Language of document : ECLI:EU:T:2018:598

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção)

25 de setembro de 2018 (*)

«Marca da União Europeia — Processo de declaração de nulidade — Marca figurativa da União Europeia GUGLER — Denominação social nacional anterior Gugler France — Motivo relativo de recusa — Artigo 8.o, n.o 4, do Regulamento (CE) n.o 207/2009 [atual artigo 8.o, n.o 4, do Regulamento (UE) 2017/1001] — Risco de confusão»

No processo T‑238/17,

Alexander Gugler, residente em Maxdorf (Alemanha), representado por M.‑C. Simon, advogada,

recorrente,

contra

Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia (EUIPO), representado inicialmente por P. Sipos e, em seguida, por A. Folliard‑Monguiral, na qualidade de agentes,

recorrido,

sendo a outra parte no processo na Câmara de Recurso do EUIPO, interveniente no Tribunal Geral,

Gugler France, com sede em Besançon (França), representada por A. Grolée, advogada,

que tem por objeto um recurso interposto da Decisão da Primeira Câmara de Recurso do EUIPO de 31 de janeiro de 2017 (processo R 1008/2016‑1), relativa a um processo de declaração de nulidade entre a Gugler France e A. Gugler,

O TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção),

composto por: A. M. Collins, presidente, M. Kancheva e G. De Baere (relator), juízes,

secretário: M. Marescaux, administradora,

vista a petição entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 25 de abril de 2017,

vista a contestação do EUIPO entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 30 de junho de 2017,

vista a resposta da interveniente entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 12 de junho de 2017,

vistas as questões escritas do Tribunal Geral às partes e as suas respostas a estas questões, entradas na Secretaria do Tribunal Geral em 13 e 20 de fevereiro de 2018,

após a audiência de 15 de março de 2018,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1        Em 31 de agosto de 2005, a Gugler GmbH, antecessora jurídica do recorrente, Alexander Gugler, obteve junto do Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia (EUIPO) o registo, sob o número 3 324 902, da seguinte marca figurativa da União Europeia (a seguir «marca contestada»):

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2        Este registo tinha sido solicitado em 25 de agosto de 2003.

3        Os produtos e serviços para os quais a marca contestada foi registada pertencem às classes 6, 17, 19, 22, 37, 39 e 42 na aceção do Acordo de Nice Relativo à Classificação Internacional dos Produtos e dos Serviços para Efeitos do Registo de Marcas, de 15 de junho de 1957, conforme revisto e alterado, e correspondem, para cada uma das classes, à seguinte descrição:

–        classe 6: «Proteção contra a luz, nomeadamente toldos, portadas, estores em metal»;

–        classe 17: «Materiais insonorizantes, nomeadamente lã de rocha e elementos de espuma plástica»;

–        classe 19: «Janelas, coberturas, portas, portões, portadas, caixas de estores em vidro e matérias plásticas; vidraças, nomeadamente jardins de inverno, coberturas para jardins de inverno; proteção contra a luz, nomeadamente portadas e estores em matérias plásticas»;

–        classe 22: «Proteção contra a luz, nomeadamente toldos em matérias plásticas»;

–        classe 37: «Serviços de fabricação de janelas, nomeadamente montagem de portas, [de] portões e [de] janelas»;

–        classe 39: «Transporte»;

–        classe 42: «Serviços de fabricação de janelas, nomeadamente planeamento de portas, [de] portões e [de] janelas».

4        Em 15 de dezembro de 2009, a licença para a utilização da marca contestada cedida pelo recorrente à Gugler GmbH foi registada pelo EUIPO.

5        Em 17 de novembro de 2010, a interveniente, a Gugler France, apresentou um pedido de declaração de nulidade da marca contestada para todos os produtos e serviços abrangidos por esta marca. Este pedido baseava‑se, por um lado, na má‑fé do titular da marca contestada aquando do depósito do pedido de marca na aceção do artigo 52.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento (CE) n.o 207/2009 do Conselho, de 26 de fevereiro de 2009, sobre a marca da UE (JO 2009, L 78, p. 1) [atual artigo 59.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento (UE) 2017/1001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de junho de 2017, sobre a marca da União Europeia (JO 2017, L 154, p. 1)] e, por outro, na denominação social da interveniente que a habilita, nos termos do direito francês, a proibir a utilização da marca contestada, na aceção do artigo 53.o, n.o 1, alínea c), do Regulamento n.o 207/2009 [atual artigo 60.o, n.o 1, alínea c), do Regulamento 2017/1001], lido em conjugação com o artigo 8.o, n.o 4, do mesmo regulamento (atual artigo 8.o, n.o 4, do Regulamento 2017/1001).

6        A interveniente foi criada em janeiro de 2002 e foi registada em 7 de fevereiro de 2002 no Registo Comercial e das Sociedades de Besançon (França) sob a denominação social Gugler France. De acordo com esse registo, e segundo o artigo 2.o dos seus estatutos, a interveniente tem por objeto «a aquisição, o comércio, a venda e a colocação de elementos de portas e janelas em edifícios através de todos os meios e procedimentos».

7        Por decisão de 21 de dezembro de 2011, a Divisão de Anulação do EUIPO julgou procedente o pedido de declaração de nulidade para todos os produtos e serviços abrangidos pela marca contestada, com base no artigo 53.o, n.o 1, alínea c), do Regulamento n.o 207/2009.

8        Em 16 de fevereiro de 2012, o recorrente interpôs recurso da decisão da Divisão de Anulação.

9        Em 26 de agosto de 2013, a pedido do recorrente, a marca contestada foi objeto de uma renovação parcial, limitada aos produtos e serviços pertencentes às classes 19, 37 e 42 referidos no n.o 3 acima referido. A renovação parcial foi publicada no Boletim de Marcas Comunitárias n.o 167/2013, de 4 de setembro de 2013.

10      Por decisão de 16 de outubro de 2013, no processo R 356/2012‑4, a Quarta Câmara de Recurso do EUIPO anulou a decisão da Divisão de Anulação e rejeitou o pedido de declaração de nulidade.

11      Em 18 de dezembro de 2013, a interveniente interpôs recurso no Tribunal Geral contra a decisão da Quarta Câmara de Recurso do EUIPO.

12      Por Acórdão de 28 de janeiro de 2016, Gugler France/IHMI — Gugler (GUGLER) (T‑674/13, não publicado, EU:T:2016:44), o Tribunal Geral anulou essa decisão. Considerou que a Câmara de Recurso tinha violado o dever de fundamentação previsto no artigo 75.o do Regulamento n.o 207/2009 (atual artigo 94.o do Regulamento 2017/1001), por um lado, ao decidir sobre o fundamento de nulidade baseado no artigo 53.o, n.o 1, alínea c), do Regulamento n.o 207/2009, lido em conjugação com o seu artigo 8.o, n.o 4, e, por outro, ao decidir sobre o fundamento de nulidade baseado no artigo 52.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 207/2009.

13      Por decisão de 6 de junho de 2016, o praesidium das Câmaras de Recurso do EUIPO devolveu o processo à Primeira Câmara de Recurso, sob a referência R 1008/2016‑1, para que adotasse uma nova decisão em conformidade com o artigo 65.o, n.o 6, do Regulamento n.o 207/2009 (atual artigo 72.o, n.o 6, do Regulamento 2017/1001).

14      Por decisão de 31 de janeiro de 2017 (a seguir «decisão impugnada»), a Primeira Câmara de Recurso do EUIPO negou provimento ao recurso da decisão da Divisão de Anulação e considerou que o pedido de declaração de nulidade da marca contestada devia ser julgado procedente com base no artigo 53.o, n.o 1, alínea c), do Regulamento n.o 207/2009, lido em conjugação com o seu artigo 8.o, n.o 4.

15      A Câmara de Recurso salientou que o sinal anterior, no qual se baseava o pedido de declaração de nulidade, era a denominação social da interveniente, a Gugler France. Em primeiro lugar, considerou que estavam preenchidas as condições previstas pelo artigo 8.o, n.o 4, do Regulamento n.o 207/2009. Com efeito, numa primeira fase, considerou que o sinal anterior era utilizado na vida comercial com um alcance que não era apenas local. A este respeito, considerou que os elementos de prova apresentados pela interveniente, nomeadamente cópias do seu relatório anual para 2002 e 2003, bem como faturas, eram suficientes para provar que esta exercia, sob a sua denominação social, atividades relacionadas com aquelas para as quais tinha sido criada, antes da data de depósito do pedido da marca contestada e com um alcance que não era apenas local. Em segundo lugar, indicou que a interveniente tinha adquirido os direitos sobre o sinal no dia da sua inscrição no Registo Comercial e das Sociedades, que é a data pertinente em aplicação do artigo L. 210‑6 do code de commerce [Código Comercial] francês, no presente caso, em 7 de fevereiro de 2002, ou seja, antes da data de depósito do pedido da marca contestada. Em terceiro lugar, constatou que, em aplicação do artigo L. 711‑4 do code de la propriété intellectuelle [Código da Propriedade Intelectual] francês, no qual se baseava o pedido de declaração de nulidade, a denominação social da interveniente lhe dava o direito de proibir a utilização de uma marca posterior, se existisse um risco de confusão no espírito do público.

16      Em seguida, a Câmara de Recurso considerou que o público relevante era composto por consumidores finais e profissionais franceses, o que comprova um grau de atenção elevado. Por um lado, considerou que os produtos e serviços abrangidos pela marca contestada e as atividades protegidas pelo sinal anterior eram idênticos ou semelhantes e, por outro, que a marca contestada e o sinal anterior apresentavam um grau de semelhança elevado. A Câmara de Recurso concluiu pela existência de um risco de confusão e deduziu daí que estavam preenchidas as condições colocadas pela legislação francesa para proibir a utilização da marca contestada.

17      Por último, a Câmara de Recurso considerou que não estava preenchida a condição de aplicação da prescrição por tolerância, prevista no artigo 54.o, n.o 2, do Regulamento n.o 207/2009 (atual artigo 61.o, n.o 2, do Regulamento 2017/1001), nos termos da qual a interveniente tinha conhecimento da utilização da marca contestada em França desde há cinco anos e tinha tolerado essa utilização.

 Pedidos das partes

18      O recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        anular a decisão impugnada;

–        condenar o EUIPO nas despesas.

19      O EUIPO e a interveniente concluem pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar o recorrente nas despesas.

 Questão de direito

20      Em apoio do seu recurso, o recorrente invoca três fundamentos de recurso. O primeiro fundamento é relativo à violação do princípio da boa administração. O segundo fundamento é relativo à violação do artigo 8.o, n.o 4, do Regulamento n.o 207/2009 e divide‑se, em substância, em duas partes, sendo a primeira relativa à apreciação incorreta pela Câmara de Recurso das condições de aplicação do artigo 8.o, n.o 4, do Regulamento n.o 207/2009 e a segunda relativa à apreciação incorreta do risco de confusão. O terceiro fundamento é relativo à violação do artigo 54.o, n.o 2, do mesmo regulamento.

21      Por uma questão de economia processual e tendo em conta as circunstâncias particulares do caso em apreço, o Tribunal Geral analisará a segunda parte do segundo fundamento, relativa à apreciação incorreta do risco de confusão.

22      A título preliminar, há que recordar que, nos termos do artigo 53.o, n.o 1, alínea c), do Regulamento n.o 207/2009, uma marca da União Europeia é declarada nula na sequência de um pedido apresentado ao EUIPO sempre que exista um direito anterior, referido no n.o 4 do artigo 8.o deste regulamento, e que se encontrem preenchidas as condições enunciadas nesse número. Por força do artigo 8.o, n.o 4, do Regulamento n.o 207/2009, após oposição do titular de uma marca não registada ou de outro sinal utilizado na vida comercial cujo alcance não seja apenas local, será recusado o pedido de registo da marca quando e na medida em que, segundo o direito do Estado‑Membro aplicável a esse sinal, tenham sido adquiridos direitos sobre esse sinal antes da data de depósito do pedido de marca da União Europeia e quando esse sinal confira ao seu titular o direito de proibir a utilização de uma marca posterior.

23      As duas primeiras condições, ou seja, as relativas à utilização e ao alcance do sinal invocado, não podendo este último ser apenas local, decorrem da própria redação do artigo 8.o, n.o 4, do Regulamento n.o 207/2009 e, por conseguinte, devem ser interpretadas à luz do direito da União. Assim, o Regulamento n.o 207/2009 estabelece padrões uniformes, relativos à utilização dos sinais e ao respetivo alcance, que são conformes aos princípios que inspiram o sistema instituído por esse regulamento [Acórdão de 24 de março de 2009, Moreira da Fonseca/IHMI — General Óptica (GENERAL OPTICA), T‑318/06 a T‑321/06, EU:T:2009:77, n.o 33].

24      Em contrapartida, resulta da locução que «quando e na medida em que, segundo […] o direito do Estado‑Membro aplicável a esse sinal», que os outras duas condições, enunciadas em seguida no artigo 8.o, n.o 4, alíneas a) e b), do Regulamento n.o 207/2009, constituem condições impostas pelo regulamento que, ao contrário das precedentes, são apreciadas à luz dos critérios fixados pela legislação que regula o sinal invocado. Esta remissão para a legislação que regula o sinal invocado é perfeitamente justificada, dado que o Regulamento n.o 207/2009 reconhece a possibilidade de sinais alheios ao sistema da marca da União Europeia serem invocados contra uma marca da União Europeia. Consequentemente, só a legislação que regula o sinal invocado permite determinar se este é anterior à marca da União Europeia e se pode justificar que se proíba a utilização de uma marca mais recente [Acórdãos de 24 de março de 2009, GENERAL OPTICA, T‑318/06 a T‑321/06, EU:T:2009:77, n.o 34, e de 18 de setembro de 2015, Federación Nacional de Cafeteros de Colombia/IHMI — Accelerate (COLOMBIANO COFFEE HOUSE), T‑359/14, não publicado, EU:T:2015:651, n.o 24].

25      No caso em apreço, a Câmara de Recurso salientou que a interveniente se baseava no artigo L. 711‑4 do code de la propriété intellectuelle [Código da Propriedade Intelectual] francês, completado por elementos de prova que demonstram a forma como esta legislação foi aplicada. Indicou que a interveniente tinha apresentado a cópia de um Acórdão de 24 de novembro de 1999 da cour d’appel [Tribunal de Recurso] de Paris (França) relativamente a um conflito entre, por um lado, uma denominação social francesa e, por outro, uma denominação social e as marcas posteriores. Neste acórdão, a cour d’appel [Tribunal de Recurso] de Paris tinha declarado que a usurpação ou a violação da denominação social por reprodução ou imitação constituíam um ato de concorrência desleal se fosse demonstrado que existia um risco de confusão e que a proteção a título do artigo L. 711‑4 do code de la propriété intellectuelle [Código da Propriedade Intelectual] francês exigia a existência de um risco de confusão. A Câmara de Recurso considerou que resultava desta disposição e da forma como foi aplicada que a condição para a interveniente poder proibir a utilização da marca contestada, com base na sua denominação social, era a existência de um risco de confusão.

26      A Câmara de Recurso constatou que o conceito de risco de confusão no direito francês não era diferente do que decorre do direito da União, na medida em que pressupõe a existência de uma semelhança entre, por um lado, os produtos e os serviços abrangidos pela marca contestada e as atividades protegidas pelo sinal anterior e, por outro, os sinais em conflito. A Câmara de Recurso pôde, portanto, acertadamente, raciocinar por analogia com os critérios estabelecidos para a aplicação do artigo 8.o, n.o 1, do Regulamento n.o 207/2009 (atual artigo 8.o, n.o 1, do Regulamento 2017/1001).

27      Nos termos do artigo 8.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 207/2009, após oposição do titular de uma marca anterior, o pedido de registo de marca é recusado quando, devido à sua identidade ou semelhança com a marca anterior e devido à identidade ou semelhança dos produtos ou serviços designados pelas duas marcas, exista risco de confusão no espírito do público do território onde a marca anterior está protegida.

28      Segundo jurisprudência constante, constitui risco de confusão o risco de que o público possa crer que os produtos ou os serviços em causa provêm da mesma empresa ou de empresas ligadas economicamente. Segundo esta mesma jurisprudência, o risco de confusão deve ser apreciado globalmente, segundo a perceção que o público pertinente tem dos sinais e dos produtos ou dos serviços em causa, tendo em conta todos os fatores que caracterizam o caso específico, nomeadamente a interdependência entre a semelhança dos sinais e a dos produtos ou dos serviços designados [v. Acórdão de 9 de julho de 2003, Laboratorios RTB/IHMI — Giorgio Beverly Hills (GIORGIO BEVERLY HILLS), T‑162/01, EU:T:2003:199, n.os 30 a 33 e jurisprudência referida].

29      O recorrente alega que, até outubro de 2009, exercia a sua atividade numa relação comercial estreita com a interveniente e que os produtos comercializados por esta última provinham da empresa titular da marca contestada, e depois da empresa que tinha uma licença dessa marca, a saber, em ambos os casos, a Gugler GmbH. A interveniente terá feito a promoção das janelas que vendia como sendo fabricadas em Maxdorf (Alemanha), cidade na qual a Gugler GmbH tem a sua sede. O recorrente conclui que, durante o período em que a interveniente comercializou os produtos da Gugler GmbH em França, indicou a sua proveniência alemã. O público relevante não poderia, portanto, ser induzido em erro sobre a sua origem e não existia risco de confusão.

30      Por último, o recorrente salienta que, depois da rutura da relação comercial entre a Gugler GmbH e a interveniente em 2010 também não existia risco de confusão, na medida em que a interveniente tinha alterado a sua denominação social, abastecia‑se junto de outro fabricante de janelas alemão e já não comercializava os produtos sob a marca GUGLER.

31      Há que recordar que a data a tomar em consideração para apreciar o risco de confusão é a data de depósito do pedido de registo da marca contestada, a saber, 25 de agosto de 2003.

32      Desta forma, os argumentos do recorrente, de que não existia risco de confusão após a rutura da relação comercial entre a Gugler GmbH e a interveniente em 2010 devem ser julgados inoperantes.

33      No entanto, importa analisar se a existência, na data de depósito do pedido de registo da marca contestada, de ligações económicas entre o titular da marca contestada e a requerente do pedido de declaração de nulidade se opõe à constatação da existência de um risco de confusão.

34      A Câmara de Recurso considerou que, mesmo admitindo que o público pertinente faça prova de um nível de atenção elevado, o facto de os sinais em conflito serem idênticos a nível do seu elemento distintivo neutralizava a reduzida semelhança existente entre determinados produtos e serviços abrangidos pela marca contestada e as atividades protegidas pelo sinal anterior. Considerou que os consumidores que foram expostos à denominação social no domínio dos elementos de portas e janelas em edifícios pensariam razoavelmente que elementos de portas e janelas idênticos ou semelhantes, bem como produtos de isolamento relacionados, comercializados em França sob a marca GUGLER, tinham a mesma origem comercial e, portanto, concluiu que existia um risco de confusão.

35      Na decisão impugnada, a Câmara de Recurso rejeitou o argumento do recorrente relativo ao facto de a interveniente e a Gugler GmbH fazerem parte de uma rede de distribuição. Considerou que nada provava que a existência do acordo de distribuição era conhecida do público e que o facto de os produtos fabricados na Alemanha serem vendidos em França sob a marca GUGLER não dava nenhum direito à Gugler GmbH sobre esta marca em França, na medida em que, ao abrigo do direito francês, a utilização de uma marca não criava direitos exclusivos sobre a mesma.

36      Importa recordar que, na data do depósito do pedido de registo da marca contestada, em 25 de agosto de 2003, existiam relações comerciais entre a interveniente e a Gugler GmbH, então titular da marca contestada. Com efeito, a interveniente era o distribuidor dos produtos da Gugler GmbH em França. As suas relações comerciais datavam de 2000, quando a interveniente se denominava ainda PK Fermetures. Desde julho de 2002, a Gugler GmbH detinha 498 participações do capital da interveniente.

37      Além disso, em 2003, a Gugler GmbH criou, com parceiros franceses, entre os quais os fundadores da interveniente, a sociedade Gugler Europe, que é titular da marca figurativa francesa GUGLER desde 28 de agosto de 2003. A Gugler Europe concedeu uma licença dessa marca à interveniente.

38      No caso em apreço, coloca‑se a questão de saber se a existência, na data de depósito do pedido de registo da marca contestada, de uma ligação económica entre o titular da marca contestada e a requerente da declaração de nulidade se opõe à constatação da existência de um risco de confusão, que é definido como «o risco de o público poder crer que os produtos ou serviços em causa provêm da mesma empresa ou de empresas ligadas economicamente».

39      A este respeito, importa recordar que a constatação de um risco de confusão tem por objetivo proteger a função de origem da marca, ao permitir a oposição ao registo de uma marca ou o pedido da sua nulidade, se existir um risco de que o consumidor seja induzido em erro sobre a origem dos produtos ou dos serviços em causa, ao crer erradamente que os produtos e os serviços abrangidos pelos sinais em conflito provêm da mesma empresa ou de empresas ligadas economicamente.

40      A função essencial da marca consiste em garantir ao consumidor ou ao utilizador final a identidade de origem do produto ou do serviço designado pela marca, permitindo‑lhe distinguir sem confusão possível esse produto ou esse serviço de outros que tenham proveniência diversa. Com efeito, para que a marca possa desempenhar o seu papel de elemento essencial do sistema de concorrência leal que o Tratado pretende criar e manter, deve constituir a garantia de que todos os produtos ou serviços que designa foram fabricados ou prestados sob o controlo de uma única empresa, à qual pode ser atribuída a responsabilidade pela sua qualidade (v. Acórdãos de 12 de novembro de 2002, Arsenal Football Club, C‑206/01, EU:C:2002:651, n.o 48 e jurisprudência referida, e de 8 de junho de 2017, W. F. Gözze Frottierweberei e Gözze, C‑689/15, EU:C:2017:434, n.o 41 e jurisprudência referida).

41      Para que esta garantia de proveniência, que constitui a função essencial da marca, possa ser assegurada, o seu titular deve ser protegido contra os concorrentes que pretendam abusar da posição e da reputação da marca, vendendo produtos que a utilizem indevidamente (Acórdão de 12 de novembro de 2002, Arsenal Football Club, C‑206/01, EU:C:2002:651, n.o 50).

42      No presente caso, a constatação da existência de um risco de confusão sobre a origem dos produtos e serviços abrangidos pela marca contestada pressupõe que o público relevante possa crer, erradamente, que os produtos e serviços por ela abrangidos e as atividades protegidas pelo sinal anterior provêm de empresas ligadas economicamente.

43      Ora, precisamente, no caso em apreço os produtos abrangidos pela marca contestada são fabricados pela Gugler GmbH e o titular da denominação social anterior é o distribuidor desses produtos. Por conseguinte, trata‑se de um caso em que o facto de o consumidor poder crer que os produtos e serviços em causa provêm de empresas economicamente ligadas não constitui um erro sobre a sua origem.

44      Importa igualmente analisar a questão de saber se, como afirmou a Câmara de Recurso, para excluir o risco de confusão, o consumidor deve ter conhecimento da ligação económica existente entre o titular do sinal anterior e o titular da marca contestada.

45      Como salienta o EUIPO, o público francês não tinha provavelmente conhecimento da existência da Gugler GmbH e do facto de esta empresa fabricar os produtos distribuídos pela interveniente, uma vez que esta última não se apresentava explicitamente como o distribuidor da Gugler GmbH. O EUIPO indica que o simples facto de a interveniente apresentar os seus produtos como sendo fabricados em Maxdorf, na Alemanha, não é suficiente para que o público francês saiba que se tratava do local em que a Gugler GmbH tinha a sua sede.

46      A apreciação do risco de confusão é de natureza objetiva. Nomeadamente, não é exigido que o consumidor tenha consciência de que comete um erro ao crer que os produtos e serviços provêm da mesma empresa ou de empresas ligadas economicamente. Da mesma forma, não se pode exigir que saiba que não se enganará quanto à origem dos produtos porque tem conhecimento da existência de uma ligação económica entre os titulares dos sinais em conflito.

47      Resulta da jurisprudência que a origem comercial exata que o público relevante atribui aos produtos ou aos serviços cobertos por cada uma das duas marcas em conflito pouco importa para a questão de saber se existe um risco de confusão entre elas. O que importa é saber se, nos dois casos, essa origem comercial poderá ser percebida pelo público relevante como a mesma [Acórdão de 9 de junho de 2010, Muñoz Arraiza/IHMI — Consejo Regulador de la Denominación de Origen Calificada Rioja (RIOJAVINA), T‑138/09, EU:T:2010:226, n.o 26].

48      Há, portanto, que considerar, contrariamente ao que afirmou a Câmara de Recurso, que não é necessário, para excluir a existência de um risco de confusão quando os titulares dos sinais em conflito estejam ligados economicamente, que o consumidor tenha conhecimento dessa ligação económica.

49      Daqui decorre que a ligação económica existente entre a interveniente, titular da denominação social anterior, e a Gugler GmbH, titular da marca contestada na data do depósito do pedido de registo, se opunha à constatação da existência de um risco de confusão.

50      A Câmara de Recurso concluiu, portanto, erradamente pela existência de um risco de confusão e há que, por conseguinte, julgar procedente a segunda parte do segundo fundamento.

51      Desta forma, sem que seja necessário analisar, no âmbito da primeira parte do segundo fundamento, se a Câmara de Recurso fez uma aplicação errada das condições de aplicação do artigo 8.o, n.o 4, do Regulamento n.o 207/2009, há que anular a decisão impugnada. Por conseguinte, também não é necessário decidir sobre o primeiro e terceiro fundamentos, nem sobre os argumentos do EUIPO relativos à admissibilidade de determinados anexos da petição.

 Quanto às despesas

52      Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

53      Tendo o EUIPO sido vencido, há que condená‑lo a suportar, além das suas próprias despesas, as efetuadas pelo recorrente, de acordo com os pedidos formulados por este último.

54      Tendo a interveniente sido vencida nos seus pedidos, suportará as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção),

decide:

1)      É anulada a Decisão da Primeira Câmara de Recurso do Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia (EUIPO), de 31 de janeiro de 2017 (processo R 1008/20161).

2)      O EUIPO suportará, além das suas próprias despesas, as despesas efetuadas por Alexander Gugler.

3)      A Gugler France suportará as suas próprias despesas.

Collins

Kancheva

De Baere

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 25 de setembro de 2018.

Assinaturas


*      Língua do processo: inglês.