Language of document : ECLI:EU:T:2011:356

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção)

13 de Julho de 2011 (*)

«Concorrência – Acordos, decisões e práticas concertadas – Mercado da borracha de butadieno e da borracha de estireno‑butadieno fabricada por polimerização em emulsão – Decisão que declara uma infracção ao artigo 81.° CE – Imputabilidade do comportamento ilícito – Coimas – Gravidade da infracção – Circunstâncias agravantes»

No processo T‑39/07,

Eni SpA, com sede em Roma (Itália), representada por G. M. Roberti e I. Perego, advogados,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada por V. Di Bucci, G. Conte e V. Bottka, na qualidade de agentes,

recorrida,

que tem por objecto um pedido de anulação, no tocante à Eni SpA, da decisão C (2006) 5700 final da Comissão, de 29 de Novembro de 2006, relativa a um processo de aplicação do artigo 81.° CE e do artigo 53.° do acordo EEE (processo COMP/F/38.638 – Borracha de butadieno e borracha de estireno‑butadieno fabricada por polimerização em emulsão), ou, a título subsidiário, a anulação ou a redução da coima aplicada à Eni,

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção),

composto por: F. Dehousse (relator), exercendo a função de presidente, I. Wiszniewska‑Białecka e N. Wahl, juízes,

secretário: K. Pocheć, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 12 de Outubro de 2009,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1        Por decisão C (2006) 5700 final, de 29 de Novembro de 2006, (processo COMP/F/38.638 – Borracha de butadieno e borracha de estireno‑butadieno fabricada por polimerização em emulsão; a seguir «decisão impugnada»), a Comissão das Comunidades Europeias declarou que várias empresas tinham infringido o artigo 81.°, n.° 1, CE e o artigo 53.° do Acordo sobre o Espaço Económico Europeu (EEE) por terem participado num acordo, decisão ou prática concertada no mercado dos produtos acima referidos.

2        As empresas destinatárias da decisão impugnada são:

–        A Bayer AG, com sede em Leverkusen (Alemanha);

–        A Dow Chemical Company, com sede em Midland, Michigan (Estados Unidos) (a seguir «Dow Chemical»);

–        A Dow Deutschland Inc., com sede em Schwalbach (Alemanha);

–        A Dow Deutschland Anlagengesellschaft mbH (anteriormente Dow Deutschland GmbH & Co. OHG), com sede em Schwalbach;

–        A Dow Europe, com sede em Horgen (Suiça);

–        A Eni SpA, com sede em Roma (Itália);

–        A Polimeri Europa SpA, com sede em Brindisi (Itália) (a seguir «Polimeri»);

–        A Shell Petroleum NV, com sede em Haia (Países Baixos);

–        A Shell Nederland BV, com sede em Haia;

–        A Shell Nederland Chemie BV, com sede em Roterdão (Países Baixos);

–        A Unipetrol a.s., com sede em Praga (República Checa);

–        A Kaučuk a.s., com sede em Kralupy nad Vltavou (República Checa);

–        A Trade‑Stomil sp. z o.o., com sede em Łódź (Polónia) (a seguir «Stomil»).

3        A Dow Deutschland, a Dow Deutschland Anlagengesellschaft e a Dow Europe são inteiramente controladas, directa ou indirectamente, pela Dow Chemical (a seguir, conjuntamente, «Dow») (considerandos 16 a 21 da decisão impugnada).

4        A actividade da Eni relativa aos produtos em causa era inicialmente assegurada pela EniChem Elastomeri Srl, indirectamente controlada pela Eni, por intermédio da sua filial EniChem SpA (a seguir «EniChem SpA»). A 1 de Novembro de 1997, a EniChem Elastomeri fundiu‑se na EniChem SpA. A Eni controlava 99,97% da EniChem SpA. Em 1 de Janeiro de 2002, a EniChem SpA transferiu a sua actividade química estratégica (incluindo a actividade ligada à borracha de butadieno e à borracha de estireno‑butadieno fabricada por polimerização em emulsão) para a sua filial, controlada a 100%, Polimeri. A Eni controla, directa e integralmente, a Polimeri desde 21 de Outubro de 2002. Em 1 de Maio de 2003, a EniChem SpA alterou o seu nome para Syndial SpA (considerandos 26 a 32 da decisão impugnada). A Comissão utiliza, na decisão impugnada, a denominação «EniChem» para se referir a qualquer sociedade detida pela Eni (a seguir «EniChem») (considerando 36 da decisão impugnada).

5        Shell Nederland Chemie é uma filial da Shell Nederland, a qual, por sua vez, é inteiramente controlada pela Shell Petroleum (a seguir, conjuntamente, «Shell») (considerandos 38 a 40 da decisão impugnada).

6        A Kaučuk foi criada em 1997, na sequência da fusão da Kaučuk Group a.s. e da Chemopetrol Group a.s. Em 21 de Julho de 1997, a Unipetrol adquiriu a totalidade dos activos, direitos e obrigações das empresas fundidas. A Unipetrol detém 100% das acções da Kaučuk (considerandos 45 e 46 da decisão impugnada). Além disso, segundo a decisão impugnada, a Tavorex s.r.o. (a seguir «Tavorex»), com sede na República Checa, representou a Kaučuk (e o seu predecessor, a Kaučuk Group) na exportação, desde 1991 até 28 de Fevereiro de 2003. Ainda segundo a decisão impugnada, a Tavorex representou a Kaučuk, a partir de 1996, nas reuniões da Associação Europeia da Borracha Sintética (considerando 49 da decisão impugnada).

7        A Stomil, segundo a decisão impugnada, representou o produtor polaco Chemical Company Dwory S.A. (a seguir «Dwory»), nas suas actividades de exportação, desde há cerca de 30 anos até, pelo menos, 2001. Segundo a decisão impugnada, a Stomil representou a Dwory, entre 1997 e 2000, nas reuniões da Associação Europeia da Borracha Sintética (considerando 51 da decisão impugnada).

8        O período de duração da infracção foi fixado de 20 de Maio de 1996 a 28 de Novembro de 2002 (no tocante à Bayer, Eni e Polimeri), de 20 de Maio de 1996 a 31 de Maio de 1999 (no tocante à Shell Petroleum, Shell Nederland e Shell Nederland Chemie), de 1 Julho de 1996 a 28 de Novembro de 2002 (no tocante à Dow Chemical), de 1 Julho de 1996 a 27 de Novembro de 2001 (no tocante à Dow Deutschland), de 16 de Novembro de 1999 a 28 de Novembro de 2002 (no tocante à Unipetrol e Kaučuk), de 16 de Novembro de 1999 a 22 de Fevereiro de 2000 (no tocante à Stomil), de 22 de Fevereiro de 2001 a 28 de Fevereiro de 2002 (no tocante à Dow Deutschland Anlagengesellschaft) e de 26 de Novembro de 2001 a 28 de Novembro de 2002 (no tocante à Dow Europe) (considerandos 476 a 485 e artigo 1.° do dispositivo da decisão impugnada).

9        A borracha de butadieno (a seguir «BR») e a borracha de estireno‑butadieno fabricada por polimerização em emulsão (a seguir «ESBR») são borrachas sintéticas essencialmente utilizadas na produção de pneus. Estes dois produtos são substituíveis entre si e também podem ser substituídos por outras borrachas sintéticas ou por borracha natural (considerandos 3 a 6 da decisão impugnada).

10      Além dos produtores a que se refere a decisão impugnada, também outros produtores da Ásia e da Europa de Leste venderam quantidades limitadas de BR e ESBR no território do EEE. Acresce que uma parte importante da BR é produzida directamente pelos grandes fabricantes de pneus (considerando 54 da decisão impugnada).

11      Em 20 de Dezembro de 2002, a Bayer contactou os serviços da Comissão e manifestou o seu desejo de cooperar ao abrigo da Comunicação da Comissão relativa à imunidade em matéria de coimas e à redução do seu montante nos processos relativos a cartéis (JO 2002, C 45, p. 3, a seguir «comunicação sobre a cooperação»), no que respeita à BR e à ESBR. No tocante à ESBR, a Bayer prestou oralmente declarações nas quais descreveu as actividades do cartel. Essas declarações foram registadas em cassete (considerando 67 da decisão impugnada).

12      Em 14 de Janeiro de 2003, a Bayer prestou oralmente declarações nas quais descreveu as actividades do cartel no que respeita à BR. Essas declarações foram registadas em cassete. A Bayer forneceu igualmente actas de reuniões do Comité BR da Associação Europeia da Borracha Sintética (considerando 68 da decisão impugnada).

13      Em 5 de Fevereiro de 2003, a Comissão notificou à Bayer a sua decisão de lhe conceder uma imunidade condicional relativamente à coima (considerando 69 da decisão impugnada).

14      Em 27 de Março de 2003, a Comissão procedeu a uma inspecção, ao abrigo do artigo 14.°, n.° 3, do Regulamento n.° 17 do Conselho, de 6 de Fevereiro de 1962, primeiro regulamento de execução dos artigos [81.° CE] e [82.° CE] (JO 1962, 13, p. 204; EE 08 F1 p. 22), nas instalações da Dow Deutschland & Co. (considerando 70 da decisão impugnada).

15      Entre Setembro de 2003 e Julho de 2006, a Comissão enviou às empresas a que se aplica a decisão impugnada vários pedidos de informação, ao abrigo do artigo 11.° do Regulamento n.° 17 e do artigo 18.° do Regulamento (CE) n.° 1/2003 do Conselho, de 16 de Dezembro de 2002, relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigos 81.° [CE] e 82.° [CE] (JO 2003, L 1, p. 1) (considerando 71 da decisão impugnada).

16      Em 16 de Outubro de 2003, representantes da Dow Deutschland e da Dow Deutschland & Co. reuniram‑se com funcionários da Comissão e manifestaram o desejo dessas empresas de cooperar ao abrigo da comunicação sobre a cooperação. Nessa reunião, foi feita uma apresentação das actividades do cartel relativamente à BR e à ESBR. Esta apresentação foi gravada. Além disso, também foi entregue um dossier com documentos relativos ao cartel (considerando 72 da decisão impugnada).

17      Em 4 de Março de 2005, a Dow Deutschland foi informada da intenção da Comissão de lhe reduzir a coima entre 30 e 50% (considerando 73 da decisão impugnada).

18      Em 7 de Junho de 2005, a Comissão procedeu à abertura do processo e enviou uma primeira comunicação de acusações às empresas destinatárias da decisão impugnada – excepto à Unipetrol – e à Dwory. A primeira comunicação de acusações também tinha a Tavorex como destinatária, embora não lhe tenha sido notificada por se encontrar em liquidação desde Outubro de 2004. O processo que lhe dizia respeito foi por isso encerrado (considerandos 49 e 74 da decisão impugnada).

19      As empresas em causa apresentaram observações escritas sobre esta primeira comunicação de acusações (considerando 75 da decisão impugnada). Tiveram igualmente acesso ao dossier, sob a forma de CD‑ROM, e às declarações e documentos correspondentes nas instalações da Comissão (considerando 76 da decisão impugnada).

20      Em 3 de Novembro de 2005, a Manufacture française des pneumatiques Michelin (a seguir «Michelin») pediu para intervir. Apresentou observações escritas em 13 de Janeiro de 2006 (considerando 78 da decisão impugnada).

21      Em 6 de Abril de 2006, a Comissão aprovou uma segunda comunicação de acusações endereçada às empresas destinatárias da decisão impugnada, comunicação essa que foi objecto de observações escritas destas empresas (considerando 84 da decisão impugnada).

22      Em 12 de Maio de 2006, a Michelin apresentou uma denúncia ao abrigo do artigo 5.° do Regulamento (CE) n.° 773/2004 da Comissão, de 7 de Abril de 2004, relativo à instrução de processos pela Comissão para efeitos dos artigos 81.° [CE] e 82.° [CE] (JO L 123, p. 18) (considerando 85 da decisão impugnada).

23      Em 22 de Junho de 2006, as empresas destinatárias da decisão impugnada, excepto a Stomil, e a Michelin participaram na audição realizada pela Comissão (considerando 86 da decisão impugnada).

24      Não havendo elementos de prova suficientes acerca da participação da Dwory no cartel, a Comissão decidiu encerrar o processo a seu respeito (considerando 88 da decisão impugnada). A Comissão decidiu igualmente encerrar o processo em relação à Syndial (considerando 89 da decisão impugnada).

25      Por outro lado, embora inicialmente tivessem sido utilizados dois números de processos distintos (um para a BR e outro para a ESBR) (COMP/E‑1/38.637 e COMP/E‑1/38.638), a Comissão decidiu passar a utilizar, depois da primeira comunicação de acusações, um número único (COMP/F/38.638) (considerandos 90 e 91 da decisão impugnada).

26      O procedimento administrativo terminou com a aprovação pela Comissão, em 29 de Novembro de 2006, da decisão impugnada.

27      Nos termos do artigo 1.° do dispositivo da decisão impugnada, as empresas adiante referidas violaram o artigo 81.° CE e o artigo 53.° EEE por terem participado, durante os períodos indicados, num acordo único e continuado no âmbito do qual acordaram fixar objectivos de preços, partilhar clientes mediante acordos de não agressão e proceder ao intercâmbio de informações sensíveis sobre preços, concorrentes e clientes nos sectores da BR e da ESBR:

a)      Bayer, de 20 de Maio de 1996 a 28 de Novembro de 2002;

b)      Dow Chemical, de 1 Julho de 1996 a 28 de Novembro de 2002; Dow Deutschland, de 1 Julho de 1996 a 27 de Novembro de 2001; Dow Deutschland Anlagengesellschaft, de 22 de Fevereiro de 2001 a 28 de Fevereiro de 2002; Dow Europe, de 26 de Novembro de 2001 a 28 de Novembro de 2002;

c)      Eni, de 20 de Maio de 1996 a 28 de Novembro de 2002; Polimeri, de 20 de Maio de 1996 a 28 de Novembro de 2002;

d)      Shell Petroleum, de 20 de Maio de 1996 a 31 de Maio de 1999; Shell Nederland, de 20 de Maio de 1996 a 31 de Maio de 1999; Shell Nederland Chemie, de 20 de Maio de 1996 a 31 de Maio de 1999;

e)      Unipetrol, de 16 de Novembro de 1999 a 28 de Novembro de 2002; Kaučuk, de 16 de Novembro de 1999 a 28 de Novembro de 2002;

f)      Stomil, de 16 de Novembro de 1999 a 22 de Fevereiro de 2000.

28      Com base nos factos apurados e nas apreciações jurídicas constantes da decisão impugnada, a Comissão aplicou às empresas em causa coimas cujos montantes foram calculados de acordo com a metodologia exposta nas Orientações para o cálculo das coimas aplicadas por força do n.° 2 do artigo 15.° do Regulamento n.° 17 e do n.° 5 do artigo 65.° do Tratado CECA (JO 1998, C 9, p. 3; a seguir «orientações») e na comunicação sobre a cooperação.

29      O artigo 2.° do dispositivo da decisão impugnada fixa as seguintes coimas:

a)      Bayer: 0 euros;

b)      Dow Chemical: 64,575 milhões de euros, dos quais:

i)      60,27 milhões de euros solidariamente com a Dow Deutschland;

ii)      47,355 milhões de euros solidariamente com a Dow Deutschland Anlagengesellschaft e a Dow Europe;

c)      Eni e Polimeri, solidariamente: 272,25 milhões de euros;

d)       Shell Petroleum, Shell Nederland e Shell Nederland Chemie, solidariamente: 160,875 milhões de euros;

e)      Unipetrol e Kaučuk, solidariamente: 17,55 milhões de euros;

f)      Stomil: 3,8 milhões de euros.

30      O artigo 3.° do dispositivo da decisão impugnada determina que as empresas enumeradas no artigo 1.° devem pôr imediatamente termo, se não o tiverem já feito, às infracções mencionadas nesse mesmo artigo e abster‑se, a partir dessa data, de repetir qualquer acto ou comportamento descrito no artigo 1.°, bem como qualquer acto ou comportamento com objecto ou efeito equivalente.

 Tramitação processual e pedidos das partes

31      Por petição apresentada na secretaria do Tribunal em 16 de Fevereiro de 2007, a Eni interpôs o presente recurso.

32      Por decisão do presidente do Tribunal de 31 de Março de 2009, N. Wahl foi designado para completar a Secção na sequência do impedimento de um dos seus Membros.

33      Com base no relatório do juiz‑relator, o Tribunal (Primeira Secção) decidiu dar início à fase oral.

34      O Tribunal Geral, no âmbito das medidas de organização do processo previstas no artigo 64.° do seu Regulamento de Processo, convidou as partes a responderem a determinadas questões e a comunicar determinados documentos. As partes satisfizeram esses pedidos nos prazos fixados.

35      Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às questões orais do Tribunal na audiência de 12 de Outubro de 2009.

36      A Eni conclui pedindo que o Tribunal de digne:

–        anular a decisão impugnada na parte em que lhe imputa a responsabilidade pelos comportamentos que são objecto da coima em causa;

–        a título subsidiário, anular ou reduzir a coima que lhe foi aplicada nos termos do artigo 2.° da decisão impugnada;

–        condenar a Comissão nas despesas.

37      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal de digne:

–        julgar o recurso improcedente;

–        condenar a Eni nas despesas.

 Questão de direito

38      Em apoio dos seus pedidos a Eni apresenta dois fundamentos. Através do primeiro, contesta o facto de a Comissão lhe ter imputado a responsabilidade pela infracção. Através do segundo, sustenta que foi incorrectamente que a Comissão determinou o montante da coima.

A –  Quanto ao pedido de anulação parcial da decisão impugnada

1.      Quanto ao primeiro fundamento, relativo à imputação ilegal da infracção à Eni

39      A Eni indica que, segundo a decisão impugnada, a detenção de 100% do capital de uma sociedade implica a presunção de que a sociedade‑mãe exerce uma influência determinante no comportamento da sua filial, o que exclui a possibilidade de esta gozar de uma real autonomia para definir a sua própria política comercial. Nesse caso, de acordo com a leitura da decisão impugnada feita pela Eni, existe inversão do ónus da prova, devendo a empresa em causa então demonstrar que a presunção decorrente do controlo da totalidade do capital é infundada.

40      O primeiro fundamento da Eni divide‑se em quatro partes. No âmbito da primeira parte, considera que a Comissão aplicou um critério de apreciação da responsabilidade da sociedade‑mãe errado. No âmbito da segunda, sustenta que a Comissão lhe imputou, erradamente, uma responsabilidade objectiva. No quadro da terceira parte, indica ter fornecido, durante o procedimento administrativo, elementos que deveriam ter levado a Comissão a considerar que não influenciado as políticas comerciais da Syndial/Polimeri. No quadro da quarta, afirma que a Comissão violou o princípio da responsabilidade limitada das sociedades de capitais e os princípios comuns em matéria de responsabilidade.

a)     Quanto à primeira parte, relativa à errada aplicação dos requisitos de imputabilidade da infracção

 Argumentos das partes

41      Ao indicar que é sobre a Comissão que recai o ónus de provar uma infracção às regras da concorrência (acórdão do Tribunal de Justiça de 17 de Dezembro de 1998, Baustahlgewebe/Comissão, C‑185/95 P, Colect., p. I‑8417, e artigo 2.° do Regulamento n.° 1/2003), a Eni considera que a abordagem que essa instituição adoptou na decisão impugnada é contrária à jurisprudência e à sua própria prática.

42      Quanto à jurisprudência, evocando, em primeiro lugar, os acórdãos proferidos no processo Stora Kopparbergs Bergslags/Comissão, pelo Tribunal Geral (acórdão do Tribunal Geral de 14 de Maio de 1998, Stora Kopparbergs Bergslags/Comissão, T‑354/94, Colect., p. II‑2111) e, em recurso, pelo Tribunal de Justiça (acórdão do Tribunal de Justiça de 16 de Novembro de 2000, Stora Kopparbergs Bergslags/Comissão, C‑286/98 P, Colect., p. I‑9925, a seguir «acórdão Stora»), a Eni considera que estes acórdãos confirmam o princípio segundo o qual a responsabilidade pelo comportamento de uma filial só pode ser imputado à sociedade‑mãe quando a filial não determina de forma autónoma o seu comportamento no mercado, mas aplica no essencial as instruções que lhe são dadas pela sociedade‑mãe (acórdão Stora Kopparbergs Bergslags/Comissão, já referido). Neste âmbito, o Tribunal de Justiça confirmou que a simples detenção do capital não justifica a responsabilidade por infracções às regras da concorrência (acórdão Stora, já referido). A Eni remete igualmente para as conclusões do advogado‑geral J. Mischo no acórdão Stora, já referido (Colect., p. I‑9928), que o Tribunal de Justiça teria seguido. Nesse processo, o comportamento da recorrente no procedimento administrativo e a participação no cartel de várias sociedades do grupo Stora permitiram concluir que a sua participação de 100% no capital das suas filiais bastava para que à Stora fosse imputada a responsabilidade pelos actos das referidas filiais. Eni conclui que só circunstâncias muito especiais, e em qualquer caso adicionais, permitem considerar provada a responsabilidade da sociedade que encabeçava o grupo, sem que outras investigações sejam necessárias para verificar se exerceu efectivamente uma influência determinante no comportamento da sua filial que violam o artigo 81.° CE.

43      O Tribunal de Justiça chegou a conclusões semelhantes em processos ulteriores em que se colocava uma questão análoga. A Eni remete, a este respeito, para os acórdãos do Tribunal de Justiça de 2 de Outubro de 2003, Aristrain/Comissão (C‑196/99 P, Colect., p. I‑11005), e de 28 de Junho de 2005, Dansk Rørindustri e o./Comissão, (C‑189/02 P, C‑202/02 P, C‑205/02 P a C‑208/02 P e C‑213/02 P, Colect., p. I‑5425). Esses acórdãos, embora digam respeito a sociedades irmãs, eram pertinentes na medida em que confirmam que, para determinar a pessoa colectiva responsável no interior de um grupo, a Comissão deve analisar em profundidade o conjunto das relações existentes entre as sociedades desse grupo. A Eni remete igualmente para o acórdão do Tribunal de Justiça de 10 de Janeiro de 2006, Cassa di Risparmio di Firenze e o. (C‑222/04, Colect., p. I‑289). Contrariamente ao que sustenta a Comissão, este acórdão não é desfavorável à posição da Eni. Com efeito, confirma que a mera detenção da totalidade do capital não equivale ao exercício efectivo de uma influência na gestão.

44      O Tribunal também não considerou que a participação de 100% no capital da sociedade que materialmente cometeu as infracções às regras de concorrência permite, por si só, justificar a responsabilidade da sociedade‑mãe, na falta de outros elementos susceptíveis de demonstrar que esta exerceu efectivamente os poderes que retira da sua participação. Eni cita, a este respeito, diversos «indícios» que permitem confirmar a presunção decorrente da detenção do capital, que foram identificados pelo Tribunal Geral em determinados processos.

45      A Eni reconhece que, em dois acórdãos recentes, o Tribunal Geral considerou que, quando uma sociedade‑mãe controla a 100% a sua filial culpada de um comportamento ilícito, existe uma presunção ilidível segundo a qual a referida sociedade‑mãe exercia efectivamente uma influência determinante sobre o comportamento da sua filial e que, por conseguinte, cabia à sociedade‑mãe inverter essa presunção apresentando elementos de prova susceptíveis de demonstrar a autonomia da sua filial (acórdãos do Tribunal Geral de 27 de Setembro de 2006, Avebe/Comissão, T‑314/01, Colect., p. II‑3085, e Akzo Nobel/Comissão, T‑330/01, Colect., p. II‑3389). Todavia, uma leitura atenta destes dois acórdãos mostra que as decisões da Comissão que imputam às sociedades‑mãe a responsabilidade pelas infracções ao direito da concorrência cometidas pelas suas filiais só foram consideradas legais, quanto a este aspecto, à luz de uma série de elementos mais precisos, que a Eni refere, que não se reconduziam à simples detenção do capital.

46      Quanto ao acórdão do Tribunal Geral de 27 de Setembro de 2006, Jungbunzlauer/Comissão (T‑43/02, Colect., p. II‑3435), evocado pela Comissão nos seus articulados, a questão da presunção de responsabilidade só é aí abordada de forma incidental e apenas com o único fito de afirmar que não se aplica ao caso em apreço. Além disso, a Eni sublinha que a sociedade‑mãe Jungbunzlauer Holding AG não esteve implicada na infracção em causa, apesar de deter a totalidade do capital da recorrente nesse processo e da Jungbunzlauer GmbH.

47      A Eni conclui que, à luz, designadamente, do acórdão Avebe/Comissão, referido no n.° 45 supra, qualquer eventual presunção de «influência decisiva» da sociedade‑mãe sobre a sua filial detida a 100% só pode ser considerada se a detenção da totalidade do capital for acompanhada de outras «indícios suficientemente importantes». De qualquer modo, a sociedade em causa tem sempre a possibilidade de «ilidir esta presunção fornecendo durante o procedimento administrativo à Comissão elementos de prova suficientes» (acórdão Akzo Nobel/Comissão, n.° 45 supra).

48      Acresce que a abordagem defendida pela Eni também foi confirmada no acórdão do Tribunal Geral de 26 de Abril de 2007, Bolloré e o./Comissão (T‑109/02, T‑118/02, T‑122/02, T‑125/02, T‑126/02, T‑128/02, T‑129/02, T‑132/02 e T‑136/02, Colect., p. II‑947). Este acórdão afirma, expressamente, que a tese da Comissão segundo a qual a simples presunção decorrente da detenção da totalidade do capital permite concluir pela responsabilidade da sociedade‑mãe não é juridicamente fundada. A detenção de 100% do capital poderia, é certo, constituir um indício da influência determinante, mas não bastava, por si só, para fazer a prova. Com efeito, segundo esse acórdão, nesse caso, continuava a ser necessária a prova de um elemento adicional em relação à taxa de participação.

49      Quanto à prática decisória anterior da Comissão, a Eni refere que, até à adopção da decisão da Comissão de 19 de Janeiro de 2005, relativa a um processo de aplicação do artigo 81.° CE e do artigo 53.° EEE (processo COMP/E‑1/37.773 – AMCA, a seguir «decisão AMCA»), a responsabilidade de uma empresa por infracção ao artigo 81.° CE nunca tinha sido considerada com base apenas no controlo exercido sobre outra sociedade. Na falta de outros elementos, a Comissão nunca imputou nem alargou a responsabilidade à sociedade que encabeçava o grupo.

50      A Eni evoca, em especial, a decisão da Comissão de 16 de Dezembro de 2003, relativa a um processo de aplicação do artigo 81.° CE e do artigo 53.° EEE (processo COMP/E‑1/38.240 – tubos industriais) (resumida no JO 2004, L 125, p. 50), e as decisões da Comissão de 20 de Outubro de 2004 (processo COMP/C.38.238/B.2 – Tabaco em rama – Espanha) e de 20 de Outubro de 2005 (processo COMP/C.38.281/B.2 – Tabaco em rama – Itália), relativas a processos de aplicação do artigo 81.° CE. A Eni recorda os ensinamentos que retira dessas decisões, para as quais foi fornecido um exame detalhado na segunda comunicação de acusações.

51      Resultaria destas decisões que a prática da Comissão era, inequivocamente – pelo menos até 2005 – a de não atribuir uma importância determinante à detenção, pela sociedade‑mãe, da totalidade do capital de uma empresa que tenha materialmente participado numa infracção para determinar a influência que ela tinha tido na política comercial dessa filial. A participação de 100% ou quase 100% «aligeirava» o ónus da prova que recai sobre a Comissão, mas não o fez desaparecer. A Eni refere, em seguida, os elementos de prova a que a Comissão atribuiu particular importância no âmbito de outras decisões. Nenhum destes elementos estava presente nas relações existentes entre a Eni e a Polimeri ou a Syndial.

52      Além disso, a Eni indica ter consciência da jurisprudência que exclui, na aplicação das coimas em matéria de concorrência, toda a contestação baseada na prática decisória anterior da Comissão. Todavia, o Tribunal Geral indicou que, mesmo quando da aplicação dessa disposição (no caso concreto, o artigo 15.° do Regulamento n.° 17) a cada caso, a Comissão deve respeitar os princípios gerais de direito, entre os quais figura o princípio da igualdade de tratamento, como interpretado pelos órgãos jurisdicionais comunitários (acórdão do Tribunal Geral de 27 de Setembro de 2006, Archer Daniels Midland/Comissão, T‑59/02, Colect., p. II‑3627). O poder discricionário que a Comissão pretende exercer está, portanto, limitado pelo respeito dos princípios fundamentais. Além disso, haveria que diferenciar a fixação do montante da coima, em que a Comissão dispõe de um poder discricionário, da identificação do ou dos sujeitos jurídicos responsáveis por uma infracção. Neste último caso, a Comissão não dispunha de poder discricionário. Isto é confirmado pelas conclusões da advogada‑geral J. Kokott no processo que deu origem ao acórdão do Tribunal de Justiça de 11 de Dezembro de 2007, ETI e o. (C‑280/06, Colect., pp. I‑10893, I‑10896). Não poderia, portanto, invocar este poder para ignorar a sua própria prática decisória anterior. Por fim, a Eni refere que a alteração da prática da Comissão não é acompanhada da fundamentação adequada e específica que se impõe quando a instituição pretende afastar‑se de uma prática anterior confirmada. A Eni considera que, no presente caso, esta fundamentação se impõe ainda mais porque esta nova orientação conduz a imputar a responsabilidade a sujeitos de direito que não participaram nas infracções punidas (acórdão do Tribunal Geral de 28 de Abril de 1994, AWS Benelux/Comissão, T‑38/92, Colect., p. II‑211).

53      Em conclusão, a Eni considera que a Comissão, na medida em que se baseia na simples presunção de influência determinante que teria exercida sobre a Polimeri graças à sua participação de 100% no capital desta para lhe imputar a responsabilidade pelos comportamentos em causa, violou os princípios relativos à responsabilidade das sociedades‑mãe pelas infracções cometidas pelas suas filiais, tal como definidos pela jurisprudência comunitária a propósito dos artigos 81.° CE e 82.° CE, e o artigo 2.° do Regulamento n.° 1/2003, que faz recair sobre a Comissão o ónus de provar as infracções às regras da concorrência.

54      Quanto aos «outros elementos» que figuram na decisão impugnada e invocados pela Comissão nos seus articulados, a Eni indica, antes de mais, que as relações hierárquicas a que é feita referência se situavam nas filiais e a elas se confinavam, sem abranger as sociedades situadas a montante. A Comissão limita‑se a constatar que a sociedade‑mãe gozava das prerrogativas comuns relativas à designação do Conselho de administração. Não se trata, portanto, de um elemento distinto do controlo. Em seguida, o facto de a Eni nunca se ter separado das suas actividades do sector químico também não constitui um elemento desse tipo. Esta afirmação, que não teria sentido, não figura, aliás, na decisão impugnada. Por último, quanto às «reorganizações sistemáticas» referidas pela Comissão, foram alegadas na decisão impugnada para contestar a relevância de um elemento aduzido pela própria Eni. Além disso, essas reorganizações mostram que as actividades não essenciais, como a química, permaneceram em sociedades distintas, diferentemente de outros sectores.

55      A Comissão entende que a primeira parte do primeiro fundamento deve ser julgada improcedente. Considera, no essencial, que, quando uma sociedade‑mãe detém 100% do capital de uma filial, existe a presunção de que a sociedade‑mãe exerce uma influência determinante sobre o comportamento da sua filial.

 Apreciação do Tribunal

56      A Comissão indica, na decisão impugnada, que uma sociedade‑mãe pode ser considerada responsável pelo comportamento ilícito de uma filial quando esta não determina autonomamente o seu comportamento no mercado. A Comissão refere‑se, nomeadamente, a este respeito, ao conceito de empresa em direito da concorrência (considerandos 333 e 334 da decisão impugnada). A Comissão indica, por outro lado, que se pode presumir que uma filial detida a 100% aplica no essencial as instruções que lhe são dadas pela sua sociedade‑mãe sem ter que verificar se a sociedade‑mãe exerceu efectivamente esse poder. Compete à sociedade‑mãe ou à filial ilidir esta presunção fornecendo elementos de prova que demonstrem que a filial determinou de forma autónoma o seu comportamento no mercado em vez de aplicar as instruções da sua sociedade‑mãe, escapando assim à aplicação do conceito de empresa (considerando 335 da decisão impugnada).

57      Em seguida, a Comissão indica que a EniChem SpA é responsável pela sua participação directa na infracção. Precisa que a actividade da Eni com os produtos em questão era inicialmente assegurada pela EniChem Elastomeri, indirectamente controlada pela Eni através da sua filial EniChem SpA. Como se recordou no n.° 4 supra, em 1 de Novembro de 1997 a EniChem Elastomeri fundiu‑se na EniChem SpA. A Eni controlava 99,97% da EniChem SpA. Em 1 de Janeiro de 2002, a EniChem SpA transferiu a sua actividade química estratégica (incluindo a actividade ligada à BR e à ESBR) para a sua filial, detida a 100%, Polimeri. A Eni controla directa e integralmente a Polimeri desde 21 de Outubro de 2002. Em 1 de Maio de 2003 a EniChem SpA mudou o nome para Syndial (considerandos 26 a 32 e 365 a 367 da decisão impugnada).

58      Por último, a Comissão indica que a Eni controlava, directa ou indirectamente, quase 100% do capital da EniChem Elastomeri, da EniChem SpA, da Syndial e da Polimeri, existindo vários elementos confirmativos, em seu entender, de que se podia presumir que a Eni exercera uma influência determinante no comportamento das suas filiais. Além disso, recordando nomeadamente que a Polimeri assumira a actividade química estratégica da EniChem SpA em 1 de Janeiro de 2002 e que havia um risco sério de que, no momento da execução da decisão impugnada, a Syndial já não possuísse activos suficientes para pagar a coima, a Comissão considerou que a Polimeri devia ser considerada responsável pelo comportamento da Syndial e decidiu não incluir a Syndial entre os destinatários da decisão impugnada. A Comissão concluiu que a decisão impugnada devia ter por destinatárias a Polimeri e a Eni, as quais deviam ser consideradas solidariamente responsáveis pela infracção (considerandos 365 a 401 da decisão impugnada).

59      A primeira parte do primeiro fundamento apresentado pela Eni assenta, em substância, no postulado jurídico segundo o qual não existe a presunção de que uma sociedade‑mãe que detém 100% do capital da sua filial exerce uma influência determinante no seu comportamento.

60      Há que recordar, a este respeito, que o direito comunitário da concorrência visa as actividades das empresas e que o conceito de empresa abrange qualquer entidade que exerça uma actividade económica, independentemente do estatuto jurídico dessa entidade e do seu modo de financiamento. O Tribunal de Justiça precisou igualmente que o conceito de empresa, inserido nesse contexto, deve ser entendido como designando uma unidade económica, mesmo que, do ponto de vista jurídico, essa unidade económica seja constituída por várias pessoas singulares ou colectivas. Quando uma tal entidade económica infringe as regras da concorrência, incumbe‑lhe, de acordo com o princípio da responsabilidade pessoal, responder por essa infracção. A infracção ao direito comunitário da concorrência deve ser inequivocamente imputada a uma pessoa jurídica à qual poderão ser aplicadas coimas, devendo a comunicação das acusações ser‑lhe endereçada. Importa igualmente que a comunicação de acusações indique em que qualidade a pessoa jurídica é acusada dos factos alegados (v. acórdão do Tribunal de Justiça de 10 de Setembro de 2009, Akzo Nobel e o./Comissão, C‑97/08 P, Colect., p. I‑8237, n.os 54 a 57 e jurisprudência aí indicada).

61      Por outro lado, resulta de jurisprudência assente que o comportamento de uma filial pode ser imputado à sociedade‑mãe designadamente quando, apesar de ter personalidade jurídica distinta, essa filial não determinar de forma autónoma o seu comportamento no mercado, mas aplica no essencial as instruções que lhe são dadas pela sociedade‑mãe, atentos em particular os vínculos económicos, organizacionais e jurídicos que unem essas duas entidades jurídicas. Com efeito, é assim porque, nessa situação, a sociedade‑mãe e a sua filial fazem parte de uma mesma unidade económica e, portanto, formam uma única empresa, na acepção da jurisprudência referida supra. Assim, o facto de uma sociedade‑mãe e a sua filial constituírem uma única empresa permite à Comissão tomar uma decisão que impõe coimas à sociedade‑mãe, sem que seja necessário demonstrar a implicação pessoal desta última na infracção (v. acórdão Akzo Nobel e o./Comissão, n.° 60 supra, n.os 58 e 59 e jurisprudência aí indicada).

62      No caso particular em que uma sociedade‑mãe detém 100% do capital da sua filial que cometeu uma infracção às regras comunitárias da concorrência, por um lado, essa sociedade‑mãe pode exercer uma influência determinante no comportamento dessa filial, e, por outro, existe uma presunção ilidível segundo a qual a referida sociedade‑mãe exerce efectivamente influência determinante sobre o comportamento da sua filial. Nestas condições, basta que a Comissão prove que a totalidade do capital de uma filial é detida pela sua sociedade‑mãe para se presumir que esta exerce uma influência determinante na política comercial dessa filial. A Comissão pode, em seguida, considerar que a sociedade‑mãe é solidariamente responsável pelo pagamento da coima aplicada à sua filial, a menos que essa sociedade‑mãe, a quem incumbe ilidir essa presunção, apresente elementos de prova suficientes susceptíveis de demonstrar que a sua filial se comporta de forma autónoma no mercado. Se é verdade que o Tribunal de Justiça evocou nos n.os 28 e 29 do acórdão Stora, n.° 42 supra, com excepção da detenção de 100% do capital da filial, outras circunstâncias, tais como a não contestação da influência exercida pela sociedade‑mãe na política comercial da sua filial e a representação comum das duas sociedades durante o procedimento administrativo, não é menos verdade que tais circunstâncias foram referidas pelo Tribunal de Justiça apenas com o objectivo de expor todos os elementos nos quais o Tribunal Geral tinha baseado o seu raciocínio, e não para subordinar a aplicação da presunção mencionada anteriormente à produção de indícios suplementares relativos ao exercício efectivo de uma influência pela sociedade‑mãe (v. acórdão Akzo Nobel e o./Comissão, n.° 60 supra, n.os 60 a 62 e jurisprudência aí indicada).

63      Daqui decorre que, contrariamente ao que sustenta a Eni, existe uma presunção ilidível segundo a qual uma sociedade‑mãe que detém 100% do capital da sua filial exerce uma influência determinante no seu comportamento. O postulado jurídico da Eni é, portanto, errado.

64      Quanto à prática decisória anterior da Comissão invocada pela Eni, e na medida em que esta invoca a violação do princípio da igualdade de tratamento, há que recordar antes de mais que, pelos motivos reproduzidos nos n.os 60 a 62 supra, o comportamento de uma filial que infringe as regras da concorrência pode ser imputado à sociedade‑mãe. Em seguida, há que salientar que a imputação da infracção à sociedade‑mãe é uma faculdade deixada à apreciação da Comissão (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de Justiça de 24 de Setembro de 2009, Erste Bank der österreichischen Sparkassen/Comissão, C‑125/07 P, C‑133/07 P, C‑135/07 P e C‑137/07 P, Colect., p. I‑8681, n.° 82, e do Tribunal Geral de 14 de Dezembro de 2006, Raiffeisen Zentralbank Österreich e o./Comissão, T‑259/02 a T‑264/02 e T‑271/02, Colect., p. II‑5169, n.° 331). Nestas condições, há que considerar que o simples facto de a Comissão ter entendido, na sua prática decisória anterior, que as circunstâncias de um processo não justificavam que se imputasse o comportamento de uma filial à sua sociedade‑mãe não implica que seja obrigada a fazer a mesma apreciação numa decisão posterior (v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 20 de Abril de 1999, Limburgse Vinyl Maatschappij e o./Comissão, dito «PVC II», T‑305/94 a T‑307/94, T‑313/94 a T‑316/94, T‑318/94, T‑325/94, T‑328/94, T‑329/94 e T‑335/94, Colect., p. II‑931, n.° 990). Para ser exaustivo, há que recordar que, a partir do momento em que uma empresa violou o artigo 81.°, n.° 1, CE, não pode furtar‑se à aplicação de uma sanção por não ter sido aplicada uma coima a outro operador económico, mesmo que o Tribunal não tenha sido chamado a conhecer da situação deste último (v. acórdão PVC II, já referido, n.° 1237 e jurisprudência aí indicada).

65      Na medida em que, com os seus argumentos relativos à prática decisória anterior, a Eni alega uma violação do dever de fundamentação que incumbe à Comissão, basta observar que, atendendo aos elementos mencionados na decisão impugnada (reproduzidos nos n.os 56 a 58 supra), a Comissão detalhou suficientemente os motivos pelos quais decidiu imputar à Eni o comportamento das suas filiais.

66      Por último, na medida em que, com os seus argumentos relativos à prática decisória anterior, a Eni alega uma violação do princípio da segurança jurídica, há que recordar que a prática da Comissão, tal como resulta do presente caso, se baseia numa interpretação correcta do artigo 81.°, n.° 1, CE. O princípio da segurança jurídica não pode, pois, obstar a uma eventual reorientação da prática decisória da Comissão (v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 8 de Julho de 2008, AC‑Treuhand/Comissão, T‑99/04, Colect., p. II‑1501, n.° 163).

67      À luz destes elementos, a primeira parte do primeiro fundamento apresentado pela Eni deve ser julgada improcedente.

b)     Quanto à segunda parte, relativa à errada imputação de uma responsabilidade objectiva

 Argumentos das partes

68      Segundo a Eni, a Comissão, na decisão impugnada, vai mesmo além da simples presunção da imputabilidade à sociedade‑mãe das eventuais infracções cometidas pelas suas filiais detidas a 100%, considerando mesmo a possibilidade de uma responsabilidade objectiva pura e simples da sociedade‑mãe, resultado de uma presunção inilidível. Esta abordagem é contrária tanto ao artigo 81.° CE como ao princípios gerais do carácter pessoal da responsabilidade e da intransmissibilidade das penas.

69      A Eni sublinha, em especial, que a Comissão afirmou que, em princípio, os elementos da refutação invocados eram, no essencial, irrelevantes. Esta posição demonstra que o alcance da decisão impugnada consiste em criar uma responsabilidade inilidível. A Comissão teria assim considerado irrelevantes a inexistência de fluxos de informações entre as filiais e a sociedade‑mãe, a falta de indicações cruzadas entre as diferentes sociedades do grupo, o facto de a Eni operar como simples holding financeira relativamente às empresas do sector químico, bem como a questão do conhecimento que a sociedade que encabeçava o grupo tinha das eventuais infracções ao direito da concorrência cometidas pelas suas filiais.

70      O facto de a Eni ter designado, «directa ou indirectamente», «a maioria dos membros do conselho de administração, senão a totalidade», das suas filiais constitui, para a Comissão, o elemento bastante para decidir que as alegadas infracções às regras da concorrência cometidas pela Syndial/Polimeri lhe sejam imputáveis. Todavia, a detenção da totalidade (ou mesmo apenas da maioria) do capital implica naturalmente um tal poder. Assim, a Eni não vê qual seria a prova em contrário susceptível de inverter esta presunção.

71      A decisão AMCA (v. n.° 49 supra), que a Eni analisa, mostra uma radicalização da intenção da Comissão de fazer da responsabilidade das sociedades‑mãe uma responsabilidade objectiva. Isto constitui uma violação dos princípios fundamentais do carácter pessoal da responsabilidade e da intransmissibilidade das penas, uma vez que a responsabilidade da sociedade‑mãe assenta na simples detenção de uma participação em pessoas juridicamente distintas. Daqui resulta igualmente uma violação do próprio princípio da legalidade.

72      É certo que o princípio da responsabilidade pessoal deve ser modulado quando aplicado no quadro de um procedimento administrativo e se trate de pessoas colectivas, a respeito das quais não é possível falar de dolo stricto sensu. Ainda assim, mesmo as entidades colectivas são «susceptíveis de infringir as regras a que estão submetidas», sendo seu «corolário, evidentemente, o não se lhes poder imputar as infracções que não cometeram» (conclusões do advogado‑geral Ruiz‑Jarabo Colomer no processo que esteve na origem do acórdão do Tribunal de Justiça de 7 de Janeiro de 2004, Aalborg Portland e o./Comissão, C‑204/00 P, C‑205/00 P, C‑211/00 P, C‑213/00 P, C‑217/00 P e C‑219/00 P, Colect., pp. I‑123, I‑133). Como a jurisprudência confirmou por várias vezes, é certo que, tendo em conta a natureza das infracções em causa, bem como a natureza e o grau de severidade das sanções que lhe foram associadas, a responsabilidade pelo cometimento dessas infracções tem carácter pessoal (acórdão do Tribunal de Justiça de 8 de Julho de 1999, Comissão/Anic Partecipazioni, C‑49/92 P, Colect., p. I‑4125) e que uma pessoa colectiva só deve ser punida por factos que lhe são especificamente censurados (acórdão do Tribunal de Justiça de 14 de Julho de 2005, ThyssenKrupp/Comissão, C‑65/02 P e C‑73/02 P, Colect., p. I‑6773). O Tribunal recordou esses princípios nos acórdãos de 5 de Abril de 2006, Degussa/Comissão (T‑279/02, Colect., p. II‑897), e de 4 de Julho de 2006, Hoek Loos/Comissão (T‑304/02, Colect., p. II‑1887). A identificação da pessoa à qual uma infracção é imputável nunca poderá abstrair do carácter pessoal da responsabilidade, que deverá necessariamente ser associada, consequentemente, ao papel que a empresa destinatária da decisão desempenhou no sector de actividade a que o cartel respeita. Daqui resulta que a origem da responsabilidade em matéria de concorrência não é a detenção de partes do capital, mas a responsabilidade pela gestão.

73      Por fim, a Eni considera que a decisão impugnada está deficientemente fundamentada. Assim, a Comissão afirmava que os fluxos de informações entre a filial e a sociedade‑mãe são irrelevantes, quando, simultaneamente, se debruçava sobre a análise detalhada desses fluxos e das obrigações que impendem sobre as pessoas materialmente participaram nos alegados comportamentos anticoncorrenciais. Além disso, o resultado dessa análise não é concludente, uma vez que não permitiu chegar até à Eni (considerando 376 da decisão impugnada). Ora, tendo em conta o carácter de novidade da posição da Comissão quanto ao fundamento da responsabilidade pelas infracções às regras da concorrência, esta fundamentação superficial não parece ser conforme ao artigo 253.° CE. A Eni indica, a este respeito, que «incumbe todavia à Comissão desenvolver o seu raciocínio de forma explícita sempre que uma decisão for sensivelmente mais longe do que as decisões precedentes» (acórdão do Tribunal de Justiça de 26 de Novembro de 1975, Groupement des fabricants de papiers peints de Belgique e o./Comissão, 73/74, Colect., p. 503).

74      A Comissão entende que a segunda parte do primeiro fundamento deve ser julgada improcedente. Considera, em substância, que a decisão impugnada não consagra a aplicação de uma responsabilidade objectiva.

 Apreciação do Tribunal

75      No âmbito da segunda parte do primeiro fundamento, a Eni parte da premissa de que a Comissão consagrou, na decisão impugnada, uma presunção inilidível de responsabilidade da sociedade‑mãe pelos actos das suas filiais detidas a 100%.

76      Ora, tal premissa é errada.

77      Com efeito, na decisão impugnada, a Comissão indicou claramente que podia presumir que uma filial detida a 100% aplicava, no essencial, as instruções dadas pela sua sociedade‑mãe, sem ter que verificar se a sociedade‑mãe exerceu efectivamente esse poder, e que cabia à sociedade‑mãe ou à filial ilidir essa presunção. A Comissão esclareceu, a este respeito, que podiam ser apresentados elementos de prova para demonstrar que a filial determinou autonomamente o seu comportamento no mercado, em vez de aplicar as instruções da sua sociedade‑mãe, pelo que escapavam à aplicação do conceito de «empresa» (considerando 335 da decisão impugnada).

78      Daqui resulta que, contrariamente ao que sustenta a Eni, a Comissão não consagrou uma presunção inilidível na decisão impugnada. O facto de a Comissão, nos considerandos 383 a 394 da decisão impugnada, não ter acolhido os argumentos apresentados pela Eni para refutar a presunção decorrente do controlo a 100% das suas filiais não equivale a tornar inilidível a referida presunção. A Comissão mais não fez do que exprimir a sua posição segundo a qual os argumentos apresentados pela Eni não permitiam contrariar esta presunção. Isto não impede a Eni de contestar a posição da Comissão a este respeito, o que, de resto, faz no âmbito da terceira parte do presente fundamento.

79      Daqui também se infere que a falta de fundamentação que a Eni a este respeito alega não procede.

80      À luz destes elementos, a segunda parte do primeiro fundamento invocado pela Eni deve ser julgada improcedente.

c)     Quanto à terceira parte, relativa a um erro na análise dos elementos apresentados pela Eni

 Argumentos das partes

81      Ao mesmo tempo que contesta a tese da Comissão sobre a presunção que a onera, a Eni sustenta que apresentou, no decurso do procedimento administrativo, um conjunto estruturado de dados e de informações susceptíveis de demonstrar que as sociedades do grupo que operam no sector químico actuavam autonomamente.

82      Em primeiro lugar, quanto à análise dos fluxos de informações entre as sociedades do grupo, a Comissão conclui que «as relações de dependência entre os diversos responsáveis pelas actividades ligadas à [BR/ESBR conduzem] directamente ao [presidente do conselho de administração (PDG)] da EniChem SpA e da Polimeri» (considerando 376 da decisão impugnada). Os fluxos de informações não permitiam, de modo algum, retroceder até à Eni. De facto, só indirectamente e graças a uma descrição artificial é que a Comissão conseguiria retroceder até aos conselhos de administração das sociedades operacionais. A Eni remete, a este propósito, para o considerando 377 da decisão impugnada e esclarece que a situação assim descrita reflecte a organização interna normal de uma qualquer sociedade. Todavia, daqui não se podia retirar qualquer indicação quanto ao nível a que, no interior da sociedade operacional em questão, são tomadas as diversas decisões. A presente situação era substancialmente diferente das que caracterizam outros processos, nos quais as pessoas que materialmente participaram nas infracções por conta da filial tinham a obrigação precisa de prestarem contas à sociedade‑mãe. A Eni remete, a este respeito, para diversas decisões da Comissão. Também sob esta perspectiva a situação da Eni era diferente da da Dow, da Shell e da Unipetrol.

83      A Comissão afirmou, sem o justificar, que «não [tinha] de fazer a prova da existência de um fluxo de informações para aplicar a presunção» (considerando 392 da decisão impugnada) e que «a alegação [da Eni] segundo a qual ignorava tudo [acerca do comportamento anticoncorrencial das suas filiais] não era pertinente» (considerando 383 da decisão impugnada). Ora, a verificação dos fluxos de informações entre as sociedades do grupo e, consequentemente, o conhecimento que a sociedade‑mãe tem dos actos da sua filial no mercado é um elemento relevante que tem por função de demonstrar que a sociedade que encabeça o grupo se imiscuiu efectivamente na gestão das suas filiais.

84      Além disso, a afirmação de que «não é de forma alguma necessário assumir a gestão quotidiana da actividade de uma filial para exercer uma influência determinante na sua política comercial» (considerando 384 da decisão impugnada) era inexacta, dado que a «influência determinante» que uma sociedade‑mãe exerce sobre os comportamentos da sua filial no mercado implica uma participação activa da primeira na gestão da segunda. No caso em apreço, nenhum elemento permite demonstrar que as políticas comerciais e os objectivos da Syndial/Polimeri foram definidos pela Eni. Esta acrescenta que a Comissão, nos articulados que apresentou ao Tribunal, tenta minimizar a importância dessa circunstância, alegando que se trata, quando muito, de um «elemento suplementar» que acresce à presunção. Contudo, isto equivalia a confirmar a não imputabilidade da responsabilidade pela infracção à Eni.

85      Em segundo lugar, a Eni indica ter alegado, durante o procedimento administrativo, que nunca tinha sido directamente activa no sector abrangido pelas infracções. Sublinhou igualmente que o sector químico não fazia parte da sua actividade principal. De holding, tinha‑se transformado, no decurso dos anos de 1990, em sociedade operacional e tinha realizado um processo complexo de repartição das actividades em diversas divisões, das quais foram excluídas as actividades ligadas ao sector químico. As referidas actividades tinham, aliás, sido racionalizadas, tendo este processo terminado, em 2002, com a transferência para a Polimeri de todas as actividades químicas do grupo. Os lucros líquidos da Polimeri, em 2002, nomeadamente no que se refere ao sector em causa, ligados aos da Eni para o mesmo ano, demonstram que as actividades químicas são actividades de importância relativa na política industrial do grupo. A autonomia do sector químico é ainda confirmada pelas regras de gestão de empresa do grupo, descritas pela Eni durante o procedimento administrativo. Em especial, as decisões relativas às estratégias industriais das filiais eram discutidas e adoptadas no seio das diversas «divisões operacionais» e das diversas «unidades» dessas empresas, sem qualquer participação directa dos membros do conselho de administração ou do presidente da sociedade operacional ou mesmo de outros escalões da sociedade‑mãe. Além disso, os estatutos da Eni e as suas regras de gestão de empresa mostram que desempenha, a respeito das suas filiais, um papel de simples coordenador técnico e financeiro e que lhes fornece a assistência financeira necessária. Quanto aos hipotéticos apoios financeiros que a Eni concedia às suas filiais, a que a Comissão faz referência nos articulados que apresentou ao Tribunal, não foram mencionados na decisão impugnada. De resto, este elemento não era pertinente, uma vez que qualquer accionista pode participar em operações financeiras respeitantes a uma sociedade em que possui participações.

86      Remetendo para os considerandos 387, 388, 390 e 391 da decisão impugnada, a Eni considera que a Comissão procedeu a uma análise superficial, ou manifestamente errada, das informações fornecidas durante o procedimento administrativo. A decisão impugnada desprezava sistematicamente os elementos susceptíveis de enfraquecer o postulado de partida da Comissão, a saber, que a sociedade que controla 100% do capital de outra sociedade deve, sempre, ser declarada responsável pelos comportamentos desta filial.

87      Além disso, a afirmação segundo a qual «a definição da actividade principal e a descrição do papel de uma sociedade‑mãe como sendo o de uma ‘sociedade holding‘ não constituem elementos probatórios no que respeita à autonomia efectiva de uma filial» é contrária à prática constante da Comissão, confirmada recentemente no processo Tabaco em rama – Itália (v. n.° 50 supra). Essa disparidade de tratamento, que, de resto, de forma alguma se encontra justificada, constitui também uma violação do princípio da não discriminação, princípio de que a Comissão deve respeitar no exercício do seu poder discricionário.

88      A Eni refere também que, pelo menos até 2001, não detinha directamente 100% do capital das empresas que operam na produção e comercialização da BR e da ESBR e que só em 21 de Outubro de 2002 adquiriu o capital da Polimeri, isto é, no momento do encerramento do procedimento administrativo. Quanto ao argumento segundo o qual a Eni procedia à «reorganização permanente das actividades» das filiais, nada de novo trazia para a tese da Comissão.

89      Em terceiro lugar, a Comissão salienta que «a inexistência de sobreposição nas direcções não pode ser considerada um factor significativo e ainda menos determinante» (considerando 393 da decisão impugnada). Com esta afirmação, a Comissão evitava tomar posição sobre os elementos aduzidos pela Eni durante o procedimento administrativo, que demonstram que nenhuma pessoa exerceu simultaneamente funções de direcção nas empresas do sector da BR e da ESBR e na sociedade‑mãe.

90      Por fim, a Comissão considerou, nos articulados que apresentou ao Tribunal, que, para ilidir a presunção que pesa sobre uma sociedade‑mãe que detém 100% do capital de uma sua filial que cometeu uma infracção, deverá demonstrar a existência de circunstâncias especiais e inabituais. Esta posição confirma que, em todos os casos de participação de controlo conformes ao direito comum, a sociedade‑mãe deveria ser considerada, por esse simples facto, solidariamente responsável pelas eventuais violações às regras da concorrência cometidas pela sua filial. A tese da Comissão seria extremista e maximalista e estava em contradição com a sua prática anterior, conduzindo, assim, a uma desigualdade de tratamento.

91      Em conclusão, a Eni considera que as provas que apresentou para demonstrar a autonomia das suas filiais foram examinadas e rejeitadas sem terem sido apreciadas no seu contexto e no seu conjunto, ou mesmo rejeitadas de forma tão genérica que os motivos da rejeição se tornaram incompreensíveis. Isto também constituía uma violação manifesta do princípio da boa administração.

92      A Comissão entende que a terceira parte do primeiro fundamento não pode ser acolhida. Considera, no essencial, que os elementos aduzidos pela Eni não são suficientes para ilidir a presunção que no presente caso existe.

 Apreciação do Tribunal

93      Pelas razões expostas no âmbito da primeira parte do primeiro fundamento, a Comissão podia presumir que, devido à detenção directa ou indirecta da totalidade do capital das suas filiais, a Eni exercia uma influência determinante no seu comportamento.

94      Incumbia, portanto, à Eni ilidir essa presunção demonstrando que as referidas filiais determinavam a sua política comercial de maneira autónoma, não constituindo assim, conjuntamente com ela, uma entidade económica única e, portanto, uma única empresa na acepção do artigo 81.° CE.

95      Mais particularmente, incumbia à Eni apresentar todos os elementos relativos aos vínculos organizacionais, económicos e jurídicos entre as suas filiais e ela própria que considerava susceptíveis de demonstrar que não constituíam uma entidade económica única. Na sua apreciação, o Tribunal deve efectivamente ter em conta o conjunto dos elementos submetidos, cujo carácter e importância podem variar de acordo com as características próprias de cada caso (acórdão do Tribunal Geral de 12 de Dezembro de 2007, Akzo Nobel e o./Comissão, T‑112/05, Colect., p. II‑5049, n.° 65).

96      Em primeiro lugar, através de alguns dos seus argumentos, a Eni sustenta, no essencial, que, dado o papel que lhe foi atribuído, nomeadamente nos seus estatutos, não pode ter exercido uma influência determinante sobre as operações comerciais das suas filiais. Em especial, refere que desempenha um papel de «mero coordenador técnico e financeiro» e que nunca foi «directamente activa no sector em questão». Ninguém exerceu simultaneamente funções de direcção nas filiais e na Eni. O conhecimento que a sociedade‑mãe tem dos comportamentos da sua filial no mercado é, também, um elemento relevante. No caso em apreço, os fluxos de informações utilizados pela Comissão não permitem subir até à Eni.

97      Ora, não é uma relação de instigação à infracção entre a sociedade‑mãe e a sua filial nem, por maioria de razão, uma implicação da primeira na referida infracção, mas o facto de constituírem uma única empresa na acepção acima mencionada que permite à Comissão endereçar a decisão que impõe coimas à sociedade‑mãe de um grupo de sociedades. Assim, a imputação do comportamento ilícito de uma filial à sua sociedade‑mãe não implica a prova de que a sociedade‑mãe influencia a política da sua filial no domínio específico que constitui o objecto da infracção (acórdão de 12 de Dezembro de 2007, Akzo Nobel e o./Comissão, n.° 95 supra, n.os 58 e 83). Em particular, o facto de a Eni desempenhar um papel de simples coordenador técnico e financeiro e fornecer, às suas filiais, a assistência financeira necessária, não basta para se excluir que exerce uma influência decisiva sobre o comportamento das referidas filiais, coordenando, nomeadamente, os investimentos financeiros do grupo. Com efeito, no contexto de um grupo de sociedades, uma sociedade que coordena, nomeadamente, os investimentos financeiros do grupo tem por vocação agrupar as participações nas diversas sociedades e por função assegurar a respectiva unidade de direcção, nomeadamente através desse controlo orçamental (v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 30 de Setembro de 2009, Arkema/Comissão, T‑168/05, não publicado na Colectânea, n.° 76).

98      Quanto à circunstância alegada de as actividades químicas terem uma importância relativa na política industrial do grupo, também essa circunstância não prova que a Eni deixou às suas filiais uma total autonomia para definirem o respectivo comportamento no mercado (v., neste sentido, acórdão Bolloré e o./Comissão, n.° 48 supra, n.° 144).

99      Em segundo lugar, por razões de exaustividade, a Comissão faz referência na decisão impugnada a elementos complementares que permitem considerar que a Eni exerceu uma influência determinante no comportamento das suas filiais. Em especial, a Comissão sublinha que os laços hierárquicos levam directamente ao PDG da EniChem SpA (actual Syndial) e ao da Polimeri. A Eni não contesta esta conclusão, mas esclarece que se trata da organização interna normal de uma sociedade comercial. Por outro lado, a Comissão indica, no considerando 379 da decisão impugnada, que os PDG da EniChem SpA (actual Syndial) e da Polimeri são responsáveis perante o respectivo conselho de administração. Ora, estes conselhos de administração eram directa ou indirectamente nomeados pela Eni, o que esta não contesta.

100    Em terceiro lugar, no que se refere aos considerandos 387, 388, 390 e 391 da decisão impugnada, há que observar, contrariamente ao que sustenta a Eni, que a Comissão não procedeu a uma análise superficial dos elementos aduzidos no procedimento administrativo. A Comissão respondeu precisamente aos argumentos apresentados pela Eni. De resto, a Eni não explica a razão pela qual a posição da Comissão a esse respeito era «manifestamente errada», como sustenta na sua petição.

101    Em quarto lugar, quanto ao facto de a decisão impugnada ser contrária à prática decisória da Comissão, os argumentos da Eni devem ser rejeitados pelas razões expostas no âmbito da primeira parte do primeiro fundamento e reproduzidas nos n.os 64 a 66 supra.

102    Em quinto lugar, quanto ao facto de a Eni não deter directamente – mas sim de forma indirecta – 100% do capital das empresas activas na produção de BR e de ESBR, há que considerar que esse elemento não é susceptível, por si só, de demonstrar que a Eni e as empresas em causa não constituem uma entidade económica única.

103    Em sexto lugar, quanto à alegada violação do princípio da boa administração, é de recordar que, entre as garantias conferidas pela ordem jurídica comunitária nos procedimentos administrativos, figura nomeadamente o referido princípio, a que está ligada a obrigação de a instituição competente examinar, com cuidado e imparcialidade, todos os elementos relevantes do caso (acórdãos do Tribunal Geral de 24 de Janeiro de 1992, la Cinq/Comissão, T‑44/90, Colect., p. II‑1, n.° 86, e de 20 de Março de 2002, ABB Asea Brown Boveri/Comissão, T‑31/99, Colect., p. II‑1881, n.° 99). Ora, tendo em conta nomeadamente os elementos referidos no n.° 100 supra, nada permite considerar que a Comissão não examinou, com cuidado e imparcialidade, os elementos do caso.

104    Resulta de todos estes elementos que os argumentos apresentados no âmbito da presente parte do primeiro fundamento não são susceptíveis de pôr em causa o facto de a Eni e as suas filiais poderem ser consideradas uma única entidade económica.

105    À luz destes elementos, a terceira parte do primeiro fundamento apresentado pela Eni deve ser julgada improcedente.

d)     Quanto à quarta parte, relativa à violação do princípio da responsabilidade limitada das sociedades de capitais e dos princípios comuns em matéria de responsabilidade

 Argumentos das partes

106    Segundo a Eni, a acção da Comissão é incompatível com os princípios geralmente admitidos em direito comunitário e no direito nacional das sociedades bem como com os respectivos critérios de imputação da responsabilidade, que confirmam, e têm mesmo por principal fundamento, a natureza absolutamente pessoal da referida responsabilidade. O princípio da responsabilidade limitada condiciona inevitavelmente os critérios de imputação da responsabilidade. O círculo dos responsáveis por uma infracção ou por um acto ilícito não pode ser estendido para além da filial que comete materialmente os factos, para abranger também, de forma derivada ou autónoma, a sua sociedade‑mãe, e isto com base numa presunção inilidível ligada à estrutura do capital do grupo.

107    A Comissão considerou, sem fundamentação específica, que esses princípios não são pertinentes no caso em apreço, em especial porque diziam respeito a outras matérias jurídicas. A Eni remete, a este respeito, para o considerando 396 da decisão impugnada. Ora, o interprete de uma disposição comunitária não poderá arbitrariamente ignorar o alcance e as implicações de um conceito comum às ordens jurídicas dos Estados‑Membros, sob o pretexto de esse princípio se inscrever formalmente num domínio jurídico diferente daquele a que deverá ser aplicado.

108    Quanto ao princípio da responsabilidade limitada de direito das sociedades, implica que os sócios só respondem pelas obrigações da empresa dentro dos limites da sua participação e que, consequentemente, a sociedade apenas responde, com o seu património, pelas obrigações da sociedade. Por outras palavras, os sócios – quer sejam pessoas singulares quer, como no caso dos grupos de sociedades, pessoas colectivas – não assumem qualquer responsabilidade em relação a terceiros. Este princípio foi recebido em direito comunitário. A Eni remete, a este propósito, para várias directivas relativas ao direito das sociedades.

109    Neste âmbito, em virtude do princípio da responsabilidade limitada, o mero controlo da sociedade holding, situada no topo do grupo, não acarreta necessariamente, nem sobretudo automaticamente, o desaparecimento da autonomia das diferentes empresas que possuem personalidade jurídica distinta. O abandono do princípio da responsabilidade limitada só é aceite quando se verifique um abuso da forma societária, isto é, face a um conjunto de indícios concordantes que demonstram a existência de um centro de interesses único, incluindo na acepção jurídica. Estes princípios são reconhecidos nos Estados Unidos, em França e no Reino Unido, países relativamente aos quais a Eni procede a uma análise da regulamentação aplicável em matéria de direito das sociedades. Quanto aos Estados Unidos, a Eni remete para dois pareceres elaborados por peritos. Segundo afirma, esses pareceres corroboram os argumentos analiticamente expostos no primeiro fundamento da petição. Esses pareceres não constituíam a explanação de um fundamento novo ou de um fundamento que apenas havia sido exposto de forma sumária.

110    Além destes princípios, que afirma fazerem parte do direito dos Estados‑Membros, a Eni invoca igualmente as regras aplicáveis, em direito da concorrência, em matéria de sucessão de empresas. A este respeito, cabe, em princípio, à pessoa singular ou colectiva que dirigia a empresa em causa no momento em que a infracção foi cometida responder por ela, mesmo que, na data da adopção da decisão que dá por provada a infracção, a exploração da empresa tenha sido colocada sob a responsabilidade de outra pessoa. A Eni remete, em particular, para os acórdãos do Tribunal de Justiça de 16 de Novembro de 2000, Cascades/Comissão (C‑279/98 P, Colect., p. I‑9693), SCA Holding/Comissão (C‑297/98 P, Colect., p. I‑10101), e do Tribunal Geral de 17 de Dezembro de 1991, EniChem Anic/Comissão (T‑6/89, Colect., p. II‑1623). Este critério de continuidade económica pode desempenhar um papel apenas e unicamente no caso de a pessoa colectiva responsável pela exploração da empresa ter deixado de existir juridicamente depois da prática da infracção (acórdão Comissão/Anic Partecipazioni, n.° 72 supra). Mesmo nesse caso, não é um mecanismo automático que assenta no único vínculo estrutural que conduziria a punir outro sujeito de direito que não o explorador inicial, mas necessidades específicas e fundamentadas, nomeadamente a de evitar que construções jurídicos permitam que se eludam as regras da concorrência. Por outras palavras, o critério da continuidade económica só seria aplicado a título excepcional. Com efeito, «fixar o objectivo na actividade e não na pessoa que a leva a cabo, independentemente de ainda existir e poder responder pelos seus actos, viola os princípios da culpa e da intransmissibilidade da sanção» (conclusões do advogado‑geral Ruiz‑Jarabo Colomer no processo Aalborg Portland e o./Comissão, n.° 72 supra). A Eni remete também para as conclusões da advogada‑geral J. Kokott no processo que deu origem ao acórdão ETI e o., n.° 52 supra.

111    Em conclusão, a Eni considera que fundar ou justificar a infracção ao artigo 81.° CE, que lhe é imputada no caso em apreço, com a simples detenção de uma participação de controlo, ao abrigo de uma presunção inilidível e incontestável, equivale, de modo injustificado, a criar uma fonte de responsabilidade objectiva, ou seja, sem culpa, e indirecta na medida em que se refere a factos cujo o autor material é outro sujeito. Tal situação corresponderia a uma violação dos direitos de defesa, ou por inversão do ónus da prova, ou pela própria limitação da possibilidade de produção de provas ilibante. Por outro lado, a decisão impugnada estaria, a este respeito, viciada por uma fundamentação deficiente, na medida em que a Comissão não indica as razões específicas que a levaram a adoptar essa abordagem.

112    A Comissão entende que a quarta parte do primeiro fundamento deve ser julgada improcedente. Observa, em especial, que os argumentos da Eni já foram refutados no considerando 396 da decisão impugnada.

 Apreciação do Tribunal

113    A quarta parte do primeiro fundamento apresentado pela Eni assenta na premissa de que a Comissão a considerou responsável pela infracção devido ao simples facto de possuir uma participação de controlo, e isto por força de uma presunção inilidível e incontestável, o que equivaleria, segundo a Eni, a criar uma fonte de responsabilidade objectiva, ou seja, sem culpa, e indirecta.

114    Ora, pelas razões expostas no quadro da segunda parte do presente fundamento, resulta da decisão impugnada que a Comissão, no presente caso, não estabeleceu uma presunção inilidível. A Eni podia, portanto, contestar a imputação da responsabilidade pela infracção de que foi objecto, o que, de resto, fez no procedimento administrativo e no âmbito da terceira parte do presente fundamento.

115    Daqui resulta que a quarta parte do primeiro fundamento apresentado pela Eni assenta numa premissa errada.

116    Além disso, pelas razões expostas nos n.os 60 a 62 supra, a Comissão pode imputar à sociedade‑mãe a responsabilidade por uma infracção cometida por uma filial, desde que a referida filial não determine de forma autónoma o seu comportamento no mercado. No caso em apreço, resulta das considerações expostas no âmbito das três primeiras partes do presente fundamento que a Comissão não cometeu nenhum erro de direito a esse respeito.

117    Por último, relativamente aos argumentos aduzidos pela Eni a propósito das regras aplicáveis, em direito da concorrência, em matéria de sucessão de empresas, não se pode deixar de observar que são inoperantes, uma vez que a responsabilidade da Eni, considerada provada pela Comissão no presente caso, não resulta de uma tal situação. Admitindo que, com os seus argumentos, a Eni contesta efectivamente a responsabilidade que lhe foi imputada pela infracção cometida pela EniChem SpA (actual Syndial), quando a Syndial não consta da decisão impugnada, há que os rejeitar. Com efeito, importa sublinhar que, contrariamente ao que sustenta a Eni no essencial, quando duas entidades constituem uma mesma entidade económica, o facto de a entidade que cometeu a infracção continuar a existir não impede, em si mesmo, que a sanção seja aplicada à entidade para a qual transferiu as suas actividades económicas (v., neste sentido, acórdão Aalborg Portland e o./Comissão, n.° 72 supra, n.os 355 a 358, e acórdão Jungbunzlauer/Comissão, n.° 46 supra, n.° 132). Em especial, uma tal aplicação da sanção é admissível quando essas entidades tenham estado sob o controlo da mesma pessoa e, tendo em conta os laços estreitos que as unem no plano económico e organizacional, aplicado no essencial as mesmas directivas comerciais (acórdão ETI e o., n.° 52 supra, n.° 49). No presente caso, verifica‑se que, quando dos seus comportamentos ilícitos, a EniChem SpA e a Polimeri eram integralmente detidas, directa ou indirectamente, pela mesma sociedade, a Eni. Nestas condições, o princípio da responsabilidade pessoal não se opõe a que a sanção pela infracção cometida pela EniChem SpA e prosseguida pela Polimeri seja globalmente aplicada a esta, como se foi decidido nos considerandos 369 a 373 da decisão impugnada (v., neste sentido, acórdão ETI e o., n.° 52 supra, n.° 51). Assim, tendo em conta o facto de que a Eni era a sociedade‑mãe da EniChem SpA e da Polimeri, nada se opunha a que o comportamento ilícito destas empresas, incluindo o resultante da transferência de actividades da EniChem SpA (actual Syndial), fosse imputado à Eni, apesar de a Syndial não figurar na decisão impugnada.

118    À luz destes elementos, a quarta parte do primeiro fundamento apresentado pela Eni deve ser julgada improcedente e, por conseguinte, todo o primeiro fundamento.

2.     Quanto ao segundo fundamento, invocado a título subsidiário, relativo à fixação ilegal do montante da coima

119    A título subsidiário, a Eni sustenta que a coima que lhe foi aplicada solidariamente com a Polimeri deve ser anulada ou, no mínimo, significativamente reduzida, uma vez que o seu valor foi fixado de forma ilegal.

120    O segundo fundamento da Eni divide‑se em três partes. No âmbito da primeira, contesta a aplicação de um coeficiente multiplicador para efeitos de dissuasão. No âmbito da segunda, considera que a Comissão cometeu um erro ao, no presente caso, tomar em consideração a circunstância agravante da reincidência. No quadro da terceira, alega que a Comissão, quando procedeu ao cálculo da coima, deveria ter tido em conta a exclusão da Syndial.

a)     Quanto à primeira parte, relativa à errada aplicação de um coeficiente multiplicador com finalidade dissuasiva

 Argumentos das partes

121    Em primeiro lugar, a Eni sublinha que, ao fixar o montante de partida da coima em função da gravidade da infracção, a Comissão apenas atendeu à natureza da infracção, abstraindo totalmente dos seus efeitos reais no mercado. A Eni remete, a este respeito, para o considerando 462 da decisão impugnada.

122    No entanto, as partes no procedimento administrativo forneceram elementos que permitem apreciar os efeitos da infracção. Em especial, a Syndial alega que as empresas participantes no presumido cartel apenas detinham uma parte limitada da totalidade do mercado da BR (30%) e da ESBR (40%);

123    Nestas condições, parece difícil sustentar que um eventual acordo entre as empresas em causa poderia ter tido uma influência significativa nos preços. A Comissão desprezou essas informações no quadro da segunda comunicação de acusações. Mesmo admitindo que as orientações autorizam a Comissão a abster‑se de avaliar os efeitos da infracção, não é menos verdade que as deveria ter tido em conta para apreciar a gravidade da infracção, como confirmam, de resto, a prática decisória da Comissão e a jurisprudência (acórdão Degussa/Comissão, n.° 72 supra).

124    Em segundo lugar, para ter em conta a capacidade dos autores da infracção para prejudicar efectivamente o bom funcionamento da concorrência e assegurar um «efeito suficientemente dissuasor» à coima, a Comissão baseou‑se nas vendas de BR e de ESBR das empresas implicadas (considerando 467 da decisão impugnada) e no volume de negócios global dos grupos a que essas empresas pertencem (considerando 474 da decisão impugnada).

125    O resultado para a Eni seria manifestamente contrária ao princípio da proporcionalidade. Com efeito, a decisão impugnada não tem de modo algum em consideração o elemento subjectivo, isto é, a consciência do carácter anticoncorrencial dos comportamentos controvertidos, ou ainda as dimensões e a importância do mercado em causa, cujo valor global no EEE era, em 2001, de 550 milhões de euros (considerando 467 da decisão impugnada).

126    Além disso, a importância do volume de negócios global do grupo Eni é subestimada, o que a jurisprudência do Tribunal proíbe. A Eni remete, a este respeito, para o acórdão do Tribunal Geral de 9 de Julho de 2003, Cheil Jedang/Comissão (T‑220/00, Colect., p. II‑2473). Embora admitindo o critério do volume de negócios do grupo para determinar o efeito dissuasivo, o Tribunal Geral precisou que, para evitar resultados mecânicos e totalmente desproporcionados, o «peso específico» da empresa no mercado afectado pela infracção devia imperativamente ser tomado em consideração. Ora, como já tinha ficado demonstrado no âmbito do primeiro fundamento, o que era confirmado pela decisão impugnada, as actividades do sector químico nunca fizeram parte da actividade principal da Eni. Assim, tomando em consideração o volume de negócios global do grupo e aplicando, por conseguinte, um coeficiente multiplicador dois ao montante da coima para efeitos de dissuasão, a Comissão aplicou à Eni uma coima excessiva e desproporcionada.

127    A Comissão entende que a primeira parte do segundo fundamento deve ser julgada improcedente. Considera, no essencial, que não cometeu qualquer erro na determinação da gravidade da infracção.

 Apreciação do Tribunal

128    A título liminar, importa assinalar que, não obstante o título da primeira parte do segundo fundamento, a Eni contesta, de facto, a determinação da gravidade da infracção, o que, de resto, veio a confirmar na audiência.

129    A gravidade das infracções deve ser determinada em função de um grande número de elementos, como as circunstâncias específicas do caso, o seu contexto e o carácter dissuasivo das coimas, e isto sem que exista uma lista vinculativa ou exaustiva de critérios que devam obrigatoriamente ser tomados em consideração (acórdãos do Tribunal de Justiça de 15 de Outubro de 2002, Limburgse Vinyl Maatschappij e o./Comissão, C‑238/99 P, C‑244/99 P, C‑245/99 P, C‑247/99 P, C‑250/99 P a C‑252/99 P e C‑254/99 P, Colect., p. I‑8375, n.° 465, e Dansk Rørindustri e o./Comissão, n.° 43 supra, n.° 241).

130    Entre os elementos susceptíveis de entrar na apreciação da gravidade das infracções figuram o comportamento de cada uma das empresas, o papel desempenhado por cada uma na instituição do acordo, o benefício que puderam retirar deste, a sua dimensão e o valor das mercadorias em causa, bem como o risco que infracções deste tipo representam para os objectivos da Comunidade (v. acórdão do Tribunal de Justiça de 25 de Janeiro de 2007, Dalmine/Comissão, C‑407/04 P, Colect., p. I‑829, n.° 130 e jurisprudência aí indicada).

131    Por outro lado, as orientações enunciam, designadamente, que a avaliação do grau de gravidade da infracção deve ter em consideração o carácter da própria infracção, o seu impacto concreto no mercado quando este for quantificável e a dimensão do mercado geográfico de referência. As infracções serão assim classificadas em três categorias que corresponderão às infracções pouco graves, às infracções graves e às infracções muito graves (ponto 1 A, primeiro e segundo parágrafos, das orientações).

132    Além disso, as orientações prevêem que, além do carácter da própria infracção, do seu impacto concreto no mercado e da dimensão geográfica deste, é necessário tomar em consideração a capacidade económica efectiva dos autores da infracção de causarem um prejuízo importante aos outros operadores, nomeadamente aos consumidores, e determinar o montante da coima num nível que lhe assegure um carácter suficientemente dissuasivo (ponto 1 A, quarto parágrafo, das orientações).

133    O poder da Comissão de aplicar coimas às empresas que, deliberadamente ou por negligência, cometem uma infracção às disposições do artigo 81.° CE constitui um dos meios que lhe foram atribuídos com vista a permitir‑lhe cumprir a missão de vigilância que lhe atribui o direito comunitário, missão que compreende o dever de prosseguir uma política geral destinada a aplicar em matéria de concorrência os princípios fixados pelo Tratado e a orientar o comportamento das empresas nesse sentido. Daqui resulta que, para apreciar a gravidade de uma infracção com vista a determinar o montante da coima, a Comissão deve atender ao carácter dissuasivo da sua acção, sobretudo para os tipos de infracções particularmente prejudiciais para a realização dos objectivos da Comunidade (acórdão do Tribunal de Justiça de 7 de Junho de 1983, Musique diffusion française e o./Comissão, 100/80 a 103/80, Recueil, p. 1825, n.os 105 e 106; acórdãos do Tribunal Geral ABB Asea Brown Boveri/Comissão, n.° 103 supra, n.° 166, e de 25 de Outubro de 2005, Groupe Danone/Comissão, T‑38/02, Colect., p. II‑4407, n.° 169).

134    Isto exige que o montante da coima seja modulado de forma a levar em conta o impacto pretendido na empresa à qual é aplicada, e isto para que a coima não se torne irrisória ou excessiva, face, nomeadamente, à capacidade financeira da empresa em questão, de acordo com as exigências relativas, por um lado, à necessidade de garantir a eficácia da coima e, por outro, ao respeito do princípio da proporcionalidade. Uma empresa de grande dimensão, que disponha de recursos financeiros consideráveis comparativamente com os outros Membros de um cartel, pode mobilizar mais facilmente os fundos necessários ao pagamento da sua coima, o que justifica, na perspectiva de um efeito dissuasivo suficiente desta última, a aplicação, nomeadamente através de um multiplicador, de uma coima proporcionalmente mais elevada do que a que seria aplicada à mesma infracção cometida por uma empresa que não dispõe de tais recursos (v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 29 de Abril de 2004, Tokai Carbon e o./Comissão, T‑236/01, T‑239/01, T‑244/01 a T‑246/01, T‑251/01 e T‑252/01, Colect., p. II‑1181, n.os 241 e 243; v., igualmente, acórdãos do Tribunal Geral ABB Asea Brown Boveri/Comissão, n.° 103 supra, n.° 170, e de 15 de Março de 2006, BASF/Comissão, T‑15/02, Colect., p. II‑497, n.° 235).

135    Há que acrescentar que o Tribunal de Justiça salientou, em especial, a relevância da tomada em conta do volume de negócios global de cada empresa membro de um cartel para fixar o montante da coima (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de Justiça de 16 de Novembro de 2000, Sarrió/Comissão, C‑291/98 P, Colect., p. I‑9991, n.os 85 e 86, e de 14 de Julho de 2005, Acerinox/Comissão, C‑57/02 P, Colect., p. I‑6689, n.os 74 e 75; v., igualmente, acórdão do Tribunal de Justiça de 29 de Junho de 2006, Showa Denko/Comissão, C‑289/04 P, Colect., p. I‑5859, n.° 17).

136    Por último, há que sublinhar que o objectivo de dissuasão que a Comissão pode prosseguir na fixação do montante de uma coima tem em vista assegurar que as empresas respeitem as regras de concorrência previstas no Tratado para a condução das suas actividades na Comunidade ou no EEE. Conclui‑se, assim, que o factor de dissuasão que pode ser incluído no cálculo da coima é determinado tomando em conta um conjunto de elementos e não unicamente a situação específica da empresa em questão. Este princípio aplica‑se, nomeadamente, quando a Comissão tenha determinado um «multiplicador de dissuasão» que afecta a coima aplicada a uma empresa (v., neste sentido, acórdão Showa Denko/Comissão, n.° 135 supra, n.os 23 e 24).

137    No caso em apreço, a Comissão, na decisão impugnada, considerou, primeiro, que as empresas em causa tinham celebrado acordos sobre objectivos de preços e partilha do mercado e tinham trocado entre si dados comerciais sensíveis. Para a Comissão, estas práticas são, pela sua própria natureza, infracções muito graves (considerando 461 e artigo 1.° do dispositivo da decisão impugnada). Em seguida, indicou não ser possível medir o impacto concreto do cartel no mercado do EEE. Acrescentou igualmente que, embora não fosse possível medir o impacto concreto do cartel, os acordos em causa tinham sido postos em prática pelas referidas empresas e tinham tido, por isso, efeitos no mercado. A Comissão terminou precisando que não teria em conta o impacto no mercado, para efeitos da determinação do montante das coimas (considerando 462 da decisão impugnada). Finalmente, salientou que a infracção abrangia todo o território do EEE (considerando 463 da decisão impugnada). Por estas razões, considerou que a infracção em causa poderia ser qualificada de muito grave (considerando 464 da decisão impugnada).

138    Isto posto, a Comissão procedeu a um tratamento diferenciado das empresas em causa fundado nos respectivos volumes de negócios acumulados com a BR e a ESBR relativos a 2001, último ano completo da infracção, salvo para a Shell (1998) e para a Stomil (1999). A Comissão classificou as empresas em causa em cinco categorias, situando‑se a EniChem na primeira (55 milhões de euros de montante de partida da coima) (considerando 465 a 473 da decisão impugnada).

139    Acresce que a Comissão indicou que, no interior da categoria das infracções muito graves, a escala das sanções permitia fixar o montante das coimas num nível que lhes assegurava um carácter suficientemente dissuasivo, tendo em conta a dimensão de cada empresa. Baseando‑se nos volumes de negócios mundiais das empresas em causa, realizados em 2005, a Comissão salientou que havia uma grande diferença de dimensão entre a Kaučuk (2,718 mil milhões de euros de volume de negócios) e a Stomil (38 milhões de euros de volume de negócios), por um lado, e as outras empresas em causa, por outro, em particular a Bayer (27,383 mil milhões de euros de volume de negócios), ou seja, a primeira das empresas de grandes dimensões visadas pela decisão impugnada. Com base nisto e tendo em conta as circunstâncias do caso, a Comissão considerou que nenhum coeficiente multiplicador com finalidade dissuasiva devia ser aplicado à Kaučuk e à Stomil e que, no tocante à Bayer, era adequado um coeficiente multiplicador de 1,5. Finalmente, sempre com base nisto e tendo em conta as circunstâncias do caso em apreço, a Comissão aplicou coeficientes multiplicadores de 1,75 à Dow (37,221 mil milhões de euros de volume de negócios), de 2 à EniChem (73,738 mil milhões de euros de volume de negócios) e de 3 à Shell (246,549 mil milhões de euros de volume de negócios) (considerando 474 da decisão impugnada).

140    Em primeiro lugar, há que observar que, no âmbito do seu recurso, a Eni não põe em causa o objecto ilícito do acordo, tal como figura na decisão impugnada, em especial no artigo 1.° do dispositivo. A este respeito, resulta da descrição das infracções muito graves constante das orientações que os acordos ou práticas concertadas que visem nomeadamente, como neste caso, a fixação de objectivos de preços ou a repartição de quotas de mercado podem obter, apenas com base na sua própria natureza, à qualificação de «muito graves», sem que a Comissão seja obrigada a demonstrar um impacto concreto da infracção no mercado (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 3 de Setembro de 2009, Prym e Prym Consumer/Comissão, C‑534/07 P, Colect., p. I‑7415, n.° 75; v., igualmente, acórdãos do Tribunal Geral de 27 de Julho de 2005, Brasserie nationale e o./Comissão, T‑49/02 a T‑51/02, Colect., p. II‑3033, n.° 178, e de 18 de Junho de 2008, Hoechst/Comissão, T‑410/03, Colect., p. II‑881, n.° 345). Do mesmo modo, segundo jurisprudência constante, os acordos horizontais em matéria de preços fazem parte das infracções mais graves ao direito comunitário da concorrência e podem, pois, por si sós, ser classificados de muito graves (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal Geral de 12 de Julho de 2001, Tate & Lyle e o./Comissão, T‑202/98, T‑204/98 e T‑207/98, Colect., p. II‑2035, n.° 103, e Groupe Danone/Comissão, n.° 133 supra, n.° 147).

141    Assim, a Comissão não cometeu qualquer erro ao considerar que as práticas em causa eram, devido à sua própria natureza, infracções muito graves.

142    Em segundo lugar, quanto ao acórdão Degussa/Comissão, n.° 72 supra, invocado pela Eni, basta observar que, no processo que esteve na origem desse acórdão, a Comissão tinha avaliado o impacto concreto do cartel, o que não fez no presente caso. A Eni não pode, portanto, encontrar apoio no acórdão Degussa/Comissão, n.° 72 supra, para contestar a legalidade da decisão impugnada a este respeito.

143    Em terceiro lugar, no que toca à referência feita pela Eni, nos seus articulados, à dimensão do mercado em causa no território do EEE no ano de 2001 (a saber, 550 milhões de euros), ou à quota de mercado das empresas em causa, há que considerar que, embora esses elementos possam ser tomado em consideração para determinar a gravidade da infracção, há que ter em conta os outros elementos relevantes do caso (v., neste sentido, acórdão Dalmine/Comissão, n.° 130 supra, n.° 132, e acórdão do Tribunal Geral de 27 de Setembro de 2006, Archer Daniels Midland/Comissão, T‑329/01, Colect., p. II‑3255, n.° 102). No caso em apreço, importa ter em conta o facto de que a infracção em causa é intrinsecamente muito grave e cobre todo o território do EEE. Em particular, há que sublinhar que as empresas em causa acordaram fixar objectivos de preços, partilhar clientes mediante acordos de não agressão e trocar informações sensíveis sobre preços, concorrentes e clientes. Além disso, recorde‑se que, com base no ponto 1 A das orientações, o montante da coima previsto para as infracções muito graves é superior a 20 milhões de euros. Em seguida, sublinhe‑se que as vendas da EniChem com os produtos em questão, em 2001, foram de montante superior a 164 milhões de euros (considerando 468 da decisão impugnada). Por fim, a Eni não contesta que o montante da sua coima não excede o limite de 10% do seu volume total de negócios realizado no exercício social precedente, previsto pelo artigo 23.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1/2003, sendo que esse limite se destina a evitar que a empresa em causa seja colocada na impossibilidade de pagar a coima em questão (v., neste sentido, acórdão Musique diffusion française e o./Comissão, n.° 133 supra, n.° 119). Tendo em conta estas circunstâncias, a fixação do montante de partida da coima em 55 milhões de euros, antes da aplicação de um coeficiente multiplicador com finalidade dissuasiva, não é desproporcionada.

144    Em quarto lugar, relativamente à circunstância alegada de que as empresas em causa só detinham uma parte limitada da totalidade do mercado da BR e da ESBR, a Eni precisou, na audiência, que a sua avaliação se baseava num mercado que incluía tanto esses dois produtos como a borracha natural, sendo que este produto não se inclui entre os abrangidos pela decisão impugnada. Nestas condições, os argumentos da Eni a este propósito são inoperantes.

145    Em quinto lugar, no que respeita à inexistência da «consciência do carácter anticoncorrencial», resulta da decisão impugnada e da gravidade da infracção que a EniChem SpA tinha necessariamente consciência do carácter anticoncorrencial do seu comportamento. Por outro lado, pelas razões expostas no âmbito do primeiro fundamento, foi correctamente que a Comissão imputou a responsabilidade pela infracção em causa à Eni. Assim, os argumentos que aduz não podem ser acolhidos.

146    Em sexto lugar, no que se refere à aplicação de um coeficiente multiplicador com finalidade dissuasiva, importa sublinhar que a relação entre, por um lado, a dimensão e os recursos globais das empresas e, por outro, a necessidade de assegurar um efeito dissuasivo à coima não pode ser contestado. Importa, com efeito, recordar que uma empresa de grande dimensão, que disponha de recursos financeiros consideráveis comparativamente aos dos outros Membros de um cartel, pode mobilizar mais facilmente os fundos necessários ao pagamento da sua coima (acórdão BASF/Comissão, n.° 134 supra, n.° 235).

147    Esta questão é diferente da da classificação das empresas, no interior da categoria das infracções muito graves, classificação que pode implicar que se atenda ao peso específico das empresas no mercado em causa (v., neste sentido, acórdão Cheil Jedang/Comissão, n.° 126 supra, n.os 88 e 89). Por conseguinte, nada permite considerar que a Comissão cometeu um erro ao decidir ter em conta a dimensão e os recursos globais das empresas no âmbito da aplicação de um coeficiente multiplicador com finalidade dissuasiva.

148    De resto, cabe referir que, no caso vertente, a Comissão teve igualmente em conta o peso específico das empresas em causa no mercado em questão quando utilizou o montante das vendas das empresas com a BR e a ESBR no último ano da infracção para ponderar o montante da coima dentro da categoria das infracções muito graves.

149    À luz destes elementos, a primeira parte do segundo fundamento apresentado pela Eni deve ser julgada improcedente.

b)     Quanto à segunda parte, relativa ao agravamento injustificado do montante de base da coima devido a reincidência

 Argumentos das partes

–       Argumentos da Eni

150    Remetendo para os considerandos 487 e 488 da decisão impugnada, a Eni reconhece que os comportamentos colusórios punidos pela Decisão 86/398/CEE da Comissão, de 23 de Abril de 1986, relativa a um processo de aplicação do artigo [81.° CE] (IV/31.149 – Polipropileno) (JO L 230, p. 1, a seguir «decisão Polipropileno») e pela Decisão 94/599/CE da Comissão, de 27 de Julho de 1994, relativa a um processo de aplicação do artigo [81.° CE] (IV/31.865 – PVC) (JO L 239, p. 14, a seguir «decisão PVC II»), evocados pela Comissão para justificar a reincidência, podem ser considerados semelhantes aos invocados na decisão impugnada.

151    Todavia, o requisito subjectivo da reincidência – isto é, o facto de as infracções em causa terem sido cometidas pela mesma empresa – não está preenchida.

152    A este respeito, em primeiro lugar, a Eni salienta que as actividades em causa diziam respeito a produtos e mercados diferentes dos que são objecto da decisão impugnada e já tinham sido cedidas há algum tempo quando da adopção das decisões Polipropileno e PVC II.

153    Em segundo lugar, as pessoas colectivas punidas pelas decisões Polipropileno e PVC II não são a Eni. A empresa do grupo em causa a quem se aplicam as referidas decisões era EniChem SpA, que se passou a designar Syndial, ou a Anic SpA. Ora, essas empresas não são destinatárias da decisão impugnada. A Eni não esteva implicada em nenhuma das decisões referidas pela Comissão, nem enquanto participante activa nos cartéis punidos nem devido ao controlo das duas sociedades do grupo.

154    Em terceiro lugar, a conclusão da Comissão é incompatível com o princípio de responsabilidade limitada e da sua natureza pessoal, na medida em que imputa uma circunstância agravante à sociedade‑mãe e a referida sociedade não foi considerada responsável nas decisões anteriores. Este incumprimento é ainda mais grave por se inscrever no exercício de poderes punitivos que estão limitados pelo princípio da legalidade, cujo respeito deve garantir às empresas que as sanções que a Comissão lhes pode aplicar, ao abrigo do artigo 81.° CE, são inteiramente previsíveis. De resto, as expressões vagas e não definidas como «infracções semelhantes» e «pela mesma empresa», utilizadas pela Comissão, revelam uma falta de fundamentação da decisão impugnada a esse propósito.

155    Em quarto lugar, a Eni contesta o poder da Comissão de aplicar a circunstância agravante da reincidência, independentemente do tempo decorrido entre as infracções. Remete, a este respeito, para o acórdão do Tribunal de Justiça de 8 de Fevereiro de 2007, Groupe Danone/Comissão, C‑3/06 P, Colect., p. I‑1331), e para as conclusões do advogado‑geral M. Poiares Maduro apresentadas no mesmo processo (Colect., p. I‑567). Acrescenta que, diferentemente do referido acórdão, no qual o Tribunal de Justiça salientou que a Comissão tinha devidamente tido em conta os elementos pertinentes, essa análise não existiu no presente caso e não foi adequadamente justificada.

–       Argumentos da Comissão

156    A título liminar, a Comissão salienta que a questão da reincidência foi suscitada na segunda comunicação de acusações, sem que a Eni formulasse objecções, quer na sua resposta quer durante a audição.

157    Quanto ao mérito, em primeiro lugar, a Comissão indica que, uma vez que o direito comunitário da concorrência reconhece que sociedades diferentes pertencentes a um mesmo grupo constituem uma entidade económica, teria podido, se o quisesse, aplicar a coima à mesma sociedade‑mãe nas decisões precedentes. Por conseguinte, a Comissão considera que pôde considerar acertadamente, na decisão impugnada, que a mesma empresa já tinha sido punida pelo mesmo tipo de infracção (acórdão do Tribunal Geral de 30 de Setembro de 2003, Michelin/Comissão, T‑203/01, Colect., p. II‑4071). Sublinha que, no referido acórdão, o Tribunal aprovou a aplicação de um agravamento da coima por reincidência outra sociedade do grupo, mais precisamente a uma «sociedade‑irmã» da que tinha sido anteriormente punida. Além disso, o conceito de reincidência, atento o objectivo que prossegue, não implica necessariamente a existência de uma sanção pecuniária prévia, mas apenas a de uma infracção anterior (acórdão de 25 de Outubro de 2005, Groupe Danone/Comissão, n.° 133 supra). Assim, seria indiferente que a Comissão não tivesse aplicado uma coima à Eni enquanto tal nos processos que originaram as decisões PVC II e Polipropileno. O facto de as sociedades destinatárias das decisões precedentes terem sido inteiramente controladas pela Eni era, em contrapartida, decisivo. Por outro lado, não se pode admitir que as sociedades do grupo, elementos da mesma empresa, escapem à reincidência unicamente devido à estrutura organizacional do próprio grupo.

158    Em segundo lugar, é indiferente que as infracções anteriores respeitassem a sectores distintos e que estes tenham sido entretanto cedidos a outras pessoas colectivas. O agravamento da coima por reincidência baseia‑se no facto de a anterior constatação de uma infracção não ter sido suficiente para impedir um novo comportamento ilícito da empresa. Por outro lado, a jurisprudência também precisou que, em princípio, cabe à pessoa singular ou colectiva que dirigia a empresa em causa no momento em que a infracção foi cometida responder por ela, mesmo que, na data da decisão que dá por provada a infracção, a exploração da empresa tenha sido colocada sob a responsabilidade de outra pessoa (acórdão Cascades/Comissão, n.° 110 supra). Estes critérios devem ser aplicados em matéria de reincidência.

159    Em terceiro lugar, o Tribunal de Justiça, no acórdão de 8 de Fevereiro de 2007, Groupe Danone/Comissão, n.° 155 supra, reafirmou que, em conformidade com o disposto no artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17, uma eventual reincidência figura entre os elementos a tomar em consideração quando da análise da gravidade da infracção e que, nesse contexto, a recorrente podia sempre prever as consequências jurídicas dos seus actos. O mesmo se pode dizer do artigo 23.°, n.° 3, do Regulamento n.° 1/2003, que constitui o fundamento jurídico da decisão impugnada. A aplicação de um agravamento por reincidência não prejudica, portanto, o princípio da legalidade.

160    Em quarto lugar, não ficou provado que a constatação e a apreciação das características específicas da reincidência fazem parte do poder da Comissão e que esta não está vinculada por um eventual prazo de prescrição para proceder a essa verificação (acórdão de 8 de Fevereiro de 2007, Groupe Danone/Comissão, n.° 155 supra). Em qualquer caso, as infracções relativas ao Polipropileno e ao PVC teriam sido reconhecidas em decisões adoptadas respectivamente em 1986 e em 1994. Era perfeitamente lógico, normal e adaptado ter em conta esses precedentes numa nova infracção cometida a partir de 1996. O prazo decorrido entre as duas infracções não é relevante em si (acórdão do Tribunal Geral de 11 de Março de 1999, Thyssen Stahl/Comissão, T‑141/94, Colect., p. II‑347). Quanto ao lapso de tempo que separa as decisões anteriores do início da nova infracção, é igual ou mesmo inferior aos já tomados em consideração pelo Tribunal de Justiça e pelo Tribunal Geral nos processos que deram lugar aos acórdãos Michelin/Comissão, n.° 157 supra, e de 8 de Fevereiro de 2007, Groupe Danone/Comissão, n.° 155 supra. A Comissão acrescenta que, nos termos deste último acórdão, «poderá» considerar o tempo decorrido desde a infracção anterior como constituindo um dos indícios que confirmam uma propensão para não respeitar as regras de concorrência. No caso vertente, a Comissão tinha precisamente examinado essa questão no considerando 488 da decisão impugnada e concluiu que a reincidência devia ser tomada em consideração.

 Apreciação do Tribunal

161    O ponto 2 das orientações refere, como exemplo de circunstâncias agravantes, a «reincidência da ou das mesmas empresas relativamente a uma infracção do mesmo tipo».

162    O conceito de reincidência, como é entendido num certo número de ordens jurídicas nacionais, implica que uma pessoa tenha cometido novas infracções após ter sido punida por infracções semelhantes (acórdãos Thyssen Stahl/Comissão, n.° 160 supra, n.° 617, e Michelin/Comissão, n.° 157 supra, n.° 284).

163    Uma eventual reincidência figura entre os elementos a considerar na análise da gravidade da infracção (acórdãos Aalborg Portland e o./Comissão, n.° 72 supra, n.° 91, e de 8 de Fevereiro de 2007, Groupe Danone/Comissão, n.° 155 supra, n.° 26).

164    No caso em apreço, a Comissão referiu, na decisão impugnada, que a EniChem já tinha sido destinatária de decisões da Comissão sobre cartéis (a saber, as decisões Polipropileno e PVC II). Isto demonstra que as primeiras coimas não foram suficientes para esta empresa alterar o seu comportamento. A Comissão retira destes elementos que esta reincidência constitui uma circunstância agravante que justifica que o montante de base da coima sofra um aumento de 50% (considerando 487 da decisão impugnada).

165    A Eni alega, em particular, o facto de não ser visada nas decisões anteriores que a Comissão refere na decisão impugnada.

166    Da decisão impugnada resulta que a Comissão atendeu, no caso em apreço, ao conceito de «empresa», na acepção do artigo 81.° CE, para efeitos da aplicação da circunstância agravante que é a reincidência, o que a Comissão confirma nos seus articulados. Mais precisamente, a Comissão considerou, no essencial, que a mesma empresa tinha repetido um comportamento ilícito, embora as pessoas colectivas implicadas nas infracções em questão não fossem idênticas. Importa recordar, a este respeito, que o conceito de empresa, na acepção do artigo 81.° CE, deve ser entendido como designando uma unidade económica, mesmo que, do ponto de vista jurídico, essa unidade económica seja constituída por várias pessoas singulares ou colectivas (v. a jurisprudência referida no n.° 60 supra). Neste contexto, há que considerar que, quando a Comissão invoca o conceito de «empresa», na acepção do artigo 81.° CE, deve apresentar elementos circunstanciados e precisos que apoiem a sua asserção.

167    Ora, há que referir, em primeiro lugar, que a Comissão faz referência, no considerando 487 da decisão impugnada, à «EniChem», de uma maneira geral, encontrando‑se esse termo definido, no considerando 36 da decisão impugnada, no sentido de abranger «qualquer sociedade detida pela EniChem SpA». Há, assim, que reconhecer que o termo utilizado pela Comissão na decisão impugnada, no quadro da apreciação da reincidência, é relativamente impreciso, pelo menos no que respeita às pessoas colectivas que compõem a entidade económica visada nas decisões Polipropileno e PVC II. Além disso, admitindo que as pessoas colectivas em causa sejam as mencionadas nos considerandos 26 a 35 da decisão impugnada, há que sublinhar que a sociedade visada na decisão Polipropileno, ou seja, a Anic, não faz parte das pessoas colectivas mencionadas nos referidos considerandos. Por outro lado, os considerandos 26 a 35 da decisão impugnada visam essencialmente descrever a evolução das sociedades detidas pela Eni durante a infracção, a qual é posterior às decisões Polipropileno e PVC II. Estes considerandos não são, portanto, de molde a dar uma informação suficientemente circunstanciada e precisa da evolução das sociedades detidas pela Eni antes da infracção que a decisão impugnada pune.

168    Em segundo lugar, a Comissão remete, na nota n.° 262 da decisão impugnada, para as decisões Polipropileno e PVC II, indicando que a «Eni» estava implicada nessas decisões. Há que salientar, antes de mais, que o termo «Eni» não é objecto, na decisão impugnada, de uma convenção redactorial, diferentemente do que acontece com o termo «EniChem». Em particular, ressalta dos considerandos 26 a 36 da decisão impugnada que, quando a Comissão pretende referir‑se à sociedade Eni, enquanto sociedade‑mãe das outras sociedades, emprega o termo «Eni SpA».

169    Em terceiro lugar, admitindo que, ao utilizar o termo «Eni» na nota n.° 262 da decisão impugnada, a Comissão pretende referir‑se às sociedades que fazem parte da «empresa», na acepção do artigo 81.° CE, constituída pelas pessoas colectivas controladas pela Eni, há que salientar que a Comissão não fornece qualquer elemento circunstanciado e preciso a este respeito no quadro da decisão impugnada. A Comissão limita‑se a afirmar, nos articulados que apresentou ao Tribunal, que a Eni controlou «inteiramente» as sociedades visadas nas decisões Polipropileno e PVC II. Ora, para além de esta afirmação não ser corroborada por qualquer elemento de prova, também não foi reproduzida na decisão impugnada.

170    Em quarto lugar, há que referir que, no caso em apreço, a evolução da estrutura e do controlo das sociedades em causa é particularmente complexa. Mais exactamente, a decisão Polipropileno tinha por destinatário a Anic, sem que o nome da Eni apareça na referida decisão. Quanto à decisão PVC II, a Comissão menciona aí, no considerando 8, o facto de a Anic se ter «transformado» na EniChem SpA e, no considerando 43, o facto de esta evolução se dever a «várias reestruturações», sem mais especificações. Além disso, mais uma vez, o nome da Eni não aparece nesta decisão. Há que acrescentar que, no presente caso, a actividade da Eni com os produtos em questão era inicialmente assegurada pela EniChem Elastomeri (antes de esta sociedade se fundir na EniChem SpA em 1997, isto é, depois da adopção da decisão PVC II) e que as actividades da EniChem SpA foram a seguir transferidas para a Polimeri, o que torna mais complexa a evolução estrutural das empresas em causa. Neste contexto, a Comissão devia ser particularmente precisa e fornecer todos os elementos circunstanciados necessários para se poder considerar que as sociedades objecto da decisão impugnada e as sociedades objecto das decisões Polipropileno e PVC II formavam uma única «empresa» na acepção do artigo 81.° CE.

171    Tendo em conta todos estes elementos, o Tribunal considera que a Comissão, na decisão impugnada, não apresentou elementos suficientemente circunstanciados e precisos que permitam concluir que uma mesma «empresa», na acepção do artigo 81.° CE, reiterou um comportamento ilícito. Nestas condições, há que acolher a segunda parte do segundo fundamento e, em consequência, anular o artigo 2.°, alínea c), da decisão impugnada, que fixa o montante da coima aplicada à Eni em 272,25 milhões de euros.

c)     Quanto à terceira parte, relativa a um erro no cálculo da coima decorrente da exclusão da Syndial

 Argumentos das partes

172    A Eni recorda que a Comissão, após num primeiro momento ter incluído a Syndial entre os responsáveis pela infracção, enviando‑lhe tanto a primeira como a segunda comunicação de acusações, acabou, no entanto, por decidir excluí‑la dos destinatários da decisão impugnada. A Comissão justificou esta opção com facto de existir «um sério risco de no momento em que uma decisão que lhe aplica uma coima vier a ser proferida e executada no presente processo a Syndial já não possuir activos suficientes para a poder pagar» (considerando 372 da decisão impugnada).

173    Ora, o critério utilizado pela Comissão para excluir a Syndial não respeita os princípios atinentes às sucessões e às transferências de empresas.

174    Remetendo para os argumentos expostos no quadro do primeiro fundamento, a Eni alega que, se, após uma conversão da sociedade, a empresa considerada responsável continuar a existir, continuará a ser responsável pela eventual infracção que lhe é imputada. A única excepção a esse princípio é o desaparecimento da pessoa colectiva, o que de modo nenhum teria ocorrido no presente caso, pois – como igualmente sublinhado na decisão impugnada – a Syndial continua a existir e não está em liquidação. A Eni acrescenta que, ao imputar à Polimeri a responsabilidade pelos alegados comportamentos anticoncorrenciais de outras sociedades do grupo antes de a Polimeri voltar ao sector químico, a Comissão desprezou o facto de, até ao final de 2001, esta sociedade ter sido uma empresa comum colocada sob o controlo conjunto da Eni e da Union Carbide.

175    A exclusão injustificada da Syndial teve consequências ao nível da coima. A Eni salienta, a este respeito, que o volume de negócios global da Syndial, no ano anterior à tomada da decisão impugnada, era de 860 milhões de euros e que, em caso de responsabilidade solidária, o montante total da coima não pode exceder 10% do volume de negócios da «empresa mais pequena». Remete, quanto a este último ponto, para uma obra da doutrina. Enquanto a Syndial era tida em consideração para efeitos da aplicação da circunstância agravante da reincidência, era indevidamente afastada para efeitos da aplicação da limitação do montante da coima ao limite de 10% previsto na regulamentação. Daqui resulta que o montante total da coima aplicada à Eni viola o artigo 23.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1/2003 e parece ser o fruto de um manifesto desvio de poder.

176    A Comissão entende que a terceira parte do segundo fundamento deve ser julgada improcedente. Sustenta, em particular, que a exclusão da Syndial não tem afecta o montante da coima imposta à Eni.

 Apreciação do Tribunal

177    A circunstância segundo a qual várias sociedades são solidariamente obrigadas ao pagamento de uma coima pelo facto de constituírem uma empresa na acepção do artigo 81.° CE não implica, no que diz respeito à aplicação do limite máximo previsto no artigo 23.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1/2003, que a obrigação de cada uma delas se limite a 10% do volume de negócios que realizou durante o último exercício. Com efeito, o limite máximo de 10%, na acepção dessa disposição, deve ser calculado com base no volume de negócios cumulado de todas as sociedades que constituem a entidade económica única que age como empresa na acepção do artigo 81.° CE, uma vez que só o volume de negócios cumulado das sociedades que a compõem pode constituir uma indicação da dimensão e do poder económico da empresa em questão (acórdãos do Tribunal Geral de 20 de Março de 2002, HFB e o./Comissão. T‑9/99, Colect., p. II‑1487, n.os 528 e 529, e de 12 de Dezembro de 2007, Akzo Nobel e o./Comissão, n.° 95 supra, n.° 90).

178    Por conseguinte, mesmo que se admita que a Syndial era destinatária da decisão impugnada, o montante da coima pelo qual a Eni devia ser considerada solidariamente responsável não devia estar limitado a 10% do volume de negócios da Syndial. Daqui resulta que os argumentos da Eni são inoperantes.

179    Além disso, admitindo que, com os seus argumentos, a Eni contesta efectivamente a responsabilidade que lhe foi imputada em relação à infracção cometida pela EniChem SpA (actual Syndial), apesar de a Syndial não constar da decisão impugnada, esses argumentos devem ser rejeitados pelas mesmas razões que já foram indicadas no n.° 117 supra. O facto de, até ao final de 2001, a Polimeri ter sido uma empresa comum colocada sob o controlo conjunto da Eni e da Union Carbide não é susceptível de modificar essa conclusão, uma vez que é pacífico que a transferência de actividades entre a EniChem SpA (actual Syndial) e a Polimeri ocorreu em 1 de Janeiro de 2002.

180    À luz destes elementos, a terceira parte do segundo fundamento apresentado pela Eni deve ser julgada improcedente.

181    Resulta do conjunto de todos estes elementos que a segunda parte do segundo fundamento deve ser julgada procedente e, em consequência, anulado o artigo 2.°, alínea c), da decisão impugnada, que fixa o montante da coima aplicada à Eni em 272,25 milhões de euros, e julgado improcedente o resto do pedido de anulação parcial da decisão impugnada.

B –  Quanto ao pedido de revisão do montante da coima

182    Importa, desde logo, pelos fundamentos expostos nos n.os 166 a 171 supra, que o Tribunal, no exercício do seu poder de plena jurisdição, nos termos do artigo 31.° do Regulamento n.° 1/2003, reforme o artigo 2.°, alínea c), da decisão impugnada, na medida em que a Comissão, para chegar ao montante de 272,25 milhões de euros, aplicou erradamente à Eni a circunstância agravante da reincidência.

183    Nas circunstâncias do caso em apreço, a fim de determinar adequadamente o montante da coima, há que manter inalterado, quanto ao resto, o método de cálculo utilizado pela Comissão.

184    O montante final da coima imposta à Eni é, pois, fixado em 181,5 milhões de euros.

 Quanto às despesas

185    Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Nos termos do n.° 3, primeiro parágrafo, da mesma disposição, o Tribunal pode repartir as despesas se ambas as partes obtiverem vencimento parcial. Nas circunstâncias do caso vertente, há que decidir que cada parte suportará as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção)

decide:

1)      O artigo 2.°, alínea c), da Decisão C (2006) 5700 final da Comissão, de 29 de Novembro de 2006, relativa a um processo de aplicação do artigo 81.° CE e do artigo 53.° do Acordo EEE (processo COMP/F/38.638 – Borracha de butadieno e borracha de estireno‑butadieno fabricada por polimerização em emulsão), é anulado na parte em que fixa o montante da coima aplicada à Eni SpA em 272,25 milhões de euros.

2)      O montante da coima imposta à Eni é fixado em 181,5 milhões de euros.

3)      É negado provimento ao recurso quanto ao restante.

4)      Cada parte suportará as suas próprias despesas.

Dehousse

Wiszniewska‑Białecka

Wahl

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 13 de Julho de 2011.

Assinaturas

Índice


Antecedentes do litígio

Tramitação processual e pedidos das partes

Questão de direito

A –  Quanto ao pedido de anulação parcial da decisão impugnada

1.  Quanto ao primeiro fundamento, relativo à imputação ilegal da infracção à Eni

a)  Quanto à primeira parte, relativa à errada aplicação dos requisitos de imputabilidade da infracção

Argumentos das partes

Apreciação do Tribunal

b)  Quanto à segunda parte, relativa à errada imputação de uma responsabilidade objectiva

Argumentos das partes

Apreciação do Tribunal

c)  Quanto à terceira parte, relativa a um erro na análise dos elementos apresentados pela Eni

Argumentos das partes

Apreciação do Tribunal

d)  Quanto à quarta parte, relativa à violação do princípio da responsabilidade limitada das sociedades de capitais e dos princípios comuns em matéria de responsabilidade

Argumentos das partes

Apreciação do Tribunal

2.  Quanto ao segundo fundamento, invocado a título subsidiário, relativo à fixação ilegal do montante da coima

a)  Quanto à primeira parte, relativa à errada aplicação de um coeficiente multiplicador com finalidade dissuasiva

Argumentos das partes

Apreciação do Tribunal

b)  Quanto à segunda parte, relativa ao agravamento injustificado do montante de base da coima devido a reincidência

Argumentos das partes

–  Argumentos da Eni

–  Argumentos da Comissão

Apreciação do Tribunal

c)  Quanto à terceira parte, relativa a um erro no cálculo da coima decorrente da exclusão da Syndial

Argumentos das partes

Apreciação do Tribunal

B –  Quanto ao pedido de revisão do montante da coima

Quanto às despesas


* Língua do processo: italiano.