Language of document : ECLI:EU:C:2018:484

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

21 de junho de 2018 (*)

«Reenvio prejudicial — Propriedade intelectual e industrial — Direito das patentes — Atos de Adesão à União Europeia de 2003, de 2005 e de 2012 — Mecanismo específico — Aplicabilidade às importações paralelas — Regulamento (CE) n.o 469/2009 — Produto protegido por um certificado complementar de proteção num Estado‑Membro e comercializado pelo titular da patente de base noutro Estado‑Membro — Esgotamento dos direitos de propriedade intelectual e industrial — Inexistência de uma patente de base nos novos Estados‑Membros — Regulamento (CE) n.o 1901/2006 — Prorrogação do período de proteção»

No processo C‑681/16,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Landgericht Düsseldorf (Tribunal Regional de Dusseldórfia, Alemanha), por decisão de 15 de dezembro de 2016, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 27 de dezembro de 2016, no processo

Pfizer Ireland Pharmaceuticals, Operations Support Group

contra

Orifarm GmbH,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

composto por: M. Ilešič, presidente de secção, A. Rosas, C. Toader (relatora), A. Prechal e E. Jarašiūnas, juízes,

advogado‑geral: E. Tanchev,

secretário: K. Malacek, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 15 de novembro de 2017,

vistas as observações apresentadas:

–        em representação da Pfizer Ireland Pharmaceuticals, Operations Support Group, por J. Feldges e B. Kramer, Rechtsanwälte, e M. Struys, avocat,

–        em representação da Orifarm GmbH, por A. Rosenfeld, A Okonek, e L. Manthey, Rechtsanwälte,

–        em representação da Comissão Europeia, por T. Scharf e J. Samnadda, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 7 de fevereiro de 2018,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação dos mecanismos específicos previstos no capítulo 2 do anexo IV do Ato relativo às condições de adesão da República Checa, da República da Estónia, da República de Chipre, da República da Letónia, da República da Lituânia, da República da Hungria, da República de Malta, da República da Polónia, da República da Eslovénia e da República Eslovaca e às adaptações dos Tratados em que se funda a União Europeia (JO 2003, L 236, p. 33, e retificação no JO 2004, L 126, p. 2, a seguir «Ato de adesão de 2003»), no capítulo 1 do anexo V do Ato relativo às condições de adesão da República da Bulgária e da Roménia e às adaptações dos Tratados em que se funda a União Europeia (JO 2005, L 157, p. 203, a seguir «Ato de adesão de 2005») e no capítulo 1 do anexo IV do Ato relativo às condições de adesão da República da Croácia e às adaptações do Tratado da União Europeia, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia e do Tratado que institui a Comunidade Europeia da Energia Atómica (JO 2012, L 112, p. 21, a seguir «Ato de adesão de 2012»), bem como a interpretação do Regulamento (CE) n.o 469/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de maio de 2009, relativo ao certificado complementar de proteção para os medicamento (JO 2009, L 152, p. 1, a seguir «Regulamento CCP»), e do Regulamento (CE) n.o 1901/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativo a medicamentos para uso pediátrico e que altera o Regulamento (CEE) n.o 1768/92, a Diretiva 2001/20/CE, a Diretiva 2001/83/CE e o Regulamento (CE) n.o 726/2004 (JO 2006, L 378, p. 1).

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Pfizer Ireland Pharmaceuticals, Operations Support Group, à Orifarm GmbH, a propósito de importações paralelas na Alemanha de um medicamento denominado «Enbrel», proveniente de novos Estados‑Membros.

 Quadro jurídico

 Ato de adesão de 2003

3        O capítulo 2 do anexo IV do Ato de adesão de 2003, com a epígrafe «Direito das sociedades», prevê:

«Mecanismo Específico

No que se refere à República Checa, à Estónia, à Letónia, à Lituânia, à Hungria, à Polónia, à Eslovénia ou à Eslováquia, o titular — ou o beneficiário — de uma patente ou de um certificado complementar de proteção de um produto farmacêutico registado num Estado‑Membro, numa data em que não era possível obter essa proteção num dos novos Estados‑Membros acima referidos para esse produto, pode invocar os direitos conferidos por essa patente ou certificado complementar de proteção para impedir a importação e a comercialização desse produto no Estado ou Estados‑Membros em que o produto em questão goza da proteção conferida pela patente ou pelo certificado complementar de proteção, mesmo que o referido produto tenha sido colocado no mercado pela primeira vez nesse novo Estado‑Membro por ele próprio ou com o seu consentimento.

Qualquer pessoa que tencione importar ou comercializar um produto farmacêutico abrangido pelo parágrafo anterior para um Estado‑Membro onde o produto goze de proteção conferida pela patente ou de proteção suplementar, deve provar às autoridades competentes, no pedido relativo a essa importação, que o titular ou o beneficiário dessa pro[te]ção foi previamente notificado com o prazo de um mês.»

 Ato de adesão de 2005

4        O capítulo 1 do anexo V do Ato de adesão de 2005, com a epígrafe «Direito das sociedades», prevê:

«Mecanismo Específico

No que se refere à Bulgária ou à Roménia, o titular — ou o beneficiário — de uma patente ou de um certificado complementar de proteção de um produto farmacêutico pedido num Estado‑Membro numa data em que não era possível obter essa proteção num dos novos Estados‑Membros acima referidos para esse produto, pode invocar os direitos conferidos por essa patente ou certificado complementar de proteção para impedir a importação e a comercialização desse produto no Estado ou Estados‑Membros em que o produto em questão goza da proteção conferida pela patente ou pelo certificado complementar de proteção, mesmo que o referido produto tenha sido colocado no mercado pela primeira vez nesse novo Estado‑Membro por ele próprio ou com o seu consentimento.

Qualquer pessoa que tencione importar ou comercializar um produto farmacêutico abrangido pelo parágrafo anterior para um Estado‑Membro onde o produto goze de proteção conferida pela patente ou de proteção suplementar, deve provar às autoridades competentes, no pedido relativo a essa importação, que o titular ou o beneficiário dessa pro[te]ção foi previamente notificado com o prazo de um mês.»

 Ato de adesão de 2012

5        O capítulo 1 do anexo IV do Ato de adesão de 2012, com a epígrafe «Direito de propriedade intelectual», prevê:

«Mecanismo Específico

No que se refere à Croácia, o titular — ou o beneficiário — de uma patente ou de um Certificado Complementar de Proteção (CCP) de um medicamento pedido num Estado‑Membro numa data em que não era possível obter tal proteção na Croácia para esse produto pode invocar os direitos conferidos por essa patente ou esse CCP para impedir a importação e a comercialização desse produto no Estado‑Membro ou Estados‑Membros em que o produto em questão goza da proteção conferida pela patente ou pelo CCP, mesmo que o referido produto tenha sido colocado no mercado pela primeira vez na Croácia por si próprio ou com o seu consentimento.

Qualquer pessoa que tencione importar ou comercializar um produto farmacêutico abrangido pelo parágrafo anterior para um Estado‑Membro onde o produto goze de proteção conferida pela patente ou de proteção suplementar, deve provar às autoridades competentes, no pedido relativo a essa importação, que o titular ou o beneficiário dessa pro[te]ção foi previamente notificado com o prazo de um mês.»

 Regulamento n.o 1901/2006

6        Os considerandos 4, 26 e 27 do Regulamento n.o 1901/2006 têm a seguinte redação:

«(4)      O presente regulamento tem por objetivo facilitar o desenvolvimento e o acesso a medicamentos para uso pediátrico, garantir que os medicamentos utilizados no tratamento da população pediátrica sejam objeto de uma investigação de elevada qualidade que tenha em conta princípios éticos e estejam adequadamente autorizados para uso pediátrico, e melhorar a informação disponível sobre o uso de medicamentos nos diferentes grupos da população pediátrica. Esses objetivos deverão ser alcançados sem que se submetam as crianças a ensaios clínicos desnecessários e sem atrasar a autorização de medicamentos para outras faixas etárias da população.

[…]

(26)      No que diz respeito aos medicamentos abrangidos pela exigência de apresentação de dados pediátricos, se todas as medidas incluídas no plano de investigação pediátrica aprovado tiverem sido cumpridas, o medicamento estiver autorizado em todos os Estados‑Membros e a informação relevante sobre o resultado dos estudos tiver sido incluída na informação disponível sobre o medicamento, deverá ser concedida uma recompensa sob a forma da prorrogação, por seis meses, do certificado complementar de proteção criado pelo Regulamento (CEE) n.o 1768/92 do Conselho[, de 18 de junho de 1992, relativo à criação de um certificado complementar de proteção para os medicamentos (JO 1992, L 182, p. 1)]. […]

(27)      O pedido de prorrogação da validade de um certificado concedido nos termos do presente regulamento só deverá ser admissível se o certificado tiver sido concedido nos termos do Regulamento [n.o 1768/92].»

7        O artigo 36.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1901/2006 enuncia:

«Sempre que um pedido nos termos dos artigos 7.o ou 8.o incluir os resultados de todos os estudos realizados em conformidade com um plano de investigação pediátrica aprovado, o titular da patente ou do [CCP] tem direito a uma prorrogação de seis meses do período referido nos n.os 1 e 2 do artigo 13.o do Regulamento […] n.o 1768/92.»

 Regulamento CCP

8        Os considerandos 2, 4, 5, 6, 8 e 10 do Regulamento CCP têm a seguinte redação:

«(2)      A investigação no domínio farmacêutico contribui de forma decisiva para a melhoria contínua da saúde pública.

[…]

(4)      Atualmente, o período que decorre entre o depósito de um pedido de patente para um novo medicamento e a autorização de introdução no mercado do referido medicamento reduz a proteção efetiva conferida pela patente a um período insuficiente para amortizar os investimentos efetuados na investigação.

(5)      Destas circunstâncias resulta uma proteção insuficiente que penaliza a investigação farmacêutica.

(6)      Existe o risco de deslocalização dos centros de investigação situados nos Estados‑Membros para países que oferecem uma melhor proteção.

[…]

(8)      É pois necessário prever um [CCP] para os medicamentos relativamente aos quais tenha sido dada autorização de introdução no mercado e que possa ser obtido a pedido do titular de uma patente nacional ou europeia nos mesmos termos em cada Estado‑Membro. Consequentemente, o regulamento é o instrumento mais adequado.

[…]

(10)      No entanto, todos os interesses em causa num setor tão complexo e sensível como o farmacêutico, incluindo os relativos à saúde pública, deverão ser tomados em consideração. Para este efeito, o certificado não poderá ser concedido por um período superior a cinco anos. Além disso, a proteção que o certificado confere deverá ser estritamente limitada ao produto abrangido pela autorização da sua introdução no mercado como medicamento.»

9        O artigo 1.o deste regulamento, intitulado «Definições», enuncia:

«Para efeitos do presente regulamento, entende‑se por:

a)      “Medicamento”: qualquer substância ou composição com propriedades curativas ou preventivas em relação a doenças humanas […];

b)      “Produto”: o princípio ativo ou composição de princípios ativos contidos num medicamento;

c)      “Patente de base”: a patente que protege um produto, na aceção da definição da alínea b), como tal, um processo de obtenção de um produto ou uma aplicação de um produto e que tenha sido designado pelo seu titular para efeitos do processo de obtenção de um certificado;

d)      Certificado: o [CCP];

[…]»

10      O artigo 3.o do referido regulamento, intitulado «Condições de obtenção do certificado», prevê:

«O certificado é concedido se no Estado‑Membro onde for apresentado o pedido previsto no artigo 7.o e à data de tal pedido:

a)      O produto estiver protegido por uma patente de base em vigor;

b)      O produto tiver obtido, enquanto medicamento, uma autorização válida de colocação no mercado, nos termos do disposto na Diretiva [2001/83/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de novembro de 2001, que estabelece um código comunitário relativo aos medicamentos para uso humano (JO 2001, L 311, p. 67)] […];

c)      O produto não tiver sido já objeto de um certificado;

d)      A autorização referida na alínea b) for a primeira autorização de colocação do produto no mercado, como medicamento.»

11      O artigo 4.o do mesmo regulamento, intitulado «Objeto da proteção», dispõe:

«Dentro dos limites da proteção assegurada pela patente de base, a proteção conferida pelo certificado abrange apenas o produto coberto pela autorização de colocação no mercado do medicamento correspondente para qualquer utilização do produto, como medicamento, que tenha sido autorizada antes do termo de validade do certificado.»

12      O artigo 5.o do Regulamento CCP tem a seguinte redação:

«Sem prejuízo do disposto no artigo 4.o, o certificado confere os mesmos direitos que os conferidos pela patente de base e está sujeito às mesmas limitações e obrigações.»

13      No seu artigo 6.o, intitulado «Direito ao certificado», o Regulamento CCP precisa que o direito ao CCP pertence ao titular da patente de base ou aos seus sucessores a qualquer título.

14      O artigo 7.o, n.os 1, 3, 4 e 5, desse regulamento, intitulado «Pedido de certificado», enuncia:

«1.      O pedido de certificado deve ser apresentado no prazo de seis meses a contar da data em que o produto obteve a autorização de colocação no mercado, como medicamento, referida na alínea b) do artigo 3.o

[…]

3.      O pedido de prorrogação da validade pode ser apresentado no momento da apresentação ou na pendência de um pedido de certificado, se estiverem preenchidos os requisitos adequados da alínea d) do n.o 1 do artigo 8.o ou do n.o 2 do artigo 8.o, respetivamente.

4.      O pedido de prorrogação da validade de um certificado já concedido deve ser apresentado, o mais tardar, dois anos antes do termo de validade do certificado.

5.      Não obstante o disposto no n.o 4, durante um período de cinco anos após a entrada em vigor do Regulamento […] n.o 1901/2006, os pedidos de prorrogação de certificados já concedidos são apresentados até seis meses antes do termo do referido certificado.»

15      Nos termos do artigo 13.o do referido regulamento, com a epígrafe «Condições de obtenção do certificado»:

«1.      O certificado produz efeitos no termo legal da validade da patente de base, durante um período que corresponde ao período decorrido entre a data da apresentação do pedido da patente de base e a data da primeira autorização de introdução no mercado na Comunidade, reduzido um período de cinco anos.

2.      Não obstante o disposto no n.o 1, o período de validade do certificado não pode exceder cinco anos a contar da data em que produzir efeitos.

3.      Os períodos previstos nos n.os 1 e 2 serão prorrogados por seis meses no caso do pedido previsto no artigo 36.o do Regulamento [n.o 1901/2006]. Nesse caso, o período previsto no n.o 1 do presente artigo só pode ser prorrogado uma vez.

[…]»

16      Segundo a tabela de correspondência que figura no Anexo II do mesmo regulamento, o artigo 13.o, n.os 1, 2 e 3, do Regulamento n.o 1768/92 corresponde ao artigo 13.o, n.os 1, 2 e 3, do Regulamento CCP.

 Litígio no processo principal e questões prejudiciais

17      A demandante no processo principal, Pfizer Ireland Pharmaceuticals, Operations Support Group, estabelecida na Irlanda, é uma empresa farmacêutica do grupo Pfizer, ao qual pertence igualmente a Pfizer Pharma GmbH, estabelecida na Alemanha e sociedade‑irmã da demandante no processo principal.

18      Segundo a declaração feita pela demandante na fase oral do processo no Tribunal de Justiça, no mês de outubro de 2009, o grupo Pfizer adquiriu a empresa farmacêutica Wyeth Pharma e os respetivos ativos, entre os quais o CCP cuja emissão tinha sido pedida por esta última, em 26 de junho de 2003 (a seguir «CCP controvertido»), com base na patente europeia n.o 0 939 121 e na autorização de introdução no mercado (a seguir «AIM») do medicamento Enbrel. Este medicamento é produzido pela demandante no processo principal na Alemanha e comercializado em vários países para o tratamento da artrite. O CCP controvertido visava a proteína etanercept, um princípio ativo do referido medicamento.

19      A AHP Manufacturing BV era titular da patente de base em causa no processo principal, para a qual a empresa farmacêutica Roche tinha apresentado um pedido, em 31 de agosto de 1990, acompanhado de reivindicações de prioridades suíças a contar de 12 de setembro de 1989, de 8 de março de 1990 e de 20 de abril de 1990. Esse pedido foi publicado em 1 de setembro de 1991.

20      A primeira AIM do medicamento Enbrel foi concedida à Wyeth Pharma em 1 de fevereiro de 2000 para a Suíça e produzia igualmente efeitos na União Europeia.

21      Em 11 de janeiro de 2006, o Deutsches Patent‑ und Markenamt (Instituto de Marcas e Patentes alemão) emitiu o CCP controvertido para o território alemão.

22      Quando a patente de base em causa no processo principal expirou, em 31 de agosto de 2010, o CCP controvertido entrou em vigor, em 1 de setembro de 2010, por um período até 1 de fevereiro de 2015.

23      Por Decisão do Instituto de Marcas e Patentes alemão de 15 de outubro de 2012, a duração do CCP controvertido foi prorrogada até 1 de agosto de 2015 em conformidade com as disposições conjugadas do Regulamento CCP e do Regulamento n.o 1901/2006.

24      A demandada no processo principal, estabelecida na Alemanha, é uma empresa do grupo dinamarquês Orifarm e exerce a atividade de importação paralela de medicamentos.

25      Decorre dos autos que, no mês de novembro de 2012, a demandada no processo principal informou a Pfizer Pharma da sua intenção de efetuar importações paralelas, principalmente da Estónia e da Letónia, bem como, a partir do mês de fevereiro de 2015, da Bulgária, da República Checa, da Hungria, da Polónia, da Roménia, da Eslováquia e da Eslovénia. No âmbito de uma abundante troca de correspondência com a demandada entre os anos de 2012 e de 2015, a Pfizer Pharma opôs‑se sempre a essas importações.

26      No mês de abril de 2015, a Pfizer Pharma tomou conhecimento de que estavam disponíveis no mercado alemão embalagens do medicamento Enbrel, que haviam sido fabricadas para a Polónia, a Eslovénia, a Lituânia e a Croácia, e que identificavam todas a demandada no processo principal como importador paralelo.

27      Por considerar que os mecanismos específicos previstos nos Atos de adesão de 2003, de 2005 e de 2012 (a seguir «mecanismos específicos») impediam uma importação paralela do produto em causa na Alemanha, a demandante no processo principal propôs, em 1 de junho de 2015, uma ação para o Landgericht Düsseldorf (Tribunal Regional de Dusseldórfia, Alemanha) por violação do CCP controvertido e da respetiva prorrogação.

28      Pede, primeiro, que seja ordenada a proibição da importação, a posse, a oferta para venda e a comercialização do medicamento Enbrel. De acordo com as informações de que o Tribunal de Justiça dispõe, a demandante no processo principal renunciou, após 1 de agosto de 2015, a esse primeiro pedido na sequência de o CCP controvertido ter expirado. Segundo, pede que seja ordenado o fornecimento de informações sobre essas atividades relativamente ao período de 1 de setembro de 2010 a 1 de agosto de 2015, incluindo a emissão de faturas, bem como a retirada e a destruição dos produtos importados, e, terceiro, pede que seja declarado o direito a uma indemnização.

29      A demandante no processo principal considera que a data de referência para efeitos de comparação dos níveis de proteção, com vista a examinar a aplicabilidade dos mecanismos específicos, é a do pedido de patente de base no Estado‑Membro de importação. Alega igualmente que o conceito de «prorrogação» do CCP deve ser entendido no sentido de que está incluído no conceito de «CCP» na aceção dos mecanismos específicos, embora o Regulamento n.o 1901/2006, que rege a referida prorrogação, não estivesse em vigor à data da celebração dos Atos de adesão de 2003 e de 2005.

30      Por seu turno, a demandada no processo principal sustenta, no órgão jurisdicional de reenvio, que os mecanismos específicos são inaplicáveis porquanto à data do pedido do CCP controvertido deveria ter sido obtida uma proteção equivalente nos novos Estados‑Membros em causa. A este respeito, alega que a patente de base e o CCP devem ser apreciados em separado.

31      Decorre da decisão de reenvio ser pacífico entre as partes que à data do pedido de patente de base, em 31 de agosto de 1990, era impossível obter uma proteção equivalente para o produto em causa em todos os novos Estados‑Membros em causa e que à data do pedido do CCP controvertido, em 26 de junho de 2003, podia ser obtida uma proteção desse produto através de um CCP em todos aqueles Estados, com exceção da Croácia.

32      A este respeito, o órgão jurisdicional de reenvio considera, à luz do Acórdão de 15 de janeiro de 2015, Forsgren (C‑631/13, EU:C:2015:13), que a patente de base e o CCP são direitos de proteção autónomos e ao mesmo tempo estão estreitamente ligados, e sublinha que a possibilidade de obter uma proteção através de um CCP nos novos Estados‑Membros em causa à data do pedido do CCP controvertido para a Alemanha deve ser apreciada tendo a conta a circunstância de que o produto em causa não podia ser protegido nos referidos Estados aderentes à data do pedido da patente de base em causa.

33      Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, o argumento de que a patente de base constitui uma condição indispensável para a posterior concessão de um CCP aponta para que se tome em conta a data do pedido da patente de base. Reconhece, porém, que esta interpretação pode conduzir a uma restrição desproporcionada do princípio do esgotamento dos direitos e da livre circulação de mercadorias.

34      Interrogando‑se igualmente acerca da questão de saber se os mecanismos específicos visam a prorrogação do CCP, com a consequência de, em caso afirmativo, a demandante no processo principal não poder invocar o esgotamento dos direitos relativamente ao período de 1 de fevereiro a 1 de agosto de 2015, o órgão jurisdicional de reenvio observa que o enunciado dos atos de adesão se limita a distinguir entre a patente de base e o CCP e não menciona o Regulamento n.o 1901/2006. Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, a finalidade idêntica do CCP e da sua prorrogação aponta no sentido de uma resposta afirmativa. Refere, porém, que esta tese colide com a necessidade de interpretar restritivamente os mecanismos específicos e com a hierarquia das normas, na medida em que um ato de direito derivado, concretamente o Regulamento n.o 1901/2006, alarga — em parte a posteriori — o âmbito de aplicação de atos de direito primário, a saber, os Atos de Adesão de 2003, de 2005 e de 2012, que preveem os mecanismos específicos.

35      Nestas condições, o Landgericht Düsseldorf (Tribunal Regional de Dusseldórfia) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      O titular de um [CCP] que lhe foi concedido para a [Alemanha], invocando as disposições do mecanismo específico, [pode] impedir a importação [na Alemanha] de produtos provenientes dos [Estados] aderentes República Checa, Estónia, Letónia, Lituânia, Hungria, Polónia, Eslovénia, Eslováquia, Bulgária, Roménia e Croácia […], quando o [CCP] foi pedido na [Alemanha] num momento em já existiam, nos [Estados] aderentes, disposições que permitiam a obtenção de um [CCP equivalente], mas esse certificado não podia ser pedido pelo titular do [CCP] concedido para a [Alemanha nem] ser‑lhe concedido, no Estado aderente [em causa], por [não existir nesse] Estado aderente [uma patente de base], necessária para a concessão do [CCP]?

2)      A resposta à primeira questão será diferente no caso de só não ter sido possível obter a proteção [equivalente] mediante uma patente de base no Estado aderente no momento da apresentação do pedido da patente de base concedida para a [Alemanha], mas essa proteção já poder ter sido obtida no período que decorreu até à publicação do pedido que deu origem à patente de base concedida para a [Alemanha]?

3)      Pode o titular de um [CCP] que lhe foi concedido para a [Alemanha], invocando as disposições do mecanismo específico, impedir a importação [na Alemanha] de produtos provenientes dos Estados aderentes República Checa, Estónia, Letónia, Lituânia, Hungria, Polónia, Eslovénia, Eslováquia, Bulgária, Roménia e Croácia, quando a importação dos produtos é efetuada após o termo do prazo de validade do [CCP] fixado no despacho originário de concessão, mas antes do [termo] da prorrogação [de] seis meses que lhe foi concedida com base no Regulamento n.o 1901/2006?

4)      A resposta à terceira questão será diferente no caso [da] Croácia, pelo facto de o mecanismo específico só ter começado a vigorar com a sua adesão, em 2013, após a entrada em vigor, em 26 de janeiro de 2007, do Regulamento n.o 1901/2006, diversamente dos restantes novos Estados‑Membros que aderiram antes de 26 de janeiro de 2007, ou seja, a República Checa, a Estónia, a Letónia, a Lituânia, a Hungria, a Polónia, a Eslovénia, a Eslováquia, a Bulgária e a Roménia?»

 Quanto às questões prejudiciais

 Quanto à primeira e segunda questões

36      Com a primeira e segunda questões, que convém abordar em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se os mecanismos específicos devem ser interpretados no sentido de que permitem ao titular de um CCP emitido num Estado‑Membro diferente dos novos Estados‑Membros opor‑se à importação paralela de um medicamento proveniente desses novos Estados‑Membros numa situação em que as ordens jurídicas destes últimos Estados previam a possibilidade de obter uma proteção equivalente não na data da apresentação do pedido de patente de base, mas na data da publicação do pedido de patente de base e/ou da apresentação do pedido de CCP no Estado‑Membro de importação, pelo que era impossível ao titular obter uma patente e um CCP equivalente nos Estados de exportação.

37      Em particular, com estas questões, o órgão jurisdicional de reenvio procura determinar a data precisa em função da qual se deve comparar o nível de proteção existente no Estado‑Membro de importação e o existente nos Estados de exportação, para efeitos de aplicação dos mecanismos específicos.

38      Nos termos de uma regra geral contida nos Atos de adesão de 2003, de 2005 e de 2012, no seu artigo 2.o respetivo, as disposições dos Tratados originários e os atos adotados pelas instituições antes da adesão dos novos Estados‑Membros vinculam estes Estados desde a sua adesão e são‑lhes aplicáveis nas condições previstas por esses Tratados e por esses atos. Por conseguinte, a contar da adesão, os artigos dos Tratados relativos à livre circulação de mercadorias e os princípios que deles decorrem nos termos da jurisprudência do Tribunal de Justiça são aplicáveis às trocas comerciais entre esses novos Estados‑Membros e os outros Estados‑Membros da União.

39      Assim, em conformidade com jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o titular de um direito de propriedade industrial e comercial protegido pela legislação de um Estado‑Membro não pode invocar esta legislação para se opor à importação de um produto que tenha sido colocado licitamente no mercado de outro Estado‑Membro pelo próprio titular deste direito ou com o seu consentimento (v., designadamente, Acórdãos de 14 de julho de 1981, Merck, 187/80, EU:C:1981:180, n.o 12, e de 12 de fevereiro de 2015, Merck Canada e Merck Sharp & Dohme, C‑539/13, EU:C:2015:87, n.o 24).

40      Todavia, à semelhança do Ato relativo às condições de adesão do Reino de Espanha e da República Portuguesa e às adaptações dos Tratados (JO 1985, L 302, p. 23), os Atos de adesão de 2003, de 2005 e de 2012 preveem, como sublinhou o advogado‑geral no n.o 47 das suas conclusões, mecanismos específicos para alcançar um equilíbrio entre a livre circulação de mercadorias e uma proteção eficaz dos direitos de propriedade intelectual e industrial decorrentes de uma patente de base. Para este efeito, esses mecanismos permitem ao titular da patente de base invocar os seus direitos exclusivos contra os importadores em situações em que, sem esses mecanismos, tais direitos estariam esgotados de acordo com a jurisprudência do Tribunal de Justiça. Assim, o objetivo do mecanismo específico consiste em evitar uma situação em que a aplicação plena dos princípios do mercado interno após a adesão dos novos Estados‑Membros levaria a que o titular da patente ficasse exposto a importações paralelas provenientes desses Estados sem ter tido a possibilidade de proteger aí a sua invenção e, consequentemente, sem ter obtido uma compensação adequada.

41      Por conseguinte, os mecanismos específicos derrogam a livre circulação de mercadorias. Ora, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, as disposições de um ato de adesão que permitem derrogar as regras dos Tratados devem ser interpretadas de forma estrita (v., designadamente, Acórdãos de 5 de dezembro de 1996, Merck e Beecham, C‑267/95 e C‑268/95, EU:C:1996:468, n.o 23, e de 12 de fevereiro de 2015, Merck Canada e Merck Sharp & Dohme, C‑539/13, EU:C:2015:87, n.o 25 e jurisprudência aí referida).

42      No caso vertente, embora os enunciados das disposições do capítulo 2 do anexo IV do Ato de adesão de 2003, do capítulo 1 do anexo V do Ato de adesão de 2005 e do capítulo 1 do anexo IV do Ato de adesão de 2012 contenham uma certa ambiguidade, a expressão «não era possível obter essa proteção», utilizada nas referidas disposições, estabelece uma condição negativa relativa aos níveis de proteção a comparar. Conclui‑se que a aplicação dos mecanismos específicos às importações paralelas depende da inexistência dessa proteção equivalente.

43      Quanto à data precisa em que deve ser comparado o nível de proteção existente no Estado‑Membro de importação e o existente nos Estados de exportação, decorre do emprego do termo «pedido» que figura nas disposições citadas no n.o 42 do presente acórdão que essa data é a do pedido de proteção.

44      A este respeito, importa sublinhar que, apesar de a versão original em alemão dos Atos de adesão de 2003 e de 2005 empregar o termo «eingetragen» (registado) em vez do termo «beantragt» (apresentado), essa versão foi objeto de retificações, em 2004 e em 2011, através, respetivamente, da Segunda ata de retificação do Tratado relativo à adesão de 2003 (JO 2004, L 126, p. 2) e da Ata de retificação do Tratado relativo à adesão de 2005 (JO 2011, L 347, p. 62). O Ato de adesão de 2012 utilizou o termo «beantragt» desde o início.

45      No caso vertente, a patente de base em causa no processo principal foi pedida na Alemanha em 31 de agosto de 1990, data em que ainda não estava prevista uma proteção equivalente pelas legislações dos onze Estados de exportação, que iam aderir à União em 2004, em 2007 e em 2013. A título de exemplo, uma proteção através de patente só foi prevista na Checoslováquia no mês de novembro de 1990, na Roménia e na Eslovénia em 1992, na Polónia e na Letónia em 1993, e na Lituânia, na Hungria e na Estónia em 1994.

46      Como salientou o órgão jurisdicional de reenvio, o CCP controvertido foi pedido na Alemanha em 26 de junho de 2003, data em que as ordens jurídicas dos Estados de exportação já previam a possibilidade de obter uma proteção equivalente.

47      Nestas circunstâncias, coloca‑se a questão de saber se é a data do pedido de CCP ou a do pedido de patente de base que deve ser considerada para comparar os níveis de proteção existentes no Estado‑Membro de importação e nos Estados de exportação.

48      Para responder a esta questão, há que ter em conta a finalidade do CCP.

49      A este respeito, importa igualmente salientar que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o CCP apenas visa restabelecer um período suficiente de proteção efetiva da patente de base, permitindo ao seu titular beneficiar de um período suplementar de exclusividade após a expiração dessa patente, destinado a compensar, pelo menos parcialmente, o atraso sofrido na exploração comercial da sua invenção, devido ao lapso de tempo decorrido entre a data da apresentação do pedido de patente e a da obtenção da primeira AIM na União (Acórdão de 12 de dezembro de 2013, Eli Lilly and Company, C‑493/12, EU:C:2013:835, n.o 41 e jurisprudência aí referida).

50      A concessão de um CCP exige, porém, a reunião das condições cumulativas enunciadas no artigo 3.o do Regulamento CCP. Esta disposição prevê, em substância, que um CCP só pode ser concedido se, à data do pedido, o produto estiver protegido por uma patente de base em vigor e já não tiver sido objeto de um CCP. Além disso, é necessário que esse produto tenha obtido, enquanto medicamento, uma AIM válida nos termos do disposto na Diretiva 2001/83 ou na Diretiva 2001/82, conforme o caso, sendo, por último, essa AIM a primeira do produto enquanto medicamento (Acórdão de 15 de janeiro de 2015, Forsgren, C‑631/13, EU:C:2015:13, n.o 32).

51      Decorre das considerações expostas nos n.os 49 e 50 do presente acórdão que há uma ligação indissolúvel entre a existência de um CCP e a de uma patente de base, visto que, na inexistência de uma patente, um produto não pode beneficiar da proteção conferida por um CCP.

52      Esta conclusão é corroborada pelo enunciado de várias disposições do Regulamento CCP. Assim, o artigo 6.o do referido regulamento precisa que o direito ao CCP pertence ao titular da patente de base ou aos seus sucessores a qualquer título. O artigo 13.o do mesmo regulamento prevê, no seu n.o 1, que o CCP produz efeitos no termo legal da validade da patente de base, durante um período que corresponde ao período decorrido entre a data da apresentação do pedido da patente de base e a data da primeira AIM na União, reduzido de um período de cinco anos.

53      Além disso, nos termos do artigo 5.o do Regulamento CCP, um CCP confere, ao expirar a patente de base, os mesmos direitos que os que eram conferidos por esta patente relativamente ao produto em causa, nos limites da proteção conferida pela referida patente, tal como enunciados no artigo 4.o desse regulamento. Assim, se o titular da patente podia, durante o período de validade desta, opor‑se, invocando a sua patente, a qualquer utilização ou a certas utilizações do seu produto sob a forma de um medicamento que consistisse nesse produto ou o contivesse, o CCP concedido para esse mesmo produto conferir‑lhe‑á os mesmos direitos para qualquer utilização do produto, como medicamento, que tenha sido autorizada antes de esse CCP expirar (v., neste sentido, Despacho de 9 de fevereiro de 2012, Novartis, C‑574/11, não publicado, EU:C:2012:68, n.o 18 e jurisprudência aí referida).

54      Consequentemente, embora as ordens jurídicas dos Estados de exportação já previssem, no momento do pedido do CCP controvertido, a possibilidade de obter uma proteção equivalente, essa possibilidade era na realidade teórica uma vez que a existência de uma patente de base em cada um desses Estados é indispensável para a obtenção efetiva de um CCP.

55      Ora, é dado assente que, no momento do pedido da patente de base em causa no processo principal na Alemanha, em 31 de agosto de 1990, era impossível ao titular pedir uma proteção equivalente nos Estados de exportação, uma vez que a possibilidade dessa proteção foi introduzida por estes últimos numa data posterior.

56      Além disso, considerar determinante, para efeitos de comparação do nível de proteção no Estado de importação com esse nível nos Estados de exportação, uma data posterior à da apresentação do pedido da patente de base no primeiro desses Estados colocaria em perigo o equilíbrio, visado pelos mecanismos específicos, entre uma proteção eficaz dos direitos decorrentes de uma patente de base ou de um CCP, por um lado, e a livre circulação de mercadorias prevista pelo Tratado FUE, por outro, ao impor, nomeadamente, ao titular uma obrigação de vigilância contínua do estado do direito em todos os países de potencial adesão e, sendo esse o caso, ao tratar diferentemente os titulares que apresentaram pedidos de patente no mesmo dia em função da morosidade do processo de autorização de introdução no mercado, processo esse sobre o qual não têm geralmente nenhuma influência. Por outro lado, como salientou a Comissão, a apresentação de um pedido de patente nos Estados de exportação à data da entrada em vigor de uma proteção equivalente nesses Estados estará, em numerosos casos, votada ao insucesso em razão da inexistência de novidade da invenção nessa data.

57      Atendendo às considerações anteriores, há que responder à primeira e segunda questões que os mecanismos específicos devem ser interpretados no sentido de que permitem ao titular de um CCP emitido num Estado‑Membro diferente dos novos Estados‑Membros opor‑se à importação paralela de um medicamento proveniente desses novos Estados‑Membros numa situação em que as ordens jurídicas destes últimos Estados previa a possibilidade de obter uma proteção equivalente não na data da apresentação do pedido de patente de base, mas na data da publicação do pedido de patente de base e/ou da apresentação do pedido de CCP no Estado‑Membro de importação, pelo que era impossível ao titular obter uma patente e um CCP equivalente nos Estados de exportação.

 Quanto à terceira e quarta questões

58      Com a terceira e quarta questões, que convém abordar em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se os mecanismos específicos devem ser interpretados no sentido de que se aplicam à prorrogação prevista no artigo 36.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1901/2006, apesar de essa prorrogação não estar expressamente prevista por esses mecanismos.

59      Desde logo, importa recordar que o artigo 36.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1901/2006 rege a prorrogação do CCP. Segundo o considerando 26 deste regulamento, essa prorrogação representa uma recompensa no caso dos produtos para os quais é exigida a apresentação de dados pediátricos, que deverá ser concedida se todas as medidas incluídas no plano de investigação pediátrica aprovado tiverem sido cumpridas, se o medicamento estiver autorizado em todos os Estados‑Membros e se a informação relevante sobre o resultado dos estudos tiver sido incluída na informação disponível sobre o medicamento.

60      O artigo 36.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1901/2006 prevê que, sempre que um pedido nos termos dos artigos 7.o ou 8.o incluir os resultados de todos os estudos realizados em conformidade com um plano de investigação pediátrica aprovado, o titular da patente de base ou do CCP tem direito a uma prorrogação de seis meses do período referido nos n.os 1 e 2 do artigo 13.o do Regulamento n.o 1768/92.

61      O Regulamento n.o 1768/92, após ter sido alterado várias vezes, foi codificado e, seguidamente, substituído pelo Regulamento CCP, precisando o artigo 22.o deste último regulamento que se deve entender que as referências ao regulamento revogado são feitas ao Regulamento CCP.

62      Segundo o artigo 13.o, n.o 1, do Regulamento CCP, o CCP produz efeitos no termo legal da validade da patente de base, durante um período que corresponde ao período decorrido entre a data de apresentação do pedido da patente de base e a data da primeira AIM na União, reduzido de um período de cinco anos. Segundo o artigo 13.o, n.o 2, deste regulamento, o prazo de validade do CCP não pode exceder cinco anos a contar da data a partir da qual produz efeitos.

63      Importa igualmente sublinhar que, nomeadamente no seu artigo 13.o, n.o 3, o Regulamento CCP refere igualmente o Regulamento n.o 1901/2006, ao dispor que os períodos previstos nos n.os 1 e 2 desse artigo 13.o são prorrogados seis meses em caso de aplicação do artigo 36.o do Regulamento n.o 1901/2006.

64      Conclui‑se que, de acordo com uma interpretação sistemática das disposições do Regulamento CCP, a prorrogação do CCP não está exclusivamente prevista pelo Regulamento n.o 1901/2006, mas é igualmente visada pelo Regulamento CCP.

65      Além disso, o artigo 36.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1901/2006 não modifica a substância do CCP, limitando‑se a prorrogá‑lo. Essa prorrogação do CCP é meramente acessória do próprio CCP, o que é confirmado pela sua menção no artigo 13.o do Regulamento CCP, intitulado «Período de validade do certificado».

66      O caráter acessório de uma prorrogação do CCP relativamente ao próprio CCP decorre igualmente da comparação do seu objeto e da sua finalidade.

67      Assim, decorre dos considerandos 2, 4, 5 e 6 do Regulamento CCP que a melhoria contínua da saúde pública através da investigação está no centro das preocupações do legislador europeu. Neste mesmo espírito, o Regulamento n.o 1901/2006 visa, como resulta do seu considerando 4, facilitar o desenvolvimento e o acesso a medicamentos para uso pediátrico e garantir que os medicamentos utilizados no tratamento da população pediátrica sejam objeto de uma investigação ética de elevada qualidade. À semelhança do Regulamento CCP, a melhoria da saúde pública, e especialmente a proteção de uma população particularmente vulnerável, constitui a finalidade do Regulamento n.o 1901/2006.

68      Nestas condições, não se pode deduzir do facto, suscitado pela demandada no processo principal no âmbito das fases escrita e oral do processo no Tribunal de Justiça, de os enunciados das disposições que instauram os mecanismos específicos não mencionarem expressamente a prorrogação do CCP e de o Regulamento n.o 1901/2006 não fazer parte do acervo da União no momento da celebração dos Atos de adesão de 2003 e de 2005 que essa prorrogação não está abrangida pelo âmbito de aplicação desses mecanismos.

69      Com efeito, como foi salientado nos n.os 65 a 74 do presente acórdão, decorre da economia do Regulamento CCP e do Regulamento n.o 1901/2006, da finalidade da prorrogação pediátrica, comparável à do CCP, e da ligação estreita entre o CCP e a sua eventual prorrogação que esta última deve ser incluída no âmbito de aplicação dos referidos mecanismos.

70      Por último, quanto ao facto de o mecanismo específico previsto pelo Ato de adesão de 2012 se limitar, à semelhança dos Atos de adesão de 2003 e de 2005, a mencionar expressamente a patente de base e o CCP, embora o Regulamento n.o 1901/2006 já estivesse em vigor no momento da adesão da República da Croácia à União, essa circunstância não justifica que se adote uma interpretação diferente relativamente às importações paralelas provenientes deste último Estado‑Membro. Com efeito, além de esta circunstância se explicar por razões históricas, a relação de complementaridade inerente ao CCP e à sua prorrogação pode justificar a opção do legislador da União de não incluir a prorrogação do CCP no texto dos mecanismos específicos.

71      Além disso, como sublinhou o advogado‑geral no n.o 83 das conclusões, se um novo Estado‑Membro fosse tratado diversamente dos restantes, as importações paralelas poderiam fazer‑se através deste último Estado aderente e, consequentemente, existiria uma lacuna na proteção conferida pelas patentes na União que, em última instância, poderia privar de eficácia a proteção estabelecida pelo mecanismo específico previsto nos outros atos de adesão.

72      Quanto ao argumento económico suscitado pela demandada no processo principal, baseado no facto de que a atividade de importação paralela é desejável em direito da União porquanto provoca uma descida de preços no Estado‑Membro de importação, basta referir que esse argumento não pode interferir na interpretação que deve ser adotada em matéria dos mecanismos específicos que, como foi recordado no n.o 40 do presente acórdão, foram instituídos pelos Atos de adesão de 2003, de 2005 e de 2012 para alcançar um equilíbrio entre a livre circulação de mercadorias e uma proteção eficaz dos direitos de propriedade intelectual e industrial decorrentes de uma patente de base.

73      Atendendo às considerações anteriores, há que responder à terceira e quarta questões que os mecanismos específicos devem ser interpretados no sentido de que são aplicáveis à prorrogação prevista no artigo 36.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1901/2006.

 Quanto às despesas

74      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) declara:

1)      Os mecanismos específicos previstos no capítulo 2 do anexo IV do Ato relativo às condições de adesão da República Checa, da República da Estónia, da República de Chipre, da República da Letónia, da República da Lituânia, da República da Hungria, da República de Malta, da República da Polónia, da República da Eslovénia e da República Eslovaca e às adaptações dos Tratados em que se funda a União Europeia, no capítulo 1 do anexo V do Ato relativo às condições de adesão da República da Bulgária e da Roménia e às adaptações dos Tratados em que se funda a União Europeia e no capítulo 1 do anexo IV do Ato relativo às condições de adesão da República da Croácia e às adaptações do Tratado da União Europeia, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia e do Tratado que institui a Comunidade Europeia da Energia Atómica, devem ser interpretados no sentido de que permitem ao titular de um certificado complementar de proteção emitido num EstadoMembro diferente dos novos EstadosMembros visados por esses atos de adesão oporse à importação paralela de um medicamento proveniente desses novos EstadosMembros numa situação em que as ordens jurídicas destes últimos Estados previam a possibilidade de obter uma proteção equivalente não na data da apresentação do pedido de patente de base, mas nada data da publicação do pedido de patente de base e/ou da apresentação do pedido de certificado complementar de proteção no EstadoMembro de importação, pelo que era impossível ao titular obter uma patente e um certificado complementar de proteção equivalente nos Estados de exportação.

2)      Os mecanismos específicos previstos no capítulo 2 do anexo IV do Ato relativo às condições de adesão da República Checa, da República da Estónia, da República de Chipre, da República da Letónia, da República da Lituânia, da República da Hungria, da República de Malta, da República da Polónia, da República da Eslovénia e da República Eslovaca e às adaptações dos Tratados em que se funda a União Europeia, no capítulo 1 do anexo V do Ato relativo às condições de adesão da República da Bulgária e da Roménia e às adaptações dos Tratados em que se funda a União Europeia e no capítulo 1 do anexo IV do Ato relativo às condições de adesão da República da Croácia e às adaptações do Tratado da União Europeia, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia e do Tratado que institui a Comunidade Europeia da Energia Atómica, devem ser interpretados no sentido de quesão aplicáveis à prorrogação prevista no artigo 36.o, n.o 1, do Regulamento (CE) n.o 1901/2006do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativo a medicamentos para uso pediátrico e que altera o Regulamento (CEE) n.o 1768/92, a Diretiva 2001/20/CE, a Diretiva 2001/83/CE e o Regulamento (CE) n.o 726/2004.

Assinaturas


*      Língua do processo: alemão.