Language of document : ECLI:EU:C:2013:503

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Oitava Secção)

18 de julho de 2013 (*)

«Imposto especial de consumo — Diretiva 92/12/CEE — Artigos 7.° a 9.° — Diretiva 2008/118/CE — Artigos 32.° a 34.° — Circulação intracomunitária de produtos sujeitos a imposto especial de consumo — Regulamento (CEE) n.° 3649/92 — Artigos 1.° e 4.° — Documento de acompanhamento simplificado — Exemplar 1 — Atividade de ‘cash & carry’ — Produtos introduzidos no consumo num Estado‑Membro e detidos para fins comerciais noutro Estado‑Membro ou produtos adquiridos por particulares para satisfação das suas necessidades e transportados pelos próprios — Bebidas espirituosas — Isenção de obrigação de verificação pelo fornecedor»

No processo C‑315/12,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.° TFUE, apresentado pelo Højesteret (Dinamarca), por decisão de 26 de junho de 2012, entrado no Tribunal de Justiça em 29 de junho de 2012, no processo

Metro Cash & Carry Danmark ApS

contra

Skatteministeriet,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Oitava Secção),

composto por: E. Jarašiūnas, presidente de secção, C. Toader (relator) e C. G. Fernlund, juízes,

advogado‑geral: E. Sharpston,

secretário: L. Hewlett, administradora principal,

vistos os autos e após a audiência de 10 de abril de 2013,

vistas as observações apresentadas:

―        em representação da Metro Cash & Carry Danmark ApS, por E. Lego Andersen e H. Peytz, advokater,

―        em representação do Governo dinamarquês, por V. Pasternak Jørgensen, na qualidade de agente, assistido por D. Auken, advokat,

―        em representação do Governo helénico, por I. Pouli e G. Papagianni, na qualidade de agentes,

―        em representação do Governo português, por L. Inez Fernandes e A. Cunha, na qualidade de agentes,

―        em representação da Comissão Europeia, por W. Mölls e C. Barslev, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvida a advogada‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação dos artigos 7.° a 9.° da Diretiva 92/12/CEE do Conselho, de 25 de fevereiro de 1992, relativa ao regime geral, à detenção, à circulação e aos controlos dos produtos sujeitos a impostos especiais de consumo (JO L 76, p. 1), conforme alterada pela Diretiva 92/108/CEE do Conselho, de 14 de dezembro de 1992 (JO L 390, p. 124, a seguir «Diretiva 92/12»), dos artigos 32.° a 34.° da Diretiva 2008/118/CE do Conselho, de 16 de dezembro de 2008, relativa ao regime geral dos impostos especiais de consumo e que revoga a Diretiva 92/12/CEE (JO L 9, p. 12), bem como das disposições do Regulamento (CEE) n.° 3649/92 da Comissão, de 17 de dezembro de 1992, relativo a um documento de acompanhamento simplificado para a circulação intracomunitária dos produtos sujeitos a impostos especiais de consumo, já introduzidos no consumo no Estado‑Membro de expedição (JO L 369, p. 17).

2        Este pedido foi apresentado no quadro de um litígio que opõe a Metro Cash & Carry Danmark ApS (a seguir «Metro») ao Skatteministeriet (Ministério das Contribuições), relativamente a uma decisão deste de impor à Metro uma obrigação de providenciar para que lhe seja entregue o exemplar 1 do documento de acompanhamento simplificado previsto pelo Regulamento n.° 3649/92 no quadro da venda dos produtos sujeitos a impostos especiais de consumo, na ocorrência, bebidas espirituosas, a clientes sujeitos passivos do imposto sobre o valor acrescentado (a seguir «IVA») na Suécia.

 Quadro jurídico

 Direito da União

 Diretiva 92/12

3        A Diretiva 92/12 estabelece o regime geral dos produtos sujeitos a impostos especiais de consumo, nomeadamente, as disposições relativas à sua detenção, à sua circulação e ao seu controlo.

4        Os considerandos quarto a oitavo da Diretiva 92/12 estão redigidos como se segue:

«Considerando que, para garantir o estabelecimento e o funcionamento do mercado interno, a exigibilidade dos impostos especiais de consumo deve ser idêntica em todos os Estados‑Membros;

Considerando que qualquer entrega, detenção com vista à entrega ou afetação às necessidades de um operador que exerça de forma independente uma atividade económica ou às necessidades de um organismo de direito público que tenha lugar num Estado‑Membro que não seja o da introdução no consumo, dará lugar à exigibilidade do imposto especial de consumo nesse Estado‑Membro;

Considerando que os produtos sujeitos a impostos especiais de consumo adquiridos por particulares para fins pessoais e transportados pelos próprios deverão ser tributados no Estado‑Membro onde esses produtos foram adquiridos;

Considerando que, para comprovar que os produtos sujeitos a impostos especiais de consumo não são detidos para fins pessoais, mas sim para fins comerciais, os Estados‑Membros podem estabelecer alguns critérios, inclusivamente limites indicativos;

Considerando que os produtos sujeitos a impostos especiais de consumo comprados por pessoas que não possuam a qualidade de depositário autorizado ou de operador registado ou não registado e expedidos ou transportados direta ou indiretamente pelo vendedor ou por sua própria conta devem ser sujeitos ao imposto especial de consumo no Estado‑Membro de destino;»

5        O artigo 6.°, n.° 1, dessa diretiva prevê o princípio segundo o qual o imposto especial de consumo é exigível no momento da introdução no consumo ou da constatação das faltas que devem ser sujeitas ao imposto especial de consumo e define a introdução no consumo como sendo toda e qualquer saída, mesmo irregular, de um regime de suspensão.

6        O artigo 7.° da referida diretiva prevê:

«1.      No caso de os produtos sujeitos a impostos especiais de consumo que tenham já sido introduzidos no consumo num Estado‑Membro serem detidos para fins comerciais noutro Estado‑Membro, o imposto será cobrado no Estado‑Membro em que os produtos são detidos.

2.      Para tal, e sem prejuízo do disposto no artigo 6.°, sempre que os produtos já introduzidos no consumo num Estado‑Membro, tal como definido no artigo 6.°, sejam entregues ou se destinem a ser entregues noutro Estado‑Membro ou afet[ados], noutro Estado‑Membro, às necessidades de um operador que exerça uma atividade económica independente ou às necessidades de um organismo de direito público, o imposto torna‑se exigível nesse outro Estado‑Membro.

3.      O imposto especial de consumo é devido pela pessoa que efetua a entrega, que detém os produtos destinados a ser entregues ou pela pessoa junto da qual se efetua a afetação dos produtos num Estado‑Membro diferente daquele em que foram introduzidos no consumo ou ainda pelo operador profissional ou organismo de direito público.

4.      Os produtos referidos no n.° 1 circularão entre os territórios dos diferentes Estados‑Membros a coberto de um documento de acompanhamento que mencione os principais elementos do documento referido no n.° 1 do artigo 18.° A forma e o conteúdo desse documento serão definidos segundo o processo previsto no artigo 24.° da presente diretiva.

5.      A pessoa, o operador ou o organismo referidos no n.° 3 deverão cumprir as seguintes obrigações:

a)      Antes da expedição das mercadorias, fazer uma declaração junto das autoridades fiscais do Estado‑Membro de destino e garantir o pagamento do imposto especial de consumo;

b)      Pagar o imposto especial de consumo do Estado‑Membro de destino de acordo com as modalidades previstas por esse Estado‑Membro;

c)      Prestar‑se a todos os controlos que permitam à administração do Estado‑Membro de destino certificar‑se da receção efetiva das mercadorias, bem como do pagamento do imposto especial de consumo a que estão sujeitas.

6.      O imposto especial de consumo pago no primeiro Estado‑Membro referido no n.° 1 será reembolsado em conformidade com o n.° 3 do artigo 22.°

[...]»

7        Nos termos do artigo 8.° da Diretiva 92/12, no que se refere aos produtos adquiridos por particulares, para satisfação das suas necessidades e transportados pelos próprios, o princípio que rege o mercado interno prevê que os impostos especiais de consumo sejam cobrados no Estado‑Membro onde os produtos foram adquiridos.

8        O artigo 9.° dessa diretiva dispõe:

«1.      Sem prejuízo dos artigos 6.°, 7.° e 8.°, o imposto especial de consumo torna‑se exigível quando os produtos introduzidos no consumo num determinado Estado‑Membro forem detidos para fins comerciais noutro Estado‑Membro.

Neste caso, o imposto especial de consumo é devido no Estado‑Membro em cujo território se encontram os produtos e torna‑se exigível ao detentor dos produtos.

2.      Para estabelecer que os produtos referidos no artigo 8.° se destinam a fins comerciais, os Estados‑Membros devem ter em conta, nomeadamente, os seguintes pontos:

―        o estatuto comercial e os motivos do detentor dos produtos,

―        o local em que se encontram os produtos ou, eventualmente, a forma de transporte utilizada,

―        qualquer documento relativo aos produtos,

―        a natureza dos produtos,

―        a quantidade dos produtos.

Para a aplicação do quinto travessão do primeiro parágrafo, os Estados‑Membros podem, apenas como elemento de prova, estabelecer níveis indicativos. Esses níveis indicativos não podem ser inferiores a:

[...]

b)      Bebidas alcoólicas

Bebidas espirituosas 10 l

[...]»

 Regulamento n.° 3649/92

9        Os artigos 1.° e 4.° do Regulamento n.° 3649/92, que fixam as modalidades do documento de acompanhamento simplificado, estão redigidos como se segue:

«Artigo 1.°

No caso de os produtos sujeitos a impostos especiais de consumo, que tenham já sido introduzidos no consumo num Estado‑Membro, se destinarem a ser entregues noutro Estado‑Membro para fins comerciais, tal como referido no artigo 7.° da Diretiva 92/12/CEE, a pessoa que pretende efetuar a entrega deve elaborar um documento de acompanhamento simplificado. Durante o transporte desses produtos de um Estado‑Membro para outro Estado‑Membro o documento deve acompanhar a remessa, bem como ser colocado à disposição das autoridades competentes dos Estados‑Membros para efeitos de controlo.

[…]

Artigo 4.°

O documento de acompanhamento simplificado deve ser elaborado em três exemplares.

Exemplar 1: a conservar pelo fornecedor para efeitos de controlo fiscal.

Exemplar 2: acompanha as mercadorias durante o transporte, devendo ser conservado pelo destinatário.

Exemplar 3: acompanha as mercadorias, devendo ser devolvido ao fornecedor com uma certificação da receção aposta pelo destinatário, indicando o tratamento fiscal subsequente das mercadorias no Estado‑Membro de destino, caso o fornecedor o solicite, nomeadamente, para efeitos de reembolso. Este exemplar deve ser apenso ao eventual pedido de reembolso referido no n.° 3 do artigo 22.° da Diretiva 92/12/CEE.»

 Diretiva 2008/118

10      Os artigos 32.° a 34.° da Diretiva 2008/118, que substituem os artigos 7.° a 9.° da Diretiva 92/12, preveem:

«Artigo 32.°

1.      O imposto especial de consumo sobre produtos sujeitos a impostos especiais de consumo adquiridos por particulares para seu uso pessoal e transportados entre dois Estados‑Membros pelos próprios é exigível apenas no Estado‑Membro em que os produtos foram adquiridos.

2.      Para determinar se os produtos sujeitos a impostos especiais de consumo a que se refere o n.° 1 se destinam ao uso pessoal dos particulares, os Estados‑Membros devem ter em conta, pelo menos, o seguinte:

a)      O estatuto comercial do detentor dos produtos e os seus motivos para a detenção dos mesmos;

b)      O local em que se encontram os produtos ou, se adequado, o modo de transporte utilizado;

c)      Qualquer documento respeitante aos produtos;

d)      A natureza dos produtos;

e)      A quantidade dos produtos.

3.      Para efeitos da aplicação da alínea e) do n.° 2, os Estados‑Membros podem, apenas como elemento de prova, estabelecer níveis indicativos. Esses níveis indicativos não podem ser inferiores a:

[…]

b)      Relativamente às bebidas alcoólicas:

―        bebidas espirituosas: 10 l,

[…]

Artigo 33.°

1.      Sem prejuízo do n.° 1 do artigo 36.°, se os produtos sujeitos a impostos especiais de consumo que tenham já sido introduzidos no consumo num Estado‑Membro forem detidos para fins comerciais noutro Estado‑Membro a fim de aí serem entregues ou utilizados, ficam sujeitos ao imposto especial de consumo, tornando‑se este imposto exigível nesse outro Estado‑Membro.

Para efeitos do presente artigo, entende‑se por ‘detenção para fins comerciais’ a detenção de produtos sujeitos a impostos especiais de consumo por uma pessoa que não seja um particular ou por um particular para fins distintos do seu uso pessoal e por ele transportados, nos termos do artigo 32.°

2.      As condições de exigibilidade e a taxa do imposto especial de consumo a aplicar são as vigentes na data em que o mesmo se torna exigível nesse outro Estado‑Membro.

3.      O devedor do imposto especial de consumo que se tenha tornado exigível é, consoante os casos mencionados no n.° 1, a pessoa que efetua a entrega ou que detém os produtos destinados a ser entregues, ou a quem são entregues os produtos no outro Estado‑Membro.

4.      Sem prejuízo do artigo 38.°, quando circularem na Comunidade para fins [comerciais] produtos sujeitos a impostos especiais de consumo que tenham já sido introduzidos no consumo num Estado‑Membro, esses produtos não são considerados como sendo detidos para esses fins até chegarem ao Estado‑Membro de destino, desde que circulem ao abrigo das formalidades estabelecidas no artigo 34.°

5.      Os produtos sujeitos a impostos especiais de consumo detidos a bordo de navios ou aeronaves que efetuam travessias ou voos entre dois Estados‑Membros, mas que não estão disponíveis para venda quando o navio ou a aeronave se encontra no território de um Estado‑Membro, não são considerados como sendo detidos para fins comerciais nesse Estado‑Membro.

6.      O imposto especial de consumo é, sempre que tal seja solicitado, reembolsado ou objeto de dispensa de pagamento no Estado‑Membro em que ocorreu a introdução no consumo quando as autoridades competentes do outro Estado‑Membro constatarem que o imposto se tornou exigível e foi cobrado nesse Estado‑Membro.

Artigo 34.°

1.      Nas situações referidas no n.° 1 do artigo 33.°, os produtos sujeitos a impostos especiais de consumo circulam entre os territórios de diferentes Estados‑Membros a coberto de um documento de acompanhamento que inclua os elementos essenciais do documento referido no n.° 1 do artigo 21.°

A Comissão aprova, nos termos do n.° 2 do artigo 43.°, medidas que estabeleçam a forma e o teor do documento de acompanhamento.

2.      As pessoas a que se refere o n.° 3 do artigo 33.° devem cumprir os seguintes requisitos:

a)      Antes da expedição dos produtos, fazer uma declaração junto das autoridades competentes do Estado‑Membro de destino e garantir o pagamento do imposto especial de consumo;

b)      Pagar o imposto especial de consumo do Estado‑Membro de destino de acordo com as modalidades previstas por esse Estado‑Membro;

c)      Prestar‑se a todos os controlos que permitam às autoridades competentes do Estado‑Membro de destino certificar‑se da receção efetiva dos produtos sujeitos a impostos especiais de consumo, bem como do pagamento do imposto especial de consumo exigível relativamente a esses produtos.

O Estado‑Membro de destino pode, nas situações e condições que determinar, simplificar ou conceder uma derrogação das obrigações referidas na alínea a). Nesse caso, informa do facto a Comissão, que por sua vez informa os demais Estados‑Membros.»

 Direito dinamarquês

11      As disposições pertinentes da Diretiva 92/12 e da Diretiva 2008/118 foram transpostas pela Lei de consolidação n.° 1239, relativa aos impostos sobre a cerveja, o vinho e o vinho de fruta e o. (lei relativa ao imposto sobre as bebidas espirituosas) [lovbekendtgørelse nr. 1239 om afgift af øl, vin og frugtvin m.m (spiritusafgiftsloven)], de 22 de outubro de 2007, e pela Lei n.° 1385, que altera, entre outras, a lei relativa ao imposto sobre as bebidas espirituosas (lov nr. 1385 om ændring af bl.a. spiritusafgiftsloven), de 21 de dezembro de 2009.

 Litígio no processo principal e questões prejudiciais

12      Resulta da decisão de reenvio que os impostos especiais de consumo dinamarqueses sobre as bebidas espirituosas são consideravelmente menos elevados que os impostos suecos correspondentes. Em 1 de janeiro de 2012, os impostos especiais de consumo dinamarqueses ascendiam a 150 coroas dinamarquesas (DKK) por litro, ao passo que os impostos especiais de consumo suecos ascendiam, na mesma data, a cerca de 424,14 DKK por litro. Esta situação constitui um incentivo financeiro para comprar bebidas espirituosas sujeitas ao imposto especial de consumo dinamarquês e para as importar para a Suécia. As bebidas espirituosas não estão sujeitas aos impostos especiais de consumo suecos, se forem adquiridas por particulares na Dinamarca, para satisfação das suas necessidades, e forem transportadas pelos próprios. Em contrapartida, em caso de aquisição para fins comerciais, aplicam‑se os impostos especiais de consumo suecos.

13      A Metro exerce na Dinamarca uma atividade de venda de uma vasta gama de produtos, incluindo bebidas espirituosas, a clientes dinamarqueses ou provenientes de outros Estados‑Membros. O conceito utilizado, «cash & carry», consiste em os clientes retirarem eles próprios os produtos das prateleiras dos estabelecimentos, colocarem‑nos nos carrinhos de compras e, em seguida, dirigirem‑se à caixa, onde pagam as suas mercadorias em dinheiro («cash»). Após o pagamento, as mercadorias são entregues aos clientes, que tratam pessoalmente de as transportar («carry»).

14      As compras só podem ser efetuadas na Metro após a apresentação na caixa de um cartão de leitura ótica (a seguir «cartão Metro») emitido, a pedido, às empresas dinamarquesas registadas no Det Centrale Virksomhedsregister (Registo Central das Empresas). No tocante aos clientes suecos, a Metro só emite esse cartão às empresas que sejam sujeitos passivos de IVA na Suécia. Um cliente a quem são emitidos vários cartões Metro pode pôr os seus cartões à disposição de outras pessoas singulares, as quais podem utilizar os referidos cartões para as suas próprias compras. Isto vale tanto para os clientes dinamarqueses como para os suecos. A Metro conta com mais de 250 000 clientes registados e emitiu mais de 700 000 cartões Metro.

15      A pessoa que se apresentar na caixa não é submetida a nenhuma formalidade com vista a provar a sua identidade ou a sua qualidade de operador ou de representante da empresa à qual o cartão Metro foi emitido. A Metro não organiza controlos na caixa a fim de verificar se as mercadorias são compradas para fins comerciais ou se se trata unicamente ou também de compras para uso privado.

16      A venda de bebidas espirituosas está sempre sujeita ao pagamento do IVA e dos impostos especiais de consumo dinamarqueses, qualquer que seja a nacionalidade do cliente.

17      Resulta de um pedido de assistência de 12 de fevereiro de 2007, justificado pelo risco de fraude no setor da restauração, que a Skatteverket (Administração Fiscal sueca) tinha solicitado à Administração Aduaneira e Fiscal dinamarquesa informações sobre as compras efetuadas pelos clientes suecos na Metro, durante os anos de 2003 e 2004. As informações recebidas tinham sido utilizadas nos controlos realizados em vários restaurantes suecos, na sequência dos quais, em todos os casos, os donos dos restaurantes receberam avisos de liquidação adicional e lhes foi retirada a licença.

18      A seguir, o Skatteministeriet adotou uma decisão que impõe à Metro que exija a entrega do exemplar 1 do documento de acompanhamento simplificado, quando das vendas de bebidas espirituosas aos clientes suecos.

19      Ao recurso interposto dessa decisão pela Metro foi negado provimento pelo Østre Landsret (Tribunal Regional do Leste da Dinamarca), por decisão de 19 de março de 2010.

20      Em 11 de maio de 2010, a Metro recorreu dessa decisão para o Højesteret.

21      Foi nessas condições que o Højesteret decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      A Diretiva 92/12 e o Regulamento n.° 3649/92 devem ser interpretados no sentido de que impõem a um operador de um Estado‑Membro que, nas circunstâncias descritas no processo principal, vende mercadorias sujeitas a imposto especial de consumo que foram introduzidas no consumo nesse Estado‑Membro e que são entregues no estabelecimento comercial do vendedor a um comprador que reside noutro Estado‑Membro, sem que o vendedor disponibilize ou providencie o transporte, a obrigação de (i) efetuar um controlo para determinar se as mercadorias sujeitas a imposto especial de consumo são adquiridas com vista à sua importação para o segundo Estado‑Membro e (ii) um controlo para determinar se as mercadorias se destinam a fins pessoais ou comerciais?

2)      Se a resposta à questão 1 for positiva, o operador é obrigado, no momento da venda das mercadorias sujeitas a imposto especial de consumo nas circunstâncias descritas no processo principal, quando realiza os controlos supramencionados, a aplicar a presunção quanto ao uso que o comprador tenciona dar às mercadorias adquiridas?

3)      Se a resposta à questão 1 for positiva, a Diretiva 92/12 e o Regulamento n.° 3649/92 devem ser interpretados no sentido de que obrigam um vendedor, tal como referido na questão 1, nas circunstâncias descritas no processo principal, a recusar a venda de mercadorias sujeitas ao imposto especial de consumo se o comprador não apresentar o exemplar 1 do documento de acompanhamento simplificado referido no artigo 4.° do Regulamento n.° 3649/92, caso a sua intenção seja utilizar as referidas mercadorias para fins comerciais no seu país de origem? Solicita‑se igualmente uma resposta a esta questão caso seja aplicável a presunção mencionada na questão 2.

4)      A entrada em vigor da Diretiva 2008/118 e a revogação da Diretiva 92/12 afetam a relevância jurídica da Diretiva 92/12 para a resposta às questões 1 a 3?

5)      A expressão «produtos adquiridos por particulares, para satisfação das suas necessidades» constante do artigo 8.° da Diretiva 92/12 (cf. artigo 32.°, n.° 1, da Diretiva 2008/118) deve ser interpretada no sentido de abranger, ou poder abranger, aquisições de mercadorias sujeitas ao imposto especial de consumo em circunstâncias idênticas às do processo principal? Se a resposta a esta questão for negativa, essas aquisições estão então abrangidas pelo artigo 7.° da Diretiva 92/12 e/ou artigo 33.° da Diretiva 2008/118?»

 Quanto às questões prejudiciais

 Quanto à primeira questão

22      Através da sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se os artigos 7.° a 9.° da Diretiva 92/12 bem como os artigos 1.° e 4.° do Regulamento n.° 3649/92 devem ser interpretados no sentido de que obrigam um operador económico, como o que está em causa no processo principal, a verificar se os compradores provenientes de outros Estados‑Membros têm a intenção de importar os produtos sujeitos a imposto especial de consumo noutro Estado‑Membro e, sendo esse o caso, se tal importação é realizada para fins privados ou para fins comerciais.

23      A título preliminar, deve recordar‑se que, segundo jurisprudência constante, a Diretiva 92/12 se destina a estabelecer um certo número de regras no que respeita à detenção, à circulação e aos controlos dos produtos sujeitos a impostos especiais de consumo, e isto, designadamente, a fim de assegurar que a exigibilidade do imposto especial de consumo seja idêntica em todos os Estados‑Membros (v. acórdão de 23 de novembro de 2006, Joustra, C‑5/05, Colet., p. I‑11075, n.° 27 e jurisprudência referida).

24      A Diretiva 92/12 estabelece, a esse respeito, tal como resulta, nomeadamente, do seu quinto e sexto considerandos, uma distinção entre, por um lado, os produtos que são detidos para fins comerciais e cujo transporte deve ser acompanhado de documentos e, por outro, os produtos que são adquiridos pelos particulares para satisfação das suas necessidades e cujo transporte não requer nenhum documento.

25      Por força do artigo 1.° do Regulamento n.° 3649/92, no caso de os produtos sujeitos a impostos especiais de consumo, que tenham já sido introduzidos no consumo num Estado‑Membro, se destinarem a ser entregues noutro Estado‑Membro para fins comerciais, tal como referido no artigo 7.° da Diretiva 92/12, a pessoa que pretende efetuar a entrega deve elaborar um documento de acompanhamento simplificado.

26      Em conformidade com o disposto no artigo 4.° do referido regulamento, o documento de acompanhamento simplificado deve ser elaborado em três exemplares, devendo o exemplar 1 ser conservado pelo fornecedor, para efeitos de controlo fiscal.

27      Resulta da leitura conjugada dos artigos 1.° e 4.° do Regulamento n.° 3649/92 que o exemplar 1 do documento de acompanhamento simplificado deve ser conservado pelo fornecedor unicamente quando esse documento tiver sido elaborado pela «pessoa que pretende efetuar a entrega», mencionada no referido artigo 1.°, à qual incumbe, por conseguinte, entregar esse exemplar ao fornecedor quando verifique que produtos sujeitos a imposto especial de consumo, que foram já introduzidos no consumo num Estado‑Membro, se destinam a ser detidos para fins comerciais noutro Estado‑Membro.

28      Nada nessas disposições permite concluir que um fornecedor como a Metro, na medida em que ele próprio não é a «pessoa que pretende efetuar a entrega» nos termos do artigo 1.° do Regulamento n.° 3649/92, deve verificar se estão preenchidas as condições para que a pessoa responsável elabore e lhe entregue o referido documento de acompanhamento simplificado, a fim de ele o poder conservar.

29      Como a Comissão alegou nas suas observações, essa pessoa é a referida no artigo 7.°, n.° 5, da Diretiva 92/12, que remete para o artigo 7.°, n.° 3, dessa diretiva.

30      Em conformidade com esta última disposição, o imposto especial de consumo é devido pela pessoa que efetua a entrega, que detém os produtos destinados a ser entregues ou pela pessoa junto da qual se efetua a afetação dos produtos num Estado‑Membro diferente daquele em que foram introduzidos no consumo ou ainda pelo operador profissional ou organismo de direito público.

31      No caso em apreço, não é contestado que, no quadro do sistema «cash & carry» instituído pela Metro, é o próprio cliente que se ocupa do transporte dos produtos comprados, os quais podem ser destinados a um uso privado ou comercial e, quando o cliente seja sueco, ser utilizados não na Suécia mas na Dinamarca.

32      Daí decorre, antes de mais, que um operador como a Metro, enquanto fornecedor que não se ocupa da entrega de produtos vendidos, não poderá ser considerado a «pessoa que efetua a entrega», na aceção do artigo 7.°, n.° 3, da Diretiva 92/12.

33      Em seguida, tal operador não pode ser considerado a pessoa «que detém os produtos destinados a ser entregues», na aceção do referido artigo 7.°, n.° 3, na medida em que a sua atividade comercial por grosso em livre serviço não lhe permite garantir nem o uso comercial dos produtos vendidos a clientes suecos nem que esses produtos serão efetivamente entregues na Suécia.

34      Esta interpretação é confirmada pelo artigo 33.°, n.° 3, da Diretiva 2008/118, que substitui o artigo 7.°, n.° 3, da Diretiva 92/12. Com efeito, o novo texto contém, a partir de então, uma remissão para o n.° 1 desse artigo 33.°, que estabelece claramente uma ligação entre a detenção com vista à entrega e a aplicação do referido artigo 33.°, que, como o artigo 7.° da Diretiva 92/12, visa os produtos «introduzidos no consumo num Estado‑Membro» e «detidos para fins comerciais noutro Estado‑Membro».

35      Finalmente, da leitura conjugada dos n.os 2 e 3 do artigo 7.° da Diretiva 92/12 resulta que a Metro, enquanto empresa estabelecida na Dinamarca, Estado‑Membro da introdução no consumo no processo principal, também não cabe nas outras hipóteses previstas no artigo 7.°, n.° 3, da referida diretiva. Com efeito, estas últimas hipóteses dizem unicamente respeito aos operadores profissionais ou aos organismos de direito público aos quais são afetados os produtos no interior de um Estado‑Membro diferente do da introdução no consumo.

36      Essa conclusão é igualmente confortada pelo artigo 33.°, n.° 3, da Diretiva 2008/118, que simplifica essas disposições da Diretiva 92/12, passando a fazer referência unicamente à pessoa «a quem são entregues os produtos no outro Estado‑Membro».

37      Por conseguinte, há que reconhecer que um operador económico como a Metro não pode ser qualificado de «pessoa que pretende efetuar a entrega», na aceção do artigo 1.° do Regulamento n.° 3649/92, e não tem de verificar se estão preenchidas as condições para que essa pessoa elabore e lhe entregue o documento de acompanhamento simplificado para ele o poder conservar.

38      Face às considerações que precedem, deve responder‑se à primeira questão que os artigos 7.° a 9.° da Diretiva 92/12 e os artigos 1.° e 4.° do Regulamento n.° 3649/92 devem ser interpretados no sentido de que não obrigam um operador económico como o que está em causa no processo principal a verificar se os compradores provenientes de outros Estados‑Membros têm a intenção de importar os produtos sujeitos a imposto especial de consumo noutro Estado‑Membro e, sendo esse o caso, se tal importação é realizada para fins privados ou para fins comerciais.

 Quanto à segunda e terceira questões

39      Tendo em conta a resposta dada à primeira questão, já não há que responder à segunda e terceira questões prejudiciais.

 Quanto à quarta questão

40      Através da sua quarta questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se os artigos 32.° a 34.° da Diretiva 2008/118 devem ser interpretados no sentido de que introduzem alterações substanciais aos artigos 7.° a 9.° da Diretiva 92/12, que justifiquem, em circunstâncias como as que estão em causa no processo principal, uma resposta diferente à primeira questão.

41      A resposta a esta questão resulta da dada à primeira questão e, nomeadamente, dos n.os 34 e 36 do presente acórdão.

42      Com efeito, deve reconhecer‑se que os artigos 32.° a 34.° da Diretiva 2008/118 não introduzem alterações substanciais aos artigos 7.° a 9.° da Diretiva 92/12, mas retomam o conteúdo desses artigos, clarificando‑os.

43      Por conseguinte, há que responder à quarta questão que os artigos 32.° a 34.° da Diretiva 2008/118 devem ser interpretados no sentido de que não introduzem alterações substanciais aos artigos 7.° a 9.° da Diretiva 92/12, que justifiquem, em circunstâncias como as que estão em causa no processo principal, uma resposta diferente à primeira questão.

 Quanto à quinta questão

44      Através da sua quinta questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 8.° da Diretiva 92/12 deve ser interpretado no sentido de que é suscetível de abranger a compra de produtos sujeitos a imposto especial de consumo em circunstâncias como as que estão em causa no processo principal.

45      A esse propósito, deve recordar‑se que os produtos que não sejam detidos para fins pessoais devem ser necessariamente considerados detidos para fins comerciais (v. acórdão Joustra, já referido, n.° 29).

46      Resulta da redação do artigo 7.° da Diretiva 92/12 que este visa a compra de produtos sujeitos a imposto especial de consumo, em circunstâncias como as que estão em causa no processo principal, quando esses produtos sejam destinados a ser detidos noutro Estado‑Membro para fins comerciais.

47      Todavia, tal como resulta do exame da primeira questão, é igualmente possível que tais produtos sejam adquiridos por particulares, para a satisfação das suas necessidades, e transportados pelos próprios para a Suécia. Em tais circunstâncias, os referidos produtos são abrangidos pelo disposto no artigo 8.° da Diretiva 92/12.

48      Por conseguinte, deve responder‑se à quinta questão que o artigo 8.° da Diretiva 92/12 deve ser interpretado no sentido de que é suscetível de abranger a compra de produtos sujeitos a imposto especial de consumo em circunstâncias como as que estão em causa no processo principal, quando esses produtos forem adquiridos por particulares, para satisfação das suas necessidades, e forem transportados pelos próprios, o que cabe às autoridades nacionais competentes verificar caso a caso.

 Quanto às despesas

49      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Oitava Secção) declara:

1)      Os artigos 7.° a 9.° da Diretiva 92/12/CEE do Conselho, de 25 de fevereiro de 1992, relativa ao regime geral, à detenção, à circulação e aos controlos dos produtos sujeitos a impostos especiais de consumo, conforme alterada pela Diretiva 92/108/CEE do Conselho, de 14 de dezembro de 1992, e os artigos 1.° e 4.° do Regulamento (CEE) n.° 3649/92 da Comissão, de 17 de dezembro de 1992, relativo a um documento de acompanhamento simplificado para a circulação intracomunitária dos produtos sujeitos a impostos especiais de consumo, já introduzidos no consumo no Estado‑Membro de expedição, devem ser interpretados no sentido de que não obrigam um operador económico como o que está em causa no processo principal a verificar se os compradores provenientes de outros Estados‑Membros têm a intenção de importar os produtos sujeitos a imposto especial de consumo noutro Estado‑Membro e, sendo esse o caso, se tal importação é realizada para fins privados ou para fins comerciais.

2)      Os artigos 32.° a 34.° da Diretiva 2008/118/CE do Conselho, de 16 de dezembro de 2008, relativa ao regime geral dos impostos especiais de consumo e que revoga a Diretiva 92/12/CEE, devem ser interpretados no sentido de que não introduzem alterações substanciais aos artigos 7.° a 9.° da Diretiva 92/12, conforme alterada pela Diretiva 92/108, que justifiquem, em circunstâncias como as que estão em causa no processo principal, uma resposta diferente à primeira questão.

3)      O artigo 8.° da Diretiva 92/12, conforme alterada pela Diretiva 92/108, deve ser interpretado no sentido de que é suscetível de abranger a compra de produtos sujeitos a imposto especial de consumo em circunstâncias como as que estão em causa no processo principal, quando esses produtos forem adquiridos por particulares, para satisfação das suas necessidades, e forem transportados pelos próprios, o que cabe às autoridades nacionais competentes verificar caso a caso.

Assinaturas


* Língua do processo: dinamarquês.