Language of document : ECLI:EU:C:2011:812

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

8 de Dezembro de 2011 (*)

«Propriedade intelectual e industrial – Patentes – Regulamento (CEE) n.° 1768/92 – Artigo 13.° – Certificado complementar de protecção para os medicamentos – Possibilidade de conceder esse certificado no caso de o período que decorreu entre a data da apresentação do pedido da patente de base e a data da primeira autorização de colocação no mercado na União ser inferior a cinco anos – Regulamento (CE) n.° 1901/2006 – Artigo 36.° – Prorrogação da duração do certificado complementar de protecção»

No processo C‑125/10,

que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.° TFUE, apresentado pelo Bundespatentgericht (Alemanha), por decisão de 28 de Janeiro de 2010, entrado no Tribunal de Justiça em 9 de Março de 2010, no processo

Merck Sharp & Dohme Corp., antiga Merck & Co. Inc.,

contra

Deutsches Patent‑ und Markenamt,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

composto por: J. N. Cunha Rodrigues, presidente de secção, U. Lõhmus (relator), A. Rosas, A. Ó Caoimh e A. Arabadjiev, juízes,

advogado‑geral: Y. Bot,

secretário: K. Malacek, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 4 de Maio de 2011,

vistas as observações apresentadas:

–        em representação da Merck Sharp & Dohme Corp., antiga Merck & Co. Inc., por M. Heinemann, M. Gundt, A. Rollins e A. von Falck, Rechtsanwälte,

–        em representação do Governo francês, por G. de Bergues, S. Menez e R. Loosli‑Surrans, na qualidade de agentes,

–        em representação do Governo lituano, por D. Kriaučiūnas e V. Balčiūnaitė, na qualidade de agentes,

–        em representação do Governo húngaro, por M. Ficsor, M. Fehér e Z. Tóth, na qualidade de agentes,

–        em representação do Governo português, por L. Inez Fernandes e P. A. Antunes, na qualidade de agentes,

–        em representação do Governo do Reino Unido, por H. Walker, na qualidade de agente,

–        em representação da Comissão Europeia, por G. Braun e F. W. Bulst, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 9 de Junho de 2011,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objecto a interpretação do artigo 13.°, n.° 1, do Regulamento (CE) n.° 469/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de Maio de 2009, relativo ao certificado complementar de protecção para os medicamentos (versão codificada) (JO L 152, p. 1).

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Merck Sharp & Dohme Corp., antiga Merck & Co. Inc. (a seguir «Merck»), ao Deutsches Patent‑ und Markenamt (Instituto Alemão das Patentes e das Marcas), a propósito da recusa deste de conceder um certificado complementar de protecção (a seguir «CCP») para a substância farmacêutica sitagliptina.

 Quadro jurídico

 Regulamento (CEE) n.° 1768/92

3        O primeiro e segundo considerandos do Regulamento (CEE) n.° 1768/92 do Conselho, de 18 de Junho de 1992, relativo à criação de um certificado complementar de protecção para os medicamentos (JO L 182, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.° 1901/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de Dezembro de 2006 (JO L 378, p. 1, a seguir «Regulamento n.° 1768/92»), têm a seguinte redacção:

«Considerando que a investigação no domínio farmacêutico contribui de forma decisiva para a melhoria contínua da saúde pública;

Considerando que os medicamentos, nomeadamente os resultantes de uma investigação longa e onerosa, só continuarão a ser desenvolvidos na Comunidade e na Europa se beneficiarem de uma regulamentação favorável que preveja uma protecção suficiente para incentivar tal investigação;».

4        O terceiro a quinto considerandos desse mesmo regulamento enunciam que o período que decorre entre o depósito de um pedido de patente para um novo medicamento e a autorização de colocação no mercado (a seguir «ACM») do referido medicamento reduz a protecção efectiva conferida pela patente a um período insuficiente para amortizar os investimentos efectuados na investigação, o que penaliza a investigação farmacêutica e ameaça ocasionar uma deslocação dos centros de investigação para fora dos Estados‑Membros.

5        O oitavo e nono considerandos do mesmo regulamento referem:

«Considerando que a duração da protecção conferida pelo [CCP] deve ser determinada de forma a permitir uma protecção efectiva suficiente; que, para esse efeito, o titular de uma patente e de um [CCP] deve poder beneficiar no total de um período máximo de quinze anos de exclusividade a partir da primeira [ACM] [na] Comunidade do medicamento em causa;

Considerando, no entanto, que todos os interesses em causa num sector tão complexo e sensível como o farmacêutico, incluindo os relativos à saúde pública, devem ser tomados em consideração; que, para este efeito, o [CCP] não poderá ser concedido por um período superior a cinco anos; que a protecção que o certificado confere deve além disso ser estritamente limitada ao produto abrangido pela [ACM] como medicamento;».

6        Nos termos do artigo 3.° do Regulamento n.° 1768/92, intitulado «Condições de obtenção do [CCP]»:

«O [CCP] é concedido se no Estado‑Membro onde for apresentado o pedido previsto no artigo [7.°] e à data de tal pedido:

a)      O produto estiver protegido por uma patente de base em vigor;

b)      O produto tiver obtido, enquanto medicamento, uma [ACM] válida, nos termos do disposto na Directiva 65/65/CEE [do Conselho, de 26 de Janeiro de 1965, relativa à aproximação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas, respeitantes às especialidades farmacêuticas (JO 1965, 22, p. 369; EE 13 F1 p. 18),] ou na Directiva 81/851/CEE [do Conselho, de 28 de Setembro de 1981, relativa à aproximação das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos medicamentos veterinários (JO L 317, p. 1), conforme alterada pela Directiva 90/676/CEE do Conselho, de 13 de Dezembro de 1990 (JO L 373, p. 15; EE 13 F12 p. 3)], conforme o caso;

c)      O produto não tiver sido já objecto de um [CCP];

d)      A [ACM] referida na alínea b) for a primeira [ACM] do produto […], como medicamento.»

7        O artigo 7.°, n.° 1, do referido regulamento prevê que «[o] pedido de [CCP] deve ser apresentado no prazo de seis meses a contar da data em que o produto obteve a [ACM]».

8        O artigo 8.° do Regulamento n.° 1768/92 enumera as menções que devem constar do CCP. Prevê, designadamente, no seu n.° 1, alínea d), i) que se o pedido de CCP contiver um pedido de prorrogação, deve incluir uma cópia da certificação da conformidade com um plano de investigação pediátrica referido no artigo 36.° do Regulamento n.° 1901/2006.

9        O artigo 10.° do Regulamento n.° 1768/92, que prevê as condições de concessão do CCP ou de recusa do pedido do mesmo, dispõe, nos seus n.os 1 e 2:

«1.      Se o pedido de [CCP] e o produto que é objecto do pedido satisfizerem as condições previstas no presente regulamento, a autoridade prevista no n.° 1 do artigo 9.° concederá o [CCP].

2.      Sem prejuízo do disposto no n.° 3, o pedido de [CCP] será recusado pela autoridade prevista no n.° 1 do artigo 9.°, se esse pedido ou o produto que dele é objecto não satisfizerem as condições previstas no presente regulamento.»

10      O artigo 13.° desse regulamento, intitulado «Período de validade do [CCP]», tem a seguinte redacção:

«1.      O [CCP] produz efeitos no termo legal da validade da patente de base, durante um período que corresponde ao período decorrido entre a data da apresentação do pedido da patente de base e a data da primeira [ACM] na Comunidade, reduzido um período de cinco anos.

2.      Não obstante o disposto no n.° 1, o período de validade do [CCP] não pode exceder cinco anos a contar da data em que produzir efeitos.

3.      Os períodos previstos nos n.os 1 e 2 serão prorrogados por seis meses no caso do pedido previsto no artigo 36.° do Regulamento (CE) n.° 1901/2006. Nesse caso, o período previsto no n.° 1 do presente artigo só pode ser prorrogado uma vez.»

11      O artigo 14.°, alínea a), do Regulamento n.° 1768/92 prevê que o CCP caduca «[n]o termo do prazo previsto no artigo 13.°».

12      O Regulamento n.° 469/2009, que codifica e revoga o Regulamento n.° 1768/92, entrou em vigor em 6 de Julho de 2009. O seu artigo 13.° está redigido em termos idênticos ao artigo 13.° do Regulamento n.° 1768/92. Contudo, tendo em conta os factos do litígio no processo principal, o Regulamento n.° 1768/92 continua aplicável ao mesmo.

 Regulamento n.° 1901/2006

13      O vigésimo sexto e vigésimo sétimo considerandos do Regulamento n.° 1901/2006 enunciam:

«(26) No que diz respeito aos medicamentos abrangidos pela exigência de apresentação de dados pediátricos, se todas as medidas incluídas no plano de investigação pediátrica aprovado tiverem sido cumpridas, o medicamento estiver autorizado em todos os Estados‑Membros e a informação relevante sobre o resultado dos estudos tiver sido incluída na informação disponível sobre o medicamento, deverá ser concedida uma recompensa sob a forma da prorrogação, por seis meses, do [CCP] criado pelo Regulamento (CEE) n.° 1768/92 [...]

(27)      O pedido de prorrogação da validade de um [CCP] concedido nos termos do presente regulamento só deverá ser admissível se o [CCP] tiver sido concedido nos termos do Regulamento (CEE) n.° 1768/92.»

14      Nos termos do artigo 36.°, n.os 1 e 4, do Regulamento n.° 1901/2006:

«1.      Sempre que um pedido nos termos dos artigos 7.° ou 8.° incluir os resultados de todos os estudos realizados em conformidade com um plano de investigação pediátrica aprovado, o titular da patente ou do [CCP] tem direito a uma prorrogação de seis meses do período referido nos n.os 1 e 2 do artigo 13.° do Regulamento (CEE) n.° 1768/92 [(a seguir ‘prorrogação pediátrica’)].

O primeiro parágrafo é igualmente aplicável nos casos em que a conclusão de um plano de investigação pediátrica aprovado não conduzir à autorização de uma indicação pediátrica, mas os resultados dos estudos realizados se reflectirem no resumo das características do medicamento e, caso se justifique, no folheto informativo do medicamento em questão.

[...]

4.      Os n.os 1, 2 e 3 são aplicáveis aos medicamentos protegidos por [CCP] ao abrigo do Regulamento (CEE) n.° 1768/92 ou por patentes que confiram direito a [CCP]. [...]»

 Litígio no processo principal e questão prejudicial

15      A Merck é titular de uma patente europeia sobre compostos inibidores da dipeptidil peptidase, para o tratamento ou a prevenção de diabetes. Essa patente de base, que é igualmente válida para a República Federal da Alemanha, foi pedida em 5 de Julho de 2002.

16      Em 14 de Setembro de 2007, a Merck pediu ao Deutsches Patent‑ und Markenamt a concessão de um CCP para a substância farmacêutica sitagliptina, abrangida pela referida patente, eventualmente sob a forma de um sal farmacologicamente admissível, em especial para o monoidrato de fosfato de sitagliptina. Indicou o dia 21 de Março de 2007 como data da primeira ACM na União Europeia e na República Federal da Alemanha, que é a data da autorização europeia concedida para o medicamento que contém a substância monoidrato de fosfato de sitagliptina. Esse medicamento é comercializado no referido Estado‑Membro, sob a marca Januvia.

17      Esse pedido foi indeferido por decisão de 1 de Julho de 2008, com o fundamento de que tinha decorrido um período de quatro anos, oito meses e dezasseis dias, entre a data da apresentação do pedido da patente de base e a data da autorização da primeira ACM, de modo que o cálculo de duração do CCP dava, de acordo com o artigo 13.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1768/92, uma duração negativa de três meses e catorze dias.

18      A Merck recorreu dessa decisão para o Bundespatentgericht. Sustenta que todas as condições para a obtenção do CCP estão reunidas no presente caso e que a duração do CCP não faz parte dessas condições.

19      A Merck alega que, mesmo que o CCP não dê uma duração positiva, poderá contudo ter uma duração zero ou negativa. O seu pedido justifica‑se pela preocupação de reservar a possibilidade de, numa data posterior, requerer a prorrogação desse certificado. Foi autorizado um plano de investigação pediátrica, nesse sentido, pela autoridade competente, em 27 de Março de 2009, devendo os estudos aprovados nesse plano estar concluídos antes de 2017.

20      O órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se sobre a questão de saber se a entrada em vigor do Regulamento n.° 1901/2006, que prevê uma recompensa sob a forma da prorrogação pediátrica de seis meses, não altera a abordagem seguida até agora, segundo a qual a emissão do CCP só é possível se tiverem decorrido cinco anos entre o pedido da patente e a primeira ACM desse medicamento na União. Importa saber se, na sequência da entrada em vigor desse regulamento, há que emitir CCP de uma duração negativa ou nula.

21      Assim, o referido órgão jurisdicional indicou que considerou necessário submeter ao Tribunal de Justiça um pedido de interpretação do artigo 13.°, n.° 1, do Regulamento n.° 469/2009.

22      Nestas condições, o Bundespatentgericht decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a questão prejudicial seguinte:

«Pode ser emitido um [CCP] para medicamentos, quando o período de tempo compreendido entre a apresentação do pedido para a patente de base e o momento da primeira [ACM] na Comunidade seja inferior a cinco anos?»

 Quanto à questão prejudicial

23      A título preliminar, há que observar que, no seu pedido de decisão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio refere‑se ao Regulamento n.° 469/2009, que codifica e revoga o Regulamento n.° 1768/92.

24      Ora, tendo o Regulamento n.° 469/2009 entrado em vigor em 6 de Julho de 2009, ou seja, posteriormente à adopção da decisão objecto de recurso no processo principal, é o Regulamento n.° 1768/92 que continua aplicável a este último.

25      Além disso, embora a duração da prorrogação pediátrica esteja prevista no artigo 13.°, n.° 3, do Regulamento n.° 1768/92, as condições da sua aplicação estão fixadas no artigo 36.° do Regulamento n.° 1901/2006. Consequentemente, é à luz destes dois regulamentos que há que responder à questão colocada pelo órgão jurisdicional de reenvio.

26      Assim, há que considerar que, pela sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se o artigo 13.° do Regulamento n.° 1768/92, lido em conjugação com o artigo 36.° do Regulamento n.° 1901/2006, deve ser interpretado no sentido de que os medicamentos podem ser objecto da concessão de um CCP, quando o período que decorreu entre a data da apresentação do pedido da patente de base e a data da primeira ACM na União for inferior a cinco anos.

27      À luz das indicações constantes do pedido de decisão prejudicial, esse órgão jurisdicional pretende igualmente saber se, em caso de resposta positiva à referida questão, a prorrogação de uma duração de seis meses prevista no artigo 36.° do Regulamento n.° 1901/2006 deve começar a correr antes da data da caducidade da patente, a saber, na data fixada tendo em conta um valor negativo para o CCP, ou, então, se é necessário que a prorrogação comece a contar a partir da data da caducidade da referida patente, arredondando para zero a duração do CCP.

28      Há que observar, antes de mais, que o artigo 13.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1768/92 prevê que o CCP produz efeitos por uma duração igual ao período que decorreu entre a data da apresentação do pedido da patente de base e a data da primeira ACM na União, reduzida de um período de cinco anos. Nada na redacção da referida disposição nem de outra disposição desse regulamento permite supor que este se opõe necessariamente a que um CCP tenha uma duração negativa.

29      Consequentemente, há que interpretar o artigo 13.° do Regulamento n.° 1768/92 à luz não só da sua letra mas igualmente da sistemática geral e dos objectivos do sistema em que se insere (v., neste sentido, acórdãos de 11 de Dezembro de 2003, Hässle, C‑127/00, Colect., p. I‑14781, n.° 55, e de 3 de Setembro de 2009, AHP Manufacturing, C‑482/07, Colect., p. I‑7295, n.° 27).

30      No que diz respeito, em primeiro lugar, à sistemática geral do Regulamento n.° 1768/92, há que observar que o artigo 10.° do referido regulamento dispõe que se o pedido de CCP e o produto que dele é objecto satisfizerem as condições previstas no mesmo regulamento, a autoridade competente concede esse certificado. Ora, há que observar que a condição da duração positiva do CCP não figura entre as condições de obtenção materiais desse certificado, enumeradas no artigo 3.° do Regulamento n.° 1768/92, nem entre as condições formais, referidas nos artigos 7.° a 9.° do mesmo.

31      No que diz respeito, em segundo lugar, aos objectivos prosseguidos pelo Regulamento n.° 1768/92, há que recordar que o objectivo fundamental desse regulamento, conforme enunciado no seu primeiro e segundo considerandos, consiste em garantir uma protecção suficiente para incentivar a investigação no domínio farmacêutico, que contribui de forma decisiva para a melhoria contínua da saúde pública (v., neste sentido, acórdão AHP Manufacturing, já referido, n.° 30).

32      A este respeito, a adopção do referido regulamento é motivada, no terceiro, quarto e oitavo considerandos do mesmo, pela duração insuficiente da protecção efectiva conferida pela patente para amortizar os investimentos efectuados na investigação farmacêutica, tendo em conta o período que decorre entre a apresentação de um pedido de patente para um novo medicamento e a emissão da ACM do referido medicamento (v., neste sentido, acórdão AHP Manufacturing, já referido, n.° 30).

33      O Regulamento n.° 1768/92 visa assim suprir esta insuficiência através da criação de um CCP para os medicamentos. Além desse objectivo, esse regulamento reconhece igualmente, como resulta do seu nono considerando, a necessidade de, num sector tão complexo e sensível como o farmacêutico, ter em conta todos os interesses em causa, incluindo os relativos à saúde pública, ao assegurar que o monopólio de exploração assim garantido não exceda o necessário para a amortização dos investimentos e não atrase abusivamente o momento em que o produto em causa cai no domínio público (v., neste sentido, acórdão AHP Manufacturing, já referido, n.os 30 e 39).

34      Quanto ao Regulamento n.° 1901/2006, que alterou, designadamente, o artigo 13.° do Regulamento n.° 1768/92, na sua versão original, há que observar que, como resulta do seu vigésimo sexto considerando, prossegue o objectivo de compensar os esforços efectuados a fim de avaliar os efeitos pediátricos do medicamento em causa, concedendo ao titular de uma patente de base que realizou todas as investigações preconizadas no plano de investigação pediátrica aprovado para o medicamento em causa uma recompensa sob a forma de uma prorrogação do CCP por seis meses.

35      É certo que, embora um CCP com uma duração negativa ou nula não apresente nenhuma utilidade em si mesmo, a verdade é que, desde a adopção do Regulamento n.° 1901/2006, esse CCP pode ter utilidade para o titular de uma patente de base que pretende obter a prorrogação pediátrica. Com efeito, o artigo 13.°, n.° 3, do Regulamento n.° 1768/92 prevê uma possibilidade de prorrogar por seis meses a duração do CCP, conforme calculada em conformidade com o n.° 1 desse artigo, e permite, por conseguinte, prorrogar o período de quinze anos de exclusividade enunciados no oitavo considerando do Regulamento n.° 1768/92.

36      Ora, como resulta do vigésimo sétimo considerando do Regulamento n.° 1901/2006 e da leitura conjugada dos artigos 13.°, n.° 3, do Regulamento n.° 1768/92 e 36.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1901/2006, a concessão da prorrogação pediátrica só é possível se tiver sido concedido um CCP nos termos do Regulamento n.° 1768/92.

37      Assim, se o pedido de CCP for recusado pelo facto de o cálculo previsto no artigo 13.°, n.° 1, deste último regulamento dar uma duração negativa ou nula, o titular da patente de base não poderia obter uma prorrogação da protecção conferida por essa patente, mesmo que tenha realizado todos os estudos segundo o plano de investigação pediátrica aprovado, na acepção do artigo 36.° do Regulamento n.° 1901/2006. Essa recusa seria susceptível de prejudicar o efeito útil do Regulamento n.° 1901/2006 e poderia ter por consequência pôr em risco os objectivos prosseguidos por esse regulamento, a saber, o que consiste em compensar os esforços efectuados para avaliar os efeitos pediátricos do medicamento em causa.

38      Por conseguinte, há que considerar que decorre da leitura conjugada dos Regulamentos n.os 1768/92 e 1901/2006 que o CCP e a prorrogação pediátrica conferem, em conjunto, ao titular de uma patente de base, um direito exclusivo de uma duração máxima de quinze anos e seis meses, a partir da data da concessão da primeira ACM do medicamento na União.

39      Resulta desta duração máxima que uma prorrogação pediátrica tem utilidade se a duração negativa de um CCP não ultrapassar seis meses. Por outras palavras, o objectivo do Regulamento n.° 1901/2006 é atingido quando o titular da patente de base tiver obtido a sua primeira ACM do medicamento na União Europeia, num período compreendido entre quatro anos e meio e cinco anos após o pedido da patente de base. Consequentemente, pode ser concedido um CCP quando tiverem decorrido menos de cinco anos entre o pedido da patente de base e a data da obtenção dessa ACM.

40      Daqui resulta que há que considerar que a emissão de um CCP não pode ser recusada pelo simples facto de a duração determinada em conformidade com as modalidades de cálculo previstas no artigo 13.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1768/92 não ser positiva.

41      No que se refere à questão de saber em que momento deve começar a correr a prorrogação pediátrica de uma duração de seis meses, importa considerar que, no caso de o período que decorreu entre a data da apresentação do pedido da patente de base e a data da primeira ACM do medicamento na União ser inferior a cinco anos, o início dessa prorrogação não pode ser fixado a partir da data da caducidade da patente de base, por forma a que a duração do referido certificado seja considerada igual a zero. Com efeito, essa solução seria contrária às modalidades de cálculo previstas no artigo 13.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1768/92, na medida em que essa disposição prevê que a duração do CCP corresponde ao período que decorreu entre a data da apresentação do pedido da patente de base e a data da primeira ACM na União, reduzido de um período de cinco anos.

42      Logo, quando a duração de um CCP é negativa, não pode ser arredondada para zero. O prazo de prorrogação pediátrica previsto no Regulamento n.° 1901/2006 começa a correr a partir da data determinada deduzindo da data da caducidade da patente a diferença entre cinco anos e a duração do período decorrido entre a apresentação do pedido de patente e a obtenção da primeira ACM.

43      Só no caso de o período entre a apresentação do pedido da patente de base e a data da primeira ACM na União do medicamento em causa ser exactamente de cinco anos é que um CCP pode ter uma duração igual a zero e o ponto de partida da prorrogação pediátrica de uma duração de seis meses é concomitante com a data da caducidade da patente de base.

44      Nas circunstâncias do processo principal, o CCP e a prorrogação pediátrica confeririam, em conjunto, ao titular de uma patente de base, uma duração de protecção de dois meses e dezasseis dias, que produz efeitos no termo legal da patente de base. Consequentemente, a concessão de um CCP de duração negativa, no presente caso, permite atingir o objectivo do Regulamento n.° 1901/2006.

45      Resulta do exposto que há que responder à questão colocada que o artigo 13.° do Regulamento n.° 1768/92, lido em conjugação com o artigo 36.° do Regulamento n.° 1901/2006, deve ser interpretado no sentido de que pode ser concedido um CCP para medicamentos, quando o período que decorreu entre a data da apresentação do pedido da patente de base e a data da primeira ACM na União for inferior a cinco anos. Nesse caso, o prazo de prorrogação pediátrica previsto neste último regulamento começa a correr a partir da data determinada deduzindo da data da caducidade da patente a diferença entre cinco anos e a duração do período decorrido entre a apresentação do pedido de patente e a obtenção da primeira ACM.

 Quanto às despesas

46      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) declara:

O artigo 13.° do Regulamento (CEE) n.° 1768/92 do Conselho, de 18 de Junho de 1992, relativo à criação de um certificado complementar de protecção para os medicamentos, conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.° 1901/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de Dezembro de 2006, lido em conjugação com o artigo 36.° do Regulamento n.° 1901/2006, deve ser interpretado no sentido de que pode ser concedido um certificado complementar de protecção para medicamentos, quando o período que decorreu entre a data da apresentação do pedido da patente de base e a data da primeira autorização de colocação no mercado na União Europeia for inferior a cinco anos. Nesse caso, o prazo de prorrogação pediátrica previsto neste último regulamento começa a correr a partir da data determinada deduzindo da data da caducidade da patente a diferença entre cinco anos e a duração do período decorrido entre a apresentação do pedido de patente e a obtenção da primeira autorização de colocação no mercado.

Assinaturas


* Língua do processo: alemão.