Language of document : ECLI:EU:T:2011:252

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Segunda Secção)

7 de Junho de 2011 (*)

«Acesso aos documentos – Regulamento (CE) n.° 1049/2001 – Relatório de auditoria sobre o subsídio de assistência parlamentar – Recusa de acesso – Excepção relativa à protecção dos objectivos das actividades de inspecção, inquérito e auditoria – Excepção relativa à protecção do processo decisório»

No processo T‑471/08,

Ciarán Toland, residente em Dublim (Irlanda), representado por A. Burke, solicitor, E. Regan, SC, e J. Newman, barrister,

recorrente,

apoiado por

Reino da Dinamarca, representado por B. Weis Fogh e C. Vang, na qualidade de agentes,

República da Finlândia, representada por J. Heliskoski, A. Guimaraes‑Purokoski e H. Leppo, na qualidade de agentes,

Reino da Suécia, representado por A. Falk, S. Johannesson e K. Petkovska, na qualidade de agentes,

intervenientes,

contra

Parlamento Europeu, representado por H. Krück, N. Lorenz e D. Moore, na qualidade de agentes,

recorrido,

que tem por objecto um pedido de anulação parcial da decisão do Parlamento Europeu de 11 de Agosto de 2008, referência A (2008) 10636, na parte em que recusa o acesso ao relatório n.° 06/02 do Serviço de Auditoria Interna do Parlamento, de 9 de Janeiro de 2008, intitulado «Auditoria sobre o subsídio de assistência parlamentar»,

O TRIBUNAL GERAL (Segunda Secção),

composto por: N. J. Forwood, presidente, F. Dehousse (relator) e J. Schwarcz, juízes,

secretário: K. Andovà, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 7 de Dezembro de 2010,

profere o presente

Acórdão

 Quadro jurídico

1        O Regulamento (CE) n.° 1049/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de Maio de 2001, relativo ao acesso do público aos documentos do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão (JO L 145, p. 43), define os princípios, as condições e os limites que regem o direito de acesso aos documentos dessas instituições previsto no artigo 255.° CE.

2        De acordo com o artigo 4.°, n.os 2 e 3, do Regulamento n.° 1049/2001:

«2. As instituições recusarão o acesso aos documentos cuja divulgação pudesse prejudicar a protecção de:

[…]

–        objectivos de actividades de inspecção, inquérito e auditoria,

excepto quando um interesse público superior imponha a divulgação.

3. O acesso a documentos, elaborados por uma instituição para uso interno ou por ela recebidos, relacionados com uma matéria sobre a qual a instituição não tenha decidido, será recusado, caso a sua divulgação pudesse prejudicar gravemente o processo decisório da instituição, excepto quando um interesse público superior imponha a divulgação.

[…]»

 Factos na origem do litígio

3        Por carta de 11 de Junho de 2008, o recorrente, C. Toland, pediu ao Parlamento que lhe enviasse o relatório anual relativo a 2006 do seu Serviço de Auditoria Interna, incluindo os dezasseis relatórios de auditoria interna referidos no n.° 24 da Resolução do Parlamento, de 22 de Abril de 2008, que contém as observações que constituem parte integrante da decisão sobre a quitação pela execução do orçamento geral da União Europeia para o exercício de 2006, Secção I – Parlamento Europeu (JO 2009, L 88, p. 3).

4        Por carta de 23 de Junho de 2008, o secretário‑geral do Parlamento concedeu ao recorrente acesso ao relatório anual relativo a 2006 do Serviço de Auditoria Interna do Parlamento, referência n.° 07/01, de 16 de Julho de 2007 (a seguir «relatório n.° 07/01», com excepção de um ponto desse relatório relativo a uma auditoria ainda em curso. Não mencionou os outros dezasseis relatórios de auditoria interna solicitados pelo recorrente na carta de 23 de Junho de 2008.

5        Por carta de 19 de Julho de 2008, o recorrente apresentou um pedido confirmativo em que reiterava o seu pedido de acesso aos dezasseis relatórios de auditoria interna, pelas razões expostas na carta de 11 de Junho de 2008 e pelo facto de a carta do secretário‑geral do Parlamento de 23 de Junho de 2008 não conter nenhuma justificação objectiva devidamente fundamentada da recusa de comunicar esses relatórios. O recorrente também pediu acesso ao ponto ocultado do relatório n.° 07/01.

6        Por carta de 11 de Agosto de 2008 (a seguir «decisão impugnada»), o Parlamento recusou, em primeiro lugar, conceder acesso ao ponto ocultado do relatório n.° 07/01, em segundo lugar, concedeu acesso integral a treze dos dezasseis relatórios de auditoria interna, bem como acesso parcial a outros dois desses relatórios, e, em terceiro lugar, recusou o acesso ao décimo quarto desses relatórios, a saber, o relatório n.° 06/02 do seu Serviço de Auditoria Interna, de 9 de Janeiro de 2008, intitulado «Auditoria sobre o subsídio de assistência parlamentar» (a seguir «relatório n.° 06/02»).

7        O Parlamento, na decisão impugnada, descreveu o relatório n.° 06/02 como contendo, numa primeira parte, uma análise dos riscos inerentes às operações financeiras de pagamento do subsídio de assistência parlamentar e uma análise detalhada das regras em vigor e do seu funcionamento, numa segunda parte, um resumo dos planos de acção estabelecidos pelo auditor interno a fim de melhorar o funcionamento do sistema e, numa terceira parte, uma explicação detalhada desses planos de acção (página 2, último parágrafo, da decisão impugnada).

8        O Parlamento acrescentou que, como estudo dos riscos associados às operações financeiras dos serviços do Parlamento de pagamento do subsídio de assistência parlamentar e como conjunto de propostas que visam melhorar o sistema, o relatório n.° 06/02 constituía uma auditoria na acepção do artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001 (página 2, último parágrafo, e início da página 3 da decisão impugnada).

9        O Parlamento considerou que o relatório n.° 06/02, apesar de ter sido finalizado em 9 de Janeiro de 2008, continuava coberto pela excepção ao direito de acesso prevista no artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001. O Parlamento referiu o acórdão do Tribunal Geral de 6 de Julho de 2006, Franchet e Byk/Comissão (T‑391/03 e T‑70/04, Colect., p. II‑2023, n.os 120 e seguintes). Indicou que os planos de acção contidos no relatório n.° 06/02 enunciavam os princípios em que se poderia basear uma revisão do quadro normativo da assistência parlamentar. Além disso, esses planos de acção enunciavam outras acções que podiam ser logo empreendidas pela Direcção‑Geral (DG) «Finanças» do Parlamento, antes de qualquer alteração do quadro regulamentar. O Parlamento considerou que devia ser concedido à sua administração um prazo razoável para a tomada em consideração e a aplicação imediata dessas propostas, conforme exigido pelo artigo 86.° do Regulamento (CE, Euratom) n.° 1605/2002 do Conselho, de 25 de Junho de 2002, que institui o Regulamento Financeiro aplicável ao orçamento geral das Comunidades Europeias (JO L 248, p. 1, a seguir «Regulamento Financeiro»). Segundo o Parlamento, conceder acesso ao relatório n.° 06/02 nessa fase, mesmo parcialmente, poderia comprometer a sua utilização efectiva e, simultaneamente, o objectivo da actividade de auditoria na acepção do artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001 (página 3, primeiro parágrafo, da decisão impugnada).

10      Além disso, o Parlamento alegou que os planos de acção do relatório n.° 06/02 continham propostas que exigiam a adopção de uma decisão pelas autoridades políticas competentes, a saber, não apenas a Mesa do Parlamento e a Conferência dos Presidentes do Parlamento mas também a Comissão, o Conselho e os Estados‑Membros. O Parlamento indicou que, na sessão plenária de 22 de Abril de 2008, encorajou, em primeiro lugar, o grupo de trabalho da Mesa do Parlamento sobre o estatuto dos membros a apresentar as suas conclusões com vista a uma acção rápida e adequada relativamente às observações constantes do relatório n.° 06/02, em segundo lugar, apelou ao início imediato das negociações com os Estados‑Membros e o Governo belga, em terceiro lugar, conferiu um mandato ao seu secretário‑geral para encetar contactos com a Comissão e o Conselho com vista a assegurar a possibilidade de uma nova regulamentação da assistência parlamentar através de uma modificação do regime dos agentes contratuais e, em último lugar, encarregou o seu grupo de trabalho sobre o estatuto dos membros do Parlamento, os assistentes parlamentares e o fundo de pensão de avaliar, de forma urgente, o funcionamento das regras em vigor e, atendendo à importância do processo, de elaborar todas as propostas de alteração dessas regras que esse grupo de trabalho considerasse necessárias (página 3, terceiro parágrafo, da decisão impugnada).

11      O Parlamento acrescentou que, apesar de a Mesa do Parlamento ter adoptado, em 9 de Julho de 2008, as medidas de aplicação relativas ao estatuto dos membros do Parlamento, o processo decisório, sensível e complexo, ainda estava em curso, no quadro do qual o relatório n.° 06/02 constituía um documento importante de referência. O Parlamento alegou que a forma como os seus membros utilizam os subsídios postos à sua disposição é um assunto sensível, seguido com muito interesse pelos meios de comunicação social e que elementos do relatório n.° 06/02 poderiam ser utilizados para frustrar o debate sobre a reforma do sistema e comprometer uma reforma rápida. Por conseguinte, segundo o Parlamento, a divulgação do relatório n.° 06/02 prejudicaria, nessa fase, gravemente o seu processo decisório mas também causaria outros prejuízos, uma vez que a reforma em causa não poderia ser levada a cabo apenas por ele (página 3, último parágrafo, e início da página 4 da decisão impugnada).

12      Por último, tendo o Parlamento considerado que o pedido do recorrente de 19 de Julho de 2008 não continha nenhum argumento susceptível de justificar a divulgação do relatório n.° 06/02 e que essa divulgação, mesmo parcial, comprometeria, por um lado, o objectivo da auditoria na acepção do artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001 e, por outro, o processo decisório do Parlamento na acepção do artigo 4.°, n.° 3, do mesmo regulamento, decidiu indeferir o pedido de acesso do recorrente ao referido relatório (página 4, segundo e terceiro parágrafos, da decisão impugnada).

 Tramitação do processo e pedidos das partes

13      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 23 de Outubro de 2008, o recorrente interpôs o presente recurso.

14      Através de requerimentos apresentados na Secretaria do Tribunal Geral, respectivamente, em 13, 17 e 30 de Março de 2009, o Reino da Suécia, a República da Finlândia e o Reino da Dinamarca pediram para intervir no presente processo em apoio dos pedidos do recorrente.

15      Por despacho de 25 de Junho de 2009, o presidente da Primeira Secção do Tribunal Geral admitiu as intervenções pedidas.

16      Tendo sido modificada a composição das Secções do Tribunal Geral, o juiz‑relator foi afectado à Segunda Secção, à qual, por conseguinte, foi atribuído o processo.

17      Por requerimentos registados na Secretaria do Tribunal Geral, respectivamente, em 26 de Agosto, 9 e 11 de Setembro de 2009, o Reino da Suécia, a República da Finlândia e o Reino da Dinamarca apresentaram as suas alegações de intervenção.

18      O Parlamento e o recorrente formularam observações sobre essas alegações de intervenção, respectivamente, em 16 e 18 de Novembro de 2009.

19      Com base no relatório do juiz‑relator, o Tribunal Geral (Segunda Secção) decidiu dar início à fase oral do processo.

20      Na audiência de 7 de Dezembro de 2010, foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às questões colocadas pelo Tribunal.

21      Na petição inicial, o recorrente pede que o Tribunal se digne:

–        anular a decisão impugnada na parte em que recusa o acesso ao relatório n.° 06/02;

–        ordenar ao Parlamento que lhe conceda acesso ao relatório n.° 06/02;

–        condenar o Parlamento nas despesas.

22      Na réplica, o recorrente retirou o pedido de o Tribunal ordenar que o Parlamento lhe concedesse acesso ao relatório n.° 06/02.

23      O Parlamento, tendo em conta essa alteração dos pedidos do recorrente, conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        julgar improcedente o pedido de anulação da decisão impugnada;

–        condenar o recorrente nas despesas;

–        condenar os intervenientes nas suas próprias despesas.

24      O Reino da Dinamarca, a República da Finlândia e o Reino da Suécia apoiam, no essencial, os pedidos de anulação do recorrente.

 Questão de direito

25      O presente recurso, além de articulado em três fundamentos, relativos, formalmente, a um erro manifesto de apreciação, à violação do dever de fundamentação e à violação do princípio da proporcionalidade, alega, no essencial, erros de direito que consistem na violação pelo Parlamento, por um lado, do artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001 e, por outro, do artigo 4.°, n.° 3, do mesmo regulamento. É de acordo com esta distinção que há que examinar, depois de algumas considerações preliminares, os diferentes fundamentos e argumentos do recorrente.

 Considerações preliminares

26      O Regulamento n.° 1049/2001 visa, como indicado nos seus artigos 1.° e 2.°, n.os 1 e 3, conceder ao público o direito de acesso aos documentos das instituições em todos os domínios de actividade da União, sob reserva de algumas excepções por ele definidas.

27      Em conformidade com o seu primeiro considerando, este regulamento inscreve‑se na vontade expressa no artigo 1.°, segundo parágrafo, UE, introduzido pelo Tratado de Amesterdão, de assinalar uma nova etapa no processo de criação de uma união cada vez mais estreita entre os povos da Europa, em que as decisões sejam tomadas de uma forma tão aberta quanto possível e ao nível mais próximo possível dos cidadãos. Como recorda o segundo considerando do Regulamento n.° 1049/2001, o direito de acesso do público aos documentos das instituições está associado ao carácter democrático destas últimas.

28      Segundo jurisprudência assente, as excepções ao acesso aos documentos devem ser interpretadas e aplicadas restritivamente, de forma a não pôr em xeque a aplicação do princípio geral de conferir ao público o acesso mais amplo possível aos documentos na posse das instituições (acórdãos do Tribunal de Justiça de 18 de Dezembro de 2007, Suécia/Comissão, C‑64/05 P, Colect., p. I‑11389, n.° 66, e de 1 de Julho de 2008, Suécia e Turco/Conselho, C‑39/05 P e C‑52/05 P, Colect., p. I‑4723, n.° 36; acórdão Franchet e Byk/Comissão, referido no n.° 9 supra, n.° 84). Além disso, o princípio da proporcionalidade exige que as excepções não ultrapassem os limites do que for adequado e necessário para atingir o fim prosseguido (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 6 de Dezembro de 2001, Conselho/Hautala, C‑353/99 P, Colect., p. I‑9565, n.° 28).

29      Além disso, o exame que se exige para o tratamento de um pedido de acesso a documentos deve revestir um carácter concreto. Com efeito, por um lado, a simples circunstância de um documento dizer respeito a um interesse protegido por uma excepção não basta para justificar a aplicação dessa excepção (v., por analogia, acórdão do Tribunal Geral de 13 de Setembro de 2000, Denkavit Nederland/Comissão, T‑20/99, Colect., p. II‑3011, n.° 45). Essa aplicação só pode, em princípio, ser justificada na hipótese de a instituição ter previamente apreciado, em primeiro lugar, se o acesso ao documento prejudicava concreta e efectivamente o interesse protegido e, em segundo lugar, nas hipóteses referidas no artigo 4.°, n.os 2 e 3, do Regulamento n.° 1049/2001, se não existia um interesse público superior que justificasse a divulgação do documento em causa (v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 19 de Janeiro de 2010, Co‑Frutta/Comissão, T‑355/04 e T‑446/04, Colect., p. II‑1, n.° 123). Por outro lado, o risco de violação do interesse protegido deve ser razoavelmente previsível e não puramente hipotético (v., por analogia, acórdão do Tribunal Geral de 7 de Fevereiro de 2002, Kuijer/Conselho, T‑211/00, Colect., p. II‑485, n.° 56). Esse exame deve resultar da fundamentação da decisão (acórdãos do Tribunal Geral de 13 de Abril de 2005, Verein für Konsumenteninformation/Comissão, T‑2/03, Colect., p. II‑1121, n.° 69, e Franchet e Byk/Comissão, referido no n.° 9 supra, n.° 115).

30      É também necessário um exame concreto e individual de cada documento uma vez que, mesmo na hipótese de ser claro que um pedido de acesso se refere a documentos abrangidos por uma excepção, apenas esse exame pode permitir à instituição apreciar a possibilidade de conceder um acesso parcial ao requerente, em conformidade com o disposto no artigo 4.°, n.° 6, do Regulamento n.° 1049/2001 (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal Geral de 12 de Outubro de 2000, JT’s Corporation/Comissão, T‑123/99, Colect., p. II‑3269, n.° 46, e Franchet e Byk/Comissão, referido no n.° 9 supra, n.° 117).

31      É à luz destes princípios que se deve examinar o presente recurso.

 Quanto à violação do artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001

 Argumentos das partes

32      O recorrente, apoiado pelos intervenientes, alega que o Parlamento invocou sem razão, no presente caso, a excepção ao direito de acesso prevista no artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001, que visa a protecção dos objectivos das actividades de auditoria.

33      Uma vez que a auditoria tinha sido finalizada em 9 de Janeiro de 2008, já não havia nenhuma razão para recusar, em Agosto de 2008, a sua divulgação, que não podia afectar de forma alguma a sua boa execução. Quanto à alegação de que essa divulgação teria comprometido os «objectivos da actividade de auditoria» na medida em que teria privado a administração de um prazo razoável para examinar e executar as medidas preconizadas no relatório n.° 06/02, o recorrente alega que a situação, no presente caso, é diferente da que estava em causa no acórdão Franchet e Byk/Comissão, referido no n.° 9 supra. Com efeito, no presente caso, a decisão impugnada não indicou de modo algum um prazo para além do qual o relatório n.° 06/02 podia ser comunicado. Essa decisão indicou que a reforma projectada era de natureza regulamentar e legislativa e não fez referência a nenhum outro inquérito ou inspecção cujo resultado pudesse ser afectado por uma divulgação do relatório n.° 06/02. Por conseguinte, os requisitos de aplicação da excepção do artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001 sobre o prejuízo dos objectivos da actividade de auditoria não estavam reunidos.

34      No que se refere à fundamentação da decisão impugnada, o recorrente alega que esta não dá reposta à questão de saber de que forma o acesso ao relatório n.° 06/02 podia prejudicar concreta e efectivamente o interesse protegido pelo artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001. Além disso, esta decisão não examinou se existia um interesse público superior que justificasse a divulgação do relatório n.° 06/02, não obstante o alegado prejuízo dos objectivos da actividade de auditoria. A referida decisão, por não conter esse exame, viola, além disso, o princípio da proporcionalidade.

35      Todavia, segundo o recorrente, constitui claramente um interesse público superior o interesse do público em tomar conhecimento de um relatório de auditoria que lhe permite ser informado sobre a forma como é utilizada uma parte significativa dos dinheiros públicos atribuídos ao Parlamento para o seu funcionamento.

36      O Parlamento alega que o acórdão Franchet e Byk/Comissão, referido no n.° 9 supra, reconhece a legitimidade de um prazo razoável deixado à administração para decidir sobre as medidas a tomar com base nas informações constantes de um relatório. Ora, no presente caso, quando da decisão impugnada, o Parlamento teve cerca de sete meses para decidir sobre essas medidas, o que é certamente razoável, atendendo aos prazos mais longos reconhecidos como razoáveis pelo Tribunal no acórdão Franchet e Byk/Comissão, referido no n.° 9 supra.

37      O Parlamento salienta que o carácter razoável do prazo deve ser apreciado à data da decisão impugnada e que não é legalmente obrigado a indicar nessa decisão em que momento, no futuro, esse prazo expirará. É errado criticá‑lo por não ter fornecido essa indicação.

38      No que se refere à alegação de que a decisão impugnada não identifica mais nenhum inquérito ou inspecção ainda em curso, a decisão impugnada deve ser compreendida no sentido de que a sua menção de que o relatório n.° 06/02 contém planos de acção «que descrevem outras medidas que já podem ser levadas a cabo pela DG ‘Finanças’ antes de qualquer alteração do quadro regulamentar» designa evidentemente, no contexto dessa decisão, não apenas reformas legislativas mas também inquéritos e investigações. Além disso, em Agosto de 2008, estavam em curso inspecções administrativas sobre a utilização por alguns deputados dos montantes pagos a título de subsídio de assistência parlamentar e a divulgação do relatório n.° 06/02 podia tê‑las prejudicado. De resto, esse facto era de conhecimento público e o recorrente tinha consciência disso.

39      O Parlamento contesta que a decisão impugnada tenha uma fundamentação insuficiente, seja no que se refere à existência de um risco de prejuízo da protecção dos objectivos das actividades de auditoria seja no que se refere à inexistência de um interesse público superior na divulgação.

40      No que se refere ao argumento relativo à violação alegada do princípio da proporcionalidade, o Parlamento alega que, além do facto de esse argumento ser, no essencial, apenas uma repetição dos outros argumentos do recorrente, a questão em causa no presente caso nada tem a ver com o teste da proporcionalidade, mas com o equilíbrio entre o interesse do público na protecção do documento e o interesse do público na sua divulgação.

41      Por último, no que se refere ao argumento de que a transparência pode constituir um interesse público superior que justifica a divulgação de um documento habitualmente coberto pela excepção do artigo 4.°, n.os 2 ou 3, do Regulamento n.° 1049/2001, essa pretensão contraria a lógica do dito regulamento.

 Apreciação do Tribunal

42      O artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001 autoriza a recusa de acesso a um documento cuja divulgação possa prejudicar a protecção dos objectivos de actividades de inspecção, inquérito e auditoria, excepto quando um interesse público superior imponha a sua divulgação.

43      O Tribunal, no processo que culminou no acórdão Franchet e Byk/Comissão, referido no n.° 9 supra (n.° 109), decidiu que o artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001 deve ser interpretado no sentido de que esta disposição, que visa proteger os objectivos de actividades de inspecção, inquérito e auditoria, só é aplicável se a divulgação dos documentos em questão puder pôr em perigo a conclusão dessas actividades.

44      É certo que os diferentes actos de inquérito ou de inspecção podem ficar abrangidos pela excepção relativa à protecção de actividades de inspecção, inquérito e auditoria enquanto as actividades de inquérito ou de inspecção prosseguem, mesmo que esteja terminado o inquérito ou a inspecção particular que deu lugar ao relatório ao qual é pedido acesso (acórdão Franchet e Byk/Comissão, referido no n.° 9 supra, n.° 110).

45      Todavia, admitir que os diferentes documentos relativos a actividades de inspecção, inquérito ou auditoria estão abrangidos pela excepção constante do artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001 enquanto o seguimento a dar a esses procedimentos não estiver decidido equivale a submeter o acesso aos referidos documentos a um acontecimento aleatório, futuro e eventualmente longínquo, dependente da celeridade e da diligência das diferentes autoridades. Esta solução colide com o objectivo que consiste em garantir o acesso do público aos documentos relativos a eventuais irregularidades cometidas na gestão dos interesses financeiros, com a finalidade de dar aos cidadãos a possibilidade de controlarem de forma mais efectiva a legalidade do exercício do poder público (acórdão Franchet e Byk/Comissão, referido no n.° 9 supra, n.os 111 e 112).

46      Assim, importa verificar se, no momento da adopção das decisões em causa nesse processo, estavam ainda em curso actividades de inspecção e inquérito que pudessem ter sido postas em causa pela divulgação dos documentos pedidos e se a prossecução dessas actividades ocorreu num prazo razoável (acórdão Franchet e Byk/Comissão, referido no n.° 9 supra, n.° 113).

47      Resulta destas enunciações que a excepção ao direito de acesso prevista no artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001 pode ser declarada aplicável a um relatório de auditoria cuja divulgação ponha em perigo actividades de inspecção ou inquérito prosseguidas, num prazo razoável, com base no seu conteúdo.

48      No presente caso, na página 3, primeiro parágrafo, da decisão impugnada, a recusa de acesso ao relatório n.° 06/02 oposta pelo Parlamento ao abrigo do artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001 baseia‑se, mediante remissão para o acórdão Franchet e Byk/Comissão, referido no n.° 9 supra, na consideração de que «devia ser concedido à administração [do Parlamento] um prazo razoável para a tomada em consideração e a aplicação imediata dessas propostas [constantes desse relatório n.° 06/02], conforme exigido pelo artigo 86.° do Regulamento Financeiro».

49      Segundo o mesmo parágrafo da decisão impugnada, «conceder acesso ao [relatório n.° 06/02] nesta fase, mesmo parcialmente, poderia comprometer a utilização efectiva desse relatório e, consequentemente, ‘o objectivo da auditoria’». Na página 4, primeiro e segundo parágrafos, da decisão impugnada, o Parlamento conclui, em termos desta vez afirmativos, que conceder esse acesso, mesmo parcial, nesta fase, «comprometeria a utilização efectiva [do] conteúdo [do relatório n.° 06/02]», ou ainda «prejudicaria o objectivo da auditoria».

50      Resulta destas enunciações que o Parlamento sustenta, com base no acórdão Franchet e Byk/Comissão, referido no n.° 9 supra, que uma divulgação do relatório n.° 06/02 à data da decisão impugnada teria sido demasiado precoce e não lhe permitiria levar a cabo, antes de qualquer reforma do quadro regulamentar e/ou legislativo do subsídio de assistência parlamentar, as acções imediatas preconizadas nesse relatório.

51      Contudo, a decisão impugnada não faz menção de nenhum processo concreto de inspecção ou de inquérito ou de outras verificações administrativas que estariam em curso quando dessa decisão e que constituiriam a implementação das acções imediatas preconizadas no relatório n.° 06/02.

52      A decisão impugnada limita‑se assim, na sua parte dedicada à rejeição do pedido de acesso ao relatório n.° 06/02, a referir, de forma abstracta, a necessidade de deixar à administração um prazo razoável para a implementação imediata das propostas contidas nesse relatório e a mencionar diversas iniciativas encetadas com vista a uma reforma regulamentar e/ou legislativa do quadro normativo da assistência parlamentar.

53      A este propósito, a referência a essas diversas iniciativas encetadas com vista a uma reforma da assistência parlamentar diz mais respeito à excepção prevista no artigo 4.°, n.° 3, do Regulamento n.° 1049/2001, relativa à protecção do processo decisório da instituição, do que à excepção prevista no artigo 4.° , n.° 2, terceiro travessão, deste mesmo regulamento, relativa à protecção do objectivo das actividades de inspecção, de inquérito e de auditoria. De resto, é neste sentido que, no início da página 4 da decisão impugnada, o Parlamento enuncia que «a divulgação do relatório [n.° 06/02] prejudicaria gravemente, nesta fase, o processo decisório do Parlamento Europeu».

54      A única referência, na decisão impugnada, a um caso de inquérito concreto consta da parte desta decisão que rejeita o pedido de acesso a algumas passagens ocultadas de outros relatórios de auditoria diferentes do relatório n.° 06/02, pelo facto de um acesso a essas passagens levar à divulgação de um caso individual de fraude alegada e pendente de exame pelo Organismo Europeu de Luta Antifraude (OLAF). Em resposta a uma pergunta do Tribunal feita na audiência, o Parlamento indicou, contudo, que o relatório n.° 06/02 não continha, por sua vez, nenhum dado nominativo que permitisse a identificação de casos individuais.

55      Na audiência, o Parlamento afirmou que estavam em curso procedimentos de inspecção e de inquérito e outras verificações administrativas com base no relatório n.° 06/02 à data da decisão impugnada. Contudo, como acima indicado no n.° 51, a referida decisão não menciona nenhum procedimento desse tipo. Por conseguinte, essa decisão, que não evoca esses alegados procedimentos, não contém nenhuma justificação para o facto de os prazos de realização desses procedimentos deverem, em Agosto de 2008, ser considerados razoáveis nem de que forma a divulgação do relatório n.° 06/02 poderia comprometer a sua boa execução.

56      Na audiência, o Parlamento também invocou o argumento de que a divulgação do relatório n.° 06/02 seria contrária à natureza desse documento. Trata‑se de um documento interno, elaborado em virtude do Regulamento Financeiro, e não de um documento que devesse ser publicado, tal como o relatório do Tribunal de Contas da União Europeia sobre a execução do orçamento, publicado todos os anos no Jornal Oficial da União Europeia. Segundo o Parlamento, a divulgação desse tipo de documento interno criaria o risco de os auditores internos das instituições se autolimitarem nos seus comentários, tendo como consequência uma menor eficiência das auditorias internas realizadas para a melhoria do funcionamento das instituições em causa.

57      Há que observar, antes de mais, que essa fundamentação não consta da decisão impugnada. É verdade que, nas páginas 2 e 3 da dita decisão, o Parlamento referiu o artigo 86.°, n.° 1, primeiro parágrafo, do Regulamento Financeiro, que menciona que o auditor interno é o conselheiro da instituição no controlo dos riscos. Contudo, não retirou dessas citações, uma das quais figura, aliás, numa parte da decisão impugnada diferente da que examina o pedido de acesso ao relatório n.° 06/02, nenhuma consideração comparável àquela que avançou pela primeira vez durante a audiência. Além disso, o facto de, no presente caso, o Parlamento ter autorizado o acesso, pelo menos parcial, a quinze dos dezasseis relatórios de auditoria interna referidos no pedido de acesso indica que não é tanto a natureza de documento interno desses relatórios de auditoria que determinou uma decisão de concessão ou de recusa de acesso pelo Parlamento, mas antes o tema e o conteúdo concretos desses relatórios.

58      Em face do exposto, há que considerar que o Parlamento não demonstrou, na decisão impugnada, de forma suficiente, que o acesso ao relatório n.° 06/02 prejudicaria a protecção dos objectivos das actividades de auditoria. Assim, sem que seja necessário examinar a questão da existência de um interesse público superior na divulgação, há que concluir que a decisão impugnada é infundada, na medida em que recusou o acesso ao relatório n.° 06/02 com base no artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001.

 Quanto à violação do artigo 4.°, n.° 3, do Regulamento n.° 1049/2001

 Argumentos das partes

59      O recorrente, apoiado pelos intervenientes, alega que o Parlamento invocou erradamente, no presente caso, a excepção ao direito de acesso prevista no artigo 4.°, n.° 3, do Regulamento n.° 1049/2001, que visa a protecção do processo decisório da instituição.

60      Com efeito, os fundamentos da decisão impugnada, relativos, por um lado, ao facto de a utilização pelos membros do Parlamento do subsídio de assistência parlamentar ser um assunto sensível que suscita um grande interesse nos meios de comunicação social e, por outro, ao facto de a divulgação do relatório n.° 06/02 poder perturbar o processo decisório, constituem afirmações mais políticas do que jurídicas, que assentam, além disso, no pressuposto de que a transparência e a informação do público se opõem ao regular desenvolvimento da actividade regulamentar e legislativa. Ao fazê‑lo, a decisão impugnada põe em causa o princípio fundamental da transparência.

61      O recorrente observa que o interesse superior do público em ser informado não foi tido em conta pelo Parlamento na decisão impugnada. Ora, há antes que considerar que o processo decisório de uma instituição democrática, nos domínios legislativo e regulamentar, não pode, em princípio, ser perturbado pela informação do público. O interesse público superior na divulgação é mais importante do que a preocupação de afastar o risco, de resto hipotético, de que o debate público seja falseado por essa divulgação. A decisão impugnada não contém nenhuma fundamentação adequada susceptível de justificar uma excepção ao princípio da transparência no presente caso.

62      O recorrente alega que a importância especial atribuída no Regulamento n.° 1049/2001 à transparência, no que se refere aos documentos e às informações relativos à actividade legislativa, não pode ser invocada para tentar justificar o incumprimento da obrigação de transparência noutros domínios de actividade do Parlamento, designadamente no domínio das suas actividades administrativas. A transparência não é apenas válida para o domínio legislativo, valendo também para a função executiva da instituição nas suas vertentes administrativa, não legislativa e interna.

63      Defende que a tentativa do Parlamento de confinar o princípio da transparência, enquanto interesse público superior, ao processo legislativo depois de um projecto dessa natureza se ter tornado público revela um visão estreita e inexacta do presente caso e dos princípios de base do Regulamento n.° 1049/2001. O Parlamento nega sem razão que o relatório n.° 06/02 estabelece os princípios com base nos quais se pode efectuar uma reforma do quadro jurídico e dissocia artificialmente o processo legislativo dos debates interinstitucionais que precedem geralmente a apresentação de um projecto legislativo formal pela Comissão.

64      Mesmo que se considere que o acórdão Suécia e Turco/Conselho, referido no n.° 28 supra, diz apenas respeito ao interesse superior na transparência em matéria legislativa, o recorrente considera que o interesse público superior na transparência impõe um mesmo direito de acesso relativamente a matérias que, como no presente caso, se referem à gestão das finanças públicas.

65      O Parlamento alega, relativamente à referência feita pelo recorrente ao acórdão Suécia e Turco/Conselho, referido no n.° 28 supra, que o relatório n.° 06/02 constituía um relatório de auditoria interna, elaborado em virtude do Regulamento Financeiro, e não um relatório de auditoria externa nem um parecer jurídico. À data da decisão impugnada, não estava em curso nenhum processo legislativo, não sendo por isso possível reivindicar no caso o benefício da transparência acrescida garantida pelo artigo 12.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1049/2001. Os princípios do acórdão Suécia e Turco/Conselho, referido no n.° 28 supra, proferido no âmbito de um pedido de acesso a um parecer jurídico formulado no contexto legislativo, não podem ser transpostos sem mais para o presente caso, que diz respeito a um relatório de auditoria interna elaborado fora de um processo legislativo.

66      O Parlamento alega que, embora a decisão impugnada qualifique o relatório n.° 06/02 de «documento de referência importante», isso remete para o «processo de decisão delicado e complexo» então em curso, e não para um processo legislativo inexistente nessa altura. Entende, portanto, que o recorrente não identificou nenhum interesse público superior para a divulgação. O único interesse reivindicado pelo recorrente, que diz respeito aos documentos legislativos, não se pode aplicar a um relatório de auditoria interno.

67      Consequentemente, é erradamente que o recorrente percebe o relatório n.° 06/02 como uma forma de «proposta legislativa» que deve ser examinada segundo o raciocínio do acórdão Suécia e Turco/Conselho, referido no n.° 28 supra. Assim, todos os argumentos relativos à necessidade de os cidadãos participarem num amplo debate sobre o conteúdo desse relatório com base no referido acórdão são desprovidos de fundamento.

68      A decisão impugnada não invocou de forma peremptória e não fundamentada uma necessidade de confidencialidade, tendo, pelo contrário, descrito as numerosas iniciativas encetadas na altura e o processo decisório delicado e complexo ainda em curso quando dessa decisão. Além disso, todas as outras tentativas anteriores de reforma no domínio em causa fracassaram e a situação em 2008 ainda era mais incerta, tanto relativamente ao princípio de uma reforma como às suas modalidades concretas. Neste contexto, podia razoavelmente recear‑se que o processo de reforma voltasse a fracassar se o relatório n.° 06/02 fosse divulgado. Essa divulgação teria, com efeito, permitido a utilização de alguns elementos desse relatório para frustrar o debate e prejudicar a rapidez da reforma. De resto, as medidas adoptadas pelo Parlamento em Julho de 2008 foram medidas transitórias e de urgência para fazer face ao risco de um fracasso do processo de reforma. Por isso, o recorrente não tem razão em alegar que é errada a invocação pelo Parlamento de um processo decisório em curso para rejeitar o pedido de acesso com base no artigo 4.°, n.° 3, do Regulamento n.° 1049/2001.

 Apreciação do Tribunal

69      O artigo 4.°, n.° 3, do Regulamento n.° 1049/2001 dispõe, no seu primeiro parágrafo, que «[o] acesso a documentos, elaborados por uma instituição para uso interno ou por ela recebidos, relacionados com uma matéria sobre a qual a instituição não tenha decidido, será recusado, caso a sua divulgação pudesse prejudicar gravemente o processo decisório da instituição, excepto quando um interesse público superior imponha a divulgação».

70      Segundo jurisprudência assente, a aplicação desta excepção pressupõe que seja demonstrado que o acesso ao documento elaborado pela instituição para o seu uso interno em causa era susceptível de prejudicar de uma forma concreta e efectiva a protecção do processo decisório da instituição e que esse risco de prejuízo era razoavelmente previsível e não puramente hipotético (além da jurisprudência acima recordada nos n.os 29 e 30, v., também, neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 18 de Dezembro de 2008, Muñiz/Comissão, T‑144/05, não publicado na Colectânea, n.° 74).

71      Acresce que, para estar abrangido pela excepção prevista no artigo 4.°, n.° 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.° 1049/2001, o prejuízo causado ao processo decisório deve ser grave. É assim, nomeadamente, quando a divulgação do documento visado tem um impacto substancial no referido processo. A apreciação da gravidade depende de todas as circunstâncias da causa, nomeadamente dos efeitos negativos dessa divulgação sobre o processo decisório invocados pela instituição (acórdão Muñiz/Comissão, referido no n.° 70 supra, n.° 75).

72      Há que observar, antes de mais, que o relatório n.° 06/02, que é um relatório de auditoria elaborado pelo serviço de auditoria interna do Parlamento em execução do artigo 86.° do Regulamento Financeiro, é um documento elaborado pela instituição para seu uso interno.

73      Em seguida, é notório que esse documento que, segundo os termos da decisão impugnada, «enunciava os princípios sobre os quais se podia basear uma revisão do quadro legal da assistência parlamentar» e «continha propostas que exigiam a adopção de uma decisão pelas autoridades públicas competentes» dizia respeito a uma questão relativamente à qual a instituição ainda não tinha tomado uma decisão.

74      A este respeito, não se discute seriamente se as decisões relativas ao estatuto dos membros do Parlamento adoptadas por este antes da decisão impugnada não esgotavam a questão, mais ampla, da reforma do estatuto da assistência parlamentar. O processo decisório do Parlamento, quer realizado apenas por esta instituição ou juntamente com o Conselho, a Comissão e os Estados‑Membros, não tinha assim terminado com essas decisões.

75      Consequentemente, há que examinar se, na decisão impugnada, o Parlamento demonstrou devidamente que a divulgação do relatório n.° 06/02 prejudicaria gravemente o seu processo decisório e, em caso afirmativo, que não existia um interesse público superior que justificasse a divulgação.

76      Na decisão impugnada, o Parlamento expôs que ainda estava em curso um «processo decisório sensível e complexo […] no qual o [relatório n.° 06/02] constituía um documento de referência importante» e que «a utilização pelos membros do Parlamento do subsídio de assistência parlamentar é um assunto sensível que suscita um grande interesse nos meios de comunicação social» (página 3, último parágrafo, da decisão impugnada). O Parlamento prosseguiu afirmando que «alguns elementos do relatório n.° 06/02 poderiam ser utilizados para frustrar o debate sobre a reforma do sistema e comprometer uma reforma rápida» (início da página 4 da decisão impugnada). Por conseguinte, afirmou o Parlamento, «a divulgação do relatório n.° 06/02 prejudicaria, nessa fase, gravemente o seu processo decisório, mas também causaria outros prejuízos, uma vez que a reforma em causa não pode ser levada a bom porto apenas pelo Parlamento» (ibidem). Em seguida, na decisão impugnada, o Parlamento reiterou a mesma afirmação relativa ao prejuízo ao seu processo decisório.

77      Resulta dessa fundamentação da decisão impugnada que a recusa de acesso se baseia, no essencial, no receio de que alguns elementos do relatório n.° 06/02 «pudessem» ser utilizados para frustrar o debate sobre a reforma.

78      Contudo, a decisão impugnada não contém nenhum elemento tangível que permita concluir que esse risco de prejuízo do processo decisório era, à data da sua adopção, razoavelmente previsível e não puramente hipotético.

79      Designadamente, a decisão impugnada não faz nenhuma referência à existência, à data da sua adopção, de prejuízos ou de tentativas de prejudicar o processo decisório em curso nem a razões objectivas que permitissem prever razoavelmente que esses prejuízos ocorreriam em caso de divulgação do relatório n.° 06/02.

80      A este respeito, a circunstância de a utilização pelos membros do Parlamento de recursos financeiros colocados à sua disposição ser um assunto sensível seguido com interesse pelos meios de comunicação social – o que, de resto, o recorrente não põe em causa, bem pelo contrário – não pode constituir, por si só, uma razão objectiva suficiente para recear um prejuízo grave ao processo decisório, salvo pondo em causa o próprio princípio da transparência pretendido pelo Tratado CE.

81      De igual modo, a alegada complexidade do processo decisório não constituía, em si mesma, uma razão particular para recear que a divulgação do relatório n.° 06/02 prejudicaria gravemente esse processo.

82      Quanto ao facto adiantado pelo Parlamento de que várias tentativas de reforma da assistência parlamentar tinham fracassado no passado, há que observar que esse facto não consta da decisão impugnada. Só é adiantado tardiamente, perante o Tribunal, e sem nenhuma indicação de que esses fracassos se tenham devido a prejuízos ao processo decisório resultantes de uma divulgação de informações sensíveis.

83      De qualquer forma e admitindo que o Parlamento tivesse demonstrado que a divulgação do relatório n.° 06/02 prejudicaria gravemente o seu processo decisório, impõe‑se observar que a decisão impugnada não contém nenhuma fundamentação relativa à questão de saber se um interesse público superior não imporia, apesar de tudo, a divulgação do referido relatório.

84      Com efeito, não se pode considerar que a afirmação, contida na decisão impugnada, de que «o pedido confirmativo não contém nenhum argumento susceptível de justificar a divulgação» constitui essa fundamentação. A este respeito, importa recordar que, nos termos do artigo 6.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1049/2001, o requerente de acesso aos documentos não é obrigado a justificar o seu pedido.

85      Em face das considerações precedentes, das quais resulta que, na decisão impugnada, o Parlamento não demonstrou que o acesso ao relatório n.° 06/02 prejudicaria gravemente o seu processo decisório e não fundamentou, de qualquer forma, a sua recusa de acesso atendendo à exigência de inexistência de um interesse público superior, há que concluir que a decisão impugnada é infundada, na parte em que recusa o acesso ao relatório n.° 06/02 com base no artigo 4.°, n.° 3, do Regulamento n.° 1049/2001.

86      Nestas condições, há que dar provimento ao presente recurso e anular a decisão impugnada na parte em que recusa ao recorrente o acesso ao relatório n.° 06/02.

 Quanto às despesas

87      Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Nos termos do artigo 87.°, n.° 4, primeiro parágrafo, do mesmo regulamento, os Estados‑Membros que intervieram no processo suportarão as suas despesas.

88      Tendo o Parlamento sido vencido, há que condená‑lo nas despesas do recorrente, em conformidade com o pedido deste. O Reino da Dinamarca, a República da Finlândia e o Reino da Suécia suportarão as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Segunda Secção)

decide:

1)      A decisão do Parlamento Europeu de 11 de Agosto de 2008, referência A (2008) 10636, é anulada na parte em que recusa o acesso ao relatório n.° 06/02 do Serviço de Auditoria Interna do Parlamento, de 9 de Janeiro de 2008, intitulado «Auditoria sobre o subsídio de assistência parlamentar».

2)      O Parlamento suportará as suas próprias despesas, bem como as despesas de C. Toland.

3)      O Reino da Dinamarca, a República da Finlândia e o Reino da Suécia suportarão as suas próprias despesas.

Forwood

Dehousse

Schwarcz

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 7 de Junho de 2011.

Assinaturas


* Língua do processo: inglês.