Language of document : ECLI:EU:F:2009:43

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA FUNÇÃO PÚBLICA DA UNIÃO EUROPEIA (Segunda Secção)

30 de Abril de 2009 (*)

«Função pública – Agentes auxiliares de sessão do Parlamento – Admissibilidade – Procedimento pré‑contencioso – Artigo 283.° CE – Artigo 78.° do ROA – Excepção de ilegalidade – Igualdade de tratamento – Estabilidade de emprego – Directiva 1999/70 – Contratos a termo – Invocabilidade»

No processo F‑65/07,

que tem por objecto um recurso nos termos dos artigos 236.° CE e 152.° EA,

Laleh Aayhan, residente em Estrasburgo (França), e outros 79 antigos agentes auxiliares de sessão identificados em documento anexo, representados por R. Blindauer, advogado,

recorrentes,

contra

Parlamento Europeu, inicialmente representado por M. Mustapha‑Pacha e R. Ignătescu, na qualidade de agentes e, depois, por R. Ignătescu e S. Seyr, na qualidade de agentes,

recorrido,

O TRIBUNAL DE FUNÇÃO PÚBLICA (Segunda Secção),

composto por: H. Kanninen, presidente, I. Boruta e S. Van Raepenbusch (relator), juízes,

secretário: R. Schiano, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 13 de Novembro de 2008,

profere o presente

Acórdão

1        Por petição entrada na Secretaria do Tribunal da Função Pública em 29 de Junho de 2007, L. Aayhan e outros 79 antigos agentes auxiliares de sessão do Parlamento Europeu pedem, designadamente, a anulação da decisão da entidade habilitada a celebrar contratos de admissão (a seguir «EHCA»), de 20 de Abril de 2007, que indefere a pretensa «reclamação» por eles apresentada em 19 de Dezembro de 2006, no sentido de que os sucessivos contratos a termo celebrados por cada um deles com o Parlamento sejam considerados como um contrato único sem termo, a tempo parcial, que os interessados sejam reintegrados, com este fundamento, no Parlamento e que lhes seja atribuída uma indemnização «representativa» do direito a férias remuneradas que adquiriram relativamente a todos os períodos de trabalho cumpridos.

 Quadro jurídico

1.     Regime aplicável aos outros agentes das Comunidades Europeias

2        Nos termos do artigo 52.°, segunda frase, do regime aplicável aos outros agentes das Comunidades Europeias (a seguir «ROA»), «[n]ão pode ser contratado pessoal auxiliar após 31 de Dezembro de 2006».

3        O artigo 58.°, primeiro parágrafo, do ROA, dispõe:

«O agente auxiliar beneficia de férias remuneradas de dois dias úteis, por mês de serviço; o tempo de serviço inferior a 15 dias ou a metade de um mês não dá direito a férias.»

4        O artigo 78.° do ROA, abrangido pelo título III, «Agentes auxiliares», dispõe:

«Em derrogação do disposto no presente título, os agentes auxiliares admitidos pelo Parlamento […] pelo prazo de duração dos trabalhos das suas sessões estão sujeitos às condições de recrutamento e remuneração previstas no acordo celebrado entre o Parlamento Europeu, o Conselho da Europa e a Assembleia da União da Europa Ocidental, relativo à admissão deste pessoal.

As disposições deste acordo, assim como qualquer modificação posterior das mesmas, serão levadas ao conhecimento das autoridades orçamentais competentes, um mês antes da sua entrada em vigor.

São aplicáveis aos agentes auxiliares contratados pela Comissão [das Comunidades Europeias], como intérpretes de conferência por conta das instituições e organismos comunitários, as mesmas condições de recrutamento e de remuneração que as aplicadas aos intérpretes de conferência recrutados pelo Parlamento […].

O presente artigo será aplicável até 31 de Dezembro de 2006, data a partir da qual o pessoal em causa ficará sujeito às condições estabelecidas nos termos do artigo 90.°»

5        O artigo 90.° do ROA, que figura no título IV, «Agentes contratuais», capítulo V, «Disposições especiais relativas aos agentes contratuais a que se refere o artigo 3.° ‑ B», dispõe:

«Em derrogação do disposto no presente título, os intérpretes de conferência contratados pelo Parlamento […] ou pela Comissão em nome das instituições ou organismos da Comunidade ficarão sujeitos às condições constantes do Acordo de 28 de Julho de 1999 entre o Parlamento […], a Comissão e o Tribunal de Justiça [das Comunidades Europeias], em nome das instituições, por um lado, e as associações representativas da profissão, por outro.

As alterações a esse Acordo, necessárias por força da entrada em vigor do Regulamento (CE) n.° 723/2004 [do Conselho, de 22 de Março de 2004, que altera o Estatuto dos Funcionários das Comunidades Europeias e o ROA, JO L 124, p. 1] serão aprovadas antes de 31 de Dezembro de 2006, de acordo com o artigo 78.° [segundo parágrafo]. As alterações ao Acordo após 31 de Dezembro de 2006 serão aprovadas por acordo entre as Instituições.»

6        Nos termos do artigo 91.° do ROA, que figura, igualmente, no título IV, «Agentes contratuais», capítulo VI, «Condições de trabalho», «[o]s artigos 16.° a 18.° são aplicáveis por analogia». O artigo 16.°, primeiro parágrafo, do ROA, em especial, remete, no que respeita, nomeadamente, à duração do trabalho, para os «artigos 55.° a 61.° do Estatuto [dos Funcionários das Comunidades Europeias]», e o artigo 55.°‑A, n.° 4, do Estatuto dos Funcionários das Comunidades Europeias (a seguir «Estatuto»), por seu turno, remete, no que respeita às regras relativas ao trabalho a tempo parcial, para o anexo IV‑A do Estatuto, cujo artigo 1.°, terceiro parágrafo, terceira frase, dispõe:

«O trabalho a tempo parcial não pode ter uma duração inferior a metade do tempo de trabalho normal.»

2.     Acordo‑quadro relativo a contratos de trabalho a termo

7        Resulta, no essencial, dos segundo e terceiro parágrafos do preâmbulo, bem como dos n.os 6 a 8 das considerações gerais do acordo‑quadro relativo a contratos de trabalho a termo, celebrado em 18 de Março de 1999 (a seguir «acordo‑quadro), que figura em anexo à Directiva 1999/70/CE do Conselho, de 28 de Junho de 1999, respeitante ao acordo‑quadro CES, UNICE e CEEP relativo a contratos de trabalho a termo (JO L 175, p. 43), que:

–        as partes signatárias do acordo‑quadro reconhecem, por um lado, que os contratos de trabalho sem termo são e continuarão a ser a forma mais comum no que respeita à relação laboral, uma vez que contribuem para a qualidade de vida dos trabalhadores e a melhoria do seu desempenho, mas, por outro lado, que os contratos de trabalho a termo respondem, em certas circunstâncias, às necessidades tanto dos empregadores como dos trabalhadores;

–        o acordo‑quadro estabelece os princípios gerais e os requisitos mínimos relativos aos contratos de trabalho a termo, estabelecendo, nomeadamente, um quadro‑geral que visa garantir a igualdade de tratamento em relação aos trabalhadores contratados a termo, protegendo‑os contra discriminações, e evitar abusos decorrentes da utilização de sucessivas relações laborais a termo, remetendo para os Estados‑Membros e para os parceiros sociais a definição pormenorizada das modalidades de aplicação dos referidos princípios e requisitos, de forma a ter em conta a realidade e especificidades das situações nacionais, sectoriais e sazonais;

–        segundo as partes signatárias do acordo‑quadro, a utilização de contratos a termo com base em razões objectivas constitui uma forma de evitar abusos em detrimento dos trabalhadores.

8        Nos termos do artigo 1.° do acordo‑quadro, este tem por objectivo:

«a)      Melhorar a qualidade do trabalho sujeito a contrato a termo garantindo a aplicação do princípio da não discriminação;

b)      Estabelecer um quadro para evitar os abusos decorrentes da utilização de sucessivos contratos de trabalho ou relações laborais a termo.»

9        O artigo 5.° do acordo‑quadro dispõe:

«1. Para evitar os abusos decorrentes da conclusão de sucessivos contratos de trabalho ou relações laborais a termo e sempre que não existam medidas legais equivalentes para a sua prevenção, os Estados‑Membros, após consulta dos parceiros sociais e de acordo com a lei, acordos colectivos ou práticas nacionais, e/ou os parceiros sociais deverão introduzir, de forma a que se tenham em conta as necessidades de sectores e/ou categorias de trabalhadores específicos, uma ou várias das seguintes medidas:

a)      Razões objectivas que justifiquem a renovação dos supramencionados contratos ou relações laborais;

b)      Duração máxima total dos sucessivos contratos de trabalho ou relações laborais a termo;

c)      Número máximo de renovações dos contratos ou relações laborais a termo.

2. Os Estados‑Membros, após consulta dos parceiros sociais, e/ou os parceiros sociais, deverão, sempre que tal seja necessário, definir em que condições os contratos de trabalho ou relações de trabalho a termo deverão ser considerados:

a)      Como sucessivos;

b)      Como celebrados sem termo.»

 Factos na origem do litígio

10      Os recorrentes são todos antigos agentes auxiliares que foram contratados pelo Parlamento Europeu, por diversas vezes, em cada uma das quais através de um contrato de trabalho a termo, pelo prazo de duração dos trabalhos das suas sessões, de acordo com o artigo 78.° do ROA, para exercer funções de auxiliar de creche, puericultora, dactilógrafo, técnico, cozinheiro, professor de línguas, empregado de vestiário, encarregado de mudanças, oficial de diligências, técnico de reprografia, assistente e outras.

11      Perante a perspectiva de o Parlamento vir a recorrer, a partir de 1 de Janeiro de 2007, a pessoal temporário para satisfazer as suas necessidades de recursos humanos durante os períodos das sessões, o advogado dos recorrentes enviou, em 18 de Setembro de 2006, um requerimento ao director‑geral da Direcção‑Geral (DG) «Pessoal», que continha uma série de acusações contra o regime até então aplicável aos agentes auxiliares de sessão, nomeadamente, quanto à duração dos seus contratos de trabalho e ao direito a férias remuneradas, bem como à intenção do Parlamento de transformar, a partir de 1 de Janeiro de 2007, os antigos contratos de agente auxiliar de sessão em contratos de trabalho temporário. Em conclusão, o advogado dos recorrentes pedia que os contratos de agente auxiliar de sessão a termo destes fossem requalificados de contratos de agente contratual sem termo, a tempo parcial (mais precisamente, a um quarto de tempo), nos termos dos artigos 3.° ‑ A ou 3.° ‑ B do ROA, que os seus clientes fossem ressarcidos pelos períodos de férias remuneradas não pagos e que se pusesse termo a quaisquer relações contratuais existentes com a empresa de trabalho temporário à qual o Parlamento pretendia recorrer.

12      Após ter‑se reunido com o advogado dos recorrentes, em 9 de Outubro de 2006, o director‑geral da DG «Pessoal» respondeu, por carta de 26 de Outubro seguinte, no essencial, que era impossível recrutar os agentes auxiliares de sessão como agentes contratuais, nos termos dos artigos 3.° ‑ A ou 3.° ‑ B do ROA, e que a utilização de trabalhadores temporários para garantir o normal funcionamento das sessões do Parlamento em Estrasburgo (França) era lícita tanto à luz do ROA como à luz do direito francês.

13      Por carta de 19 de Dezembro de 2006, os recorrentes apresentaram uma pretensa reclamação contra a decisão de 26 de Outubro de 2006, que indeferiu o requerimento apresentado em 18 de Setembro de 2006, pedindo à EHCA que revogasse a referida decisão e, «em consequência, [considerasse] o conjunto dos [c]ontratos a [t]ermo que vinculavam os recorrentes ao Parlamento […] como [...] um único [c]ontrato [s]em [t]ermo prorrogado para além de 1 de Janeiro de 2007; [reintegrasse] todos [esses] agente[s] [através] de um [c]ontrato [s]em [t]ermo […] [e concedesse] a cada agente recorrente uma indemnização representativa do direito a férias remuneradas que adquiriram pelo seu contrato de trabalho relativamente a todos os períodos de trabalho cumpridos desde o início da sua contratação».

14      Em 20 de Abril de 2007, o director‑geral da DG «Pessoal» respondeu, após ter requalificado a carta de 19 de Dezembro de 2006 de «requerimento», na acepção do artigo 90.°, n.° 1, do Estatuto, que não lhe poderia dar seguimento favorável.

15      Em 21 de Junho de 2007, os recorrentes apresentaram uma reclamação contra a decisão de indeferimento de 20 de Abril de 2007.

16      Por decisão de 25 de Outubro de 2007, a EHCA indeferiu esta última reclamação.

 Tramitação processual e pedidos das partes

17      Por requerimento separado apresentado na Secretaria do Tribunal da Função Pública em 29 de Novembro de 2007, o Parlamento arguiu uma excepção de inadmissibilidade relativamente ao recurso, nos termos, de acordo com o Parlamento, do artigo 114.° do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias, aplicável mutatis mutandis ao Tribunal da Função Pública por força do artigo 3.°, n.° 4, da Decisão 2004/752/CE, Euratom do Conselho, de 2 de Novembro de 2004, que institui o Tribunal da Função Pública da União Europeia (JO L 333, p. 7), até à entrada em vigor do Regulamento de Processo deste último.

18      Por carta entrada na Secretaria do Tribunal da Função Pública em 21 de Janeiro de 2008, por fax (o original foi entregue em 24 de Janeiro de 2008), os recorrentes apresentaram observações sobre a excepção de inadmissibilidade.

19      Por despacho de 13 de Março de 2008, o Tribunal da Função Pública ordenou que se reservasse para final a decisão sobre a excepção de inadmissibilidade suscitada pelo Parlamento, de acordo com o artigo 78.°, n.° 3, segundo parágrafo, do Regulamento de Processo, aplicável desde 1 de Novembro de 2007, ou seja, desde uma data anterior à apresentação da referida excepção de inadmissibilidade.

20      Os recorrentes concluem pedindo que o Tribunal da Função Pública se digne:

–        anular a decisão do Parlamento Europeu, de 20 de Abril de 2007, que indeferiu a reclamação dos recorrentes de 19 de Dezembro de 2006.

Em consequência:

–        requalificar todos os contratos a termo que os vincularam ao Parlamento de contrato único sem termo;

–        declarar que o Parlamento tem a obrigação de os reintegrar através de um contrato sem termo;

–        decidir que os agentes do Parlamento designados auxiliares de sessão têm direito, relativamente a todos os períodos de trabalho cumpridos após o início da sua contratação, a uma indemnização representativa do direito a férias remuneradas que adquiriram pelo seu trabalho;

–        condenar o Parlamento a pagar a cada recorrente 2 000 euros a título de despesas de processo não reembolsáveis;

–        condenar o Parlamento Europeu nas despesas da presente instância.

21      O Parlamento conclui pedindo que o Tribunal da Função Pública se digne:

–        julgar manifestamente inadmissível a suposta acção por omissão;

–        julgar improcedente o recurso de anulação;

–        julgar inadmissível o pedido dos recorrentes no sentido de requalificar todos os contratos a termo que os vincularam ao Parlamento de contrato único sem termo;

–        julgar inadmissível o pedido no sentido de reintegrar todos estes agentes através de um contrato sem termo;

–        julgar improcedente o pedido no sentido de conceder aos requerentes uma indemnização representativa do direito a férias remuneradas;

–        julgar inadmissível o pedido no sentido de pagar a cada recorrente 2 000 euros a título de «despesas de processo não reembolsáveis»;

–        decidir nos termos legais quanto às despesas.

22      Por petição entrada na Secretaria do Tribunal da Função Pública em 21 de Janeiro de 2008, por fax (o original foi entregue no dia 28 do mesmo mês), os recorrentes pedem, designadamente, a anulação da decisão de 25 de Outubro de 2007, que indeferiu a reclamação por eles apresentada em 27 de Junho de 2007 (processo registado com a referência F‑10/08).

23      Na audiência, os recorrentes foram convidados pelo Tribunal da Função Pública a apresentar o seu último contrato de agentes auxiliares de sessão celebrado com o Parlamento antes de apresentarem a sua pretensa reclamação, em 19 de Dezembro de 2006. Os recorrentes satisfizeram a este pedido por carta entrada na Secretaria do Tribunal da Função Pública em 26 de Novembro de 2008, por fax (o original foi entregue em 1 de Dezembro de 2008). O Parlamento apresentou observações relativamente à referida carta em 12 de Dezembro de 2008, data na qual foi encerrada a fase oral e o processo concluso para deliberação.

 Quanto à admissibilidade do recurso

1.     Argumentos das partes

24      O Parlamento considera que o recurso é manifestamente inadmissível.

25      Com efeito, de acordo com o Parlamento, a primeira carta do advogado dos recorrentes, datada de 18 de Setembro de 2006, constitui apenas um conjunto de reflexões, nomeadamente, sobre a legalidade do artigo 78.° do ROA, sobre a situação jurídica dos agentes auxiliares de sessão e sobre a solução adoptada pelo Parlamento de recorrer, a partir de 1 de Janeiro de 2007, a trabalhadores temporários.

26      Esta carta não continha qualquer convite preciso e à EHCA para que tomasse uma decisão relativamente aos recorrentes e terminava com uma proposta de encontro com o director‑geral da DG «Pessoal» para discutir o assunto. Tal encontro teve, de resto, lugar em 9 de Outubro de 2006.

27      A resposta do director‑geral da DG «Pessoal», em 26 de Outubro de 2006, era desprovida de carácter decisório, tendo, tão só, como objectivo sintetizar a posição do Parlamento relativamente às principais questões invocadas nesse encontro.

28      Em contrapartida, a carta dos recorridos de 19 de Dezembro de 2006 continha pedidos precisos e devia ser qualificada de requerimento na acepção do artigo 90.°, n.° 1, do Estatuto, e não de reclamação, na ausência, até essa data, de qualquer decisão tomada pelo Parlamento susceptível de causar prejuízo aos recorrentes.

29      O Parlamento observa que, em consequência, os recorrentes puderam, validamente, apresentar, em 21 de Junho de 2007, uma reclamação contra a decisão da EHCA, de 20 de Abril de 2007, que indeferiu o referido requerimento. Esta reclamação foi indeferida pela decisão da EHCA de 25 de Outubro de 2007.

30      Neste contexto, havia que considerar extemporâneo e, consequentemente, inadmissível, o recurso interposto em 29 de Junho de 2007, uma vez que, nessa data, a fase pré‑contenciosa não estava terminada.

31      Em seguida, o Parlamento contesta a admissibilidade dos pedidos constantes da petição, no sentido de, por um lado, qualificar todos os contratos a termo celebrados por cada um dos recorrentes com o Parlamento de contrato único sem termo e, por outro, declarar que o Parlamento tem a obrigação de reintegrar todos os agentes em causa através de contratos sem termo.

32      De acordo com o Parlamento, apenas a EHCA pode contratar um agente temporário ou auxiliar. Além disso, no quadro da competência de anulação que lhe é reconhecida pelo artigo 230.° CE, não cabe ao juiz comunitário dirigir injunções às instituições. O Parlamento acrescenta que o artigo 233.° CE prevê uma repartição de competências entre a autoridade judiciária e a autoridade administrativa, no sentido em que cabe à instituição da qual emana o acto anulado determinar quais são as medidas necessárias para executar um acórdão de anulação, exercendo, sob o controlo do juiz comunitário, o poder de apreciação de que dispõe para esse efeito e respeitando tanto o dispositivo e a fundamentação do acórdão que tem de executar como as disposições de direito comunitário.

33      Por último, na audiência, o Parlamento considerou que o recurso era, igualmente, inadmissível porque os contratos de agente temporário a termo que vinculavam os recorrentes ao Parlamento nunca tinham sido impugnados nos prazos previstos nos artigos 90.° e 91.° do Estatuto.

34      Os recorrentes consideram, pelo contrário, que a carta de 18 de Setembro de 2006 constitui um requerimento na acepção do artigo 90.°, n.° 1, do Estatuto. Declaram, contudo, ter interposto novo recurso da decisão de 25 de Outubro de 2007, para o caso de a carta de 18 de Setembro de 2006 ser qualificada de requerimento.

2.     Apreciação do Tribunal da Função Pública

35      Importa recordar, em primeiro lugar, que, segundo jurisprudência constante, a qualificação jurídica de uma carta ou de uma nota de requerimento na acepção do artigo 90.°, n.° 1, do Estatuto, decorre exclusivamente da apreciação do Tribunal e não da vontade das partes (despachos do Tribunal de Primeira Instância de 15 de Julho de 1993, Hogan/Parlamento, T‑115/92, Colect. p. II‑895, n.° 36, e de 20 de Agosto de 1998, Collins/Comité das Regiões, T‑132/97, ColectFP, pp. I‑A‑469 e II‑1379, n.° 12 a 16).

36      No caso em apreço, resulta claro que os recorrentes requereram, através de carta de 18 de Setembro de 2006, que todos os contratos de agente auxiliar de sessão relativos a cada um deles fossem requalificados de contrato de agente contratual sem termo, a tempo parcial, nos termos dos artigos 3.° ‑ A e 3.° ‑ B do ROA, bem como o pagamento de uma indemnização compensatória das férias remuneradas relativamente aos períodos de trabalho cumpridos, e que se pusesse termo a quaisquer relações contratuais existentes com a empresa de trabalho temporário à qual o Parlamento pretendia recorrer. Essa carta deve ser qualificada de requerimento na acepção do artigo 90.°, n.° 1, do Estatuto.

37      O facto de este requerimento conter um convite para «discutir» o assunto com o «director de recursos humanos» do Parlamento não põe em causa a sua qualificação jurídica.

38      Neste contexto, há que qualificar a carta de 19 de Dezembro de 2006 de reclamação contra a decisão de 26 de Outubro 2006, que indeferiu o requerimento de 18 de Setembro de 2006, reclamação essa que foi objecto de uma decisão de indeferimento da AIPN, em 20 de Abril de 2007.

39      Importa, em segundo lugar, analisar a questão de saber se, ao apresentar um requerimento, na acepção do artigo 90.°, n.° 1, do Estatuto, os recorrentes aplicaram correctamente o procedimento administrativo prévio, tal como está previsto nos artigos 90.° e 91.° do Estatuto, para os quais remete o artigo 46.° do ROA.

40      A este respeito, é jurisprudência uniforme que, quando exista uma decisão da AIPN que constitua um acto que cause prejuízo a um funcionário, este, se pretender pedir a anulação, a reforma ou o arquivamento dessa decisão, não deve apresentar um requerimento, na acepção do artigo 90.°, n.° 1, do Estatuto, mas sim utilizar o procedimento da reclamação, previsto no artigo 90.°, n.° 2 (v., neste sentido, despachos do Tribunal de Primeira Instância de 7 de Junho de 1991, Weyrich/Comissão, T‑14/91, Colect., p.II‑235, n.° 32 e 34, e de 1 de Abril de 2003, Mascetti/Comissão, T‑11/01, ColectFP, pp. I‑A‑117 e II‑579, n.° 33, e acórdão do Tribunal da Função Pública de 28 de Junho de 2006, Le Maire/Comissão, F‑27/05, ColectFP, pp. I‑A‑1‑47 e II‑A‑1‑159, n.° 36).

41      No caso em apreço, tal como resulta do n.° 36 do presente acórdão, através do seu requerimento de 18 de Setembro de 2006, os recorrentes pretendiam obter da parte da administração, por um lado, a transformação dos seus sucessivos contratos de agente auxiliar de sessão em contratos únicos de agente contratual sem termo, nos termos dos artigos 3.° ‑ A ou 3.° ‑ B do ROA e, por outro, o pagamento de uma indemnização pelo prejuízo sofrido por não lhes terem sido concedidas férias remuneradas relativamente aos períodos de trabalho cumpridos.

42      Quanto ao primeiro aspecto, na audiência, o Parlamento alegou, no essencial, que os recorrentes deveriam ter, dentro dos prazos previstos, utilizado o procedimento de reclamação, previsto no artigo 90.°, n.° 2, do Estatuto, pelo menos contra o seu último contrato de agente auxiliar de sessão, por este não ter sido celebrado sem termo.

43      É um facto que, normalmente, um contrato produz os seus efeitos a partir da data da sua assinatura. É, por isso, a partir da data da assinatura que se deve contar o prazo para apresentar uma reclamação em tempo útil na acepção do artigo 90.°, n.° 2, do Estatuto (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 11 de Julho de 2002, Martínez Páramo e o./Comissão, T‑137/99 e T‑18/00, ColectFP, pp. I‑A‑119 e II‑639, n.° 56). Assim, no caso em apreço, teria sido aceitável que os recorrentes tivessem apresentado, formalmente, uma reclamação contra um dos seus últimos contratos de agente auxiliar de sessão por este não ter sido celebrado sem termo, nem com base nos artigos 3.° ‑ A ou 3.° ‑ B do ROA.

44      Todavia, tendo em conta a natureza das acusações suscitadas pelos recorrentes e dos argumentos invocados para as apoiar, bem como todos os períodos de trabalho cumpridos no Parlamento, na qualidade de agentes auxiliares de sessão, era‑lhes, igualmente, possível, à luz do sistema de recursos tal como está previsto nos artigos 90.° e 91.° do Estatuto, numa primeira fase, convidar o Parlamento, através de um requerimento na acepção do artigo 90.°, n.° 1, do Estatuto, a exercer o seu poder de apreciação com pleno conhecimento das acusações e dos argumentos apresentados e a tomar, formalmente, uma decisão quanto à possibilidade de qualificar todos os contratos controvertidos de contratos sem termo, decisão essa susceptível de vir a ser impugnada por meio de uma reclamação e, posteriormente, se fosse caso disso, de um recurso.

45      Em todo o caso, se houver que acolher, quanto a este aspecto, a tese do Parlamento, há que observar que pode, facilmente, considerar‑se que a reclamação apresentada pelos recorrentes em 19 de Dezembro de 2006, atendendo ao seu objectivo e ao seu conteúdo, se dirige aos últimos contratos de agente auxiliar de sessão celebrados, nos três meses anteriores, entre o Parlamento e os recorrentes, tendo sido apresentada por estes, a pedido do Tribunal, cópia desses contratos. O facto de esses contratos terem sido apresentados no final da fase oral do processo, sem que a parte recorrida tenha, por seu turno, levantado objecções a este respeito, não implica a inadmissibilidade formal da petição.

46      Quanto ao segundo aspecto do requerimento de 18 de Setembro de 2006, uma vez que os pedidos de indemnização dos recorrentes tiveram origem no pretenso comportamento ilegal do Parlamento, na medida em que, durante longos anos, não terá reconhecido aos recorrentes qualquer direito a férias remuneradas, porquanto os contratos de agente auxiliar de sessão foram celebrados por prazos muito curtos, cabia aos recorrentes apresentar um requerimento de acordo com o artigo 90.°, n.° 1, do Estatuto, convidando a EHCA a reparar o alegado prejuízo e, eventualmente, prosseguir com uma reclamação contra a decisão de indeferimento do requerimento. Ora, foi exactamente o que aconteceu no caso em apreço, tal como resulta dos n.os 41 a 44 do presente acórdão.

47      Há, pois, que considerar que o presente recurso é dirigido contra a decisão de 26 de Outubro de 2006, que indeferiu o requerimento de 18 de Setembro de 2006 (a seguir «decisão impugnada»), quer no que respeita ao pedido de requalificação dos sucessivos contratos de agente auxiliar de sessão de cada um dos recorrentes de contrato de agente contratual sem termo, nos termos dos artigos 3.° ‑ A ou 3.° ‑ B do ROA, quer no que respeita ao pedido de indemnização.

48      Em terceiro e último lugar, importa tomar posição relativamente ao alcance ou à admissibilidade de determinados pedidos apresentados no recurso.

49      Os recorrentes convidam o Tribunal da Função Pública, designadamente, a:

«–      [anular] a decisão expressa do Parlamento […], de 20 de Abril de 2007, que indeferiu a reclamação [dos recorrentes] de 19 de Dezembro de 2006 [...]».

Em consequência:

–        «[requalificar] todos os [c]ontratos a [t]ermo que [os] vincularam [...] ao Parlamento […] de [c]ontrato único [s]em [t]ermo;

–        [declarar] que o Parlamento [...] tem a obrigação de [os] reintegrar [...] através de um [c]ontrato [s]em [t]ermo;

–        [decidir] que os agentes do Parlamento [...] designados [a]uxiliares de [s]essão têm direito, relativamente a todos os períodos de trabalho cumpridos após o início da sua contratação, a uma indemnização por conta do direito a férias remuneradas que adquiriram pelo seu trabalho».

50      Através do primeiro pedido acima mencionado, os recorrentes pedem a anulação da decisão de 20 de Abril de 2007, que indeferiu a reclamação por eles apresentada. A este respeito, há que recordar que, de acordo com a jurisprudência, a reclamação administrativa e o seu indeferimento, tácito ou expresso, pela administração fazem parte integrante de um processo complexo. Nestas condições, um recurso para o Tribunal, ainda que formalmente interposto contra o indeferimento da reclamação do funcionário, tem por efeito submeter à apreciação do Tribunal o acto lesivo contra o qual foi apresentada a reclamação (acórdãos do Tribunal de Justiça de 17 de Janeiro de 1989, Vainker/Parlamento, 293/87, Colect., p. 23, n.° 8, e de 7 de Fevereiro de 1990, Culin/Comissão, C‑343/87, Colect., p. I‑225, n.° 7, acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 16 de Outubro de 1996, Capitanio/Comissão, T‑36/94, ColectFP, pp. I‑A‑449 e II‑1279, n.° 33, e de 7 de Junho de 2005, Cavallaro/Comissão, T‑375/02, ColectFP, pp. I‑A‑151 e II‑673, n.° 59). Assim, no caso em apreço, deve considerar‑se que o recurso é dirigido contra a decisão de 26 de Outubro de 2006, que indefere o requerimento dos recorrentes de 18 de Setembro de 2006.

51      Através dos segundo e terceiro pedidos mencionados acima, os recorrentes pedem, na verdade, ao Tribunal da Função Pública que dirija injunções à instituição em causa ou que proceda ele próprio às valorações jurídicas requeridas.

52      Ora, no quadro de um recurso interposto nos termos do artigo 91.° do Estatuto, o órgão jurisdicional comunitário não pode, sem usurpar as prerrogativas da autoridade administrativa, proferir declarações ou constatações de princípio ou dirigir injunções às instituições comunitárias (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 27 de Junho de 1991, Valverde Mordt/Tribunal de Justiça, T‑156/89, Colect., p. II‑407, n.° 150, e de 8 de Junho de 1995, P/Comissão, T‑583/93, ColectFP, pp. I‑A‑137 e II‑433, n.os 17 e 18, e despacho do Tribunal da Função Púbica de 16 de Maio de 2006, Voigt/Comissão F‑55/05, ColectFP, pp. I‑A‑1‑15 e II‑A‑1‑51, n.° 25).

53      Por isso, há que negar provimento aos segundo e terceiro pedidos acima mencionados por serem inadmissíveis.

54      Por último, quanto ao quarto pedido, há que observar que mais não é do que uma reiteração do conteúdo do segundo aspecto do requerimento de 18 de Setembro de 2006, mencionado nos n.os 36 e 46 do presente acórdão, tal como foi indeferido pela decisão de 26 de Outubro de 2006, contra a qual é apresentado o presente recurso. O quarto pedido confunde‑se, assim, com o primeiro, tal como especificado acima.

 Quanto ao pedido de anulação

1.     Argumentos das partes

55      A argumentação apresentada pelos recorrentes em apoio do seu recurso de anulação deve ser entendida como assentando numa excepção de ilegalidade contra o artigo 78.° do ROA.

56      Os recorrentes consideram que o artigo 78.° do ROA, ao submeter os agentes auxiliares de sessão às condições de recrutamento e de remuneração previstas num acordo celebrado entre o Parlamento, o Conselho da Europa e a Assembleia da União da Europa Ocidental (UEO, a seguir «acordo»), teve como consequência excluir esta categoria de agentes do campo de aplicação da legislação comunitária aplicável aos funcionários, bem como aos agentes contratuais e auxiliares, e até subtraí‑los à aplicação das normas jurídicas estaduais ou comunitárias.

57      Daqui resultou, de acordo com os recorrentes, que, durante anos, os agentes auxiliares de sessão trabalharam numa situação não tutelada pelo Direito.

58      Ora, cabia ao Conselho da União Europeia, de acordo com o artigo 283.° CE, conceder aos agentes em causa um estatuto, ainda que adaptado às condições específicas das funções por eles exercidas, e não excluí‑los de qualquer estatuto, tal como resulta da aplicação do artigo 78.° do ROA.

59      Os recorrentes acrescentam que sujeitar o destino de cerca de 300 agentes à vontade exclusiva de três empregadores, ainda que se trate de entidades públicas, é uma aberração jurídica, uma vez que o acordo entre o Parlamento, o Conselho da Europa e a Assembleia da UEO não é uma fonte de direito. Este acordo constitui uma fonte de direito contratual apenas no que respeita às relações entre as três instituições, mas não no que respeita às relações entre estas e os seus agentes. O acordo não tem nem valor regulamentar, nem valor estatutário, nem valor contratual.

60      Em consequência, importa afastar as disposições do artigo 78.° do ROA e, na falta de legislação nacional aplicável, aplicar os princípios fundadores da União Europeia.

61      A este respeito, os recorrentes invocam, em primeiro lugar, a Carta Social Europeia, assinada em Turim, em 18 de Outubro de 1961, que assegura condições de trabalho equitativas em matéria de remuneração e de duração do trabalho e que proíbe qualquer tipo de discriminação.

62      Alegam, a este respeito, que a única diferença objectiva que podia estabelecer‑se entre os agentes auxiliares de sessão e outras categorias de agentes com contratos de trabalho sem termo é a que resulta do funcionamento específico das sessões plenárias do Parlamento, em Estrasburgo. Assim, o Parlamento tinha o direito de empregar agentes auxiliares de sessão apenas 5 dias por mês, atendendo ao carácter específico das funções por eles desempenhadas. Mas nem por isso podia colocá‑los numa situação precária e submetê‑los à vontade exclusiva, ainda que conjugada, de três empregadores públicos.

63      O Parlamento tinha, por isso, criado uma discriminação entre agentes que exercem o mesmo tipo de funções, quando nada justificava, objectivamente, tal discriminação e o artigo 283.° CE não permitia que se excluísse uma categoria de agentes do direito a dispor de um estatuto.

64      Os recorrentes acrescentam que os agentes auxiliares de sessão são recrutados para lugares permanentes de acordo com um ciclo de trabalho específico e não para lugares precários.

65      Em segundo lugar, os recorrentes invocam a Convenção n.° 111 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), sobre a discriminação em matéria de emprego e profissão, adoptada em 25 de Junho de 1958, e a Convenção n.° 158 da OIT, relativa à cessação do contrato de trabalho por iniciativa do empregador, adoptada em 22 de Junho de 1982, em especial o artigo 4.° desta última convenção, nos termos do qual «[u]m trabalhador não deverá ser despedido sem que exista um motivo válido de despedimento relacionado com a aptidão ou com o comportamento do trabalhador, ou baseado nas necessidades de funcionamento da empresa, estabelecimento ou serviço».

66      Ora, no caso em apreço, o Parlamento, através do sistema que implementou em relação aos agentes auxiliares de sessão, estaria em posição, pelo menos potencialmente, de despedir estes agentes no termo de cada contrato de cinco dias, sem que os interessados pudessem recorrer a uma protecção jurisdicional eficaz. Além disso, a externalização das suas funções para uma agência de trabalho temporário, na medida em que implica a cessação do contrato de trabalho com o Parlamento, constituiria um verdadeiro despedimento injustificado.

67      Em terceiro lugar, os recorrentes invocam o acordo‑quadro, que estabelece, no segundo parágrafo do preâmbulo, que os contratos de trabalho sem termo são a forma comum no que respeita às relações laborais entre empregadores e trabalhadores. Os recorrentes sublinham que só o trabalho sem termo assegura ao trabalhador uma situação verdadeiramente coberta pelo Direito, a estabilidade de emprego e a protecção dos seus direitos fundamentais.

68      Por último, os recorrentes consideram que o acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 16 de Julho de 1998, Gebhard/Parlamento (T‑109/96, Colect., p. II‑2785), é anterior à Directiva 1999/70 e não tem por objecto o estatuto dos agentes auxiliares de sessão. Além disso, contrariamente ao que resulta do n.° 41 daquele acórdão, os lugares de agente auxiliar de sessão não satisfazem necessidades pontuais.

69      O Parlamento observa que, através do seu recurso, os recorrentes pretendem invocar que o legislador comunitário não cumpriu a sua obrigação, estabelecida no artigo 283.° CE, de criar um estatuto próprio para os agentes auxiliares de sessão. O recurso devia, por isso, ser apreciado como uma acção por omissão. Ora, de acordo com o Parlamento, tal acção deve ser considerada improcedente por inadmissível, pelos motivos abaixo expostos.

70      Em primeiro lugar, a acção devia, pelo menos, ter sido intentada contra o Conselho, que, de acordo com o artigo 283.° CE, é o legislador na matéria em causa.

71      Em segundo lugar, de acordo com jurisprudência uniforme, só é possível intentar uma acção por omissão se a omissão da instituição se mantiver após ter sido convidada a agir e, portanto, se a instituição não se pronunciar ou responder em termos dilatórios. A acção por omissão está excluída quando a instituição tome uma posição diferente da que lhe é pedida, caso em que o interessado pode optar pela via do recurso de anulação.

72      Ora, no caso em apreço, uma vez que o Parlamento, na sequência do envio da carta de 19 de Dezembro de 2006 e da apresentação da reclamação de 21 de Junho de 2007, não deixou de se pronunciar nem respondeu em termos dilatórios, o único recurso que os recorrentes podiam interpor era o de anulação.

73      Em terceiro lugar, uma acção por omissão só é admissível, nos termos do artigo 230.°, parágrafo quarto, CE, se o recorrente for o destinatário do acto. Como resulta de jurisprudência uniforme, há que julgar improcedente por inadmissível uma acção por omissão que visa obter uma disposição de carácter geral e normativo e não um acto que diga directa e individualmente respeito ao recorrente.

74      Ora, no caso em apreço, a acção visava a adopção de um novo regime aplicável a todos os agentes auxiliares de sessão.

75      Em quarto lugar, o Parlamento tem dúvidas quanto à possibilidade de se intentar uma acção por omissão no Tribunal da Função Pública. Nos termos do artigo 3.°, n.° 1, alínea c), da Decisão 88/591/CECA, CEE, Euratom do Conselho, de 24 de Outubro de 1988, que institui um Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias (JO L 319, p. 1), é ao Tribunal de Primeira Instância que compete apreciar as acções intentadas contra uma instituição por pessoas singulares ou colectivas. Ora, esta repartição de competências não foi modificada quando foi criado o Tribunal da Função Pública.

76      A título subsidiário, na hipótese de acção por omissão ser considerada admissível pelo Tribunal da Função Pública, o Parlamento considera que não existiu qualquer omissão por parte do legislador e que, logo, deve ser julgada improcedente. De facto, o artigo 283.° CE foi implementado através da adopção, pelo Conselho, do ROA, que contém o artigo 78.°, que se aplica especificamente à situação dos agentes auxiliares de sessão.

77      O argumento dos recorrentes de que os auxiliares de sessão ficaram numa situação não coberta pelo Direito é contrariado pela realidade. De acordo com o Parlamento, estes agentes integram a categoria dos agentes auxiliares abrangida pelo título III do ROA e, salvo disposições derrogatórias relativas ao seu recrutamento e à sua remuneração, beneficiavam de todos os direitos e estavam sujeitos a todas as obrigações dos agentes auxiliares: assim, beneficiavam da protecção da segurança social, pagavam impostos e, se o desejassem, podiam inscrever‑se no seguro de desemprego, como os demais agentes auxiliares.

78      Além disso, quanto à excepção de ilegalidade suscitada pelos recorrentes e baseada na incompatibilidade do artigo 78.° do ROA com determinados instrumentos internacionais, o Parlamento tem dúvidas quanto à sua admissibilidade dada a falta de conexão jurídica entre as decisões individuais impugnadas e o acto de carácter geral cuja ilegalidade é suscitada. De facto, as decisões individuais objecto do recurso são constituídas pela recusa da EHCA, datada de 20 de Abril de 2007, de requalificar os contratos dos recorrentes. Ora, nessa data, já não existia qualquer conexão entre esta decisão da administração e o artigo 78.° do ROA, que não é aplicável desde 1 de Janeiro de 2007.

79      Acresce que o ROA, enquanto regulamento adoptado pelo legislador comunitário, impunha‑se a todos os sujeitos jurídicos, entre os quais as instituições. Por isso, o Parlamento tinha sido obrigado a aplicar as disposições do ROA no quadro do recrutamento dos agentes auxiliares de sessão, recordando‑se que, de acordo com a jurisprudência, os actos comunitários beneficiam da presunção de validade, enquanto não forem anulados por um órgão jurisdicional comunitário ou até que este os declare inválidos.

80      Em todo o caso, o Parlamento observa que o respeito da Carta Social Europeia, assinada em Turim, em 18 de Outubro de 1961, está sujeito ao controlo do Comité Europeu dos Direitos Sociais do Conselho da Europa e que as convenções da OIT, que pertencem ao direito internacional geral, não constituem fonte de direito comunitário, uma vez que não foram celebradas ao nível comunitário. Dado que as Comunidades não estão vinculadas por aquelas convenções, os recorrentes não têm o direito de invocar a incompatibilidade do artigo 78.° do ROA com as suas disposições. Além disso, uma vez que as convenções invocadas não pertencem à ordem jurídica comunitária, não poderiam conceder direitos aos recorrentes nas suas relações com o Parlamento.

81      Por último, o Parlamento invoca o acórdão Gebhard/Parlamento, já referido, do qual resulta que «[o] artigo 78.° do ROA destina‑se assim a permitir à instituição parlamentar das Comunidades Europeias satisfazer as necessidades pontuais e maciças em recursos humanos de apoio necessários ao bom funcionamento das sessões dos seus diferentes órgãos deliberativos» (n.° 41). O Parlamento sublinha que, nesse acórdão, o Tribunal da Função Pública concluiu que não se afigurava «que o Parlamento tenha excedido os limites da derrogação que lhe é permitida pelo Conselho no artigo 78.° do ROA, ao estabelecer, por força desta disposição, a regulamentação interna aplicável aos intérpretes de sessão» (n.° 43).

82      Tal conclusão aplicava‑se, igualmente, à legislação relativa aos auxiliares de sessão em geral, na medida em que a derrogação estabelecida no artigo 78.° do ROA abrangia todos os agentes auxiliares contratados pelo Parlamento pelo prazo de duração dos trabalhos das suas sessões.

83      O Parlamento acrescenta que o acórdão Gebhard/Parlamento, já referido, foi confirmado por jurisprudência posterior à Directiva 1999/70 (acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 10 de Junho de 2004, Alvarez Moreno/Parlamento, T‑275/01, ColectFP, pp. I‑A‑171 e II‑765, bem como Garroni/Parlamento, T‑276/01, ColectFP, pp. I‑A‑177 e II‑795, e acórdão do Tribunal da Função Pública de 14 de Dezembro de 2006, André/Comissão, F‑10/06, ColectFP, pp. I‑A‑1‑183 e II‑A‑1‑755).

2.     Apreciação do Tribunal da Função Pública

84      Em apoio do seu recurso de anulação da decisão impugnada, na medida em que os contratos controvertidos não foram requalificados de contratos de trabalho sem termo, a tempo parcial, nem baseados nos artigos 3.° ‑ A ou 3.° ‑ B do ROA, os recorrentes suscitam uma excepção de ilegalidade contra o artigo 78.° do ROA.

85      Há que recordar, a título preliminar, que o artigo 78.° do ROA autoriza uma derrogação ao regime dos agentes auxiliares, estabelecido no título III do ROA, ao permitir que o Parlamento limite à duração dos trabalhos das suas sessões o período de contratação dos agentes auxiliares necessários à sua organização. De facto, tal como o Tribunal de Justiça observou no acórdão de 11 de Julho de 1985, Maag/Comissão (43/84, Recueil, p. 2581, n.° 19), a propósito dos intérpretes «free‑lance»recrutados pela Comissão, o regime dos agentes auxiliares não pode, em princípio, ser aplicado a contratos de curta duração frequentemente renovados todos os anos. O mesmo se aplicaria, na falta da derrogação constante do artigo 78.° do ROA, ao recrutamento de pessoas apenas pelo prazo de duração das sessões do Parlamento.

86      Como sublinhou, igualmente, o Tribunal de Primeira Instância, no acórdão Gebhard/Parlamento Europeu (já referido, n.os 40 e 41), o artigo 78.° do ROA destina‑se a permitir ao Parlamento satisfazer as necessidades pontuais e maciças em recursos humanos de apoio necessários ao bom funcionamento das sessões dos seus diferentes órgãos deliberativos. Para o efeito, a disposição em causa remete para as condições de contratação anteriormente acordadas, em relação ao pessoal de apoio necessário à assistência das actividades parlamentares, entre três instituições ou organizações europeias especificamente interessadas a este respeito. O artigo 78.°, segundo parágrafo, do ROA dispõe que as disposições deste acordo, assim como qualquer modificação posterior das mesmas, serão levadas ao conhecimento das autoridades orçamentais competentes um mês antes da sua entrada em vigor.

 Quanto à admissibilidade da excepção de ilegalidade

87      A este respeito, há que recordar que, de acordo com a jurisprudência, para que uma excepção de ilegalidade seja admissível, é necessário que exista uma conexão suficientemente estreita entre a decisão individual impugnada e a disposição cuja ilegalidade se suscita, de forma a que a inaplicabilidade de uma tenha necessariamente influência sobre a legalidade da outra (ver, nesse sentido, acórdãos do Tribunal de Justiça de 13 de Julho de 1966, Itália/Conselho e Comissão, 32/65, Colect. 1965‑1968, p. 483; Recueil, pp. 563, 594, e de 5 de Outubro de 2000, Conselho/Chvatal e o., C‑432/98 P e C‑433/98 P, Colect., p. I‑8535, n.° 33).

88      No caso em apreço, uma vez que o recurso é interposto do indeferimento do requerimento dos recorrentes, de 18 de Setembro de 2006, no sentido de que os seus sucessivos contratos de agente auxiliar de sessão a termo fossem requalificados de contrato único de agente contratual sem termo e a tempo parcial, nos termos dos artigos 3.° ‑ A ou 3.° ‑ B do ROA, há que observar que a decisão impugnada se apresenta como tendo sido adoptada com base no artigo 78.° do ROA, de modo que a ilegalidade deste artigo, caso venha a ser demonstrada seja com que fundamento for, deve ter, necessariamente, influência sobre o indeferimento do pedido dos recorrentes.

89      Contudo, na hipótese de o artigo 78.° do ROA ser ilegal e dever ser declarado inaplicável ao caso em apreço, a excepção de ilegalidade suscitada pelos recorrentes nem por isso pode conduzir à anulação da decisão impugnada se se verificar que o ROA não contém uma disposição específica que possa constituir uma base jurídica adequada para satisfazer o pedido dos recorrentes no sentido de obterem um contrato de trabalho sem termo e a tempo parcial. No caso vertente, os recorrentes basearam o seu pedido, a este respeito, nos artigos 3.° ‑ A ou 3.° ‑ B do ROA. Assim, ainda que esta questão esteja mais relacionada com a relevância e, consequentemente, com a procedência da excepção de ilegalidade suscitada pelos recorrentes do que com a sua admissibilidade, é útil, nesta fase da sua análise, apurar se os artigos 3.° ‑ A e 3.° ‑ B são susceptíveis, à primeira vista, de constituir a base jurídica adequada, referida supra, de modo a delimitar o verdadeiro objecto do presente litígio.

90      De acordo com o ROA, apenas os contratos de agente temporário, na acepção do artigo 2.°, alíneas a) ou c), ou de agente contratual, na acepção do artigo 3.° ‑ A, podem ser celebrados sem termo, nas condições previstas, respectivamente, nos artigos 8.° e 85.° do ROA. Ora, os recorrentes não podiam, manifestamente, pretender celebrar um contrato na acepção do artigo 2.°, alínea c), do ROA, que se destina a agentes temporários a exercer funções junto de pessoa que exerça funções previstas pelos Tratados. Também não podiam, atendendo à natureza dos serviços por eles prestados, respondendo a necessidades intermitentes e de muito curta duração, que se repetem todos os meses, reivindicar a qualidade de agente temporário na acepção do artigo 2.°, alínea a), do ROA, que ocupa, ao serviço da administração comunitária, um lugar permanente, «pertencente ao quadro de efectivos anexo à secção do orçamento correspondente a cada instituição» e, como sublinhou o Tribunal de Justiça no acórdão Maag/Comissão (já referido, n.° 17), inconciliável com as tarefas do pessoal de apoio.

91      O artigo 3.° ‑ A do ROA, que permite, igualmente, a celebração de contratos sem termo e a tempo parcial, destina‑se, em contrapartida, à contratação de agentes não afectados a um lugar «previsto no quadro de efectivos anexo à secção do orçamento correspondente à instituição em causa» para, nomeadamente, «executar tarefas manuais ou administrativas de apoio». Não deve excluir‑se à primeira vista, na hipótese de o artigo 78.° do ROA não se aplicar por causa da sua ilegalidade, que o recurso ao artigo 3.° ‑ A do ROA possa satisfazer o pedido dos recorrentes no sentido de lhes ser concedido um contrato sem termo e a um quarto do tempo.

92      Contudo, o Parlamento alega que, por força do artigo 1.°, terceiro parágrafo, do Anexo IV‑A do Estatuto, para o qual remete o artigo 55.° ‑ A, n.° 4, do Estatuto, aplicável, por analogia, aos agentes contratuais (tal como, de resto, aos agentes temporários), de acordo com os artigos 16.° e 91.°, conjugados, do ROA, o trabalho a tempo parcial de um agente contratual não pode ter uma duração inferior a metade do tempo de trabalho normal. Esta disposição exclui, por isso, em todo o caso, a possibilidade de o Parlamento celebrar contratos de agente contratual a um quarto do tempo com pessoal afectado unicamente aos trabalhos dos períodos das sessões.

93      Esta interpretação do artigo 1.°, terceiro parágrafo, do anexo IV‑A do Estatuto não merece acolhimento. De facto, o artigo 55.° ‑A do Estatuto, cujas modalidades de aplicação são definidas no referido anexo, dizem respeito apenas ao tratamento de um pedido de um funcionário no sentido de obter autorização para exercer a sua actividade a tempo parcial. Não dispõe sobre as condições nas quais uma instituição pode tomar a iniciativa de celebrar um contrato a tempo parcial devido à própria natureza do trabalho abrangido por aquele.

94      Resulta do que antecede que a excepção de ilegalidade suscitada pelos recorrentes visava não apenas questionar a legalidade do artigo 78.° do ROA, mas podia, igualmente, ter como consequência, tendo em conta a inaplicabilidade deste artigo, conduzir a que o Parlamento, para satisfazer as necessidades pontuais e maciças em recursos humanos, durante os períodos das suas sessões, recorra a outras soluções de natureza contratual, entre as quais não pode excluir‑se, à primeira vista, o recurso ao artigo 3.° ‑ A do ROA.

95      Face a uma conexão suficientemente estreita entre a decisão impugnada, por um lado, e o artigo 78.° do ROA, por outro, contra o qual a excepção é suscitada, há, portanto, que considerar que os recorrentes têm legitimidade para contestar, a título incidental, a legalidade do artigo 78.° do ROA.

 Quanto à procedência da excepção de ilegalidade

96      No quadro da excepção de ilegalidade deduzida contra o artigo 78.° do ROA pelos recorrentes, estes acusam o legislador comunitário de não ter consagrado uma regulamentação específica relativamente aos agentes auxiliares de sessão, adaptada às condições específicas das funções por eles exercidas, e de ter renunciado à adopção de normas estatutárias, remetendo para um acordo de natureza contratual celebrado entre o Parlamento, o Conselho da Europa e a Assembleia da UEO. Os recorrentes permaneceram, assim, numa situação de indefinição jurídica e numa relação de trabalho precária, apesar de serem recrutados para satisfazer necessidades permanentes, ainda que intermitentes. Neste aspecto, o artigo 78.° ROA é ilegal por diferentes razões:

–        em primeiro lugar, o legislador comunitário, desse modo, abdica das suas responsabilidades em matéria estatutária, em violação do artigo 283.° CE;

–        em segundo lugar, cria uma discriminação entre, por um lado, os agentes que beneficiam de um regime regulamentar completo e estável e, por outro lado, os agentes auxiliares de sessão, em violação da Carta Social Europeia, assinada em Turim, em 18 de Outubro de 1961, e da Convenção n.° 111 da OIT e,

–        em terceiro lugar, afecta a estabilidade de emprego que os recorrentes podiam pretender, em violação da Convenção n.° 158 da OIT e da Directiva 1999/70.

 Quanto à alegada violação do artigo 283.° CE

97      A este respeito, há que observar que os agentes auxiliares de sessão integram o título III do ROA, relativo aos agentes auxiliares, que apenas não se lhes aplica no que respeita às condições de recrutamento e de remuneração, que são as previstas no acordo. Tal significa que as demais disposições do título III, relativas, nomeadamente, às condições de trabalho e à segurança social, continuam a ser aplicáveis, independentemente das regras internas específicas, adoptadas pela Mesa ou pelo Secretário‑Geral do Parlamento e destinadas a aplicar ou a completar as normas do ROA.

98      Afigura‑se, assim, que, até 31 de Dezembro de 2006, o pessoal contratado pelo Parlamento para satisfazer as necessidades em termos de recursos humanos durante os períodos das suas sessões era, seguramente, abrangido pelo âmbito de aplicação das normas do ROA. É, por isso, incorrecto entender que o legislador comunitário renunciou a assumir as suas responsabilidades legislativas em matéria estatutária.

99      O facto de o legislador, no que respeita às condições de recrutamento e de remuneração dos agentes auxiliares de sessão, se ter referido ao acordo não significa que tenha renunciado a exercer a competência que lhe é atribuída pelo artigo 283.° CE para aprovar o Estatuto e o ROA. Pelo contrário, é precisamente no exercício dessa competência que o Conselho, tendo em consideração os interesses e as necessidades comuns de três organizações europeias quanto ao bom funcionamento das sessões dos seus órgãos deliberativos, considerou dever alinhar as condições de recrutamento e de remuneração dos agentes recrutados pelo prazo de duração dos trabalhos das sessões do Parlamento com as que foram acordadas entre as três instituições ou organizações em causa, com ressalva do controlo orçamental previsto no artigo 78.°, segundo parágrafo, do ROA. É, ainda, necessário que o próprio acordo, para o qual remete o artigo 78.° do ROA, respeite uma norma de direito comunitário superior, o que será objecto de análise, em seguida, a respeito das demais acusações apresentadas pelos recorrentes.

100    Há, assim, que considerar que a acusação relativa à violação do artigo 283.° CE carece de fundamento factual e deve, em consequência, ser julgada improcedente.

 Quanto à alegada violação do princípio da não discriminação

101    Quanto à acusação relativa à violação do princípio da não discriminação, tal como consagrado na Carta Social Europeia, assinada em Turim, em 18 de Outubro de 1961, e na Convenção n.° 111 da OIT, há que recordar, sem que seja necessário pronunciarmo‑nos sobre a aplicabilidade e o alcance dos dois instrumentos internacionais invocados, a este propósito, pelos recorrentes, que os princípios da igualdade de tratamento e da não discriminação constituem princípios fundamentais da ordem jurídica comunitária.

102    De acordo com jurisprudência constante, há violação do princípio da igualdade de tratamento, nomeadamente quando a duas categorias de pessoas, cujas situações factual e jurídica não têm diferenças essenciais, são aplicados tratamentos diferentes, e esta diferenciação não é objectivamente justificada (acórdão do Tribunal de Justiça de 11 de Janeiro de 2001, Gevaert/Comissão, C‑389/98 P, Colect., p. I‑65, n.° 54; acórdãos do Tribunal de Primeira Instância, de 15 de Março de 1994, La Pietra/Comissão, T‑100/92, ColectFP, pp. I‑A‑83 e II‑275, n.° 50, de 16 de Abril de 1997, Kuchlenz‑Winter/Comissão, T‑66/95, Colect. p. II‑637, n.° 55, e de 21 de Julho de 1998, Mellett/Tribunal de Justiça, T‑66/96 e T‑221/97, ColectFP, pp. I‑A‑449 e II‑1305, n.° 129; despacho do Tribunal de Primeira Instância de 9 de Julho de 2007, De Smedt/Comissão, T‑415/06 P, ainda não publicado na Colectânea, n.° 52).

103    Ora, a situação dos agentes recrutados para satisfazer as necessidades intermitentes e maciças em recursos humanos de apoio, sentidas pelo Parlamento unicamente durante os seus períodos de sessão, não é comparável à dos agentes recrutados para satisfazer necessidades contínuas e quotidianas que exigem presença de pessoal composto por funcionários e, se for caso disso, agentes temporários ou agentes contratuais na acepção dos artigos 3.° ‑ A ou 3.° ‑ B do ROA.

104    Há que acrescentar que não devem questionar‑se as diferenças de estatuto que existem entre as diversas categorias de pessoas empregadas pelas Comunidades na medida em que algumas dessas categorias podem beneficiar de vantagens que não são concedidas a outras. De facto, a definição de cada uma das categorias de agentes corresponde a necessidades legítimas da administração comunitária e à natureza das tarefas que esta tem por missão realizar (acórdão do Tribunal de Justiça de 6 de Outubro de 1983, Celant e o./Comissão, 118/82 a 123/82, Recueil, p. 2995, n.° 22, e despacho De Smedt/Comissão, já referido, n.° 55).

105    Em especial, ao instituir a categoria específica dos agentes auxiliares de sessão, o Conselho utilizou a liberdade de reger de forma específica esta categoria de agentes atendendo às necessidades especiais do Parlamento e à natureza das tarefas que tem por missão realizar, da mesma forma que utilizou esta liberdade relativamente à categoria específica dos intérpretes de conferência, que podem, igualmente, ser chamados a trabalhar por curtos períodos e para satisfazer necessidades de carácter intermitente, ou mesmo ocasional.

106    A acusação baseada na violação do princípio da não discriminação deve, por isso, ser julgada improcedente.

 Quanto à estabilidade de emprego

107    Há que observar, antes de mais, que a acusação baseada na violação da estabilidade de emprego, no sentido de que o artigo 78.° do ROA permite ao Parlamento dispensar um agente auxiliar de sessão no termo de cada contrato, impedindo‑o de obter um contrato sem termo, que é a forma comum das relações laborais entre empregadores e trabalhadores, conduz, na verdade, a que se questione se uma norma ou princípio de direito superior obriga o Parlamento, ao determinar as condições de recrutamento dos agentes auxiliares de sessão, a recorrer a relações laborais sem termo, mas a tempo parcial.

108    A este respeito, os recorrentes invocam, no essencial:

–        por um lado, o artigo 4.° da Convenção n.° 158 da OIT, nos termos do qual «[u]m trabalhador não deverá ser despedido sem que exista um motivo válido de despedimento relacionado com a aptidão ou com o comportamento do trabalhador, ou baseado nas necessidades de funcionamento da empresa, estabelecimento ou serviço»;

–        por outro lado, o acordo‑quadro e, em especial, o segundo parágrafo do seu preâmbulo e o n.° 6 das considerações gerais, do qual resulta que os contratos sem termo constituem «a forma comum da relação laboral», caracterizando‑se pela estabilidade de emprego, uma vez que apenas em determinadas circunstâncias os contratos de trabalho a termo respondem às necessidades quer dos empregadores quer dos trabalhadores.

109    O artigo 4.° da Convenção n.° 158 da OIT, enquanto tal, não deve ser considerado pertinente no caso em apreço, uma vez que, por si só, não permite resolver a questão de saber se o Parlamento tem ou não o direito de celebrar um contrato de agente auxiliar apenas pelo prazo de duração de uma sessão parlamentar. De facto, se a resposta a esta questão for afirmativa, nem por isso se pode configurar o termo do prazo de cada contrato a termo como um despedimento, o qual teria de ser especialmente fundamentado tendo em conta a aptidão ou a conduta do agente ou ainda as necessidades de funcionamento do Parlamento, pois estar‑se‑ia perante a cessação de vigência de um contrato por superveniência do seu termo.

110    Quanto ao argumento baseado na violação do acordo‑quadro, a sua análise pressupõe a análise prévia da questão da invocabilidade da Directiva 1999/70 contra uma instituição comunitária.

–       Invocabilidade da Directiva 1999/70 por um funcionário ou por um agente contra uma instituição comunitária

111    Importa realçar, a título preliminar, que as directivas são dirigidas aos Estados‑Membros e não às instituições da Comunidade. Não se pode, portanto, considerar que as disposições da Directiva 1999/70 e do acordo‑quadro em anexo impõem, enquanto tais, obrigações às instituições nas relações com o seu pessoal (ver, nesse sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 9 de Setembro de 2003, Rinke C‑25/02, Colect. p. I‑8349, n.° 24; acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 21 de Maio de 2008, Belfass/Conselho, T‑495/04, Colect., p. II‑781, n.° 43).

112    Contudo, esta consideração nem por isso deve excluir toda a invocabilidade de uma directiva nas relações entre as instituições e os seus funcionários ou agentes.

113    De facto, as disposições de uma directiva poderão, em primeiro lugar, impor‑se indirectamente a uma instituição se constituírem a expressão de um princípio geral de direito comunitário cuja aplicação, enquanto tal, incumba àquela (ver, nesse sentido, acórdão Rinke, já referido, n.os 25 a 28, a propósito da Directiva 76/207/CEE do Conselho, de 9 de Fevereiro de 1976, relativa à concretização do princípio da igualdade de tratamento entre homens e mulheres no que se refere ao acesso ao emprego, à formação e promoção profissionais e às condições de trabalho, JO L 39, p. 40; EE 05 F2 p. 70).

114    No caso em apreço, a estabilidade de emprego, embora seja concebida como um elemento da maior importância na protecção dos trabalhadores (v., acórdãos do Tribunal de Justiça de 22 de Novembro de 2005, Mangold, C‑144/04, Colect., p. I‑9981, n.° 64 e de 15 de Abril de 2008, Impact, C‑268/06, Colect., p. I‑2483, n.° 87), não constitui, contudo, um princípio geral de direito ao abrigo do qual a legalidade de um acto de uma instituição possa ser apreciada. Em especial, não resulta, de forma alguma, da Directiva 1999/70 e do acordo‑quadro que a estabilidade de emprego tenha sido erigida em norma de direito vinculativa. Por outro lado, os considerandos sexto e sétimo da directiva, tal como o primeiro parágrafo do preâmbulo e o n.° 5 das considerações gerais do próprio acordo‑quadro colocam a ênfase na necessidade de obter um equilíbrio entre flexibilidade e segurança.

115    A estabilidade de emprego constitui, em contrapartida, uma finalidade perseguida pelas entidades signatárias do acordo‑quadro, cujo artigo 1.°, alínea b), dispõe que o objectivo de tal acordo‑quadro consiste em «[e]stabelecer um quadro para evitar os abusos decorrentes da utilização de sucessivos contratos de trabalho ou relações laborais a termo».

116    Em segundo lugar, uma directiva pode igualmente vincular uma instituição quando esta tenha decidido, no quadro da sua autonomia de organização e nos limites do Estatuto, aplicar uma obrigação especial prevista numa directiva ou ainda quando um acto de alcance geral de aplicação interna remeta, ele próprio, expressamente, para as medidas adoptadas pelo legislador comunitário em aplicação dos Tratados. Assim, o artigo 1.° ‑ E, n.° 2, do Estatuto, prevê que sejam concedidas aos funcionários «condições de trabalho que obedeçam às normas de saúde e de segurança adequadas, pelo menos equivalentes aos requisitos mínimos aplicáveis por força de medidas aprovadas nestes domínios por força dos Tratados». Esta última disposição é aplicável, por analogia, aos agentes temporários e aos agentes contratuais de acordo com o artigo 10.°, primeiro parágrafo, e com o artigo 80.°, n.° 4, do ROA.

117    Contudo, impõe‑se observar que a Directiva 1999/70 não tem como objectivo melhorar as condições de trabalho, reforçando, a bem dizer, a protecção da saúde e a segurança dos trabalhadores, mas aproximar as legislações e as práticas nacionais no domínio das condições de trabalho relativas à duração das relações laborais.

118    Em terceiro lugar, e em todo o caso, há que recordar que o princípio da cooperação leal, previsto no artigo 10.° CE não só obriga os Estados‑Membros a adoptar todas as medidas adequadas para garantir o alcance e a eficácia do direito comunitário (acórdão do Tribunal de Justiça de 26 de Setembro de 2000, Engelbrecht, C‑262/97, Colect. p. I‑7321, n.° 38), mas impõe, igualmente, às instituições comunitárias deveres recíprocos de cooperação leal com os Estados‑Membros (acórdãos do Tribunal de Justiça de 10 de Fevereiro de 1983, Luxemburgo/Parlamento, 230/81, Recueil, p. 255, n.° 37, de 14 de Maio de 2002, Comissão/Alemanha, C‑383/00, Colect., p. I‑4219, n.° 18, de 26 de Novembro de 2002, First e Franex, C‑275/00, Colect., p. I‑10943, n.° 49, de 4 de Março de 2004, Alemanha/Comissão, C‑344/01, Colect., p. I‑2081, n.° 79, e de 20 de Outubro de 2005, Ten Kate Holding Musselkanaal e o., C‑511/03, Colect., p. I‑8979, n.° 28), e entre as próprias instituições (v., nesse sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 30 de Março de 1995, Parlamento/Conselho, C‑65/93, Colect., p. I‑643, n.° 23).

119    A este título, incumbe às instituições garantir, na medida do possível, a coerência entre a sua própria política interna e a sua acção legislativa à escala comunitária, nomeadamente, dirigida aos Estados‑Membros. Assim, no seu comportamento enquanto empregadoras, as instituições devem ter em conta as disposições legislativas que, designadamente, impõem condições mínimas para a melhoria das condições de vida e de trabalho dos trabalhadores nos Estados‑Membros através da aproximação das legislações e das práticas nacionais e, em especial, a vontade do legislador comunitário de fazer da estabilidade de emprego um objectivo prioritário em matéria de relações laborais na União Europeia. Esta obrigação impõe‑se tanto mais que a reforma administrativa, operada pelo Regulamento n.° 723/2004, acentuou uma tendência para a contratualização da função pública europeia.

120    Quanto ao acordo‑quadro, em especial, que tende a aproximar as legislações e as práticas nacionais, enunciando condições mínimas relativas ao trabalho a termo, incumbe, assim, ao Parlamento, em conformidade com o dever de lealdade que sobre ele impende, interpretar, na medida do possível, as disposições do ROA à luz do texto e da finalidade do acordo‑quadro para atingir o resultado pretendido por este último.

121    Por fim, as consequências que acima se extraíram do dever de lealdade resultam também, no caso em apreço, de jurisprudência uniforme, de acordo com a qual, para a interpretação de uma disposição de direito comunitário, há que ter em conta não apenas os termos da mesma, mas igualmente o seu contexto e os objectivos prosseguidos pela regulamentação em que se integra, bem como o conjunto das disposições do direito comunitário (v., nesse sentido, acórdãos do Tribunal de Justiça de 6 de Outubro de 1982, Cilfit e o., 283/81, Recueil, p. 3415, n.° 20, e de 17 de Novembro de 1983, Merck, 292/82, Recueil, p. 3781, n.° 12, e acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 6 de Outubro de 2005, Sumitomo Chemical e Sumika Fine Chemicals/Comissão, T‑22/02 e T‑23/02, Colect., p. II‑4065, n.° 47). Exclui‑se, por isso, que uma instituição, na aplicação e interpretação das disposições do ROA relativas à duração dos contratos, se abstraia das condições mínimas relativas ao trabalho a termo adoptadas à escala comunitária.

122    Tendo em conta as considerações que antecedem, há que julgar improcedente a excepção de ilegalidade suscitada pelos recorrentes contra o artigo 78.° do ROA, não podendo a Directiva 1999/70, enquanto tal, fundamentar uma excepção de ilegalidade contra uma disposição do regulamento do Conselho, que contém o Estatuto e o ROA, por se afigurar contrária ao acordo‑quadro.

123    Contudo, a referida directiva e o acordo‑quadro que aquela visa aplicar são, nas circunstâncias do caso em apreço e nos limites referidos nos n.os 118 a 121 supra, invocáveis pelos recorrentes contra o Parlamento com vista a obterem, na medida do possível, uma interpretação das normas do Estatuto e do ROA que seja conforme às exigências do acordo‑quadro.

124    Ora, a análise das disposições do acordo‑quadro invocadas pelos recorrentes, a que se procedeu acima, não permite, em todo o caso, concluir que o Parlamento tenha violado o artigo 78.° do ROA, interpretado à luz das finalidades e das condições mínimas que tais disposições estabelecem.

–       Quanto ao conteúdo do acordo‑quadro

125    Em primeiro lugar, importa realçar que a Directiva 1999/70 e o acordo‑quadro se destinam a regular os contratos e relações de trabalho a termo celebrados com os órgãos da administração e outras entidades do sector público (acórdãos do Tribunal de Justiça de 4 de Julho de 2006, Adeneler e o., C‑212/04, Colect., p. I‑6057, n.° 54, de 7 de Setembro de 2006, Marrosu e Sardino, C‑53/04, Colect., p. I‑7213, n.° 39, e Vassallo, C‑180/04, Colect. p. I‑7251, n.° 32).

126    A este respeito, o acordo‑quadro parte da premissa de que os contratos de trabalho sem termo constituem a forma comum da relação laboral, reconhecendo simultaneamente que os contratos a termo constituem uma característica do emprego em certos sectores, ocupações e actividades (v. n.os 6 e 8 das considerações gerais do acordo‑quadro; acórdão Adeneler e o., já referido, n.° 61).

127    Consequentemente, o benefício da estabilidade de emprego é concebido como um elemento da maior importância na protecção dos trabalhadores (v. acórdão Mangold, já referido, n.° 64), enquanto só em determinadas circunstâncias é que os contratos a termo respondem às necessidades tanto dos empregadores como dos trabalhadores (v. segundo parágrafo do preâmbulo e n.° 8 das considerações gerais do acordo‑quadro; acórdão Adeneler e o., já referido, n.° 62).

128    Nesta óptica, o acordo‑quadro destina‑se a enquadrar o recurso sucessivo a esta última categoria de relações de trabalho, considerada fonte potencial de abusos em prejuízo dos trabalhadores, prevendo um certo número de normas de protecção mínima destinadas a evitar a precarização da situação dos trabalhadores dependentes (acórdão Adeneler e o., já referido, n.° 63).

129    Assim, o artigo 5.°, n.° 1, do acordo‑quadro visa, especificamente, «evitar os abusos decorrentes da conclusão de sucessivos contratos de trabalho ou relações laborais a termo».

130    Para esse efeito, o referido artigo impõe aos Estados‑Membros a obrigação de introduzirem na sua ordem jurídica uma ou mais das medidas enumeradas no n.° 1, alíneas a) a c), quando não existam já no Estado‑Membro em causa disposições legais equivalentes destinadas a evitar efectivamente a utilização abusiva de contratos a termo sucessivos (acórdão Adeneler e o., já referido, n.° 65). Em contrapartida, o acordo‑quadro não impõe uma obrigação geral de os Estados‑Membros preverem, após um determinado número de renovações dos contratos a termo ou o cumprimento de um determinado período de trabalho, a conversão dos contratos a termo em contratos sem termo, nem regula as condições precisas em que se pode fazer uso dos primeiros (v., nesse sentido, acórdãos Adeneler e o., já referido, n.° 91, bem como Marrosu e Sardino, já referido, n.° 47).

131    Entre as medidas enumeradas no artigo 5.°, n.° 1, constam, na alínea a), as «razões objectivas que justifiquem a renovação dos supramencionados contratos ou relações laborais».

132    As partes signatárias do acordo‑quadro consideraram, de facto, que a utilização de contratos a termo com base em razões objectivas constitui uma forma de evitar abusos (v., n.° 7 das considerações gerais do acordo‑quadro).

133    Ora, no caso em apreço, resulta dos autos que são, precisamente, «razões objectivas» que o Parlamento invoca, em substância, para justificar a renovação dos contratos de agente auxiliar de sessão por ocasião da realização de cada sessão parlamentar.

134    A este respeito, o Tribunal de Justiça decidiu, no acórdão Adeneler e o. (já referido, n.° 69), que o conceito de «razões objectivas», na acepção do artigo 5.°, n.° 1, alínea a), do acordo‑quadro deve ser interpretado no sentido de que visa circunstâncias precisas e concretas que caracterizam uma actividade determinada e, portanto, susceptíveis de justificar, nesse contexto específico, a utilização de sucessivos contratos a termo. Essas circunstâncias podem resultar, nomeadamente, da natureza particular das tarefas para a realização das quais esses contratos foram celebrados e das características inerentes a essas tarefas ou, eventualmente, da prossecução de um objectivo legítimo de política social de um Estado‑Membro (acórdão Adeneler e o., já referido, n.° 70).

135    No caso em apreço, o Parlamento alegou, pertinentemente, que a renovação dos contratos a termo controvertidos satisfazia uma necessidade real na medida em que era necessária à prossecução das missões que lhe estão atribuídas. De facto, o recurso ao artigo 78.° do ROA, até 1 de Janeiro de 2007, permitiu‑lhe satisfazer necessidades intermitentes e maciças em recursos humanos apenas pelo prazo de duração das suas sessões. É um facto que o crescimento considerável da actividade desenvolvida pelo Parlamento em Estrasburgo, durante um período limitado de quatro ou cinco dias por mês, implicava uma alteração assinalável das suas necessidades em recursos humanos afectos a tarefas tão precisas quanto diversas, tais como as de auxiliar de creche, puericultora, dactilógrafo, técnico, cozinheiro, professor de línguas, tradutor, oficial de diligências, encarregado de mudanças e outras. Ainda que tais necessidades fossem previsíveis, o aumento da actividade nem por isso era permanente e duradouro. Tais circunstâncias permitiram, validamente, tendo em conta o artigo 5.°, n.° 1, alínea a), do acordo‑quadro, justificar a celebração de sucessivos contratos de agente auxiliar a termo.

136    É certo que, tal como observaram os recorrentes, de acordo com o artigo 58.°, primeiro parágrafo, do ROA, o agente auxiliar só adquire o direito a férias remuneradas se tiver cumprido um tempo de serviço de, pelo menos, quinze dias ou metade de um mês, pelo que os agentes auxiliares de sessão ficam privados do direito a férias pelo simples facto de serem admitidos através de contratos por prazos muito curtos, inferior ao período mínimo.

137    Contudo, os recorrentes não suscitaram nenhuma excepção de ilegalidade contra o artigo 58.°, primeiro parágrafo, do ROA. O Tribunal não tem, por isso, de analisar esta questão, sob pena de extravasar o âmbito do litígio, tal como apresentado pelos recorrentes.

138    Atento o que precede, não pode ser acolhida a excepção de ilegalidade suscitada pelos recorrentes contra o artigo 78.° do ROA, nem o Parlamento violou o alcance daquele artigo à luz da Directiva 1999/70. Em consequência, deve ser negado provimento ao pedido de anulação.

 Quanto ao pedido de indemnização

1.     Argumentos das partes

139    Os recorrentes pedem a condenação do Parlamento no pagamento de uma indemnização compensatória das férias remuneradas relativamente aos períodos de trabalho cumpridos, bem como no pagamento a cada recorrente 2 000 euros a título de despesas de processo «não reembolsáveis».

140    O Parlamento contrapõe que, de acordo com o artigo 58.° do ROA, o agente auxiliar beneficia de férias remuneradas de dois dias úteis por mês de serviço e que o tempo de serviço inferior a 15 dias ou a metade de um mês não dá direito a férias. Neste contexto, os agentes auxiliares de sessão, que trabalham, no máximo 5 dias por mês, não têm direito a férias remuneradas. Por isso, os recorrentes não têm direito a qualquer indemnização compensatória.

141    Por outro lado, o Parlamento realça que, de acordo com o artigo 94.° do Regulamento de Processo do Tribunal da Função Pública, o processo neste Tribunal é gratuito. Este regulamento não prevê, de resto, a possibilidade de condenação da parte que sucumbe no pagamento de despesas de processo «não reembolsáveis». O pedido de pagamento de tais despesas deve, em consequência, ser considerado inadmissível.

2.     Apreciação do Tribunal

142    De acordo com jurisprudência uniforme, a responsabilidade da Comunidade supõe a reunião de um conjunto de condições no que respeita à ilegalidade do comportamento imputado às instituições, à realidade do dano e à existência de um nexo de causalidade entre o comportamento e o prejuízo invocado (acórdão do Tribunal de Justiça de 16 de Dezembro de 1987, Delauche/Comissão, 111/86, Colect., p. 5345, n.° 30, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 27 de Novembro de 2003, Bories e o./Comissão, T‑331/00 e T‑115/01, ColectFP, pp. I‑A‑309 e II‑1479, n.° 192, acórdão do Tribunal da Função Pública de 10 de Outubro de 2007, Berrisford/Comissão, F‑107/06, ainda não publicado na Colectânea, n.° 109). Basta que uma dessas condições não se verifique para que seja negado provimento ao pedido de indemnização na íntegra, sem que seja necessário analisar as demais condições.

143    Quanto à ilegalidade do comportamento censurado ao Parlamento, os recorrentes não desenvolveram, no seu recurso, qualquer outra argumentação para além da que foi apresentada em apoio da excepção de ilegalidade por eles invocada contra o artigo 78.° do ROA no quadro do pedido de anulação. Tal como resulta do n.° 96 do presente acórdão, esta excepção baseou‑se, no essencial, em três acusações, a saber, violação do artigo 283.° CE, violação do princípio da não discriminação e prejuízo para a estabilidade de emprego. Ora, foi negado provimento à excepção de ilegalidade porque nenhuma das acusações apresentadas para a apoiar foi acolhida.

144    Importa, em consequência, negar provimento ao pedido de indemnização, porquanto os recorrentes não lograram demonstrar, de forma juridicamente convincente, a ilegalidade do comportamento censurado ao Parlamento.

 Quanto às despesas

145    Por força do disposto no artigo 122. ° do Regulamento de Processo do Tribunal da Função Pública, as disposições do capítulo VIII do título II do referido regulamento, relativas às despesas e aos encargos judiciais, apenas se aplicam aos processos intentados no Tribunal a contar da entrada em vigor desse Regulamento de Processo, isto é, 1 de Novembro de 2007. As disposições do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância pertinentes na matéria continuam a aplicar‑se, mutatis mutandis, aos processos pendentes no Tribunal da Função Pública antes dessa data.

146    Por força do disposto no artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Todavia, por força do artigo 88.° do referido Regulamento, nos litígios entre as Comunidades e os seus agentes, as despesas efectuadas pelas instituições ficam a cargo destas. Tendo sido negado provimento ao recurso há que condenar cada parte a suportar as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DA FUNÇÃO PÚBLICA (Segunda Secção)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      Cada parte suportará as suas próprias despesas.

Kanninen

Boruta

Van Raepenbusch

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 30 de Abril de 2009.

O secretário

 

      O presidente

W. Hakenberg

 

      H. Kanninen


Índice


Quadro jurídico

1.  Regime aplicável aos outros agentes das Comunidades Europeias

2.  Acordo‑quadro relativo a contratos de trabalho a termo

Factos na origem do litígio

Tramitação processual e pedidos das partes

Quanto à admissibilidade do recurso

1.  Argumentos das partes

2.  Apreciação do Tribunal da Função Pública

Quanto ao pedido de anulação

1.  Argumentos das partes

2.  Apreciação do Tribunal da Função Pública

Quanto à admissibilidade da excepção de ilegalidade

Quanto à procedência da excepção de ilegalidade

Quanto à alegada violação do artigo 283.° CE

Quanto à alegada violação do princípio da não discriminação

Quanto à estabilidade de emprego

–  Invocabilidade da Directiva 1999/70 por um funcionário ou por um agente contra uma instituição comunitária

–  Quanto ao conteúdo do acordo‑quadro

Quanto ao pedido de indemnização

1.  Argumentos das partes

2.  Apreciação do Tribunal

Quanto às despesas


O texto da presente decisão, bem como os das decisões das jurisdições comunitárias nela citadas ainda não publicadas na Colectânea, estão disponíveis no sítio Internet do Tribunal de Justiça, www.curia.europa.eu

ANEXO

Tendo em conta o número elevado de recorrentes neste processo, os seus nomes não constam do presente anexo.


* Língua do processo: francês.