Language of document : ECLI:EU:C:2014:2474

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

MELCHIOR WATHELET

apresentadas em 18 de dezembro de 2014 (1)

Processo C‑601/13

Ambisig — Ambiente e Sistemas de Informação Geográfica, SA

contra

Nersant — Associação Empresarial da Região de Santarém

e

Núcleo Inicial — Formação e Consultoria, L.da

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)]

«Reenvio prejudicial — Diretiva 2004/18/CE — Contrato de serviços — Adjudicação do contrato — Oferta economicamente mais vantajosa — Critérios de adjudicação do contrato — Avaliação da equipa encarregada da execução do contrato»





1.        O presente processo, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 25 de novembro de 2013, diz respeito à interpretação da Diretiva 2004/18/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de março de 2004, relativa à coordenação dos processos de adjudicação dos contratos de empreitada de obras públicas, dos contratos públicos de fornecimento e dos contratos públicos de serviços (2). O pedido de decisão prejudicial foi apresentado no âmbito de uma ação de contencioso pré‑contratual intentada pela Ambisig — Ambiente e Sistemas de Informação Geográfica, SA (a seguir «Ambisig»), contra a decisão, de 14 de fevereiro de 2012, do presidente da Comissão Executiva da Nersant — Associação Empresarial da Região de Santarém (a seguir «Nersant»), de adjudicar à Iberscal — Consultores Lda um contrato relativo à aquisição de serviços de formação e consultoria para a execução do projeto «Move PME, área de qualidade, ambiente, segurança e saúde no trabalho, segurança alimentar Médio Tejo — PME».

I –    Factos do litígio no processo principal e questão prejudicial

2.        A Nersant, entidade adjudicante, publicou, em 24 de novembro de 2011 (3), um anúncio de concurso público, com vista à aquisição de serviços de formação e consultoria para a execução do referido projeto «Move PME, área de qualidade, ambiente, segurança e saúde no trabalho, segurança alimentar Médio Tejo — PME».

3.        O artigo 5.° do anúncio de concurso previa que o contrato seria adjudicado à proposta economicamente mais vantajosa, apurada tendo em conta os seguintes fatores:

«A)      Avaliação da equipa: 40%

i)      Este fator será obtido tendo em conta a constituição da equipa, a experiência comprovada e análise curricular.

B)      Qualidade e mérito do serviço proposto: 55%

i)      Apreciação global da estrutura proposta incluindo o programa de trabalhos: 0 a 20%

ii)      Descrição das técnicas a utilizar e das metodologias de atuação: 0 a 15%

iii)      Descrição dos métodos de verificação e controlo da qualidade do trabalho, no âmbito das diversas áreas de intervenção: 0 a 20%

C)      Preço global: 5%

Será considerada mais valiosa a proposta que apresentar pontuação mais elevada».

4.        No seu relatório preliminar, o júri do concurso em causa classificou a Iberscal em primeiro lugar.

5.        Em 3 de janeiro de 2012, a Ambisig, que tinha apresentado uma proposta, exerceu o seu direito de audiência prévia, contestando a legalidade do fator A incluído nos critérios de adjudicação, a saber, a avaliação da equipa.

6.        O júri juntou ao seu relatório final, elaborado em 4 de janeiro de 2012, um aditamento datado de 14 de fevereiro de 2012, no qual rejeitou os argumentos apresentados pela Ambisig no âmbito do exercício do seu direito de audiência prévia. Segundo esse júri, o que é avaliado pelo referido fator A «é a concreta equipa técnica que o concorrente propõe afetar aos trabalhos a prestar. A experiência da equipa técnica proposta é, no caso concreto, uma característica intrínseca da proposta e não uma característica do concorrente».

7.        Por decisão de 14 de fevereiro de 2012, o presidente da Comissão Executiva da Nersant adjudicou o referido contrato de serviços à Iberscal, com base nas conclusões do júri, e aprovou a minuta do contrato de prestação de serviços.

8.        A Ambisig intentou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria (Portugal) uma ação em matéria de contencioso pré‑contratual, nos termos da qual pedia simultaneamente que o despacho de adjudicação do contrato em causa fosse anulado e que o objeto do processo fosse ampliado à impugnação do referido contrato.

9.        Tendo o Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria julgado a ação totalmente improcedente, a Ambisig interpôs recurso para o Tribunal Central Administrativo Sul.

10.      Confirmando a decisão proferida pelo tribunal de primeira instância, o tribunal de recurso considerou que o fator previsto no ponto A do artigo 5.° do anúncio de concurso, posto em causa enquanto critério de adjudicação, respeitava o artigo 75.°, n.° 1, do Código dos Contratos Públicos (a seguir «CCP»), na medida em que se reportava «à equipa proposta para executar o contrato de prestação de serviços posto a concurso e não, diretamente ou indiretamente, a situações, qualidades ou características ou outros elementos de facto relativos aos concorrentes».

11.      A Ambisig interpôs recurso desse acórdão no Supremo Tribunal Administrativo, alegando, em substância, que o critério de adjudicação controvertido era não só ilegal à luz do artigo 75.°, n.° 1, do CCP como igualmente contrário às disposições da Diretiva 2004/18.

12.      Segundo a decisão de reenvio do Supremo Tribunal Administrativo, a questão jurídica a resolver é a de saber se critérios como os contemplados no artigo 5.°, ponto A, do anúncio de concurso em causa são admissíveis como critérios de adjudicação em processos de concursos públicos relativos à aquisição de serviços e consultoria.

13.      O Supremo Tribunal Administrativo salienta que surgiu um elemento novo relativamente à jurisprudência do Tribunal de Justiça sobre as diretivas relativas aos contratos públicos, na medida em que a Comissão Europeia apresentou uma proposta de diretiva suscetível de alterar a apreciação desta questão (4).

14.      Neste contexto, o órgão jurisdicional de reenvio decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«Para a contratação da prestação de serviços, de caráter intelectual, de formação e consultoria, é compatível com a Diretiva [2004/18], e respetivas alterações, estabelecer, entre os fatores que compõem o critério de adjudicação das propostas de um concurso público, um fator que avalie as equipas concretamente propostas pelos concorrentes para a execução do contrato, tendo em conta as respetivas constituições, a experiência comprovada e a análise curricular?»

II – Análise

15.      Pode observar‑se, desde logo, que a Nersant, todos os Estados‑Membros que apresentaram observações neste processo, a saber, os Governos português, helénico e polaco, bem como a Comissão Europeia, propõem, em substância, uma resposta afirmativa à questão prejudicial. Por seu turno, a Ambisig não apresentou observações escritas, mas participou na audiência que teve lugar em 6 de novembro de 2014.

A –    Observações preliminares

16.      Em primeiro lugar, o meu raciocínio basear‑se‑á exclusivamente nas disposições da Diretiva 2004/18, as únicas relevantes ratione temporis, não sendo a nova diretiva aplicável, de forma alguma, ao caso concreto (5).

17.      Em segundo lugar, no que respeita aos princípios, importa distinguir os critérios de seleção e os critérios de adjudicação. Enquanto a seleção de um proponente diz respeito à sua situação pessoal e à sua aptidão para prosseguir a atividade profissional em causa, o contrato é adjudicado ao proponente que tenha apresentado a proposta economicamente mais vantajosa do ponto de vista da entidade adjudicante [artigo 53.°, n.° 1, alínea a), da Diretiva 2004/18] ou que proponha o preço mais baixo [n.° 1, alínea b), do mesmo artigo].

18.      Por outras palavras, é lógico que, no momento da adjudicação do contrato, não é (ou já não é) avaliado o proponente, mas a sua proposta.

19.      Além disso, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça em matéria de processo de adjudicação de contratos públicos, a verificação da aptidão dos proponentes para executar os contratos a adjudicar e a adjudicação destes contratos são duas operações distintas. Ainda que as diretivas pertinentes não excluam que a verificação da aptidão dos proponentes e a adjudicação do contrato possam ocorrer em simultâneo, as duas operações regem‑se por regras diferentes (6) e obedecem a objetivos diferentes.

20.      Neste contexto, o artigo 44.°, n.° 1, da Diretiva 2004/18 prevê que os contratos são adjudicados após verificada a aptidão dos operadores económicos de acordo com os critérios relativos à sua capacidade económica e financeira e aos seus conhecimentos ou capacidades profissionais e técnicas.

21.      Embora a Diretiva 2004/18 deixe às entidades adjudicantes a escolha dos critérios de adjudicação do contrato que pretendem considerar, não é menos certo que essa escolha só pode fazer‑se entre os critérios que visem identificar a proposta economicamente mais vantajosa (7), e, logo, a proposta que apresenta a melhor relação qualidade/preço.

B –    Jurisprudência

22.      No âmbito da Diretiva 92/50/CEE (8), o Tribunal de Justiça já se pronunciou sobre a questão de saber se esta diretiva se opunha a que, no quadro de um processo de adjudicação, a entidade adjudicante tenha em conta a experiência dos proponentes, o seu pessoal e o seu equipamento assim como a sua capacidade de executar o contrato no prazo previsto, não a título de critérios de seleção qualitativa, mas a título de critérios de adjudicação.

23.      No acórdão Lianakis e o. (EU:C:2008:40) (9), o Tribunal de Justiça declarou:

«30.      […] são excluídos como ‘critérios de adjudicação’os critérios que não visam identificar a proposta economicamente mais vantajosa, mas que estão ligados essencialmente à apreciação da aptidão dos proponentes para executar o contrato em questão.

31.      No processo principal, os critérios definidos, pela entidade adjudicante, como ‘critérios de adjudicação’ referem‑se, no entanto, principalmente à experiência, às qualificações e aos meios suscetíveis de garantir uma boa execução do contrato em questão. Trata‑se de critérios que dizem respeito à aptidão dos proponentes para executar esse contrato e que, portanto, não têm a qualidade de ‘critérios de adjudicação’, na aceção do artigo 36.°, n.° 1, da Diretiva 92/50.

32.      Deve, por conseguinte, reconhecer‑se que os artigos 23.°, n.° 1, 32.° e 36.°, n.° 1, da Diretiva 92/50 se opõem a que, no quadro de um processo de adjudicação, a entidade adjudicante tenha em conta a experiência dos proponentes, o seu pessoal e o equipamento assim como a capacidade de executarem o contrato no prazo previsto, não a título de ‘critérios de seleção qualitativa’, mas a título de ‘critérios de adjudicação’.»

24.      Ao fazê‑lo, o Tribunal de Justiça confirmou a sua jurisprudência (10) segundo a qual a verificação da aptidão dos proponentes para executar os trabalhos a adjudicar e a adjudicação do contrato são, no quadro da adjudicação de um contrato público, duas operações distintas que obedecem a regras diferentes.

25.      A inexistência de distinção entre os critérios de seleção qualitativa e os critérios de adjudicação levou, aliás, o Tribunal de Justiça a declarar um incumprimento no processo Comissão/Grécia (C‑199/07, EU:C:2009:693) (11).

26.      Neste contexto, importa salientar que a redação do artigo 36.°, n.° 1, alínea a), da Diretiva 92/50, sob a epígrafe «Critérios de adjudicação dos contratos», é, em substância, idêntica à redação do artigo 53.°, n.° 1, alínea a), da Diretiva 2004/18 (com exclusão da introdução por esta diretiva de três novos critérios relativos às características ambientais, ao custo de utilização e à rendibilidade) (12).

27.      Não obstante, em relação à Diretiva 92/50, a Diretiva 2004/18 parece conceder mais importância aos critérios qualitativos, na medida em que prevê, no seu considerando 46, terceiro parágrafo, que, «[s]empre que as entidades adjudicantes decidirem adjudicar o contrato à proposta economicamente mais vantajosa, deverão avaliar as propostas para determinar qual delas apresenta a melhor relação qualidade/preço. Para tanto, determinarão os critérios económicos e qualitativos que, no seu conjunto, devem permitir determinar a proposta economicamente mais vantajosa para a entidade adjudicante. A determinação dos critérios depende do objeto do contrato, na medida em que tais critérios devem permitir avaliar o nível de desempenho de cada proposta em relação ao objeto do contrato, tal como definido nas especificações técnicas, bem como calcular a relação qualidade/preço de cada proposta» (13).

28.      Além do mais, penso (à semelhança da Comissão) que o facto de o artigo 53.°, n.° 1, alínea a), da Diretiva 2004/18 não mencionar expressamente os títulos académicos ou profissionais dos membros da equipa proposta nem a relevância da sua experiência para a execução do contrato não pode ser considerado determinante, dado que os critérios de adjudicação previstos nesta disposição são enumerados apenas a título exemplificativo. Por conseguinte, é evidente que o artigo 53.°, n.° 1, alínea a), da Diretiva 2004/18 (14) deixa à entidade adjudicante a escolha dos critérios de adjudicação do contrato que pretenda considerar, desde que se destinem a identificar a proposta economicamente mais vantajosa. Além disso, decorre quer da jurisprudência quer da letra do artigo 53.°, n.° 1, alínea a), da Diretiva 2004/18 que só os critérios relacionados com o objeto do contrato (15) poderão ser considerados para adjudicação do contrato em causa.

29.      Os exemplos referidos no artigo 53.°, n.° 1, alínea a), da Diretiva 2004/18, quando «a adjudicação for feita à proposta economicamente mais vantajosa», são a qualidade, o preço, o valor técnico, as características estéticas e funcionais, as características ambientais, o custo de utilização, a rendibilidade, a assistência técnica e o serviço pós‑venda, a data de entrega e o prazo de entrega ou de execução.

30.      Neste contexto, em minha opinião, a equipa técnica apresentada pelos proponentes no âmbito de um concurso público que tenha por objeto a prestação de serviços de caráter intelectual, tais como, neste caso, serviços de formação e consultoria, constitui um aspeto intrinsecamente ligado ao objeto do contrato, em particular à sua qualidade, uma vez que essa avaliação não pretende, de forma alguma, avaliar a capacidade ou aptidão abstratas dos proponentes para executar o contrato, antes pretende avaliar a proposta, a saber, os meios (no caso, humanos) efetivamente afetados a esta execução.

31.      O mesmo se aplica a fortiori no caso de serviços complexos em que exista uma relação estreita entre, nomeadamente, as qualificações profissionais do pessoal e o valor económico das propostas.

32.      Com efeito, penso (à semelhança da Comissão) que, em determinados casos, a entidade adjudicante poderia precisar, no anúncio de concurso, que as qualificações e a experiência do pessoal afetado à execução do contrato poderão ser determinantes na avaliação do valor económico das propostas apresentadas.

33.      Este critério relativo às qualificações técnicas e profissionais dos membros da equipa encarregada da execução do contrato poderia ser considerado quando, por um lado, a própria natureza deste o justificasse e, por outro, a equipa encarregada da sua execução fosse determinante para o valor económico que a entidade adjudicante atribui a cada proposta. As qualificações e a experiência do pessoal em questão seriam então tidas em consideração para avaliar as propostas e determinar a que apresenta a melhor relação qualidade/preço.

34.      É o que indica o considerando 46, terceiro parágrafo, da Diretiva 2004/18 que permite a utilização de critérios de atribuição que «depende[m] do objeto do contrato, na medida em que tais critérios devem permitir avaliar o nível de desempenho de cada proposta em relação ao objeto do contrato [(16)], tal como definido nas especificações técnicas, bem como calcular a relação qualidade/preço de cada proposta».

35.      Isto implica que, na medida em que as características e as qualidades específicas do pessoal constituam um elemento determinante do valor económico da proposta, a substituição não autorizada de qualquer um dos membros da equipa proposta, durante a execução do contrato, será suscetível de reduzir esse valor do ponto de vista da entidade adjudicante. Observo, por outro lado, que o legislador da União Europeia acrescentou estas palavras (a saber, «do ponto de vista da entidade adjudicante») ao artigo 53.°, n.° 1, alínea a), da Diretiva 2004/18 relativamente ao artigo 36.°, n.° 1, alínea a), da Diretiva 92/50, salientando assim claramente a margem de apreciação das entidades adjudicantes na escolha dos critérios.

36.      Com efeito, e como sublinharam acertadamente os Governos português, helénico e polaco, no âmbito dos contratos de prestações de caráter intelectual, a experiência profissional do pessoal destinado a executar o contrato em causa exerce uma influência direta sobre a qualidade dos serviços prestados por esse pessoal.

37.      É incontestável que, nos contratos de serviços de caráter intelectual, não é só a capacidade do proponente que é apreciada, mas também a capacidade (ou a experiência profissional) do pessoal que será encarregado de prestar esses serviços, a saber, o «pessoal‑chave» identificado na proposta.

38.      As competências, a experiência e a eficácia em geral da equipa de trabalho constituem assim características intrínsecas da proposta de serviços como os em causa no processo principal, na medida em que se reportam a uma apreciação da qualidade da proposta e não à aptidão económica, técnica e profissional do proponente para assegurar a boa execução do contrato.

39.      Por conseguinte, concordo com a afirmação dos Governos português, helénico e polaco segundo a qual a experiência profissional das pessoas que prestam efetivamente tais serviços pode fazer parte dos critérios de seleção da proposta economicamente mais vantajosa previstos no artigo 53.° da Diretiva 2004/18.

40.      É interessante observar aqui que este problema já foi abordado no pedido de decisão prejudicial no processo Lianakis e o. (EU:C:2008:40) (17), no contexto de um critério de adjudicação e da respetiva avaliação. O órgão jurisdicional de reenvio esclareceu que, «[a]liás, se é verdade que o aviso de concurso exige, sob pena de inadmissibilidade, a apresentação de uma declaração sobre o tipo de vínculo laboral do pessoal, o facto de alguns membros da equipa de trabalho serem declarados como colaboradores permanentes do gabinete de estudos ‘Planitiki’ não constituiu um vício suscetível de levar à sua exclusão, uma vez que, com essa declaração, fica suficientemente definida a relação existente entre tais membros e o gabinete de projetos. Outra questão é a de saber se é legal o eventual cômputo, para efeitos de avaliação da experiência do gabinete de projetos, da experiência de meros colaboradores, que não são sócios nem empregados do gabinete de projetos ou não colaboram na assunção do projeto […]».

41.      Neste caso, parece resultar dos presentes autos, nos termos em que foram apresentados ao Tribunal de Justiça, que aquilo que foi avaliado pelo fator A «Avaliação da equipa proposta» foi efetivamente a equipa técnica concreta que cada um dos proponentes se propunha afetar à execução do contrato — analisando o júri a respetiva composição, experiência, perfil e competência técnico‑científica de cada um dos profissionais que integram essa equipa — e que, por conseguinte, a experiência da equipa técnica proposta era, neste caso, uma característica intrínseca da proposta e não uma característica do proponente.

42.      Como explica a Nersant, a qualidade das prestações dependia, em larga medida, das pessoas encarregadas de prestar os serviços. Com efeito, saliento que neste caso, na nota global para obter a proposta economicamente mais vantajosa, o preço só contava 5% contra 40% para a avaliação da equipa e 55% para a qualidade e mérito do serviço proposto (v. n.° 3 das presentes conclusões). É evidente que, no caso em apreço, a qualidade era um critério muito importante. Por conseguinte, há que distinguir a análise abstrata dos membros do pessoal de uma empresa que pode ser considerada respeitante a uma característica do proponente (o que seria proibido no âmbito da avaliação das propostas) de uma análise concreta da experiência e das competências do pessoal a afetar à execução do referido contrato que não constituiria uma característica do proponente, mas uma característica da sua proposta (o que, em meu entender, seria perfeitamente aceitável no âmbito da avaliação das propostas).

43.      Penso mesmo que esta distinção entre análise abstrata e análise concreta dos efetivos não é contrária aos acórdãos Lianakis e o. (EU:C:2008:40) e Comissão/Grécia (EU:C:2009:693).

44.      Com efeito, já no acórdão Beentjes (EU:C:1988:422), o Tribunal de Justiça não afastou a possibilidade de, no momento da seleção, ser adequado avaliar a capacidade do proponente e, no momento da adjudicação, avaliar as competências específicas dos membros do grupo de projeto («project team»). No n.° 30 do acórdão Lianakis e o. (EU:C:2008:40), o Tribunal de Justiça refere‑se ao caráter inapropriado do tratamento como critério de adjudicação da «apreciação da aptidão dos proponentes para executar o contrato em questão» (o sublinhado é meu) (18).

45.      Em todo o caso, pode afirmar‑se que as situações de facto na origem dos acórdãos Lianakis e o. (EU:C:2008:40) e Comissão/Grécia (EU:C:2009:693) são diferentes da subjacente ao presente processo.

46.      Com efeito, no referido processo Lianakis e o., a entidade adjudicante havia fixado como critérios de adjudicação a «experiência», tendo por referência o montante dos estudos realizados pela empresa proponente durante os últimos três anos e «o pessoal e o equipamento do gabinete», tendo em conta o pessoal do grupo de estudos (19).

47.      Estes critérios eram muito genéricos e diziam respeito ao proponente, sem referência ao trabalho concretamente efetuado contrariamente ao critério aqui utilizado, que é muito mais preciso e diz respeito à equipa técnica que será encarregada da execução do contrato: «A) Avaliação da equipa: 40%. i) Este fator será obtido tendo em conta a constituição da equipa, a experiência comprovada e análise curricular» (ponto 2.2.1. do pedido de decisão prejudicial) (o sublinhado é meu).

48.      Pelo contrário, no que diz respeito à experiência enquanto critério de adjudicação, no acórdão Lianakis e o. (EU:C:2008:40), a entidade adjudicante «determinou que [esta] devia ser apreciada segundo o montante dos estudos realizados. Assim, um proponente recebia 0 pontos por um montante até 500 000 euros, 6 pontos por um montante entre 500 000 euros e 1 000 000 euros, 12 pontos por um montante entre 1 000 000 euros e 1 500 000 euros, e assim por diante até à nota máxima de 60 pontos por um montante superior a 12 000 000 euros» (n.° 14 desse acórdão). Apenas o montante global dos estudos realizados era determinante.

49.      No que diz respeito ao segundo critério de adjudicação, a saber, o pessoal e o equipamento do gabinete, estes últimos «deviam ser apreciados em função do número dos efetivos do grupo de estudos. Por conseguinte, um proponente recebia 2 pontos por um grupo de 1 a 5 pessoas, 4 pontos por um grupo de 6 a 10 pessoas, e assim por diante até à nota máxima de 20 pontos por um grupo de mais de 45 pessoas» [n.° 15 do acórdão Lianakis e o. (EU:C:2008:40)]. Uma vez mais, só o número de efetivos era determinante (independentemente da composição e experiência concretas).

50.      Por último, quanto ao terceiro critério de adjudicação (a capacidade de realizar o estudo no prazo previsto), esta «devia ser apreciada em função do montante dos compromissos assumidos. Deste modo, um proponente recebia a nota máxima de 20 pontos por um montante inferior a 15 000 euros, 18 pontos por um montante entre 15 000 euros e 60 000 euros, 16 pontos por um montante entre 60 000 euros e 100 000 euros, e assim por diante até à nota mínima de 0 pontos por um montante superior a 1 500 000 euros» (n.° 16 do referido acórdão). Uma vez mais, não era tida em conta nenhuma conotação qualitativa concreta.

51.      Por conseguinte, é evidente que, contrariamente ao presente processo, no acórdão Lianakis e o. (EU:C:2008:40), a avaliação incidia sobre a empresa proponente (e sua experiência em geral) e não sobre a equipa técnica a ser afetada ao contrato (e sua experiência específica).

52.      Do mesmo modo, no processo Comissão/Grécia (EU:C:2009:693), o critério de adjudicação assentava na avaliação da experiência geral e específica da empresa proponente, em particular, do trabalho de conceção de projetos semelhantes, e na sua capacidade para executar o contrato no prazo previsto.

53.      À semelhança da Nersant, creio que, em ambos os casos, os critérios definidos diziam respeito à aptidão ou à capacidade abstratas dos proponentes para a execução do contrato e não às das equipas técnicas concretas a afetar a essa execução.

54.      Assim sendo, em meu entender, não decorre dos acórdãos Lianakis e o. (EU:C:2008:40) e Comissão/Grécia (EU:C:2009:693) que a equipa técnica concreta a afetar a um contrato não possa ser objeto de uma avaliação no âmbito da avaliação das propostas, mas apenas que a adjudicação do contrato não pode assentar num critério baseado na aptidão do proponente para executar um contrato (aptidão aferida com base na sua capacidade abstratamente definida).

55.      Do mesmo modo, a apreciação por parte da entidade adjudicante da equipa destinada, pelo operador económico, à execução do contrato em causa que é relativo à prestação de serviços de natureza intelectual destina‑se a avaliar a qualidade oferecida pelo operador económico pelos serviços que devem ser fornecidos. Diz assim respeito a um critério destinado a selecionar a proposta que apresenta a melhor relação qualidade/preço.

56.      Tal como sublinham Hölzl e Friton (20), a admissibilidade de um critério de adjudicação depende da questão de saber se este último está associado à capacidade do proponente para executar o contrato em causa ou se se destina a identificar a proposta economicamente mais vantajosa. Nesta última situação, a experiência da equipa ou do pessoal afetado aos serviços abrangidos pelo contrato em questão pode ser efetivamente utilizada.

57.      O acórdão Lianakis e o. (EU:C:2008:40) não se opõe a uma tal interpretação (21). Com efeito, neste acórdão, o Tribunal de Justiça declarou que são excluídos como critérios de adjudicação critérios que «estão ligados essencialmente» ou «[se] referem [...] principalmente» à apreciação da aptidão dos proponentes para executar o contrato em questão. Isso permite, portanto, utilizar critérios que, dizendo igualmente respeito à questão da aptidão do proponente para executar o contrato, se destinam principalmente a identificar a proposta economicamente mais vantajosa.

58.      Será útil referir outros acórdãos do Tribunal de Justiça e, em primeiro lugar, o acórdão GAT (EU:C:2003:360), anterior ao acórdão Lianakis e o. (EU:C:2008:40). Nesse processo, uma entidade adjudicante austríaca havia lançado um concurso público para o fornecimento de um veículo especial (uma varredoura mecânica) destinado ao serviço de gestão e manutenção de uma autoestrada. O anúncio de concurso previa que, «a fim de avaliar as propostas para determinar a proposta economicamente mais vantajosa, a entidade adjudicante devia ter em conta o número das referências relativas aos produtos oferecidos pelos proponentes a outros clientes», acrescentando o Tribunal de Justiça — neste caso com relevo — «sem examinar se a experiência destes [clientes] com os produtos adquiridos tinha sido boa ou má» (n.° 57).

59.      O Tribunal de Justiça declarou, no n.° 64 desse acórdão, que, se o artigo 26.°, n.° 1, da Diretiva 93/36/CEE (22) deixava à entidade adjudicante a escolha dos critérios de adjudicação que entendia fixar, essa escolha só podia fazer‑se entre critérios para identificação da proposta economicamente mais vantajosa. Ora, «há que referir que a apresentação de uma lista dos principais fornecimentos efetuados durante os três últimos anos, com indicação dos montantes, datas e destinatários, públicos ou privados, figura expressamente entre os elementos de referência ou os meios de prova que, nos termos do artigo 23.°, n.° 1, alínea a), da Diretiva 93/36, podem ser exigidos para justificar a capacidade técnica dos fornecedores» (n.° 65).

60.      Além disso, «uma simples lista de referências, como a exigida no anúncio do concurso em causa no processo principal, que contenha unicamente a identidade e o número dos clientes anteriores dos proponentes, sem outras precisões relativamente aos fornecimentos efetuados a esses clientes, não dá qualquer indicação que permita identificar a proposta economicamente mais vantajosa, na aceção do artigo 26.°, n.° 1, alínea b), da Diretiva 93/36, e não pode, portanto, em caso algum, constituir um critério de adjudicação na aceção desta disposição» (n.° 66).

61.      Por conseguinte, o Tribunal de Justiça concluiu que «a Diretiva 93/36 se opõe a que, no âmbito de um processo de adjudicação de um contrato público de fornecimento, a entidade adjudicante tenha em conta o número das referências relativas aos produtos oferecidos pelos proponentes a outros clientes não como critério de verificação da aptidão destes últimos para executar o contrato em causa, mas como critério de adjudicação do referido contrato» (n.° 67).

62.      Em meu entender, verifica‑se que o Tribunal de Justiça não excluiu, por princípio, a utilização das listas de referências como critério de adjudicação, mas apenas na medida em que estas forneçam uma indicação sobre a qualidade [por exemplo, ao mencionar se a experiência dos clientes com os produtos foi boa ou má (v. n.° 57 desse acórdão)], por outras palavras, uma indicação que permita identificar a proposta economicamente mais vantajosa (23).

63.      Por outro lado, o Tribunal de Justiça não tinha exigido, no seu acórdão Evans Medical e Macfarlan Smith (C‑324/93, EU:C:1995:84), que os critérios de seleção e os critérios de adjudicação se excluíssem entre si e tinha admitido que fosse tido em conta na adjudicação um critério baseado no proponente (a saber, a sua capacidade para assegurar a segurança e a regularidade do abastecimento).

64.      Por último, pode salientar‑se que, quando a fiabilidade é especificamente mencionada como critério de seleção nas diretivas relativas aos contratos públicos, o Tribunal de Justiça observa, no acórdão EVN e Wienstrom (C‑448/01, EU:C:2003:651, n.° 70), que «a segurança do abastecimento [pode], em princípio, fazer parte dos critérios de adjudicação a ter em consideração para determinar a proposta economicamente mais vantajosa».

65.      Menciono igualmente a jurisprudência do Tribunal Geral da União Europeia em processos relativos aos contratos públicos celebrados pelas instituições da União e que aqui reveste interesse por tais contratos terem sido celebrados com fundamento em disposições cuja redação é idêntica aos termos da Diretiva 2004/18 aplicáveis ao presente processo.

66.      No processo Evropaïki Dynamiki/Comissão (T‑589/08, EU:T:2011:73) [decidido após o acórdão Lianakis e o. ( EU:C:2008:40), uma vez que o Tribunal de Justiça negou provimento ao recurso interposto desse acórdão do Tribunal Geral, através do despacho Evropaïki Dynamiki/Comissão (C‑235/11 P, EU:C:2011:791)], colocava‑se a questão do número de dias indicado para a execução dos trabalhos num processo de concurso público. O Tribunal Geral observou que, «[n]o seu relatório, o comité de avaliação [tinha] salientado que ‘[o] número de dias indicado para a execução dos trabalhos da missão [se afigurava] exageradamente reduzido’ e que ‘[i]sto suscita[va] sérias dúvidas quanto à possibilidade de alcançar adequadamente os objetivos’» (n.° 40).

67.      A este respeito, o Tribunal Geral recordou que, «na sua proposta, a recorrente tinha proposto 45 pessoas/dias para a gestão do projeto, enquanto a estimativa prevista no caderno de encargos era de 60 pessoas/dias. Tal como o comité de avaliação observou no seu relatório, o número de pessoas/dias proposto pela recorrente é, pois, inferior em 25% à estimativa fornecida a título indicativo no processo de concurso em litígio. O Tribunal Geral considera, e a recorrente reconheceu‑o aliás na audiência, que uma discrepância destas exige uma explicação convincente» (n.° 41). Segundo o Tribunal Geral, a indicação do número de pessoas/dias previsto era «relevante, principalmente para avaliar a fiabilidade da proposta da recorrente» (n.° 42).

68.      O que aqui nos interessa é que o Tribunal Geral observa acertadamente, no n.° 43, que «a alegada experiência dos peritos da recorrente também não explica esta discrepância. A este respeito, o Tribunal Geral não partilha contudo da afirmação da Comissão, segundo a qual a experiência da recorrente é desprovida de pertinência para a avaliação dos critérios de adjudicação. Se é verdade que, em geral, esse fator é tido em conta para determinar se a proposta pode satisfazer os critérios de seleção e não por ocasião da avaliação dos critérios de adjudicação, importa salientar que a recorrente não invoca a sua experiência como critério de adjudicação em si mesmo, mas apenas com vista a justificar o número reduzido de pessoas/dias previsto. Neste contexto, uma maior experiência seria, em princípio, suscetível de explicar um tal desvio entre as estimativas» (o sublinhado é meu).

69.      Ora, como salienta o Tribunal Geral (n.° 44), neste caso, a recorrente não tinha demonstrado que a sua equipa dispunha de uma maior experiência. Por conseguinte, declarou que a Comissão tinha razão ao considerar que a experiência invocada não permitia apreciar a capacidade da equipa para realizar, em 45 dias, os serviços exigidos (n.° 45) (24).

70.      Num outro acórdão posterior ao acórdão Lianakis e o. (EU:C:2008:40), a saber, o acórdão Evropaïki Dynamiki/EFSA (EU:T:2012:671), o Tribunal Geral declarou acertamente — no âmbito de um litígio relativo à celebração de contratos públicos por um organismo da União e a propósito de um concurso público com um caráter altamente técnico relativo ao fornecimento de prestações de serviços com base num contrato‑quadro — que não era possível deduzir nem da regulamentação aplicável nem da jurisprudência Beentjes (EU:C:1988:422) e Lianakis e o. (EU:C:2008:40) que a utilização de curricula vitae para efeitos de avaliação, tanto na fase de seleção como na fase de adjudicação, devia ser excluída por princípio (v. n.os 80 e segs.).

71.      Segundo o Tribunal Geral, a utilização destes documentos durante a fase de adjudicação poderia justificar‑se se servisse para identificar a proposta economicamente mais vantajosa e não a aptidão dos proponentes para executar o contrato (n.os 81 e 82).

72.      O Tribunal Geral destaca, particularmente, o facto de a utilização de um critério que consiste em avaliar a estratégia de formação de uma equipa proposta para executar um contrato de serviços complexos poder servir para identificar a proposta economicamente mais vantajosa, na medida em que se trata claramente de serviços em relação aos quais a qualidade da proposta e a qualidade da equipa proposta estão inegavelmente ligadas (n.° 82).

73.      No acórdão AWWW/FEACVT (T‑211/07, EU:T:2008:240, n.os 58 a 63), igualmente posterior ao acórdão Lianakis e o. (EU:C:2008:40), foi também acertadamente que o Tribunal Geral considerou legítimo o facto de se ter em conta, como critério de adjudicação, a experiência anterior, com vista a apreciar a qualidade da execução dos serviços, na medida em que considera que os curricula vitae do processo de seleção podem ser utilizados e a experiência tida em conta na avaliação da qualidade da execução, por parte do proponente, das partes específicas do trabalho abrangidas pelo contrato. Menciono ainda na mesma linha o acórdão Evropaïki Dynamiki/OEDT (T‑63/06, EU:T:2010:368).

74.      Já antes do acórdão Lianakis e o. (EU:C:2008:40), o Tribunal Geral tinha aceitado, no acórdão Renco/Conselho (T‑4/01, EU:T:2003:37), que a experiência da empresa pudesse ser utilizada como critério de adjudicação (25).

C –    Doutrina

75.      Um grande número de artigos de doutrina sustentam também que a avaliação da equipa técnica a ser afetada à execução de um contrato pode constituir um aspeto da proposta e não uma característica do proponente, e que, por esse motivo, pode constituir um fator a ter em conta na escolha da proposta economicamente mais vantajosa (26).

76.      Como Lee (27) salientou acertadamente, «[e]valuating an entityʼs ability to perform the contract on the one hand, and comparing the strengths of different teams proposed by tenderers are not the same thing. For example, an awarding authority seeking management consultancy services is likely to find that the global consultancy firms have the capacity and manpower to carry out almost any given management consultancy project. However, it is self‑evident that the success of the project will depend not on the capacity of the firm but on the specific resources made available by that firm for the project».

77.      Em seguida, tal como Rubach‑Larsen (28) observou com razão, «the ECJ has opened up for the lawful choice of bidder related criteria as award criteria, provided that these are not essentially linked to the selection of qualified tenderers, but instead to the evaluation of the offers, and not principally related to the tenderers' experience, qualification or means, but to the quality of the works, supplies or services they have offered» (o sublinhado é meu).

78.      Como Arrowsmith (29) também salientou acertadamente, «Lianakis does not preclude considering either the abilities of the tenderer or the qualities of the individuals or team that will be working on the contract to the extent that these are actually relevant to the quality of the work that will be done under the contract i.e. to determining which offer is the most economically advantageous. In this respect, it can be argued that on the facts of Lianakis the experience and manpower of the tenderer was not actually used to assess the quality of the services but in an arbitrary fashion that had no relevance to that question — tenderers were given higher scores for different types and extent of experience without actually considering the relevance of this to the services to be performed (which were actually of relatively low value)» (o sublinhado é meu).

79.      Por último, Treumer (30) cita com pertinência uma decisão da Danish Complaints Board for Public Procurement (31) segundo a qual «[t]he Board quoted a passage from [an] earlier ruling to the effect that according to the EC public procurement rules it is not excluded that an element can be considered both in the selection and in the award stage. However, according to the Board the condition is that the element according to its content is suited to function as the basis for selection but also — owing to the character of the supply in question — is suited to assess the economically most advantageous tender. The Board found that this condition was fulfilled in the concrete case, which concerned a service where an experienced service provider would be of particular value. The Board emphasized in this context that the reliability of supply was of special importance for the task in question, namely out of consideration for maritime safety. The Board therefore found it justified to consider the extent of the experience in the award phase while it at the same time stressed that this normally is to be considered as a selection criterion» (o sublinhado é meu).

D –    Conclusão

80.      Embora a distinção entre a etapa de seleção e a de adjudicação impeça que se utilize como critério de adjudicação a experiência anterior geral de um operador económico, não deixa de ser verdade que a experiência específica da equipa técnica concreta por este proposta pode, em determinados contratos, ser tida em conta no momento da adjudicação do contrato, para efeitos de avaliação da proposta.

81.      Como o Governo polaco acertadamente salientou, o artigo 53.° da Diretiva 2004/18 menciona expressamente a qualidade da entrega ou dos serviços como um dos critérios suscetíveis de serem tidos em conta pela entidade adjudicante. Neste quadro, o artigo 53.°, n.° 1, alínea a), da Diretiva 2004/18 refere‑se à proposta economicamente mais vantajosa do ponto de vista da entidade adjudicante e não à proposta mais vantajosa à luz de critérios abstratos e objetivos. A entidade adjudicante deve, assim, ter a possibilidade de definir, para a seleção da proposta economicamente mais vantajosa, os fatores que devem ser tidos em conta e cuja satisfação lhe permitirá escolher a proposta mais vantajosa à luz das suas necessidades específicas.

82.      Estou igualmente de acordo com o Governo português quando este salienta que a possibilidade, ou mesmo a necessidade, de apreciar o valor técnico e a qualidade da proposta em si, com vista a adjudicar contratos que tenham por objeto a prestação de serviços de caráter intelectual, de formação e consultoria, como no presente processo, deve ser concretizada por meio de elementos objetivos ligados ao conteúdo da proposta. Além disso, um destes elementos essenciais consiste, precisamente, na indicação dos recursos humanos concretos que os proponentes afetarão à execução do contrato, não constituindo evidentemente esta indicação uma qualidade ou uma característica dos proponentes, mas da própria proposta.

83.      Esta interpretação parece‑me ser a que melhor se coaduna com a letra e o espírito das disposições em questão e com a sistemática da Diretiva 2004/18 (que, não esqueçamos, se destina a conferir maior importância aos critérios qualitativos) (32) no que respeita aos contratos que tenham por objeto a prestação de serviços de caráter intelectual, de formação e consultoria.

84.      À luz da Diretiva 2004/18, o critério de adjudicação das propostas de um concurso público pode assim abranger uma avaliação das equipas técnicas objetiva e concretamente propostas pelos proponentes para a execução de um contrato que tenha por objeto a prestação de serviços de caráter intelectual, como a formação ou a consultoria.

85.      Por último, como o Governo polaco salientou acertadamente, parece resultar dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça que, no caso concreto, a entidade adjudicante satisfez as restantes exigências estabelecidas na Diretiva 2004/18, no que diz respeito à necessidade de assegurar os princípios da transparência e da não discriminação do processo de concurso público em causa.

86.      Por conseguinte, deve responder‑se à questão prejudicial submetida que a Diretiva 2014/18 não se opõe a que, em determinadas circunstâncias, para a adjudicação de contratos de prestação de serviços de caráter intelectual, de formação e consultoria, as entidades adjudicantes utilizem, entre os fatores que compõem o critério de adjudicação de um contrato público, a avaliação das equipas concretamente propostas pelos concorrentes para a execução do contrato em causa, tendo em conta, com base numa análise concreta, a respetiva composição, a experiência comprovada e os seus diplomas e outras qualificações profissionais. O exercício desta faculdade só é compatível com os objetivos da Diretiva 2004/18 quando as características e as qualidades específicas do pessoal que compõe a equipa constituam um elemento determinante do valor económico da proposta submetida à avaliação da entidade adjudicante, de modo que a substituição não autorizada, no decurso da execução do contrato, de um dos membros da equipa proposta seria suscetível de reduzir esse valor do ponto de vista da entidade adjudicante.

E –    Post scriptum: a nova Diretiva 2014/24

87.      Ainda que a nova Diretiva 2014/24 não seja aplicável ratione temporis ao presente caso (33), menciono‑a aqui por uma questão de exaustividade.

88.      Decorre do artigo 67.°, n.° 2, alínea b), da Diretiva 2014/24 que o legislador da União considera necessário esclarecer as regras discutidas nas presentes conclusões. Segundo esta disposição, de entre os critérios de adjudicação do contrato suscetíveis de ser tidos em consideração pela entidade adjudicante para determinar a proposta economicamente mais vantajosa, constam a «[o]rganização, qualificações e experiência do pessoal encarregado da execução do contrato em questão, caso a qualidade do pessoal empregue tenha um impacto significativo no nível de execução do contrato».

89.      Esta disposição é clarificada no considerando 94 desta diretiva que dispõe:

«Sempre que a qualidade do pessoal empregado seja relevante para o nível de desempenho do contrato, as autoridades adjudicantes deverão também poder utilizar como critério de adjudicação a organização, as qualificações e a experiência do pessoal encarregado da execução do contrato em questão, pois estas características podem afetar a qualidade da execução do contrato e, consequentemente, o valor económico da proposta. Tal pode ser o caso, por exemplo, dos contratos de serviços de natureza intelectual como a consultoria ou os serviços de arquitetura. As autoridades adjudicantes que recorram a esta possibilidade deverão assegurar, através dos meios adequados previstos nos contratos[,] que o pessoal encarregado da execução do contrato cumpra efetivamente as normas de qualidade especificados e só possa ser substituído com o consentimento da autoridade adjudicante, que verificará se a substituição do pessoal proporciona um nível de qualidade equivalente.»

90.      A intenção de clarificar as regras em causa neste processo já estava presente na Proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, relativa aos contratos públicos [COM(2011 896 final]. Com efeito, na respetiva exposição de motivos, pode ler‑se que «[a] distinção entre a seleção dos proponentes e a adjudicação do contrato, que provoca muitas vezes erros e mal‑entendidos, tornou‑se mais flexível, permitindo que as autoridades adjudicantes tomem decisões sobre a sequência que considerem mais prática, analisando os critérios de adjudicação antes dos critérios de seleção, e tenham em conta a organização e a qualidade do pessoal afetado à execução do contrato como critério de adjudicação».

III – Conclusão

91.      Por conseguinte, convido o Tribunal de Justiça a responder à questão prejudicial submetida pelo Supremo Tribunal Administrativo da seguinte forma:

«A Diretiva 2014/18/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de março de 2004, relativa à coordenação dos processos de adjudicação dos contratos de empreitada de obras públicas, dos contratos públicos de fornecimento e dos contratos públicos de serviços, não se opõe a que, em determinadas circunstâncias, para a celebração de contratos de prestação de serviços de caráter intelectual, de formação e consultoria, as entidades adjudicantes estabeleçam, entre os fatores que compõem o critério de adjudicação de um contrato público, um fator que permita avaliar as equipas concretamente propostas pelos concorrentes para a execução do contrato, tendo em conta a respetiva constituição, a experiência comprovada e a análise dos seus diplomas e outras qualificações profissionais. No entanto, o exercício desta faculdade só é compatível com os objetivos da Diretiva 2004/18 quando as características e as qualidades específicas do pessoal que compõe a equipa constituam um elemento determinante do valor económico da proposta submetida à avaliação da entidade adjudicante.»


1 —      Língua original: francês.


2 —      JO L 134, p. 114.


3 —      Diário da República, 2.ª série, n.° 226.


4 —      Após a entrada dos presentes autos no Tribunal de Justiça, foi adotada a Diretiva 2014/24/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de fevereiro de 2014, relativa aos contratos públicos e que revoga a Diretiva 2004/18 (JO L 94, p. 65), a qual entrou em vigor em abril do mesmo ano.


5 —      V. acórdãos Comissão/França (C‑337/98, EU:C:2000:543, n.os 38 a 40) e Hochtief e Linde‑Kca‑Dresden (C‑138/08, EU:C:2009:627). A Diretiva 2014/24 não estava sequer em vigor à data dos factos no processo principal.


6 —      V., neste sentido, acórdãos Beentjes (31/87, EU:C:1988:422, n.os 15 e 16) e Lianakis e o. (C‑532/06, EU:C:2008:40, n.° 26).


7 —      Acórdãos Beentjes (EU:C:1988:422, n.° 19); Concordia Bus Finland (C‑513/99, EU:C:2002:495, n.os 54 e 59); GAT (C‑315/01, EU:C:2003:360, n.os 63 e 64); e Lianakis e o. (EU:C:2008:40, n.° 29).


8 —      Diretiva do Conselho, de 18 de junho de 1992, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de contratos públicos de serviços (JO L 209, p. 1), conforme alterada pela Diretiva 97/52/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de outubro de 1997 (JO L 328, p. 1, a seguir «Diretiva 92/50»).


9 —      Observo que esse acórdão foi proferido por uma Secção composta por cinco juízes, sem conclusões.


10 —      V. acórdão Beentjes (EU:C:1988:422).


11 —      Neste contexto, v., igualmente, acórdão Espanha/Comissão (C‑641/13 P, EU:C:2014:2264).


12 —      Neste contexto, determinados autores salientaram, contudo, que noutros dos seus artigos as duas diretivas apresentam algumas diferenças a este propósito. V., por exemplo, Burgi, M., e Brandmeier, B. — «Quality as an interacting award criterion under current and future EU‑law», European Procurement & Public Private Partnership Law Review, 2014, vol. 9, n.° 1, p. 23: «Taking a closer look at the background of these judgments [acórdãos Beentjes (EU:C:1988:422); Lianakis e o. (EU:C:2008:40); e Comissão/Grécia (EU:C:2009:693)], […] the wording of the previous provisions in Directive 92/50/EC, on which the court based its decision, provided for a much stricter differentiation between the selection and the award stage. […] Article 20 stated that selection criteria had to be evaluated before entering the award phase. Apart from the fact that this chronological order never was interpreted in a strict way […], the legal base for such an assumption was replaced. A provision according to Article 20 of Directive 92/50 no longer exists under current EU law».


13 —      Burgi, M., e Brandmeier, B., op. cit., salientam, no mesmo artigo, que, «among the non‑exhaustive list of possible award criteria in Article 53(1)(a) of Directive 2004/18/EC, the aspect of ‘delivery date and delivery period or period of completion’ was introduced as concreti[s]ation of quality in this regard. […] Apart from this, it is striking that the court gave no further justification, in any of these rulings, for the necessity of such a strict differentiation, nor did it take into account the practical need of public entities to make certain tenderer‑related aspects part of their awarding decision».


1414 —      Que respeita ao caso de «a adjudicação [ser] feita à proposta economicamente mais vantajosa do ponto de vista da entidade adjudicante», referindo‑se a alínea b) do n.° 1 ao caso em que as entidades adjudicantes têm por base «unicamente o preço mais baixo» na adjudicação do contrato.


1515 —      V., neste sentido, acórdãos Concordia Bus Finland (EU:C:2002:495, n.° 59) e Lianakis e o. (EU:C:2008:40, n.° 29).


1616 —      V. Lee, P. — «Implications of the Lianakis decision», Public Procurement Law Review, 2010, p. 52: «The recitals in the old directives were silent regarding award criteria. This change clarifies that where criteria are relevant to assess the ‘performance offered’ by each tenderer, it is an appropriate and valid award criteria. This provision changes the emphasis that might have existed in the old directives, and clarifies that criteria, where they assess the ‘level of performance’, must be valid criteria regardless of whether it was also a selection criterion. How else is the anticipated level of performance in a services contract to be evaluated? Does not the experience of the specific personnel offered become a necessary evaluation criterion? Perhaps the anticipated level of performance and the mere ability to perform are different. A League One soccer player has the ability to ‘perform’ in a soccer match, but the anticipated level of performance would be significantly different from that of a premiership player» (o sublinhado é meu).


1717 —      V. Pachner, F. — «Schafft die Entscheidung Lianakis des EuGH Probleme für die Vergabe geistiger Leistungen?», ZVB, 2008, pp. 285 e segs.


1818 —      No que respeita à mesma interpretação, v., inter alia, Lee, P., op. cit. Tal como este acertadamente salienta: i) «the facts of the case [in Lianakis e o.] go some way to undermine the contention that the municipality genuinely examined the project team rather than the firm’s size»; ii) «there is nothing explicit or implicit in the wording of the directives that leads to the conclusion that the experience of the project team cannot be, or should not be, evaluated at the award stage», e iii) «more unfortunately neither in Beentjes nor in Lianakis [e o.] is there any rationale offered to explain the harm that could arise if ‘experience’ were considered at both stages, in particular where at selection ‘experience’ is of the entity and at award is of the project team».


1919 —      «O anúncio de concurso mencionava, como critérios de adjudicação por ordem de prioridade, em primeiro lugar, a comprovada experiência do perito, adquirida durante estudos realizados no decurso dos três últimos anos, em segundo lugar, o pessoal e o equipamento do gabinete e, em terceiro lugar, a capacidade de realizar o estudo no prazo previsto, combinada com os compromissos assumidos pelo gabinete e pelo seu potencial científico» (n.° 10 desse acórdão) (o sublinhado é meu).


2020 —      Hölzl, F.‑J., e Friton, P. — «Entweder — Oder: Eignungs — sind keine Zuschlagskriterien», Neue Zeitschrift für Baurecht und Vergaberecht, 2008, pp. 307 e 308.


2121 —      V. Orthmann, M. — «The experience of the bidder as award criterion in EU public procurement law», Humboldt Forum Recht, 2014, n.° 1, p. 4. Salienta que, «throughout the EU, contracting authorities already seem to have adopted a flexible interpretation of the rule and to follow a pragmatic approach in dealing with the criterion ‘experience’ [...]. In general, contracting authorities indeed encounter the problem of experience as an award criterion mostly in cases concerning services of a more complex nature [...]. National courts seem to have adopted a soft interpretation of the rule [...] allowing the contracting authorities to take into account experience where it is linked to the subject‑matter of the contract [...] and has not been established as a selection criterion [Oberlandesgericht München, decisão de 10 de fevereiro de 2011, n.° Verg 24/10; Oberlandesgericht Düsseldorf, decisão de 5 de maio de 2008, n.° Verg 5/08; Oberlandesgericht Düsseldorf, decisão de 28 de abril de 2008, n.° Verg 1/08]».


2222 —      Diretiva do Conselho, de 14 de junho de 1993, relativa à coordenação dos processos de adjudicação dos contratos públicos de fornecimento (JO L 199, p. 1).


2323 —      V., também, n.° 51 das conclusões do advogado‑geral L. A. Geelhoed no processo GAT (EU:C:2002:573), segundo o qual «[a] lista de referências em causa diz, possivelmente, algo sobre a experiência e o conhecimento técnico do concorrente, mas uma lista desse tipo não é adequada para se poder determinar qual a proposta mais vantajosa. Essa lista de referências não fornece, nomeadamente, qualquer indicação sobre os serviços prestados, a assistência, os custos de utilização ou outros critérios adequados para determinar qual a proposta que, em última análise, se revelará economicamente mais vantajosa para a entidade adjudicante».


2424 —      V. Peterson, Z. — «Refining the rules on the distinction between selection and award criteria — Evropaïki Dynamiki v Commission (T‑589/08)», Public Procurement Law Review, 2011, p. NA246: «The present ruling […] interprets [the] case law [of the Court] in a flexible way, as it clearly approved the consideration of the experience and qualifications of the proposed team members when evaluating the relative advantages of the proposed project management within the third award criterion. For the purpose of that evaluation it expressly applied the test whether the applicantʼs tender had shown the ability of its proposed team to properly deliver the objectives of the contract […] So it seems that the General Court considers the experience and qualifications of the team members offered to perform the specific contract to be admissible considerations for the award decision. The experience and qualifications of the team offered in the tender is, according to the General Court, relevant to establish the tendererʼs ability to properly deliver the contract, which clearly is a quality criterion relevant to identifying the most economically advantageous tender».


2525 —      Os acórdãos do Tribunal Geral nos processos Evropaïki/Dynamiki (EU:T:2012:671), AWWW/FEACVTT (EU:T:2008:240), Evropaïki Dynamiki/OEDT (EU:T:2010:368) e Renco/Conselho (EU:T:2003:37) não deram lugar a recurso.


2626 —      Vários artigos são referidos por Orthmann, M., op.cit.


2727 —      Lee, P., op.cit., pp. 47 e 48.


2828 —      Rubach‑Larsen, A. — «Selection and award criteria from a German public procurement law perspective», Public Procurement Law Review, 2009, pp. 112, 119 e 120.


2929 —      Arrowsmith, S. — «EU Public Procurement Law: An Introduction», University of Nottingham, 2010, pp. 173 e 174.


3030 —      V. Treumer, S., — «The distinction between selection and award criteria in EC public procurement law: the Danish approach», Public Procurement Law Review, 2009, n.° 3, pp. 146 a 154.


3131 —      No processo Iver C. Weilbach og CO/A/S v Kort‑ og Matrikelstyrelsen.


3232 —      V. n.° 27 das presentes conclusões.


33 —      V. n.° 16 das presentes conclusões.