Language of document : ECLI:EU:C:2008:620

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

13 de Novembro de 2008 (*)

«Incumprimento de Estado – Comunicações electrónicas – Redes e serviços – Directiva 2002/19/CE (directiva acesso) – Artigos 4.°, n.° 1, e 5.°, n.° 1, primeiro parágrafo – Transposição incorrecta»

No processo C‑227/07,

que tem por objecto uma acção por incumprimento nos termos do artigo 226.° CE, entrada em 8 de Maio de 2007,

Comissão das Comunidades Europeias, representada por M. Shotter e K. Mojzesowicz, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

demandante,

contra

República da Polónia, representada inicialmente por E. Ośniecka‑Tamecka e T. Nowakowski e, em seguida, por M. Dowgielewicz, na qualidade de agentes,

demandada,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

composto por: C. W. A. Timmermans, presidente de secção, K. Schiemann, P. Kūris (relator), L. Bay Larsen e C. Toader, juízes,

advogado‑geral: D. Ruiz‑Jarabo Colomer,

secretário: R. Grass,

vistos os autos,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 10 de Junho de 2008,

profere o presente

Acórdão

1        Na petição inicial, a Comissão pede ao Tribunal de Justiça que declare que a República da Polónia, ao não transpor correctamente, para o direito nacional, a Directiva 2002/19/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de Março de 2002, relativa ao acesso e interligação de redes de comunicações electrónicas e recursos conexos (directiva acesso) (JO L 108, p. 7, a seguir «directiva acesso»), nomeadamente os seus artigos 4.°, n.° 1, relativo à obrigação de negociar a interligação entre si, e 5.°, n.° 1, primeiro parágrafo, relativo ao poder de a autoridade reguladora nacional incentivar e, sempre que oportuno, garantir, em conformidade com as disposições dessa directiva, o acesso e a interligação adequados, bem como a interoperabilidade dos serviços, não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força dessa directiva.

 Quadro jurídico

 Direito comunitário

2        O sexto considerando da directiva acesso expõe:

«Em mercados em que se verificam ainda grandes diferenças no poder de negociação entre empresas e em que algumas empresas têm como base uma infra‑estrutura fornecida por terceiros para a entrega dos seus serviços, justifica‑se a criação de um quadro destinado a garantir o bom funcionamento do mercado. As autoridades reguladoras nacionais devem ter poderes para garantir, em caso de falha das negociações comerciais, um acesso e interligação adequados e a interoperabilidade dos serviços, no interesse dos utilizadores finais. Em particular, podem assegurar a interligação de extremo‑a‑extremo, impondo obrigações proporcionais às empresas que controlam o acesso aos utilizadores finais. O controlo dos meios de acesso pode implicar a propriedade ou o controlo da ligação física ao utilizador final (quer seja fixa ou móvel), e/ou a capacidade de alterar ou retirar o número ou números nacionais necessário para ter acesso ao ponto terminal da rede de um utilizador final. Seria esse o caso, por exemplo, se os operadores de redes restringissem despropositadamente a escolha dos utilizadores finais no que diz respeito ao acesso a serviços e portais da internet.»

3        O décimo quarto considerando dessa directiva enuncia:

«A Directiva 97/33/CE estabelece uma gama de obrigações a impor a empresas com poder de mercado significativo, nomeadamente transparência, não discriminação, separação de contas, acesso e controlo dos preços, incluindo a orientação para os custos. Esta gama de obrigações possíveis deve ser mantida, mas, além disso, deve ser definida como um conjunto de obrigações máximas que pode ser aplicado às empresas, a fim de evitar um excesso de regulação. Excepcionalmente, e a fim de dar cumprimento a compromissos internacionais ou à legislação comunitária, poderá justificar‑se o estabelecimento de obrigações para o acesso ou interligação aplicáveis a todos os intervenientes no mercado, como é actualmente o caso dos sistemas de acesso condicional para serviços de televisão digital».

4        Nos termos do décimo nono considerando dessa mesma directiva:

«A obrigatoriedade de concessão de acesso à infra‑estrutura de rede poderá justificar‑se como um meio para aumentar a concorrência, mas as autoridades reguladoras nacionais devem equilibrar os direitos que o proprietário da infra‑estrutura tem de proceder à exploração desta em seu próprio benefício e os direitos de outros prestadores de serviços, de acederem a recursos que são essenciais para a oferta de serviços concorrentes. Sempre que forem impostas obrigações aos operadores que os obriguem a satisfazer pedidos razoáveis de acesso e utilização de elementos de redes e recursos conexos, esses pedidos apenas devem ser recusados com base em critérios objectivos, tais como a viabilidade técnica ou a necessidade de manter a integridade da rede. Sempre que o acesso for recusado, a parte prejudicada pode submeter o caso ao procedimento de resolução de conflitos referido nos artigos 20.° e 21.° da Directiva 2002/21/CE [do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de Março de 2002, relativa a um quadro regulamentar comum para as redes e serviços de comunicações electrónicas (directiva‑quadro) (JO L 108, p. 33, a seguir «directiva‑quadro»)]. A um operador vinculado a um acesso obrigatório não pode ser exigido que ofereça tipos de acesso para cuja prestação este não tem poderes. A imposição de acesso obrigatório pelas autoridades reguladoras nacionais, visando a promoção da concorrência a curto prazo, não deve ter por resultado a redução dos incentivos aos concorrentes para investir em recursos alternativos que possam garantir uma maior concorrência a longo prazo. A Comissão publicou uma Comunicação sobre a aplicação das regras da concorrência aos acordos de acesso no sector das telecomunicações [(JO 1998, C 265, p. 2)], que aborda estas questões. As autoridades reguladoras nacionais podem impor condições técnicas e operacionais ao prestador e/ou aos beneficiários de acesso obrigatório, de acordo com o direito comunitário. Em particular, a imposição de normas técnicas deveria ser conforme com a Directiva 98/34/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de Junho de 1998, relativa a um procedimento de informação no domínio das normas e regulamentações técnicas e das regras relativas aos serviços da sociedade da informação [(JO L 204, p. 37), na redacção dada pela Directiva 98/48/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de Julho de 1998 (JO L 217, p. 18)].»

5        O artigo 2.° da referida directiva contém, nomeadamente, as seguintes definições:

«[…]

a)      ‘Acesso’, a disponibilização de recursos e/ou serviços a outra empresa, segundo condições definidas, em regime de exclusividade ou não exclusividade, para efeitos de prestação de serviços de comunicações electrónicas. Abrange, nomeadamente: o acesso a elementos da rede e recursos conexos, podendo incluir a ligação de equipamento, através de meios fixos ou não fixos (incluindo, em especial, o acesso ao lacete local e a recursos e serviços necessários para prestar serviços pelo lacete local); o acesso a infra‑estruturas físicas, incluindo edifícios, condutas e postes; o acesso a sistemas de software pertinentes, incluindo sistemas de apoio operacional; o acesso à conversão numérica ou a sistemas que ofereçam uma funcionalidade equivalente; o acesso a redes fixas e móveis, em especial para fins de itinerância (roaming); o acesso a sistemas de acesso condicional para serviços de televisão digital[;] o acesso aos serviços de rede virtual;

b)      ‘Interligação’, a ligação física e lógica de redes de comunicações públicas utilizadas por uma mesma empresa ou por empresas diferentes, de modo a permitir a utilizadores de uma empresa comunicarem com utilizadores desta ou de outras empresas, ou acederem a serviços oferecidos por outra empresa. Os serviços podem ser oferecidos pelas partes envolvidas ou por terceiros que tenham acesso à rede. A interligação é um tipo específico de acesso implementado entre operadores de redes públicas;

[…]»

6        O artigo 4.°, n.° 1, da directiva acesso tem a seguinte redacção:

«Os operadores das redes de comunicações públicas têm o direito e, quando solicitados por outras empresas autorizadas para o efeito, a obrigação, de negociar a interligação entre si com vista à prestação dos serviços de comunicações electrónicas acessíveis ao público, de modo a garantir a oferta e interoperabilidade de serviços em toda a Comunidade. Os operadores oferecerão o acesso e a interligação a outras empresas nos termos e nas condições compatíveis com as obrigações impostas pela autoridade reguladora nacional nos termos dos artigos 5.°, 6.°, 7.° e 8.°»

7        O artigo 5.° da mesma directiva, que define os poderes e as responsabilidades das autoridades reguladoras nacionais relativamente ao acesso e à interligação, dispõe:

«1.      As autoridades reguladoras nacionais devem, agindo em conformidade com os objectivos estabelecidos no artigo 8.° da [directiva‑quadro], incentivar e, sempre que oportuno, garantir, em conformidade com as disposições da presente directiva, o acesso e a interligação adequados, bem como a interoperabilidade de serviços, exercendo a sua responsabilidade de modo a promover a eficiência e a concorrência sustentável e a proporcionar o máximo benefício aos utilizadores finais.

Em especial, e sem prejuízo das medidas que possam ser tomadas em relação às empresas que detenham poder de mercado significativo nos termos do artigo 8.°, as autoridades reguladoras nacionais devem ter a possibilidade de:

a)      Na medida do necessário para garantir a ligação de extremo‑a‑extremo, impor obrigações às empresas que controlam o acesso aos utilizadores finais, incluindo, em casos justificados, a obrigação de interligarem as suas redes quando ainda não estiverem interligadas;

b)      Na medida do necessário para garantir a acessibilidade dos utilizadores finais aos serviços de radiodifusão digital de rádio e televisão especificados pelo Estado‑Membro, impor aos operadores a obrigação de oferecerem acesso aos outros recursos mencionados no anexo I, parte II, em condições justas, razoáveis e não discriminatórias.

2.      Ao imporem a um operador obrigações de oferta de acesso em conformidade com o artigo 12.°, as autoridades reguladoras nacionais podem fixar condições técnicas ou operacionais, a serem cumpridas pelo fornecedor e/ou beneficiários de tal acesso, de acordo com o direito comunitário, quando necessário para garantir o funcionamento normal da rede. As condições que incidam na aplicação de normas ou especificações técnicas específicas deverão obedecer ao disposto no artigo 17.° da [directiva‑quadro].»

3.      As obrigações e as condições impostas nos termos dos n.os 1 e 2 deverão ser objectivas, transparentes, proporcionadas e não discriminatórias, e ser aplicadas em conformidade com o procedimento previsto nos artigos 6.° e 7.° da [directiva‑quadro].

4.      No que diz respeito ao acesso e interligação, os Estados‑Membros assegurarão que as autoridades reguladoras nacionais tenham poderes para intervir por iniciativa própria quando tal se justificar ou, na falta de acordo entre as empresas, a pedido de qualquer das partes envolvidas, a fim de garantir os objectivos de política nesta matéria, constantes do artigo 8.° da [directiva‑quadro], em conformidade com a presente directiva e com os procedimentos referidos nos artigos 6.°, 7.°, 20.° e 21.° da [directiva‑quadro].»

8        Os artigos 6.° e 7.° da directiva acesso, que estão incluídos no seu capítulo III, sob a epígrafe «Obrigações impostas a operadores e procedimentos de análise de mercado», disciplinam, por um lado, os sistemas de acesso condicional para a difusão digital de serviços de televisão e rádio aos telespectadores e ouvintes na Comunidade e, por outro, o necessário reexame das obrigações anteriores em matéria de acesso e de interligação.

9        O artigo 8.°, n.os 2 e 3, da directiva acesso precisa:

«2.      Caso um operador seja designado como operador com poder de mercado significativo num mercado específico, na sequência de uma análise do mercado efectuada em conformidade com o disposto no artigo 16.° da [directiva‑quadro], as autoridades reguladoras nacionais imporão as obrigações previstas nos artigos 9.° a 13.° da presente directiva, consoante adequado.

3.      Sem prejuízo:

–        do disposto nos n.os 1 e 2 do artigo 5.° e no artigo 6.°,

–        do disposto nos artigos 12.° e 13.° da [directiva‑quadro], da condição 7 na secção B do anexo à Directiva 2002/20/CE [do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de Março de 2002, relativa à autorização de redes e serviços de comunicações electrónicas] (directiva autorização) [(JO L 108, p. 21)], tal como aplicado por força do n.° 1 do artigo 6.° dessa directiva, e dos artigos 27.°, 28.° e 30.° da Directiva 2002/22/CE [do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de Março de 2002, relativa ao serviço universal e aos direitos dos utilizadores em matéria de redes e serviços de comunicações electrónicas] (directiva serviço universal) [(JO L 108, p. 51, a seguir ‘directiva serviço universal’)] ou das disposições relevantes da Directiva 97/66/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Dezembro de 1997, relativa ao tratamento de dados pessoais e à protecção da privacidade no sector das telecomunicações [(JO 1998, L 24, p. 1)], que contêm obrigações relativas a empresas não designadas como detendo poder de mercado significativo, ou

–        da necessidade de respeitar os compromissos internacionais.

As autoridades reguladoras nacionais não imporão as obrigações definidas nos artigos 9.° a 13.° aos operadores que não tenham sido designados em conformidade com o n.° 2.

[…]»

10      O artigo 12.° da directiva acesso, sob a epígrafe «Obrigações de acesso e utilização de recursos de rede específicos», dispõe:

«1.      A autoridade reguladora nacional pode, nos termos do artigo 8.°, impor aos operadores a obrigação de dar resposta aos pedidos razoáveis de acesso e utilização de elementos de rede específicos e recursos conexos, nomeadamente em situações em que considere que a recusa de acesso ou a fixação de condições não razoáveis prejudicariam a emergência de um mercado concorrencial sustentável a nível retalhista, ou não seriam do interesse do utilizador final.

Pode, nomeadamente ser exigido aos operadores que:

[…]

b)      Negoceiem de boa fé com as empresas que requerem acesso;

[…]

2.      Ao estudarem a possibilidade de imporem ou não as obrigações contempladas no n.° 1 e, em especial, ao avaliarem se tais obrigações serão proporcionais aos objectivos fixados no artigo 8.° da [directiva‑quadro], as autoridades reguladoras nacionais deverão atender em especial aos seguintes factores:

a)      A viabilidade técnica e económica da utilização ou instalação de recursos concorrentes, em função do ritmo de desenvolvimento do mercado, tendo em conta a natureza e o tipo da interligação e do acesso em causa;

b)      A viabilidade de oferta do acesso proposto, face à capacidade disponível;

c)      O investimento inicial do proprietário dos recursos, tendo em conta os riscos envolvidos na realização do investimento;

d)      A necessidade de salvaguardar a concorrência a longo prazo;

e)      Quando adequado, os eventuais direitos de propriedade intelectual pertinentes;

f)      A oferta de serviços pan‑europeus.»

11      O artigo 8.° da directiva‑quadro define os objectivos de política geral e os princípios de regulação cuja observância deve ser assegurada pelas autoridades reguladoras nacionais.

 Direito nacional

12      O artigo 1.° da Lei das Telecomunicações (Prawo Telekomunikacyjne), de16 de Julho de 2004 (Dz. U de 2004, n.° 171, posição 1800, a seguir «lei das telecomunicações»), define o regime aplicável às actividades de prestação de serviços de telecomunicações, de fornecimento de redes de telecomunicações ou de aplicações conexas (a seguir «actividades de telecomunicações»).

13      O segundo parágrafo do referido artigo 1.° dispõe:

«O objectivo da lei é criar condições:

1)      para o incentivo de uma concorrência leal e efectiva nos serviços de telecomunicações;

2)      para o desenvolvimento e a utilização de infra‑estruturas de telecomunicações modernas;

3)      que garantam a ordem na exploração da numeração, das radiofrequências e dos recursos orbitais;

4)      que proporcionem benefícios máximos aos utilizadores em matéria de diversidade, preços e qualidade dos serviços de telecomunicações;

5)      que garantam a neutralidade tecnológica.

[…]»

14      O artigo 26.° da lei das telecomunicações tem a seguinte redacção:

«1.      Se uma outra empresa de telecomunicações ou entidade referida no artigo 4.°, n.os 1, 2, 4, 5, 7 e 8 o solicitar, o operador de uma rede pública de telecomunicações é obrigado a realizar negociações para a celebração de um contrato de acesso para fornecer serviços de telecomunicações acessíveis ao público e garantir a interoperabilidade dos serviços.

2.      Ao negociar as cláusulas dos contratos de acesso, as empresas de telecomunicações são obrigadas a levar em conta as obrigações que lhes foram impostas.

3.      As informações obtidas no âmbito das negociações só podem ser utilizadas de acordo com o respectivo destino e são objecto de uma obrigação de confidencialidade, salvo disposição em contrário.

4.      Salvo disposição em contrário, o disposto no presente capítulo relativamente às empresas de telecomunicações aplica‑se, respectivamente, às entidades referidas no artigo 4.°, n.os 1, 2, 4, 5, 7 e 8.

5.      Um operador de um Estado‑Membro que peça para aceder a uma rede de telecomunicações não é obrigado a fazer a inscrição no registo referido no artigo 10.°, se não exercer actividades de telecomunicações no território polaco.»

15      Nos termos do artigo 27.° da lei das telecomunicações:

«1.      Oficiosamente ou a requerimento, por escrito, de cada uma das partes nas negociações para a celebração de um contrato de acesso, o presidente do Urząd Komunikacji Elektronicznej (UKE) [(Serviço das Comunicações Electrónicas)] pode fixar, por despacho, um prazo para a conclusão das negociações, que não pode exceder 90 dias a contar da apresentação do pedido de celebração desse contrato.

2.      Se as negociações não forem iniciadas, se o acesso for recusado pela entidade obrigada a concedê‑lo ou se não for celebrado nenhum contrato no prazo referido no n.° 1, cada uma das partes pode requerer ao presidente do UKE que profira uma decisão em que sejam resolvidas as questões controvertidas ou definidas as condições de colaboração.

3.      O requerimento referido no n.° 2 deve conter o projecto de contrato de acesso e indicar as posições respectivas das partes na medida prevista na lei, assim como as cláusulas do contrato relativamente às quais as partes não chegaram a acordo.

4.      A pedido do presidente do UKE, as partes devem apresentar‑lhe, no prazo de 14 dias, as respectivas posições sobre as questões controvertidas e os documentos indispensáveis ao exame do requerimento.»

16      O artigo 28.° dessa lei tem a seguinte redacção:

«1.      O presidente do UKE profere a sua decisão sobre a concessão do acesso, no prazo de 90 dias a contar da data da apresentação do requerimento referido no artigo 27.°, n.° 2, levando em conta os seguintes critérios:

1)      O interesse dos utilizadores das redes de telecomunicações;

2)      As obrigações impostas às empresas de telecomunicações;

3)      A promoção de serviços de telecomunicações modernos;

4)      A natureza das questões controvertidas existentes e a possibilidade prática, face aos aspectos técnicos e económicos do acesso, de implementar as soluções propostas pelas empresas de telecomunicações, que são partes nas negociações, ou que possam servir de soluções alternativas;

5)      A garantia:

a)      da integralidade da rede e da interoperabilidade dos serviços,

b)      de condições de acesso não discriminatórias,

c)      do desenvolvimento da concorrência no mercado dos serviços de telecomunicações;

6)      O poder de mercado das empresas de telecomunicações cujas redes estão interligadas;

7)      O interesse público, incluindo o relativo à protecção do ambiente;

8)      A continuidade dos serviços universais.

2.      O presidente do UKE profere a decisão de concessão de acesso às entidades referidas no artigo 4.°, n.os 1, 2, 4, 5, 7 e 8, no prazo de 60 dias a contar da apresentação do requerimento referido no artigo 27.°, n.° 2, atendendo aos critérios mencionados no n.° 1 [do presente artigo], pontos 1 a 4, 5, alíneas a) e c), 6 e 8, à defesa e à segurança do Estado, à segurança pública e à ordem pública assim como ao carácter específico das missões assumidas por essas entidades.

3.      A decisão de acesso, no âmbito da interligação das redes, pode conter disposições [vinculativas e variáveis, consoante os tipos de rede interligados].

4.      A decisão de concessão do acesso substitui a parte do contrato de acesso abrangida por essa decisão.

5.      Se as partes interessadas celebrarem um contrato de acesso, as disposições da decisão de acesso abrangidas por esse contrato ficam automaticamente sem efeito.

6.      A decisão de acesso pode ser alterada pelo presidente do UKE, a pedido de cada uma das partes em causa, ou oficiosamente, quando isso se justificar pela necessidade de garantir a protecção dos interesses dos utilizadores finais, uma concorrência eficaz ou a interoperabilidade dos serviços.

7.      Dever‑se‑á recorrer aos tribunais caso haja reivindicações financeiras por incumprimento ou cumprimento deficiente das obrigações decorrentes da decisão de acesso.

8.      O presidente do UKE profere uma decisão sobre o acesso que contenha todas as disposições necessárias para garantir o acesso, se uma das partes for uma empresa de telecomunicações à qual foi imposta uma obrigação nos termos [, nomeadamente, do artigo] 45.°»

17      Nos termos do artigo 29.° da referida lei:

«O presidente do UKE pode decidir, oficiosamente, alterar o texto de um contrato de acesso ou obrigar as partes a alterá‑lo, quando isso se justificar pela necessidade de garantir a protecção dos interesses dos utilizadores finais, uma concorrência eficaz ou a interoperabilidade dos serviços.»

18      O artigo 30.° da lei das telecomunicações prevê que «[o]s artigos 26.° a 28.° [...] aplicam‑se, com as necessárias adaptações, à alteração dos contratos de acesso».

19      Nos termos do artigo 45.° dessa lei:

«Tendo em conta a adequação de uma obrigação face ao problema identificado, ao princípio da proporcionalidade e aos objectivos mencionados no artigo 1.°, n.° 2, e atendendo ao artigo 1.°, n.° 3, o presidente do UKE pode adoptar uma decisão que imponha a uma empresa de telecomunicações que controla o acesso aos utilizadores finais as obrigações de regulação indispensáveis para garantir aos utilizadores finais dessa empresa as comunicações com os utilizadores de outra empresa de telecomunicações, incluindo a obrigação de interligação.»

20      O artigo 136.° da referida lei dispõe:

«1.      Para assegurar o acesso dos utilizadores finais a serviços de transmissões radiofónicas e televisivas digitais, o presidente do UKE pode tomar uma decisão que imponha às empresas de telecomunicações a obrigação de conceder acesso às seguintes aplicações conexas:

1)      Software do interface,

2)      Guia electrónico dos programas.

2.      As disposições relativas ao procedimento de consulta e de consolidação aplicam‑se à decisão referida no n.° 1.

3.      O presidente do UKE toma a decisão referida no n.° 1, com base nos princípios da igualdade e da não discriminação.»

 Fase pré‑contenciosa

21      Por notificação para cumprir, remetida em 21 de Março de 2005, a Comissão informou a República da Polónia dos seus receios quanto à transposição, para o direito nacional, dos artigos 4.°, n.° 1, e 5.°, n.° 1, primeiro parágrafo, da directiva acesso. Esse Estado‑Membro respondeu‑lhe por ofício de 20 de Maio de 2005.

22      Em 4 de Julho de 2006, a Comissão emitiu um parecer fundamentado, convidando o referido Estado‑Membro a adoptar as medidas necessárias para cumprir esse parecer no prazo de dois meses a contar da sua recepção. As autoridades polacas responderam a esse parecer em 4 de Setembro de 2006. A Comissão, por não considerar satisfatória essa resposta, decidiu propor a presente acção.

 Quanto à acção

 Quanto à primeira acusação, relativa à não conformidade do artigo 26.° da lei das telecomunicações com o artigo 4.°, n.° 1, da directiva acesso

 Argumentos das partes

23      No âmbito da sua primeira acusação, a Comissão alega que a obrigação de negociar prevista no artigo 4.°, n.° 1, da directiva acesso incumbe a todos os operadores de redes públicas de telecomunicações e diz respeito à interligação das redes. Esta última é um tipo específico de acesso que é implementado entre os diferentes operadores de redes públicas e não visa nenhuma outra forma de acesso. A intervenção da autoridade reguladora nacional só tem lugar em circunstâncias excepcionais.

24      Na opinião da Comissão, resulta, na verdade, do sexto e décimo quarto considerandos e dos artigos 8.°, n.° 3, 5.°, n.° 1, e 12.° da directiva acesso que, em primeiro lugar, deve ser efectuada uma avaliação da situação, para determinar se o mercado em causa está sujeito a uma regulação ex ante e qual o grau de concorrência existente nesse mercado. Em segundo lugar, as autoridades reguladoras nacionais são obrigadas a ter em conta um conjunto de elementos e a examinar o impacto da obrigação de concessão de acesso na concorrência a longo prazo no referido mercado. Em terceiro lugar, o artigo 5.°, n.° 1, da directiva acesso exige a habilitação expressa da autoridade reguladora nacional para impor a todos os operadores, incluindo os que não têm poder de mercado significativo, a obrigação de negociar o acesso às redes de telecomunicações. Em quarto lugar, um dos fundamentos do quadro jurídico comunitário em matéria de comunicações electrónicas é o princípio segundo o qual a autoridade reguladora nacional só intervém nos casos em que os mecanismos do livre mercado não funcionam ou não conduzem a resultados satisfatórios.

25      Ora, segundo a Comissão, o artigo 26.°, n.° 1, da lei das telecomunicações acaba por impor uma obrigação geral de negociar de boa fé contratos de acesso às redes de telecomunicações.

26      No entender da Comissão, quando uma obrigação dessa natureza é imposta ex lege, isso significa não só que a autoridade reguladora nacional não é obrigada a verificar se a imposição dessa obrigação incentiva o acesso ao mercado de telecomunicações mas também que essa autoridade não pondera os interesses do operador da rede em causa e os das empresas que pedem o acesso a essa rede, nem avalia a influência que a imposição dessa obrigação tem num mercado preciso. A referida autoridade tão‑pouco é obrigada a indicar se estão reunidas as condições referidas no artigo 5.°, n.° 1, da directiva acesso.

27      Além do mais, a Comissão sustenta que a posição da República da Polónia assenta em duas premissas erradas. A primeira é a de que a directiva acesso dispõe que a autoridade reguladora nacional pode, sem levar em conta a situação concreta, impor a qualquer operador de uma rede de telecomunicações a obrigação de negociar o acesso a essa rede. A segunda é a de que a realização de negociações representa um encargo mínimo para os operadores de redes de telecomunicações, sem consequências nas suas decisões em matéria de investimento e, portanto, nas condições da concorrência.

28      Por fim, a Comissão salienta, por um lado, que a solução adoptada pela lei das telecomunicações não permite uma melhor execução do princípio da segurança jurídica do que a prevista na directiva acesso e, por outro, que esta prevê não o direito de exigir a abertura de negociações mas tão‑só o poder de a autoridade reguladora nacional impor, após ter analisado o mercado, uma obrigação de negociar aos operadores de redes de telecomunicações que têm um poder de mercado significativo ou, em determinados casos, a qualquer operador.

29      A República da Polónia contesta a procedência desta primeira acusação. Com efeito, alega que uma interpretação teleológica e funcional da directiva acesso conduz à conclusão de que, ao prever a obrigação de iniciar negociações não só para a interligação das redes de telecomunicações mas também para o acesso a essas redes, as disposições do artigo 26.° da lei das telecomunicações não são contrárias ao artigo 4.°, n.° 1, dessa directiva.

30      A este respeito, este Estado‑Membro sublinha, em primeiro lugar, que impor a um operador de uma rede de telecomunicações a obrigação de iniciar negociações com a empresa que pede o acesso a essa rede constitui uma forma de incentivar o acesso às redes de telecomunicações. Deste modo, pode‑se alcançar a utilização máxima das infra‑estruturas existentes por todas as partes interessadas.

31      Além disso, o referido Estado‑Membro alega que a solução que consiste em atribuir a órgãos nacionais a competência para impor a esse operador a obrigação de iniciar negociações a pedido de uma empresa que pretende aceder à rede em causa e a solução, que adoptou, consistente em garantir a essa empresa o direito de obter a abertura de negociações levam a resultados semelhantes para esse operador.

32      Em segundo lugar, a República da Polónia considera que o conceito adoptado é o que melhor concretiza o princípio da segurança jurídica, pois os operadores têm a possibilidade de conhecer com exactidão o alcance das obrigações que lhes incumbem por força da lei das telecomunicações.

33      Esse Estado‑Membro sustenta, além disso, que se deduz do sexto considerando e do artigo 5.°, n.° 1, primeiro parágrafo, da directiva acesso que qualquer empresa tem, de facto, o direito de pedir ao operador de uma rede pública de telecomunicações a realização de negociações relativamente ao acesso a essa rede e que, em caso de insucesso, uma empresa se pode dirigir à autoridade reguladora. Consequentemente, pode‑se considerar que a decisão de a autoridade reguladora obrigar o operador em causa a iniciar negociações é uma decisão de natureza declarativa que confirma a existência de uma obrigação nesse sentido na esfera jurídica desse operador e, portanto, o correspondente direito da empresa que pede o acesso. Deste modo, esse direito e a obrigação simétrica que implica para os operadores encontram plena justificação no objectivo prosseguido pela referida directiva.

34      Por último, segundo esse mesmo Estado‑Membro, embora a lei das telecomunicações esteja em vigor há três anos, nem os operadores nem o desenvolvimento da concorrência sofreram efeitos indesejáveis devido àquela.

 Apreciação do Tribunal de Justiça

35      A título preliminar, importa salientar que a República da Polónia admite que o artigo 26.°, n.° 1, da lei das telecomunicações constitui uma disposição legal geral que impõe a todo o operador de uma rede pública de telecomunicações a obrigação de negociar de boa fé a celebração de um acordo sobre o acesso a essa rede, a pedido de qualquer empresa que pretenda obter esse acesso; essa negociação abrange não só os acordos em matéria de interligação mas também os acordos que regem o acesso à referida rede.

36      Ora, importa assinalar que a obrigação de negociar que incumbe a todos os operadores de redes públicas de telecomunicações, caso outras empresas titulares de uma autorização o solicitem, tal como resulta do artigo 4.°, n.° 1, da directiva acesso, tem por objecto a interligação, a qual, de acordo com a definição dada pelo artigo 2.°, alínea b), dessa directiva, «é um tipo específico de acesso implementado entre operadores de redes públicas». Assim, ao contrário do artigo 26.° da lei das telecomunicações, essa obrigação não diz respeito a outras formas de acesso às redes, como as definidas no artigo 2.°, alínea a), da mesma directiva e como as previstas na lei das telecomunicações.

37      Recorde‑se também que o artigo 4.°, n.° 1, segundo período, da directiva acesso permite aos operadores oferecer o acesso e a interligação a outras empresas, nos termos e nas condições compatíveis com as obrigações impostas pela autoridade reguladora nacional. Entre estas figuram as obrigações que essa autoridade, em aplicação do artigo 8.°, n.° 2, da directiva acesso, pode impor, após uma análise do mercado, a um operador designado como operador com poder de mercado significativo num mercado específico.

38      A este respeito, resulta da leitura combinada dos artigos 8.° e 12.°, n.° 1, alínea b), da directiva acesso que a obrigação de negociar de boa fé um contrato com empresas pode ser imposta pela autoridade reguladora nacional aos operadores que têm um poder de mercado significativo, após análise deste.

39      Ora, como o advogado‑geral refere no n.° 62 das suas conclusões, o artigo 26.° da lei das telecomunicações não assenta numa dualidade de regimes em função do poder das empresas, mas leva a tratar de forma igualitária todos os operadores, sem permitir à autoridade reguladora nacional ter em conta situações concretas antes de intervir ou durante a apreciação do requerimento da empresa que solicita o acesso a uma rede de telecomunicações.

40      Com efeito, a obrigação de negociar de boa fé os contratos de acesso, prevista na lei das telecomunicações, tem por consequência impor essa obrigação sem avaliação prévia do grau de concorrência efectiva no mercado em causa. Essa lei também não permite suprimir nem alterar essa obrigação se a concorrência vier a intensificar‑se nesse mercado.

41      Por outro lado, as intervenções da autoridade reguladora nacional devem, nos termos do décimo nono considerando da directiva acesso, ao mesmo tempo que aumentam a concorrência, equilibrar o direito que o proprietário da infra‑estrutura tem de proceder à exploração desta em seu próprio benefício e o direito de outros prestadores de serviços acederem a recursos essenciais para a oferta de serviços concorrentes.

42      De mais a mais, de acordo com o artigo 12.°, n.° 2, da directiva acesso, as intervenções da autoridade reguladora nacional são enquadradas pela necessidade de tomar em consideração os elementos enumerados nessa disposição, entre os quais se incluem a necessidade de salvaguardar a concorrência a longo prazo e de apreciar a proporcionalidade das obrigações que essa autoridade tenciona impor no que respeita ao acesso a elementos específicos da rede e à respectiva utilização face aos objectivos definidos no artigo 8.° da directiva‑quadro.

43      Ora, ao não prever a intervenção da autoridade reguladora nacional previamente à imposição da obrigação de negociar contratos de acesso, a lei das telecomunicações não permite nenhuma avaliação segundo os elementos enumerados no referido artigo 12.°, n.° 2.

44      Donde se conclui que, ao impor aos operadores públicos de redes de telecomunicações uma obrigação geral de negociar contratos para o acesso à rede de telecomunicações, a República da Polónia não transpôs correctamente o artigo 4.°, n.° 1, da directiva acesso.

45      Esta conclusão não é posta em causa pelo argumento desenvolvido por esse Estado‑Membro, de que uma interpretação mais dinâmica e teleológica permitiria o desenvolvimento mais rápido das tecnologias.

46      Com efeito, importa notar que a intervenção da autoridade reguladora nacional só tem lugar para assegurar o funcionamento eficaz do mercado. A este título, o artigo 5.°, n.° 1, primeiro parágrafo, da directiva acesso prevê que a referida autoridade deve promover a eficiência e a concorrência sustentável e proporcionar o máximo benefício aos utilizadores finais.

47      Quanto ao argumento do referido Estado‑Membro de que a lei das telecomunicações reforça a observância do princípio da segurança jurídica, basta referir que esse princípio em caso algum pode permitir uma derrogação às regras previstas na directiva acesso.

48      Resulta das considerações precedentes que a primeira acusação é procedente.

49      Consequentemente, há que concluir que, ao não transpor correctamente o artigo 4.°, n.° 1, da directiva acesso, a República da Polónia não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força dessa directiva.

 Quanto à segunda acusação, relativa à não conformidade da lei das telecomunicações com o artigo 5.°, n.° 1, primeiro parágrafo, da directiva acesso

 Argumentos das partes

50      Na sua segunda acusação, a Comissão sustenta que os artigos 26.° a 30.° da lei das telecomunicações não asseguram a transposição correcta do artigo 5.°, n.° 1, primeiro parágrafo, da directiva acesso. Resulta dos referidos artigos 26.° a 30.° assim como dos artigos 45.° e 136.° da mesma lei que todos os operadores de redes públicas de telecomunicações são obrigados a negociar o acesso a essas redes, que o presidente da autoridade reguladora nacional pode decidir o prazo para a conclusão desse tipo de negociações e que, se as partes não chegarem a acordo, o referido presidente pode, a pedido de uma das partes, proferir uma decisão de concessão de acesso que substitui o contrato de acesso quantos aos pontos que dela são objecto e impor, desse modo, obrigações às empresas, independentemente da sua posição no mercado.

51      A este respeito, a Comissão sustenta, em primeiro lugar, que o artigo 5.°, n.° 1, da directiva acesso não pode ser executado por uma norma legal geral, pois exige que a autoridade reguladora nacional esteja habilitada a actuar apenas em determinados casos. Esse poder é limitado pela referência aos objectivos expostos no artigo 8.° da directiva‑quadro e pelas exigências impostas no artigo 5.°, n.° 3, da directiva acesso. O referido artigo 5.°, n.° 1, não é uma simples norma programática, mas sim um texto que indica as decisões que as autoridades reguladoras nacionais devem estar habilitadas a tomar. Constitui uma excepção ao princípio geral inserido no artigo 8.° da directiva acesso, que deve ser interpretado de forma restritiva.

52      Em segundo lugar, alega que, por si só, o artigo 5.°, n.° 4, da directiva acesso não permite impor obrigações de regulação a todas as empresas, mas apenas às que têm um poder de mercado significativo ou, independentemente dessa condição, nos casos mencionados no artigo 8.°, n.° 3, dessa directiva. As obrigações mencionadas nos artigos 9.° a 13.° da referida directiva não podem ser impostas com base no procedimento descrito no artigo 5.°, n.° 4.

53      Em terceiro lugar, afirma que o artigo 5.°, n.° 1, da directiva acesso não faz depender o poder da autoridade reguladora nacional da existência de um qualquer litígio entre empresas.

54      A República da Polónia, por seu turno, contesta a presente acusação. Alega, em primeiro lugar, que as duas regras decorrentes do artigo 5.°, n.° 1, primeiro parágrafo, da directiva acesso, segundo as quais a autoridade reguladora nacional é obrigada, por um lado, a incentivar o acesso às redes, a interligação e a interoperabilidade dos serviços e, por outro, a garanti‑los caso seja necessário, são de natureza muito geral e constituem normas programáticas. Essas regras só vinculam os Estados‑Membros quanto ao objectivo a alcançar, cuja realização são obrigados a assegurar no âmbito das respectivas políticas de acesso às redes de telecomunicações.

55      Esta interpretação é, segundo afirma, confirmada pela sistemática geral da directiva acesso, pois o referido artigo 5.° está inserido no capítulo II desta, sob a epígrafe «Disposições gerais».

56      O Estado‑Membro demandado sustenta também que os objectivos expostos no artigo 8.° da directiva‑quadro são definidos de forma geral, pelo que o facto de se lhes fazer referência deixa um amplo poder de apreciação às autoridades reguladoras nacionais. Além disso, mesmo uma definição precisa dos objectivos fixados para a actividade destas últimas não garante às empresas que operam no mercado a possibilidade de prever as obrigações que lhes incumbem. Ora, o princípio da segurança jurídica exige que as regras de direito sejam claras e precisas.

57      As competências de regulação gerais também não são limitadas pelos critérios definidos no artigo 5.°, n.° 3, da directiva acesso, que visam as obrigações e as exigências impostas ao abrigo do artigo 5.°, n.os 1 e 2, dessa directiva.

58      Este Estado‑Membro conclui daí que a transposição do referido artigo 5.° não pode ser efectuada literalmente, prevendo uma habilitação geral da autoridade reguladora nacional para incentivar e assegurar o acesso às redes de telecomunicações.

59      Em segundo lugar, a República da Polónia sublinha que a presente acusação apenas tem por objecto a não conformidade do direito polaco com o artigo 5.°, n.° 1, primeiro parágrafo, da directiva acesso, e não com o segundo parágrafo do referido n.° 1.

60      Por outro lado, alega que a Comissão não leva em conta que o referido artigo 5.°, n.° 1, primeiro parágrafo, contém duas regras jurídicas. A primeira dessas regras, que instaura uma obrigação geral de incentivar o acesso, a interligação e a interoperabilidade dos serviços em cada caso, independentemente das circunstâncias, para o que a autoridade reguladora deve actuar permanentemente, é concretizada pelo capítulo 2 da lei das telecomunicações. A segunda regra respeita à obrigação de assegurar o acesso à rede, a qual está prevista nos artigos 28.° e 29.° dessa lei.

 Apreciação do Tribunal de Justiça

61      Com a sua segunda acusação, a Comissão pede ao Tribunal que declare que o artigo 5.°, n.° 1, primeiro parágrafo, da directiva acesso, que impõe que a autoridade reguladora nacional esteja habilitada a intervir pontualmente em apoio dos objectivos do artigo 8.° da directiva‑quadro, não foi transposto correctamente pela lei das telecomunicações.

62      Em primeiro lugar, recorde‑se que as funções de regulação da autoridade reguladora nacional são definidas nos artigos 8.° a 13.° da directiva‑quadro. O artigo 8.°, n.° 1, dessa directiva prevê que os Estados‑Membros deverão assegurar que as autoridades reguladoras nacionais tomem, no âmbito do desempenho dessas funções, todas as medidas razoáveis para realizar os objectivos enumerados nos n.os 2 a 4 do mesmo artigo.

63      Por outro lado, o Tribunal interpretou o referido artigo 8.° no sentido de que impõe aos Estados‑Membros a obrigação de assegurarem que as autoridades reguladoras nacionais tomarão todas as medidas razoáveis a fim de promover a concorrência na oferta dos serviços de comunicações electrónicas, velando por que a concorrência não seja falseada nem entravada no sector das telecomunicações electrónicas e eliminando os últimos obstáculos à oferta dos referidos serviços a nível europeu (acórdão de 31 de Janeiro de 2008, Centro Europa 7, C‑380/05, n.° 81).

64      Em segundo lugar, importa salientar que o artigo 5.°, n.° 1, primeiro parágrafo, da directiva acesso visa os poderes e as responsabilidades das autoridades reguladoras nacionais relativamente ao acesso e à interligação. Esse artigo prevê que, para realizar os objectivos expostos no artigo 8.° da directiva‑quadro, essas autoridades reguladoras devem incentivar e, sempre que oportuno, garantir o acesso e a interligação adequados, bem como a interoperabilidade de serviços e, simultaneamente, promover a eficiência e a concorrência sustentável e proporcionar o máximo benefício aos utilizadores finais.

65      Daqui se conclui que o artigo 5.°, n.° 1, primeiro parágrafo, da directiva acesso se limita a prever uma habilitação geral das autoridades reguladoras nacionais, com vista à realização dos objectivos do artigo 8.° da directiva‑quadro no âmbito específico do acesso e da interligação.

66      Em terceiro lugar, como o advogado‑geral observou no n.° 83 das suas conclusões, os artigos 26.° a 30.° da referida lei conferem à autoridade reguladora nacional amplos poderes de intervenção.

67      Em quarto lugar, importa recordar que, segundo jurisprudência assente, no âmbito de uma acção por incumprimento, incumbe à Comissão demonstrar a existência do incumprimento alegado. Compete‑lhe fornecer ao Tribunal os elementos necessários à verificação, por este, da existência desse incumprimento (acórdão de 10 de Janeiro de 2008, Comissão/Finlândia, C‑387/06, n.° 25 e jurisprudência referida).

68      Ora, não se pode deixar de observar que, ao limitar‑se a sustentar que o artigo 5.°, n.° 1, primeiro parágrafo, da directiva acesso pode ser executado não por uma norma legal geral mas apenas por um texto que indique as decisões que as autoridades reguladoras nacionais devem estar habilitadas a tomar, sem demonstrar que as disposições em causa da lei das telecomunicações não realizam os objectivos da directiva‑quadro, a Comissão não fez prova bastante de que as referidas disposições não asseguram a correcta transposição do artigo 5.°, n.° 1, primeiro parágrafo, da directiva acesso.

69      Donde se conclui que a segunda acusação deve ser julgada improcedente.

 Quanto às despesas

70      Por força do disposto no artigo 69.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. No entanto, nos termos do disposto no n.° 3, primeiro parágrafo, do mesmo artigo, se cada parte obtiver vencimento parcial, ou em circunstâncias excepcionais, o Tribunal pode determinar que as despesas sejam repartidas entre as partes, ou que cada uma das partes suporte as suas próprias despesas. Tendo a Comissão e a República da Polónia sido parcialmente vencidas, há que decidir que suportarão as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) decide:

1)      Ao não transpor correctamente o artigo 4.°, n.° 1, da Directiva 2002/19/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de Março de 2002, relativa ao acesso e interligação de redes de comunicações electrónicas e recursos conexos (directiva acesso), a República da Polónia não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força dessa directiva.

2)      A acção é julgada improcedente quanto ao mais.

3)      A Comissão das Comunidades Europeias e a República da Polónia suportarão, cada uma, as suas próprias despesas.

Assinaturas


* Língua do processo: polaco.