Language of document : ECLI:EU:T:2018:453

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção)

12 de julho de 2018 (*)

«Concorrência — Acordos, decisões e práticas concertadas — Mercado europeu dos cabos elétricos — Decisão que declara provada uma infração ao artigo 101.o TFUE — Infração única e continuada — Prova da infração — Duração da participação — Distanciamento público — Cálculo do montante da coima — Gravidade da infração — Competência de plena jurisdição»

No processo T‑441/14,

Brugg Kabel AG, com sede em Brugg (Suíça),

Kabelwerke Brugg AG Holding, com sede em Brugg,

representadas por A. Rinne, A. Boos, e M. Lichtenegger, advogados,

recorrentes,

contra

Comissão Europeia, representada por H. Leupold, H. van Vliet e C. Vollrath, na qualidade de agentes, assistidos por A. Israel, advogado,

recorrida,

que tem por objeto, com base no artigo 263.o TFUE, um pedido principal de anulação da Decisão C (2014) 2139 final da Comissão, de 2 de abril de 2014, relativa a um processo nos termos do artigo 101.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia e do artigo 53.o do Acordo [EEE] (processo AT.39610 — Cabos elétricos), na parte aplicável às recorrentes, e um pedido subsidiário de redução do montante da coima que lhes foi aplicada,

O TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção),

composto por: A. M. Collins, presidente, M. Kancheva (relator) e R. Barents, juízes,

secretário: L. Grzegorczyk, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 1 de junho de 2017,

profere o presente

Acórdão

I.      Antecedentes do litígio

A.      Recorrentes e setor em causa

1        As recorrentes, a Kabelwerke Brugg AG Holding e a sua filial que lhe pertence integralmente, a Brugg Kabel AG, são sociedades suíças com atividade no setor da produção e fornecimento de cabos elétricos subterrâneos (considerandos 28 e 37 da decisão recorrida).

2        Os cabos elétricos submarinos e subterrâneos são utilizados, respetivamente debaixo de água e debaixo de terra, para o transporte e distribuição de eletricidade. São classificados em três categorias: baixa tensão, média tensão e alta e muito alta tensão. Os cabos elétricos de alta e muito alta tensão são, na maioria dos casos, vendidos no âmbito de um projeto. Esses projetos consistem numa conjugação do cabo elétrico e dos equipamentos, instalações e serviços suplementares necessários. Os cabos elétricos de alta e muito alta tensão são vendidos em todo o mundo a grandes exploradores de redes nacionais e outras empresas de eletricidade, principalmente no âmbito de contratos públicos.

B.      Procedimento administrativo

3        Por carta de 17 de outubro de 2008, a sociedade sueca ABB AB apresentou à Comissão das Comunidades Europeias uma série de declarações e documentos relativos a práticas comerciais restritivas no setor da produção e fornecimento de cabos elétricos subterrâneos e submarinos. Essas declarações e esses documentos foram apresentados no âmbito de um pedido de imunidade na aceção da Comunicação da Comissão relativa à imunidade em matéria de coimas e à redução do seu montante nos processos relativos a cartéis (JO 2006, C 298, p. 17, a seguir «comunicação sobre a clemência»).

4        De 28 de janeiro a 3 de fevereiro de 2009, na sequência das declarações da ABB, a Comissão efetuou inspeções nas instalações da Prysmian SpA e da Prysmian Cavi e Sistemi Energia Srl, e ainda de outras sociedades europeias, a saber, a Nexans SA e a Nexans France SAS.

5        Em 2 de fevereiro de 2009, as sociedades japonesas Sumitomo Electric Industries Ltd, Hitachi Cable Ltd e J‑Power Systems Corp. apresentaram um pedido conjunto de imunidade de coimas ao abrigo do ponto 14 da comunicação sobre a clemência ou, a título subsidiário, de redução do seu montante, ao abrigo do ponto 27 dessa comunicação. Seguidamente, transmitiram à Comissão outras declarações orais e outros documentos.

6        No inquérito, a Comissão enviou vários pedidos de informações, nos termos do artigo 18.o do Regulamento (CE) n.o 1/2003 do Conselho, de 16 de dezembro de 2002, relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigos [101.o] e [102.o TFUE] (JO 2003, L 1, p. 1) e do ponto 12 da comunicação sobre a clemência, a empresas do setor da produção e do fornecimento de cabos elétricos subterrâneos e submarinos.

7        Em 30 de junho de 2011, a Comissão abriu um procedimento e adotou uma comunicação de acusações contra as seguintes entidades jurídicas: Nexans France, Nexans, Pirelli & C. SpA, Prysmian Cavi e Sistemi Energia, Prysmian, The Goldman Sachs Group Inc, Sumitomo Electric Industries, Hitachi Cable, J‑Power Systems, Furukawa Electric Co. Ltd, Fujikura Ltd, Viscas Corp., SWCC Showa Holdings Co. Ltd, Mitsubishi Cable Industries Ltd, Exsym Corp., ABB, ABB Ltd, nkt cables GmbH, NKT Holding A/S, Silec Cable, SAS, Grupo General Cable Sistemas SA, Safran SA, General Cable Corp., LS Cable & System Ltd, Taihan Electric Wire Co. Ltd e as recorrentes.

8        De 11 a 18 de junho de 2012, todos os destinatários da comunicação de acusações, com exceção da Furukawa Electric, participaram numa audiência administrativa na Comissão.

9        Com os Acórdãos de 14 de novembro de 2012, Nexans France e Nexans/Comissão (T‑135/09, EU:T:2012:596), e de 14 de novembro de 2012, Prysmian e Prysmian Cavi e Sistemi Energia/Comissão (T‑140/09, não publicado, EU:T:2012:597), o Tribunal anulou parcialmente as decisões de inspeção dirigidas, por um lado, à Nexans e Nexans France e, por outro, à Prysmian e à Prysmian Cavi e Sistemi Energia, na parte respeitante aos cabos elétricos diferentes dos cabos elétricos submarinos e subterrâneos de alta tensão e ao material associado a esses outros cabos, negando provimento aos recursos no restante. Em 24 de janeiro de 2013, a Nexans e a Nexans France interpuseram recurso do primeiro desses acórdãos. Pelo Acórdão de 25 de junho de 2014, Nexans e Nexans France/Comissão (C‑37/13 P, EU:C:2014:2030), o Tribunal de Justiça negou provimento a esse recurso.

10      Em 2 de abril de 2014, a Comissão adotou a Decisão C (2014) 2139 final, relativa a um processo nos termos do artigo 101.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia e do artigo 53.o do Acordo EEE (processo AT.39610 — Cabos elétricos) (a seguir «decisão recorrida»).

C.      Decisão recorrida

1.      Infração em causa

11      O artigo 1.o da decisão recorrida dispõe que várias empresas participaram, em diferentes períodos, numa infração única e continuada ao artigo 101.o TFUE, no «setor dos cabos elétricos de (muito) alta tensão subterrâneos e/ou submarinos». Em substância, a Comissão considerou que desde fevereiro de 1999 e até ao final de janeiro de 2009, os principais produtores europeus, japoneses e sul coreanos de cabos elétricos submarinos e subterrâneos participaram numa rede de reuniões multilaterais e bilaterais e em contactos com o fim de restringir a concorrência em projetos de cabos elétricos subterrâneos e submarinos de (muito) alta tensão em territórios específicos, repartindo entre si os mercados e os clientes e assim falseando o processo normal da concorrência (considerandos 10 a 13 e 66 dessa decisão).

12      Na decisão recorrida, a Comissão considerou que o cartel tinha duas configurações principais que constituíam um conjunto composto. Mais precisamente, afirmava que o cartel era constituído por duas componentes:

–        a «configuração A/R do cartel»» que agrupava as empresas europeias, geralmente chamadas «membros R», as empresas japonesas, designadas «membros A» e, por último, as empresas sul coreanas, designadas «membros K». Essa configuração permitia realizar o objetivo de atribuição de territórios e de clientelas entre produtores europeus, japoneses e sul coreanos. A atribuição fazia‑se segundo um acordo sobre o «território nacional», por força do qual os produtores japoneses e sul coreanos se abstinham de entrar em concorrência em projetos a correr no «território nacional» dos produtores europeus, obrigando‑se estes a ficar fora dos mercados do Japão e da Coreia do Sul. A isto acrescia a atribuição de projetos nos «territórios de exportação», a saber, o resto do mundo com exceção nomeadamente dos Estados Unidos, que, durante certo período, respeitava uma «quota 60/40», que significa que 60% dos projetos estavam reservados aos produtores europeus e os 40% restantes aos produtores asiáticos; e

–        a «configuração europeia do cartel», que implicava a atribuição de territórios e de clientes pelos produtores europeus de projetos a realizar no «território nacional» europeu ou atribuídos a produtores europeus (v. ponto 3.3 da decisão recorrida, em particular, considerandos 73 e 74 dessa decisão).

13      A Comissão considerou que os participantes no cartel tinham instituído obrigações de comunicação de dados que permitissem o acompanhamento dos acordos de repartição (considerandos 94 a 106 e 111 a 115 da decisão recorrida).

14      Tendo em conta o papel desempenhado por diferentes participantes na execução do cartel, a Comissão classificou‑os em três grupos. Antes de mais, definiu o núcleo duro do cartel, ao qual pertenciam, por um lado, as empresas europeias: a Nexans France, as empresas filiais da Pirelli & C., anteriormente Pirelli SpA, que participaram sucessivamente no cartel (a seguir «Pirelli»), e a Prysmian Cavi e Sistemi Energia; e, por outro, as empresas japonesas: a Furukawa Electric, a Fujikura e a sua empresa comum Viscas, e ainda a Sumitomo Electric Industries, a Hitachi Cable e a sua empresa comum, a J‑Power Systems (considerandos 545 a 561 da decisão recorrida). Seguidamente, distinguiu um grupo de empresas que não faziam parte do núcleo duro, mas que não era por isso que podiam ser consideradas atores marginais do cartel e classificou nesse grupo a ABB, a Exsym, a Brugg Kabel e a entidade constituída pela Sagem SA, a Safran e a Silec Cable (considerandos 562 a 575 dessa decisão). Por último, considerou que a Mitsubishi Cable Industries, a SWCC Showa Holdings, a LS Cable & System, a Taihan Electric Wire e a nkt cables eram atores marginais do cartel (considerandos 576 a 594 dessa decisão).

2.      Responsabilidade das recorrentes

15      A responsabilidade da Brugg Kabel foi declarada devido à sua participação direta na infração, de 14 de dezembro de 2001 a 16 de novembro de 2006. A Kabelwerke Brugg foi declarada responsável pela infração como sociedade‑mãe da Brugg Kabel durante o mesmo período (considerandos 859 a 861 da decisão recorrida).

3.      Coima aplicada

16      O artigo 2.o, alínea b), da decisão recorrida, aplica uma coima no montante de 8 490 000 euros, «solidariamente» às recorrentes.

17      Para efeitos de cálculo do montante das coimas, a Comissão aplicou o artigo 23.o, n.o 2, alínea a), do Regulamento n.o 1/2003, e a metodologia exposta nas Orientações para o cálculo das coimas aplicadas por força do n.o 2, alínea a), do artigo 23.o do Regulamento (CE) n.o 1/2003 (JO 2006, C 210, p. 2, a seguir «orientações para o cálculo das coimas de 2006»).

18      Em primeiro lugar, quanto ao montante de base das coimas, depois de determinar o valor das vendas correto, de acordo com o n.o 18 das orientações para o cálculo das coimas de 2006 (considerandos 963 a 994 da decisão recorrida), a Comissão fixou a proporção desse valor das vendas que refletia a gravidade da infração, de acordo com os n.os 22 e 23 dessas orientações. A esse respeito, considerou que a infração, pela sua natureza, constituía uma das restrições mais graves da concorrência, o que justificava uma taxa de gravidade de 15%. Do mesmo modo, aplicou um agravamento de 2% do coeficiente de gravidade a todos os destinatários pela sua quota de mercado acumulada e pelo alcance geográfico quase‑mundial do cartel, nomeadamente abrangendo todo o território do Espaço Económico Europeu (EEE). Por outro lado, considerou, nomeadamente, que o comportamento das empresas europeias era mais prejudicial para a concorrência do que o das outras empresas, na medida em que, para além da sua participação na «configuração A/R do cartel», as empresas europeias tinham partilhado entre elas os projetos de cabos elétricos no âmbito da «configuração europeia do cartel». Por essa razão, fixou em 19% a proporção do valor das vendas a ter em consideração pela gravidade da infração para as empresas europeias e em 17% para as outras empresas (considerandos 997 a 1010 dessa decisão).

19      Quanto ao coeficiente multiplicador relativo à duração da infração, a Comissão fixou, no que respeita às recorrentes, um coeficiente de 4,91 pelo período entre 14 de dezembro de 2001 e 16 de novembro de 2006. Incluiu ainda, no montante de base da coima das recorrentes um montante adicional, a saber, a taxa de entrada, correspondente a 19% do valor das vendas. Esse montante ficou assim em 8 937 000 euros (considerandos 1011 a 1016 da decisão recorrida).

20      Em segundo lugar, quanto aos ajustamentos do montante de base das coimas, a Comissão não deu por provadas circunstâncias agravantes que pudessem afetar o montante de base da coima fixado para cada um dos participantes no cartel, com exceção da ABB. Em contrapartida, no que diz respeito às circunstâncias atenuantes, decidiu refletir no montante das coimas o papel desempenhado por diferentes empresas na execução do cartel. Assim, reduziu em 10% o montante de base da coima a aplicar aos atores marginais do cartel e em 5% o montante de base da coima a aplicar às empresas cujo envolvimento no cartel fosse médio. Além disso, concedeu à Mitsubishi Cable Industries e à SWCC Showa Holdings, quanto ao período anterior à criação da Exsym, à LS Cable & System Ltd e à Taihan Electric Wire uma redução suplementar de 1% por não terem tido conhecimento de certos aspetos da infração única e continuada e pela inexistência de responsabilidade sua nesses aspetos. Em contrapartida, nenhuma redução do montante de base da coima foi dada às empresas pertencentes ao núcleo duro do cartel (considerandos 1017 a 1020 e 1033 da decisão recorrida). Por outro lado, a Comissão concedeu, de acordo com as orientações para o cálculo das coimas de 2006, uma redução suplementar de 3% do montante da coima aplicada à Mitsubishi Cable Industries Ltd pela sua cooperação efetiva fora do quadro da comunicação sobre a clemência (considerando 1041 dessa decisão).

21      A Comissão decidiu ainda conceder imunidade das coimas à ABB e reduzir em 45% o montante da coima aplicada à J‑Power Systems, à Sumitomo Electric Industries e à Hitachi Cable a fim de ter em conta a cooperação dessas empresas no âmbito da comunicação sobre a clemência.

II.    Tramitação do processo e pedidos das partes

22      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 16 de junho de 2014, as recorrentes interpuseram o presente recurso.

23      Em 28 de setembro de 2016, no âmbito das medidas de organização do processo previstas no artigo 89.o, n.o 3, alíneas a) e d), do seu Regulamento de Processo, o Tribunal Geral colocou certas questões à Comissão e convidou‑a a juntar certos documentos, nomeadamente as versões não confidenciais das respostas dos outros destinatários da comunicação de acusações.

24      Tendo a composição das secções do Tribunal sido modificadas, nos termos do artigo 27.o, n.o 5, do Regulamento de Processo, o juiz‑relator foi afetado à Oitava Secção (nova composição), à qual foi consequentemente distribuído o presente processo.

25      Por carta de 31 de outubro de 2016, a Comissão respondeu às questões colocadas pelo Tribunal e juntou os documentos pedidos, com exceção das versões não confidenciais das respostas à comunicação de acusações da Nexans France, da Nexans, da The Goldman Sachs Group, da Sumitomo Electric Industries, da Hitachi Cable, da J‑Power Systems, da Furukawa Electric, da Fujikura, da Mitsubishi Cable Industries, da Exsym, da nkt cables, da NKT Holding, da Silec Cable, da Grupo General Cable Sistemas, da Safran, da General Cable, da LS Cable & System, da ABB, da Pirelli & C, da Prysmian, da Prysmian Cavi e Sistemi Energia, da SWCC Showa Holdings, da Taihan Electric Wire e da Viscas. Precisou que, não obstante o seu pedido a esse respeito, essas sociedades ainda não tinham preparado uma versão não confidencial da sua resposta à comunicação de acusações.

26      Com base no relatório do juiz‑relator, o Tribunal Geral (Oitava Secção) decidiu iniciar a fase oral do processo. Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às questões colocadas pelo Tribunal Geral na audiência de 1 de junho de 2017.

27      As recorrentes concluem pedindo que o Tribunal se digne:

–        A título principal, anular o artigo 1.o, n.o 2, o artigo 2.o, alínea b), e, na medida em que lhes diz respeito, o artigo 3.o da decisão recorrida, na parte em que as condenam «solidariamente» no pagamento de uma coima no montante de 8 490 000 euros pela sua responsabilidade na prática de uma infração única e continuada ao artigo 101.o TFUE e ao artigo 53.o do Acordo EEE, de 14 de dezembro de 2001 a 16 de novembro de 2006;

–        a título subsidiário, anular parcialmente a decisão recorrida, na medida em que as declara igualmente responsáveis, pela sua alegada participação nos diferentes acordos e práticas concertadas constitutivos da infração única e continuada, de infrações individuais ao artigo 101.o TFUE e ao artigo 53.o do Acordo EEE;

–        a título ainda mais subsidiário, reduzir o montante da coima que lhes foi aplicada no artigo 2.o, alínea b), da decisão recorrida;

–        condenar a Comissão nas despesas.

28      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar as recorrentes nas despesas.

III. Questão de direito

29      No recurso, as recorrentes formulam tantos pedidos de anulação parcial da decisão recorrida como de redução do montante da coima que lhes foi aplicada.

A.      Quanto aos pedidos de anulação

30      Em apoio do pedido de anulação, as recorrentes invocam seis fundamentos. O primeiro é relativo à violação dos direitos de defesa e do direito a um processo equitativo. O segundo é relativo a incompetência da Comissão para punir uma infração cometida em Estados terceiros e sem incidência no EEE. O terceiro é relativo a erro de apreciação e a violações do dever de fundamentação e do direito à presunção de inocência consagrado no artigo 6.o, n.o 2, da Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais assinada em Roma em 4 de novembro de 1950 (a seguir «CEDH»), e no artigo 48.o, n.o 1, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta»), por referência ao artigo 6.o, n.os 2 e 3, TUE, devido à errada imputação aos recorrentes de uma responsabilidade pela sua alegada participação numa infração única e continuada. O quarto é relativo a um incumprimento do dever de inquérito, devido a erros de facto e à desvirtuação de provas relativas à alegada participação das recorrentes no cartel e ainda a uma violação do dever de fundamentação. O quinto fundamento é relativo a uma violação «do direito substantivo» devido a uma aplicação errada do artigo 101.o TFUE e/ou do artigo 53.o do Acordo EEE. O sexto fundamento é relativo a uma violação do artigo 23.o, n.os 2 e 3, do Regulamento n.o 1/2003, e dos princípios da igualdade de tratamento e da proporcionalidade, a erro de fundamentação, a vários erros de apreciação e a desvio de poder no cálculo do montante da coima aplicada às recorrentes.

1.      Quanto ao primeiro fundamento, relativo a violações dos direitos de defesa e do direito a um processo equitativo

31      O primeiro fundamento tem duas vertentes. A primeira vertente é relativa a uma violação do direito a um processo equitativo, devido à recusa da Comissão de transmitir às recorrentes os pedidos de informações e a comunicação de acusações em alemão. A segunda vertente é relativa a uma violação dos direitos de defesa pela recusa da Comissão de facultar às recorrentes o acesso às respostas de outras empresas à comunicação de acusações que potencialmente continham informações ilibatórias.

a)      Quanto à notificação em inglês dos pedidos de informações e da comunicação de acusações

32      As recorrentes alegam que a Comissão violou o seu direito a um processo equitativo e os seus direitos de defesa ao notificar‑lhes os pedidos de informações e a comunicação de acusações exclusivamente em inglês, apesar de a Brugg Kabel ter pedido por várias vezes para comunicar em alemão.

33      As recorrentes alegam que, por força do direito a um processo equitativo, do princípio do respeito dos direitos de defesa e do artigo 6.o, n.o 3, alínea a), da CEDH, quando a Comissão se dirige a uma sociedade com sede social no território de um Estado não pertencente ao EEE, tem de utilizar a língua oficial desse Estado, quando essa língua faça parte das línguas oficiais da União Europeia e, além disso, essa língua faça parte das línguas de trabalho da Comissão. Consequentemente, conforme se esclarece, de resto, no documento da Comissão intitulado «Antitrust Manual of Procedures», no caso de uma sociedade, como a Brugg Kabel, com sede social no cantão de Argóvia (Suíça), em que a língua oficial é o alemão, a Comissão era obrigada a utilizar essa língua ou a obter uma dispensa por parte dessa sociedade até à comunicação de acusações.

34      Ora, no caso, depois de a Comissão se ter inicialmente dirigido à Brugg Kabel em inglês, uma funcionária da Direção Geral da Concorrência da Comissão indicou aos representantes dessa sociedade, num conversa telefónica em 23 de outubro de 2009, que a Comissão não podia dar resposta favorável ao seu pedido de lhe ser transmitida uma versão alemã do seu pedido de informações de 20 de outubro de 2009, pelo facto de essa sociedade não ter a sua sede social num Estado‑Membro da União. Segundo as recorrentes, foi só no seguimento dessa recusa que os representantes da mesma sociedade requereram uma tradução apenas parcial desse pedido de informações, conforme resulta da carta dirigida à Comissão em 27 de outubro de 2009. Ao contrário do que alega a Comissão, a sociedade em causa não esperou pela audição com o auditor para pedir que se lhe dirigisse em alemão. Além disso, a vontade da sociedade em causa de utilizar o alemão como língua de processo resultava claramente do facto de ela ter respondido nessa língua a todos os pedidos de informações e à comunicação de acusações.

35      Afirmam que a recusa da Comissão de notificar à Brugg Kabel os pedidos de informações e a comunicação de acusações em alemão exigiu períodos de tradução de inglês para alemão, que levaram a uma redução do tempo geralmente dedicado à sua defesa. As recorrentes alegam a esse respeito que, ao contrário do que alega a Comissão, o conhecimento de inglês nessa sociedade não dava resposta às exigências do artigo 6.o, n.o 3, alínea a), da CEDH. Pelo contrário, tanto o trabalho quotidiano como as reuniões dos dirigentes e as reuniões dos controladores de gestão decorrem regularmente em alemão. Do mesmo modo, segundo as recorrentes, o alemão era a língua em que eram redigidos a correspondência interna dessa sociedade e os documentos internos, como os relatórios anuais ou o manual de direção, que eram seguidamente traduzidos para inglês por um prestador de serviços externo. Por último, é indiferente que os contactos controvertidos entre a Brugg Kabel e os outros produtores de cabos elétricos se processassem essencialmente em inglês, na medida em que eram a exposição puramente técnica de um colaborador na linguagem profissional dos produtores de cabos elétricos, ao passo que a comunicação de acusações continha imputações complexas que a sociedade em causa deveria ter a possibilidade de compreender na perfeição a fim de poder estudá‑las do ponto de vista técnico e jurídico.

36      Por outro lado, as recorrentes alegam que a Comissão violou igualmente os seus direitos de defesa no Tribunal Geral ao utilizar na contestação citações em inglês e em francês sem a respetiva tradução, como exige o artigo 35.o, n.o 3, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral de 2 de maio de 1991. Afirmam que não era possível sanar essa falta de tradução na tréplica, pois essa regularização não é admissível na medida em que elas já tinham feito a alegação de violação da língua de processo na petição. Resulta daí que todas as passagens da contestação que contêm essas citações devem ser excluídas por ser inadmissíveis.

37      A Comissão contesta a argumentação das recorrentes.

38      A esse respeito, há que lembrar que, embora a CEDH não constitua, enquanto a União a ela não tiver aderido, um instrumento jurídico formalmente integrado no ordenamento jurídico da União, o artigo 6.o, n.o 3, TUE, dispõe que os direitos fundamentais reconhecidos nessa convenção fazem parte do direito da União como princípios gerais e o artigo 52.o, n.o 3, da Carta impõe que sejam dados aos direitos nela contidos que correspondam a direitos garantidos por essa convenção o mesmo sentido e alcance que lhes esta lhes confere (v., neste sentido, Acórdão de 18 de julho de 2013, Schindler Holding e o./Comissão, C‑501/11 P, EU:C:2013:522, n.o 32 e jurisprudência aí referida).

39      Há que lembrar igualmente que, de acordo com o artigo 6.o, n.o 3, alínea a), da CEDH, o acusado tem direito a ser informado, no mais curto prazo, em língua que entenda e de forma minuciosa, da natureza e da causa da acusação contra ele formulada.

40      Há que lembrar ainda que, de acordo com a jurisprudência, a Comissão não pode ser qualificada de «tribunal» na aceção do artigo 6.o da CEDH (v. Acórdão de 10 de março de 1992, Shell/Comissão, T‑11/89, EU:T:1992:33, n.o 39 e jurisprudência aí referida). Além disso, o respeito do artigo 6.o da CEDH não exclui a possibilidade de, num procedimento de natureza administrativa, ser aplicada uma «pena» primeiro por uma autoridade administrativa que não preenche por si própria as condições previstas no artigo 6.o, n.o 1, da CEDH, desde que a decisão dessa autoridade seja sujeita à posterior fiscalização de um órgão judicial de plena jurisdição (v., neste sentido, Acórdão de 18 de julho de 2013, Schindler Holding e o./Comissão, C‑501/11 P, EU:C:2013:522, n.o 35). Daí resulta que as recorrentes não podem invocar contra a Comissão uma violação do artigo 6.o da CEDH.

41      Contudo, há que lembrar igualmente que, de acordo com a jurisprudência, o respeito dos direitos de defesa, que o artigo 41.o da Carta faz um elemento consubstancial do direito a uma boa administração, tem de ser observado em todas as circunstâncias, nomeadamente em qualquer procedimento suscetível de levar a sanções, mesmo que seja um procedimento administrativo. A esse título, exige que as empresas e as associações de empresas em causa tenham a possibilidade, logo na fase do procedimento administrativo, de darem utilmente a conhecer o seu ponto de vista sobre a realidade e a relevância dos factos, acusações e circunstâncias alegados pela Comissão (v. Acórdão de 27 de setembro de 2012, Shell Petroleum e o./Comissão, T‑343/06, EU:T:2012:478, n.os 82 e 88 e jurisprudência aí referida).

42      Resulta igualmente da jurisprudência que os direitos de defesa das empresas envolvidas num procedimento administrativo suscetível de levar a sanções devem igualmente ser respeitados pela Comissão durante a tramitação dos procedimentos de inquérito prévio, pois é necessário evitar que esses direitos possam ser irremediavelmente comprometidos no âmbito desses procedimentos, incluindo nomeadamente as inspeções, que podem ter um caráter determinante na fixação da prova do caráter ilícito de comportamentos de empresas capazes de dar origem à sua responsabilidade (Acórdão de 14 de novembro de 2012, Nexans France e Nexans/Comissão, T‑135/09, EU:T:2012:596, n.o 41).

43      É à luz dos princípios acima lembrados nos n.os 38 a 42 que se deve verificar se o envio de pedidos de informações e da notificação da comunicação de acusações em inglês às recorrentes violou os seus direitos de defesa.

44      Primeiro, quanto ao envio dos pedidos de informações em inglês, refira‑se que, como acima se refere no n.o 42, a obrigação de a Comissão respeitar os direitos de defesa nos inquéritos prévios à abertura propriamente dita do procedimento em matéria de cartel visa evitar que sejam irremediavelmente violados esses direitos nesses inquéritos. É por essa razão que o respeito dos direitos de defesa deve ser observado pela Comissão, nomeadamente nas inspeções, uma vez que estas podem ter um caráter determinante na fixação da prova do caráter ilícito de comportamentos de empresas capazes de dar origem à sua responsabilidade.

45      Há que considerar que essa lógica é igualmente aplicável aos pedidos de informações dirigidos pela Comissão às empresas em causa no momento do inquérito prévio, uma vez que as respostas a esses pedidos podem ser utilizadas pela Comissão, como no caso, para fazer prova do caráter ilícito do comportamento dessas empresas.

46      Contudo, não se pode deixar de observar que, embora os pedidos de informações de 7 de abril de 2009, de 20 de outubro de 2009, de 31 de março de 2010 e de 29 de novembro de 2010, dirigidos pela Comissão à Brugg Kabel estivessem redigidos em inglês, resulta dos autos que as recorrentes tiveram condições para compreender suficientemente os pedidos em causa para responder a cada um deles. De resto, saliente‑se que a Brugg Kabel só pediu a tradução de certas passagens do pedido da Comissão de 20 de outubro de 2009 e que, depois de a Comissão ter fornecido essas traduções, a Brugg Kabel respondeu a esse pedido de informações. Há que salientar igualmente que a Comissão de modo nenhum exigiu que a Brugg Kabel respondesse aos pedidos de informações em inglês. Assim, não se pode deixar de observar que a Brugg Kabel tinha condições para dar utilmente o seu ponto de vista quanto às informações pedidas pela Comissão.

47      Do mesmo modo, na medida em que a argumentação das recorrentes possa ser interpretada no sentido de que a recusa da Comissão de dirigir os pedidos de informações à Brugg Kabel em alemão, como se refere na sua carta de 27 de outubro de 2009, constitui uma violação do artigo 41.o, n.o 4, da Carta, não convence. Com efeito, esta disposição refere o direito de qualquer pessoa se dirigir às instituições numa língua dos Tratados e de receber uma resposta nessa língua. Ora, não se pode deixar de observar que, no caso, foi a Comissão que se dirigiu à Brugg Kabel pedindo uma resposta desta e não o contrário.

48      Segundo, quanto à notificação da comunicação de acusações em inglês, refira‑se que, embora o respeito dos direitos de defesa se imponha à Comissão no âmbito de um inquérito prévio, também se impõe, por maioria de razão, depois da abertura formal de um procedimento administrativo suscetível de levar à adoção de sanções contra as empresas em causa, como acima referido no n.o 42.

49      Contudo, no caso, independentemente do nível exato de compreensão de inglês que pudessem ter o pessoal e os dirigentes das recorrentes, não se pode deixar de observar que, como resulta da carta dirigida pela Brugg Kabel à Comissão em 1 de setembro de 2011, estas não pediram um prazo suplementar para responder à comunicação de acusações por razões de tradução, mas a fim de dispor de tempo suplementar para analisar em pormenor todos os documentos do processo e as numerosas alegações contidas na comunicação de acusações e tendo em conta os recursos limitados que podiam afetar a essa missão. Ora, é difícil acreditar que, se as recorrentes tinham dificuldades em compreender a versão inglesa da comunicação de acusações ou necessitavam de mais tempo para a traduzir, não teriam mencionado essas circunstâncias para fundamentar o seu pedido de prorrogação do prazo de resposta à comunicação de acusações. Também não se pode deixar de observar que conseguiram responder à comunicação de acusações, mesmo apesar de a sua resposta estar redigida em alemão, o que, também isso, demonstra que as recorrentes tinham um conhecimento suficiente de inglês para compreender a natureza e a causa da acusação feita contra elas e tomar utilmente posição a esse respeito.

50      Em face destas considerações, improcede a argumentação das recorrentes assente em violação dos direitos de defesa no procedimento administrativo por causa da notificação às recorrentes dos pedidos de informações e da comunicação de acusações em inglês.

51      Por outro lado, quanto à alegada violação dos direitos de defesa das recorrentes no âmbito do presente procedimento jurisdicional, refira‑se desde logo que só pode ser rejeitada por irrelevante, na medida em que é apresentada em apoio de um fundamento relativo à violação dos direitos de defesa da Brugg Kabel no âmbito do procedimento administrativo.

52      De resto, não colhe a argumentação das recorrentes no sentido de serem julgadas inadmissíveis certas passagens da contestação pelo facto de, ao não respeitarem a língua de processo, violarem os seus direitos de defesa.

53      A esse respeito, está assente que a língua de processo no presente processo é o alemão. Além disso, resulta do artigo 35.o, n.o 3, primeiro e segundo parágrafos, do Regulamento de Processo de 2 de maio de 1991, aplicável à data da apresentação da contestação, que a língua de processo deve ser usada nomeadamente nos articulados e alegações das partes, incluindo as peças e documentos anexos e que qualquer peça e qualquer documento apresentado ou anexo numa língua que não seja a língua de processo deve ser acompanhado de uma tradução na língua de processo.

54      Daí resulta que a Comissão era obrigada a fornecer uma tradução na língua de processo das passagens citadas noutra língua na contestação. A Comissão não pode subtrair‑se a essa obrigação unicamente por existir uma tradução de algumas dessas passagens na decisão recorrida anexa à petição ou por outras passagens serem extratos dos anexos da petição ou ainda por serem declarações de um trabalhador das recorrentes.

55      Ora, não se pode deixar de observar que a Comissão sanou essa irregularidade formal ao juntar a tradução dessas passagens nos anexos da tréplica.

56      Além disso, ao contrário do que alegam as recorrentes, o facto de já terem arguido na petição uma alegação de inobservância da língua de processo não se opunha a essa regularização. Com efeito, basta referir que essa alegação era relativa à língua utilizada pela Comissão no procedimento administrativo, que não pode prejudicar a língua de processo no âmbito do processo jurisdicional.

57      Daí resulta que as passagens da contestação redigidas numa língua diferente da língua de processo não podem ser julgadas inadmissíveis.

58      Em face destas considerações, improcede a primeira vertente do primeiro fundamento.

b)      Quanto à recusa da Comissão de facultar acesso às respostas dos outros destinatários da comunicação de acusações

59      As recorrentes acusam a Comissão de ter violado os seus direitos de defesa ao recusar‑lhes o acesso, ou dar acesso ao seu advogado, à versão não confidencial das respostas dos outros destinatários da comunicação de acusações, com exceção de um acesso extremamente restrito às respostas da ABB e da J‑Power Systems, apesar de conterem elementos de prova ilibatória relativos, em particular, ao objeto da reunião de 14 de dezembro de 2001 em Divonne‑les‑Bains (França), erradamente considerada pela Comissão como o início da participação da Brugg Kabel na infração, e à interrupção da participação desta última na infração em 2005.

60      As recorrentes alegam que a divulgação das respostas dos outros destinatários da comunicação de acusações se justificava ainda mais quando, por um lado, como já decidiu o Tribunal de Justiça no Acórdão de 7 de janeiro de 2004, Aalborg Portland e o./Comissão (C‑204/00 P, C‑205/00 P, C‑211/00 P, C‑213/00 P, C‑217/00 P e C‑219/00 P, EU:C:2004:6), não cabe à Comissão decidir só por si quais são os elementos relevantes para a sua defesa, o que, de resto, ela não tem condições para fazer, e, por outro, quando lhes é imputada a participação numa infração única e continuada, que leva a considerá‑las responsáveis por práticas de outras empresas em que não participaram e de que eventualmente nem mesmo tinham conhecimento.

61      Segundo as recorrentes, ao contrário do que alega a Comissão, o seu acesso às respostas dos outros destinatários da comunicação de acusações suscetíveis de conter elementos ilibatórios não teria o efeito, no caso presente, de retardar indefinidamente a adoção do encerramento do procedimento administrativo, uma vez que a Comissão já tinha facultado esse acesso a outros destinatários da comunicação de acusações.

62      Por outro lado, as recorrentes alegam que não se lhes pode exigir que, para demonstrarem que os documentos com informações potencialmente ilibatórias seriam úteis à sua defesa, deem indicações precisas sobre o conteúdo desses documentos a que, por definição, não tiveram acesso. A exigência de um começo de prova a esse respeito, conforme resulta do Acórdão de 27 de setembro de 2012, Shell Petroleum e o./Comissão (T‑343/06, EU:T:2012:478), referida pela Comissão, visa aligeirar o ónus da prova das empresas a que a Comissão recusou acesso a um documento ilibatório e não deve ser interpretada de forma a impossibilitar essa prova. As recorrentes entendem que, no caso, basta que indiquem, o que fizeram, que as respostas dos outros destinatários da comunicação de acusações eram suscetíveis de confirmar que nenhum alegado participante no cartel fazia referência à reunião de 14 de dezembro de 2001 em Divonne‑les‑Bains como uma «reunião R» em que a Brugg Kabel tivesse participado na execução do cartel.

63      A Comissão contesta a argumentação das recorrentes.

64      A esse respeito, em primeiro lugar, quanto à tese das recorrentes segundo a qual a Comissão era obrigada a dar‑lhes acesso às respostas dos outros destinatários da comunicação de acusações pelo facto de não lhe caber decidir sozinha da relevância dos documentos no âmbito do procedimento para a sua defesa, não se pode deixar de observar que não colhe.

65      Com efeito, há que lembrar que, nos termos do artigo 27.o, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1/2003, antes de tomar as decisões previstas nos artigos 7.o, 8.o e 23.o e no artigo 24.o, n.o 2, desse regulamento, a Comissão deve dar às empresas e associações de empresas objeto do procedimento levado a cabo pela Comissão a oportunidade de dar a conhecer o seu ponto de vista a respeito das acusações feitas pela Comissão. Essa mesma disposição refere que «[a] Comissão deve basear as suas decisões apenas em acusações sobre as quais as partes tenham tido oportunidade de apresentar as suas observações» e que «[o]s autores das denúncias são estreitamente associados ao processo».

66      Assim, o acesso ao processo, nos processos de concorrência, tem nomeadamente por objeto permitir aos destinatários da comunicação de acusações tomarem conhecimento dos elementos de prova que constam do processo da Comissão, para se poderem pronunciar utilmente sobre as conclusões a que chegou a Comissão na comunicação de acusações com base nesses elementos (Acórdão de 2 de outubro de 2003, Corus UK/Comissão, C‑199/99 P, EU:C:2003:531, n.o 125). O acesso ao processo faz parte, portanto, das garantias processuais destinadas a proteger os direitos de defesa e a garantir, em particular, o exercício efetivo do direito de audiência.

67      De acordo com a jurisprudência, o direito de acesso ao processo implica que a Comissão dê à empresa em causa a possibilidade de proceder a um exame da totalidade dos documentos que constam do processo instrutor e que possam ser relevantes para a sua defesa. Estes abrangem tanto os documentos acusatórios como os ilibatórios, sem prejuízo dos segredos de negócios de outras empresas, dos documentos internos da Comissão e de outras informações confidenciais (Acórdão de 7 de janeiro de 2004, Aalborg Portland e o./Comissão, C‑204/00 P, C‑205/00 P, C‑211/00 P, C‑213/00 P, C‑217/00 P e C‑219/00 P, EU:C:2004:6, n.o 68 e jurisprudência aí referida).

68      Contudo, é só no início da fase contraditória administrativa que a empresa em causa é informada, através da comunicação de acusações, de todos os elementos essenciais em que a Comissão se baseia nessa fase do procedimento e essa empresa dispõe de um direito de acesso ao processo a fim de garantir o exercício efetivo dos seus direitos de defesa. Consequentemente, a resposta das outras partes à comunicação de acusações não está, em princípio, incluída no conjunto dos documentos do processo instrutor que podem ser consultados pelas partes (Acórdãos de 30 de setembro de 2009, Hoechst/Comissão, T‑161/05, EU:T:2009:366, n.o 163; de 12 de julho de 2011, Toshiba/Comissão, T‑113/07, EU:T:2011:343, n.o 42; e de 12 de julho de 2011, Mitsubishi Electric/Comissão, T‑133/07, EU:T:2011:345, n.o 41).

69      Não obstante, se a Comissão tencionar basear‑se numa passagem de uma resposta à comunicação de acusações ou num documento anexo a essa resposta para demonstrar a existência de uma infração num procedimento de aplicação do artigo 101.o, n.o 1, TFUE, ou do artigo 53.o, n.o 1, do Acordo EEE, as outras empresas envolvidas nesse procedimento devem ter a possibilidade de se pronunciarem sobre esse elemento de prova. Com efeito, nestas circunstâncias, essa passagem de uma resposta à comunicação de acusações ou o documento anexo a essa resposta constitui um elemento acusatório contra as diferentes empresas que participaram na infração (Acórdãos de 12 de julho de 2011, Toshiba/Comissão, T‑113/07, EU:T:2011:343, n.o 43, e de 12 de julho de 2011, Mitsubishi Electric/Comissão, T‑133/07, EU:T:2011:345, n.o 42).

70      Por analogia, se uma passagem de uma resposta a uma comunicação de acusações ou um documento anexo a essa resposta for suscetível de ser relevante para a defesa de uma empresa por lhe permitir invocar elementos que não concordam com as deduções feitas nessa fase pela Comissão, constitui um elemento ilibatório. Neste caso, a empresa em causa deve ter a possibilidade de proceder a um exame dessa passagem ou desse documento e de se pronunciar a seu respeito (Acórdãos de 12 de julho de 2011, Toshiba/Comissão, T‑113/07, EU:T:2011:343, n.o 44, e de 12 de julho de 2011, Mitsubishi Electric/Comissão, T‑133/07, EU:T:2011:345, n.o 43).

71      Por outro lado, há que lembrar que o n.o 8 da Comunicação da Comissão relativa às regras de acesso ao processo nos casos de aplicação dos artigos 101.o e 102.o [CE], artigos 53.o, 54.o e 57.o do Acordo EEE e do Regulamento (CE) n.o 139/2004 do Conselho (JO 2005, C 325, p. 7) dispõe que o «processo da Comissão» numa investigação de concorrência é composto por todos os documentos obtidos, elaborados ou recolhidos pela Direção‑Geral da Concorrência da Comissão durante a investigação. O n.o 27 dessa comunicação precisa o seguinte:

«O acesso ao processo será concedido mediante pedido, normalmente uma única vez, na sequência da notificação às partes da comunicação de objeções da Comissão, por forma a garantir o princípio da paridade de meios e para proteger os seus direitos de defesa. Por conseguinte, regra geral não será concedido acesso às respostas das outras partes às objeções da Comissão.

Contudo, uma parte terá acesso aos documentos recebidos após a notificação da comunicação de objeções em fases posteriores do procedimento administrativo, quando tais documentos possam constituir novos elementos de prova — quer de acusação quer de defesa — no que se refere às alegações formuladas relativamente a essa parte na comunicação de objeções da Comissão. Trata‑se, em especial, de casos em que a Comissão pretende utilizar novos elementos de prova.»

72      Daí resulta que, ao contrário do que alegam as recorrentes, é à Comissão que cabe proceder a uma primeira apreciação do caráter potencialmente ilibatório das informações contidas nos documentos recebidos depois da comunicação de acusações, quando uma empresa envolvida pede acesso a esses documentos.

73      A esse respeito, as recorrentes não podem invocar a jurisprudência segundo a qual não cabe só à Comissão, que notifica as acusações e toma a decisão de aplicação de uma sanção, determinar os documentos úteis à defesa da empresa em causa, na medida em que consideração, relativa aos documentos do processo constituído pela Comissão, não se pode aplicar a respostas dadas por outras partes às acusações por ela comunicadas (Acórdão de 27 de setembro de 2012, Shell Petroleum e o./Comissão, T‑343/06, EU:T:2012:478, n.o 89).

74      Por outro lado, há que rejeitar igualmente a tese das recorrentes de que o facto de lhes ser imputada a participação numa infração única e continuada justificava que lhes fosse concedido o acesso às respostas dos outros destinatários da comunicação de acusações para poderem identificar por si próprias elementos de prova ilibatória nessas respostas. Com efeito, basta referir que, nos processos que deram origem aos Acórdãos de 12 de julho de 2011, Toshiba/Comissão (T‑113/07, EU:T:2011:343), de 12 de julho de 2011, Mitsubishi Electric/Comissão (T‑133/07, EU:T:2011:345), e de 27 de setembro de 2012, Shell Petroleum e o./Comissão (T‑343/06, EU:T:2012:478), imputava‑se igualmente às recorrentes a sua participação numa infração única e continuada.

75      Em segundo lugar, quanto ao argumento das recorrentes de que, em substância, a Comissão violou os seus direitos de defesa ao recusar, com base numa apreciação errada da relevância para a sua defesa das informações contidas nas respostas dos outros destinatários da comunicação de acusações, dar‑lhes acesso à versão não confidencial dessas respostas, não se pode deixar de observar que também não colhe.

76      Há que lembrar que se um documento na posse da Comissão, que possa ser qualificado de elemento ilibatório por ser suscetível de ilibar uma empresa à qual é imputada a participação num cartel, não for comunicado a essa empresa, os direitos de defesa dessa empresa são violados se essa empresa demonstrar que esse elemento poderia ter sido útil para a sua defesa (v., neste sentido, Acórdão de 19 de dezembro de 2013, Siemens e o./Comissão, C‑239/11 P, C‑489/11 P e C‑498/11 P, não publicado, EU:C:2013:866, n.o 367).

77      Essa prova pode ser fornecida demonstrando que a não divulgação pode ter influenciado, em detrimento da empresa em causa, o decurso do procedimento e o teor da decisão da Comissão, ou ainda que pode ter prejudicado ou dificultado a defesa dos interesses dessa empresa no procedimento administrativo (Acórdão de 19 de dezembro de 2013, Siemens e o./Comissão, C‑239/11 P, C‑489/11 P e C‑498/11 P, não publicado, EU:C:2013:866, n.o 368).

78      A possibilidade de um documento não divulgado ter influenciado o decurso do processo e o conteúdo da decisão da Comissão só pode ser demonstrada através de um exame provisório de determinados meios do qual resulte que os documentos não divulgados podiam ter tido — em relação a esses meios de prova — uma importância que não deveria ter sido menosprezada (Acórdão de 14 de março de 2013, Fresh Del Monte Produce/Comissão, T‑587/08, EU:T:2013:129, n.o 688).

79      A esse respeito, não se pode exigir que os recorrentes que tenham suscitado um fundamento relativo à violação dos seus direitos de defesa desenvolvam na petição uma argumentação elaborada ou pormenorizem um conjunto de indícios para demonstrar que o procedimento administrativo poderia ter levado a um resultado diferente se tivessem tido acesso a certos elementos que, na realidade, nunca lhes foram comunicados. Com efeito, esse critério traduzir‑se‑ia em exigir‑lhes uma probatio diabolica (Acórdão de 14 de março de 2013, Fresh Del Monte Produce/Comissão, T‑587/08, EU:T:2013:129, n.o 689).

80      Contudo, cabe ao recorrente fornecer um primeiro indício da utilidade, para a sua defesa, dos documentos não comunicados (Acórdão de 14 de março de 2013, Fresh Del Monte Produce/Comissão, T‑587/08, EU:T:2013:129, n.o 690).

81      Há que verificar, portanto, se, no caso, os argumentos avançados pelas recorrentes fornecem um primeiro indício da utilidade das respostas dos outros destinatários da comunicação de acusações para a sua defesa.

82      As recorrentes alegam que o acesso às respostas dos outros destinatários da comunicação de acusações lhes teria permitido provar um facto negativo, a saber, que nem a Pirelli nem a Nexans France tinham indicado que a reunião de 14 de dezembro de 2001 em Divonne‑les‑Bains, que constitui o ponto de partida da participação das recorrentes no cartel segundo a Comissão, era uma reunião R. Afirmam que o acesso a essas respostas lhes deu igualmente a possibilidade de confirmar que os outros membros do cartel tinham consciência de que elas tinham interrompido a sua participação no cartel em 2005.

83      Primeiro, quanto à reunião de 14 de dezembro de 2001 em Divonne‑les‑Bains, refira‑se que, ao contrário do que alega a Comissão, o facto de essa reunião ter sido mencionada no seu pedido de informações de 31 de março de 2010 e de as recorrentes terem tido acesso às respostas dos outros destinatários desse pedido de informações não priva de interesse o seu pedido de acesso às respostas dos outros destinatários da comunicação de acusações. Com efeito, o conteúdo das respostas da Nexans France e da Pirelli ao pedido de informações da Comissão de 31 de março de 2010, em que esses participantes no cartel simplesmente não tomaram posição sobre a sua participação na reunião de 14 de dezembro de 2001 em Divonne‑les‑Bains e sobre o objeto dessa reunião não permite julgar antecipadamente a sua posição a esse respeito na sua resposta à comunicação de acusações.

84      Contudo, há que referir que o facto de os outros participantes no cartel não se terem expressado nas suas respostas à comunicação de acusações sobre a natureza da reunião de 14 de dezembro de 2001 em Divonne‑les‑Bains, admitindo‑o demonstrado, não é, só por si, suscetível de dar suporte à defesa das recorrentes.

85      Com efeito, está assente que, na comunicação de acusações, a Comissão indicou que tinha sido organizada uma reunião R em Divonne‑les‑Bains em 14 de dezembro de 2001 e que os participantes nessa reunião eram em todos os casos, a Nexans France, representada por J., a Sagem, representada por V. e a Brugg Kabel, representada por N.

86      Ora, o facto de, face a essa acusação, a Nexans France e a Sagem não terem tentado eventualmente impugnar a natureza da reunião de 14 de dezembro de 2001 em Divonne‑les‑Bains nas suas respostas à comunicação de acusações vai mais no sentido de demonstrar que reconheciam os factos que lhes eram imputados pela Comissão a esse respeito.

87      Por outro lado, na medida em que a argumentação das recorrentes visa igualmente a alegada falta de uma tomada de posição da Pirelli sobre a natureza da reunião de 14 de dezembro de 2001 em Divonne‑les‑Bains, tendo as recorrentes admitido a participação da Pirelli nessa reunião nas suas próprias respostas à comunicação de acusações (v., adiante, n.o 156), não se pode deixar de observar que esta não pode proceder. Com efeito, uma vez que a Comissão não acusou a Pirelli de ter tomado parte nessa reunião na comunicação de acusações, a falta de uma tomada de posição desta última quanto à natureza dessa reunião não pode, seja como for, ser interpretada como a confirmação de que essa reunião tinha ou não caráter anticoncorrencial.

88      Segundo, quanto à argumentação das recorrentes de que as respostas dos outros destinatários da comunicação de acusações continham elementos capazes de demonstrar que tinham interrompido a sua participação no cartel em 2005, refira‑se que tem falta de precisão. Com efeito, as recorrentes não indicam quais são os factos que as respostas dos outros destinatários da comunicação de acusações deveriam demonstrar ou quais são as alegações específicas da Comissão contidas na comunicação de acusações relativas à sua participação no cartel em 2005 que essas respostas poderiam pôr em causa. Do mesmo modo, as recorrentes não explicam por que razão consideram que se poderiam encontrar elementos ilibatórios relativos à sua participação no cartel em 2005 nas respostas de todos os destinatários da comunicação de acusações.

89      Assim, há que considerar que os argumentos das recorrentes não são suscetíveis de fornecer um primeiro indício da utilidade, para a sua defesa, das respostas dos outros destinatários da comunicação de acusações que não lhes foram comunicadas.

90      Em face da jurisprudência acima lembrada no n.o 73, há que julgar igualmente improcedente o argumento das recorrentes suscitado na audiência, segundo o qual o facto de a Comissão não ter preparado uma versão não confidencial das respostas de todos os destinatários da comunicação de acusações, de forma a permitir eventualmente comunicar à empresa em causa os elementos ilibatórios que podiam conter a respeito de uma empresa, demonstraria que, no caso, a Comissão não respeitou o princípio da igualdade de armas.

91      Há que julgar, pois, improcedente a segunda vertente do primeiro fundamento e, com ela, o próprio fundamento na íntegra.

2.      Quanto ao segundo fundamento, relativo a incompetência da Comissão para punir uma infração cometida em Estados terceiros e sem incidência no EEE

92      As recorrentes alegam que a Comissão não tinha competência para aplicar o artigo 101.o TFUE às práticas levadas a cabo fora do EEE e aos projetos a realizar fora do EEE, uma vez que não tinham incidência no EEE. Na falta de prova de que as práticas relativas a cada um desses projetos tinham efeitos imediatos, substanciais e previsíveis no EEE, na aceção da jurisprudência, a Comissão não podia simplesmente associar essas atribuições à infração única e continuada para basear a sua competência extraterritorial, a menos que se permita conferir a esta um caráter ilimitado.

93      A Comissão contesta a argumentação das recorrentes.

94      A esse respeito, quanto à aplicabilidade territorial do artigo 101.o TFUE e do artigo 53.o do Acordo EEE, antes de mais, há que lembrar que a norma de concorrência da União prevista no artigo 101.o TFUE proíbe os acordos e as práticas que tenham por objeto ou por efeito impedir, restringir ou falsear a concorrência «no mercado interno».

95      Por outro lado, refira‑se que os pressupostos de aplicação territorial do artigo 101.o TFUE podem estar reunidos em dois casos.

96      Primeiro, a aplicação do artigo 101.o TFUE é justificada quando as práticas a que se refere são levadas a cabo no território do mercado interno, independentemente do lugar da sua formação. Com efeito, sujeitar a aplicabilidade das proibições decretadas pelo direito da concorrência ao lugar da formação de um cartel levaria evidentemente a dar às empresas um meio fácil de se subtraírem a essas proibições (Acórdão de 27 de setembro de 1988, Ahlström Osakeyhtiö e o./Comissão, 89/85, 104/85, 114/85, 116/85, 117/85 e 125/85 à 129/85, EU:C:1988:447, n.o 16).

97      Segundo, como o Tribunal de Justiça já decidiu, a aplicação do artigo 101.o TFUE é igualmente justificada quando seja previsível que as práticas aí previstas produzem um efeito imediato e substancial no mercado interno (Acórdão de 25 de novembro de 1971, Béguelin Import, 22/71, EU:C:1971:113, n.o 11). A esse respeito, refira‑se que esse critério prossegue o mesmo objetivo do critério que se baseia na execução de um acordo no território da União, a saber, descobrir comportamentos que não foram decididos nesse território mas cujos efeitos anticoncorrenciais são suscetíveis de se fazer sentir no mercado da União.

98      Refira‑se igualmente que os pressupostos da aplicação do artigo 101.o TFUE acima lembrados respetivamente nos n.os 96 e 97 constituem meios alternativos e não cumulativos para demonstrar a competência da Comissão para dar por provada e punir uma infração a essa disposição.

99      Na decisão recorrida, a Comissão entendeu que o pressuposto da execução do cartel no EEE e o pressuposto relativo aos efeitos qualificados por ele produzidos no EEE estavam ambos preenchidos no caso presente (considerandos 467 a 469 da decisão recorrida).

100    Ora, as recorrentes alegam que a Comissão deveria ter demonstrado que cada um dos projetos a realizar fora do EEE tinha suficiente incidência na União para justificar, na aceção da jurisprudência, a aplicabilidade territorial do artigo 101.o TFUE a essa parte da infração em causa.

101    Esta argumentação não colhe.

102    Quanto à execução das práticas do cartel relativas a projetos a realizar fora do EEE, refira‑se que o acordo sobre os «territórios de exportação», segundo o qual os produtores europeus e os produtores asiáticos partilhavam entre si projetos a realizar nesses territórios, foi executado no território do EEE. Assim, resulta do considerando 79 da decisão recorrida e do seu considerando 247, para o qual remete o considerando 468 da decisão recorrida, que a Grécia não fazia parte do «território nacional europeu» na aceção do acordo sobre o «território nacional» e que os projetos implantados na Grécia se inseriam na atribuição dos projetos dentro do respeito da «quota 60/40» nos termos do acordo sobre os «territórios de exportação». Além disso, resulta igualmente dos considerandos 81 e 82 da decisão recorrida que os membros A do cartel consideravam que os projetos que ligavam um Estado‑Membro da União a um Estado terceiro deviam inscrever‑se na quota dos 60% atribuída aos membros R do cartel, à semelhança do projeto que ligava Espanha a Marrocos, referido no considerando 232 da decisão recorrida.

103    Em contrapartida, há que referir igualmente que, uma vez que o comportamento das empresas europeias consistia, nos termos do acordo sobre o «território nacional», em não fazer concorrência em projetos a realizar no «território nacional» das empresas asiáticas não foi, por definição, executada no território do EEE.

104    Contudo, ao contrário do que alegam as recorrentes, daí não resulta que a Comissão tivesse de fazer prova de que cada um dos projetos a realizar fora do EEE, nos termos do acordo sobre o «território nacional», tinha suficiente incidência na União para justificar a aplicabilidade territorial do artigo 101.o TFUE.

105    Com efeito, conforme resulta da jurisprudência acima referida no n.o 97, a Comissão podia basear a aplicabilidade do artigo 101.o TFUE à infração única e continuada tal como dada por provada na decisão recorrida nos seus efeitos previsíveis, imediatos e substanciais no mercado interno.

106    A esse respeito, refira‑se que o artigo 101.o TFUE é suscetível de ser aplicável a práticas e acordos que sirvam um mesmo objetivo anticoncorrencial, quando seja previsível que, em conjunto, essas práticas e acordos têm efeitos imediatos e substanciais no mercado interno. Com efeito, não se pode permitir às empresas subtraírem‑se à aplicação das normas da concorrência combinando vários comportamentos que prosseguem um objetivo idêntico, cada um dos quais, considerado isoladamente, não é suscetível de produzir um efeito substancial na União, mas que, considerados no seu conjunto, são suscetíveis de produzir esse efeito.

107    Ora, há que referir que o objetivo único do cartel consistia em restringir a concorrência nos projetos de cabos elétricos submarinos e subterrâneos de (muito) alta tensão a realizar em territórios específicos, acordando a atribuição de mercados e de clientes e, assim, falseando o processo normal da concorrência no EEE.

108    Daí resulta que, ao contrário do que alegam as recorrentes, é face aos efeitos, em conjunto, das diferentes práticas descritas no considerando 493 da decisão recorrida, incluindo os relativos aos projetos a realizar fora do EEE, que se deve apreciar se o artigo 101.o TFUE era aplicável no caso presente.

109    Ora, há que observar que a Comissão não cometeu qualquer erro ao declarar no considerando 469 da decisão recorrida que os efeitos na concorrência no EEE, incluindo o mercado interno, das práticas e acordos em que os membros do cartel participaram eram previsíveis, substanciais e imediatos.

110    A esse respeito, basta ter em conta os efeitos prováveis de um comportamento na concorrência para estar preenchido o pressuposto da previsibilidade.

111    Quanto ao caráter imediato dos efeitos das práticas em causa no território da União, há que observar que estas tiveram necessariamente influência direta no fornecimento de cabos elétricos de alta e muito alta tensão a realizar nesse território, pois era esse o objetivo das diferentes reuniões e contactos entre os participantes no cartel (considerando 66 da decisão recorrida). Além disso, a repartição feita entre as partes no cartel, ao mesmo tempo diretamente no interior e no exterior desse território, teve efeitos previsíveis na concorrência nesse território, como acertadamente refere a Comissão.

112    Quanto ao caráter substancial dos efeitos na União, há que referir o número e a importância dos produtores que participaram no cartel, que representavam a quase totalidade do mercado, e a ampla gama de produtos afetados pelos diferentes acordos e a gravidade das práticas em causa. Refira‑se igualmente a grande duração da infração única e continuada, que se processou durante dez anos. Todos esses elementos, apreciados em conjunto, concorrem para demonstrar o caráter substancial dos efeitos das práticas em causa no território da União (considerandos 66 e 492, 493 e 620 da decisão recorrida).

113    Assim, há que concluir que a infração única e continuada conforme definida pela Comissão na decisão recorrida se integrava no âmbito de aplicação do artigo 101.o TFUE e que a Comissão era competente para a punir. Nestas circunstâncias, a Comissão não tinha de demonstrar concretamente que estavam preenchidos os pressupostos da aplicação do artigo 101.o TFUE relativamente a cada um dos projetos a realizar fora do EEE.

114    Por outro lado, quanto à alegação das recorrentes de que a Comissão contornou a falta de efeitos no EEE do acordo relativo aos «territórios de exportação» integrando‑o de forma artificial na infração única e continuada de forma a aplicar‑lhe o artigo 101.o TFUE, refira‑se que se traduz, na realidade, em impugnar a existência da infração única e continuada conforme descrita pela Comissão na decisão recorrida e não a aplicabilidade do artigo 101.o TFUE a essa infração.

115    Além disso, há que referir que as recorrentes não apresentam qualquer elemento capaz de sustentar essa alegação, pelo que há que rejeitá‑la como uma simples afirmação.

116    Em face destas considerações, improcede o segundo fundamento.

3.      Quanto ao terceiro fundamento e ao quarto fundamento, relativos a erro de apreciação, violação do direito à presunção de inocência, erros de facto, desvirtuação da prova, e violação do dever de fundamentação, a respeito da alegada participação das recorrentes numa infração única e continuada

117    Em apoio do terceiro fundamento e do quarto fundamento, a analisar conjuntamente, as recorrentes apresentam vários argumentos. Primeiro, criticam a Comissão por ter recorrido ao conceito de infração única para qualificar os diferentes elementos do cartel. Segundo, alegam que a Comissão violou o seu dever de fundamentação quanto ao caráter interrompido da sua participação na infração, além disso, não apresentou suficiente prova quanto ao início da sua participação na infração e à sua duração ininterrupta. Terceiro, criticam a Comissão por lhes ter imputado a responsabilidade por uma infração única e continuada, mesmo apesar de não terem a intenção de contribuir para o conjunto dos objetivos do cartel e de não terem conhecimento de certos comportamentos ilícitos. Quarto, alegam que a Comissão deveria ter demonstrado que elas tinham conhecimento dos acordos relativos a cada um dos projetos ou que podiam prevê‑los, pelo menos relativamente aos mercados nacionais ou aos projetos de cabos elétricos submarinos. Quinto, acusam a Comissão de não ter precisado os projetos que deviam ser objeto de acordo, limitando‑se a utilizar abreviaturas ou designações genéricas e de ter apresentado o mesmo projeto como vários projetos distintos por causa de ligeiras diferenças de designação.

a)      Considerações preliminares

118    Resulta da jurisprudência que cabe à Comissão provar não só a existência do cartel mas também a sua duração. Mais especificamente, no que diz respeito à administração da prova de uma infração ao artigo 101.o, n.o 1, TFUE, a Comissão tem de fazer prova das infrações que declara e tem de fazer prova bastante da existência dos factos constitutivos de uma infração. A existência de uma dúvida no espírito do julgador aproveita à empresa destinatária da decisão que declara a infração. O julgador não pode, portanto, concluir que a Comissão fez prova bastante da existência dessa infração se ainda subsistir no seu espírito uma dúvida quanto a essa questão, nomeadamente em sede de recurso de anulação de uma decisão que aplica uma coima ou de redução do seu montante. Com efeito, nesta última situação, é necessário ter em conta o princípio da presunção de inocência, que faz parte dos direitos fundamentais que são protegidos na ordem jurídica da União e que se encontra consagrado no artigo 48.o, n.o 1, da Carta dos Direitos Fundamentais. Dada a natureza das infrações em causa e a natureza e o grau de gravidade das sanções que lhe estão associadas, o princípio da presunção de inocência aplica‑se, nomeadamente, aos processos relativos a violações das normas da concorrência aplicáveis às empresas e suscetíveis de conduzir à aplicação de coimas ou de sanções pecuniárias compulsórias. Deste modo, é necessário que a Comissão apresente provas precisas e concordantes que fundamentem a firme convicção de que a infração foi cometida (v. Acórdão de 17 de maio de 2013, Trelleborg Industrie e Trelleborg/Comissão, T‑147/09 e T‑148/09, EU:T:2013:259, n.o 50 e jurisprudência aí referida).

119    Contudo, também é jurisprudência assente que não se exige que cada uma das provas apresentadas pela Comissão corresponda necessariamente a estes critérios em relação a cada elemento da infração. Basta que o conjunto de indícios invocado pela instituição, apreciado globalmente, preencha este requisito (v. Acórdão de 17 de maio de 2013, Trelleborg Industrie e Trelleborg/Comissão, T‑147/09 e T‑148/09, EU:T:2013:259, n.o 51 e jurisprudência aí referida).

120    Além disso, é habitual as atividades que os acordos anticoncorrenciais implicam decorrerem clandestinamente, as reuniões serem realizadas secretamente e a documentação que lhes diz respeito ser reduzida ao mínimo. Daí resulta que, mesmo que a Comissão descubra documentos que provem de forma explícita a existência de contactos ilegais entre operadores, como as atas de reuniões, esses documentos estão normalmente fragmentados e dispersos, pelo que, muitas vezes, é necessário reconstituir determinados pormenores por dedução. Assim, na maior parte dos casos, a existência de uma prática ou de um acordo anticoncorrencial deve ser inferida de um certo número de coincidências e de indícios que, considerados em conjunto, possam constituir, na falta de outra explicação coerente, a prova de uma violação das normas da concorrência (Acórdãos de 7 de janeiro de 2004, Aalborg Portland e o./Comissão, C‑204/00 P, C‑205/00 P, C‑211/00 P, C‑213/00 P, C‑217/00 P e C‑219/00 P, EU:C:2004:6, n.os 55 a 57; e de 25 de janeiro de 2007, Sumitomo Metal Industries e Nippon Steel/Comissão, C‑403/04 P e C‑405/04 P, EU:C:2007:52, n.o 51).

121    Além disso, a jurisprudência exige que, na falta de provas que permitam determinar diretamente a duração de uma infração, a Comissão se baseie, pelo menos, em elementos de prova relativos a factos suficientemente próximos no tempo, de modo a que se possa razoavelmente admitir que esta infração perdurou ininterruptamente entre duas datas precisas (Acórdão de 7 de julho de 1994, Dunlop Slazenger/Comissão, T‑43/92, EU:T:1994:79, n.o 79; v., igualmente, Acórdão de 16 de novembro de 2006, Peróxidos Orgánicos/Comissão, T‑120/04, EU:T:2006:350, n.o 51 e jurisprudência aí referida).

b)      Quanto ao caráter único da infração

122    As recorrentes alegam, em substância, que as práticas identificadas pela Comissão não preenchem os critérios de uma infração única e continuada fixados na jurisprudência. Alegam, em particular, que não há qualquer identidade dos produtos e dos serviços, visto os cabos elétricos submarinos e os cabos elétricos subterrâneos representarem mercados distintos, que apenas há uma identidade parcial das empresas participantes na infração, pois elas próprias, a Silec Cable, a Mitsubishi Cable Industries, a SWCC Showa Holdings, a LS Cable & Systemd, a Taihan Electric Wire e a nkt cables não fabricam cabos elétricos submarinos, que apenas há uma identidade parcial das pessoas singulares participantes nos diferentes elementos do cartel, tendo a Pirelli ou a Prysmian, a nkt cables e a ABB enviado sempre representantes diferentes às reuniões relativas aos cabos elétricos submarinos e às reuniões relativas aos cabos elétricos subterrâneos, e que não há identidade das modalidades de execução dos acordos, uma vez que os projetos de cabos elétricos subterrâneos e os projetos de cabos submarinos eram sempre discutidos separadamente e as folhas de posição sobre a «quota 60/40» eram redigidas separadamente consoante o tipo de cabos elétricos. Assinalam igualmente que a Comissão não demonstrou a existência dessa relação de complementaridade entre as diferentes práticas.

123    A Comissão contesta a argumentação das recorrentes.

124    A esse respeito, há que lembrar que, de acordo com jurisprudência constante, a violação do artigo 101.o, n.o 1, TFUE pode resultar não apenas de um ato isolado mas igualmente de uma série de atos ou ainda de um comportamento continuado, mesmo quando um ou mais elementos dessa série de atos ou desse comportamento continuado também possam constituir, por si sós e considerados isoladamente, uma violação dessa disposição. Assim, quando as diferentes ações se inserem num «plano de conjunto», em razão do seu objeto idêntico falseando o jogo da concorrência no interior do mercado comum, a Comissão tem o direito de imputar a responsabilidade dessas ações em função da participação na infração considerada no seu conjunto (Acórdãos de 6 de dezembro de 2012, Comissão/Verhuizingen Coppens, C‑441/11 P, EU:C:2012:778, n.o 41, e de 26 de janeiro de 2017, Villeroy & Boch/Comissão, C‑625/13 P, EU:C:2017:52, n.o 55).

125    A este propósito, a jurisprudência identificou vários critérios relevantes para apreciar o caráter único de uma infração, a saber, a identidade dos objetivos das práticas em causa, a identidade dos produtos e dos serviços em causa, a identidade das empresas participantes e a identidade das formas de execução. Além disso, a identidade das pessoas singulares envolvidas por conta das empresas e a identidade do âmbito de aplicação geográfico das práticas em causa são igualmente elementos que podem ser tomados em conta para efeitos dessa análise (Acórdão de 17 de maio de 2013, Trelleborg Industrie e Trelleborg/Comissão, T‑147/09 e T‑148/09, EU:T:2013:259, n.o 60).

126    No caso, o acordo sobre o «território nacional» e a atribuição dos projetos de cabos elétricos no âmbito da “configuração europeia do cartel» no interior do EEE foram executados concomitantemente, eram reativos aos cabos elétricos submarinos de alta tensão e aos cabos elétricos subterrâneos de alta tensão e envolviam os mesmos produtores europeus e, no que diz respeito a esse acordo e ao acordo sobre os «territórios de exportação», os mesmos produtores sul coreanos e japoneses. Além disso, ao contrário do que alegam as recorrentes, com exceção do caso da Pirelli, as pessoas singulares envolvidas por conta das empresas eram as mesmas em todos os diferentes elementos do cartel. Do mesmo modo, as diferentes medidas participavam num objetivo comum, a saber, a instauração de um sistema de partilha do mercado mundial dos projetos de cabos elétricos de alta tensão, com exceção dos Estados Unidos.

127    Esta conclusão não pode ser posta em causa pelos argumentos das recorrentes.

128    Com efeito, quanto à afirmação de que a infração não pode ser qualificada de infração única, pelo facto de os cabos elétricos subterrâneos de alta tensão e os cabos elétricos submarinos de alta tensão serem produtos distintos correspondentes a necessidades distintas e, afinal, a mercados distintos, primeiro, há que referir que o acordo sobre o «território nacional» não fazia qualquer distinção entre os diferentes tipos de cabos elétricos. Segundo, ao contrário do que alegam as recorrentes, resulta dos exemplos fornecidos pela Comissão quanto ao funcionamento dos mecanismos de controlo da «configuração europeia do cartel» (considerandos 333 a 338, 399 e 400 da decisão recorrida) e da «configuração A/R do cartel» (considerando 106 dessa decisão) que se podia proceder a compensações entre projetos de cabos elétricos subterrâneos de alta tensão e projetos de cabos elétricos submarinos de alta tensão, pelo que, do ponto de vista das empresas partes no cartel, é manifesto que não havia qualquer diferença a esse respeito. Isto é ilustrado pela troca de mensagens de correio eletrónico, cujo conteúdo é mencionado no considerando 399 da decisão recorrida em que A., empregado da Prysmian, indicou a R., empregado da Nexans France, que recusava compensar o benefício da atribuição da parte terrestre de um projeto de cabos elétricos submarinos de alta tensão à Prysmian com outro projeto, mas aceitava a possibilidade de uma subcontratação de acordo com os princípios que regiam a atribuição de um projeto na União, sem se fazer qualquer distinção consoante esses projetos fossem projetos de cabos elétricos submarinos de alta tensão ou projetos de cabos elétricos subterrâneos de alta tensão.

129    O facto de certas empresas partes no cartel, como as recorrentes, não terem a capacidade ou a vontade de tentar obter a atribuição de projetos de cabos elétricos submarinos é irrelevante a esse respeito.

130    Quanto à afirmação das recorrentes de que em reuniões A/R os projetos de cabos elétricos submarinos e os projetos de cabos elétricos subterrâneos eram objeto de reuniões separadas, basta referir que, mesmo embora algumas dessas reuniões abordassem de forma separada os projetos consoante o tipo de cabos elétricos em causa, como demonstram os convites para as reuniões de 11 de setembro de 2003 e de 28 de janeiro de 2004, essa afirmação é desmentida pelo facto de, noutras ocasiões, os projetos de cabos elétricos submarinos e os projetos de cabos elétricos subterrâneos serem discutidos na mesma reunião. Com efeito, em resposta a uma questão do Tribunal, a Comissão juntou um extrato do anexo I da decisão recorrida que continha um certo número de encontros que é certo terem sido relativos tanto aos cabos elétricos subterrâneos como aos cabos elétricos submarinos numa sessão comum. A Comissão precisou que esse extrato não continha nenhuma informação sobre reuniões em que tivesse havido sessões distintas em dias sucessivos ou sobre aquelas em que a organização revelava claramente que os projetos para os cabos elétricos subterrâneos e para os cabos elétricos submarinos tinham sido abordados em sessões diferentes. Assinala, porém, que, mesmo em reuniões desse tipo, os representantes das empresas eram os mesmos para as discussões sobre os cabos elétricos subterrâneos, por um lado, e os cabos elétricos submarinos, por outro. Juntou ainda as provas mencionadas nas notas de rodapé desse anexo, nas quais se baseia para afirmar que os projetos de cabos elétricos de alta tensão submarinos e os projetos de cabos elétricos de alta tensão subterrâneos eram discutidos em sessões comuns durante essas reuniões.

131    Convidadas pelo Tribunal a tomar posição sobre esses documentos na audiência, as recorrentes limitaram‑se a indicar que, visto não terem participado nas reuniões A/R, não tinham a possibilidade de comentar o seu funcionamento.

132    Ora, resulta da prova feita pela Comissão que os projetos de cabos elétricos de alta tensão submarinos e os projetos de cabos elétricos de alta tensão subterrâneos foram objeto de discussões nas sessões comuns ao longo de pelo menos treze reuniões A/R organizadas entre 22 de fevereiro de 2001 e 27 de março de 2003. Isto basta para rejeitar o argumento das recorrentes de que os projetos de cabos elétricos submarinos e os projetos de cabos elétricos subterrâneos eram objeto de reuniões separadas nessas reuniões.

133    Quanto ao argumento das recorrentes de que, nas reuniões dos membros R do cartel, os projetos de cabos elétricos submarinos e os projetos de cabos elétricos subterrâneos eram igualmente objeto de discussões separadas, refira‑se que não invocam qualquer prova disso.

134    A esse respeito, resulta dos considerandos 114, 249 e 534 da decisão recorrida que a Comissão considerou que as reuniões R, que eram precedidas de um jantar organizado na véspera, em que participavam todos os membros presentes, começavam com uma parte geral, em que as partes discutiam a situação geral no mercado e nas suas empresas. Ainda segundo a descrição feita nessa decisão, nessa parte geral, a Nexans France e a Pirelli & C./Prysmian informavam igualmente os produtores europeus de menor importância, como as recorrentes, dos acontecimentos ocorridos no âmbito das reuniões A/R e os participantes discutiam então os projetos no EEE e nos «territórios de exportação» e indicavam que produtor reivindicava ou obtinha a «preferência» ou o «interesse» num determinado projeto. Essa descrição do decurso das reuniões R leva a crer que as partes discutiam todos os projetos sem distinção entre projetos de cabos elétricos subterrâneos e projetos de cabos elétricos submarinos. Contudo, resulta da resposta das recorrentes à comunicação de acusações, que, na reunião R de 18 e 19 de novembro de 2003, se realizaram reuniões separadas para os projetos de cabos elétricos submarinos e para os projetos de cabos elétricos subterrâneos. Para clarificar esse ponto, a Comissão foi convidada, por meio de uma medida de organização do processo, a precisar ao Tribunal em que medida as provas reunidas ao longo do procedimento administrativo lhe permitiam considerar que os projetos de cabos elétricos subterrâneos e os projetos de cabos elétricos submarinos eram objeto de discussões comuns nas reuniões R. Em resposta a esse convite, a Comissão juntou as atas da reunião A/R de 27 de março de 2003 em Tóquio (Japão), das reuniões R de 23 de abril de 2003 e de 12 de maio de 2005, e ainda um extrato da resposta da J‑Power Systems a um pedido de informações da Comissão.

135    Convidadas pelo Tribunal a tomar posição sobre esses documentos na audiência, as recorrentes alegaram, sem se referirem especificamente a uma das reuniões R acima referidas no n.o 134, que é certo que essas reuniões se realizavam no mesmo dia, mas eram separadas em duas sessões. Assim, segundo afirmam, a primeira sessão, que era dedicada aos cabos elétricos submarinos, realizava‑se de manhã e a segunda sessão, que era relativa aos cabos elétricos subterrâneos, realizava‑se à tarde. Precisaram ainda que, por vezes, as duas sessões não se realizavam no mesmo dia, mas sim em dois dias sucessivos. Alegam além disso que necessariamente os participantes nessas diferentes sessões eram parcialmente diferentes, uma vez que as sociedades interessadas unicamente nos cabos elétricos subterrâneos, como elas próprias, não participaram nem uma única vez numa reunião sobre os cabos elétricos submarinos. Afirmam que não existe, tanto quanto sabem, qualquer ata de uma dessas reuniões que refira uma reunião comum.

136    Contudo, há que referir, antes de mais, que resulta da ata da reunião R de 23 de abril de 2003, que os participantes nessa reunião, incluindo os representantes da Brugg Kabel, foram informados das discussões havidas na reunião A/R de 27 de março de 2003. Ora, resulta da ata desta última reunião que nela houve discussões relativas a projetos de cabos elétricos submarinos de alta tensão. Seguidamente, há que observar que resulta do anexo I da decisão recorrida, sem impugnação das recorrentes, que a Brugg Kabel participou na reunião R, realizada em 30 de junho e 1 de julho de 2004. Ora, não resulta da ata dessa reunião que tivesse dado origem a discussões separadas sobre os cabos elétricos submarinos e os cabos elétricos subterrâneos, sendo os projetos discutidos referidos sem particular referência a esse respeito. Além disso, resulta da parte dessa ata intitulada «Ongoing projects» que os projetos «Italy Sardigna» e «Sarco» foram discutidos nessa ocasião. É certo que, ao contrário do que afirma a Comissão, não resulta claramente do extrato da resposta da J‑Power Systems a um pedido de informações da Comissão que esses projetos fossem projetos de cabos elétricos submarinos, uma vez que estes não eram expressamente mencionados no quadro da J‑Power Systems. Resulta, porém, da ata da reunião R de 30 de junho e 1 de julho de 2004 que o projeto «Sarco» suscitava dificuldades entre gestores da rede elétrica francesa e italiana, o que confirma a afirmação da Comissão de que esse projeto se referia a uma ligação entre a Sardenha e a Córsega, pelo que era um projeto de cabos elétricos submarinos. Por último, resulta da ata da reunião R de 12 de maio de 2005 que os projetos «Ireland 220 kV» e «GCC» foram mencionados nessa reunião. Ora, esses projetos são expressamente mencionados como projetos de cabos elétricos submarinos de alta tensão no extrato da resposta da J‑Power Systems a esse pedido de informações.

137    Por outro lado, o facto de os participantes nas sessões das reuniões R dedicadas aos cabos elétricos subterrâneos não serem exatamente os mesmos que os participantes nas sessões dessas reuniões dedicadas aos cabos elétricos submarinos é a simples consequência do facto de certos membros do cartel não fabricarem cabos elétricos submarinos e poderem ter um interesse menor em participar nas sessões dedicadas a esse tipo de cabos elétricos. Contudo, em face das outras características do cartel, não pode resultar só desse facto que se deva considerar que o cartel era constituído por dois cartéis distintos relativos, respetivamente, aos cabos elétricos submarinos e aos cabos elétricos subterrâneos.

138    Daí resulta que a Comissão não cometeu qualquer erro ao considerar que os projetos de cabos elétricos subterrâneos de alta tensão e os projetos de cabos elétricos submarinos de alta tensão eram efetivamente objeto de discussões ao mesmo tempo nas reuniões R, mesmo embora, por vezes, tenham sido organizadas sessões distintas como no caso da reunião desses membros de 18 e 19 de novembro de 2013.

139    Quanto ao argumento das recorrentes de que eram feitas folhas de posição separadas para os projetos de cabos elétricos submarinos e para os projetos de cabos elétricos subterrâneos no âmbito da «configuração A/R do cartel», refira‑se que, como resulta do considerando 99 da decisão recorrida, essas folhas de posição conservavam a mesma estrutura formal e respeitavam a mesma repartição, a saber, a «quota 60/40». Embora isso não seja expressamente esclarecido nessa decisão, é provável que a necessidade de redigir folhas de posição diferentes estivesse ligada à vontade de não lesar as empresas que não produziam um dos tipos de cabos elétricos, o que seria o caso das recorrentes se, por exemplo, a parte da «quota 60/40» atribuída aos membros R do cartel fosse constituída unicamente por projetos de cabos elétricos submarinos.

140    Quanto ao argumento das recorrentes de que a Comissão deveria ter tido em conta a falta de complementaridade entre os diferentes elementos do cartel, basta lembrar que, de acordo com a jurisprudência, para qualificar diferentes atuações de infração única e continuada, não há que verificar se apresentam uma relação de complementaridade, no sentido de que cada um deles se destina a fazer face a uma ou mais consequências do jogo normal da concorrência e contribuem, por uma interação, para a realização de todos os efeitos anticoncorrenciais pretendidos pelos seus autores, no âmbito de um plano global com vista a um objetivo único. Em contrapartida, o pressuposto relativo ao conceito de objetivo único implica que se verifique se não existem elementos que caracterizam os diferentes comportamentos que fazem parte da infração que sejam suscetíveis de indicar que os comportamentos materialmente executados por outras empresas participantes não partilham do mesmo objeto ou do mesmo efeito anticoncorrencial e não se inscrevem consequentemente num «plano de conjunto» em razão do seu objeto idêntico falseando o jogo da concorrência no mercado interno (v. Acórdão de 26 de janeiro de 2017, Villeroy & Boch/Comissão, C‑625/13 P, EU:C:2017:52, n.o 58 e jurisprudência aí referida). Ora, há que lembrar que, conforme resulta da observação acima feita no n.o 126, o pressuposto da existência do objeto único da infração está preenchido no caso presente.

141    Em face destas considerações, não se pode deixar de observar que a Comissão não cometeu qualquer erro ao considerar que os diferentes elementos do cartel eram constitutivos de uma infração única e continuada ao artigo 101.o TFUE.

c)      Quanto à duração da participação das recorrentes na infração

142    As recorrentes contestam tanto a fixação pela Comissão do início da sua participação no cartel em 14 de dezembro de 2001 como o caráter ininterrupto dessa participação.

1)      Quanto ao início da participação das recorrentes no cartel

143    As recorrentes alegam que a Comissão não demonstrou que a reunião de 14 de dezembro de 2001 em Divonne‑les‑Bains era uma reunião R, como as definidas na decisão recorrida, ou uma reunião em que tivessem participado numa atividade contrária ao direito da concorrência. Afirmam que as provas juntas pela Comissão também não permitem demonstrar que começaram a participar no cartel entre 14 de dezembro de 2001 e 3 de julho de 2002.

144    A Comissão contesta a argumentação das recorrentes.

145    A esse respeito, há que examinar a tese da recorrente de que a Comissão não fez prova do caráter anticoncorrencial da reunião de 14 de dezembro de 2001 em Divonne‑les‑Bains, eventualmente antes de examinar a questão de saber se as provas recolhidas pela Comissão eram suficientes para demonstrar que as recorrentes tinham começado a participar no cartel antes de 3 de julho de 2002.

146    Resulta dos autos que a questão n.o 4 do pedido de informações da Comissão, de 31 de março de 2010, tinha a seguinte redação:

«A Comissão tem informações de que houve uma série de reuniões e de comunicações por outros meios (telecópias, mensagens de correio eletrónico, chamadas telefónicas, etc.) entre concorrentes, cuja lista se encontra adiante, em d. Mais em particular, […] que os seguintes representantes da vossa empresa assistiram a essas reuniões/estiveram envolvidos nessas comunicações: [MN. N., P. e K.]

Tendo em conta as reuniões acima elencadas em d. e qualquer outra reunião da mesma natureza que possa ter existido entre os concorrentes, agradecemos que juntem ou indiquem:

–        uma confirmação da data da reunião;

–        quem teve a iniciativa da reunião;

–        quem organizou e pôs em prática a reunião;

–        o lugar preciso da reunião;

–        os nomes de todos os participantes na reunião, a sua função e o nome das empresas que representavam;

–        os assuntos da ordem de trabalhos;

–        quem fixou os assuntos da ordem de trabalhos;

–        a ata da reunião;

–        o âmbito geográfico preciso abrangido pela reunião.

Agradecemos que forneçam cópias de qualquer documento disponível, independentemente de ser manuscrito, datilografado, digital ou em qualquer outro formato, relativo às reuniões adiante elencadas em d., e a qualquer outra reunião de natureza semelhante que possa ter existido entre concorrentes.

Agradecemos que facultem o nome e as funções de qualquer outro representante da vossa empresa que tenha participado nas reuniões adiante elencadas em d. e em qualquer outra reunião de natureza semelhante que possa ter havido entre concorrentes.»

147    Na sua resposta ao pedido de informações da Comissão de 31 de março de 2010, as recorrentes confirmaram que tinha havido uma reunião em 14 de dezembro de 2001 em Divonne‑les‑Bains, na qual tinha participado N. Juntaram igualmente o recibo do cartão de crédito dessa pessoa, datado do mesmo dia, e um extrato da sua agenda onde estavam anotados a data, o lugar e os participantes na reunião, a saber, a Nexans France e a Pirelli.

148    Por outro lado, nas suas respostas ao pedido de informações da Comissão de 31 de março de 2010, nenhum outro destinatário da comunicação de acusações confirmou ter participado numa reunião com concorrentes em 14 de dezembro de 2001 em Divonne‑les‑Bains.

149    Contudo, no considerando 292 da comunicação de acusações, a Comissão indicou que tinha sido organizada uma reunião R em Divonne‑les‑Bains em 14 de dezembro de 2001 e que os participantes nessa reunião eram em todos os casos a Nexans France, representada por J., a Sagem, representada por V, e a Brugg Kabel, representada por N. A Comissão precisava que a presença de. J. e V. decorria de uma mensagem de correio eletrónico posteriormente enviada pelo primeiro ao segundo, que se referia à anterior reunião em que ambos tinham participado. A presença de N. decorria da resposta das recorrentes ao pedido de informações da Comissão de 31 de março de 2010.

150    Na sua resposta à comunicação de acusações, as recorrentes impugnaram o caráter anticoncorrencial da reunião de 14 de dezembro de 2001 em Divonne‑les‑Bains, alegando que esta «não foi nada mais do que a vã tentativa da Nexans [France] e da Prysmian de convencerem a Brugg Kabel a participar nas reuniões com outros produtores de cabos elétricos. Contudo, a Brugg Kabel recusou participar nos acordos e continuou a ser considerada e tratada como um pária pelos outros destinatários da comunicação de acusações».

151    No considerando 197 da decisão recorrida, a Comissão indicou o seguinte:

«De acordo com o estipulado na reunião A/R de 13 de novembro de 2001, um mês mais tarde, em 14 de dezembro de 2001, foi organizada uma reunião R em [Divonne‑les‑Bains], França. [J.] (Nexans) e [N.] (Brugg [Kabel]) estiveram em todos os casos entre os participantes dessa reunião e é altamente provável que [V.] da Sagem e ainda um representante da Pirelli estivessem igualmente presentes 261. O lugar, um castelo em [Divonne‑les‑Bains], foi igualmente utilizado várias vezes para várias reuniões R.»

152    Na nota 261 no considerando 197 da decisão recorrida, a Comissão precisou igualmente o seguinte:

«A participação de [J. e V.] decorre de uma mensagem de correio eletrónico enviada em 18 de fevereiro de 2002 por [J.] a [V.], que faz referência expressa à reunião anterior em [Divonne‑les‑Bains], à qual assistiram ambos, v. ID 318/128, inspeção na Nexans [France]. A Brugg [Kabel] confirmou a participação de [N.], v. ID 1492/4, resposta da Brugg [Kabel] de 7 de maio de 2010 ao pedido de informações [da Comissão] de 31 de março de 2010. Nos anexos fornecidos pela [Brugg Kabel], a Pirelli é igualmente mencionada; ID 1492/20, resposta da Brugg [Kabel] de 7 de maio de 2010 [a esse pedido de informações].»

153    Nos considerandos 921 e 922 da decisão recorrida, a Comissão indicou ainda o seguinte:

«(921)      a [Brugg Kabel] aderiu ao cartel em 14 de dezembro de 2001. Nesse dia, [N.] ([Brugg Kabel]) participou numa reunião R em [Divonne‑les‑Bains] (v. considerando (197). A Kabelwerke Brugg AG Holding tem responsabilidade como sociedade‑mãe pelo comportamento da [Brugg Kabel] igualmente a partir de 14 de dezembro de 2001. A [Brugg Kabel] refuta essa data de início de participação no cartel, pois a reunião de 14 de dezembro de 2001 não teve caráter anticoncorrencial, visto a [Brugg Kabel] ter recusado cooperar nessa data.

(922)      Vários indícios tendem a demonstrar que a [Brugg Kabel] tinha participado nos acordos do cartel já antes desse acontecimento [considerandos (161) (167) e (186)]. Embora essa reunião possa ter tido por objetivo convencer a [Brugg Kabel] a aderir ao cartel, isso em nada atenua o seu caráter anticoncorrencial. A Nexans e a Prysmian tinham anunciado, na reunião A/R de 13 de novembro de 2001, que organizariam reuniões R regulares, e respeitaram a promessa com a organização da reunião de 14 de dezembro de 2001 (considerando (188). Os participantes europeus no cartel procederam à atribuição de projetos no EEE e nos “territórios de exportação” nas reuniões R [(v., por exemplo, considerando (315)]. Nada prova que a [Brugg Kabel] tivesse anunciado, nessa reunião, que não participaria no cartel. Pelo contrário, existem provas que indicam que a Nexans [France] e a Prysmian conseguiram o que pretendiam, visto que, na reunião A/R de 30 de janeiro de 2002, a Nexans [France] e a Pirelli informaram os outros participantes de que a “[Brugg Kabel] e a Sagem [tinham sido] convidadas para a reunião” [“[Brugg Kabel] and Sagem [were] invited to the meeting”] e “vão continuar” [“will continue”] (considerando (206)]. Na reunião A/R de 5 de abril de 2002, as notas indicam que um “ambiente de cooperação melhora progressivamente com a [Brugg Kabel], a Sagem e a nkt” [“gradually growing cooperative atmosphere with [Brugg Kabel], Sagem and nkt”] (considerando (212)]. No seguimento disto, em abril de 2002, a Brugg [Kabel] encarou a possibilidade de ela própria organizar uma reunião R. Essa reunião foi anulada, mas foi organizada uma segunda reunião pela [Brugg Kabel] em 3 de julho de 2002 (considerando (217)]. É muito pouco provável que a [Brugg Kabel] tivesse previsto organizar uma reunião no âmbito do cartel em abril de 2002 apesar de não ser ainda seu membro.»

154    Resulta dos considerandos 197, 921 e 922 da decisão recorrida que a Comissão entendeu que existiam provas diretas da participação das recorrentes, representadas por N., numa reunião com concorrentes organizada em Divonne‑les‑Bains em 14 de dezembro de 2001, bem como um conjunto de suficientes provas indiretas sobre a participação nessa reunião, se não da Sagem, pelo menos da Nexans France e da Pirelli e que essa reunião era uma reunião R, isto é, uma reunião dos membros da «configuração europeia do cartel».

155    Primeiro, quanto à participação das recorrentes, representadas por N., numa reunião em 14 de dezembro de 2001 em Divonne‑les‑Bains, basta dizer que não é impugnada.

156    Segundo, quanto à participação de outros produtores europeus de cabos elétricos nessa reunião, refira‑se que, conforme resulta da decisão recorrida, a presença dos representantes da Nexans France e da Pirelli. Nessa reunião foi indicada pelas próprias recorrentes na sua resposta ao pedido de informações da Comissão de 31 de março de 2001.

157    Por outro lado, há que observar que a mensagem de correio eletrónico dirigida por J. a V. em 18 de fevereiro de 2002 faz claramente referência a uma reunião realizada em Divonne‑les‑Bains. Além disso, o facto de outras pessoas para além de J. e V. terem assistido a essa reunião resulta muito claramente da seguinte passagem: «Na sequência da nossa reunião em [Divonne‑les‑Bains], tendo‑se tornado impossíveis as datas antecipadas de 6 e 7/03 para alguns de nós, proponho‑vos realizar a próxima reunião em Paris, em 28 de fevereiro à tarde (o lugar será comunicado posteriormente).»

158    O facto de a Sagem não ter confirmado na sua resposta ao pedido de informações da Comissão de 31 de março de 2010 a presença do representante da Sagem, V., numa reunião realizada em Divonne‑les‑Bains no final de 2001 não é significativo a esse respeito, pois, como resulta dessa resposta, a Safran não tinha a possibilidade de desmentir ou confirmar essa informação por razões materiais.

159    Verifica‑se que, como alegam as recorrentes, a mensagem de correio eletrónico de J. de 18 de fevereiro de 2002 não contém qualquer indicação sobre a data da reunião a que se refere, a participação das recorrentes nessa reunião ou o objeto da mesma, pelo que unicamente permite demonstrar que J. e V. assistiram, num momento indeterminado, mas necessariamente anterior à data dessa mensagem de correio eletrónico, a uma reunião em Divonne‑les‑Bains com outras pessoas cuja identidade é igualmente indeterminada. Daí resulta que essa mensagem de correio eletrónico não permite, só por si, demonstrar a presença da Sagem, representada por V., na reunião de 14 de dezembro de 2001 em Divonne‑les‑Bains.

160    As provas acima analisadas nos n.os 156 a 159 bastam para demonstrar que o representante das recorrentes, N., e os representantes da Nexans France e da Pirelli participaram numa reunião em 14 de dezembro de 2001 em Divonne‑les‑Bains. Em contrapartida, essas provas não permitem determinar com certeza que o representante da Sagem, a saber, V. assistiu a essa reunião.

161    Terceiro, quanto à natureza da reunião de 14 de dezembro de 2001 em Divonne‑les‑Bains, refira‑se, por um lado, que, nessa cidade, se realizaram regularmente reuniões dos membros R do cartel, nas quais, depois de os representantes da Nexans France e da Pirelli e, mais tarde, da Prysmian terem informado os outros produtores europeus das discussões havidas na reunião A/R anterior, os participantes partilhavam entre si os projetos a realizar no «território nacional» europeu e os projetos a realizar nos «territórios de exportação» que tinham sido atribuídos aos membros R do cartel (considerando 315 e anexo I da decisão recorrida). O caráter habitual da organização dessas reuniões nessa cidade é demonstrado pelo facto de alguns dos participantes nessas reuniões chegarem mesmo a falar da necessidade de «divonar» (considerando 364 da decisão recorrida).

162    Por outro, há que referir que há provas invocadas pela Comissão na decisão recorrida capazes de demonstrar que a primeira reunião R do cartel se realizou efetivamente em Divonne‑les‑Bains em 14 de dezembro de 2001.

163    Assim, resulta das notas de um empregado da J‑Power Systems relativas às discussões havidas na reunião A/R de 13 de novembro de 2001, mencionadas no considerando 188 da decisão recorrida, que a Nexans France e a Pirelli tinham indicado, nessa ocasião, que no futuro passaria a haver uma discussão entre os membros R do cartel uma vez por mês.

164    Ora, nas notas de um empregado da J‑Power Systems relativas às discussões ocorridas na reunião A/R de 30 de janeiro de 2002, mencionadas no considerando 206 da decisão recorrida, numa parte intitulada «Organização — Lado R», indica‑se o seguinte:

«[Brugg Kabel] e Sagem convidadas para a reunião. Vão continuar. A ABB nunca quis aderir. A NKT talvez seja necessária por ter mais atividade no mercado de exportação.»

165    Segundo as recorrentes, as notas de um empregado da J‑Power Systems relativas às discussões ocorridas na reunião A/R de 30 de janeiro de 2002 unicamente evidenciam o facto de os outros participantes no cartel prosseguirem, na reunião de 14 de dezembro de 2001 em Divonne‑les‑Bains, as suas tentativas infrutíferas de as convencer a participar nas reuniões e discussões do cartel. Alegam que, se elas tivessem dado nessa reunião o seu acordo em participar nas discussões depois de anos de reiterada recusa, seguramente isso teria sido referido na reunião A/R de 30 de janeiro de 2002 como uma importante notícia. Salientam, assim, que, depois da reunião R de 3 de julho de 2002, em que participaram, J. escreveu numa mensagem de correio eletrónico de 4 de setembro de 2002 dirigido a O., empregado da [J‑Power Systems], com vista à reunião A/R de 6 e 7 de setembro de 2002, que tinha «pass[ado] a haver contactos regulares com a [Brugg Kabel]».

166    As recorrentes alegam ainda que é também provável que a reunião de 14 de dezembro de 2001 em Divonne‑les‑Bains tivesse tido por objeto a continuação da negociação de uma subcontratação com a Nexans France sobre um projeto a realizar em Abu Dabi (Emirados Árabes Unidos), iniciada numa reunião de 21 de novembro de 2001 em Paris (França).

167    Contudo, há que considerar, como faz a Comissão, que as notas de um empregado da J‑Power Systems relativas às discussões havidas na reunião A/R de 30 de janeiro de 2002 demonstram, pelo contrário, que o objeto da reunião de 14 de dezembro de 2001 em Divonne‑les‑Bains, na qual as recorrentes admitem ter participado por intermédio de N., era efetivamente o de uma reunião dos membros R do cartel.

168    Com efeito, a passagem, extraída das notas de um empregado da J‑Power Systems relativas às discussões havidas na reunião A/R de 30 de janeiro de 2002, acima referida no n.o 164, refere‑se muito claramente ao estado da participação dos produtores europeus de cabos elétricos numa reunião da «configuração europeia do cartel» e não à recusa de dar seguimento ao convite para participarem nessa reunião. Isso resulta, quanto à Brugg Kabel e à Sagem, da expressão «convidadas para a reunião» e da inexistência da menção a qualquer recusa destas a esse respeito. Isso resulta igualmente da menção à recusa de longa data da ABB de participar em contactos multilaterais pela frase «A ABB nunca quis aderir», que justifica a não‑participação desta na reunião R, e da frase «A NKT talvez seja necessária por ter mais atividade no mercado de exportação». Assim, pode‑se inferir dessa passagem que a Brugg Kabel e a Sagem participaram numa reunião R e que continuariam a participar.

169    Esta interpretação não é posta em causa pelos diferentes argumentos das recorrentes.

170    Antes de mais, ao contrário do que alegam as recorrentes, a mensagem de correio eletrónico dirigida em 4 de setembro de 2002 por J., empregado da Nexans France, a O., empregado da J‑Power Sysems, não contém qualquer anúncio particular sobre a Brugg Kabel. Aí, J. simplesmente relata a importância de garantir a participação da Exsym no cartel do lado dos membros A do cartel, uma vez que tinha passado a haver contactos com a nkt cables, a Sagem, a Safran, a Silec Cable e a Brugg Kabel: «Passámos a ter contactos regulares com a [nkt cables], a [Sagem], a [Brugg Kabel] se não tivermos a Exsym a bordo, não faz sentido».

171    Seguidamente, é improvável que uma empresa aceite participar numa reunião com concorrentes cujo objeto consiste em estes tentarem convencê‑la a participar na adoção de um comportamento anticoncorrencial se, de qualquer forma, tem a intenção de rejeitar essa proposta. Se as recorrentes não tinham a intenção de participar numa reunião anticoncorrencial, podiam muito simplesmente recusar participar.

172    Por último, a explicação alternativa dada pelas recorrentes, segundo a qual a reunião de 14 de dezembro de 2001 em Divonne‑les‑Bains podia igualmente consistir numa reunião sobre uma subcontratação com a Nexans France num projeto a realizar em Abu Dabi que tinha sido o objeto de uma reunião anterior em 21 de novembro de 2001 em Paris, é dificilmente conciliável com a afirmação das recorrentes de que a reunião de 14 de dezembro de 2001 em Divonne‑les‑Bains era apenas uma vã tentativa da Nexans France e da Pirelli de as convencer a participar no cartel. Além disso, essa tese torna‑se pouco credível pelo facto de, por um lado, resultar da agenda de N., junta pelas recorrentes em resposta a um pedido de informações da Comissão, que este devia encontrar‑se em 14 de dezembro de 2001 em Divonne‑les‑Bains não só com a Nexans France, mas igualmente com a Pirelli. Ora, é difícil imaginar por que razão a Pirelli teria de participar numa reunião unicamente relativa à celebração de um contrato de subcontratação entre as recorrentes e a Nexans France. Apor outro lado, há que referir que as recorrentes não apresentam qualquer prova do objeto da reunião de 14 de dezembro de 2001 em Divonne‑les‑Bains, quando apresentaram tais provas sobre a reunião de 21 de novembro de 2001 em Paris.

173    A este respeito, há que observar que, se, como alegam, as recorrentes têm a liberdade de propor uma interpretação dos factos diferente da que foi seguida pela Comissão, com vista a pôr em dúvida as conclusões desta quanto à natureza da reunião de 14 de dezembro de 2001 em Divonne‑les‑Bains, cabe ao Tribunal apreciar a sua credibilidade, nomeadamente à luz das provas apresentadas ou não pelas recorrentes. Ora, como refere a Comissão, resulta dos documentos juntos pelas recorrentes com a réplica que, nas trocas preparatórias da reunião de 21 de novembro de 2001 em Paris, o assunto desta reunião era claramente mencionado. Com efeito, na mensagem de correio eletrónico dirigida por C., empregado da Nexans France, a N., empregado da Brugg Kabel, indica‑se nomeadamente o seguinte: «assuntos abordados: subcontratação da Brugg para o circuito B do projeto».

174    Se, como alegam as recorrentes, a reunião de 14 de dezembro de 2001 em Divonne‑les‑Bains tivesse tido igualmente por objeto a celebração do contrato de subcontratação em causa, é provável que o tema dessa reunião constasse das trocas preparatórias da sua organização. Contudo, as recorrentes não juntaram tais documentos. Além disso, há que observar que a mensagem de correio eletrónico dirigida nesse mesmo dia por N. a C. contém na rubrica «Agenda» a menção «contrato negociação e assinatura», o que, sem provas nesse sentido, faz ser pouco credível a hipótese de um prolongamento dessa negociação nessa reunião.

175    Em face das considerações acima expostas nos n.os 145 a 174, há que considerar que a Comissão fez prova bastante de que as recorrentes, representadas por N., tinham participado, em 14 de dezembro de 2001 em Divonne‑les‑Bains, numa reunião dos membros R do cartel, pelo que a Comissão tinha razão ao fixar nessa data o início da participação das recorrentes no cartel.

2)      Quanto ao caráter ininterrupto da participação das recorrentes na infração

176    As recorrentes alegam que, como a Comissão reconheceu várias vezes nos fundamentos da decisão recorrida, os comportamentos que lhes são imputados constituem infrações uniformes e repetidas, o que implica uma interrupção nesses comportamentos. Consequentemente, existe uma contradição entre o artigo 1.o do dispositivo da decisão recorrida, que imputa às recorrentes a responsabilidade da participação numa infração única e continuada e os fundamentos que o sustentam.

177    Além disso, as recorrentes alegam que, visto o cartel atravessar em 2005 um período de crise, não tinha de se distanciar publicamente dele para demonstrar que tinham interrompido a sua participação, o que foi o caso de 12 de maio de 2005, data da partida de um dos seus empregados, P., em 8 de dezembro de 2005. Afirma que essa interrupção era motivada pela vontade da sua nova equipa dirigente de respeitar a nova legislação suíça relativa à proibição de cartéis. Entendem que isso resulta da correspondência entre N. e o coordenador dos membros R do cartel, J., e da correspondência entre este e vários participantes no cartel que se queixavam da concorrência que elas lhes faziam em diferentes projetos.

178    A Comissão contesta a argumentação das recorrentes.

179    A esse respeito, primeiro, quanto à alegada contradição entre os fundamentos e o dispositivo da decisão recorrida sobre o caráter repetido ou continuado da infração imputada às recorrentes, há que referir que a Comissão utilizou, nos considerandos 467, 511, 513, 516, 519, 524, 575, 576, 625, 680, e 944 e na epígrafe do n.o 4.3.3 dessa decisão, as expressões alemãs «einzige und fortgesetzte» (única e continuada) e «einheitliche und fortdauernde» (uniforme e repetida) para caracterizar a infração. Ora, ao contrário do que alegam as recorrentes, não resulta daí que a Comissão tivesse desse modo admitido qualquer interrupção na sua participação na infração, uma vez que as duas expressões têm um conteúdo semântico próximo e expressam a ideia de um mesmo comportamento que se prolonga sem interrupção.

180    Além disso, no considerando 620 da decisão recorrida esclarece‑se que, «de acordo com as provas, as partes prosseguiram o objetivo único do cartel sem interrupção, de 18 de fevereiro de 1999 até 29 de janeiro de 2009)». Do mesmo modo, resulta ainda do quadro 8, intitulado «Coeficientes multiplicadores relativos à duração», que consta do considerando 1012 da decisão recorrida, que a Comissão não assinalou qualquer interrupção entre o início da participação das recorrentes na infração, em 14 de dezembro de 2001, e o final dessa participação em 16 de novembro de 2006.

181    Assim, não se pode considerar que existe uma contradição entre a fundamentação da decisão recorrida e o seu dispositivo quanto ao caráter único e continuado da infração.

182    Segundo, quanto à alegada interrupção da participação das recorrentes no cartel de 12 de maio de 2005 a 8 de dezembro de 2005, refira‑se desde logo que, ao contrário do que dão a entender as recorrentes, a Comissão não baseou na decisão recorrida a sua recusa de considerar que elas não tinham interrompido a sua participação na infração em 2005 na sua falta de distanciamento público do cartel, mas sim em provas da continuação dessa participação.

183    As recorrentes invocam certas passagens da correspondência entre N. e J. para demonstrar que tinham, do seu ponto de vista, suspendido a sua participação no cartel.

184    As recorrentes citam, assim, uma mensagem de correio eletrónico de N. de 10 de maio de 2005, onde este indica que recusava participar na reunião R de 11 e 12 de maio de 2005, referindo‑se à partida de P. da empresa no fim de maio de 2005 e a uma mudança na gestão.

185    As recorrentes citam igualmente uma mensagem de correio eletrónico de 26 de outubro de 2005 de J. onde este se queixa a N. da concorrência agressiva que elas fazem, indicando o seguinte:

«Temos a impressão de que V. Exa. se tornou bastante agressivo a respeito do projeto acima indicado. Na nossa opinião, esse projeto deve ficar reservado para o nosso amigo, R. C., e achamos que não é razoável mostrar agressividade nesse tipo de projeto no país onde ele está instalado.»

186    Segundo as recorrentes, a interrupção da sua participação foi expressamente confirmada numa mensagem de correio eletrónico de 9 de dezembro de 2005 dirigido a N. por J., onde este escreve «desde então [P.] partiu e o senhor abandonou os “seminários”». Salientam que, nessa mesma mensagem de correio eletrónico, J. se informou ainda junto de N. com vista a saber se ele participava de novo nas reuniões e pediu‑lhe uma confirmação nestes termos: «Está oficialmente de volta aos seminários? (esperamos sinceramente que nos confirme ser o caso)».

187    Contudo, há que referir que a mensagem de correio eletrónico de N. de 10 de maio de 2005 tinha a seguinte redação:

«Tendo em conta as atuais tensões ligadas ao desenvolvimento do processo Al Aweer e a atual mudança na gestão da [Brugg Kabel], [P.] vai deixá‑la no final de maio de 2005/lamentamos informar de que a [Brugg Kabel] não participará nesse seminário.

Esperamos que o AWEER se desenvolva como anteriormente falado, viabilizando a participação posterior […]»

188    Daí resulta que, por um lado, a decisão de não participar na reunião R de 11 e 12 de maio de 2005, foi certamente motivada pela partida de P. e pela mudança na gestão da Brugg Kabel, mas igualmente pelas tensões ligadas ao desenvolvimento do projeto «Al Aweer», e, por outro, essa decisão dizia respeito unicamente a essa reunião. Além disso, como resulta igualmente da mensagem de correio eletrónico de N. de 10 de maio de 2005, este não excluía a possibilidade de participar nas reuniões posteriores, na medida em que esse se desenvolvesse de acordo com as discussões havidas anteriormente. Daí resulta que, ao contrário do que alegam as recorrentes, essa mensagem de correio eletrónico não pode ser considerada o anúncio de uma suspensão da sua participação no cartel.

189    Do mesmo modo, há que observar que, numa mensagem de correio eletrónico de 14 de junho de 2005 dirigido a J. por N., este último escreve o seguinte a respeito de um concurso no Koweit:

«Assinalámos a falta da [Nexans France] na reunião pré‑apresentação.

Intenção de não [apresentar proposta], mas verificar se é “politicamente aceitável”.

No caso de [apresentação de proposta] pedirei instruções.

Registo a sua observação sobre o acidente de cabo e concordo […])»

190    Refira‑se que a observação relativa ao acidente de cabo se refere a uma anterior mensagem de correio eletrónico de J. de 14 de junho de 2005 onde este indica: «Chamo a sua atenção para a possibilidade de vir a ser chamado para uma reparação numa avaria acidental de um cabo que ocorreu recentemente nesse mesmo país. Se for o caso, por favor notifique (receberemos instruções o que ajudará a restabelecer contactos)».

191    Resulta da troca de mensagens de correio eletrónico entre J. e N. em 14 de junho de 2005 que, nessa data, as recorrentes mantinham contactos com J., o coordenador dos membros R do cartel, com vista à execução desse cartel.

192    Isto resulta igualmente de uma mensagem de correio eletrónico de 21 de outubro de 2005, igualmente dirigida a J. por N. onde este escreve nomeadamente o seguinte:

«Depois da nossa atitude de cooperação no encerramento do MEW/60: 18‑09‑2005 para 92 km XLPE 132kv que permitiram à TEC assegurar o seu primeiro XLPE no [Koweit], não compreendemos bem o seu comportamento em […]

Quando confirmámos a nossa coop[eração] no MEW/60, mencionei‑lhe esse projeto e confiei que essa mensagem seria transmitida à TEC. A [Brugg Kabel] está muito interessada e, na realidade, só é entravada pelas ações da TEC que ainda não foi pré‑selecionada. O nível dos preços já está abaixo de […] 100. […]

Só assinalo ainda que se pede cooperação à [Brugg Kabel] uma e outra vez enquanto muitos sofrem de “Alzheimer”.)»

193    A participação das recorrentes na infração ao longo de 2005 é ainda confirmada por duas mensagens de correio eletrónico dirigidas a J. por N. em dezembro de 2005 e janeiro de 2006.

194    Assim, numa mensagem de correio eletrónico de 12 de dezembro de 2005, N. escreve o seguinte:

«A nova (e jovem) gestão da [Brugg Kabel] tem medo, pois temos na Suíça uma nova lei [anti‑cartéis] e temos instruções do conselho para a respeitarmos. Sabe que, apesar disso, atuei em 2005 como se […] (p. ex. [Koweit])

Não estragámos o nível!

Todos os participantes no “seminário” podem felicitar‑se por um excelente ano de 2005.

[…]e estão todos em excelente posição. […]»

195    Do mesmo modo, numa mensagem de correio eletrónico de 24 de janeiro de 2006 relativo a um projeto a realizar no Koweit, N. escreve a J. o seguinte:

«Verifico novamente a grande diferença das nossas visões sobre a situação. Mesmo estando os vossos cadernos de encomendas cada vez mais cheios, vão sempre pedir mais sem parar. É‑me difícil estabelecer uma política de sobrevivência que vos sirva! Mesmo assim, tive a ingenuidade de acreditar durante muito tempo […] eu trabalhava então a favor de uma coordenação com os grandes […]

[…] havia muitos negócios em 2005 (deixámo‑vos ficar com quase todos)

p. ex.

“A” MEW 101 (que compensa 082 largamente)

“K” MEW/60 92km XLPE 132 kV

“[Pirelli]” ME/EW/66‑2005/06

“A” MEW/52/2006‑06

E apenas para mencionar uma pequena cooperação que pedi através de ti de “A” no Qatar: mandam‑me ir passear, dizem que não se pode fazer mais nada etc. etc. Ao mesmo tempo a [Nexans]+ABB ficam com GTC/22/04 com 102 km 132kV 1x2000mm2 […]»

196    N. precisa ainda na sua mensagem de correio eletrónico de 24 de janeiro de 2006, a respeito de uma violação do cartel de que eram culpadas as recorrentes sobre o MEW 082, que «foi sem descidas de preços!».

197    Resulta da leitura dessa correspondência entre J., coordenador dos membros R do cartel, e N. que, do ponto de vista das recorrentes, embora já não participassem nas reuniões por causa dos receios manifestados pela sua nova gestão, não tinham suspendido a sua participação no cartel e tomavam mesmo parte ativa no seu sucesso.

198    Ao contrário do que alegam as recorrentes, resulta igualmente de mensagens de correio eletrónico trocadas entre J. e vários participantes no cartel que estes consideravam que elas nele participavam mesmo durante a segunda parte de 2005.

199    É certo que as mensagens de correio eletrónico cujo conteúdo é citado na petição pelas recorrentes demonstram a irritação manifestada por certos participantes no cartel relativamente ao comportamento destas na execução do cartel.

200    Assim, numa mensagem de correio eletrónico de 14 de setembro de 2005 dirigido a J. por R. C., empregado da Prysmian, este escrevia: «Por favor, assegure‑se de que a [Brugg Kabel] não representa um problema».

201    O descontentamento de J. e de R. C. face à atitude da Brugg Kabel resulta igualmente da mensagem de correio eletrónico de 26 de outubro de 2005, enviada por J. a N., cujo conteúdo está acima reproduzido no n.o 185.

202    Numa mensagem de correio eletrónico de 28 de outubro de 2005, dirigida a J. por R. C., este volta a referir a atitude da Brugg Kabel da seguinte forma:

«Acabo de ser informado de que a [Brugg Kabel] está a aumentar os esforços e a tornar‑se ainda mais agressiva. Só te quero dizer que se algo correr mal atacaremos a [Brugg Kabel] em todo e cada projeto (seja onde for) de forma a fazê‑la perder contratos ou a perder muito dinheiro para os conseguir. […] Tu sabes que NÃO gosto disto, mas já chega! Sinto‑me tentado a “tornar pessoal” este assunto.»

203    Ainda a respeito da atitude das recorrentes, numa mensagem de correio eletrónico de 9 de novembro de 2005 dirigido a J., R. C. refere que as recorrentes se bateriam pelo projeto «E‑Plus» nestes termos: «A [Brugg Kabel] parece ter confirmado o seu interesse numa luta ([K] confirmou)».

204    De resto, R. C., confirmou seguidamente a J., numa mensagem de correio eletrónico de 3 de janeiro de 2006, que tinha perdido o projeto «E‑plus» para as recorrentes.

205    O descontentamento de R. C. sobre a atitude das recorrentes resulta igualmente de uma mensagem de correio eletrónico de 16 de novembro de 2005, onde escreve a J. o seguinte:

«[…] Os seus queridos amigos da [Brugg Kabel] estão a ser muito agressivos aqui em mais um contrato de 380kV […]. A sua despreocupação quanto a estas agressões significa que está a abandonar este território e que já não se importa com a arrogância da [Brugg Kabel]?»

206    Contudo, não se pode deixar de observar que, como resulta da mensagem de correio eletrónico de R. C. de 16 de novembro de 2005, este considerava que as recorrentes ainda estavam vinculadas pelas regras do cartel, pois denunciava precisamente a sua alegada violação dessas regras. Com efeito, se assim não fosse, R. C. não teria nenhuma razão para se queixar do comportamento das recorrentes ao coordenador dos membros R do cartel, J.

207    Por outro lado, refira‑se, como faz a Comissão no considerando 346 da decisão recorrida, que a alegada violação das regras do cartel pelas recorrentes na segunda metade de 2005 não levou a que fossem consideradas «outsiders» pelos outros membros do cartel. Com efeito, não foram objeto das medidas coordenadas previstas na reunião realizada em Divonne‑les‑Bains em 15 de março de 2005 em que participaram.

208    Além disso, resulta da enumeração das empresas participantes no cartel redigida em 24 de junho de 2005 por J., mencionada no considerando 353 da decisão recorrida, que as recorrentes continuam a ser referidas entre os membros médios («medium ones») do cartel. Não existe nenhuma referência a uma saída.

209    Do mesmo modo, como acertadamente refere a Comissão, resulta da mensagem de correio eletrónico de 26 de agosto de 2005 dirigida por J. a M. I., empregado da Exsym, e R. C., empregado da Pirelli & C./Prysmian, mencionada no considerando 358 da decisão recorrida, que as recorrentes eram ainda consideradas nessa data como membros do cartel. Aí se trata da questão da necessidade de garantir a manutenção de certos participantes no cartel, nos termos seguintes:

«Se diz que [a Tahian e a LS Cable] estão fora da “A”, então a [taxa de 40%] já não é válida e talvez deva ser reduzida para 20%, tendo em conta o balanço dos últimos anos em Km, claramente negativo para [C. da Pirelli]. Assim, ou [a Tahian e a LS Cable] estão fora de “A” e os dois projetos de [cabos de óleo] seguintes devem pertencer a [C. da Pirelli], para reequilibrar a situação, como já reconheceu, ou [eles estão] dentro de “A” e deve ser aplicado o sistema de rotação. Compreendemos a vossa dificuldade em controlar [a Tahian e a LS Cable], tal como nós temos dificuldades em controlar a [ABB] e a [Brugg Kabel] e a [Sagem] ou a [nkt cables], mas isso [não significa] que seja necessário pô‑las fora [do cartel]. É simplesmente um facto a que temos que nos adaptar (como se fez […] nas Filipinas ou […]). Repito que o nosso interesse global é manter […] pois dar o projeto EDC à [Tahian] ou à [LS Cable] ajudar‑nos‑á a todos.»

210    Ora, há que lembrar que, de acordo com a jurisprudência, é a compreensão que os outros participantes num cartel têm da intenção dessa empresa que é determinante para apreciar se esta quis distanciar‑se do acordo ilícito (Acórdão de 19 de março de 2009, Archer Daniels Midland/Comissão, C‑510/06 P, EU:C:2009:166, n.o 120).

211    Isto não é posto em causa pela mensagem de correio eletrónico de 9 de dezembro de 2005 dirigido a N. por J., onde este escreve que: «desde então [P.] saiu e o senhor abandonou os “seminários”» e perguntou a N. se participava de novo oficialmente nas reuniões «[E]stá oficialmente de volta aos seminários? (esperamos sinceramente que nos confirme ser o caso)». Com efeito, como acima se expõe nos n.os 183 a 210, não obstante a ausência de N. nas reuniões R do cartel, as recorrentes prosseguiram claramente a sua participação nesse cartel ao longo desse período.

212    Há que rejeitar igualmente o argumento que as recorrentes tentam extrair de uma troca de mensagens de correio eletrónico entre R. C. e J. de 9 de janeiro de 2006, da qual afirmam resultar que as recorrentes não reagiam aos pedidos de contacto da Nexans France, uma vez que as próprias recorrentes admitiram que, nessa data, tinham retomado a sua participação no cartel.

213    Consequentemente, há que concluir que a Comissão não cometeu qualquer erro ao considerar, com base nas provas que tinha reunido, que as recorrentes tinham participado no cartel sem interrupção de 14 de dezembro de 2001 até 16 de novembro de 2006.

d)      Quanto à intenção das recorrentes de contribuírem para o conjunto dos objetivos do cartel e ao seu conhecimento de certos comportamentos ilícitos

214    As recorrentes alegam que a Comissão não fez prova bastante de que tencionavam contribuir com o seu comportamento para a realização de todos os objetivos comuns do cartel. Afirmam que essa demonstração não existe quanto à atribuição de projetos de cabos elétricos submarinos, à «atribuição dos mercados nacionais» e à atribuição de contratos de grande envergadura. Afirmam ainda que a decisão recorrida também não contém quaisquer elementos precisos que demonstrem que tinham conhecimento dos comportamentos ilícitos dos outros participantes no cartel na atribuição de contratos de cabos elétricos submarinos.

215    A Comissão contesta a argumentação das recorrentes.

216    A esse respeito, há que lembrar que uma empresa que tenha participado numa infração única e complexa através de comportamentos seus, que se enquadravam nos conceitos de acordo ou de prática concertada com um objetivo anticoncorrencial na aceção do artigo 101.o, n.o 1, CE e que visavam contribuir para a realização da infração no seu conjunto, pode, deste modo, ser responsável pelos comportamentos postos em prática por outras empresas no âmbito da mesma infração durante todo o período em que nela participou. É o caso quando se demonstra que essa empresa tencionava contribuir com o seu próprio comportamento para os objetivos comuns prosseguidos por todos os participantes e tinha tido conhecimento dos comportamentos ilícitos projetados ou adotados por outras empresas na prossecução dos mesmos objetivos, ou podia razoavelmente prevê‑los e estava disposta a aceitar o risco (v. Acórdão de 26 de janeiro de 2017, Villeroy & Boch/Comissão, C‑625/13 P, EU:C:2017:52, n.o 56 e jurisprudência aí referida).

217    Assim, uma empresa pode ter participado diretamente em todos os comportamentos anticoncorrenciais que compõem a infração única e continuada, caso em que a Comissão tem o direito de lhe imputar a responsabilidade por todos esses comportamentos e, portanto, pela referida infração no seu todo. Uma empresa pode igualmente ter participado diretamente apenas numa parte dos comportamentos anticoncorrenciais que compõem a infração única e continuada, mas ter tido conhecimento de todos os outros comportamentos ilícitos planeados ou postos em prática por outros participantes no cartel na prossecução dos mesmos objetivos, ou ter podido razoavelmente prevê‑los e ter‑se prontificado a aceitar o risco. Nesse caso, a Comissão pode igualmente imputar a essa empresa a responsabilidade pelo conjunto dos comportamentos anticoncorrenciais que constituem essa infração e, por conseguinte, pela própria infração no seu todo (v. Acórdão de 26 de janeiro de 2017, Villeroy & Boch/Comissão, C‑625/13 P, EU:C:2017:52, n.o 57 e jurisprudência aí referida).

218    No caso, primeiro, quanto à falta de vontade das recorrentes de contribuírem para todos os objetivos comuns do cartel, há que lembrar que, como acima se observa no n.o 126, as medidas adotadas pelos participantes no cartel partilhavam um objetivo comum, a saber, a instauração de um sistema de partilha do mercado mundial dos projetos de cabos elétricos de alta tensão, com exceção dos Estados Unidos. Há que lembrar igualmente que, como acima se expõe no n.o 128, esse sistema de partilha do mercado dos projetos dos cabos elétricos de alta tensão era relativo a projetos que necessitassem tanto de cabos elétricos submarinos como de cabos elétricos subterrâneos.

219    Ora, ao contrário do que alegam as recorrentes, o facto de não terem participado na atribuição dos projetos de cabos elétricos submarinos não é suscetível de demonstrar que não tencionavam contribuir com o seu comportamento para o objetivo comum do cartel, acima lembrado no n.o 218, uma vez que, como elas próprias confessam, essa falta de participação resultava da sua falta de capacidade para produzir esses cabos elétricos e não de uma vontade claramente expressa de não participar na atribuição desses projetos. Além disso, como reflete o considerando 324 da decisão recorrida, onde a Comissão refere que as recorrentes tinham pedido uma preferência para um projeto relativo à instalação de cabos elétricos subterrâneos em águas pouco profundas, a despeito da sua incapacidade de produzir cabos elétricos submarinos propriamente ditos, as recorrentes tinham a vontade, na medida em que isso fosse tecnicamente concebível, de participar na atribuição de projetos que, em princípio, necessitassem da instalação de cabos elétricos submarinos.

220    A argumentação das recorrentes de que a sua falta de participação na atribuição de projetos de grande envergadura demonstra que não tencionavam contribuir com o seu comportamento para o objetivo comum do cartel também não convence. Com efeito, antes de mais, resulta da decisão recorrida que os mecanismos do cartel, sejam as obrigações de informação, as regras de atribuição ou os mecanismos de compensação, não faziam qualquer distinção consoante o volume dos projetos em causa (a perda de um grande projeto podia ser compensada pela atribuição de vários projetos mais pequenos e vice‑versa). Seguidamente, refira‑se que a alegada falta de participação das recorrentes nos projetos de grande envergadura resulta, como elas próprias explicam pormenorizadamente, da sua falta de capacidade para responder às necessidades dos clientes para esses projetos. Por último, resulta de uma mensagem de correio eletrónico dirigida por J. a I. que as recorrentes não hesitavam em apresentar propostas para projetos de envergadura recorrendo, sendo caso disso, à subcontratação para atenuar os seus problemas de capacidade.

221    Há que rejeitar igualmente o argumento das recorrentes de que não tinham querido respeitar «a atribuição dos mercados nacionais». Com efeito, há que referir que, como resulta do considerando 108 da decisão recorrida, a Comissão considerou que, na repartição dos projetos de cabos elétricos entre os membros R do cartel, havia provas de que tinha sido reconhecido a alguns deles um «mercado nacional» (por ex. Itália para a Nexans France e a Prysmian, os Países Baixos para a Prysmian) onde tinham prioridade. As recorrentes alegam que, como resulta de vários elementos de prova, várias vezes recusaram respeitar a atribuição de mercados nacionais apresentando propostas nos territórios considerados mercado nacional de outros participantes no cartel. Ora, não se pode deixar de observar que, desse modo, as recorrentes se limitam a indicar que nem sempre respeitaram uma das regras de repartição de projetos entre os membros R do cartel, o que não demonstra, só por si, que não tinham a intenção de contribuir para o objetivo comum do cartel. Refira‑se ainda que, como reconhecem as recorrentes, não era a «atribuição dos mercados nacionais» em si mesma que lhes causava problemas, mas sim o facto de, quando os outros participantes no cartel não lhes reconheciam um certo território, não poderem beneficiar dele em concreto.

222    Segundo, quanto à falta de conhecimento dos comportamentos ilícitos relativos aos cabos elétricos submarinos, refira‑se que, como acima se expõe no n.o 134, as reuniões R em que participava N. começavam por uma parte geral em que os representantes da Nexans France e da Pirelli informavam os outros membros R desse cartel das discussões havidas na reunião A/R anterior. Ora, como acima se observa nos n.os 130 a 132, as reuniões A/R diziam respeito à repartição de projetos de cabos elétricos subterrâneos e submarinos nos «territórios de exportação» entre os membros R do mesmo cartel, por um lado, e os membros A e K, por outro. Daí resulta que as recorrentes tinham necessariamente conhecimento de que os projetos de cabos elétricos submarinos eram objeto de repartição entre os membros A e R do cartel. Quanto ao conhecimento que as recorrentes tinham da repartição dos projetos de cabos elétricos submarinos entre os membros R do cartel, refira‑se que, admitindo que, como na reunião R de 18 e 19 de novembro de 2003, as discussões sobre os cabos elétricos submarinos e os cabos elétricos subterrâneos decorressem sempre de forma separada e que os representantes da Brugg Kabel nunca tivessem assistido às reuniões R em que os projetos de cabos elétricos subterrâneos e os projetos de cabos elétricos submarinos eram objeto de discussões comuns, o que é fortemente posto em causa pelas provas juntas pela Comissão em resposta a uma medida de organização do processo decidida pelo Tribunal (v. n.os 134 a 138), o facto de as recorrentes terem conhecimento, tendo em conta os documentos de preparação das reuniões dos membros em causa, de que haveria discussões sobre os cabos elétricos submarinos, basta para demonstrar que tinham conhecimento dessa repartição ou deveriam ter suspeitado. Além disso, resulta da mensagem de correio eletrónico dirigida por J. a N. em 23 de janeiro de 2006, exposta nos considerandos 377 e 378 da decisão recorrida, e relativa à atribuição nos «territórios de exportação», que as recorrentes sabiam que os acordos previam uma coordenação nos projetos de cabos elétricos submarinos. Com efeito, resulta dessa mensagem de correio eletrónico o seguinte: «A já não tem confiança e recusa continuar o exercício [Koweït] (e portanto recusa essa atrib[uição]) se [C. da Pirelli] e tu não se comprometerem a respeitar os acordos futuros nesse país. [C. da Pirelli] confirmou que no futuro seguiriam e deram uma explicação credível para o seu gesto (ligado a um projeto submarino)».

223    Em face destas considerações, há que observar que a Comissão não cometeu qualquer erro ao considerar que as recorrentes, com o seu comportamento, visavam contribuir para a realização da infração no seu conjunto e tinham conhecimento dos comportamentos ilícitos dos outros membros do cartel, na aceção da jurisprudência acima lembrada nos n.os 216 e 217.

e)      Quanto à prova de que as recorrentes tinham conhecimento dos acordos relativos aos diferentes projetos de cabos elétricos

224    As recorrentes alegam que a Comissão deveria ter demonstrado que tinham conhecimento dos acordos relativos a cada um dos projetos ou que podiam prevê‑los, pelo menos para os mercados nacionais ou para os projetos de cabos elétricos submarinos.

225    A Comissão contesta a argumentação das recorrentes.

226    A esse respeito, há que referir, como faz a Comissão que, a organização geral das obrigações de informação e das quotas dizia respeito a todos os projetos objeto do cartel e que a exigência de prova incidia sobre este caráter do plano global. Como os membros R do cartel tinham precisamente que manifestar por si próprios o seu interesse por projetos específicos se quisessem ser tidos em consideração na sua atribuição, é lógico que um produtor de menor dimensão como as recorrentes não fosse expressamente mencionado para todos os projetos. Contudo, isto em nada muda o facto de terem participado, em conjunto, nas modalidades aplicadas e de, como demonstrou a Comissão, terem conhecimento do modo geral de atuação.

f)      Quanto à fundamentação da decisão recorrida sobre a identidade dos projetos de cabos elétricos em causa

227    As recorrentes criticam a Comissão por não ter precisado na decisão recorrida os projetos que deviam ser objeto de um acordo, limitando‑se a utilizar abreviaturas ou designações genéricas e a apresentar o mesmo projeto como vários projetos distintos em razão de ligeiras diferenças de designação.

228    A Comissão contesta os argumentos das recorrentes.

229    A esse respeito, há que referir que resulta, por exemplo, dos considerandos 234 e 372 da decisão recorrida, que contêm muitos extratos de comunicações entre os membros do cartel, que estes faziam sistematicamente referência aos projetos de cabos elétricos em causa sob a forma de abreviaturas ou de alusões codificadas com um evidente objetivo de dissimulação. Nestas condições, o dever de fundamentação, que se impõe à Comissão por força do artigo 296.o TFUE, não pode levar a exigir que esta identifique com precisão cada um dos projetos mencionados pelos participantes no cartel nas suas comunicações.

230    Em face destas considerações, improcedem o terceiro e o quarto fundamentos do recurso.

4.      Quanto ao quinto fundamento, relativo a violação do artigo 101.o TFUE e do artigo 53.o do Acordo EEE

231    As recorrentes alegam que a aplicação do conceito de infração única e continuada no caso constitui uma violação do artigo 101.o TFUE e do artigo 53.o do Acordo EEE.

232    Em apoio deste fundamento, as recorrentes limitam‑se a remeter para os argumentos já suscitados no âmbito dos terceiro e quarto fundamentos para demonstrar que a infração em causa não constitui uma infração única e continuada. Em particular, remetem para os argumentos relativos ao início da sua participação no cartel a partir de 14 de dezembro de 2001, à duração ininterrupta dessa participação, ao conhecimento dos acordos relativos aos cabos elétricos submarinos ou ao dever de os conhecer, à sua participação em acordos relativos aos mercados nacionais e à sua participação em projetos de grande envergadura. Tendo estes argumentos já sido julgados improcedentes no exame dos terceiro e quarto fundamentos e na falta de argumentação autónoma, o quinto fundamento só pode ser julgado desprovido de qualquer suporte.

233    Em face da improcedência dos segundo, terceiro, quarto e quinto fundamentos, há que concluir que não cometeu qualquer erro a Comissão ao imputar às recorrentes a participação na infração única e continuada ao artigo 101.o, n.o 1, TFUE, de 14 de dezembro de 2001 a 16 de novembro de 2006.

5.      Quanto ao sexto fundamento, relativo a violação do artigo 23.o, n.os 2 e 3, do Regulamento n.o 1/2003, a violações dos princípios da igualdade de tratamento, da proporcionalidade e ne bis in idem, a uma violação do dever de fundamentação, a vários erros de apreciação e a um desvio de poder no que diz respeito ao cálculo do montante da coima aplicada às recorrentes

234    O sexto fundamento compõe‑se de cinco vertentes. Com a primeira vertente, as recorrentes acusam a Comissão de ter cometido um erro e de ter violado o princípio da igualdade de tratamento ao escolher 2004 como ano de referência para o valor das vendas, que não representava o seu poder económico e a sua contribuição no cartel. Com a segunda vertente, acusam a Comissão de ter violado o seu dever de fundamentação e o princípio ne bis in idem e de ter cometido um erro de apreciação quanto à gravidade da infração. Com a terceira vertente, criticam a Comissão por ter fixado um coeficiente de 4,91 pela duração da infração. Com a quarta vertente, alegam que a Comissão violou o seu dever de fundamentação quanto à fixação da «taxa de entrada». Com a quinta vertente, acusam a Comissão de ter cometido um erro de apreciação e de ter violado o princípio da igualdade de tratamento e o princípio da proporcionalidade no âmbito da apreciação das circunstâncias atenuantes.

a)      Quanto à escolha do ano de 2004 como ano de referência do valor das vendas para o cálculo do montante de base da coima

235    As recorrentes alegam que, ao optar por 2004 como ano de referência em vez do último ano completo da participação no cartel, a Comissão se afastou sem qualquer justificação válida da regra fixada no n.o 13 das orientações para o cálculo das coimas de 2006. Entendem que essa escolha levou a tratar de forma discriminatória as recorrentes em razão das vendas ligadas a projetos de cabos elétricos extremamente altas que tiveram em 2004. Segundo as recorrentes, a fim de evitar este tratamento discriminatório, a Comissão deveria ter escolhido como ano de referência o último ano completo da sua participação no cartel, a saber, 2005, ou utilizado um valor médio baseado nos anos de 2003 a 2005.

236    A Comissão contesta a argumentação das recorrentes.

237    A esse respeito, há que lembrar que, quanto ao cálculo da coima no caso de um cartel de alcance mundial, o n.o 18 das orientações para o cálculo das coimas de 2006 prevê o seguinte:

«Quando [o] âmbito geográfico de uma infração ultrapassar o território do EEE (por exemplo, no caso de cartéis mundiais), as vendas em causa da empresa no EEE podem não refletir de maneira adequada o peso de cada empresa na infração. Este pode ser especificamente o caso de acordos a nível mundial de repartição de mercado.

Em tais circunstâncias, a fim de refletir ao mesmo tempo a dimensão agregada das vendas em causa no EEE e o peso relativo de cada empresa na infração, a Comissão pode estimar o valor total das vendas dos bens ou serviços relacionadas com a infração na área geográfica (mais amplo do que o EEE) em causa, determinar a quota das vendas de cada empresa que participa na infração neste mercado e aplicar esta percentagem às vendas agregadas destas mesmas empresas no EEE. O resultado será utilizado a título de valor das vendas para efeitos da determinação do montante de base da coima.»

238    Há que lembrar igualmente que, de acordo com jurisprudência constante, na medida em se tenha de tomar por base o volume de negócios das empresas envolvidas na mesma infração com vista a determinar as relações entre as coimas a aplicar, deve‑se delimitar o período a tomar em consideração de modo a que os valores obtidos sejam tão comparáveis quanto possível (v. Acórdão de 30 de setembro de 2009, Akzo Nobel e o./Comissão, T‑175/05, não publicado, EU:T:2009:369, n.o 142 e jurisprudência aí referida).

239    Há que lembrar ainda que, quanto ao período a tomar em consideração para determinar o valor das vendas utilizado no cálculo da coima, o n.o 13 das orientações para o cálculo das coimas de 2006 prevê o seguinte:

«Para determinar o montante de base da coima a aplicar, a Comissão utilizará o valor das vendas de bens ou serviços, realizadas pela empresa, relacionadas direta ou indiretamente com a infração, na área geográfica em causa no território do Espaço Económico Europeu (“EEE”.) A Comissão utilizará em princípio as vendas realizadas pela empresa durante o último ano completo da sua participação na infração.»

240    Contudo, há que observar que o uso da expressão «utilizará em princípio as vendas realizadas pela empresa durante o último ano completo da sua participação na infração» no n.o 13 das orientações para o cálculo das coimas de 2006, não exclui a possibilidade de a Comissão utilizar outro período de referência desde que, de acordo com a jurisprudência acima referida no n.o 238, permita obter números tão comparáveis quanto possível.

241    No caso, resulta da decisão recorrida que, para o cálculo do montante de base das coimas, a Comissão se baseou no método previsto no n.o 18 das orientações para o cálculo das coimas de 2006 (considerandos 966 e 968 a 994 dessa decisão). Resulta igualmente dessa decisão que, para efeitos de aplicação desse método, não se baseou nas vendas efetuadas no último ano completo da participação na infração, mas sim nos valores das vendas relativos a 2004 (considerandos 966 e 968 a 994 dessa decisão).

242    A Comissão justificou essa opção, primeiro, pelo facto de as vendas de cabos elétricos realizadas à escala do EEE terem aumentado sensivelmente a partir de 2006, pelo que a escolha do último ano completo de participação na infração não seria suficientemente representativo do período de infração para as empresas que cessaram qualquer participação na infração depois de 2006. Entende que basear‑se nas vendas realizadas por todas as empresas em 2004 permitia obter uma estimativa mais precisa da importância económica da infração ao longo de toda a sua duração e do peso relativo das empresas em causa na infração. Segundo, entendeu que a escolha de 2004 permitiria evitar um tratamento discriminatório entre as empresas que puseram termo mais cedo à sua participação (direta) e aquelas que a continuaram. Salientou igualmente na decisão recorrida que o n.o 13 das orientações para o cálculo das coimas de 2006 lhe permitia, numa tal situação, não se basear nos valores das vendas do último ano de participação na infração (considerando 965 da decisão recorrida). Acrescentou que a escolha de um único ano de referência em que todas as partes tivessem participado na infração era preferível para efeitos de aplicação do n.o 18 dessas orientações, de forma a refletir adequadamente o peso de cada empresa na infração (considerando 966 dessa decisão).

243    Quanto ao argumento das recorrentes de que a escolha de um ano de referência comum tem necessariamente um caráter arbitrário por afetar de forma diferente os participantes no cartel consoante o volume de negócios realizado nesse ano, há que lembrar que, de acordo com a jurisprudência, a utilização de um ano de referência comum para todas as empresas que participaram na mesma infração permite, em princípio, determinar as coimas de modo uniforme dentro do respeito do princípio da igualdade, não deixando de apreciar a amplitude da infração cometida em função da realidade económica conforme se apresentava durante o período em causa (v., neste sentido, Acórdãos de 2 de outubro de 2003, Aristrain/Comissão, C‑196/99 P, EU:C:2003:529, n.o 129, e de 16 de novembro de 2011, ASPLA/Comissão, T‑76/06, não publicado, EU:T:2011:672, n.o 112).

244    Por outro lado, há que lembrar que, de acordo com a jurisprudência, uma determinada empresa só pode exigir que a Comissão se baseie, a seu respeito, num período diferente do que geralmente é tido em conta se demonstrar que o volume de negócios que realizou neste último período não constitui, por razões específicas suas, uma indicação da sua verdadeira dimensão e do seu poder económico nem da amplitude da infração que cometeu (Acórdão de 14 de maio de 1998, Fiskeby Board/Comissão, T‑319/94, EU:T:1998:95, n.o 42).

245    No caso, as recorrentes alegam que realizaram um volume de negócios excecional no domínio dos cabos elétricos em 2004, em razão da finalização do projeto «BASF» por 4 700 000 de francos suíços (CHF) e do projeto «Espagne 9» por 3 200 000 CHF, que afirmam não ser representativo do seu volume de negócios ao longo da sua participação na infração. Ora, não juntam qualquer prova dessa alegação, pelo que não é possível o Tribunal apreciar, para além da realidade e da composição do seu volume de negócios de 2004, a amplitude da variação desse volume de negócios face aos anos de 2003 e 2005. Resulta ainda do relatório anual da Brugg Kabel de 2005 que, não obstante um início de ano difícil, as vendas atingiram nesse ano um nível comparável ao do ano anterior, em razão de várias encomendas no domínio dos cabos elétricos de alta tensão na segunda parte do ano.

246    Nestas condições, há que considerar que as recorrentes não demonstraram que a Comissão cometeu um erro na fixação do ano de referência para a determinação do montante das vendas a tomar em conta no cálculo do montante de base da coima. Daí resulta que a primeira vertente do sexto fundamento deve ser julgada improcedente.

b)      Quanto à apreciação da gravidade da infração

247    As recorrentes acusam a Comissão de ter violado o seu dever de fundamentação e de ter cometido um erro de apreciação no que diz respeito à proporção do valor das vendas de 19% que lhes foi fixada face à gravidade da infração única e continuada.

1)      Quanto à alegada violação do dever de fundamentação na determinação da proporção do valor das vendas fixada face à gravidade da infração

248    As recorrentes alegam que a Comissão fundamentou de forma contraditória a decisão recorrida ao precisar, por um lado, no considerando 998 da decisão recorrida, que, para a determinação da proporção do valor das vendas fixada face à gravidade da infração, só tinha em conta uma infração única e continuada cuja gravidade avaliava em 15%, ao passo que, por outro lado, no considerando 999 dessa decisão, aumentou de forma seletiva a proporção do valor das vendas a tomar em consideração em 2% para as empresas que alegadamente tinham tomado parte na «configuração europeia do cartel», que procedia a uma repartição suplementar dos projetos de cabos elétricos depois de esta já ter sido feita no âmbito da configuração A/R desse cartel. Ao fazê‑lo, a Comissão colocou‑se em contradição com o postulado que ela própria tinha estabelecido segundo o qual os mecanismos de repartição desta última configuração e da configuração europeia desse cartel fazem parte integrante da infração única e continuada. As recorrentes entendem que lhes é, assim, aplicada uma primeira percentagem de gravidade de 15% em razão da sua participação na infração única e continuada que engloba as duas configurações do cartel, e depois uma segunda percentagem de gravidade de 2%, novamente em razão da sua participação na «configuração europeia do cartel». Entendem, assim que a lógica aplicada pela Comissão conduz a uma violação do princípio ne bis in idem.

249    Por outro lado, as recorrentes alegam que a Comissão violou o seu dever de fundamentação ao indicar, nos considerandos 1003 e 1004 da decisão recorrida, que se justifica um aumento do grau de gravidade pela quota de mercado acumulada das empresas participantes no cartel e pelo seu alcance geográfico, sem precisar o montante nem a composição desse aumento. Salientam que é só a partir das «conclusões» relativas à gravidade, no considerando 1010 dessa decisão, que pode calcular esse montante por dedução.

250    A Comissão contesta a argumentação das recorrentes no seu conjunto.

251    A esse respeito, primeiro, quanto ao aumento do grau de gravidade em razão da quota de mercado acumulada das empresas participantes no cartel e do seu alcance geográfico, refira‑se que o montante desse aumento, a saber, uma percentagem de 2%, está descrito com precisão no considerando 1010 da decisão recorrida, como de resto admitem as recorrentes. Quanto à falta de precisão nessa decisão sobre a contribuição respetiva para esse aumento dos dois fatores que estão na sua origem, a saber, a quota de mercado acumulada e o alcance geográfico do cartel, essa precisão não era necessária no caso presente, uma vez que a fundamentação a esse respeito era adaptada à natureza do ato em causa e revelava de forma clara e inequívoca o raciocínio da Comissão, o que permite às recorrentes conhecer as justificações da medida tomada e ao Tribunal exercer a sua fiscalização.

252    Segundo, quanto ao alegado caráter contraditório da fundamentação da decisão recorrida no que diz respeito à determinação da proporção do valor das vendas a ter em conta pela gravidade da infração, não se pode deixar de observar que decorre de uma leitura errada da decisão recorrida.

253    As recorrentes alegam, em substância, que a Comissão apreciou uma primeira vez o comportamento dos participantes na infração única e continuada ao determinar em 15% a proporção do valor das vendas a ter em conta pela gravidade da infração, uma vez que apreciou uma segunda vez o mesmo comportamento quando fixou uma percentagem suplementar de 2% para as empresas que participaram na «configuração europeia» e na «configuração A/R» do cartel.

254    Ora, há que referir que, no considerando 998 da decisão recorrida, a Comissão indicou que a infração única e continuada ao artigo 101.o TFUE e ao artigo 53.o do Acordo EEE em que os destinatários da decisão recorrida tinham participado, consistia em repartir a clientela e os mercados. Precisou que essa infração constituía, pela sua própria natureza, uma das restrições mais graves da concorrência, pois falseava os principais parâmetros da concorrência. Lembrou que, de acordo com o n.o 23 das orientações para o cálculo das coimas de 2006, essas práticas são, por princípio, severamente punidas e que o grau de gravidade se situa geralmente na parte alta da escala. Precisou que considerava que esse elemento justificaria uma percentagem de 15% em razão da gravidade dos factos.

255    No considerando 999 da decisão recorrida, a Comissão precisou seguidamente que, para além dos mecanismos de atribuição da «configuração A/R do cartel», certos projetos no EEE tinham sido objeto de uma repartição suplementar entre os produtores europeus no âmbito da «configuração europeia» desse cartel e que essa atuação, que era exclusiva dos produtores europeus, intensificou o prejuízo para a concorrência já causado pelo acordo de repartição dos mercados entre os produtores europeus, japoneses e sul coreanos e, portanto, o grau de gravidade da infração. Seguidamente indicou que a distorção adicional causada por esta última configuração justificava um aumento do grau de gravidade da infração de 2% para as empresas que tinham participado nesse aspeto do cartel.

256    Resulta claramente dos considerandos 998 e 999 da decisão recorrida que a Comissão entendeu que a percentagem mínima das vendas a ter em conta por todas as empresas a que podia ser imputada a responsabilidade da infração única e continuada era de 15%, independentemente do seu nível de participação no cartel, mas que se deveria fixar uma percentagem suplementar de 2% contra as empresas que tinham participado na «configuração A/R do cartel» e na «configuração europeia» desse cartel, pelo facto de os efeitos anticoncorrenciais da primeira dessas duas configurações serem reforçados pelos da segunda.

257    Não têm razão, portanto, as recorrentes quando alegam que a fundamentação da decisão recorrida relativa à gravidade da infração é contraditória a esse respeito. Do mesmo modo, não têm razão as recorrentes quando alegam uma violação do princípio ne bis in idem, pois o raciocínio da Comissão exposto nos considerandos 998 e 999 da decisão recorrida não leva a punir duas vezes pelos mesmos factos.

2)      Quanto ao alegado erro resultante de não ter sido tido em conta o facto de as recorrentes não fabricarem cabos elétricos submarinos durante o período da infração no âmbito da determinação da proporção do valor das vendas fixado quanto à gravidade da infração

258    As recorrentes alegam que, de acordo com a jurisprudência, a Comissão tinha de ter em conta na determinação da proporção do valor das vendas fixado quanto à gravidade da infração o facto de não produzirem cabos elétricos submarinos durante o período de infração. Afirmam que a Comissão simplesmente não podia escapar a essa obrigação alegando que essa circunstância já tinha sido tida em conta no cálculo da coima pela não inclusão das vendas de cabos elétricos submarinos no valor das vendas. Afirmam que isto vale também para o facto de não aplicarem a regra do mercado nacional e de não participarem na atribuição de projetos de grande envergadura.

259    A Comissão contesta os argumentos das recorrentes.

260    A esse respeito, há que referir que a Comissão explicou no considerando 1000 da decisão recorrida que, em substância, não havia que ter em conta o facto de as recorrentes não produzirem cabos elétricos submarinos durante o período da infração, no âmbito da determinação da proporção do valor das vendas a fixar‑lhes pela gravidade da infração, uma vez que já tinha sido tido em conta na determinação do valor das suas vendas.

261    Além disso, como acertadamente refere a Comissão, a única jurisprudência invocada pelas recorrentes com vista a contestar esta apreciação é irrelevante para o caso.

262    Com efeito, no processo que deu origem ao Acórdão de 30 de novembro de 2011, Quinn Barlo e o./Comissão (T‑208/06, EU:T:2011:701), o Tribunal considerou que a recorrente não tinha ou não tinha de ter conhecimento dos acordos relativos a outros produtos. Ora, no caso presente, como acima se observa no n.o 222, as recorrentes tinham conhecimento da existência de acordos relativos aos cabos elétricos submarinos.

263    Do mesmo modo, no processo que deu origem ao Acórdão de 16 de setembro de 2013, Zucchetti Rubinetteria/Comissão (T‑396/10, EU:T:2013:446), os acordos eram relativos a diversos grupos de produtos e diferentes produtores. Também aí, nem todas as empresas participantes tinham conhecimento de todos os tipos de acordos e a participação da empresa recorrente restringia‑se a um mercado nacional.

264    Nos processos que deram origem ao Acórdão de 30 de novembro de 2011, Quinn Barlo e o./Comissão (T‑208/06, EU:T:2011:701), e ao Acórdão de 16 de setembro de 2013, Zucchetti Rubinetteria/Comissão (T‑396/10, EU:T:2013:446), não era possível imputar aos recorrentes a responsabilidade pelo comportamento dos outros participantes no cartel na medida em que não tinham conhecimento dele. No caso, pelo contrário, como acima se dá por provado no n.o 223, as recorrentes tinham pleno conhecimento do alcance dos acordos e podiam, portanto, ser com razão consideradas responsáveis pelo conjunto da infração.

265    Daí resulta que as recorrentes não demonstraram que a Comissão cometeu um erro ao não ter em conta, no âmbito da determinação da proporção do valor das vendas a fixar pela gravidade da infração, o facto de não terem fabricado cabos elétricos submarinos ao longo do período da infração.

3)      Quanto à alegada violação do princípio da igualdade de tratamento

266    As recorrentes criticam a Comissão por ter entendido que a sua participação na «configuração europeia do cartel» e, desse modo, no segundo «nível de atribuição» desse cartel apresentava um grau de gravidade maior, pelo que aplicou um aumento de 2% da proporção do valor das vendas a fixar‑lhes pela gravidade da infração. Entendem que isso leva a puni‑las com maior gravidade pelo facto de serem alegadamente informadas dos resultados das discussões no âmbito da «configuração A/R» desse cartel do que as empresas que participaram ativamente nessas configurações, que conceberam, coordenaram e impuseram todo o cartel e que igualmente mais beneficiaram com os acordos.

267    A Comissão contesta a argumentação das recorrentes.

268    A esse respeito, há que lembrar que, de cada vez que decide aplicar coimas nos termos do direito da concorrência, a Comissão tem de respeitar os princípios gerais de direito, entre os quais constam os princípios da igualdade de tratamento e da proporcionalidade, tal como interpretados pelos tribunais da União. Segundo jurisprudência assente, o princípio da igualdade de tratamento ou da não discriminação exige que não sejam tratadas situações comparáveis de maneira diferente e que não sejam tratadas situações diferentes de maneira igual, a não ser que tal tratamento seja objetivamente justificado (v. Acórdãos de 27 de junho de 2012, Bolloré/Comissão, T‑372/10, EU:T:2012:325, n.o 85 e jurisprudência aí referida, e de 19 de janeiro de 2016, Mitsubishi Electric/Comissão, T‑409/12, EU:T:2016:17, n.o 108 e jurisprudência aí referida).

269    No caso, no considerando 999 da decisão recorrida, a Comissão justificou um aumento de 2% da proporção do valor das vendas a fixar pela gravidade da infração relativamente a certas empresas participantes na infração pelo facto de terem participado na «configuração europeia do cartel» que tinha intensificado o prejuízo para a concorrência já causado pelo acordo de repartição dos mercados entre os produtores europeus, japoneses e sul coreanos. Daí resulta que o critério tido em conta pela Comissão para justificar esse aumento estava ligado à simples participação na «configuração europeia do cartel» e não ao caráter mais ou menos ativo dessa participação. Uma vez que, como acima se observa no n.o 233, a Comissão teve razão ao imputar às recorrentes a participação na infração única e continuada, incluindo na «configuração europeia do cartel», estas não podem validamente alegar que foram objeto de um tratamento menos favorável do que as outras empresas europeias que participaram na mesma configuração a quem foi aplicado o mesmo aumento.

270    De resto, há que referir que foi tido em conta o caráter mais ou menos ativo da participação na infração das diferentes empresas destinatárias da decisão recorrida na fase da apreciação das circunstâncias atenuantes. Assim, as recorrentes foram classificadas no grupo dos participantes intermédios, ao passo que as empresas com o papel de líder na «configuração europeia» e na «configuração A/R do cartel», isto é, a Nexans France, a Pirelli e a Prysmian, foram classificadas no núcleo duro do cartel. Em consequência dessa diferença de classificação, a Comissão concedeu às recorrentes uma redução da coima de 5%, tendo excluído essa redução à Nexans France, à Pirelli e à Prysmian. Daí resulta que as recorrentes não demonstraram que a Comissão tenha violado o princípio da igualdade de tratamento ao aplicar‑lhes o mesmo aumento de 2% da proporção do valor das vendas a fixar pela gravidade da infração que aplicou à Nexans France, à Pirelli e à Prysmian.

271    Em face destas considerações, improcede a segunda vertente do sexto fundamento.

c)      Quanto à fixação de um coeficiente de 4,91 pela duração da participação das recorrentes na infração

272    As recorrentes criticam a Comissão por ter aplicado um coeficiente de 4,91 pela duração da sua participação na infração que não tem em conta o facto de esta não ter demonstrado o início da sua participação na infração antes de 3 de julho de 2002 nem o facto de a sua participação na infração se ter interrompido, em particular, entre 12 de maio de 2005 e 8 de dezembro de 2005. Afirmam que, consequentemente, a Comissão deveria ter aplicado um coeficiente de 3,79.

273    A Comissão contesta a argumentação das recorrentes.

274    A esse respeito, basta lembrar que, conforme acima se observa no n.o 213, a Comissão fixou corretamente o início da participação das recorrentes na infração em 14 de dezembro de 2001 e não cometeu qualquer erro ao considerar que a sua participação tinha sido contínua até 16 de novembro de 2006.

275    Improcede, pois, a terceira vertente do sexto fundamento.

d)      Quanto ao montante da taxa de entrada

276    As recorrentes criticam a Comissão por não ter exposto qualquer fundamento autónomo quanto à taxa de entrada invocada no considerando 1013 da decisão recorrida e de se ter limitado a remeter para os considerandos 998 a 1010 dessa decisão, relativos ao cálculo do montante de base. Afirmam que a Comissão, nos termos dos n.os 22 e 25 das orientações para o cálculo das coimas de 2006, deveria ter tido em consideração a sua participação objetiva em todos os elementos da infração ou o seu conhecimento subjetivo desses elementos, ou mesmo de uma parte deles. A taxa de entrada deveria, consequentemente, refletir o facto de as recorrentes não poderem consideradas responsáveis pelos acordos relativos aos cabos elétricos submarinos, aos mercados nacionais e aos projetos de grande envergadura.

277    A Comissão contesta a argumentação das recorrentes.

278    A esse respeito, há que lembrar que, nos termos do n.o 25 das orientações para o cálculo das coimas de 2006:

«[…] independentemente da duração da participação de uma empresa na infração, a Comissão incluirá no montante de base uma soma compreendida entre 15% e 25% do valor das vendas tal como definidos na secção A a fim de dissuadir as empresas de participarem até mesmo em acordos horizontais de fixação de preços, de repartição de mercado e de limitação de produção A Comissão pode igualmente aplicar tal montante adicional no caso de outras infrações. Para decidir a proporção do valor das vendas a ter em conta num determinado caso, a Comissão terá em conta certos fatores, em especial os identificados no [n.o] 22.»

279    O n.o 22 das orientações para o cálculo das coimas de 2006 prevê o seguinte «[a] fim de decidir se a proporção do valor das vendas a tomar em consideração num determinado caso se deverá situar num nível inferior ou superior desta escala, a Comissão terá em conta certos fatores, como a natureza da infração, a quota de mercado agregada de todas as partes em causa, o âmbito geográfico da infração e se a infração foi ou não posta em prática».

280    Baseando‑se expressamente no n.o 25 das orientações para o cálculo das coimas de 2006, a Comissão indicou, no considerando 1013 da decisão recorrida, que, para determinar a percentagem específica a aplicar, ter‑se‑ia em conta os elementos referidos nos considerandos 998 a 1010 dessa decisão.

281    Ora, há que observar que os considerandos 998 a 1002 da decisão recorrida são relativos à natureza da infração, o considerando 1003 dessa decisão é relativo à quota de mercado acumulada detida pelos participantes na infração, o considerando 1004 dessa decisão diz respeito ao alcance geográfico da infração e os considerandos 1005 a 1009 da mesma decisão são relativos à sua execução. Há que salientar que, no considerando 1008 da decisão recorrida, a Comissão precisou que, como resultava do n.o 4.3.3 da decisão em causa, todas as empresas tinham conhecimento de todos os outros comportamentos ilícitos previstos ou executados pelos outros participantes no cartel ou podiam razoavelmente prevê‑los e estavam dispostas a aceitar o risco.

282    Além disso, no considerando 1014 da decisão recorrida, a Comissão precisou que a percentagem a aplicar pelo montante adicional era de 17% para a Sumitomo Electric Industries, a Hitachi Cable, a Furukawa Electric, a Fujikura, a SWCC Showa Holdings, a Mitsubishi Cable Industries, a LS Cable & System e a Taihan Electric Wire e de 19% para a Nexans France, a Prysmian, a ABB, a Brugg Kabel, a Safran, a Silec Cable, a nkt cables e as empresas obrigadas «solidariamente» responsáveis com uma ou outra destas.

283    Assim, na medida em que, com a sua argumentação, as recorrentes alegam falta de fundamentação da decisão recorrida quanto à taxa de entrada, não se pode deixar de observar que, na realidade, essa argumentação não tem suporte nos factos, uma vez que as recorrentes tinham a possibilidade de compreender as razões pelas quais a Comissão optou por lhes aplicar uma taxa de entrada correspondente a 19% do valor das vendas e o Tribunal tem a possibilidade de fiscalizar a legalidade da decisão recorrida a esse respeito.

284    Por outro lado, na medida em que as recorrentes acusam a Comissão de um erro ao não ter em conta na determinação da taxa de entrada o facto de não poderem ser responsáveis pelos acordos sobre os cabos elétricos submarinos, sobre os mercados nacionais e sobre os projetos de envergadura, basta lembrar que, como acima se observa no n.o 233, a Comissão não cometeu qualquer erro ao imputar às recorrentes a participação na infração única e continuada.

285    Improcede, pois, a quarta vertente do sexto fundamento.

e)      Quanto às circunstâncias atenuantes

286    As recorrentes acusam a Comissão, primeiro, de ter cometido um erro ao classificá‑las entre os participantes intermédios no cartel e ao atribuir‑lhes, consequentemente, uma redução do montante da coima de 5%, quando o papel passivo que tiveram no cartel, demonstrado pela sua atitude perturbadora e pelas tentativas de as disciplinar, justificava que fossem classificadas nos participantes marginais no cartel e que lhes fosse atribuída, consequentemente, uma redução do montante da coima de 10%. Segundo, alegam que essa situação constitui uma violação dos princípios da igualdade de tratamento e da proporcionalidade na medida em que tiveram um papel comparável ao da nkt cables, que a Comissão classificou ente os participantes marginais no cartel e à qual concedeu, consequentemente, uma redução do montante da coima de 10%. Terceiro, alegam que a Comissão cometeu um erro ao não ter em conta, a título de circunstância atenuante, o facto de, no caso de uma infração única e continuada, serem imputados à empresa em causa, para além do seu próprio comportamento, outros comportamentos ilícitos que não são seus. Afirmam que, no caso de uma infração única e continuada, os factos que contribuíram para a infração devem ser tidos em consideração particularmente a nível da modulação do montante de base da coima. Quarto, alegam que, além disso, deveriam ter beneficiado de uma redução suplementar da coima de 1%, como a Mitsubishi Cable Industries e a SWCC Showa Holdings, pelo período anterior à constituição da Exsym, da LS Cable & System e da Taihan Electric Wire, pela sua falta de conhecimento de certos aspetos da infração e, portanto, de responsabilidade a seu respeito, em particular quanto aos cabos elétricos submarinos e aos projetos de grande envergadura.

287    A Comissão contesta todos os argumentos das recorrentes.

288    A esse respeito, primeiro, quanto à classificação das recorrentes como participantes intermédios do cartel, há que referir que é em vão que as recorrentes tentam alegar que tiveram um papel passivo no cartel.

289    Com efeito, há que lembrar que, como acertadamente resulta do considerando 572 da decisão recorrida, embora as recorrentes não estivessem envolvidas na criação do cartel e não tenham assistido a nenhuma reunião A/R, os seus empregados assistiram pelo menos a 17 reuniões anticoncorrenciais com membros R desse cartel entre dezembro de 2001 e novembro de 2006.

290    De resto, há que lembrar que já acima se deu por provado, no n.o 175, que, ao contrário do que as recorrentes alegam, as provas reunidas pela Comissão eram suficientes para demonstrar que elas tinham participado em 14 de dezembro de 2001 em Divonne‑les‑Bains numa primeira reunião dos membros R do cartel.

291    Além disso, resulta das provas reunidas pela Comissão que as recorrentes tentaram organizar uma reunião R em abril de 2002.

292    Com efeito, numa mensagem de correio eletrónico de 9 de abril de 2002 intitulada «Meeting in the area of BRUGG» (reunião na região de Brugg), N. indicava o seguinte:

«Pela presente se confirma o convite à Brugg para a próxima reunião. Fizemos a reserva para a reunião e para o almoço num local privado nas proximidades […] para quinta‑feira, 25 de abril de 2002.

Max. 20 pessoas […]

É favor informar a identidade e o número de pessoas que chegam na véspera.

Por favor transmitir aos outros participantes e reconfirmar a data e a reunião […].»

293    Ora, há que referir que a mensagem de correio eletrónico de 9 de abril de 2002 é dirigida por N. a J., a quem pede que transmita a informação aos outros participantes na reunião, em vez de o fazer por si próprio. Da mesma forma, N. pede a J. que lhe confirme quantas pessoas virão na véspera da reunião. Verifica‑se, pois, que N. se dirige a J. na qualidade de coordenador da reunião. Ora, é pacífico que J. ocupava precisamente a função de coordenador dos membros R do cartel. Além disso, não se pode deixar de observar que as recorrentes não impugnam as afirmações da Comissão relativas ao conteúdo dessa mensagem de correio eletrónico nos seus articulados.

294    Acresce que as próprias recorrentes admitem nos seus articulados terem assumido a organização material de uma reunião dos membros R do cartel em 3 de junho de 2002. É certo que, como alegam as recorrentes, o facto de organizar materialmente essas reuniões não é, só por si, o sinal de que exerciam um papel semelhante ao de um coordenador do cartel. De resto, está assente que esse papel, que implicava, por exemplo, a convocação das reuniões, a proposta da ordem de trabalhos ou a distribuição de documentos preparatórios, era, no caso presente, assumida por J. Contudo, há que observar que a organização material de uma reunião R implica necessariamente da parte quem se encarrega dela uma vontade de contribuir ativamente para o funcionamento do cartel.

295    Por outro lado, é igualmente em vão que as recorrentes alegam que o papel passivo que desempenharam na infração é demonstrado pelas suas muitas faltas à disciplina do cartel.

296    Com efeito, tendo em conta os muitos exemplos não impugnados de execução do cartel pelas recorrentes, referidos no considerando 493 da decisão recorrida, o facto de, em certos casos, as recorrentes não terem respeitado as regras de funcionamento do cartel por recusarem respeitar a regra do mercado nacional no interior da «configuração europeia» ou por não respeitarem a preferência pré‑estabelecida sobre projetos a realizar nos «territórios de exportação» não basta para desmentir o facto de os acordos terem sido executados pelas recorrentes. Como acertadamente refere a Comissão, isto é ainda mais verdade quando uma certa instabilidade é inerente à própria natureza dos cartéis, o que faz com que uma desobediência ocasional de certos membros e as represálias a que conduz no interior da «configuração europeia do cartel» sejam típicas dessa repartição do mercado. Durante o período da infração que lhes é imputado, as recorrentes respeitaram, em princípio, permanentemente as modalidades acordadas, o que N. confirma na mensagem de correio eletrónico de 24 de janeiro de 2006 dirigida a J., acima referida nos n.os 195 e 196. Deste modo, as provas referidas pelas recorrentes, sobre eventuais medidas destinadas a discipliná‑las, não servem para provar que elas tiveram um papel passivo.

297    Assim, não se pode deixar de observar que a Comissão não cometeu qualquer erro ao classificar as recorrentes entre os participantes intermédios da infração.

298    Consequentemente, é inoperante o argumento das recorrentes de que, quanto à participação no cartel, estavam na mesma situação da nkt cables. Com efeito, esse argumento, admitindo‑o fundado, seria suscetível de justificar um aumento do montante da coima aplicada à nkt cables. Em contrapartida, essa circunstância é irrelevante quanto à concessão de uma redução do montante da coima aplicada às recorrentes por circunstâncias atenuantes, uma vez que o princípio da igualdade de tratamento não pode servir de base a nenhum direito à aplicação não discriminatória de um tratamento ilegal (v., neste sentido, Acórdão de 11 de setembro de 2002, Pfizer Animal Health/Conselho, T‑13/99, EU:T:2002:209, n.o 479).

299    Segundo, quanto à alegada violação do princípio da igualdade de tratamento no que diz respeito à redução suplementar do montante da coima de 1%, basta observar que a afirmação das recorrentes de que deveriam ter beneficiado dessa redução por não terem conhecimento dos acordos sobre os cabos elétricos submarinos e não poderem participar na atribuição de projetos de grande envergadura assenta numa premissa errada, como acima se observa nos n.os 219, 220 e 222.

300    Terceiro, quanto à alegação de que, no âmbito da apreciação das circunstâncias atenuantes, a Comissão deveria ter tido em conta a natureza única e continuada da infração, há que referir, como faz a Comissão, que o conceito de infração única e continuada não impõe, em si mesmo, uma redução da coima. Conforme acima se considerou no n.o 297, a Comissão, em face dos elementos de facto na sua posse, apreciou corretamente a contribuição das recorrentes para a execução do cartel ao classificá‑las na categoria intermédia, por um lado. Por outro, o valor das vendas realça a importância económica das recorrentes, mesmo tendo em conta apenas os cabos elétricos que elas produziam. O facto de serem tidas em conta as atuações dos outros participantes no cartel não pode justificar uma redução suplementar da coima, pois estão em concordância com o modo de organização do cartel posto em prática pelos participantes, baseado na divisão do trabalho e vigiado de forma continuada e estrita.

301    Resulta do exposto que não violou o princípio da igualdade de tratamento nem cometeu qualquer erro de apreciação a Comissão ao classificar as recorrentes entre os participantes intermédios no cartel, pelo que lhes concedeu, consequentemente, uma redução de 5% do montante da coima.

302    Em face destas considerações, improcede a quinta vertente do sexto fundamento e, com ela, todo esse fundamento.

303    Não tendo o exame dos fundamentos apresentados pelas recorrentes revelado qualquer ilegalidade que afete a decisão recorrida, improcede na íntegra o pedido de anulação.

B.      Quanto ao pedido de redução do montante da coima aplicada

304    Antes de examinar o pedido das recorrentes de redução do montante da coima que lhes foi aplicada, há que lembrar que a fiscalização da legalidade é completada pela competência de plena jurisdição que é reconhecida ao juiz da União pelo artigo 31.o do Regulamento n.o 1/2003, de acordo com o artigo 261.o TFUE. Essa competência habilita o julgador, para além da simples fiscalização da legalidade da sanção, a substituir a apreciação da Comissão pela sua própria apreciação e, deste modo, a suprimir, reduzir ou aumentar a coima ou a sanção pecuniária compulsória aplicada. Há que salientar, porém, que o exercício da competência de plena jurisdição não equivale a uma fiscalização oficiosa e que a tramitação processual nos tribunais da União é contraditória. Com exceção dos fundamentos de ordem pública de que o julgador deve conhecer oficiosamente, como a inexistência de fundamentação da decisão recorrida, é ao recorrente que cabe suscitar fundamentos contra essa decisão e apresentar prova que alicerce esses fundamentos (Acórdão de 8 de dezembro de 2011, KME Germany e o./Comissão, C‑389/10 P, EU:C:2011:816, n.os 130 e 131).

305    As recorrentes pedem a redução do montante da coima que lhes foi aplicada pelos fundamentos mencionados no âmbito do sexto fundamento. Ora, por um lado, o sexto fundamento invocado pelas recorrentes em apoio do seu pedido de anulação foi julgado improcedente e, por outro, não há elementos que, no caso, possam justificar uma redução do montante dessa coima. Daí resulta que o pedido de redução desse montante deve ser julgado improcedente.

306    Em face destas considerações, há que negar integralmente provimento ao recurso.

IV.    Quanto às despesas

307    Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo as recorrentes sido vencidas, há que condená‑las nas despesas, em conformidade com os pedidos da Comissão.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção)

decide:

1)      Negase provimento ao recurso.

2)      A Brugg Kabel AG e a Kabelwerke Brugg AG Holding são condenadas nas despesas.

Collins

Kancheva

Barents

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 12 de julho de 2018.

Assinaturas


Índice


I. Antecedentes do litígio

A. Recorrentes e setor em causa

B. Procedimento administrativo

C. Decisão recorrida

1. Infração em causa

2. Responsabilidade das recorrentes

3. Coima aplicada

II. Tramitação do processo e pedidos das partes

III. Questão de direito

A. Quanto aos pedidos de anulação

1. Quanto ao primeiro fundamento, relativo a violações dos direitos de defesa e do direito a um processo equitativo

a) Quanto à notificação em inglês dos pedidos de informações e da comunicação de acusações

b) Quanto à recusa da Comissão de facultar acesso às respostas dos outros destinatários da comunicação de acusações

2. Quanto ao segundo fundamento, relativo a incompetência da Comissão para punir uma infração cometida em Estados terceiros e sem incidência no EEE

3. Quanto ao terceiro fundamento e ao quarto fundamento, relativos a erro de apreciação, violação do direito à presunção de inocência, erros de facto, desvirtuação da prova, e violação do dever de fundamentação, a respeito da alegada participação das recorrentes numa infração única e continuada

a) Considerações preliminares

b) Quanto ao caráter único da infração

c) Quanto à duração da participação das recorrentes na infração

1) Quanto ao início da participação das recorrentes no cartel

2) Quanto ao caráter ininterrupto da participação das recorrentes na infração

d) Quanto à intenção das recorrentes de contribuírem para o conjunto dos objetivos do cartel e ao seu conhecimento de certos comportamentos ilícitos

e) Quanto à prova de que as recorrentes tinham conhecimento dos acordos relativos aos diferentes projetos de cabos elétricos

f) Quanto à fundamentação da decisão recorrida sobre a identidade dos projetos de cabos elétricos em causa

4. Quanto ao quinto fundamento, relativo a violação do artigo 101.o TFUE e do artigo 53.o do Acordo EEE

5. Quanto ao sexto fundamento, relativo a violação do artigo 23.o, n.os 2 e 3, do Regulamento n.o 1/2003, a violações dos princípios da igualdade de tratamento, da proporcionalidade e ne bis in idem, a uma violação do dever de fundamentação, a vários erros de apreciação e a um desvio de poder no que diz respeito ao cálculo do montante da coima aplicada às recorrentes

a) Quanto à escolha do ano de 2004 como ano de referência do valor das vendas para o cálculo do montante de base da coima

b) Quanto à apreciação da gravidade da infração

1) Quanto à alegada violação do dever de fundamentação na determinação da proporção do valor das vendas fixada face à gravidade da infração

2) Quanto ao alegado erro resultante de não ter sido tido em conta o facto de as recorrentes não fabricarem cabos elétricos submarinos durante o período da infração no âmbito da determinação da proporção do valor das vendas fixado quanto à gravidade da infração

3) Quanto à alegada violação do princípio da igualdade de tratamento

c) Quanto à fixação de um coeficiente de 4,91 pela duração da participação das recorrentes na infração

d) Quanto ao montante da taxa de entrada

e) Quanto às circunstâncias atenuantes

B. Quanto ao pedido de redução do montante da coima aplicada

IV. Quanto às despesas


* Língua do processo: alemão.