Language of document : ECLI:EU:C:2018:229

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

MELCHIOR WATHELET

apresentadas em 11 de abril de 2018 (1)

Processos apensos C622/16 P a C624/16 P

Scuola Elementare Maria Montessori Srl

contra

Comissão Europeia (C‑622/16 P)

e

Comissão Europeia

contra

Scuola Elementare Maria Montessori Srl (C‑623/16 P)

e

Comissão Europeia

contra

Pietro Ferracci (C‑624/16 P)

«Recurso de decisão do Tribunal Geral — Artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE — Admissibilidade — Ato regulamentar que não necessita de medidas de execução — Afetação direta — Auxílios de Estado — Regime de auxílios concedidos pelas autoridades italianas a entidades não comerciais que exercem atividades específicas em determinados domínios — Isenção do imposto municipal sobre imóveis — Decisão que declara impossível a recuperação de um auxílio de Estado incompatível com o mercado interno — Decisão que declara não constitutivo de auxílio de Estado o regime de isenções ao imposto predial municipal em benefício das instalações onde são exercidas atividades não económicas por entidades não comerciais — Recurso de anulação de potenciais concorrentes»






I.      Introdução

1.        Com os seus respetivos recursos nos processos C‑622/16 P e C‑623/16 P, a Scuola Elementare Maria Montessori Srl e a Comissão Europeia pedem a anulação do Acórdão do Tribunal Geral da União Europeia de 15 de setembro de 2016, Scuola Elementare Maria Montessori/Comissão (T‑220/13, não publicado, EU:T:2016:484), através do qual o Tribunal Geral negou provimento ao recurso interposto pela Scuola Elementare Maria Montessori com vista à anulação da Decisão 2013/284/UE da Comissão, de 19 de dezembro de 2012, relativa ao auxílio estatal SA.20829 [C 26/2010, ex NN 43/2010 (ex CP 71/2006)] Regime relativo à isenção do imposto municipal sobre imóveis (ICI) concedida a imóveis utilizados por entidades não comerciais para fins específicos a que a Itália deu execução (2) (a seguir «decisão controvertida»). Com o seu recurso no processo C‑624/16 P, a Comissão pede igualmente a anulação do Acórdão do Tribunal Geral de 15 de setembro de 2016, Ferracci/Comissão (T‑219/13, EU:T:2016:485), através do qual o Tribunal Geral negou provimento ao recurso de Pietro Ferracci com vista à anulação da mesma decisão.

2.        O artigo 230.o CE foi alterado pelo Tratado de Lisboa. Este tratado aditou ao quarto parágrafo do artigo 263.o TFUE uma terceira parte «que flexibilizou os requisitos de admissibilidade dos recursos de anulação interpostos por pessoas singulares e coletivas» (3). Em todo caso, era este o objetivo declarado.

3.        Com efeito, embora o Tribunal de Justiça tenha reconhecido que «a alteração do direito de recurso das pessoas singulares e coletivas previsto no quarto parágrafo do artigo 230.o CE tinha como objetivo permitir a essas pessoas a interposição, em condições menos restritivas, de recursos de anulação de atos de alcance geral» (4), não deixou de interpretar cada um dos requisitos estabelecidos no artigo 263.o, quarto parágrafo, último membro de frase, TFUE de forma bastante restritiva.

4.        Assim, os atos regulamentares foram definidos como atos de alcance geral, com exceção dos atos legislativos (5), o requisito da falta de medidas de execução foi distinguido do requisito da afetação direta (6) e o «caráter mecânico» de uma medida nacional suscetível de ser adotada na sequência de um ato da União foi considerado irrelevante quando se trata de identificar uma medida de execução na aceção do artigo 263.o, quarto parágrafo, último membro de frase, TFUE (7).

5.        Após os Acórdãos de 13 de março de 2018, Industrias Químicas del Vallés/Comissão (C‑244/16 P, EU:C:2018:177) e European Union Copper Task Force/Comissão (C‑384/16 P, EU:C:2018:176), os presentes recursos oferecem ao Tribunal de Justiça a possibilidade de conferir ao artigo 263.o, quarto parágrafo, último membro de frase, TFUE um vislumbre de efeito útil. Efetivamente, se o Tribunal de Justiça declarar a inadmissibilidade dos recursos que estão na origem dos presentes recursos, confirmará igualmente o alcance liliputiano da alteração introduzida no artigo 263.o TFUE (ou anterior artigo 230.o CE) pelo Tratado de Lisboa (8).

II.    Quadro jurídico

6.        Nos termos do artigo 14.o, n.o 1, do Regulamento (CE) n.o 659/1999 do Conselho, de 22 de março de 1999, que estabelece as regras de execução do artigo [108.o TFUE] (9):

«Nas decisões negativas relativas a auxílios ilegais, a Comissão decidirá que o Estado‑Membro em causa deve tomar todas as medidas necessárias para recuperar o auxílio do beneficiário. A Comissão não deve exigir a recuperação do auxílio se tal for contrário a um princípio geral de direito comunitário.»

III. Antecedentes do litígio

7.        Os antecedentes do litígio, tais como resultam dos n.os 1 a 20 dos acórdãos do Tribunal Geral de 15 de setembro de 2016, Scuola Elementare Maria Montessori/Comissão (T‑220/13, não publicado, EU:T:2016:484), e Ferracci/Comissão (T‑219/13, EU:T:2016:485) (a seguir «acórdão recorridos»), podem ser resumidos da seguinte forma.

8.        P. Ferracci é proprietário de um estabelecimento turístico‑hoteleiro tipo «Bed & Breakfast», composto por dois quartos; a Scuola Elementare Maria Montessori é um estabelecimento de ensino privado. No decurso dos anos 2006 e 2007, apresentaram denúncias à Comissão, alegando que, por um lado, a alteração do âmbito de aplicação do regime nacional relativo ao Imposta comunale sugli immobili (imposto municipal sobre imóveis, a seguir «ICI») decidida pela República Italiana, e, por outro, o artigo 149.o, n.o 4, do Testo unico delle imposte sui redditi (Texto único dos impostos sobre os rendimentos, a seguir «TUIR») constituíam auxílios de Estado incompatíveis com o mercado interno.

9.        A alteração do ICI pretendia, em substância, estabelecer que a isenção deste imposto, de que beneficiavam desde 1992 as entidades não comerciais que exerciam, nos imóveis que lhes pertenciam, exclusivamente atividades assistenciais, previdenciais, sanitárias, didáticas, de hospedagem, culturais, recreativas e desportivas, assim como a atividades religiosas e de culto, devia ser entendida no sentido de que também se aplicava às referidas atividades, «independentemente da sua natureza eventualmente comercial». O artigo 149.o, n.o 4, do TUIR previa, em substância, que, ao contrário de todas as outras entidades, as instituições religiosas reconhecidas como pessoas coletivas de direito civil e os clubes de desporto amador não estavam sujeitos aos critérios que previa para efeitos da determinação da perda de qualidade de entidade não comercial.

10.      Na sequência de alterações e de precisões introduzidas no ICI pelas autoridades italianas, a Comissão, numa carta de 15 de fevereiro de 2010, comunicou a P. Ferracci e à Scuola Elementare Maria Montessori que considerava, com base numa análise preliminar, que as medidas contestadas não aparentavam constituir auxílios de Estado, pelo que não havia necessidade de prosseguir a investigação. Em 26 de abril de 2010, P. Ferracci e a Scuola Elementare Maria Montessori interpuseram dois recursos no Tribunal Geral, registados com as referências T‑192/10 e T‑193/10, com vista à anulação da carta de 15 de fevereiro de 2010.

11.      Em 12 de outubro de 2010, a Comissão decidiu dar início ao procedimento formal de investigação na aceção do artigo 108.o, n.o 2, TFUE, relativo, por um lado, à isenção do ICI para as entidades não comerciais com fins específicos e, por outro, ao artigo 149.o, n.o 4, do TUIR. Através de dois despachos de 18 de novembro de 2010, o Tribunal Geral ordenou, a pedido de P. Ferracci e da Scuola Elementare Maria Montessori, que os processos T‑192/10 e T‑193/10 fossem cancelados do registo (10).

12.      Em 15 de fevereiro de 2012, as autoridades italianas indicaram à Comissão a sua intenção de adotar uma nova regulamentação em matéria de imposto municipal sobre os imóveis e anunciaram que a isenção do ICI seria substituída, a partir de 1 de janeiro de 2012, pela isenção prevista no novo regime relativo ao Imposta municipale unica (imposto municipal único, a seguir «IMU»). Esta nova regulamentação foi adotada em 19 de novembro de 2012.

13.      Em 19 de dezembro de 2012, a Comissão adotou a decisão controvertida. Nesta decisão começou por constatar que a isenção concedida às entidades não comerciais que exerciam atividades específicas do regime do ICI nos imóveis que lhes pertenciam constituía um auxílio de Estado incompatível com o mercado interno, a que a República Italiana tinha dado ilegalmente execução em violação do artigo 108.o, n.o 3, TFUE. Em seguida, a Comissão entendeu que, tendo em conta as particularidades do presente processo, era absolutamente impossível à República Italiana recuperar os auxílios ilegais, pelo que, na decisão controvertida, a Comissão não lhe ordenou que o fizesse. Por último, a Comissão considerou que nem o artigo 149.o, n.o 4, do TUIR nem a isenção prevista no novo regime do IMU constituíam auxílios de Estado na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE.

IV.    Tramitação processual no Tribunal Geral e acórdãos recorridos

14.      Por petições apresentadas na Secretaria do Tribunal Geral em 16 de abril de 2013, P. Ferracci e a Scuola Elementare Maria Montessori interpuseram, respetivamente, recursos de anulação da decisão controvertida na parte em que a Comissão constatou, por um lado, que era impossível às autoridades italianas recuperar os auxílios considerados ilegais e incompatíveis com o mercado interno (primeira parte da decisão controvertida) e, por outro, que nem o artigo 149.o, n.o 4, do TUIR nem a isenção prevista no novo regime do IMU constituíam auxílios de Estado (respetivamente, segunda e terceira partes da decisão controvertida).

15.      Por requerimentos apresentados na Secretaria do Tribunal Geral em 17 de julho de 2013, a Comissão suscitou exceções de inadmissibilidade, que o Tribunal Geral decidiu conhecer juntamente com a apreciação do mérito da causa, por despachos de 29 de outubro de 2014.

16.      Nos acórdãos recorridos, o Tribunal Geral declarou os dois recursos admissíveis nos termos do artigo 263.o, quarto parágrafo, último membro de frase, TFUE, por considerar que a decisão controvertida constituía um ato regulamentar que dizia diretamente respeito a P. Ferracci e à Scuola Elementare Maria Montessori e que não necessitava de medidas de execução. Quanto ao mérito, o Tribunal Geral negou provimento a ambos os recursos, rejeitando de forma sucessiva os quatro fundamentos respetivamente invocados por P. Ferracci e pela Scuola Elementare Maria Montessori, relativos a uma violação do artigo 14.o, n.o 1, do Regulamento n.o 659/1999, a uma violação do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, e a uma violação do dever de fundamentação.

V.      Pedidos das partes e tramitação do processo no Tribunal de Justiça

17.      Com o seu recurso no processo C‑622/16 P, a Scuola Elementare Maria Montessori pede que o Tribunal de Justiça se digne:

–        anular o acórdão do Tribunal Geral de 15 de setembro de 2016, Scuola Elemenatare Maria Montessori/Comissão (T‑220/13, não publicado, EU:T:2016:484), e, por conseguinte, anular a decisão controvertida na medida em que a Comissão decidiu não ordenar a recuperação do auxílio concedido mediante a isenção do ICI e considerou que as medidas relativas à isenção do IMU não estavam abrangidas pelo âmbito de aplicação do artigo 107.o, n.o 1, TFUE;

–        em quaisquer circunstâncias anular as partes desse acórdão relativas aos fundamentos do presente recurso que o Tribunal de Justiça julgue procedentes e admissíveis, e

–        condenar a Comissão nas despesas do processo em ambas as instâncias.

18.      A Comissão, apoiada pela República Italiana, conclui pedindo que o Tribunal de Justiça se digne:

–        negar provimento ao presente recurso na íntegra, e

–        condenar a recorrente nas despesas tanto do presente processo como do processo em primeira instância.

19.      Com os seus recursos nos processos C‑623/16 P e C‑624/16 P, a Comissão, apoiada pela República Italiana, pede que o Tribunal de Justiça se digne:

–        anular os acórdãos recorridos, na medida em que declaram admissíveis os recursos em primeira instância, com base no artigo 263.o, quarto parágrafo, último membro de frase, TFUE;

–        declarar os recursos em primeira instância inadmissíveis com base no artigo 263.o, quarto parágrafo, segundo e último membros de frase, TFUE, e, consequentemente, negar‑lhes provimento na íntegra;

–        condenar, respetivamente, P. Ferracci e a Scuola Elementare Maria Montessori no pagamento das despesas efetuadas pela Comissão tanto no processo no Tribunal Geral como no presente processo.

20.      A Scuola Elementare Maria Montessori conclui pedindo que o Tribunal de Justiça se digne:

–        negar provimento ao recurso interposto pela Comissão no processo C‑623/16 P e confirmar o acórdão do Tribunal Geral, na medida em que declara admissível o recurso por ela interposto;

–        condenar a Comissão nas despesas no presente processo.

21.      Por decisão do presidente do Tribunal de Justiça de 11 de abril de 2017, os processos C‑622/16 P a C‑624/16 P foram apensos para efeitos de uma eventual fase oral e do acórdão. As partes apresentaram os seus argumentos por escrito e oralmente na audiência de 6 de fevereiro de 2018.

VI.    Quanto aos presentes recursos

22.      Uma vez que os recursos da Comissão visam a apreciação, efetuada pelo Tribunal Geral, da admissibilidade dos recursos em primeira instância, examinarei em primeiro lugar esta questão. Abordarei, em segundo lugar, os fundamentos de recurso da Scuola Elementare Maria Montessori.

A.      Quanto à admissibilidade dos recursos interpostos por P. Ferracci e pela Scuola Elementare Maria Montessori no Tribunal Geral

23.      Para um recurso de anulação com fundamento no artigo 263.o, quarto parágrafo, último membro de frase, TFUE ser admissível deve ter por objeto um ato regulamentar que diga diretamente respeito ao recorrente e que não necessite de medidas de execução. A Comissão invoca um fundamento único nos seus recursos, segundo o qual o Tribunal Geral interpretou e aplicou erradamente cada um dos três requisitos.

1.      Quanto ao caráter regulamentar da decisão controvertida

24.      A decisão controvertida articula‑se em três partes. Na primeira parte, a Comissão constatou que a isenção concedida às entidades não comerciais que exerciam atividades específicas do regime do ICI nos imóveis que lhes pertenciam constituía um auxílio de Estado incompatível com o mercado interno, a que à República Italiana deu ilegalmente execução em violação do artigo 108.o, n.o 3, TFUE. No entanto, considerou que era impossível à República Italiana recuperar este auxílio. Na segunda e terceira partes, a Comissão considerou, respetivamente, que o artigo 149.o, n.o 4, do TUIR, e a isenção prevista no novo regime do IMU não constituíam auxílios de Estado na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE.

25.      Segundo a Comissão, o Tribunal Geral cometeu três erros de direito nos acórdãos recorridos ao qualificar a decisão controvertida de ato regulamentar (11). Em primeiro lugar, o Tribunal Geral considerou, incorretamente, que qualquer ato não legislativo de alcance geral é necessariamente um ato regulamentar. Em segundo lugar, o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao inferir o caráter regulamentar da decisão controvertida do alcance geral das medidas nacionais objeto dessa decisão. Em terceiro lugar e em todo caso, o Tribunal Geral não deveria ter considerado que cada uma destas três partes da decisão controvertida tinha alcance geral. Com efeito, a parte relativa à isenção do ICI, na medida em que tem por objeto a recuperação do auxílio concedido ao abrigo de tal isenção, diz respeito a um círculo fechado de pessoas.

a)      Quanto à equiparação do ato regulamentar na aceção do artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE ao ato não legislativo de alcance geral

26.      A Comissão não tem razão quando sugere que qualquer ato não legislativo de alcance geral não é necessariamente visado no artigo 263.o, quarto parágrafo, último membro de frase, TFUE.

27.      Com efeito, não é contestado que o Tratado de Lisboa aditou uma terceira parte ao artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE, que «flexibilizou os requisitos de admissibilidade dos recursos de anulação interpostos por pessoas singulares e coletivas» (12).

28.      Não obstante, o Tribunal de Justiça considerou que o conceito de «atos regulamentares» utilizado nessa disposição tinha um alcance mais limitado que o de «atos» que figura nas duas primeiras partes do artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE (13).

29.      Com base nas considerações recordadas nos dois números anteriores, o Tribunal de Justiça declarou que «a alteração do direito de recurso das pessoas singulares e coletivas previsto no quarto parágrafo do artigo 230.o CE tinha como objetivo permitir a essas pessoas a interposição, em condições menos restritivas, de recursos de anulação de atos de alcance geral, com exceção dos atos legislativos» (14). Daqui deduziu que «[o] Tribunal Geral concluiu, pois, com razão que o conceito de "atos regulamentares" previsto no quarto parágrafo do artigo 263.o TFUE não inclu[ía] os atos legislativos» (15).

30.      Para justificar esta interpretação restritiva, o Tribunal de Justiça baseou‑se nos trabalhos preparatórios do artigo III‑365, n.o 4, do Projeto de Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa (16). Ora, estes mesmos trabalhos não permitem estabelecer que outros atos de alcance geral devem ser excluídos do conceito de «atos regulamentares». A possibilidade de manter uma abordagem restritiva no que respeita ao recurso interposto por particulares encontra‑se aí expressamente limitada aos atos legislativos (17). Contrariamente ao que a Comissão alegou ainda na audiência de 6 de fevereiro de 2018, nada nos trabalhos preparatórios relativos ao artigo III‑365, n.o 4, do Projeto de Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa permite defender que as decisões em matéria de auxílios de Estado constituem, «por natureza», uma terceira categoria de atos de alcance geral à margem, por um lado, dos atos legislativos, e, por outro, dos atos regulamentares na aceção do artigo 263.o, quarto parágrafo, último membro de frase, TFUE.

31.      Além disso, contrariamente à distinção entre atos legislativos e atos não legislativos, a exclusão de determinados atos não legislativos de alcance geral do âmbito de aplicação do artigo 263.o, quarto parágrafo, último membro de frase, TFUE não se pode basear num critério processual (18). Ora, uma abordagem casuística é contrária à exigência de segurança jurídica que deve prevalecer sobre a interposição de um recurso judicial.

32.      Com efeito, da mesma forma que o Tribunal de Justiça reconheceu que o princípio da proteção jurisdicional efetiva implica que o particular deve poder decidir com pleno conhecimento de causa se é útil recorrer ao juiz (19), o particular deve estar em condições de determinar se o ato em causa pode ser diretamente impugnado perante o juiz da União com fundamento no artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE. Para o efeito, as categorias de atos impugnáveis devem necessariamente ser definidas e identificáveis de forma clara e precisa.

33.      Por conseguinte, entendo que o Tribunal Geral não cometeu um erro de direito ao considerar, nos acórdãos recorridos, que qualquer ato não legislativo de alcance geral é necessariamente um ato regulamentar.

b)      Quanto ao alcance geral da decisão controvertida

34.      Nos acórdãos recorridos, o Tribunal Geral considera que «a decisão [controvertida] reveste um âmbito geral no que diz respeito às suas três partes» (20). Partilho desta análise: qualquer interpretação contrária poria em causa a qualificação constante das decisões da Comissão relativas à compatibilidade de um regime de auxílios no âmbito do artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE, por oposição às decisões da Comissão relativas à compatibilidade de um auxílio individual.

35.      Sem dúvida, não é abusivo afirmar que o ato de alcance geral foi sempre definido como um ato aplicável a situações determinadas objetivamente e que comporta efeitos jurídicos em relação a categorias de pessoas consideradas de modo geral e abstrato (21).

36.      É certo que as decisões que a Comissão adota com fundamento no artigo 108.o, n.o 2, TFUE se dirigem a um Estado‑Membro específico. Todavia, já tive oportunidade de afirmar que partilho da reflexão da advogada‑geral J. Kokott segundo a qual uma decisão dirigida a um Estado‑Membro tem a particularidade de poder «configurar um ordenamento jurídico nacional e, deste modo, ter caráter geral» (22).

37.      Além disso, não é anódino constatar que o Conselho da União Europeia definiu os «[r]egimes de auxílios» no Regulamento n.o 659/1999 como «qualquer ato com base no qual, sem que sejam necessárias outras medidas de execução, podem ser concedidos auxílios individuais a empresas nele definidas de forma geral e abstrata e qualquer diploma com base no qual pode ser concedido a uma ou mais empresas um auxílio não ligado a um projeto específico, por um período de tempo indefinido e/ou com um montante indefinido» (23).

38.      Em especial, esta definição do «[r]egime de auxílios» que faz referência ao caráter geral e abstrato da definição das empresas em causa está igualmente no cerne de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça segundo a qual as decisões da Comissão que autorizam ou proíbem um regime de auxílios têm um alcance geral.

39.      Com efeito, a propósito das decisões que autorizam um regime de auxílios, o Tribunal de Justiça declarou que «o alcance geral da decisão impugnada […] result[ava] do facto de [que] esta decisão t[inha] por objeto autorizar um regime fiscal que se aplica a uma categoria de operadores definidos de modo geral e abstrato» (24). Quanto às decisões que proíbem um regime de auxílios, o Tribunal de Justiça tem considerado de forma constante que se apresentam, em relação a empresas que pertencem ao setor em causa e que são, potencialmente, beneficiários do regime de auxílio em causa «como […] medida[s] de alcance geral que se aplica[m] a situações determinadas objetivamente e que comporta[m] efeitos jurídicos em relação a uma categoria de pessoas consideradas de modo geral e abstrato» (25).

40.      Esta jurisprudência, desenvolvida no âmbito do requisito da afetação individual já presente no artigo 230.o CE, não foi posta em causa após a entrada em vigor do Tratado de Lisboa.

41.      Nomeadamente, foi por isso que, no Acórdão de 19 de dezembro de 2013, Telefónica/Comissão (C‑274/12 P, EU:C:2013:852), o Tribunal de Justiça considerou o artigo 1.o, n.o 1, da Decisão 2011/5/CE da Comissão, de 28 de outubro de 2009, relativa à amortização para efeitos fiscais da diferença relativamente ao valor do património (financial goodwill), em caso de aquisição de participações em empresas estrangeiras Processo C 45/07 (ex NN 51/07, ex CP 9/07), aplicada pela Espanha (26), uma disposição que «[se aplica] a situações determinadas objetivamente e produz efeitos jurídicos em relação a categorias de pessoas consideradas de modo geral e abstrato» (27).

42.      Observo igualmente que o Tribunal de Justiça não aceitou o convite da Comissão para proceder a uma substituição de fundamentos no processo que deu origem ao Despacho de 10 de outubro de 2017, Greenpeace Energy/Comissão (C‑640/16 P, não publicado, EU:C:2017:752), por o Tribunal Geral ter cometido um erro de direito «na medida em que, para concluir que a decisão controvertida não era um ato de alcance geral, não se havia contentado com o seu caráter de «decisão», mas tinha igualmente referido o facto de essa decisão ser relativa a um auxílio individual» (28).

43.      Ao não ter procedido à substituição solicitada nem condenado o raciocínio do Tribunal de Geral, o Tribunal de Justiça confirmou, implícita mas certamente, que o Tribunal Geral teve razão ao não se limitar ao facto de o ato impugnado ser uma decisão dirigida a um Estado‑Membro para lhe negar qualquer alcance geral.

44.      Para justificar a sua posição, a Comissão invocou o n.o 92 do Acórdão de 17 de setembro de 2015, Mory e o./Comissão (C‑33/14 P, EU:C:2015:609). Nos termos deste número, o Tribunal de Justiça declarou que «[c]omo a decisão controvertida, de que a República Francesa é destinatária, não constitu[ía] um ato regulamentar nos termos do artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE, visto que não é um ato de alcance geral […], importa[va] verificar se aquela decisão diz[ia] direta e individualmente respeito às recorrentes, na aceção desta disposição».

45.      Contrariamente ao que sugeria a Comissão, esta análise não podia ser generalizada. Com efeito, a decisão em causa tinha uma natureza específica, na medida em que constituía uma resposta da Comissão a uma questão precisa da República Francesa, relativa à obrigação de recuperação de auxílios de Estado individuais anteriormente considerados ilegais e incompatíveis com o mercado interno. Além disso, caso a referida decisão fosse equiparada a uma decisão da Comissão relativa à legalidade de um auxílio de Estado, teria, em todo caso, sido considerada uma decisão de alcance individual, uma vez que era «conexa e complementar» (29) à decisão inicial da Comissão, que tinha por objeto a concessão de auxílios a uma empresa determinada.

46.      Concluindo, uma vez que as decisões da Comissão que declaram um regime de auxílios compatível ou incompatível com o mercado comum com base no artigo 108.o, n.o 2, TFUE são consideradas medidas de alcance geral, constituem, a este título, atos regulamentares na aceção do artigo 263.o, quarto parágrafo, último membro de frase, TFUE (30).

47.      Por outro lado, contrariamente ao que foi alegado pela Comissão na audiência de 6 de fevereiro de 2018, o facto de a primeira parte da decisão controvertida ser relativa a um auxílio de Estado que já não está em vigor e cujos beneficiários constituem, consequentemente, um círculo fechado em nada afeta o seu alcance geral. Com efeito, a qualificação do caráter geral e abstrato de uma norma não depende da possibilidade de identificar, no âmbito da sua aplicação, um número determinado de destinatários mas a forma como estes são considerados pelo autor da norma (31). O teste decisivo é o do objeto do ato: uma norma terá alcance individual ou geral consoante tenha sido adotada para regular casos individuais ou situações objetivas (32). Ora, na hipótese de uma decisão relativa a um regime de auxílios — mesmo que revogado ou substituído no momento da adoção da decisão da Comissão —, o objeto do ato consiste efetivamente em regular situações objetivas definidas em termos abstratos e não casos individuais identificados a priori.

48.      Assim, é efetivamente através da medida nacional objeto da decisão da Comissão que o alcance geral desta pode, e deve, ser determinado. De resto, uma interpretação contrária conduziria a uma incoerência fundamental na aplicação das diferentes partes do artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE. Com efeito, sob pena de abandonar a jurisprudência relativa à qualificação das decisões da Comissão em matéria de auxílios de Estado desenvolvida no âmbito do exame da afetação individual (33), o alcance individual ou geral das decisões adotadas pela Comissão em matéria de auxílios de Estado poderia variar — em relação a um único e mesmo recorrente! — consoante estivesse a apreciar a admissibilidade do recurso de anulação com fundamento na segunda ou na terceira parte do artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE. De facto, neste último caso, a decisão da Comissão é um ato de alcance individual, ao passo que, no âmbito da segunda parte — que pode ser sempre invocada a título subsidiário por um recorrente —, a mesma decisão tem um alcance geral.

49.      Além disso, esta distinção no alcance do ato é, no mínimo, paradoxal. Enquanto o objetivo prosseguido pela terceira parte do artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE consistia em permitir a interposição de um recurso de anulação em condições de admissibilidade menos restritivas, a nova disposição não é aplicável às decisões da Comissão em matéria de auxílios de Estado devido ao facto de o Tribunal de Justiça ter recusado reconhecer‑lhes o alcance geral que, no entanto, lhes concedia anteriormente ao Tratado de Lisboa.

50.      Tendo em consideração as razões expostas nas presentes conclusões, entendo, consequentemente, que o Tribunal Geral não cometeu um erro de direito ao inferir o caráter regulamentar da decisão controvertida do alcance geral das medidas nacionais objeto dessa decisão.

2.      Quanto à afetação direta

51.      O requisito relativo à afetação direta já estava presente no artigo 230.o CE. O seu alcance não se alterou após a entrada em vigor do Tratado de Lisboa. «[R]equer a reunião de dois critérios cumulativos, a saber, que a medida contestada, em primeiro lugar, produza diretamente efeitos na situação jurídica do particular e, em segundo lugar, não deixe nenhum poder de apreciação aos seus destinatários, que estão encarregados da sua execução, tendo esta caráter puramente automático e decorrendo apenas da regulamentação da União, sem aplicação de outras regras intermédias» (34).

52.      O segundo requisito que determina a afetação direta não é contestado. Como declarou, acertadamente, o Tribunal Geral, a decisão controvertida produz os seus efeitos jurídicos de forma puramente automática ao abrigo unicamente da regulamentação da União e sem aplicação de outras regras intermédias (35).

53.      Em contrapartida, a Comissão considera que o Tribunal Geral concluiu erradamente pela afetação direta de P. Ferracci e da Scuola Elementare Maria Montessori visto estes não terem demonstrado que a decisão controvertida produzia um efeito «concreto e tangível» sobre a sua situação. Entende que não basta demonstrar que o ato impugnado produz um efeito «teórico e potencial» sobre o mercado do concorrente do beneficiário do auxílio em causa para que diga «diretamente respeito», na aceção do artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE, a esse concorrente.

54.      Esta interpretação parece‑me conduzir a uma confusão entre os dois requisitos previstos no artigo 263.o, quarto parágrafo, segundo membro de frase, TFUE, ou seja, por um lado, a afetação direta e, por outro, a afetação individual.

55.      Com efeito, para que um ato de alcance geral ou uma decisão de que não são destinatárias lhes diga individualmente respeito, as pessoas que interpõem um recurso de anulação devem demonstrar que o ato impugnado «as afet[a] devido a certas qualidades que lhes são próprias ou a uma situação de facto que as caracteriza em relação a qualquer outra pessoa» (36).

56.      Em matéria de auxílios de Estado, este requisito é entendido no sentido de que incumbe ao recorrente demonstrar que a sua posição no mercado em causa é «substancialmente afetada pelo auxílio objeto da decisão em causa» (37). Assim, não basta que uma empresa invoque unicamente a sua qualidade de concorrente em relação à empresa beneficiária para se considerar que essa decisão lhe diz individualmente respeito (38). É, por conseguinte, graças a este requisito que o Tribunal de Justiça verifica os efeitos «concretos e tangíveis» da norma impugnada na situação do recorrente.

57.      Se tivesse de sintetizar ao máximo a diferença entre os dois requisitos previstos no artigo 263.o, quarto parágrafo, segundo membro de frase, TFUE, diria que a afetação direta visa a situação jurídica do recorrente — a medida contestada «deve produz[ir] diretamente efeitos na situação jurídica do [particular]» (39) —, ao passo que a afetação individual respeita à situação factual do recorrente — a medida é‑lhe aplicável devido «a uma situação de facto que [o] caracteriza em relação a qualquer outra pessoa» (40).

58.      Ora, ao exigir ao recorrente a apresentação da prova de um «efeito concreto e tangível» sobre a sua situação para demonstrar que o ato impugnado lhe diz diretamente respeito, a Comissão oscila na apreciação factual da situação. Dessa forma, desvirtua o requisito da afetação direta. Introduz na terceira parte do artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE um requisito que o constituinte não contemplou, e isso com um objetivo de flexibilização dos requisitos de admissibilidade do recurso de anulação (41). Por conseguinte, tal perversão do requisito relativo à afetação direta não pode, em meu entender, ser seguida.

59.      A Comissão fundamenta a sua argumentação nos Acórdãos de 28 de abril de 2015, T & L Sugars e Sidul Açúcares/Comissão (C‑456/13 P, EU:C:2015:284) e de 17 de setembro de 2015, Confederazione Cooperative Italiane e o./Anicav e o. (C‑455/13 P, C‑457/13 P e C‑460/13 P, não publicado, EU:C:2015:616).

60.      No processo T & L Sugars e Sidul Açúcares/Comissão (C‑456/13 P, EU:C:2015:284), as recorrentes eram empresas de refinação de açúcar de cana importado. O Tribunal de Justiça declarou que os atos impugnados não lhes diziam diretamente respeito, uma vez que eram aplicados apenas aos produtores de açúcar europeus. No processo Confederazione Cooperative Italiane e o./Anicav e o. (C‑455/13 P, C‑457/13 P e C‑460/13 P, não publicado, EU:C:2015:616), as recorrentes eram transformadores industriais de frutas. Ora, as disposições impugnadas aplicavam‑se unicamente às frutas e aos legumes transformados pelas organizações de produtores. Em tais circunstâncias, o Tribunal de Justiça declarou que o simples facto de se ser colocado numa situação concorrencial desvantajosa em razão das disposições impugnadas não era suficiente para considerar que as recorrentes eram afetadas na sua situação jurídica.

61.      Pelos motivos referidos nos n.os 54 a 58 das presentes conclusões, estas aplicações particularmente severas do requisito relativo à afetação direta devem ser limitadas às circunstâncias específicas dos processos T & L Sugars e Sidul Açúcares/Comissão (C‑456/13 P, EU:C:2015:284), e Confederazione Cooperative Italiane e o./Anicav e o (C‑455/13 P, C‑457/13 P e C‑460/13 P, não publicado, EU:C:2015:616). Com efeito, embora, contrariamente ao que entendeu o Tribunal Geral nos acórdãos recorridos, possa parecer artificial considerar que as recorrentes nos processos T & L Sugars e Sidul Açúcares/Comissão e Confederazione Cooperative Italiane e o./Anicav e o., acima referidos, não estavam presentes nos mesmos mercados que os «produtores» referidos pelas disposições impugnadas, não deixa de ser verdade que as regulamentações impugnadas apenas produziam diretamente os seus efeitos sobre a situação jurídica de tais produtores, o que as recorrentes não eram. Só os referidos produtores estavam abrangidos pelo âmbito de aplicação dos atos impugnados.

62.      Em contrapartida, no âmbito de um recurso de uma decisão da Comissão em matéria de auxílios de Estado, não vejo razão para invalidar a jurisprudência do Tribunal Geral — estabelecida com fundamento nos Acórdãos do Tribunal de Justiça de 17 de janeiro de 1985, Piraiki‑Patraiki e o./Comissão (11/82, EU:C:1985:18, n.os 6 a 10), e de 28 de janeiro de 1986, Cofaz e o./Comissão (169/84, EU:C:1986:42, n.o 30) — segundo a qual uma decisão de autorização da Comissão diz diretamente respeito ao concorrente do beneficiário de um auxílio quando este já foi concedido ou quando a vontade do Estado‑Membro de fornecer este auxílio não suscita qualquer dúvida (42).

63.      Neste contexto, considero que o Tribunal Geral não cometeu um erro de direito ao concluir que as medidas visadas pela decisão controvertida afetavam as situações jurídicas de P. Ferracci e da Scuola Elementare Maria Montessori e lhes diziam diretamente respeito.

3.      Quanto à existência de medidas de execução

64.      Importa recordar que a decisão controvertida se articula em três partes. Na primeira parte, a Comissão decidiu que a isenção concedida às entidades não comerciais que exercem, nos imóveis que lhes pertencem, atividades específicas do regime do ICI constituía um auxílio de Estado incompatível com o mercado interno, à qual foi dada ilegalmente execução. No entanto, não exigiu a sua recuperação. Na segunda e terceira partes, considerou, respetivamente, que o artigo 149.o, n.o 4, do TUIR e a isenção prevista no novo regime do IMU não constituíam auxílios de Estado na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE.

65.      Segundo a Comissão, esta decisão necessita de medidas de execução na aceção do artigo 263.o, quarto parágrafo, último membro de frase, TFUE, uma vez que os recorrentes poderiam ter pedido para beneficiar do tratamento fiscal reservado aos seus alegados concorrentes e intentar uma ação no órgão jurisdicional nacional contra uma recusa da administração, contestando a validade da decisão controvertida nessa ocasião (43).

66.      Reconheço que esta conclusão se insere na lógica do Acórdão de 19 de dezembro de 2013, Telefónica/Comissão (C‑274/12 P, EU:C:2013:852).

67.      Com efeito, o Tribunal de Justiça considerou então que a disposição de uma decisão da Comissão que tem por objeto declarar a incompatibilidade com o mercado comum de um regime de auxílios não define as consequências específicas que essa declaração terá para cada um dos contribuintes. Segundo o Tribunal de Justiça, «[estas] consequências […] [materializar‑se‑ão] em atos administrativos como um aviso de cobrança, o qual constitui, enquanto tal, uma medida de execução […] na aceção do último membro de frase do quarto parágrafo do artigo 263.o TFUE» (44). Foi por isso que o Tribunal de Justiça considerou que o Tribunal Geral tinha tido razão ao declarar que «as medidas que visam pôr em prática a decisão de incompatibilidade, entre as quais a que consiste designadamente em indeferir um pedido de benefício da vantagem fiscal em causa, indeferimento que a recorrente também pode impugnar perante o juiz nacional, são medidas de execução da decisão controvertida» (45).

68.      Tal raciocínio não pode, aparentemente, ser aplicado nos presentes recursos, pelas razões que se seguem.

69.      Por um lado, o auxílio em causa na primeira parte da decisão controvertida não tem de ser recuperado pela República Italiana. Esta primeira parte da decisão controvertida não necessita, assim, de nenhuma medida de execução; é definitiva e autossuficiente.

70.      Por outro lado, contrariamente à recorrente no processo que deu origem ao Acórdão de 19 de dezembro de 2013, Telefónica/Comissão (C‑274/12 P, EU:C:2013:852), P. Ferracci e a Scuola Elementare Maria Montessori não são elegíveis para o benefício do auxílio em causa, mas potenciais concorrentes dos beneficiários desse auxílio (46). Ora, o Tribunal de Justiça declarou que, para apreciar se um ato regulamentar necessita de medidas de execução, se tinha de considerar exclusivamente a posição da pessoa que invoca o direito de recurso nos termos do último membro de frase do quarto parágrafo do artigo 263.o TFUE (47).

71.      Nesta perspetiva, importa reconhecer que nenhum ato «adotado em execução» da decisão controvertida será aplicável às situações de P. Ferracci e da Scuola Elementare Maria Montessori. Imaginar que possam pedir a concessão de um auxílio que sabem perfeitamente não lhes poderá ser concedido, apenas com o objetivo de contestar a decisão de indeferimento num tribunal, afigura‑se totalmente artificial.

72.      Aliás, a este respeito não compreendo o impacto que poderia ter a diferença existente entre um regime de auxílios ilegal, mas que não tem de ser recuperado (primeira parte da decisão controvertida), e um regime de auxílios considerado legal, mas do qual os recorrentes não são, de qualquer forma, beneficiários (segunda e terceira partes da decisão controvertida). Como não duvidar, tanto num caso como noutro, da efetividade real de uma construção teórica baseada na existência de um ato sem outra justificação que não poder ser impugnado judicialmente (48)?

73.      A este propósito, talvez não seja inútil recordar que a origem do artigo 263.o, quarto parágrafo, último membro de frase, TFUE se encontra na afirmação do Tribunal de Justiça segundo a qual não está garantida uma proteção jurisdicional efetiva quando um particular não tem outra opção se não infringir o direito a fim de levar a autoridade nacional competente a adotar um ato de execução que o obrigue a defender‑se perante um órgão jurisdicional que pode, então, submeter uma questão prejudicial (49).

74.      Aliás, o Tribunal de Justiça reconheceu expressamente que «importa[va] interpretar o conceito de “atos regulamentares […] que não necessitam de medidas de execução”, na aceção do último membro de frase do quarto parágrafo do artigo 263.o TFUE, à luz do objetivo desta disposição, que consiste, como resulta da sua origem, em evitar que um particular seja obrigado a violar as regras de direito para poder aceder ao juiz» (50).

75.      Ora, embora, formalmente, P. Ferracci e a Scuola Elementare Maria Montessori não estivessem a cometer uma infração ao pedir a concessão de um auxílio que não lhes era destinado, viam‑se, não obstante, obrigados a adotar um comportamento que, com toda a certeza, estava condenado ao fracasso, apenas para poderem aceder ao juiz. Tal situação não é diametralmente oposta, na sua filosofia, à situação que justificou a alteração do artigo 230.o CE.

76.      Os processos relativos ao regime dinamarquês de tributação do jogo invocados pela Comissão no Tribunal Geral em apoio dos seus recursos não são suscetíveis de alterar esta abordagem(51).

77.      A Comissão considerou esse regime compatível com o mercado interno na aceção do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE. No âmbito dos recursos dessa decisão da Comissão, o Tribunal de Justiça declarou que a mesma «apenas produz os seus efeitos jurídicos em relação [aos] recorrente[s] por intermédio [da] medida legislativa nacional [que tinha adiado a entrada em vigor do regime controvertido até que a Comissão adotasse a sua decisão final], assim como dos avisos de cobrança que serão adotados com fundamento nesta decisão, os quais materializarão as consequências específicas que a declaração de compatibilidade que figura na referida decisão implica para cada um dos contribuintes, entre os quais [os] recorrente[s]» (52).

78.      Nos acórdãos recorridos, o Tribunal Geral considerou que as situações não eram comparáveis, uma vez que o dispositivo da decisão da Comissão em causa nos processos relativos ao regime dinamarquês de tributação do jogo previa a adoção de disposições de implementação da medida notificada, em particular após a adoção desta (53).

79.      Independentemente da pertinência desta apreciação, existe uma diferença fundamental entre o regime dinamarquês de tributação do jogo e as disposições italianas em causa nos presentes recursos. Com efeito, o regime dinamarquês não instaurava em caso algum uma isenção de imposto a favor de determinados prestadores. Pelo contrário, a lei nacional relativa aos impostos sobre o jogo previa todas as diferentes taxas de imposto aplicáveis, incluindo aquelas — mais elevadas — aplicáveis às empresas que impugnavam a decisão da Comissão (54).

80.      Por conseguinte, numa situação deste tipo, não estava errado considerar que os avisos de cobrança adotados com fundamento na lei nacional são medidas de execução de que a decisão da Comissão «necessita». Esses avisos materializarão as consequências da decisão da Comissão e poderão, sem dificuldade nem artificio, ser impugnados no tribunal nacional.

81.      Por todos estes motivos, considero que o Tribunal Geral não cometeu um erro de direito ao concluir que a decisão controvertida não necessitava de medidas de execução em relação a P. Ferracci e à Scuola Elementare Maria Montessori.

4.      Conclusão quanto à admissibilidade dos recursos interpostos por P. Ferracci e pela Scuola Elementare Maria Montessori no Tribunal Geral

82.      Atendendo ao exposto, considero que a decisão controvertida é efetivamente um ato regulamentar que não necessita de medidas de execução em relação a P. Ferracci e à Scuola Elementare Maria Montessori e que lhe diz diretamente respeito.

83.      Por conseguinte, uma vez que o fundamento único dos recursos invocado pela Comissão é improcedente, considero que se deve negar provimento aos recursos da Comissão.

84.      Como a admissibilidade dos recursos interpostos por P. Ferracci e pela Scuola Elementare Maria Montessori deve ser confirmada, há que apreciar o recurso interposto por esta última, que diz respeito ao mérito do recurso.

B.      Quanto ao mérito do recurso interposto pela Scuola Elementare Maria Montessori no Tribunal Geral

85.      A Scuola Elementare Maria Montessori invoca dois fundamentos de recurso contra o Acórdão de 15 de setembro de 2016, Scuola Elementare Maria Montessori/Comissão (T‑220/13, não publicado, EU:T:2016:484, a seguir «acórdão recorrido»). O primeiro fundamento tem por objeto a apreciação do Tribunal Geral relativa à falta de uma ordem de recuperação dos auxílios considerados ilegais e incompatíveis com o mercado interno (primeira parte da decisão controvertida). O segundo fundamento visa o acórdão recorrido na medida em que o Tribunal Geral declarou que a isenção do IMU não constituía um auxílio de Estado na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE (terceira parte da decisão controvertida).

1.      Quanto ao primeiro fundamento, relativo à falta de uma ordem de recuperação

a)      Argumentação das partes

86.      O primeiro fundamento divide‑se em quatro partes.

87.      Em primeiro lugar, a Scuola Elementare Maria Montessori alega que o Tribunal Geral violou o artigo 108.o TFUE, o artigo 14.o, n.o 1, do Regulamento n.o 659/1999 e o artigo 4.o, n.o 3, TFUE, ao permitir que a Comissão declarasse que existia uma impossibilidade absoluta de proceder à recuperação de auxílios ilegais na fase do procedimento formal de investigação. A impossibilidade absoluta de recuperar auxílios ilegais não constitui um princípio geral de direito na aceção do artigo 14.o, n.o 1, do Regulamento n.o 659/1999.

88.      Em segundo lugar, a Scuola Elementare Maria Montessori contesta a interpretação do conceito de «impossibilidade absoluta» adotada pelo Tribunal Geral no acórdão recorrido. O Tribunal Geral apoiou‑se exclusivamente nas bases de dados cadastrais e fiscais italianas, que não permitiam extrapolar, com efeitos retroativos, os dados necessários para a recuperação. Ora, estes elementos fazem parte da ordem jurídica interna e não podem, assim, fundamentar a impossibilidade absoluta da recuperação dos auxílios.

89.      Em terceiro lugar, o acórdão recorrido assenta numa interpretação errada do conceito de «impossibilidade absoluta», na medida em que o Tribunal Geral julgou improcedentes as alegações da Scuola Elementare Maria Montessori relativas à existência de modalidades alternativas que permitiriam à República Italiana recuperar o auxílio em causa independentemente da estrutura das bases de dados cadastrais e fiscais. O Tribunal Geral inverteu igualmente o ónus da prova ao exigir à Scuola Elementare Maria Montessori a demonstração da possibilidade de recuperar os auxílios.

90.      Em quarto lugar, a Scuola Elementare Maria Montessori acusa o Tribunal Geral de desvirtuação dos elementos de prova ao declarar que era impossível inferir das bases de dados cadastrais e fiscais as informações necessárias para a recuperação dos auxílios em causa.

91.      A Comissão contrapõe, em primeiro lugar, que a falta de uma ordem de recuperação dos auxílios ilegais na decisão controvertida é conforme ao artigo 14.o, n.o 1, do Regulamento n.o 659/1999, que proíbe a Comissão de ordenar a recuperação quando esta é contrária a um princípio geral de direito. Ora, segundo o princípio geral de direito de que ninguém está obrigado ao impossível, a Comissão não pode impor uma obrigação cuja execução é, desde a sua origem e de forma objetiva e absoluta, impossível de realizar.

92.      Em segundo lugar, a Comissão alega que a Scuola Elementare Maria Montessori confunde os conceitos de «força maior» e de «impossibilidade absoluta». O segundo conceito é mais amplo que o primeiro e abrange situações que nada têm de imprevisível nem de anormal, tais como a liquidação da empresa beneficiária.

93.      Em terceiro lugar, a argumentação relativa à existência de métodos alternativos para recuperar o auxílio em causa assenta na alegação, errada, de que a Scuola Elementare Maria Montessori provou a existência de tais métodos. O Tribunal Geral rejeitou os argumentos relativos à prova dessa existência. Na medida em que a Scuola Elementare Maria Montessori contesta essa rejeição, põe em causa apreciações factuais, que não podem ser objeto de recurso.

94.      Em quarto lugar, o argumento respeitante à desvirtuação dos elementos de prova é inadmissível, uma vez que a Scuola Elementare Maria Montessori se limita a pedir ao Tribunal de Justiça para apreciar as provas diferentemente do Tribunal Geral.

b)      Análise

95.      Na realidade, as duas primeiras partes do primeiro fundamento desenvolvidas pela Scuola Elementare Maria Montessori impõem que se responda a três questões que se sucedem logicamente:

–        Antes de mais, pode a Comissão renunciar, a priori, a ordenar a recuperação de um auxílio que considera ilegal e incompatível com o mercado interno?

–        Seguidamente, em caso de resposta afirmativa a esta primeira questão, é possível identificar no caso em apreço um dos fundamentos suscetíveis de justificar a falta de uma ordem de recuperação?

–        Por último, em caso de resposta afirmativa a esta segunda questão, o Tribunal Geral cometeu um erro de direito na aplicação do fundamento assim identificado?

1)      Quanto à possibilidade de a Comissão não ordenar a recuperação de um auxílio ilegal

96.      No que respeita à primeira questão, considero que a Comissão pode decidir, logo na fase do procedimento formal de investigação de um regime de auxílios, não ordenar a recuperação de auxílios considerados ilegais.

97.      Após ter recordado que a supressão de um auxílio ilegal através de recuperação é a consequência lógica da constatação da sua ilegalidade (55), o Tribunal Geral explica, no n.o 75 do acórdão recorrido, que «as disposições do Tratado em matéria de auxílios de Estado têm por finalidade o restabelecimento de uma concorrência efetiva, pelo que, em princípio, as decisões da Comissão impõem ao Estado‑Membro em causa a obrigação de obter efetivamente, e sem demora, a restituição dos auxílios em causa» (56).

98.      Não vejo aí qualquer erro de direito. Com efeito, parece‑me correto ver na ordem de recuperar auxílios ilegais um princípio que, por definição, pode ser acompanhado de exceções.

99.      A jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa ao papel dos órgãos jurisdicionais nacionais na aplicação do sistema de controlo dos auxílios de Estado confirma esta análise. Com efeito, ao afirmar que «o principal objetivo visado pela recuperação de um auxílio de Estado concedido ilegalmente é eliminar a distorção da concorrência provocada pela vantagem concorrencial proporcionada por esse auxílio» (57), o Tribunal de Justiça já teve a oportunidade de precisar que «[s]ó se se verificarem circunstâncias excecionais é que poderá ser inadequado ordenar o reembolso do auxílio» (58). Desta forma, o Tribunal de Justiça já reconheceu a possibilidade, é certo excecional, de derrogar o princípio segundo o qual se deve ordenar a recuperação de um auxílio ilegal.

100. Aliás, esta ideia é expressamente reproduzida no artigo 14.o, n.o 1, do Regulamento n.o 659/1999, que prevê que «[a] Comissão não deve exigir a recuperação do auxílio se tal for contrário a um princípio geral de direito comunitário».

101. Desta forma, para reproduzir os termos do Tribunal de Justiça, «a Comissão está sempre obrigada a ordenar a recuperação de um auxílio que declara incompatível com o mercado comum, exceto se tal recuperação for contrária a um princípio geral do direito da União» (59).

102. Consequentemente, embora ocorra a título excecional, a possibilidade de não ordenar a recuperação de um auxílio ilegal na fase do procedimento formal de investigação aparentemente não suscita dúvidas.

103. Por conseguinte, há que abordar a segunda questão colocada pelo primeiro fundamento da Scuola Elementare Maria Montessori e identificar o princípio geral de direito que pode ter justificado a falta de uma ordem de recuperação na decisão controvertida.

2)      Quanto à existência de um princípio geral do direito da União que justifique, no caso em apreço, a falta de uma ordem de recuperação dos auxílios considerados ilegais

104. No acórdão recorrido, o Tribunal Geral considerou que «a Comissão não [tinha cometido] um erro de direito quando constatou, logo na fase do procedimento formal de investigação e antes de adotar uma ordem de recuperação, a impossibilidade absoluta de a República Italiana recuperar os auxílios considerados ilegais na decisão [controvertida]» (60).

105. Segundo a Comissão, os argumentos que a República Italiana desenvolveu para chegar a tal conclusão inserem‑se no âmbito do princípio «impossibilium nulla obligatio est», que pode ser traduzido pela fórmula «ninguém está obrigado ao impossível» (61). A Comissão vislumbra aí a expressão de um princípio geral do direito da União.

106. Antes de mais, observo que embora esta fórmula possa ter sido qualificada como «máxima» (62) ou simples «adágio» (63) por alguns dos meus antecessores, o próprio Tribunal de Justiça qualificou‑a recentemente como «princípio» (64). De resto, ainda mais recentemente, utilizou‑a para justificar a interpretação de uma disposição do direito da União (65).

107. Em seguida, se os princípios gerais do direito da União podem ser definidos como disposições fundamentais do direito primário não escrito que são inerentes à ordem jurídica da União (66), o princípio «impossibilium nulla obligatio est» pode ter esta qualificação quando aplicado ao domínio dos auxílios de Estado.

108. Este reconhecimento é coerente com o facto de a validade de uma decisão da Comissão relativa à recuperação de um auxílio de Estado declarado ilegal estar sujeito à possibilidade de recuperar o auxílio em causa. Com efeito, segundo o Tribunal de Justiça, «a impossibilidade absoluta [de recuperar o auxílio ilegal] não pode invalidar a decisão impugnada, uma vez que essa impossibilidade só surge na fase da execução. […] Em contrapartida, a Comissão não poderia impor, através de uma decisão como a decisão impugnada, sob pena da sua invalidade, uma obrigação cuja execução seria, desde o início, objetiva e absolutamente impossível de realizar» (67).

109. O reconhecimento deste princípio geral é igualmente coerente com a jurisprudência do Tribunal de Justiça segundo a qual um Estado‑Membro que, «na execução de uma decisão da Comissão em matéria de auxílios de Estado, […] tome consciência de consequências não previstas pela Comissão, deve submeter esses problemas à apreciação desta última, propondo modificações apropriadas à decisão em causa» (68). Esta obrigação do Estado‑Membro sugere necessariamente que se a Comissão tivesse tido consciência das consequências da sua decisão — como uma impossibilidade de recuperar os auxílios ilegais — poderia e deveria tê‑las em conta na fase da decisão. Caso contrário, não haveria razão para impor ao Estado‑Membro que delas se aperceba o dever de informar a Comissão para que, se necessário, esta possa alterar a sua decisão.

110. Tendo em consideração o exposto, o princípio «impossibilium nulla obligatio est», entendido como uma impossibilidade absoluta de recuperação, corresponde a uma disposição não escrita fundamental inerente ao direito dos auxílios de Estado da União. Assim, o referido princípio pode ser qualificado como princípio geral do direito da União na aceção do artigo 14.o, n.o 1, do Regulamento n.o 659/1999.

3)      Quanto à aplicação, pelo Tribunal Geral, do princípio «impossibilium nulla obligatio est»

111. Uma vez que o princípio «impossibilium nulla obligatio est» pode ser considerado um princípio geral do direito da União na aceção do artigo 14.o, n.o 1, do Regulamento n.o 659/1999, importa verificar se o Tribunal Geral não cometeu um erro de direito quando declarou que a própria Comissão não tinha cometido um erro deste tipo ao considerar que as bases de dados cadastrais e fiscais não permitiam identificar os beneficiários dos auxílios em causa, e que, por conseguinte, era impossível obter a recuperação dos auxílios ilegais (69).

112. Com a segunda parte do primeiro fundamento do seu recurso, a Scuola Elementare Maria Montessori contesta esta conclusão do Tribunal Geral: os elementos invocados pelo Governo italiano fazem parte da ordem jurídica interna e, assim, não podem fundamentar a impossibilidade absoluta da recuperação dos auxílios.

113. O conceito de «impossibilidade absoluta» foi desenvolvido pelo Tribunal de Justiça no âmbito do acompanhamento da execução das decisões da Comissão em matéria de auxílios de Estado. Nos termos de jurisprudência constante, «o único meio de defesa suscetível de ser invocado por um Estado‑Membro no quadro de uma ação por incumprimento intentada pela Comissão nos termos do artigo 108.o, n.o 2, TFUE é a impossibilidade absoluta de executar corretamente a decisão daquela instituição que ordena a recuperação do auxílio em questão» (70).

114. Todavia, importa referir que, embora o fundamento de defesa exista em teoria, atualmente apenas é reconhecido numa hipótese específica. Trata‑se do caso em que as empresas beneficiárias dos auxílios em causa foram liquidadas sem deixar ativos recuperáveis (71); a simples alegação da difícil situação financeira da empresa ou afirmações gerais e abstratas relativas à cessão das atividades de algumas empresas são, por outro lado, consideradas insuficientes para responder às exigências da impossibilidade absoluta de recuperação (72). Pelo contrário, no caso das empresas que cessaram a sua atividade, «só se pode considerar […] que existe uma impossibilidade absoluta de execução em função de circunstâncias específicas de cada uma [das empresas em causa]» (73).

115. Em seguida, também é certo que o requisito de uma impossibilidade absoluta de execução não está preenchido quando o Estado‑Membro se limita a comunicar à Comissão as dificuldades jurídicas, políticas ou práticas que a execução da decisão suscitava, sem fazer nenhuma verdadeira diligência junto das empresas em causa para obter a recuperação do auxílio e sem propor à Comissão modalidades alternativas para aplicação da decisão, que teriam permitido ultrapassar as dificuldades. A importância e a estabilidade desta rejeição não suscitam qualquer dúvida (74).

116. De forma mais precisa, saliento que o Tribunal de Justiça já teve oportunidade de declarar que as dificuldades relativas à identificação dos beneficiários devido a uma lacuna na lei aplicável ou relativas ao cálculo do montante dos auxílios a recuperar, assim como à escolha e à execução dos procedimentos de recuperação eram dificuldades internas imputáveis à própria atuação ou às omissões das autoridades nacionais (75). De igual modo, o grande número de empresas em causa também não permite considerar que a recuperação é tecnicamente impossível de realizar (76).

117. Ora, no caso em apreço, há que constatar que os argumentos invocados pelo Governo italiano e aceites pela Comissão são dessa natureza.

118. Com efeito, como refere o Tribunal Geral no n.o 76 do acórdão recorrido, «[n]a decisão [controvertida], a Comissão indicou, nos considerandos 191 a 198, que, à luz da especificidade do presente processo, seria absolutamente impossível à República Italiana proceder à recuperação dos eventuais auxílios ilegalmente concedidos no âmbito das disposições do ICI. Em substância, explicou que nem as bases de dados cadastrais nem as bases de dados fiscais permitiam recensear o tipo de atividade (económica ou não económica) exercida nos imóveis pertencentes às entidades não comerciais, nem calcular objetivamente o montante do imposto a recuperar».

119. No n.o 85 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral repete que «a República Italiana explicou que, devido à estrutura do cadastro e à inexistência de informações fiscais pertinentes, era impossível extrapolar, com efeitos retroativos, a partir das bases de dados cadastrais e fiscais, o tipo de dados necessários para pôr em prática a recuperação do alegado auxílio. À luz destas explicações, a Comissão considerou que, com efeito, era impossível identificar os beneficiários do auxílio em causa e este último não podia ser calculado de forma objetiva por não haver dados disponíveis, o que explicou na decisão [controvertida]».

120. Estes argumentos, relativos aos dados cadastrais e aos dados fiscais, são semelhantes aos que foram invocados pela República francesa no processo que deu origem ao Acórdão de 13 de novembro de 2008, Comissão/França (C‑214/07, EU:C:2008:619), que respeitava igualmente a uma isenção fiscal (77).

121. Ora, contrariamente ao Governo francês, que alegava que se tratava de limitações externas relacionadas com a amplitude e a complexidade do exercício da recuperação, o Tribunal de Justiça considerou que se tratava de dificuldades internas imputáveis à própria atuação e às omissões das autoridades nacionais (78). Muito recentemente, o Tribunal de Justiça precisou mesmo que «o receio de dificuldades internas, mesmo insuperáveis, relacionadas, nomeadamente, com a verificação da situação de cada empresa interessada relativamente à recuperação dos auxílios ilegais […] não pode justificar que um Estado‑Membro não respeite as obrigações que lhe incumbem por força do direito da União» (79).

122. Por conseguinte, o Tribunal Geral cometeu um erro de direito quando concluiu, no n.o 87 do acórdão recorrido, com base em elementos relacionados unicamente com as lacunas dos dados cadastrais e fiscais, que «a Comissão não [tinha cometido] um erro de direito quando constatou, logo na fase do procedimento formal de investigação e antes de adotar uma ordem de recuperação, a impossibilidade absoluta de a República Italiana recuperar os auxílios considerados ilegais na decisão [controvertida]».

123. Com efeito, como recordado anteriormente, a supressão de um auxílio ilegal através da recuperação é a consequência lógica da declaração da sua ilegalidade (80). Deduzi daqui que a obrigação de ordenar a recuperação de auxílios ilegais era um princípio que podia ser acompanhado de exceções (81). Ora, como qualquer exceção, esta deve ser interpretada restritivamente.

124. Considero, assim, que, em matéria de auxílios de Estado, contrariamente ao que fez o Tribunal Geral no acórdão recorrido, não se pode conferir ao princípio geral do direito «impossibilium nulla obligatio est» um alcance mais amplo do que o alcance conferido à «impossibilidade absoluta» de recuperar um auxílio ilegal na fase da execução da decisão da Comissão.

125. Por conseguinte, se argumentos relativos às dificuldades jurídicas, políticas ou administrativas não foram aceites pelo Tribunal de Justiça no âmbito da execução de uma decisão da Comissão que ordena a recuperação de um regime de auxílios, não podem ser aceites na fase da decisão adotada no termo do procedimento formal de investigação.

c)      Conclusão quanto ao primeiro fundamento

126. Concluo das considerações anteriores que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao declarar, no n.o 87 do acórdão recorrido, que a Comissão não tinha cometido um erro de direito quando constatou, logo na fase do procedimento formal de investigação e antes de adotar uma ordem de recuperação, a impossibilidade absoluta de a República Italiana recuperar os auxílios considerados ilegais na decisão controvertida, baseando‑se unicamente na impossibilidade de extrapolar, com efeitos retroativos, a partir das bases de dados cadastrais e fiscais disponíveis, o tipo de dados necessários para pôr em prática a recuperação do alegado auxílio.

127. Os argumentos desenvolvidos pela Scuola Elementare Maria Montessori, no âmbito da terceira e quarta partes do primeiro fundamento, respeitam igualmente à aplicação, pelo Tribunal Geral, do requisito relativo à «impossibilidade absoluta» de recuperar o auxílio em causa. Por conseguinte, estes argumentos não podem dar lugar a uma anulação mais extensa do acórdão do Tribunal Geral no que diz respeito à primeira parte da decisão controvertida. Assim, é inútil apreciá‑los.

2.      Quanto ao segundo fundamento

128. Com o seu segundo fundamento, a Scuola Elementare Maria Montessori critica o acórdão recorrido na medida em que o Tribunal Geral declarou que a isenção do IMU não constitui um auxílio de Estado na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE (terceira parte da decisão controvertida), por os seus requisitos de concessão garantirem que não é aplicável às «atividades económicas».

a)      Argumentação das partes

129. Para beneficiar da isenção do IMU, as atividades visadas pela regulamentação aplicável devem ser exercidas de acordo «com modalidades não comerciais» (82). Este conceito é definido no artigo 1.o, n.o 1, alínea p), do decreto ministeriale del 19 novembre 2012, n.o 200 [Decreto Ministerial n.o 200, de 19 de novembro de 2012 (a seguir «decreto ministerial»)]: não devem ter fins lucrativos e não deve existir uma relação de concorrência entre a atividade da entidade beneficiária da isenção e a dos operadores do mercado que prosseguem fins lucrativos.

130. Segundo a Elementare Maria Montessori, o conceito de «atividade económica» exercida de acordo com «modalidades não comerciais» é desconhecido do direito da União em matéria de concorrência e os critérios gerais enunciados no artigo 1.o, n.o 1, alínea p), do decreto ministerial divergem dos critérios elaborados pelo Tribunal de Justiça.

131. Além disso, segundo a recorrente, atividades como as ligadas ao ensino e à hospedagem incluem, «tipicamente, uma oferta de bens e serviços no mercado e […] estão por natureza em concorrência com as atividades exercidas por outros operadores do mercado» (83). Assim, o requisito relativo à inexistência de concorrência é, em todo caso, puramente formal.

132. Por outro lado, a Scuola Elementare Maria Montessori considera que os requisitos «objetivos» enunciados no decreto ministerial — que definem as características específicas que cada atividade, nomeadamente de ensino e de alojamento, tem de reunir para beneficiar da isenção em causa — devem ser objeto de uma apreciação mais aprofundada por parte do Tribunal Geral. Assim, para que se considere que as atividades de ensino são exercidas de acordo com modalidades «não comerciais», a recorrente sublinha que devem «ser prestadas a título gratuito ou mediante um pagamento simbólico que cubra apenas uma parte do custo efetivo do serviço» (84). Com este requisito, a recorrente considera que o decreto ministerial permite que os serviços prestados pelos beneficiários da isenção possam ser financiados por particulares mediante o pagamento de uma contrapartida que cubra uma parte substancial dos custos (85). Quanto às atividades de hospedagem, para que se considere que são exercidas de acordo com modalidades «não comerciais», a recorrente refere que devem ser igualmente «prestadas a título gratuito ou mediante um pagamento simbólico e, em todo o caso, inferior à metade do preço médio praticado para atividades análogas realizadas em condições de concorrência no mesmo âmbito territorial» (86). Com esta referência a metade do preço médio previsto para atividades análogas exercidas de acordo com modalidades concorrenciais, a recorrente considera que o decreto ministerial reconhece uma natureza económica à prestação oferecida a um preço simbólico (87).

133. Em contrapartida, a Comissão considera que o raciocínio do Tribunal Geral é não apenas lógico como igualmente correto de um ponto de vista jurídico. Além disso, a crítica da recorrente relativa ao requisito da contrapartida simbólica que pode ser exigida para o financiamento das atividades didáticas e de hospedagem (requisito objetivo) assenta num postulado errado.

b)      Análise

134. A Scuola Elementare Maria Montessori critica a utilização, pela legislação italiana, de um conceito desconhecido do direito da União em matéria de concorrência, ou seja, o conceito de atividade económica exercida de acordo com «modalidades não comerciais». A interpretação deste conceito pelo Tribunal Geral é contrária aos conceitos de «empresa» e de «atividade económica» tais como resultam da jurisprudência do Tribunal de Justiça.

135. Não partilho desta leitura do acórdão recorrido. Pelo contrário, tanto a Comissão (na decisão controvertida) como o Tribunal Geral (no acórdão recorrido) compreenderam o requisito prévio imposto pela legislação italiana para beneficiar da isenção do IMU à luz dos conceitos de «empresa» e de «atividade económica», tais como definidos pelo Tribunal de Justiça em jurisprudência constante.

136. Por um lado, está estabelecido que «o direito da União em matéria de concorrência, em especial a proibição do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, visa as atividades das empresas» (88), que incluem, neste mesmo contexto do direito da União em matéria de concorrência «qualquer entidade que exerça uma atividade económica, independentemente do seu estatuto jurídico e do seu modo de financiamento» (89). Por outro lado, é também certo que «[c]onstitui uma atividade económica qualquer atividade que consista na oferta de bens ou serviços num determinado mercado» (90). Nestas condições, «[a] circunstância de a oferta de bens ou de serviços ser feita sem fins lucrativos não obsta a que a entidade que realiza essas operações no mercado deva ser considerada uma empresa, uma vez que essa oferta está em concorrência com a de outros operadores que prosseguem fins lucrativos» (91).

137. Foi com base nestas definições, recordadas nos n.os 131 a 133 do acórdão recorrido, que o Tribunal Geral apreciou a legalidade do regime de isenção do IMU.

138. Ora, como o Tribunal Geral constatou, o decreto ministerial exclui expressamente do âmbito de aplicação da isenção do IMU as atividades que estejam em concorrência com as de outros operadores que prosseguem fins lucrativos (92). Por conseguinte, o Tribunal Geral não cometeu um erro de direito ao declarar, no n.o 137 do acórdão recorrido, que «a referida regulamentação só se aplica[va] a entidades que não possam ser consideradas “empresas” para efeitos da aplicação do direito da União».

139. Como a Comissão afirma, corretamente, na contestação, embora este requisito possa não ser respeitado, tal circunstância não influencia a legalidade do regime apreciado, mas constitui unicamente uma violação da regulamentação nacional (93).

140. Além deste requisito geral, relativo ao exercício de uma atividade de acordo com «modalidades não comerciais», o decreto ministerial sujeita a isenção do IMU ao respeito de requisitos «objetivos» específicos a determinados tipos de atividades. Contrariamente ao que alega a recorrente, os requisitos «objetivos» relativos às atividades didáticas e de hospedagem não põem em causa a apreciação do sistema de isenção.

141. No que respeita às atividades de ensino, a Scuola Elementare Maria Montessori recorda que a atividade de ensino deve ser prestada a título gratuito ou mediante o pagamento de uma contrapartida simbólica que cubra apenas uma parte do custo efetivo do serviço. Desta forma, segundo a recorrente, a legislação italiana permite que os serviços prestados possam ser financiados essencialmente por particulares mediante o pagamento de uma contrapartida (94).

142. Tal como exposto pela recorrente, o argumento pode parecer convincente. Todavia, não resiste a uma análise. Antes de mais, é duvidoso que um pagamento que cobre apenas «uma parte do custo efetivo do serviço» possa financiar o essencial da atividade prestada. Em seguida, a recorrente só tem em conta uma parte do artigo 4.o, n.o 3, alínea c), do decreto ministerial. Com efeito, a recorrente omite, de forma «surpreendente», o último requisito que, no entanto, está expressamente previsto nesta disposição. Embora o decreto ministerial autorize o pagamento de um montante simbólico, o artigo 4.o, n.o 3, alínea c), desse mesmo decreto ministerial acrescenta que o montante reclamado não deve estar relacionado com o custo efetivo do serviço.

143. Ora, para que uma atividade de ensino seja considerada uma prestação de serviços, é necessário que «o ensino [seja] ministrado em estabelecimentos de ensino financiados essencialmente por fundos privados não provenientes do próprio prestador de serviços» (95). Por conseguinte, uma vez que a contribuição externa suscetível de ser reclamada não deve, necessariamente, estar relacionada com o custo efetivo do serviço, parece‑me impossível que cubra o essencial do seu financiamento.

144. Dado que o montante simbólico autorizado pelo decreto ministerial não pode cobrir o essencial da atividade de ensino, não pode ser equiparado à contrapartida económica desta prestação. Assim, não se trata de uma remuneração na aceção do direito da União em matéria de concorrência. Por outras palavras, o artigo 4.o, n.o 3, alínea c), do decreto ministerial assegura que as entidades suscetíveis de beneficiar da isenção do IMU em razão de uma atividade de ensino não exerçam uma «atividade económica», uma vez que o seu objetivo não é obter um benefício comercial através dessa atividade (96).

145. No que respeita às atividades de hospedagem, os requisitos impostos pelo decreto ministerial garantem igualmente que não tenham caráter económico. Antes de mais, o artigo 1.o, n.o 1, alínea j), desse decreto reserva a isenção do IMU apenas aos casos em que o acesso à hospedagem está limitado a algumas categorias de beneficiários e por períodos de abertura não contínuos. Além disso, a mesma disposição exclui expressamente as estruturas hoteleiras ou para‑hoteleiras. Em seguida, tal como em relação às atividades de ensino, o artigo 4.o, n.o 4, do decreto ministerial só autoriza o pagamento de um montante simbólico para as atividades de hospedagem, e, «em todo o caso, inferior à metade do preço médio praticado para atividades análogas realizadas em condições de concorrência no mesmo âmbito territorial, tendo também em conta a inexistência de uma relação com o custo efetivo do serviço» (97) (sendo esta última precisão novamente omitida pela recorrente).

146. Assim, neste contexto, considero que o Tribunal Geral também não cometeu um erro de direito na sua apreciação dos «requisitos objetivos» relativos às atividades didáticas e de hospedagem.

c)      Conclusão quanto ao segundo fundamento

147. Concluo das considerações anteriores que o Tribunal Geral não cometeu um erro de direito na sua apreciação da compatibilidade do regime de isenção do IMU. O Tribunal Geral teve razão ao declarar que a recorrente não conseguiu demonstrar que esse regime podia ser aplicado a atividades com caráter económico nem que, por esse motivo, a Comissão tinha violado o artigo 107.o, n.o 1, TFUE.

VII. Quanto à remessa dos processos ao Tribunal Geral

148. No termo da minha análise do segundo fundamento de recurso invocado pela Scuola Elementare Maria Montessori, considero que o Tribunal Geral não cometeu um erro de direito na sua apreciação da compatibilidade do regime de isenção do IMU. Se o Tribunal de Justiça partilhar da minha análise, o acórdão do Tribunal Geral será definitivo no que respeita à terceira parte da decisão controvertida.

149. Em contrapartida, no termo da minha análise do primeiro fundamento de recurso invocado pela Scuola Elementare Maria Montessori, concluí que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito quando declarou, no n.o 87 do acórdão recorrido, que a Comissão não tinha cometido um erro de direito ao constatar, logo na fase do procedimento formal de investigação e antes de adotar uma ordem de recuperação, a impossibilidade absoluta de a República Italiana recuperar os auxílios considerados ilegais na decisão controvertida.

150. Se o Tribunal de Justiça partilhar da minha análise, o acórdão do Tribunal Geral deverá ser anulado a este respeito. Nos termos do artigo 61.o, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, este pode, neste caso, decidir definitivamente o litígio, se estiver em condições de ser julgado. Considero que é o que sucede no processo principal.

151. Com efeito, resulta dos fundamentos expostos nos n.os 118 a 125 das presentes conclusões que a Comissão cometeu um erro de direito quando declarou, logo na fase do procedimento formal de investigação e antes de adotar uma ordem de recuperação, a impossibilidade absoluta de a República Italiana recuperar os auxílios considerados ilegais, baseando‑se unicamente na impossibilidade de extrapolar, com efeitos retroativos, a partir das bases de dados cadastrais e fiscais disponíveis, o tipo de dados necessários para pôr em prática a recuperação do alegado auxílio. Por conseguinte, a primeira parte da decisão controvertida também deve ser anulada na medida em que a Comissão decidiu que era impossível às autoridades italianas recuperar os auxílios considerados ilegais e incompatíveis com o mercado interno.

VIII. Quanto às despesas

152. Nos termos do artigo 138.o, n.o 3, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, aplicável ao presente recurso por força do artigo 184.o, n.o 1, deste mesmo regulamento, se as partes obtiverem vencimento parcial, cada uma das partes suporta as suas próprias despesas. No entanto, se tal se afigurar justificado tendo em conta as circunstâncias do caso, o Tribunal pode decidir que, além das suas próprias despesas, uma parte suporte uma fração das despesas da outra parte.

153. Caso o Tribunal de Justiça partilhe da minha análise dos presentes recursos, esta derrogação deve ser aplicada ao processo principal. Com efeito, se for negado provimento aos recursos da Comissão, a Scuola Elementare Maria Montessori apenas é vencida num dos fundamentos do seu próprio recurso. Além disso, importa igualmente salientar que a decisão impugnada no Tribunal Geral é, in fine, parcialmente anulada.

154. Neste contexto, uma vez que a primeira das três partes da decisão controvertida é anulada, considero que se deve condenar a Comissão a suportar, além das suas próprias despesas no processo no Tribunal Geral e no Tribunal de Justiça, um terço das despesas efetuadas pela Scuola Elementare Maria Montessori em ambas as instâncias.

155. Em conformidade com o artigo 184.o, n.o 4, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, a República Italiana suportará as suas próprias despesas.

IX.    Conclusão

156. Tendo em consideração o exposto, proponho que o Tribunal de Justiça responda o seguinte:

1)      É anulado o acórdão do Tribunal Geral da União Europeia de 15 de setembro de 2016, Scuola Elementare Maria Montessori/Comissão (T‑220/13, não publicado, EU:T:2016:484), na medida em que decidiu que a Comissão Europeia não tinha cometido um erro de direito ao declarar, logo na fase do procedimento formal de investigação e antes de adotar uma ordem de recuperação, a impossibilidade absoluta de a República Italiana recuperar os auxílios considerados ilegais na Decisão 2013/284/UE da Comissão, de 19 de dezembro de 2012, relativa ao auxílio estatal S.A. 20829 [C 26/2010, ex NN 43/2010 (ex CP 71/2006)] Regime relativo à isenção do imposto municipal sobre imóveis (ICI) concedida a imóveis utilizados por entidades não comerciais para fins específicos a que a Itália deu execução, baseando‑se unicamente na impossibilidade de extrapolar, com efeitos retroativos, a partir das bases de dados cadastrais e fiscais disponíveis, o tipo de dados necessários para pôr em prática a recuperação do alegado auxílio.

2)      É anulada a primeira parte da Decisão 2013/284 na medida em que a Comissão decidiu que era impossível às autoridades italianas recuperar os auxílios considerados ilegais e incompatíveis com o mercado interno.

3)      É negado provimento aos recursos que a Comissão interpôs dos Acórdãos do Tribunal Geral de 15 de setembro de 2016, Scuola Elementare Maria Montessori/Comissão (T‑220/13, não publicado, EU:T:2016:484), e Ferracci/Comissão (T‑219/13, EU:T:2016:485).

4)      A Comissão é condenada a suportar as despesas que efetuou em primeira instância e no Tribunal de Justiça, bem como um terço das despesas que a Scuola Elementare Maria Montessori Srl efetuou nos mesmos processos.


1      Língua original: francês.


2      JO 2013, L 166, p. 24.


3      Acórdão de 3 de outubro de 2013, Inuit Tapiriit Kanatami e o./Parlamento e Conselho (C‑583/11 P, EU:C:2013:625, n.o 57).


4      Acórdão de 3 de outubro de 2013, Inuit Tapiriit Kanatami e o./Parlamento e Conselho (C‑583/11 P, EU:C:2013:625, n.o 60). O sublinhado é meu.


5      V., neste sentido, Acórdão de 3 de outubro de 2013, Inuit Tapiriit Kanatami e o./Parlamento e Conselho (C‑583/11 P, EU:C:2013:625, n.os 60 e 61).


6      V., neste sentido, Despacho de 14 de julho de 2015, Forgital Italy/Conselho (C‑84/14 P, não publicado, EU:C:2015:517, n.o 43).


7      V., neste sentido, Acórdãos de 28 de abril de 2015, T & L Sugars e Sidul Açúcares/Comissão (C‑456/13 P, EU:C:2015:284, n.o 41); de 10 de dezembro de 2015, Canon Europa/Comissão (C‑552/14 P, não publicado, EU:C:2015:804, n.o 47); e Kyocera Mita Europe/Comissão (C‑553/14 P, não publicado, EU:C:2015:805, n.o 46).


8      Sob reserva da interpretação do Tribunal Geral segundo a qual, para que um ato regulamentar «necessit[e]» de medidas de execução, estas devem ser adotadas na «atividade negocial normal» (Acórdão de 14 de janeiro de 2016, Tilly‑Sabco/Comissão, T‑397/13, EU:T:2016:8, n.o 43; v., igualmente, Acórdão de 14 de janeiro de 2016, Doux/Comissão, T‑434/13, não publicado, EU:T:2016:7, n.o 44). Embora tenha sido adotada num acórdão que foi objeto de recurso, esta interpretação mais ampla do artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE não foi criticada pela Comissão nem censurada pelo Tribunal de Justiça (v., Acórdão de 20 de setembro de 2017, Tilly‑Sabco/Comissão, C‑183/16 P, EU:C:2017:704). Ora, «o critério que sujeita a admissibilidade de um recurso interposto por uma pessoa singular ou coletiva de uma decisão de que não é a destinatária às condições de admissibilidade fixadas no artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE constitui um motivo de inadmissibilidade de ordem pública que os órgãos jurisdicionais da União podem a todo o tempo examinar, mesmo oficiosamente» (Acórdão de 27 de fevereiro de 2014, Stichting Woonpunt e o./Comissão, C‑132/12 P, EU:C:2014:100, n.o 45).


9      JO 1999, L 83, p. 1.


10      Despachos do Tribunal Geral de 18 de novembro de 2010, Ferracci/Comissão (T‑192/10, não publicado, EU:T:2010:474) e Scuola Elementare Maria Montessori/Comissão (T‑193/10, não publicado, EU:T:2010:475).


11      V. Acórdãos do Tribunal Geral de 15 de setembro de 2016, Scuola Elementare Maria Montessori/Comissão (T‑220/13, não publicado, EU:T:2016:484, n.os 50 a 52), e Ferracci/Comissão (T‑219/13, EU:T:2016:485, n.os 53 a 55).


12      V., neste sentido, Acórdão de 3 de outubro de 2013, Inuit Tapiriit Kanatami e o./Parlamento e Conselho (C‑583/11 P, EU:C:2013:625, n.o 57), O sublinhado é meu.


13      V., neste sentido, Acórdão de 3 de outubro de 2013, Inuit Tapiriit Kanatami e o./Parlamento e Conselho (C‑583/11 P, EU:C:2013:625, n.o 58).


14      Acórdão de 3 de outubro de 2013, Inuit Tapiriit Kanatami e o./Parlamento e Conselho (C‑583/11 P, EU:C:2013:625, n.o 60).


15      Acórdão de 3 de outubro de 2013, Inuit Tapiriit Kanatami e o./Parlamento e Conselho (C‑583/11 P, EU:C:2013:625, n.o 61).


16      V., neste sentido, Acórdão de 3 de outubro de 2013, Inuit Tapiriit Kanatami e o./Parlamento e Conselho (C‑583/11 P, EU:C:2013:625, n.o 59).


17      V. Relatório final do Círculo de Discussão sobre o Funcionamento do Tribunal de Justiça, Secretariado da Convenção Europeia, de 25 de março de 2003 (CONV 636/03, n.o 22), e nota de transmissão do Praesidium à Convenção, de 12 de maio de 2003 (CONV 734/03, p. 20).


18      Desde o Tratado de Lisboa, a qualificação de um ato legislativo depende unicamente do processo previsto no artigo do Tratado que autoriza a sua adoção. Com efeito, «um ato jurídico só pode ser qualificado como ato legislativo da União se for adotado com base numa disposição dos Tratados que se refira expressamente ao processo legislativo ordinário ou ao processo legislativo especial» (v. Acórdão de 6 de setembro de 2017, Eslováquia e Hungria/Conselho, C‑643/15 e C‑647/15, EU:C:2017:631, n.o 62).


19      V., neste sentido, Acórdão de 15 de outubro de 1987, Heylens e o. (222/86, EU:C:1987:442, n.o 15).


20      Acórdãos do Tribunal Geral de 15 de setembro de 2016, Ferracci/Comissão (T‑219/13, EU:T:2016:485, n.o 54), e Scuola Elementare Maria Montessori/Comissão (T‑220/13, não publicado, EU:T:2016:484, n.o 51).


21      V., implicitamente (para diferenciar a decisão individual do regulamento), Acórdão de 14 de dezembro de 1962, Confédération nationale des producteurs de fruits et légumes e o./Conselho (16/62 e 17/62, não publicado, EU:C:1962:47, n.os 2 e 3), e, expressamente, Acórdão de 15 de janeiro de 2002, Libéros/Comissão (C‑171/00 P, EU:C:2002:17, n.o 28).


22      Conclusões da advogada‑geral J. Kokott no processo Telefónica/Comissão (C‑274/12 P, EU:C:2013:204, n.o 25), e, neste sentido, conclusões que apresentei no processo Stichting Woonpunt e o./Comissão (C‑132/12 P, EU:C:2013:335, n.o 85).


23      Artigo 1.o, alínea d), do Regulamento n.o 659/1999; o sublinhado é meu. Esta definição foi reproduzida no artigo 1.o, alínea d), do Regulamento (UE) 2015/1589 do Conselho, de 13 de julho de 2015, que estabelece as regras de execução do artigo 108.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (JO 2015, L 248, p. 9).


24      Acórdão de 22 de dezembro de 2008, British Aggregates/Comissão (C‑487/06 P, EU:C:2008:757, n.o 31). O sublinhado é meu.


25      Acórdão de 29 de abril de 2004, Itália/Comissão (C‑298/00 P, EU:C:2004:240, n.o 37). O sublinhado é meu.


26      JO 2011, L 7, p. 48.


27      Acórdão de 19 de dezembro de 2013, Telefónica/Comissão (C‑274/12 P, EU:C:2013:852, n.o 48). O artigo 1.o, n.o 1, da Decisão 2011/5 constatava que o regime em causa tinha sido aplicado em violação do artigo 88.o, n.o 3, CE e declarava‑o incompatível com o mercado interno.


28      N.o 22 desse despacho.


29      Segundo os termos utilizados pelo Tribunal de Justiça no n.o 104 do Acórdão de 17 de setembro de 2015, Mory e o./Comissão (C‑33/14 P, EU:C:2015:609).


30      V., neste sentido, Lenaerts, K., Maselis, I., Gutman, K., EU Procedural Law, Oxford University Press, 2014,n.o 7.120.


31      Segundo o Tribunal de Justiça, «a natureza regulamentar de um ato não é posta em causa pela possibilidade de determinar com maior ou menor precisão o número ou mesmo a identidade dos sujeitos de direito a que se aplica num momento determinado, tanto mais que é evidente que esta aplicação se efetua em virtude de uma situação objetiva de direito ou de facto, definida pelo ato, em relação com a finalidade deste último» (Acórdão de 11 de julho de 1968, Zuckerfabrik Watenstedt/Conselho, 6/68, EU:C:1968:43; o sublinhado é meu). V., igualmente, Acórdãos de 17 de junho de 1980, Calpak e Società Emiliana Lavorazione Frutta/Comissão (789/79 e 790/79, não publicado, EU:C:1980:159, n.o 9); de 30 de setembro de 1982, Roquette Frères/Conselho (242/81, EU:C:1982:325, n.o 7); e de 29 de junho de 1993, Gibraltar/Conselho (C‑298/89, EU:C:1993:267, n.o 17).


32      V., nestes termos, Kovar, R., «L’identification des actes normatifs en droit communautaire», em Mélanges en hommage à Michel Waelbroeck, vol. 1, Bruxelas, Bruylant, 1999, p. 387 a 422, em especial p. 390.


33      Além dos exemplos referidos no n.o 39 das presentes conclusões, v. Acórdão de 2 de fevereiro de 1988, Kwekerij van der Kooy e o./Comissão (67/85, 68/85 e 70/85, EU:C:1988:38, n.o 15), ou ainda Acórdão de 17 de setembro de 2009, Comissão/Koninklijke FrieslandCampina (C‑519/07 P, EU:C:2009:556, n.o 53).


34      Acórdão de 13 de outubro de 2011, Deutsche Post e Alemanha/Comissão (C‑463/10 P e C‑475/10 P, EU:C:2011:656, n.o 66).


35      V. Acórdãos do Tribunal Geral de 15 de setembro de 2016, Ferracci/Comissão (T‑219/13, EU:T:2016:485, n.o 48), e Scuola Elementare Maria Montessori/Comissão (T‑220/13, não publicado, EU:T:2016:484, n.o 45).


36      Acórdãos do 15 de julho de 1963, Plaumann/Comissão (25/62, EU:C:1963:17), e de 3 de outubro de 2013, Inuit Tapiriit Kanatami e o./Parlamento e Conselho (C‑583/11 P, EU:C:2013:625, n.o 72).


37      V., neste sentido, Acórdãos de 13 de dezembro de 2005, Comissão/Aktionsgemeinschaft Recht und Eigentum (C‑78/03 P, EU:C:2005:761, n.o 37); de 22 de novembro de 2007, Sniace/Comissão (C‑260/05 P, EU:C:2007:700, n.o 54); e de 17 de setembro de 2015, Mory e o./Comissão (C‑33/14 P, EU:C:2015:609, n.o 97).


38      V., neste sentido, Acórdão de 22 de dezembro de 2008, British Aggregates/Comissão (C‑487/06 P, EU:C:2008:757, n.o 47).


39      Acórdão de 27 de fevereiro de 2014, Stichting Woonpunt e o./Comissão (C‑132/12 P, EU:C:2014:100, n.o 74); o sublinhado é meu.


40      Acórdão de 27 de fevereiro de 2014, Stichting Woonpunt e o./Comissão (C‑132/12 P, EU:C:2014:100, n.o 57); o sublinhado é meu.


41      Quanto ao objetivo de flexibilização dos requisitos do recurso de anulação, v. Acórdão de 3 de outubro de 2013, Inuit Tapiriit Kanatami e o./Parlamento e Conselho (C‑583/11 P, EU:C:2013:625, n.o 57).


42      V., nomeadamente, Acórdãos de 6 de julho de 1995, AITEC e o./Comissão (T‑447/93 a T‑449/93, EU:T:1995:130); de 22 de outubro de 1996, Skibsværftsforeningen e o./Comissão (T‑266/94, EU:T:1996:153); de 3 de junho de 1999, TF1/Comissão (T‑17/96, EU:T:1999:119, n.o 30); de 12 de fevereiro de 2008, BUPA e o./Comissão (T‑289/03, EU:T:2008:29, n.o 81); e de 18 de novembro de 2009, Scheucher — Fleisch e o./Comissão, T‑375/04, EU:T:2009:445, n.o 36). Apesar de não se tratar de uma decisão da Comissão em matéria de auxílios de Estado, o Tribunal de Justiça admitiu igualmente que um ato da União era suscetível de afetar diretamente a situação jurídica de um particular quando «a possibilidade de os destinatários não implementarem o ato [da União] é puramente teórica, não existindo quaisquer dúvidas de que pretendem retirar consequências conformes ao referido ato» (Acórdão de 5 de maio de 1998, Dreyfus/Comissão, C‑386/96 P, EU:C:1998:193, n.o 44). V., igualmente, para recordar o princípio, Acórdão de 10 de setembro de 2009, Comissão/Ente per le Ville Vesuviane e Ente per le Ville Vesuviane/Comissão (C‑445/07 P e C‑455/07 P, EU:C:2009:529, n.o 46).


43      V. n.o 75 dos processos C‑623/16 P e C‑624/16 P.


44      Acórdão de 19 de dezembro de 2013, Telefónica/Comissão (C‑274/12 P, EU:C:2013:852, n.o 35).


45      Acórdão de 19 de dezembro de 2013, Telefónica/Comissão (C‑274/12 P, EU:C:2013:852, n.o 36); o sublinhado é meu.


46      É verdade que no processo que deu origem a esse acórdão, a recorrente não era visada pela ordem de recuperação e que, no período abrangido pela obrigação de recuperação, tinha renunciado ao benefício do auxílio controvertido. De facto, a sua situação era assim equiparável à de P. Ferracci e da Scuola Elementare Maria Montessori.


47      V., neste sentido, Acórdãos de 19 de dezembro de 2013, Telefónica/Comissão (C‑274/12 P, EU:C:2013:852, n.o 30); e de 28 de abril de 2015, T & L Sugars e Sidul Açúcares/Comissão (C‑456/13 P, EU:C:2015:284, n.o 32).


48      V., neste sentido, conclusões que apresentei no processo Stichting Woonpunt e o./Comissão (C‑132/12 P, EU:C:2013:335, n.o 62).


49      V., neste sentido, Acórdão de 13 de março de 2007, Unibet (C‑432/05, EU:C:2007:163, n.o 64).


50      Acórdão de 19 de dezembro de 2013, Telefónica/Comissão (C‑274/12 P, EU:C:2013:852, n.o 27).


51      Trata‑se dos Acórdãos de Tribunal Geral de 26 de setembro de 2014, Dansk Automat Brancheforening/Comissão (T‑601/11, EU:T:2014:839), e Royal Scandinavian Casino Århus/Comissão (T‑615/11, não publicado, EU:T:2014:838), que foram confirmados pelo Tribunal de Justiça por Despachos de 21 de abril de 2016, Dansk Automat Brancheforening/Comissão (C‑563/14 P, não publicado, EU:C:2016:303), e Royal Scandinavian Casino Århus/Comissão (C‑541/14 P, não publicado, EU:C:2016:302).


52      Despachos de 21 de abril de 2016, Royal Scandinavian Casino Århus/Comissão (C‑541/14 P, não publicado, EU:C:2016:302, n.o 46), e Dansk Automat Brancheforening/Comissão (C‑563/14 P, não publicado, EU:C:2016:303, n.o 58).


53      Acórdãos do Tribunal Geral de 15 de setembro de 2016, Ferracci/Comissão (T‑219/13, EU:T:2016:485, n.o 69), Scuola Elementare Maria Montessori/Commission (T‑220/13, não publicado, EU:T:2016:484, n.o 66).


54      V. Despachos de 21 de abril de 2016, Royal Scandinavian Casino Århus/Comissão (C‑541/14 P, não publicado, EU:C:2016:302, n.o 45), e Dansk Automat Brancheforening/Comissão (C‑563/14 P, não publicado, EU:C:2016:303, n.o 57).


55      Esta afirmação do Tribunal Geral tem apoio na jurisprudência do Tribunal de Justiça. V., neste sentido, nomeadamente, Acórdãos de 21 de março de 1990, Bélgica/Comissão (C‑142/87, EU:C:1990:125, n.o 66), e de 21 de dezembro de 2016, Comissão/Aer Lingus e Ryanair Designated Activity (C‑164/15 P e C‑165/15 P, EU:C:2016:990, n.o 116).


56      O sublinhado é meu.


57      Acórdão de 8 de dezembro de 2011, Residex Capital IV (C‑275/10, EU:C:2011:814, n.o 34). Mais recentemente, v., também, Acórdão de 1 de outubro de 2015, Electrabel e Dunamenti Erőmű/Comissão (C‑357/14 P, EU:C:2015:642, n.o 111).


58      Acórdão de 8 de dezembro de 2011, Residex Capital IV (C‑275/10, EU:C:2011:814, n.o 35); o sublinhado é meu.


59      Acórdão de 28 de julho de 2011, Mediaset/Comissão (C‑403/10 P, não publicado, EU:C:2011:533, n.o 124); o sublinhado é meu.


60      Acórdão de 15 de setembro de 2016, Scuola Elementare Maria Montessori/Comissão (T‑220/13, não publicado, EU:T:2016:484, n.o 87); o sublinhado é meu.


61      V. n.o 12 da contestação da Comissão (C‑622/16 P). Este princípio, já conhecido do direito romano (Digeste, p. 50, 17 e 185, Celsus libro octavo digestorum),é igualmente conhecido pela expressão «nemo potest ad impossibile obligari».


62      V. Conclusões da advogada‑geral V. Trstenjak no processo Budějovický Budvar (C‑482/09, EU:C:2011:46, nota 44).


63      V. enunciando um argumento invocado pela Alemanha, Conclusões do advogado‑geral L. A. Geelhoed nos processos apensos Comissão/Alemanha (C‑20/01 e C‑28/01, EU:C:2002:717, n.o 30).


64      V. Acórdão de 3 de março de 2016, Daimler (C‑179/15, EU:C:2016:134, n.o 42).


65      V. Acórdão de 20 de dezembro de 2017, Protect Natur‑, Arten‑und Landschaftsschutz Umweltorganisation (C‑664/15, EU:C:2017:987, n.o 96).


66      V., neste sentido, Conclusões da advogada‑geral V. Trstenjak no processo Audiolux e o. (C‑101/08, EU:C:2009:410, n.o 69).


67      Acórdão de 17 de junho de 1999, Bélgica/Comissão (C‑75/97, EU:C:1999:311, n.o 86); o sublinhado é meu.


68      Acórdão de 12 de fevereiro de 2015, Comissão/França (C‑37/14, não publicado, EU:C:2015:90, n.o 67); o sublinhado é meu. V., igualmente, Acórdãos de 10 de junho de 1993, Comissão/Grécia (C‑183/91, EU:C:1993:233, n.o 19), e de 17 de junho de 1999, Bélgica/Comissão (C‑75/97, EU:C:1999:311, n.o 88).


69      V. Acórdão de 15 de setembro de 2016, Scuola Elementare Maria Montessori/Comissão (T‑220/13, não publicado, EU:T:2016:484, n.os 85 e 87).


70      Acórdão de 24 de janeiro de 2013, Comissão/Espanha (C‑529/09, EU:C:2013:31, n.o 99). Esta possibilidade foi enunciada pela primeira vez no Acórdão de 15 de janeiro de 1986, Comissão/Bélgica (52/84, EU:C:1986:3, n.o 14). Mais recentemente, v. Acórdão de 9 de novembro de 2017, Comissão/Grécia (C‑481/16, não publicado, EU:C:2017:845, n.o 28).


71      V., Acórdão de 2 de julho de 2002, Comissão/Espanha (C‑499/99, EU:C:2002:408, n.o 37). Neste sentido, Karpenschif, M., Droit européen des aides d’État, Bruxelas, Bruylant, 2.a ed., 2017, n.o 612.


72      V., Acórdãos de 2 de julho de 2002, Comissão/Espanha (C‑499/99, EU:C:2002:408, n.os 38 a 40), e de 13 de novembro de 2008, Comissão/França (C‑214/07, EU:C:2008:619, n.o 63).


73      Acórdão de 13 de novembro de 2008, Comissão/França (C‑214/07, EU:C:2008:619, n.o 64).


74      Desde a sua primeira formulação no Acórdão de 2 de fevereiro de 1989, Comissão/Alemanha (94/87, EU:C:1989:46, n.o 10), identifiquei pelo menos 31 referências a esta jurisprudência.


75      V., neste sentido, Acórdão de 13 de novembro de 2008, Comissão/França (C‑214/07, EU:C:2008:619, n.o 50).


76      V., neste sentido, Acórdão de 17 de junho de 1999, Bélgica/Comissão (C‑75/97, EU:C:1999:311, n.o 90).


77      A República francesa invocava, nomeadamente, o facto de o regime de auxílios controvertido não implicar necessariamente uma identificação específica dos beneficiários no âmbito de um sistema declarativo ou ainda o facto de as declarações fiscais efetuadas a nível nacional não terem mencionado algumas informações necessárias para o cálculo dos auxílios a recuperar (V. Acórdão de 13 de novembro de 2008, Comissão/França, C‑214/07, EU:C:2008:619, n.os 23 e 28).


78      Comparar n.os 21 e 50 do Acórdão de 13 de novembro de 2008, Comissão/França, C‑214/07, EU:C:2008:619). Já aconteceu à Comissão ter de distinguir estas dificuldades da situação em que era impossível identificar os beneficiários de um auxílio em razão do termo do prazo legal de conservação dos documentos contabilísticos (v., neste sentido, posição da Comissão no âmbito do processo que deu origem ao Acórdão de 13 de novembro de 2008, Comissão/França, C‑214/07, EU:C:2008:619, n.os 13, 22 e 48). Contudo, se o Tribunal de Justiça se pronunciar sobre esta circunstância específica — o que não fez no Acórdão Comissão/França já referido —, a sua jurisprudência mais recente permite‑me até duvidar da relevância da distinção, uma vez que o Tribunal de Justiça declarou recentemente que «o receio de dificuldades internas, mesmo insuperáveis […] não pode justificar que um Estado‑Membro não respeite as obrigações que lhe incumbem por força do direito da União» (Acórdão de 13 de setembro de 2017, Comissão/Bélgica, C‑591/14, EU:C:2017:670, n.o 44).


79      Acórdão de 13 de setembro de 2017, Comissão/Bélgica (C‑591/14, EU:C:2017:670, n.o 44 e jurisprudência referida). O sublinhado é meu.


80      V. jurisprudência referida na nota 55.


81      V. n.o 98 das presentes conclusões.


82      V. artigo 91.o‑A, n.o 1, do decreto‑legge 24 gennaio 2012, n.o 1, recante «Disposizioni urgenti per la concorrenza, lo sviluppo delle infrastrutture e la competitività», convertito, con modifiche, dalla legge del 24 marzo 2012, n.o 27 (Decreto‑lei n.o 1, de 24 de janeiro de 2012, relativo às disposições urgentes para a concorrência, o desenvolvimento das infraestruturas e a competitividade, convertido em lei com alterações pela Lei n.o 27 de 24 de março de 2012).


83      V. n.o 57 do recurso de cassação da Scuola Elementare Maria Montessori (sublinhado pela recorrente).


84      Artigo 4.o, n.o 3, alínea c), do decreto ministerial.


85      V. n.o 59 do recurso de cassação da Scuola Elementare Maria Montessori.


86      Artigo 4.o, n.o 4, do decreto ministerial.


87      V. n.o 64 do recurso de cassação da Scuola Elementare Maria Montessori.


88      Acórdão de 27 de junho de 2017, Congregación de Escuelas Pías Provincia Betania (C‑74/16, EU:C:2017:496, n.o 39). V., igualmente, Acórdão de 5 de março de 2015, Comissão e o./Versalis e o. (C‑93/13 P e C‑123/13 P, EU:C:2015:150, n.o 88).


89      Acórdãos do 10 de janeiro de 2006, Cassa di Risparmio di Firenze e o. (C‑222/04, EU:C:2006:8, n.o 107); de 19 de dezembro de 2012, Mitteldeutsche Flughafen e Flughafen Leipzig‑Halle/Comissão (C‑288/11 P, EU:C:2012:821, n.o 50); e de 27 de junho de 2017, Congregación de Escuelas Pías Provincia Betania (C‑74/16, EU:C:2017:496, n.o 41).


90      Acórdãos do 10 de janeiro de 2006, Cassa di Risparmio di Firenze e o. (C‑222/04, EU:C:2006:8, n.o 108); de 19 de dezembro de 2012, Mitteldeutsche Flughafen e Flughafen Leipzig‑Halle/Comissão (C‑288/11 P, EU:C:2012:821, n.o 50); e de 27 de junho de 2017, Congregación de Escuelas Pías Provincia Betania (C‑74/16, EU:C:2017:496, n.o 45).


91      Acórdãos de 1 de julho de 2008, MOTOE (C‑49/07, EU:C:2008:376, n.o 27), e de 27 de junho de 2017, Congregación de Escuelas Pías Provincia Betania (C‑74/16, EU:C:2017:496, n.o 46). V., igualmente neste sentido, Acórdão de 10 de janeiro de 2006, Cassa di Risparmio di Firenze e o. (C‑222/04, EU:C:2006:8, n.o 123).


92      Importa recordar que, segundo o artigo 91.o‑A, n.o 1, do Decreto‑Lei n.o 1, para beneficiar da isenção do IMU, as atividades referidas pela regulamentação aplicável devem ser exercidas de acordo com «modalidades não comerciais». Ora, nos termos do artigo 1.o, n.o 1, alínea p), do decreto ministerial, para satisfazer este requisito, as atividades não devem prosseguir fins lucrativos e não deve existir uma relação de concorrência entre a atividade da entidade beneficiária da isenção e a dos operadores do mercado que prosseguem fins lucrativos.


93      V., n.o 69 da contestação da Comissão.


94      V. n.o 59 do seu recurso de cassação. Um raciocínio semelhante é aplicado às atividades de hospedagem: a possibilidade de reclamar um montante simbólico «inferior à metade do preço médio praticado para atividades análogas» confere uma natureza económica à prestação oferecida a um preço simbólico (v. n.o 64 do referido recurso de cassação).


95      Acórdão de 27 de junho de 2017, Congregación de Escuelas Pías Provincia Betania (C‑74/16, EU:C:2017:496, n.o 48); o sublinhado é meu. V., igualmente neste sentido, Acórdão de 11 de setembro de 2007, Schwarz e Gootjes‑Schwarz (C‑76/05, EU:C:2007:492, n.o 40). Contrariamente ao que sugere a recorrente, a jurisprudência referida pelo Tribunal Geral no n.o 141 do acórdão recorrido é, assim, totalmente relevante.


96      Quanto à distinção entre os estabelecimentos de ensino graças aos quais o Estado cumpre a sua missão nos domínios social, cultural e educativo e os estabelecimentos, «financiados no essencial por fundos privados, nomeadamente pelos estudantes ou pelos seus pais, […] que procuram realizar um benefício comercial» v. Acórdão de 7 de dezembro de 1993, Wirth (C‑109/92, EU:C:1993:916, n.o 17); o sublinhado é meu.


97      O sublinhado é meu.