Language of document : ECLI:EU:C:2018:714

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Décima Secção)

13 de setembro de 2018 (*)

«Recurso de decisão do Tribunal Geral — Marca da União Europeia — Registo internacional que designa a União Europeia — Marca figurativa que representa um padrão de linhas onduladas entrecruzadas — Regulamento (CE) n.o 207/2009 — Artigo 7.o, n.o 1, alínea b) — Motivo absoluto de recusa — Caráter distintivo — Padrão de superfície»

No processo C‑26/17 P,

que tem por objeto um recurso de uma decisão do Tribunal Geral nos termos do artigo 56.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, interposto em 18 de janeiro de 2017,

Birkenstock Sales GmbH, com sede em Vettelschoß (Alemanha), representada por C. Menebröcker e V. Töbelmann, Rechtsanwälte,

recorrente,

sendo a outra parte no processo:

Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia (EUIPO), representado por D. Walicka, na qualidade de agente,

recorrido em primeira instância,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Décima Secção),

composto por: E. Levits, presidente de secção, A. Borg Barthet (relator) e M. Berger, juízes,

advogado‑geral: M. Szpunar,

secretário: C. Strömholm, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 21 de março de 2018,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 6 de junho de 2018,

profere o presente

Acórdão

1        Com o presente recurso, a Birkenstock Sales GmbH pede a anulação do Acórdão do Tribunal Geral da União Europeia de 9 de novembro de 2016, Birkenstock Sales/EUIPO (Representação de um padrão de linhas onduladas entrecruzadas) (T‑579/14, a seguir «acórdão recorrido», EU:T:2016:650), na medida em que nesse acórdão o Tribunal Geral negou provimento parcial ao seu recurso de anulação da decisão da Primeira Câmara de Recurso do Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia (EUIPO) de 15 de maio de 2014 (Processo R 1952/2013‑1) relativamente ao registo internacional que designa a União Europeia da marca figurativa que representa um padrão de linhas onduladas entrecruzadas (a seguir «decisão controvertida»).

 Quadro jurídico

2        O Regulamento (CE) n.o 207/2009 do Conselho, de 26 de fevereiro de 2009, sobre a marca da União Europeia (JO 2009, L 78, p. 1), dispõe, no seu artigo 7.o, n.o 1, alínea b):

«1. Será recusado o registo:

[…]

b)      De marcas desprovidas de caráter distintivo;

[…]»

 Antecedentes do litígio

3        A recorrente é sucessora dos direitos da Birkenstock Orthopädie GmbH & Co. KG que obteve na Secretaria Internacional da Organização Mundial de Propriedade Intelectual (OMPI), em 27 de junho de 2012, um registo internacional, com base numa marca alemã, que designa em particular a União Europeia para a seguinte marca figurativa:

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4        Em 25 de outubro de 2012, o EUIPO recebeu uma notificação do registo internacional do sinal em causa (a seguir «sinal em causa»).

5        A extensão da proteção foi reivindicada para produtos das classes 10, 18 e 25 na aceção do Acordo de Nice relativo à Classificação Internacional dos Produtos e dos Serviços para o registo de marcas, de 15 de junho de 1957, conforme revisto e alterado (a seguir «Acordo de Nice»), e que correspondem, para cada uma destas classes, à seguinte descrição:

–        classe 10: «Aparelhos e instrumentos cirúrgicos, médicos, dentários e veterinários; membros, olhos e dentes artificiais; artigos ortopédicos; material de sutura; material de sutura para uso cirúrgico; calçado ortopédico, incluindo calçado ortopédico de reabilitação, de fisioterapia do pé, de terapia e concebido para outros usos médicos, e suas partes, incluindo calçado ortopédico, incluindo calçado ortopédico com palmilhas ou suportes ortopédicos e peças de inserção ortopédicas para calçado, incluindo suportes ortopédicos e peças de inserção ortopédicas para calçado e suas partes, também em forma de peças de inserção rígidas termoplásticas; componentes de calçado e acessórios de calçado para adaptação ortopédica de calçado, em especial acessórios, cunhas, almofadas de proteção, solas interiores, almofadas de proteção de espuma, almofadas de proteção de espuma e solas moldadas para calçado, incluindo peças de inserção totalmente em plástico e palmilhas ortopédicas de cortiça natural, cortiça térmica, plástico, borracha ou materiais em espuma de plástico, incluindo componentes elásticos à base de mistura de cortiça e borracha ou de plástico e cortiça; peças de inserção ortopédicas para pés e calçado; suportes ortopédicos para pés e calçado; calçado ortopédico, em especial pantufas e sandálias ortopédicas; solas interiores ortopédicas, peças de inserção, incluindo peças de inserção em plástico, borracha ou materiais em espuma de plástico, incluindo componentes elásticos à base de mistura de cortiça e borracha ou de plástico e cortiça»;

–        classe 18: «Couro e imitações de couro, bem como produtos nestes materiais incluídos nesta classe; pele de animais, peles; malas e maletas de viagem; chapéus‑de‑chuva, chapéus‑de‑sol e bastões de caminhada; chicotes, arreios e selaria; porta‑moedas; bolsas; sacos; malas de mão; porta‑documentos; bolsas de cintura; sacos de viagem para vestuário; estojos para chaves (marroquinaria); estojos para produtos de beleza; estojos de toilette [“nécessaires”]; sacos de viagem; mochilas»;

–        classe 25: «Vestuário, artigos de chapelaria, calçado, incluindo calçado confortável e calçado para o trabalho, atividades de lazer, de saúde do pé e de desporto, incluindo sandálias, sandálias para tonificar os músculos inferiores, chinelos, pantufas, socas, também dotadas de palmilhas, especialmente palmilhas profundas, anatómicas e moldadas, suportes ortopédicos para pés e calçado e peças de inserção ortopédicas para pés e calçado, peças de inserção de proteção; partes e peças de inserção de calçado referidas, a saber partes superiores do calçado, reforço dos calcanhares, solas exteriores, solas interiores, partes inferiores do calçado, incluindo palmilhas, suportes ortopédicos para pés e calçado; peças de inserção ortopédicas para pés e calçado, em especial palmilhas profundas, anatómicas e moldadas, em especial em cortiça natural, cortiça térmica, plástico, borracha ou materiais em espuma de plástico, incluindo componentes elásticos à base de mistura de cortiça e borracha ou de plástico e cortiça; solas interiores; calçado, incluindo sapatos e sandálias, botas e partes e guarnições para todos os produtos referidos que integram esta classe; cintos, xailes e lenços.»

6        Em 21 de novembro de 2012, o examinador notificou a recorrente de uma recusa oficiosa provisória total de proteção da marca internacional na União. O motivo invocado para esta recusa foi a falta de caráter distintivo do sinal em causa para todos os produtos em questão, na aceção do artigo 7.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 207/2009.

7        Depois de a recorrente ter respondido às objeções expostas na notificação de recusa provisória, por decisão de 29 de agosto de 2013, a Divisão de Exame do EUIPO confirmou, pelo motivo anteriormente indicado, a recusa total de proteção da marca internacional na União.

8        Em 4 de outubro de 2013, a recorrente interpôs recurso desta decisão para o EUIPO, ao abrigo dos artigos 58.o a 60.o do Regulamento n.o 207/2009.

9        Por decisão de 15 de maio de 2014, a Primeira Câmara de Recurso do EUIPO (a seguir «Câmara de Recurso») negou provimento ao recurso por considerar que o sinal em causa não tinha caráter distintivo no que se refere aos produtos em questão.

10      A Câmara de Recurso considerou, em particular, que o referido sinal apresentava linhas onduladas que se cruzavam em ângulo reto e que se apresentavam numa sequência repetitiva que se podia estender nas quatro direções do quadrado e, portanto, aplicar‑se a qualquer superfície bidimensional ou tridimensional. O sinal em causa seria assim imediatamente considerado como representando um padrão de superfície.

11      Além disso, a Câmara de Recurso salientou que era notório que as superfícies dos produtos ou o seu acondicionamento estavam ornamentadas com motivos por diversas razões, especialmente para melhorar a sua aparência estética e/ou responder a considerações técnicas.

12      A Câmara de Recurso sublinhou que, segundo a jurisprudência, uma vez que o consumidor médio não tinha por hábito presumir a origem comercial dos produtos baseando‑se em sinais que se confundem com a aparência dos próprios produtos, esses sinais só possuem caráter distintivo, na aceção do artigo 7.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 207/2009, se divergirem de forma significativa da norma ou dos usos do setor. Considerou que essa jurisprudência era aplicável no caso em apreço, uma vez que o sinal em causa se confunde com a aparência dos produtos designados.

13      A Câmara de Recurso considerou que a impressão geral produzida pelo sinal em causa era banal e que esse motivo em relevo podia ser encontrado em todos os produtos em causa, relativamente aos quais podia ter uma função estética e/ou técnica. Em sua opinião, a impressão do conjunto produzida pelo referido sinal não divergia de forma significativa, ou em nada, dos usos dos setores em questão.

14      A Câmara de Recurso concluiu que, muito provavelmente, o público relevante compreendia esse sinal como um mero padrão de superfície e não como a indicação de uma origem comercial especial.

 Tramitação do processo no Tribunal Geral e acórdão recorrido

15      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 1 de agosto de 2014, a recorrente interpôs recurso de anulação da decisão controvertida.

16      Em apoio do seu recurso, a recorrente invocou um único fundamento, baseado na violação do artigo 7.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 207/2009. Alegou especialmente que a Câmara de Recurso não se tinha baseado no sinal em causa na sua forma registada, que é uma imagem cuja superfície está claramente delimitada e que não se confunde com a forma dos produtos, mas que ampliou sem justificação o referido sinal afirmando que este podia ser reproduzido e continuado.

17      Depois de ter recordado a jurisprudência pertinente, nos n.os 23 a 27 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral procedeu à apreciação da aplicabilidade, no caso concreto, da jurisprudência relativa aos sinais que se confundem com a aparência dos produtos. Para este efeito, o Tribunal Geral, nomeadamente, examinou, nos n.os 50 a 68 do acórdão recorrido, a questão de saber qual é o critério pertinente para que um sinal, composto por uma série de elementos que se repetem regularmente e designado como marca figurativa, possa ser considerado um padrão de superfície para os produtos em causa.

18      A este respeito, o Tribunal Geral considerou, nos n.os 54 a 57 do acórdão recorrido, que é apenas quando a utilização de um padrão de superfície é pouco provável, dada a natureza dos produtos em causa, é que esse sinal não pode ser considerado um padrão de superfície relativamente aos produtos em causa.

19      À luz deste critério, o Tribunal Geral decidiu que, quanto aos «membros, olhos e dentes artificiais», «material de sutura; material de sutura para uso cirúrgico» e «peles de animais, peles», foi erradamente que a Câmara de Recurso aplicou a referida jurisprudência, dado que se baseou em critérios de apreciação errados e que, portanto, haveria que anular a decisão controvertida no que diz respeito a esses produtos. Em contrapartida, quanto aos produtos pertencentes às classes 10, 18 e 25 na aceção do Acordo de Nice, o Tribunal Geral considerou que a Câmara de Recurso tinha aplicado justificadamente a jurisprudência relativa aos sinais que se confundem com a aparência dos produtos.

20      Quanto a estes últimos produtos visados pela marca internacional cuja proteção é solicitada, o Tribunal Geral apreciou, nos n.os 129 a 153 do acórdão recorrido, se foi justificadamente que a Câmara de Recurso considerou que o sinal em causa não divergia de forma significativa das normas ou dos usos dos setores em questão. Concluiu que era esse o caso.

21      Consequentemente, o Tribunal Geral anulou a decisão controvertida no que diz respeito aos produtos seguintes: «membros, olhos e dentes artificiais», «material de sutura; material de sutura para uso cirúrgico» e «peles de animais, peles», e negou provimento ao recurso quanto ao restante.

 Pedidos das partes

22      Com o seu recurso, a recorrente pede que o Tribunal de Justiça se digne:

–        anular o acórdão recorrido;

–        dar provimento aos seus pedidos apresentados em primeira instância; e

–        condenar o EUIPO nas despesas, incluindo as efetuadas com o processo de recurso perante o Tribunal Geral e a Câmara de Recurso.

23      O EUIPO pede que o Tribunal de Justiça negue provimento ao presente recurso e condene a recorrente nas despesas.

 Quanto ao presente recurso

24      Em apoio do presente recurso, a recorrente invoca três fundamentos, baseados, respetivamente, na violação do artigo 7.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 207/2009, nas contradições na fundamentação do acórdão recorrido e na desvirtuação dos factos.

 Quanto ao primeiro fundamento

 Quanto à primeira parte do primeiro fundamento

–       Argumentos das partes

25      Na primeira parte do seu primeiro fundamento, a recorrente alega que o Tribunal Geral considerou, erradamente, nos n.os 54 e seguintes do acórdão recorrido, como critério pertinente para que possa ser aplicada, no caso em apreço, a jurisprudência relativa aos sinais que se confundem com a aparência dos produtos em causa, o critério relativo à simples «possibilidade» de utilização do sinal em causa como padrão de superfície.

26      Com efeito, o Tribunal de Justiça decidiu, em particular no Despacho de 26 de abril de 2012, Deichmann/IHMI (C‑307/11 P, não publicado, EU:C:2012:254), que é necessário que a utilização do sinal em causa como padrão de superfície seja «a utilização mais provável». Por conseguinte, a única possibilidade de utilização da marca internacional em causa como padrão de superfície não é suficiente para que seja aplicada a jurisprudência relativa aos sinais que se confundem com a aparência dos produtos.

27      Segundo a recorrente, ao declarar que um sinal que é composto por uma série de elementos que se repetem regularmente pode não ser considerado um padrão de superfície exclusivamente no caso de a utilização desse padrão ser pouco provável, dada a natureza dos produtos em causa, o Tribunal Geral estabeleceu um critério diferente do critério relativo à «utilização mais provável». O referido primeiro critério de apreciação impõe às marcas figurativas compostas por uma série de elementos que se repetem critérios mais estritos do que os impostos a outros tipos de marcas para apreciar o seu caráter distintivo.

28      O EUIPO sustenta, a título principal, que a primeira parte do primeiro fundamento é inadmissível e, a título subsidiário, que é improcedente.

–       Apreciação do Tribunal de Justiça

29      No que diz respeito à admissibilidade da primeira parte do primeiro fundamento, importa recordar que, em conformidade com o artigo 256.o TFUE e com o artigo 58.o, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, o recurso é limitado às questões de direito. O Tribunal Geral é o único competente para apurar e apreciar os factos pertinentes, bem como para apreciar os elementos de prova. A apreciação destes factos e elementos de prova não constitui, portanto, salvo em caso de desvirtuação dos mesmos, uma questão de direito sujeita, enquanto tal, à fiscalização do Tribunal de Justiça no âmbito do recurso de uma decisão do Tribunal Geral (Acórdão de 2 de setembro de 2010, Calvin Klein Trademark Trust/IHMI, C‑254/09 P, EU:C:2010:488, n.o 49 e jurisprudência referida).

30      A este respeito, basta constatar que, através da primeira parte do seu primeiro fundamento, a recorrente sustenta que o Tribunal Geral, ao basear‑se no critério relativo à utilização possível do sinal em causa como padrão de superfície, para aplicar a jurisprudência relativa aos sinais que se confundem com a aparência dos produtos, cometeu um erro de direito. Portanto, essa parte, que suscita uma questão de direito, é admissível no quadro de um recurso de decisão da primeira instância.

31      No que diz respeito à procedência da referida parte, resulta da jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que o caráter distintivo de uma marca, no sentido do artigo 7.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 207/2009, significa que essa marca permite identificar o produto para o qual o registo é pedido como proveniente de uma determinada empresa e, portanto, distinguir esse produto dos de outras empresas. Este caráter distintivo deve ser apreciado, por um lado, relativamente aos produtos ou aos serviços para os quais o registo foi pedido e, por outro, em relação à perceção que deles tem o público relevante (Acórdãos de 25 de outubro de 2007, Develey/IHMI, C‑238/06 P, EU:C:2007:635, n.o 79 e jurisprudência referida, e de 21 de janeiro de 2010, Audi/IHMI, C‑398/08 P, EU:C:2010:29, n.os 33 e 34).

32      A este propósito, o Tribunal Geral recordou, justificadamente, no n.o 23 do acórdão recorrido, que os critérios de apreciação do caráter distintivo das marcas tridimensionais constituídas pela aparência do próprio produto não são diferentes dos critérios aplicáveis às outras categorias de marcas. Precisou igualmente que, na aplicação desses critérios, a perceção do consumidor médio não é necessariamente a mesma no caso de uma marca tridimensional, constituída pela aparência do próprio produto, e no caso de uma marca nominativa ou figurativa, que consiste num sinal independente do aspeto dos produtos que designa. Com efeito, os consumidores médios não têm por hábito presumir a origem dos produtos baseando‑se na sua forma ou na do seu acondicionamento, na falta de qualquer elemento gráfico ou textual, podendo, por isso, tornar‑se mais difícil provar o caráter distintivo quando se trata de uma marca tridimensional do que quando se trata de uma marca nominativa ou figurativa (Acórdãos de 7 de outubro de 2004, Mag Instrument/IHMI, C‑136/02 P, EU:C:2004:592, n.o 30, e de 22 de junho de 2006, Storck/IHMI, C‑25/05 P, EU:C:2006:422, n.os 26 e 27).

33      Nestas circunstâncias, como o Tribunal Geral igualmente recordou, com razão, no n.o 24 do acórdão recorrido, só uma marca que, de forma significativa, divirja da norma ou dos usos do setor e que, por essa razão, pode cumprir a sua função essencial de indicação de origem não é desprovida de caráter distintivo, no sentido do artigo 7.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 207/2009 (Acórdãos de 12 de janeiro de 2006, Deutsche SiSi‑Werke/IHMI, C‑173/04 P, EU:C:2006:20, n.o 31, e de 22 de junho de 2006, Storck/IHMI, C‑25/05 P, EU:C:2006:422, n.o 28).

34      Esta jurisprudência, desenvolvida a respeito das marcas tridimensionais constituídas pela própria aparência do produto é também válida quando a marca cujo registo é pedido é uma marca figurativa constituída pela representação bidimensional do referido produto (Acórdão de 22 de junho de 2006, Storck/IHMI, C‑25/05 P, EU:C:2006:422, n.o 29), ou ainda quando a marca cujo registo é pedido é um sinal constituído por um padrão aplicado na superfície de um produto (v., neste sentido, Despacho de 28 de junho de 2004, Glaverbel/IHMI, C‑445/02 P, EU:C:2004:393, n.os 22 a 24).). Com efeito, nesses dois casos, a marca também não consiste num sinal independente do aspeto dos produtos que designa.

35      A referida jurisprudência é também aplicável quando só uma parte do produto designado é representada por uma marca (Despacho de 13 de setembro de 2011, Wilfer/IHMI, C‑546/10 P, não publicado, EU:C:2011:574, n.o 59, e Acórdão de 15 de maio de 2014, Louis Vuitton Malletier/IHMI, C‑97/12 P, não publicado, EU:C:2014:324, n.o 54).

36      Daqui se conclui, como o Tribunal Geral declarou, justificadamente, no n.o 28 do acórdão recorrido, que o elemento determinante no que diz respeito à aplicabilidade da jurisprudência relativa às marcas tridimensionais que se confundem com a aparência dos produtos não é a qualificação do sinal em causa de figurativo, tridimensional ou outro, mas o facto de ele se confundir com a aparência do produto designado.

37      Este elemento determinante implica, como salientou concretamente o advogado‑geral nos n.os 52 e 53 das suas conclusões, a existência de uma semelhança entre o sinal e os produtos que ele designa ou uma parte deles, que deve ser apreciada à luz da natureza dos referidos produtos e ser percetível pelo público relevante.

38      É à luz destas considerações que há que verificar, como sustenta a recorrente, se o Tribunal Geral deveria considerar, como critério pertinente para poder aplicar a jurisprudência relativa às marcas que se confundem com a aparência dos produtos, o critério baseado na utilização mais provável do sinal em questão como padrão de superfície.

39      A este propósito, o Tribunal Geral considerou, nos n.os 36 e 37 do acórdão recorrido, que o sinal em causa é um sinal composto por uma série de elementos que se repetem regularmente, que pode estender‑se indefinidamente nas quatro direções e que se presta muito especialmente a ser utilizado como padrão de superfície. No n.o 48 desse acórdão, o Tribunal Geral considerou que os produtos designados por esse sinal são, em parte, produtos relativamente aos quais é evidente que apresentam frequentemente padrões de superfície, como os artigos de moda no sentido amplo, e, em parte, produtos relativamente aos quais não é evidente que apresentem frequentemente padrões de superfície. Declarou, nos n.os 54 e 55 do referido acórdão, que existe, assim, em princípio, uma probabilidade, inerente a este sinal, de que seja utilizado como padrão de superfície e que, nessas circunstâncias, é unicamente quando a utilização de um padrão de superfície é pouco provável dada a natureza dos produtos em causa que tal sinal não pode ser considerado um padrão de superfície, relativamente aos referidos produtos e, que, nos outros casos, pode ser considerado que o sinal em causa constitui efetivamente um padrão de superfície.

40      Ao optar pelo critério baseado na utilização possível, e não pouco provável, do sinal em causa como padrão de superfície tendo em conta a natureza dos produtos em questão, a fim de aplicar a jurisprudência relativa às marcas tridimensionais que se confundem com a aparência dos produtos, o Tribunal Geral não cometeu nenhum erro de direito.

41      Com efeito, por um lado, tendo em conta as características intrínsecas do sinal em causa, que é composto por uma série de elementos que se repetem de forma regular, e a natureza dos produtos que ele designa, este sinal é, em princípio, destinado a ser aposto na superfície dos referidos produtos, como salientou o advogado‑geral no n.o 77 das suas conclusões. Existe uma probabilidade inerente a um sinal que é constituído por uma sequência repetitiva de elementos de ser utilizado como padrão de superfície e, portanto, confundir‑se com a aparência dos produtos em questão.

42      Por outro lado, há que sublinhar que o critério baseado na utilização mais provável, tido em conta no Despacho de 26 de abril de 2012, Deichmann/IHMI (C‑307/11 P, não publicado, EU:C:2012:254, n.o 55), é irrelevante no caso em apreço, uma vez que o que estava em causa no processo que deu origem a esse despacho não era o registo de um sinal composto por uma sequência repetitiva de elementos, mas um sinal que representa uma banda em ângulo orlada de linhas tracejadas.

43      Além disso, o cumprimento do critério baseado na utilização mais provável, como invoca a recorrente, conduziria a que os sinais que se prestam muito particularmente, em razão das suas características intrínsecas, a ser utilizados como padrão de superfície, relativamente aos produtos que designam, pudessem escapar à jurisprudência relativa às marcas que se confundem com a aparência dos produtos, quando existe, no que diz respeito a tais sinais, uma probabilidade que lhes é inerente de serem utilizados como padrão de superfície e, portanto, de se confundirem com a aparência dos produtos.

44      Nestas circunstâncias, há que julgar a primeira parte do primeiro fundamento improcedente por ser infundada.

 Quanto à segunda parte do primeiro fundamento

–       Argumentos das partes

45      Através da segunda parte do seu primeiro fundamento, a recorrente sustenta que foi erroneamente que o Tribunal Geral não determinou as normas e os usos do setor para os produtos em questão e não apreciou o sinal em causa em relação a essas normas.

46      A este respeito, a recorrente recorda, fazendo referência aos Acórdãos de 7 de outubro de 2004, Mag Instrument/IHMI (C‑136/02 P, EU:C:2004:592, n.o 31), e de 24 de maio de 2012, Chocoladefabriken Lindt & Sprüngli/IHMI (C‑98/11 P, EU:C:2012:307, n.o 42), a reiterada jurisprudência segundo a qual uma marca que, de forma significativa, divirja da norma ou dos usos do setor considerado e, por esse facto, pode cumprir a sua função essencial de indicação da origem não é desprovida de caráter distintivo, no sentido do artigo 7.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 207/2009.

47      A recorrente sustenta que, nos n.os 83 a 96 e 113 a 123 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral apenas apreciou se os produtos em questão podiam, em princípio, apresentar um padrão de superfície e que, no n.o 133 desse acórdão, retomou a constatação de ordem geral feita pela Câmara de Recurso segundo a qual a experiência geral demonstrava que os padrões de superfície se caracterizavam por uma infinidade de desenhos diferentes. Ora, em sua opinião, esta afirmação não substitui a determinação das normas e dos usos do setor em questão para cada categoria de produtos designada, sobretudo tendo em conta que os produtos como «os aparelhos e instrumentos médicos», «os artigos de selaria» ou «o calçado» não podem ser incluídos numa categoria de produtos homogéneos.

48      O EUIPO alega, a título principal, que a segunda parte do primeiro fundamento é inadmissível e, a título subsidiário, que é improcedente.

–       Apreciação do Tribunal de Justiça

49      Há que salientar que, através da segunda parte do primeiro fundamento, a recorrente sustenta, em substância, que foi erradamente que o Tribunal Geral não definiu as normas e os usos do setor para cada categoria de produtos designada pelo sinal controvertido, para efeitos de apreciar o caráter distintivo da marca internacional objeto do pedido de proteção. Esta parte do fundamento, pela qual a recorrente suscita uma questão de direito, é admissível no âmbito de um recurso de uma decisão do Tribunal Geral, em conformidade com a jurisprudência recordada no n.o 29 do presente acórdão.

50      Quanto à procedência desta segunda parte do fundamento, há que referir que assenta numa interpretação errada do acórdão recorrido.

51      Com efeito, nos n.os 70 a 128 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral apreciou, em primeiro lugar, a questão de saber se a jurisprudência relativa aos sinais que se confundem com a aparência dos produtos, considerados os produtos em causa, era aplicável no caso em apreço à luz do critério definido no n.o 55 desse acórdão, ou seja, que é unicamente quando a utilização de um padrão de superfície for pouco provável, dada a natureza dos produtos em causa, que esse sinal não pode ser considerado um padrão de superfície. O Tribunal Geral procedeu a essa análise relativamente a cada categoria dos produtos em causa e apreciou, segundo as normas ou os usos do setor em questão, se era pouco provável ou não que os referidos produtos apresentassem um padrão de superfície.

52      Em segundo lugar, nos n.os 129 a 147 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral apreciou, no que diz respeito aos produtos relativamente aos quais Câmara de Recurso tinha aplicado justificadamente a jurisprudência relativa às marcas tridimensionais, se a Câmara tinha considerado, igualmente de forma justificada, que esse sinal não divergia de forma significativa das normas ou dos usos dos setores em causa e que, portanto, o sinal não tinha caráter distintivo.

53      O Tribunal Geral considerou, a este respeito, nos n.os 131 e 132 do acórdão recorrido, que o sinal em causa é um padrão simples, constituído por uma simples combinação de linhas onduladas, entrecruzadas de forma repetida e rejeitou o argumento da recorrente baseado no facto de que as formas que constituem este sinal são já inabituais consideradas isoladamente. No n.o 133 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral acrescentou, à semelhança do que a Câmara de Recurso tinha salientado, que a experiência geral demonstra que padrões aplicados na superfície se caracterizam por uma infinidade de desenhos diferentes e que os elementos dos padrões aplicados na superfície são muitas vezes formas geométricas simples, como pontos, círculos, retângulos ou linhas, podendo estas últimas ser direitas ou subir e descer em ziguezagues ou em ondas.

54      Depois de ter recordado, no n.o 136 do acórdão recorrido, que, em conformidade com a jurisprudência aplicável, compete à recorrente que invoca o caráter distintivo da marca cujo registo é pedido, apesar da análise do EUIPO, fornecer informações concretas e sustentadas que comprovem que essa marca é dotada de caráter distintivo intrínseco ou de caráter distintivo adquirido pelo efeito do uso, o Tribunal Geral apreciou, nos n.os 137 a 147 desse acórdão, os argumentos e os elementos de prova apresentados pela recorrente.

55      No n.o 138 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral considerou, no âmbito da apreciação do argumento da recorrente segundo o qual a Câmara de Recurso não deveria ter‑se limitado a tecer considerações gerais sobre o conjunto dos produtos ou serviços, que a afirmação feita pela Câmara de Recurso, segundo a qual os padrões aplicados na superfície se caracterizavam por uma infinidade de desenhos diferentes, não se limitava a um determinado setor. No n.o 144 do referido acórdão, o Tribunal Geral declarou que as imagens dos sapatos fornecidas pela recorrente não podiam demonstrar a existência de uma divergência entre o sinal em causa e as normas e os usos do setor do calçado. No n.o 145 do referido acórdão, considerou que algumas imagens das solas interiores dos sapatos apresentadas pela recorrente não eram, de qualquer forma, suscetíveis de demonstrar a existência de uma divergência significativa entre o sinal em causa e as normas e os usos do setor em questão, na medida em que a totalidade das imagens mostravam a parte superior das solas interiores. Para os outros produtos em causa, o Tribunal Geral considerou que a recorrente não apresentou imagens destinadas a comprovar as normas e os usos dos setores em questão. Portanto, o Tribunal Geral declarou, no n.o 147 do acórdão recorrido, que as afirmações da recorrente não conseguiam demonstrar a existência de uma divergência significativa entre o sinal em causa e as normas e os usos dos setores em questão.

56      Nestas circunstâncias, Tribunal Geral não pode ser censurado por não ter determinado as normas e os usos dos setores em questão quando apreciou o caráter distintivo do sinal em causa.

57      Daqui resulta que a segunda parte do primeiro fundamento do presente recurso deve ser julgada improcedente.

 Quanto à terceira parte do primeiro fundamento

–       Argumentos das partes

58      Através da terceira parte do seu primeiro fundamento, a recorrente alega que o Tribunal Geral aplicou critérios mais estritos do que os previstos no artigo 7.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 207/2009, quando considerou, nos n.os 130, 131 e 133 do acórdão recorrido, que a impressão global produzida pela marca internacional em causa era banal e que os padrões de superfície eram frequentemente formas geométricas simples, como pontos, círculos, retângulos ou linhas.

59      A este respeito, a recorrente faz referência ao Acórdão de 16 de setembro de 2004, SAT.1/IHMI (C‑329/02 P, EU:C:2004:532, n.o 41), do qual se depreende que o registo de um sinal como marca da União Europeia não está subordinado à constatação de um determinado nível de criatividade ou de imaginação por parte do titular da marca, mas apenas à capacidade de esse sinal distinguir os produtos ou os serviços em questão dos das outras empresas. Ora, as linhas entrelaçadas que se cruzam formando um ângulo de 90o que constituem o sinal em causa suscitam uma impressão global precisa e característica de um «padrão de ossinhos», de modo que a impressão global produzida por este sinal permite indicar a sua origem.

60      O EUIPO alega, a título principal, que a terceira parte do segundo fundamento é inadmissível e, a título subsidiário, que é improcedente.

–       Apreciação do Tribunal de Justiça

61      Ocorre dizer que, embora através da terceira parte do seu primeiro fundamento, a recorrente invoque, em substância, a aplicação errada, pelo Tribunal Geral, do artigo 7.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 207/2009, na realidade contesta as apreciações factuais que o Tribunal Geral efetuou nos n.os 130, 131 e 133 do acórdão recorrido, segundo as quais, em substância, a impressão geral produzida pelo sinal em litígio era banal. Daqui se infere que, através da sua argumentação, a recorrente pretende que o Tribunal de Justiça proceda a uma nova apreciação desse sinal.

62      Ora, dado que a recorrente não alega a desvirtuação dos factos a esse respeito, há que considerar que a terceira parte do primeiro fundamento é inadmissível, em conformidade com a jurisprudência recordada no n.o 29 do presente acórdão.

63      Resulta destas considerações que o primeiro fundamento do presente recurso deve ser julgado parcialmente improcedente e parcialmente inadmissível.

 Quanto ao segundo fundamento

 Quanto à primeira parte do segundo fundamento

–       Argumentos das partes

64      Através da primeira parte do seu segundo fundamento, a recorrente sustenta que o acórdão recorrido enferma de fundamentação contraditória entre o n.o 77 do acórdão recorrido e os seus n.os 76 e 78.

65      Com efeito, o Tribunal Geral refere, no n.o 77, que a apreciação do caráter distintivo intrínseco de um sinal deve ser baseada nas suas características, independentemente de qualquer uso concreto que dele seja feito. Todavia, nos referidos n.os 76 e 78, o Tribunal Geral faz referência a uma declaração feita pela recorrente na audiência relativa à utilização do sinal em causa no passado.

66      O EUIPO sustenta que a primeira parte deste segundo fundamento deve ser julgada improcedente.

–       Apreciação do Tribunal de Justiça

67      Há que observar que a primeira parte do segundo fundamento do presente recurso assenta numa interpretação errada do acórdão recorrido.

68      Com efeito, há que salientar que os fundamentos que figuram nos n.os 76 a 78 do acórdão recorrido têm por objetivo responder ao argumento da recorrente, repetido no n.o 74 desse acórdão, segundo o qual a decisão controvertida continha uma contradição, uma vez que a mesma marca não poderia ser simultaneamente um padrão de superfície bidimensional e um revestimento em três dimensões.

69      A este respeito, depois de ter considerado, no n.o 75 do acórdão recorrido, que nada se opunha a que seja tomado em consideração, por um lado, o uso bidimensional e, por outro, o uso tridimensional de um sinal, o Tribunal Geral salientou, no n.o 76 desse acórdão, que, na audiência, a recorrente admitira que o sinal em causa era utilizado, há mais de 40 anos, nas solas de sapatos e que esse uso correspondia a uma utilização do referido sinal como padrão de superfície em relevo. No n.o 77 do referido acórdão, acrescentou que, na verdade, a apreciação do caráter distintivo intrínseco deve basear‑se nas suas características independentemente de qualquer uso concreto que dele é feito. No n.o 78 do mesmo acórdão, salientou que, apesar disso, a argumentação da recorrente não era coerente quando afirmava, por um lado, que a marca internacional constituía uma marca figurativa bidimensional «habitual» e não um padrão de superfície e que, por outro, o uso na sola exterior do calçado, concretamente como padrão de superfície em relevo, constituía um uso da referida marca.

70      Por conseguinte, resulta dos n.os 76 a 78 do acórdão recorrido que o Tribunal Geral limitou‑se a sublinhar a incoerência da argumentação da recorrente. Nestas circunstâncias, não se pode considerar que os fundamentos do acórdão que figuram nestes números estão viciados por uma contradição.

71      Por conseguinte, a primeira parte do primeiro fundamento do recurso deve ser julgada improcedente.

 Quanto à segunda parte do segundo fundamento

–       Argumentos das partes

72      Com a segunda parte do seu segundo fundamento, a recorrente alega que o n.o 75 do acórdão recorrido está viciado por uma contradição quanto à questão de saber se o caráter distintivo de uma marca pode ser apreciado com base numa utilização bidimensional e tridimensional da mesma. Com efeito, o Tribunal Geral refere‑se, nesse número, a um dos seus acórdãos anteriores no qual teve em consideração dois tipos de utilização da marca em causa. Ora, dado que a apreciação do caráter distintivo deve ser efetuada de forma casuística, a referência a um acórdão anterior do Tribunal Geral não pode ser suficiente para demonstrar que o caráter distintivo de uma marca pode ser apreciado tendo em conta a sua utilização bidimensional e tridimensional.

73      O EUIPO alegou que a segunda parte do segundo fundamento do presente recurso é improcedente.

–       Apreciação do Tribunal de Justiça

74      No n.o 75 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral respondeu ao argumento da recorrente segundo o qual a decisão controvertida estava viciada por uma contradição, uma vez que a mesma marca não pode simultaneamente ser objeto de uma utilização bidimensional e de uma utilização tridimensional e considerou que nada se opunha a que sejam tomadas em consideração as duas utilizações dessa marca. A este respeito, fez referência ao Acórdão de 10 de setembro de 2015, EE/IHMI (Représentation de pontos brancos num padrão marfim) (T‑144/14, não publicado, EU:T:2015:615), no qual o Tribunal Geral tomou em consideração essas duas utilizações relativas a um sinal figurativo que representa pontos brancos num fundo marfim. Daí concluiu que, no caso em apreço, a decisão controvertida não era contraditória quanto a esse aspeto.

75      Embora seja verdade, como a recorrente sublinha, que a apreciação do caráter distintivo de um sinal deve ser efetuada caso a caso, também não deixa de ser verdade que o Tribunal Geral pode, no âmbito da fundamentação da sua apreciação desse caráter distintivo, fazer referência a casos comparáveis, sem se contradizer a esse respeito.

76      Conclui‑se que a segunda parte do segundo fundamento do presente recurso deve ser rejeitada por não ser procedente e que, portanto, o segundo fundamento deve igualmente ser julgado improcedente.

 Quanto ao terceiro fundamento

 Argumentos das partes

77      Com o seu terceiro fundamento, a recorrente sustenta que, nos n.os 134 a 139 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral desvirtuou os factos, dado que os factos que considerou como «notórios» manifestamente não o são no que diz respeito à utilização dos padrões de superfície aos produtos em questão das classes 10, 18 e 25, na aceção do Acordo de Nice. A recorrente sublinha, designadamente, a este respeito, que o simples facto de uma parte dos produtos em causa poder apresentar padrões de superfície não é suficiente para que seja considerado como notório o facto de estes apresentarem padrões de superfície e que a marca internacional em causa não se distingue de maneira significativa dos padrões de superfície habitualmente utilizados no setor de produtos em questão.

78      Por conseguinte, não pode ser considerado notório o facto de os instrumentos médicos, cirúrgicos, dentários e veterinários, os couros e as imitações de couro, os bastões de caminhada, o calçado ortopédico, as solas interiores, os componentes e acessórios de calçado, em especial acessórios, cunhas, almofadas, arneses, sacos de viagem para vestuário, porta‑documentos e as malas apresentarem habitualmente padrões de superfície.

79      O EUIPO sustenta que o terceiro fundamento de recurso é inadmissível.

 Apreciação do Tribunal de Justiça

80      Procede recordar que, tendo em conta a natureza excecional de um fundamento baseado na desvirtuação dos factos, o artigo 256.o TFUE, o artigo 58.o, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia e o artigo 168.o, primeiro parágrafo, alínea d), do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça impõem, em particular, ao recorrente que indique de modo preciso os elementos que, em seu entender, foram desvirtuados e que demonstre os erros de análise que, na sua apreciação, o levaram a essa desvirtuação. Essa desvirtuação deve revelar‑se de forma manifesta dos documentos dos autos, sem que seja necessário proceder a uma nova apreciação dos factos e das provas (Acórdãos de 17 de março de 2016, Naazneen Investments/IHMI, C‑252/15 P, não publicado, EU:C:2016:178, n.o 69 e jurisprudência referida, e de 6 de junho de 2018, Apcoa Parking Holdings/EUIPO, C‑32/17 P, não publicado, EU:C:2018:396, n.os 47 e 48).

81      No caso em apreço, há que declarar que a recorrente limita‑se a alegar que os factos considerados pelo Tribunal Geral como sendo «notórios» manifestamente não o são no que diz respeito à utilização dos padrões de superfície nos produtos controvertidos das classes 10, 18 e 25, na aceção do Acordo de Nice, sem apresentar, em apoio dessa alegação, o mínimo elemento de prova que demonstre que o Tribunal Geral desvirtuou os factos a este respeito.

82      Daqui decorre que há que julgar inadmissível o terceiro fundamento do recurso.

83      Decorre das considerações precedentes que há que negar provimento ao recurso na sua totalidade.

 Quanto às despesas

84      Nos termos do artigo 184.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, se o recurso da decisão do Tribunal Geral for julgado improcedente, o Tribunal de Justiça decide sobre as despesas. Nos termos do artigo 138.o, n.o 1, deste regulamento, aplicável aos processos de recursos de decisões do Tribunal Geral por força do artigo 184.o, n.o 1, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo o EUIPO pedido a condenação da Birkenstock Sales GmbH e tendo esta sido vencida, há que condená‑la nas despesas.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Décima Secção) decide:

1)      É negado provimento ao presente recurso.

2)      A Birkenstock Sales GmbH é condenada nas despesas.

Assinaturas


*      Língua do processo: alemão.