Language of document : ECLI:EU:C:2012:798

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

13 de dezembro de 2012 (*)

«Livre circulação de trabalhadores — Artigo 45.° TFUE — Auxílio à contratação de desempregados de idade avançada e de desempregados de longa duração — Requisito de inscrição no centro de emprego da Administração nacional do emprego — Requisito de residência — Restrição — Justificação»

No processo C‑379/11,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.° TFUE, apresentado pela Cour administrative (Luxemburgo), por decisão de 14 de julho de 2011, entrado no Tribunal de Justiça em 18 de julho de 2011, no processo

Caves Krier Frères Sàrl

contra

Directeur de l’Administration de l’emploi,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

composto por: A. Rosas, exercendo funções de presidente da Segunda Secção, U. Lõhmus, A. Ó Caoimh (relator), A. Arabadjiev e C. G. Fernlund, juízes,

advogado‑geral: E. Sharpston,

secretário: R. Şereş, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 21 de junho de 2012,

vistas as observações apresentadas:

¾        em representação da Caves Krier Frères Sàrl, por M. Mailliet, avocat,

¾        em representação do Governo luxemburguês, por C. Schiltz, na qualidade de agente, assistido por G. Pierret e S. Coï, avocats,

¾        em representação do Governo checo, por M. Smolek e D. Hadroušek, na qualidade de agentes,

¾        em representação do Governo austríaco, por C. Pesendorfer, na qualidade de agente,

¾        em representação do Governo polaco, por M. Szpunar e B. Majczyna, na qualidade de agentes,

¾        em representação da Comissão Europeia, por G. Rozet, na qualidade de agente,

ouvidas as conclusões da advogada‑geral na audiência de 27 de setembro de 2012,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação dos artigos 21.° TFUE e 45.° TFUE.

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Caves Krier Frères Sàrl (a seguir «Caves Krier») à Administration de l’emploi (a seguir «ADEM»), a respeito da recusa de concessão de um auxílio à contratação de desempregados de idade avançada e de desempregados de longa duração.

 Quadro jurídico luxemburguês

3        Nos termos do artigo L. 541‑1 do code du travail (Código do Trabalho):

«O fundo para o emprego reembolsa os empregadores do setor privado das contribuições para a segurança social, na parte liquidada pelo empregador e na parte liquidada pelo beneficiário, relativas aos desempregados contratados, quer estes sejam ou não indemnizados, desde que os mesmos tenham completado [45] anos de idade e estejam inscritos como candidatos a emprego num centro de emprego da [ADEM] há, pelo menos, um mês.

Os candidatos a emprego com idade compreendida entre [40] e [44] anos devem estar inscritos como candidatos a emprego num centro de emprego da [ADEM] há, pelo menos, três meses e os candidatos a emprego com idade compreendida entre [30] e [39] anos há, pelo menos, doze meses.

O requisito de inscrição num centro de emprego da [ADEM] não é aplicável a candidatos a emprego com mais de [40] anos que sejam afetados por um plano de manutenção do emprego, na aceção do artigo L. 513‑3, homologado pelo Ministro competente em matéria de emprego.»

4        O artigo L. 622‑6 (1) do mesmo code du travail dispõe que todas as pessoas desempregadas que procuram trabalho são obrigadas a inscrever‑se como candidatas a emprego na ADEM.

 Litígio no processo principal e questão prejudicial

5        M. Schmidt‑Krier, nacional luxemburguesa nascida em 30 de julho de 1955, reside com o seu marido na Alemanha, perto da fronteira luxemburguesa. M. Schmidt‑Krier realizou toda a sua carreira profissional no Luxemburgo.

6        Em 1 de maio de 2008, M. Schmidt‑Krier, que tinha então 52 anos, celebrou um contrato de trabalho por tempo indeterminado com a Caves Krier, sociedade com sede social em Remich (Luxemburgo).

7        Em 2 de setembro de 2008, na sequência da contratação de M. Schmidt‑Krier, a Caves Krier apresentou à ADEM um pedido de auxílio à contratação de desempregados de idade avançada e de desempregados de longa duração, nos termos do artigo L. 541‑1, primeiro parágrafo, do code du travail.

8        Por decisão de 4 de setembro de 2008, a ADEM indeferiu este pedido com o fundamento de que M. Schmidt‑Krier não cumpria o requisito da inscrição como candidata a emprego na ADEM há, pelo menos, um mês, nos termos previstos na referida disposição (a seguir «decisão controvertida»).

9        Em 11 de janeiro de 2010, a Caves Krier interpôs no tribunal administratif um recurso de anulação desta decisão, no qual sublinhou que M. Schmidt‑Krier estava inscrita como candidata a emprego na Alemanha e que sempre tinha trabalhado no Luxemburgo, tendo‑se inscrito no centro de emprego na Alemanha exclusivamente pelo facto de ela própria e o seu cônjuge terem transferido residência para esse país, apesar de terem continuado a trabalhar no Luxemburgo.

10      A Caves Krier baseou o seu recurso num fundamento único, relativo à violação do princípio da igualdade perante a lei, nos termos consagrados na Constituição do Grão‑Ducado do Luxemburgo, na medida em que a regulamentação aplicável e, por conseguinte, a decisão controvertida estabelece, para a concessão do auxílio em causa, uma diferença de tratamento entre um nacional luxemburguês residente no Luxemburgo e um nacional luxemburguês residente no estrangeiro, tendo um e outro trabalhado no Luxemburgo, sem que esta diferença de tratamento seja justificada por critérios objetivos.

11      Na sua decisão de 14 de julho de 2010, o tribunal administratif negou provimento ao recurso com o fundamento de que M. Schmidt‑Krier não cumpria, quando da sua contratação, o requisito da inscrição na ADEM. No que diz respeito à violação do princípio constitucional da igualdade de tratamento, esse tribunal considerou que a situação de um desempregado residente no Luxemburgo, habilitado, em virtude deste facto, a inscrever‑se como candidato a emprego na ADEM, não é comparável à de um desempregado que, não sendo residente no Luxemburgo, não se pode inscrever junto desta Administração, antes devendo, pelo contrário, inscrever‑se na agência de emprego do seu Estado‑Membro de residência.

12      Em 12 de agosto de 2010, a Caves Krier interpôs recurso desta decisão na Cour administrative, tendo invocado a inconstitucionalidade do artigo L. 541‑1, primeiro parágrafo, do code du travail.

13      Tendo esta questão sido submetida à Cour constitutionnelle, esta decidiu, no seu acórdão n.° 64/11, de 4 de maio de 2011 (Mémorial A 2011, p. 1572), que a referida disposição era conforme com a Constituição luxemburguesa.

14      Na sua decisão de reenvio, a Cour administrative considera, no entanto, que este processo suscita uma questão de direito da União. Com efeito, é pacífico que só os residentes se podem inscrever na ADEM. Portanto, uma vez que o auxílio à contratação previsto no artigo L. 541‑1, primeiro parágrafo, do code du travail está subordinado a essa inscrição, esse auxílio estaria, de facto, reservado aos empregadores que contratassem pessoas desempregadas residentes. Por conseguinte, esta disposição pode constituir um obstáculo à livre circulação de cidadãos da União na aceção dos artigos 21.° TFUE e 45.° TFUE, na medida em que o empregador potencial de um desempregado com idade superior a 45 anos é levado a preferir contratar um residente luxemburguês, uma vez que só a contratação deste lhe permitirá beneficiar do auxílio em causa.

15      O órgão jurisdicional de reenvio observa que, uma vez que o Estado luxemburguês não esteve representado no processo nele pendente, não teve oportunidade de apurar se a restrição quanto à residência tem por base considerações objetivas de interesse público independentes da nacionalidade das pessoas em causa e se é proporcionada atendendo ao objetivo legítimo prosseguido pela disposição nacional controvertida. Esse órgão jurisdicional considera que não pode justificar essa legislação ex officio.

16      Nestas condições, a Cour administrative decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«O artigo L. 541‑1, primeiro parágrafo, do code du travail luxemburguês, na medida em que reserva aos empregadores do setor privado o direito de reembolso das contribuições para a [s]egurança [s]ocial, no que se refere à parte liquidada pelo empregador e à parte liquidada pelo beneficiário, relativas aos desempregados contratados com mais de [45] anos de idade, sejam ou não indemnizados, na condição de os desempregados estarem inscritos como candidatos a emprego num centro de emprego da [ADEM] há, pelo menos, um mês, ao passo que os empregadores que contratam desempregados inscritos como candidatos a emprego junto de organismos correspondentes estrangeiros não beneficiam desta medida, está em conformidade com o direito da União, em especial [com] os artigos 21.° [TFUE] e 45.° [TFUE]?»

 Quanto à questão prejudicial

 Quanto à admissibilidade

17      Em primeiro lugar, o Governo austríaco alega que o pedido de decisão prejudicial é inadmissível, na medida em que o órgão jurisdicional de reenvio não expôs com precisão os factos pertinentes do caso em apreço e as disposições nacionais aplicáveis. Com efeito, apesar de não resultar do teor literal do artigo L. 541‑1, primeiro parágrafo, do code du travail nem da redação da questão que a concessão do auxílio à contratação controvertida ao empregador esteja limitada às pessoas residentes no Luxemburgo, a decisão de reenvio parece defender essa limitação. Assim, não é certo que haja que examinar, no caso em apreço, a conformidade com o direito da União de um requisito de residência ou, simplesmente, da inscrição obrigatória na ADEM.

18      Esta objeção não pode ser acolhida. Com efeito, como resulta do n.° 14 do presente acórdão, o órgão jurisdicional de reenvio expôs com toda a clareza exigível, na sua decisão de reenvio prejudicial submetida ao Tribunal de Justiça, os factos pertinentes do litígio no processo principal e identificou com precisão a disposição nacional aplicável a este litígio, isto é, o artigo L. 541‑1, primeiro parágrafo, do code du travail. Além disso, esse órgão jurisdicional expôs a interpretação que acolheu da regulamentação nacional aplicável, tendo constatado que é pacífico que só os residentes no território nacional se podem inscrever como candidatos a emprego na ADEM. Assim, o Tribunal de Justiça dispõe de todos os elementos necessários para fornecer ao órgão jurisdicional de reenvio uma resposta útil que permita a este último decidir o litígio no processo principal.

19      Em segundo lugar, o Governo checo interroga‑se sobre se a questão submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio não é hipotética, visto que, não obstante o disposto no artigo L. 541‑1, primeiro parágrafo, do code du travail, M. Schmidt‑Krier foi contratada pela Caves Krier.

20      Embora seja verdade que a recusa de concessão à Caves Krier do auxílio à contratação previsto no artigo L. 541‑1, primeiro parágrafo, do code du travail não impediu esta sociedade de contratar M. Schmidt‑Krier, não é menos certo que, como reconhece o próprio Governo checo nas suas observações escritas, essa recusa teve, todavia, por efeito o facto de esta contratação ter sido efetuada em condições menos favoráveis do que a contratação de um candidato a emprego com idade superior a 45 anos inscrito na ADEM, o que, segundo a Caves Krier, constitui um obstáculo à livre circulação de trabalhadores consagrada no direito da União e, portanto, deu lugar a um litígio entre ela própria e a ADEM. Nestas condições, não se pode considerar que a questão submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio é hipotética.

21      Em terceiro e último lugar, o Governo checo salienta que a questão submetida também pode ser julgada inadmissível na medida em que parece decorrer da decisão de reenvio que M. Schmidt‑Krier estava inscrita como candidata a emprego na Alemanha, ao passo que, ao mesmo tempo, trabalhava no Luxemburgo.

22      Contudo, tendo o órgão jurisdicional de reenvio declarado que o artigo L. 541‑1, primeiro parágrafo, do code du travail era aplicável ao litígio no processo principal, o que pressupõe que M. Schmidt‑Krier estava desempregada na data da sua contratação, o Tribunal de Justiça, que não tem por missão, no quadro de um reenvio prejudicial, apreciar os factos, não pode pôr em causa esta premissa.

23      Por conseguinte, há que considerar admissível o presente pedido de decisão prejudicial.

 Quanto ao mérito

24      Com a sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se os artigos 21.° TFUE e 45.° TFUE devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma regulamentação de um Estado‑Membro que sujeita a concessão aos empregadores de um auxílio à contratação de pessoas desempregadas com idade superior a 45 anos ao requisito de a pessoa desempregada contratada estar inscrita como candidata a emprego nesse mesmo Estado‑Membro, uma vez que essa inscrição está sujeita a um requisito de residência no território nacional.

25      Importa recordar que, segundo jurisprudência assente, qualquer nacional de um Estado‑Membro, independentemente do seu lugar de residência e da sua nacionalidade, que tenha exercido o direito de livre circulação dos trabalhadores e que tenha exercido uma atividade profissional noutro Estado‑Membro diferente do de residência, é abrangido pelo âmbito de aplicação do artigo 45.° TFUE (v., designadamente, acórdãos de 21 de fevereiro de 2006, Ritter‑Coulais, C‑152/03, Colet., p. I‑1711, n.° 31, e de 18 de julho de 2007, Hartmann, C‑212/05, Colet., p. I‑6303, n.° 17).

26      Além disso, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que, no âmbito do artigo 45.° TFUE, deve ser considerada «trabalhador» a pessoa que realiza, durante um determinado período, em benefício de outra e sob a sua direção, as prestações em contrapartida das quais recebe uma remuneração. Quando a relação de trabalho cessa, o interessado perde, em princípio, a qualidade de trabalhador, entendendo‑se, no entanto, que, por um lado, tal qualidade pode produzir determinados efeitos após a cessação da relação de trabalho e que, por outro, uma pessoa que verdadeiramente procura um emprego deve também ser qualificada de trabalhador (v. acórdão de 12 de maio de 1998, Martínez Sala, C‑85/96, Colet., p. I‑2691, n.° 32 e jurisprudência referida).

27      Daqui decorre que a situação de um trabalhador transfronteiriço, como M. Schmidt‑Krier, que, após ter perdido o seu emprego num Estado‑Membro diferente do Estado‑Membro onde reside efetivamente, encontra um emprego nesse outro Estado‑Membro no âmbito de um contrato de trabalho por tempo indeterminado, é abrangida pelo artigo 45.° TFUE.

28      Se é certo que os direitos de livre circulação previstos neste artigo beneficiam os trabalhadores, incluindo os candidatos a emprego, nada na letra do referido artigo indica que estes direitos não possam ser invocados por outrem. Com efeito, para ser eficaz e útil, o direito que os trabalhadores têm de ser contratados e de terem uma ocupação, sem discriminação, deve necessariamente ter como complemento o direito de os empregadores os contratarem, no respeito das regras em matéria de livre circulação de trabalhadores (v. acórdãos de 7 de maio de 1998, Clean Car Autoservice, C‑350/96, Colet., p. I‑2521, n.os 19 e 20, e de 11 de janeiro de 2007, ITC, C‑208/05, Colet., p. I‑181, n.os 22 e 23).

29      Nestas condições, um empregador como a Caves Krier pode invocar os direitos diretamente reconhecidos aos trabalhadores no artigo 45.° TFUE.

30      Na medida em que o processo principal é abrangido por esta disposição, o Tribunal não tem de se pronunciar sobre a interpretação do artigo 21.° TFUE. Com efeito, esta disposição, que enuncia em termos gerais o direito de qualquer cidadão da União de circular e de permanecer livremente no território dos Estados‑Membros, tem uma expressão específica no artigo 45.° TFUE no que respeita à livre circulação de trabalhadores (v., designadamente, acórdãos ITC, já referido, n.os 64 e 65; de 11 de setembro de 2007, Hendrix, C‑287/05, Colet., p. I‑6909, n.os 61 e 62; e de 25 de outubro de 2012, Prete, C‑367/11, n.° 20).

31      No que diz respeito à questão de saber se uma regulamentação nacional como a que está em causa no processo principal constitui uma restrição na aceção do artigo 45.° TFUE, importa recordar que todas as disposições do Tratado FUE relativas à livre circulação de pessoas têm por objetivo facilitar aos nacionais dos Estados‑Membros o exercício de atividades profissionais de qualquer natureza no território da União Europeia e opõem‑se às medidas que possam desfavorecer estes nacionais quando pretendam exercer uma atividade económica no território de outro Estado‑Membro (v., designadamente, acórdãos ITC, já referido, n.° 31, e de 16 de março de 2010, Olympique Lyonnais, C‑325/08, Colet., p. I‑2177, n.° 33).

32      O Governo luxemburguês sustenta, no entanto, que a regulamentação nacional em causa no processo principal não afeta a livre circulação de trabalhadores, na medida em que não prevê nenhum requisito de residência. A este respeito, a questão submetida baseia‑se numa interpretação errada dada pelo órgão jurisdicional de reenvio da regulamentação nacional. Com efeito, qualquer pessoa desempregada não residente pode inscrever‑se na ADEM. Assim, o artigo L. 622‑6 (1) do code du travail dispõe claramente que todas as pessoas desempregadas que procuram trabalho são obrigadas a inscrever‑se como candidatas a emprego na ADEM. Embora seja verdade que um trabalhador de nacionalidade luxemburguesa residente na Alemanha se deve inscrever na Administração do emprego alemã a fim de receber os eventuais subsídios de desemprego, nenhum texto legislativo luxemburguês impede esse trabalhador de se inscrever na ADEM para ser informado dos empregos disponíveis existentes no Luxemburgo e para permitir que o empregador que o contrata beneficie dos direitos decorrentes do artigo L. 541‑1, primeiro parágrafo, do code du travail.

33      Por conseguinte, o Governo luxemburguês considera que nem esta disposição nem o artigo L. 622‑6 (1) do code du travail são discriminatórios à luz do direito da União, na medida em que não é exigível nenhum critério de nacionalidade ou de residência relativo ao candidato a emprego para que o empregador possa requerer o auxílio em causa. O artigo L. 541‑1, primeiro parágrafo, do referido código precisa, além disso, claramente, que o empregador é reembolsado das quotizações para a segurança social relativas às pessoas desempregadas que tenham sido contratadas, quer estas tenham recebido um subsídio quer não. No processo principal, a ADEM limitou‑se, assim, a constatar, na sua decisão controvertida, que M. Schmidt‑Krier não reunia o requisito de inscrição nessa Administração. Em contrapartida, não tomou nenhuma decisão de recusa de inscrição fundada em motivos discriminatórios à luz do direito da União.

34      Segundo esse governo, daqui resulta que os trabalhadores residentes no território luxemburguês, à semelhança dos nacionais de outros Estados‑Membros que trabalhem no Luxemburgo ou de nacionais luxemburgueses que trabalhem no Luxemburgo e que residam noutro Estado‑Membro, estão sujeitos às mesmas obrigações. Por conseguinte, não há uma diferença de tratamento entre si, uma vez que todos se podem inscrever na ADEM.

35      A este respeito, importa recordar que, segundo jurisprudência assente, o Tribunal de Justiça não é competente para interpretar o direito nacional de um Estado‑Membro (v., designadamente, acórdão de 17 de março de 2011, Naftiliaki Etaireia Thasou e Amaltheia I Naftiki Etaireia, C‑128/10 e C‑129/10, Colet., p. I‑1885, n.° 40).

36      Por conseguinte, não compete ao Tribunal de Justiça pronunciar‑se, no âmbito de um reenvio prejudicial nos termos do artigo 267.° TFUE, sobre a interpretação das disposições nacionais nem decidir se a interpretação dada pelo órgão jurisdicional de reenvio das mesmas é correta (acórdão de 23 de abril de 2009, Angelidaki e o., C‑378/07 a C‑380/07, Colet., p. I‑3071, n.° 48 e jurisprudência referida).

37      Em contrapartida, no quadro da repartição das competências entre os órgãos jurisdicionais da União e nacionais, incumbe ao Tribunal de Justiça ter em conta o contexto factual e regulamentar no qual se inserem as questões prejudiciais, tal como definido pela decisão de reenvio (acórdão de 29 de outubro de 2009, Pontin, C‑63/08, Colet., p. I‑10467, n.° 38 e jurisprudência referida).

38      Assim, quaisquer que sejam as críticas feitas pelo Governo luxemburguês à interpretação do direito nacional adotada pelo órgão jurisdicional de reenvio, o exame do presente reenvio prejudicial deve ser efetuado à luz da interpretação que é dada a esse direito por este último órgão jurisdicional (v., por analogia, acórdão Pontin, já referido, n.° 38).

39      Ora, como resulta já do n.° 18 do presente acórdão, mesmo que não se conteste no presente processo que a regulamentação nacional em causa no processo principal não prevê de forma explícita que a inscrição na ADEM está sujeita a um requisito de residência no Luxemburgo, o órgão jurisdicional de reenvio declarou, na sua decisão que submeteu ao Tribunal de Justiça a título prejudicial, que é pacífico que só os residentes se podem inscrever na ADEM.

40      Além disso, resulta dos autos apresentados no Tribunal de Justiça que esta interpretação também foi seguida, no contexto do processo principal, pelo tribunal administratif na sua decisão de 14 de julho de 2010 e pela Cour constitutionnelle no seu acórdão n.° 64/11, de 4 de maio de 2011.

41      Por outro lado, resulta dos documentos apresentados pela Caves Krier em resposta a uma questão escrita colocada pelo Tribunal de Justiça que, embora o sítio Internet destinado aos candidatos a emprego no Luxemburgo indique de forma sucinta que os trabalhadores transfronteiriços que o pretendam se podem inscrever na ADEM, esta indicação é contrariada por outras passagens do mesmo sítio e por vários outros documentos, que salientam, pelo contrário, que, para se inscrever na ADEM, um candidato a emprego deve residir nesse Estado‑Membro. A tal acresce que, embora resulte dos trabalhos preparatórios relativos à reforma da ADEM, igualmente apresentados pela Caves Krier, que, a partir do ano de 2012, os trabalhadores transfronteiriços que tenham perdido o emprego no Luxemburgo terão acesso a todos os serviços da ADEM, não deixa de ser verdade que esta reforma, que não tinha entrado em vigor na data dos factos do litígio no processo principal, sugere fortemente a ideia que esse acesso estava excluído antes de 2012.

42      Por consequência, para efeitos da apreciação da presente questão prejudicial, há que partir do princípio de que a regulamentação nacional em causa no processo principal sujeita a inscrição na ADEM e, portanto, a concessão do auxílio à contratação prevista no artigo L. 541‑1, primeiro parágrafo, do code du travail a um requisito de residência no Luxemburgo, o que compete, contudo, ao órgão jurisdicional de reenvio verificar no quadro do exercício das suas competências.

43      Nestas condições, a regulamentação nacional em causa no processo principal parece introduzir uma diferença de tratamento entre, por um lado, os nacionais dos Estados‑Membros candidatos a emprego com residência no território do Luxemburgo e, por outro, os mesmos nacionais com residência noutro Estado‑Membro.

44      Ao sujeitar a concessão do auxílio à contratação ao requisito de que o candidato a emprego tenha a sua residência no Luxemburgo, esta regulamentação nacional prejudica, assim, certos trabalhadores pelo simples facto de terem a sua residência noutro Estado‑Membro.

45      Por esta razão, esta regulamentação é suscetível de dissuadir um empregador com sede no Luxemburgo de contratar um candidato a emprego que, como M. Schmidt‑Krier no processo principal, não tem a sua residência nesse Estado‑Membro, uma vez que essa contratação, contrariamente à contratação de um candidato a emprego que tenha a sua residência no mesmo Estado‑Membro, não permite que esse empregador beneficie do auxílio à contratação.

46      Daqui decorre que esta regulamentação é suscetível de dificultar o acesso ao emprego no Luxemburgo de um trabalhador transfronteiriço que, como M. Schmidt‑Krier, se encontra numa situação de desemprego.

47      Essa regulamentação nacional, que reserva aos trabalhadores não residentes um tratamento menos favorável do que o tratamento de que beneficiam os trabalhadores residentes no Luxemburgo, constitui uma restrição à liberdade garantida aos trabalhadores pelo artigo 45.° TFUE (v., por analogia, acórdãos de 7 de julho de 2005, van Pommeren‑Bourgondiën, C‑227/03, Colet., p. I‑6101, n.° 44, e Ritter‑Coulais, já referido, n.os 37 e 38).

48      Uma medida que restringe a livre circulação dos trabalhadores só é admissível se prosseguir um objetivo legítimo compatível com o Tratado e se se justificar por razões imperiosas de interesse geral. Em tal caso, é ainda necessário que a aplicação dessa medida seja adequada para garantir a realização do objetivo em causa e não exceda o necessário para alcançar esse objetivo (v., designadamente, acórdãos, já referidos, ITC, n.° 37, e Olympique Lyonnais, n.° 38).

49      Segundo jurisprudência assente, incumbe aos Estados‑Membros, quando estes adotam uma medida derrogatória a um princípio consagrado pelo direito da União, provar, em cada caso concreto, que a referida medida é adequada para garantir a realização do objetivo invocado e que não excede o necessário para o atingir. As razões justificativas que podem ser invocadas por um Estado‑Membro devem, por conseguinte, ser acompanhadas de uma análise da aptidão e da proporcionalidade da medida adotada por esse Estado, bem como dos elementos precisos que permitam sustentar a sua argumentação (acórdão de 13 de abril de 2010, Bressol e o., C‑73/08, Colet., p. I‑2735, n.° 71).

50      No caso em apreço, impõe‑se declarar que o Governo luxemburguês, não obstante as questões colocadas pelo Tribunal de Justiça na audiência a este respeito, não procurou descrever o objetivo prosseguido pelo requisito de residência imposto pela regulamentação nacional em causa no processo principal para a inscrição na ADEM e, por conseguinte, para a concessão do auxílio à contratação, limitando‑se a justificar o requisito da inscrição nesta Administração e, portanto, que esse governo não apresentou nenhum elemento com vista a justificar este requisito de residência em virtude das razões imperiosas de interesse geral protegidas pelo artigo 45.° TFUE.

51      De forma a fornecer uma resposta exaustiva ao órgão jurisdicional de reenvio, importa recordar que, na verdade, o Tribunal de Justiça já decidiu que incumbe aos Estados‑Membros a escolha das medidas suscetíveis de realizar os objetivos que prosseguem em matéria de emprego. O Tribunal de Justiça reconheceu que os Estados‑Membros dispõem de uma margem de apreciação bastante ampla no exercício desta competência. Além disso, não se pode contestar que a promoção da contratação constitui um objetivo legítimo de política social (v. acórdão ITC, já referido, n.° 39 e jurisprudência referida).

52      No entanto, a margem de apreciação de que os Estados‑Membros dispõem em matéria de política social não pode justificar que se atente contra os direitos conferidos aos particulares pelas disposições do Tratado que consagram as suas liberdades fundamentais (v. acórdão ITC, já referido, n.° 40 e jurisprudência referida).

53      Ora, a este respeito, importa, em particular, recordar que resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que um requisito de residência é, em princípio, inadequado quanto aos trabalhadores migrantes e transfronteiriços, uma vez que estes, tendo acedido ao mercado de trabalho de um Estado‑Membro, criaram, em princípio, um vínculo de integração suficiente na sociedade desse Estado que lhes permite aí beneficiar do princípio da igualdade de tratamento, em relação, respetivamente, aos trabalhadores nacionais e aos trabalhadores residentes. O vínculo de integração resulta, nomeadamente, do facto de, com as contribuições que pagam no Estado‑Membro de acolhimento em virtude da atividade por conta de outrem que aí exercem, os trabalhadores migrantes e transfronteiriços contribuírem para o financiamento das políticas sociais deste Estado (v., neste sentido, designadamente, acórdão de 14 de junho de 2012, Comissão/Países Baixos, C‑542/09, n.os 63, 65, 66 e jurisprudência referida).

54      Assim, é pacífico, no processo principal, que M. Schmidt‑Krier, embora não resida no Luxemburgo, é uma trabalhadora transfronteiriça nacional desse Estado‑Membro que realizou toda a sua carreira profissional nesse Estado‑Membro. Por conseguinte, encontra‑se integrada no mercado de trabalho luxemburguês.

55      Tendo em conta o exposto, há que responder à questão submetida que o artigo 45.° TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma regulamentação de um Estado‑Membro que sujeita a concessão aos empregadores de um auxílio à contratação de pessoas desempregadas com idade superior a 45 anos ao requisito de que a pessoa desempregada que tenha sido contratada esteja inscrita como candidata a emprego nesse mesmo Estado‑Membro, se essa inscrição, o que compete ao órgão jurisdicional de reenvio verificar, estiver sujeita a um requisito de residência no território nacional.

 Quanto às despesas

56      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) declara:

O artigo 45.° TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma regulamentação de um Estado‑Membro que sujeita a concessão aos empregadores de um auxílio à contratação de pessoas desempregadas com idade superior a 45 anos ao requisito de que a pessoa desempregada que tenha sido contratada esteja inscrita como candidata a emprego nesse mesmo Estado‑Membro, se essa inscrição, o que compete ao órgão jurisdicional de reenvio verificar, estiver sujeita a um requisito de residência no território nacional.

Assinaturas


* Língua do processo: francês.