Language of document : ECLI:EU:C:2010:382

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)

29 de Junho de 2010 (*)

«Política externa e de segurança comum – Medidas restritivas específicas contra certas pessoas e entidades no âmbito do combate ao terrorismo – Posição Comum 2001/931/PESC – Regulamento (CE) n.° 2580/2001 – Artigos 2.° e 3.° – Inscrição de uma organização na lista das pessoas, grupos e entidades envolvidos em actos terroristas – Transferência para uma organização por membros desta de fundos provenientes da angariação de donativos e de vendas de publicações»

No processo C‑550/09,

que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.° TFUE, apresentado pelo Oberlandesgericht Düsseldorf (Alemanha), por decisão de 21 de Dezembro de 2009, entrado no Tribunal de Justiça em 29 de Dezembro de 2009, no processo penal instaurado contra

E,

F,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção),

composto por: V. Skouris, presidente, A. Tizzano, J. N. Cunha Rodrigues, K. Lenaerts (relator), J.‑C. Bonichot, P. Lindh e C. Toader, presidentes de secção, E. Juhász, G. Arestis, A. Borg Barthet, M. Ilešič, T. von Danwitz e A. Arabadjiev, juízes,

advogado‑geral: P. Mengozzi,

secretário: R. Şereş, administradora,

vista a decisão do presidente do Tribunal de Justiça de 1 de Março de 2010 de submeter o processo a tramitação acelerada, em conformidade com os artigos 23.°‑A do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia e 104.°‑A, primeiro parágrafo, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça,

vistos os autos e após a audiência de 12 de Maio de 2010,

vistas as observações apresentadas:

–        em representação do Generalbundesanwalt beim Bundesgerichtshof, por V. Homann e K. Lohse, na qualidade de agentes,

–        em representação de E, por F. Hess e A. Nagler, Rechtsanwälte,

–        em representação de F, por B. Eder e A. Pues, Rechtsanwältinnen,

–        em representação do Governo francês, por E. Belliard, G. de Bergues e L. Butel, na qualidade de agentes,

–        em representação do Conselho da União Europeia, por Z. Kupcova, E. Finnegan e R. Szostak, na qualidade de agentes,

–        em representação da Comissão Europeia, por T. Scharf e M. Konstantinidis, na qualidade de agentes,

ouvido o advogado‑geral,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objecto, por um lado, a validade da inscrição da organização Devrimci Halk Kurtulus Partisi‑Cephesi (DHKP‑C) na lista das pessoas, grupos e entidades a que se aplica o Regulamento (CE) n.° 2580/2001 do Conselho, de 27 de Dezembro de 2001, relativo a medidas restritivas específicas de combate ao terrorismo dirigidas contra determinadas pessoas e entidades (JO L 344, p. 70), e, por outro, a interpretação dos artigos 2.° e 3.° deste regulamento.

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um processo penal instaurado contra E e F (a seguir, em conjunto, «arguidos»), actualmente em prisão preventiva na Alemanha, acusados de pertencerem a um grupo terrorista no estrangeiro e de infracção aos artigos 2.° e 3.° do Regulamento n.° 2580/2001.

 Quadro jurídico

 Direito Internacional

3        Na sequência dos ataques terroristas cometidos em 11 de Setembro de 2001 em Nova Iorque, Washington e na Pensilvânia, o Conselho de Segurança das Nações Unidas adoptou, em 28 de Setembro de 2001, a Resolução 1373 (2001).

4        O preâmbulo desta resolução reafirma «a necessidade de combater, por todos os meios, em conformidade com a Carta das Nações Unidas, as ameaças à paz e à segurança internacionais que os actos de terrorismo representam». Sublinha também a obrigação de os Estados «complementarem a cooperação internacional através da adopção de medidas adicionais para prevenir e reprimir nos seus territórios, por todos os meios lícitos, o financiamento e a preparação de quaisquer actos de terrorismo».

5        Nos termos do ponto 1 da referida resolução, o Conselho de Segurança das Nações Unidas:

«Decide que todos os Estados:

a)      Previnam e reprimam o financiamento de actos de terrorismo;

b)      Tipifiquem como crime a disponibilização ou a angariação voluntárias, pelos seus nacionais ou nos seus territórios, por quaisquer meios, directa ou indirectamente, de fundos que se prevê que venham a ser utilizados, ou que se sabe que serão utilizados para a prática de actos de terrorismo;

[…]

d)      Proíbam os seus nacionais e todas as pessoas ou entidades que se encontrem nos seus territórios de directa ou indirectamente colocarem fundos, activos financeiros ou recursos económicos ou serviços financeiros ou outros serviços conexos à disposição de pessoas que cometam ou tentem cometer actos de terrorismo, neles participem ou os facilitem, de entidades que sejam propriedade dessas pessoas ou que estejam sob o seu controlo directo ou indirecto e de pessoas e entidades que actuem em nome ou sob instruções dessas pessoas.»

 Posições Comuns 2001/931/PESC e 2002/340/PESC

6        Em 27 de Dezembro de 2001, o Conselho da União Europeia adoptou a Posição Comum 2001/931/PESC, relativa à aplicação de medidas específicas de combate ao terrorismo (JO L 344, p. 93).

7        Nos termos do primeiro, segundo e quinto considerandos da referida posição comum:

«(1)      Em 21 de Setembro de 2001, o Conselho Europeu, em sessão extraordinária, declarou que o terrorismo constitui um verdadeiro desafio para o mundo e para a Europa e que o combate ao terrorismo passaria a ser um objectivo prioritário da União Europeia.

(2)      Em 28 de Setembro de 2001, o Conselho de Segurança das Nações Unidas adoptou a Resolução 1373 (2001) que estabelece estratégias de amplo alcance de combate ao terrorismo e, nomeadamente, ao seu financiamento.

[…]

(5)      A União Europeia deve adoptar medidas adicionais para dar execução à Resolução 1373 (2001) do Conselho de Segurança da ONU.»

8        O artigo 1.° da Posição Comum 2001/931 contém, designadamente, as seguintes disposições:

«1.       A presente decisão é aplicável, nos termos dos artigos seguintes, às pessoas, grupos ou entidades envolvidos em actos terroristas e enunciados no anexo.

2.      Para efeitos da presente posição comum, entende‑se por ‘pessoas, grupos e entidades envolvid[o]s em actos terroristas’:

–        pessoas que pratiquem ou tentem praticar actos terroristas, neles participem ou os facilitem;

–        grupos e entidades directa ou indirectamente possuídas ou controladas por essas pessoas; e pessoas, grupos e entidades que actuem em nome ou sob a orientação dessas pessoas, grupos e entidades, incluindo fundos obtidos a partir de bens directa ou indirectamente possuídos ou controlados por essas pessoas e por pessoas, grupos e entidades a elas associadas, ou provenientes desses bens.

3.      Para efeitos da presente posição comum, entende‑se por ‘acto terrorista’ um acto intencional que, dada a sua natureza ou o seu contexto, possa causar sérios danos a um país ou a uma organização internacional, definido como infracção na legislação nacional e cometido com o intuito de:

[…]

iii)      Desestabilizar gravemente ou destruir as estruturas políticas, constitucionais, económicas ou sociais fundamentais de um país ou de uma organização internacional:

[…]

k)      Participação nas actividades de um grupo terrorista, nomeadamente através da prestação de informações, do fornecimento ou meios materiais, ou de qualquer forma de financiamento das suas actividades, com o conhecimento de que essa participação contribui para as actividades criminosas desse grupo.

[…]

4.      A lista do anexo deve ser elaborada com base em informações precisas ou em elementos do processo que demonstrem que foi tomada uma decisão por uma autoridade competente sobre as pessoas, grupos e entidades visados, quer se trate da abertura de um inquérito ou de um processo relativo a um acto terrorista, a uma tentativa, à participação ou à facilitação de tal acto, com base em provas e indícios sérios, ou de uma condenação por esses factos […]

Para efeitos do presente número, entende‑se por ‘autoridades competentes’ as autoridades judiciárias ou, sempre que estas não sejam competentes na matéria abrangida por este número, as autoridades competentes equivalentes nessa matéria.

[…]

6.      Os nomes das pessoas e entidades constantes da lista devem ser regularmente revistos, pelo menos uma vez por semestre, a fim de assegurar que a sua presença na lista continua a justificar‑se.»

9        Nos termos do artigo 3.° da referida posição comum, «[a] Comunidade Europeia, actuando nos limites das competências que lhe são conferidas pelo Tratado que institui a Comunidade Europeia, assegura que os fundos e outros activos financeiros ou recursos económicos ou financeiros de pessoas ou outros serviços conexos não sejam disponibilizados, directa ou indirectamente, em benefício das pessoas, grupos e entidades enunciados no anexo.»

10      Esta mesma posição comum contém um anexo que inclui uma «[p]rimeira lista de pessoas, grupos e entidades referida no artigo 1.° […]». O DHKP‑C não consta dessa lista.

11      O conteúdo desse anexo foi alterado pela Posição Comum 2002/340/PESC do Conselho, de 2 de Maio de 2002, que actualiza a Posição Comum 2001/931 (JO L 116, p. 75).

12      No anexo da Posição Comum 2002/340 figura, no ponto 19 da rubrica 2, intitulada «Grupos e entidades», o «Exército/Frente/Partido Revolucionário Popular de Libertação (DHKP/C), [Devrimci Sol (Esquerda Revolucionária), Dev Sol]». Esta organização foi mantida na lista mencionada no artigo 1.°, n.° 6, da Posição Comum 2001/93 por subsequentes posições comuns do Conselho e, por último, pela Decisão 2009/1004/PESC do Conselho, de 22 de Dezembro de 2009, que actualiza a lista de pessoas, grupos e entidades a que se aplicam os artigos 2.°, 3.° e 4.° da Posição Comum 2001/931 (JO L 346, p. 58).

 Regulamento n.° 2580/2001

13      Nos termos do segundo a quinto considerandos do Regulamento n.° 580/2001:

«(2)      O Conselho Europeu declarou ainda que a luta contra o financiamento do terrorismo constitui uma vertente decisiva no combate ao terrorismo e solicitou ao Conselho que tomasse as medidas necessárias para combater todas as formas de financiamento de actividades terroristas.

(3)      Em 28 de Setembro de 2001, na sua Resolução 1373 (2001), o Conselho de Segurança das Nações Unidas decidiu que todos os Estados deveriam proceder ao congelamento de fundos e de outros activos financeiros ou recursos económicos de pessoas que pratiquem ou ameacem praticar actos terroristas, neles participem ou facilitem a sua prática.

(4)      Além disso, o Conselho de Segurança decidiu que deveriam ser aprovadas medidas para proibir a disponibilização de fundos e de outros activos financeiros ou recursos económicos em benefício dessas pessoas, bem como a prestação de serviços financeiros ou de outros serviços conexos em proveito das mesmas.

(5)      É necessário que a Comunidade tome medidas para pôr em prática os aspectos PESC da Posição Comum 2001/931/PESC.»

14      O artigo 1.° do Regulamento n.° 2580/2001 dispõe que, «[p]ara efeitos do presente regulamento, entende‑se por:

1)      ‘Fundos, outros activos financeiros e recursos económicos’, quaisquer activos, corpóreos ou incorpóreos, móveis ou imóveis, independentemente da forma como sejam adquiridos […]

[…]

4)      ‘acto de terrorismo’ [a definição] constante do n.° 3 do artigo 1.° da Posição Comum 2001/931/PESC;

[…]»

15      O artigo 2.° do Regulamento n.° 2580/2001 prevê:

«1.      Salvo disposição em contrário prevista nos artigos 5.° e 6.°:

a)      São congelados todos os fundos, outros activos financeiros e recursos económicos que sejam propriedade das pessoas singulares ou colectivas, grupos ou entidades incluídos na lista a que se refere o n.° 3, ou por ela[s] possuídos ou detidos;

b)      Não são, directa ou indirectamente, postos à disposição das pessoas singulares ou colectivas, grupos ou entidades incluídos na lista a que se refere o n.° 3, nem utilizados em seu benefício, quaisquer fundos, outros activos financeiros e recursos económicos.

[…]

3.      O Conselho, deliberando por unanimidade, estabelece, revê e altera a lista de pessoas, grupos e entidades a que este regulamento é aplicável, nos termos dos n.os 4, 5 e 6 do artigo 1.° da Posição Comum 2001/931/PESC. […]»

16      Nos termos do artigo 3.°, n.° 1, do Regulamento n.° 2580/2001, «[é] proibido participar, consciente e intencionalmente, em actividades conexas que tenham por objectivo ou efeito, directo ou indirecto, evitar o disposto no artigo 2.°».

17      O artigo 9.° do Regulamento n.° 2580/2001 dispõe que «[c]ada Estado‑Membro determina as sanções aplicáveis em caso de violação do presente regulamento».

 Disposições relativas à inscrição do DHKP‑C na lista prevista no artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 2580/2001

18      A Decisão 2001/927/CE do Conselho, de 27 de Dezembro de 2001, que estabelece a lista prevista no n.° 3 do artigo 2.° do Regulamento n.° 2580/2001 (JO L 344, p. 83), adoptou uma primeira lista de pessoas, grupos e entidades às quais se aplica o referido regulamento. O DHKP‑C não consta dessa primeira lista.

19      A Decisão 2002/334/CE do Conselho, de 2 de Maio de 2002, que dá execução ao disposto no n.° 3 do artigo 2.° do Regulamento n.° 2580/2001 e que revoga a Decisão 2001/927 (JO L 116, p. 33), actualizou pela primeira vez, no seu artigo 1.°, a lista de pessoas, grupos e entidades às quais se aplica o referido regulamento. Nessa lista actualizada, figura, no ponto 10 da rubrica 2, intitulada «Grupos e entidades», o «Exército/Frente/Partido Revolucionário Popular de Libertação (DHKP/C), [Devrimci Sol (Esquerda Revolucionária), Dev Sol]».

20      A inscrição do DHKP‑C na lista prevista no artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 2580/2001 foi mantida pelas seguintes disposições subsequentes:

–        o ponto 18 da rubrica 2 do artigo 1.° da Decisão 2002/460/CE do Conselho, de 17 de Junho de 2002, que dá execução ao disposto no n.° 3 do artigo 2.° do Regulamento n.° 2580/2001 e que revoga a Decisão 2002/334 (JO L 160, p. 26);

–        o ponto 19 da rubrica 2 do artigo 1.° da Decisão 2002/848/CE do Conselho, de 28 de Outubro de 2002, que dá execução ao disposto no n.° 3 do artigo 2.° do Regulamento n.° 2580/2001 e que revoga a Decisão 2002/460 (JO L 295, p. 12);

–        o ponto 20 da rubrica 2 do artigo 1.° da Decisão 2002/974/CE do Conselho, de 12 de Dezembro de 2002, que dá execução ao disposto no n.° 3 do artigo 2.° do Regulamento n.° 2580/2001 e que revoga a Decisão 2002/848 (JO L 337, p. 85);

–        o ponto 20 da rubrica 2 do artigo 1.° da Decisão 2003/480/CE do Conselho, de 27 de Junho de 2003, que dá execução ao disposto no n.° 3 do artigo 2.° do Regulamento n.° 2580/2001 e que revoga a Decisão 2002/974 (JO L 160, p. 81);

–        o ponto 20 da rubrica 2 do artigo 1.° da Decisão 2003/646/CE do Conselho, de 12 de Setembro de 2003, que dá execução ao disposto no n.° 3 do artigo 2.° do Regulamento n.° 2580/2001 e que revoga a Decisão 2003/480 (JO L 229, p. 22);

–        o ponto 21 da rubrica 2 do artigo 1.° da Decisão 2003/902/CE do Conselho, de 22 de Dezembro de 2003, que dá execução ao disposto no n.° 3 do artigo 2.° do Regulamento n.° 2580/2001 e que revoga a Decisão 2003/646 (JO L 340, p. 63);

–        o ponto 22 da rubrica 2 do artigo 1.° da Decisão 2004/306/CE do Conselho, de 2 de Abril de 2004, que dá execução ao disposto no n.° 3 do artigo 2.° do Regulamento n.° 2580/2001 e que revoga a Decisão 2003/902 (JO L 99, p. 28);

–        o ponto 23 da rubrica 2 do artigo 1.° da Decisão 2005/221/PESC do Conselho, de 14 de Março de 2005, que dá execução ao disposto no n.° 3 do artigo 2.° do Regulamento n.° 2580/2001 e que revoga a Decisão 2004/306 (JO L 69, p. 64);

–        o ponto 22 da rubrica 2 do artigo 1.° da Decisão 2005/428/PESC do Conselho, de 6 de Junho de 2005, que dá execução ao disposto no n.° 3 do artigo 2.° do Regulamento n.° 2580/2001 e que revoga a Decisão 2005/221 (JO L 144, p. 59);

–        o ponto 22 da rubrica 2 do anexo da Decisão 2005/722/CE do Conselho, de 17 de Outubro de 2005, que dá execução ao disposto no n.° 3 do artigo 2.° do Regulamento n.° 2580/2001 e que revoga a Decisão 2005/428 (JO L 272, p. 15);

–        o ponto 23 da rubrica 2 do artigo 1.° da Decisão 2005/848/CE do Conselho, de 29 de Novembro de 2005, que dá execução ao n.° 3 do artigo 2.° do Regulamento n.° 2580/2001 e que revoga a Decisão 2005/722 (JO L 314, p. 46);

–        o ponto 24 da rubrica 2 do artigo 1.° da Decisão 2005/930/CE do Conselho, de 21 de Dezembro de 2005, que dá execução ao n.° 3 do artigo 2.° do Regulamento n.° 2580/2001 e que revoga a Decisão 2005/848 (JO L 340, p. 64); e

–        o ponto 25 da rubrica 2 do artigo 1.° da Decisão 2006/379/CE do Conselho, de 29 de Maio de 2006, que dá execução ao n.° 3 do artigo 2.° do Regulamento n.° 2580/2001 e que revoga a Decisão 2005/930 (JO L 144, p. 21).

21      Nos termos do terceiro ponto da fundamentação da Decisão 2007/445/CE do Conselho, de 28 de Junho de 2007, que dá execução ao n.° 3 do artigo 2.° do Regulamento n.° 2580/2001 e que revoga as Decisões 2006/379 e 2006/1008/CE (JO L 169, p. 58), o Conselho forneceu a todas as pessoas, grupos e entidades às quais foi possível fazê‑lo na prática exposições de motivos explicando as razões pelas quais foram incluídas, nomeadamente, na lista constante da Decisão 2006/379.

22      Como resulta do quarto a sexto pontos da fundamentação da Decisão 2007/445, por meio de um aviso publicado no Jornal Oficial da União Europeia em 25 de Abril de 2007 (JO C 90, p. 1), o Conselho informou essas pessoas, grupos e entidades de que tencionava mantê‑los na lista prevista no artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 2580/2001 e de que era possível dirigir‑lhe, se fosse caso disso, um pedido de acesso à exposição dos motivos. Na sequência de uma completa revisão dessa lista, que teve em consideração as observações e documentos que lhe foram apresentados, o Conselho concluiu que as pessoas, grupos e entidades constantes da lista em anexo da Decisão 2007/445 estiveram envolvidos em actos terroristas na acepção do artigo 1.°, n.os 2 e 3, da Posição Comum 2001/931, que foram objecto de uma decisão tomada por uma autoridade competente na acepção do mesmo artigo 1.°, n.° 4, e que deverão continuar a estar sujeitas às medidas restritivas específicas previstas no Regulamento n.° 2580/2001.

23      Nos termos do artigo 3.° da Decisão 2007/445, «[a] presente decisão produz efeitos a partir da data da sua publicação». Essa publicação ocorreu em 29 de Junho de 2007.

24      Na lista constante do anexo da referida decisão, que, como decorre dos seus artigos 1.° e 2.°, substitui, nomeadamente, a lista contida na Decisão 2006/379, figura, no ponto 26 da rubrica 2, intitulada «Grupos e entidades», o DHKP‑C.

25      Esta organização foi mantida na lista prevista no artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 2580/2001 pelas decisões posteriores do Conselho, nomeadamente pela Decisão 2007/868/CE do Conselho, de 20 de Dezembro de 2007, que dá execução ao n.° 3 do artigo 2.° do Regulamento n.° 2580/2001 e que revoga a Decisão 2007/445 (JO L 340, p. 100), e pela Decisão 2008/583/CE do Conselho, de 15 de Julho de 2008, que dá execução ao n.° 3 do artigo 2.° do Regulamento n.° 2580/2001 e que revoga a Decisão 2007/868 (JO L 188, p. 21).

 Direito nacional

26      As infracções a actos da União, como o Regulamento n.° 2580/2001, são passíveis de sanções penais por força do § 34, n.° 4, da Lei relativa ao comércio externo (Außenwirtschaftsgesetz, a seguir «AWG»), tanto na sua versão de 11 de Dezembro de 1996 (BGBl. 1996 I, p. 1850) como na de 26 de Junho de 2006 (BGBl. 2006 I, p. 1386).

 Factos na origem do processo principal e questões prejudiciais

27      O processo penal contra os arguidos baseia‑se na acusação deduzida pelo Generalbundesanwalt beim Bundesgerichtshof (a seguir «Generalbundesanwalt»), em 6 de Outubro de 2009, na qual são acusados de, entre 30 de Agosto de 2002 e 5 de Novembro de 2008, data da sua detenção, terem sido membros do DHKP‑C, cujo objectivo era, nos termos da referida acusação, combater através da luta armada a ordem estatal na Turquia. Foi com base nesses factos que foram colocados em prisão preventiva.

28      Segundo a acusação, durante todo o período em que pertenceram ao DHKP‑C, os arguidos, que dirigiam as secções locais («Bölge») dessa organização na Alemanha, no âmbito da sua missão principal, que consistia em colocar fundos à disposição do DHKP‑C, organizaram campanhas anuais de angariação de donativos a favor deste e transferiram os fundos angariados para as suas mais altas instâncias dirigentes. Além disso, ainda segundo a acusação, os arguidos participaram de forma determinante na organização de eventos e na venda de publicações destinadas à angariação de fundos para o DHKP‑C e transferiram esses fundos para este último. Por último, os arguidos não ignoravam que os fundos assim angariados visavam, pelo menos em parte, financiar as actividades terroristas do DHKP‑C.

29      Durante o período referido na acusação, um dos arguidos terá angariado e transferido para o DHKP‑C pelo menos 215 809 euros e o outro pelo menos 105 051 euros.

30      Tendo dúvidas sobre a validade da inscrição do DHKP‑C na lista prevista no artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 2580/2001 e sobre a interpretação do referido regulamento, o Oberlandesgericht Düsseldorf decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      Tendo em consideração – se for caso disso – o processo alterado em virtude da Decisão 2007/445[…], a inclusão numa lista, com fundamento no artigo 2.° do Regulamento […] n.° 2580/2001 […], de uma organização que não interpôs recurso das decisões que lhe dizem respeito deve ser considerada eficaz (‘wirksam’) desde o início, mesmo quando a inclusão na lista tenha sido efectuada em violação de garantias processuais elementares?

2)      Os artigos 2.° e 3.° do Regulamento […] n.° 2580/2001 […] devem ser interpretados no sentido de que pode existir colocação de fundos, activos financeiros e recursos económicos à disposição de uma pessoa colectiva, de um grupo ou de uma entidade incluídos na lista a que se refere o artigo 2.°, n.° 3, [deste] regulamento, colaboração em tal operação ou participação em actividades que tenham por objectivo evitar a aplicação do disposto no artigo 2.° do [dito] regulamento mesmo quando a pessoa que coloca esses montantes à disposição é membro da pessoa colectiva, do grupo ou da entidade em causa?

3)      Os artigos 2.° e 3.° do Regulamento […] n.° 2580/2001 devem ser interpretados no sentido de que pode existir colocação de fundos, activos financeiros e recursos económicos à disposição de uma pessoa colectiva, de um grupo ou de uma entidade constantes da lista a que se refere o artigo 2.°, n.° 3, [deste] regulamento, colaboração em tal operação ou participação em actividades que tenham por objectivo evitar a aplicação do disposto no artigo 2.° do [dito] regulamento mesmo quando o activo a transmitir já se encontrava à disposição (em sentido amplo) da pessoa colectiva, do grupo ou da entidade em causa?»

 Tramitação do processo no Tribunal de Justiça

31      O pedido de decisão prejudicial foi notificado em 1 de Fevereiro de 2010 aos interessados, aos quais foi concedido, para a apresentação de observações escritas, um prazo que terminava entre 15 e 21 de Abril de 2010. O órgão jurisdicional de reenvio e os interessados, no momento dessa notificação, foram informados da decisão do Tribunal de Justiça de tratar prioritariamente o presente pedido de decisão prejudicial.

32      Por documento separado de 5 de Fevereiro de 2010, entrado na Secretaria do Tribunal de Justiça no dia 11 do mesmo mês, o órgão jurisdicional de reenvio requereu ao Tribunal de Justiça que submetesse o presente pedido de decisão prejudicial a tramitação acelerada. Em apoio do seu pedido, referiu que, por despacho de 15 de Fevereiro de 2010, iniciou um processo penal contra os arguidos e marcou as audiências para o período compreendido entre 11 de Março e 31 de Agosto de 2010. Afirmou que, tendo em atenção a duração previsível desse processo penal e a importância das questões prejudiciais para o processo principal, havia uma enorme urgência em decidir sobre estas questões.

33      Por despacho de 1 de Março de 2010, o presidente do Tribunal de Justiça decidiu submeter o presente pedido de decisão prejudicial a tramitação acelerada.

 Quanto à admissibilidade do pedido de decisão prejudicial

34      E contesta a admissibilidade do pedido de decisão prejudicial, invocando a composição alegadamente irregular da Secção do órgão jurisdicional de reenvio que apresentou esse pedido ao Tribunal de Justiça.

35      A este respeito, importa observar que, desde que uma decisão de reenvio emane de um órgão jurisdicional na acepção do artigo 267.° TFUE, em princípio não incumbe ao Tribunal de Justiça verificar se tal decisão foi adoptada em conformidade com as regras de organização e processuais de direito nacional.

36      Daqui resulta que o pedido de decisão prejudicial é admissível.

 Quanto às questões prejudiciais

 Quanto à primeira questão

37      Com a primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, no essencial, se se deve considerar que a inscrição do DHKP‑C na lista prevista no artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 2580/2001, que este não contestou judicialmente, produziu efeitos desde o início apesar de essa inscrição ter sido inicialmente efectuada em violação de garantias processuais elementares.

38      Resulta das indicações que figuram no pedido de decisão prejudicial que, entre essas garantias, o órgão jurisdicional de reenvio visa, em especial, o dever de fundamentação previsto no artigo 296.° TFUE. As dúvidas que tem, em face das objecções suscitadas pelos arguidos, relativamente à validade da referida inscrição à luz desse dever resultam dos acórdãos em que o Tribunal de Primeira Instância invalidou a inscrição de diversas pessoas, grupos e entidades na referida lista, designadamente pelo facto de o Conselho não ter, nas decisões impugnadas, fundamentado essas diferentes inscrições tornando assim impossível a fiscalização judicial da legalidade (acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 12 de Dezembro de 2006, Organisation des Modjahedines du peuple d’Iran/Conselho T‑228/02, Colect., p. II‑4665; de 11 de Julho de 2007, Sison/Conselho, T‑47/03; Al‑Aqsa/Conselho, T‑327/03; de 3 de Abril de 2008, PKK/Conselho, T‑229/02; e Kongra‑Gel e o./Conselho, T‑253/04).

39      Neste contexto, o órgão jurisdicional de reenvio questiona‑se sobre se, apesar de o DHKP‑C não ter requerido a anulação da sua inscrição na lista prevista no artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 2580/2001, há que concluir, por identidade de razões, pela invalidade das decisões do Conselho na parte em que inscreveram, e depois mantiveram, esta organização nessa lista.

40      Seguidamente, interroga‑se sobre a incidência da Decisão 2007/445, tendo em conta a alegação, formulada na acusação, de que a inscrição do DHKP‑C na referida lista teria, em qualquer caso, sido validada retroactivamente graças ao procedimento seguido pelo Conselho para a adopção dessa decisão, durante o qual foram expostas as razões dessa inscrição.

41      Assim, na primeira questão solicita‑se um exame, à luz do dever de fundamentação previsto no artigo 296.° TFUE, da validade da inscrição do DHKP‑C e da sua manutenção na lista prevista no artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 2580/2001, resultante das disposições identificadas no n.° 20 do presente acórdão, que abrangem sucessivamente o período compreendido entre 30 de Agosto de 2002, data de início dos comportamentos censurados na acusação, e 28 de Junho de 2007, data que corresponde à véspera do dia em que a Decisão 2007/445 começou a produzir efeitos (a seguir «inscrição do DHKP‑C na lista prevista no artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 2580/2001 durante o período anterior a 29 de Junho de 2007»).

42      Em contrapartida, como admitem todas as partes que apresentaram observações ao Tribunal de Justiça, com excepção de F, esta primeira questão não tem por objecto a validade da inscrição do DHKP‑C na lista prevista no artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 2580/2001, que resulta da Decisão 2007/445 e das decisões posteriores do Conselho referidas no n.° 25 do presente acórdão. Contrariamente à posição defendida por F, tão‑pouco diz respeito à validade do Regulamento n.° 2580/2001.

43      A título liminar, há que salientar que, diversamente do processo em que foi proferido o acórdão de 3 de Setembro de 2008, Kadi e Al Barakaat International Foundation/Conselho e Comissão (C‑402/05 P e C‑415/05 P, Colect., p. I‑6351), relativo a uma medida de congelamento dos activos dos recorrentes, as disposições cuja validade é apreciada no presente pedido de decisão prejudicial são invocadas em apoio de acusações relativas à violação do Regulamento n.° 2580/2001, que, segundo o direito nacional aplicável, é passível de sanções penais privativas de liberdade.

44      Neste contexto, deve salientar‑se que a União é uma União de direito cujas instituições estão sujeitas à fiscalização da conformidade dos seus actos, nomeadamente, com o Tratado FUE e com os princípios gerais do direito. O referido Tratado estabeleceu um sistema completo de vias de recurso e de procedimentos destinado a confiar ao Tribunal de Justiça a fiscalização da legalidade dos actos das instituições da União (v., neste sentido, acórdãos de 25 de Julho de 2002, Unión de Pequeños Agricultores/Conselho, C‑50/00 P, Colect., p. I‑6677, n.os 38 e 40, e Kadi e Al Barakaat International Foundation/Conselho e Comissão, já referido, n.° 281).

45      Daqui resulta que, no contexto de um processo nacional, qualquer parte tem o direito de alegar, no órgão jurisdicional onde foi intentado o referido processo, a invalidade de disposições contidas nos actos da União que servem de fundamento para uma decisão ou para um acto nacional tomados contra si e de levar o referido órgão jurisdicional, que não é competente para declarar ele próprio essa invalidade, a interrogar o Tribunal de Justiça a esse respeito através de uma questão prejudicial (v., neste sentido, acórdãos de 15 de Fevereiro 2001, Nachi Europe, C‑239/99, Colect., p. I‑1197, n.° 35, e Unión de Pequeños Agricultores/Conselho, já referido, n.° 40).

46      O reconhecimento desse direito pressupõe, todavia, que essa parte não dispusesse do direito de interpor, ao abrigo do artigo 263.° TFUE, um recurso directo contra essas disposições, de que sofreu as consequências sem ter podido requerer a sua anulação (v., neste sentido, acórdãos de 9 de Março de 1994, TWD Textilwerke Deggendorf, C‑188/92, Colect., p. I‑833, n.° 23, e Nachi Europe, já referido, n.° 36).

47      No processo principal, a inscrição do DHKP‑C na lista prevista no artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 2580/2001 durante o período anterior a 29 de Junho de 2007, conjugada com esse regulamento, contribui, com base no § 34, n.° 4, da AWG, para fundamentar a acusação de que os arguidos são objecto relativamente ao referido período.

48      Importa, assim, verificar se um recurso de anulação interposto pelos arguidos contra essa inscrição teria sido, sem margem para dúvidas, admissível (v., neste sentido, acórdão de 2 de Julho de 2009, Bavaria e Bavaria Italia, C‑343/07, Colect., p. I‑5491, n.° 40).

49      A este respeito, há que observar que os arguidos não são objecto dessa inscrição, pois, com efeito, esta apenas visa o DHKP‑C. De resto, o pedido de decisão prejudicial não contém nenhuma indicação susceptível de demonstrar que a posição ocupada pelos arguidos no DHKP‑C lhes tenha conferido o poder de representar essa organização no âmbito de um recurso de anulação interposto no Tribunal da União.

50      Por outro lado, não se pode considerar, sem margem para dúvidas, que a inscrição em causa «[diga] directa e individualmente respeito» aos arguidos, na acepção do artigo 230.°, quarto parágrafo, CE, aplicável durante o período em questão.

51      Com efeito, como o Regulamento n.° 2580/2001, essa inscrição tem carácter geral e contribui, em conjugação com o referido regulamento, para impor a um número indeterminado de pessoas o cumprimento de medidas restritivas específicas contra o DHKP‑C (v., por analogia, acórdão Kadi e Al Barakaat International Foundation/Conselho e Comissão, já referido, n.os 241 a 244).

52      Daqui resulta que, como refere o órgão jurisdicional de reenvio, os arguidos não tinham, diversamente do DHKP‑C, uma legitimidade inquestionável para pedir a anulação da referida inscrição com base no artigo 230.° CE.

53      Quanto à apreciação, à luz do dever de fundamentação previsto no artigo 296.° TFUE, da validade das disposições identificadas no n.° 20 do presente acórdão, há que salientar que o referido dever é aplicável a uma inscrição como a que está em causa no processo principal, o que, de resto, não foi posto em dúvida por nenhuma das partes intervenientes no Tribunal de Justiça.

54      Este dever de fundamentação tem por objectivo permitir, por um lado, aos interessados conhecer as justificações da disposição adoptada para apreciar a sua razão de ser e, por outro, ao órgão jurisdicional competente exercer a sua fiscalização (v., neste sentido, acórdãos de 23 de Fevereiro de 2006, Atzeni e o., C‑346/03 e C‑529/03, Colect., p. I‑1875, n.° 73, e de 1 de Outubro de 2009, Comissão/Conselho, C‑370/07, Colect., p. I‑8917, n.° 37).

55      No caso vertente, como confirmou o Conselho na audiência, nenhuma das disposições mencionadas no n.° 20 do presente acórdão continha uma fundamentação sobre as condições legais de aplicação do Regulamento n.° 2580/2001 ao DHKP‑C, em especial sobre a existência de uma decisão adoptada por uma autoridade competente, na acepção do artigo 1.°, n.° 4, da Posição Comum 2001/931, nem uma exposição das razões específicas e concretas pelas quais o Conselho considerou que a inscrição do DHKP‑C na lista prevista no artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 2580/2001 era ou continuava a ser justificada.

56      Os arguidos vêem‑se assim privados dos elementos necessários para verificar a procedência da inscrição do DHKP‑C na lista prevista no artigo 2.°, n.° 3, deste regulamento durante o período anterior a 29 de Junho de 2007, em especial a exactidão e a pertinência dos elementos que levaram a essa inscrição, apesar de essa inscrição contribuir para fundamentar a acusação de que são objecto. Na audiência, o Conselho reconheceu que o direito de conhecer os elementos justificativos dessa inscrição é extensivo aos referidos arguidos.

57      A falta de fundamentação de que enferma a referida inscrição é também susceptível de frustrar uma fiscalização jurisdicional adequada da sua legalidade material, destinada, nomeadamente, a verificar os factos assim como os elementos de prova e de informação invocados em seu apoio. Ora, como salientou F na audiência, a possibilidade de uma tal fiscalização revela‑se indispensável para permitir assegurar um justo equilíbrio entre as exigências do combate ao terrorismo internacional e a protecção das liberdades e dos direitos fundamentais.

58      O Generalbundesanwalt considera contudo que, mesmo que a inscrição do DHKP‑C na lista prevista no artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 2580/2001 não tivesse sido validamente efectuada no período anterior a 29 de Junho de 2007, a referida inscrição foi, de qualquer forma, validada retroactivamente devido ao procedimento seguido para a adopção da Decisão 2007/445, durante o qual foi fornecida uma exposição dos motivos dessa inscrição.

59      Todavia, mesmo admitindo que, ao adoptar a Decisão 2007/445, o Conselho tenha pretendido suprir a falta de fundamentação da inscrição em causa em relação ao período anterior a 29 de Junho de 2007, esta decisão não pode, em nenhum caso, contribuir para justificar, em conjugação com o § 34, n.° 4, da AWG, uma condenação penal por factos relativos ao referido período, sob pena de violação do princípio da não retroactividade das disposições susceptíveis de fundamentar uma condenação dessa natureza (v., por analogia, acórdãos de 10 de Julho de 1984, Kirk, 63/83, Recueil, p. 2689, n.os 21 e 22; de 13 de Novembro de 1990, Fedesa e o., C‑331/88, Colect., p. I‑4023, n.° 44; e de 3 de Maio de 2005, Berlusconi e o., C‑387/02, C‑391/02 e C‑403/02, Colect., p. I‑3565, n.os 74 a 78).

60      Com efeito, se a Decisão 2007/445 pudesse, para efeitos do processo principal, fornecer uma exposição dos motivos em apoio das decisões identificadas no n.° 20 do presente acórdão, inválidas para o período anterior a 29 de Junho de 2007, contribuiria, na realidade, para justificar uma condenação penal por factos cometidos durante o referido período, apesar de tal decisão não existir nesse período.

61      Nestas condições, incumbe ao órgão jurisdicional nacional não aplicar, no contexto do processo principal, as disposições mencionadas no n.° 20 do presente acórdão, as quais não podem, consequentemente, contribuir para justificar os procedimentos penais instaurados contra os arguidos relativamente ao período anterior a 29 de Junho de 2007.

62      Tendo em conta as considerações anteriores, há que responder à primeira questão que a inscrição do DHKP‑C na lista prevista no artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 2580/2001 é inválida e, por conseguinte, não pode contribuir para justificar uma condenação penal relacionada com uma alegada violação deste regulamento, relativamente ao período anterior a 29 de Junho de 2007.

 Quanto à segunda e terceira questões

63      Com a segunda e terceira questões, que importa examinar em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, no essencial, se os artigos 2.° e 3.° do Regulamento n.° 2589/2001 devem ser interpretados no sentido de que visam a transferência para uma pessoa colectiva, grupo ou entidade que conste da lista prevista no artigo 2.°, n.° 3, deste regulamento, por um membro dessa pessoa colectiva, grupo ou entidade, de fundos, outros activos financeiros ou recursos económicos angariados ou obtidos de terceiros.

64      Tendo em conta as indicações do pedido de decisão prejudicial, estas duas questões têm por objectivo determinar se actos como aqueles em que os arguidos, na qualidade de membros do DHKP‑C, transferiram para esta organização, mais precisamente para as suas mais altas instâncias dirigentes, os fundos obtidos de terceiros no âmbito de campanhas anuais de angariação de donativos, de manifestações e de vendas de publicações implicam que esses fundos foram postos à disposição dessa organização, na acepção do Regulamento n.° 2580/2001.

65      A este respeito, à semelhança do Governo francês, importa começar por salientar que nada na redacção dos artigos 2.° e 3.° deste regulamento permite supor que estas disposições não se aplicam a actos dessa natureza.

66      Pelo contrário, a proibição prevista no referido artigo 2.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 2580/2001 está formulada de forma particularmente ampla (v., por analogia, acórdão de 11 de Outubro de 2007, Möllendorf e Möllendorf‑Niehuus, C‑117/06, Colect., p. I‑8361, n.° 50).

67      A expressão «postos à disposição» reveste um significado amplo, englobando qualquer acto cuja prática seja necessária para permitir a uma pessoa, grupo ou entidade que consta da lista prevista no artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 2580/2001 obter efectivamente o poder de dispor de forma plena dos fundos, outros activos financeiros e recursos económicos em causa (v., por analogia, acórdão Möllendorf e Möllendorf‑Niehuus, já referido, n.° 51).

68      Este significado é independente da existência, ou não, de relações entre o autor e o destinatário do acto de colocação à disposição em causa. Como alega o Generalbundesanwalt, e contrariamente à posição defendida por F, o Regulamento n.° 2580/2001 não comporta, nas suas diferentes versões linguísticas, nenhum elemento que exclua deste significado a transferência de fundos por um membro de uma organização que consta da referida lista para essa organização enquanto tal.

69      O conceito de «fundos, outros activos financeiros e recursos económicos», na acepção do Regulamento n.° 2580/2001, reveste também, por força da definição que é dada no artigo 1.°, n.° 1, do referido regulamento, um sentido amplo, que abrange os activos de qualquer natureza, independentemente do modo como sejam adquiridos. A este respeito, não é relevante que se trate de activos próprios ou de activos angariados ou obtidos de terceiros.

70      Importa acrescentar que, para efeitos da interpretação do Regulamento n.° 2580/2001, se deve ter em conta o texto e o objecto da Posição Comum 2001/931, que este regulamento, nos termos do seu quinto considerando, se destina a pôr em prática.

71      Ora, a proibição enunciada no artigo 3.° dessa posição comum está formulada em termos tão amplos como os utilizados no artigo 2.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 2580/2001. Além disso, o artigo 1.°, n.° 3, dessa posição comum, para o qual remete o artigo 1.°, n.° 4, do mesmo regulamento, confere um significado amplo ao conceito de «acto terrorista», que engloba, nos termos do seu ponto iii), alínea k), «qualquer forma de financiamento» das actividades de um grupo terrorista.

72      Como alega a Comissão Europeia, a interpretação do Regulamento n.° 2580/2001 implica também que se deva ter em conta o texto e o objectivo da Resolução 1373 (2001), para a qual remete o terceiro considerando deste regulamento (v., por analogia, acórdão Möllendorf e Möllendorf‑Niehuus, já referido, n.° 54, e de 29 de Abril de 2010, M e o., C‑340/08, Colect., p. I‑0000, n.° 45).

73      Ora, o ponto 1, alínea d), da referida resolução estabelece uma proibição generalizada de, nomeadamente, colocar fundos à disposição de pessoas ou entidades que cometam, ou tentem cometer, actos de terrorismo. O ponto 1, alínea b), desta mesma resolução determina, além disso, que os Estados «[t]ipifiquem como crime a disponibilização ou a angariação voluntárias, pelos seus nacionais ou nos seus territórios, por quaisquer meios, directa ou indirectamente, de fundos que se prevê que venham a ser utilizados ou que se sabe que serão utilizados para a prática de actos de terrorismo».

74      A redacção ampla e inequívoca das disposições referidas nos n.os 71 e 73 do presente acórdão confirma que o artigo 2.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 2580/2001 engloba actos como os visados na segunda e terceiras questões.

75      Como afirma a Comissão, a análise precedente não é posta em causa pela alegação dos arguidos de que, uma vez na sua posse, os fundos em causa já estavam indirectamente acessíveis ao DHKP‑C, de modo que a sua posterior transferência para as instâncias dirigentes dessa organização não consistiu em os pôr à disposição dessa organização, na acepção do Regulamento n.° 2580/2001.

76      Com efeito, tendo em conta, designadamente, a estrutura do DHKP‑C, que, como o Generalbundesanwalt expôs na audiência, é composto por órgãos centrais de direcção e por quatro divisões principais, elas próprias compostas por subdivisões nacionais, regionais e locais, a detenção, por membros dessa organização, de fundos recebidos de terceiros não basta para considerar que as instâncias dirigentes que dão corpo à organização, referida como tal na lista prevista no artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 2580/2001, dispõem elas próprias desses fundos. No caso vertente, a transferência desses mesmos fundos para as referidas instâncias foi necessária para o DHKP‑C adquirir efectivamente o poder, de que até então não dispunha, de dispor plenamente desses fundos para a prossecução dos seus objectivos.

77      Relativamente à circunstância, alegada pelos arguidos, de que não estava demonstrado que os fundos que transferiram foram efectivamente utilizados pelo DHKP‑C para financiar actividades terroristas, há que salientar que tanto a definição contida no artigo 1.°, n.° 1, do Regulamento n.° 2580/2001 como os termos do seu artigo 2.°, n.° 1, alínea b), lhe retiram pertinência. Os fundos colocados à disposição de uma organização que consta da lista prevista no artigo 2.°, n.° 3, deste regulamento comportam, em si próprios, um risco de que possam ser desviados para apoiar tais actividades (v., por analogia, acórdão M e o., já referido, n.° 57). Consequentemente, essa colocação à disposição é abrangida pela proibição enunciada no referido artigo 2.°, n.° 1, alínea b), e é passível das sanções penais previstas pelo direito nacional aplicável, independentemente da prova de que os ditos fundos foram efectivamente utilizados pela organização em causa para actividades dessa natureza.

78      Nas observações que apresentou ao Tribunal de Justiça, F sustenta ainda que o facto de, diversamente da Resolução 1373 (2001), nem a Posição Comum 2001/931 nem o Regulamento n.° 2580/2001 visarem a angariação de fundos em benefício de uma pessoa, grupo ou entidade que consta da lista prevista no artigo 2.°, n.° 3, desse regulamento revela a intenção do legislador da União de excluir este tipo de acto do âmbito de aplicação do referido regulamento.

79      Todavia, como decorre do pedido de decisão prejudicial, e como o Generalbundesanwalt confirmou na audiência, a acusação não visa a actividade de angariação de fundos enquanto tal, mas a transferência das receitas dessa actividade para a organização de que os arguidos são membros.

80      Atendendo às considerações anteriores, há que responder à segunda e terceira questões que o artigo 2.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 2580/2001 deve ser interpretado no sentido de que visa a transferência para uma pessoa colectiva, grupo ou entidade que consta da lista prevista no artigo 2.°, n.° 3, deste regulamento, por um membro dessa pessoa colectiva, grupo ou entidade, de fundos, outros activos financeiros ou recursos económicos angariados ou obtidos de terceiros.

 Quanto às despesas

81      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) declara:

1)      A inscrição do Devrimci Halk Kurtulus Partisi‑Cephesi (DHKP‑C) na lista prevista no artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento (CE) n.° 2580/2001 do Conselho, de 27 de Dezembro de 2001, relativo a medidas restritivas específicas de combate ao terrorismo dirigidas contra determinadas pessoas e entidades, é inválida e, por conseguinte, não pode contribuir para justificar uma condenação penal relacionada com uma alegada violação deste regulamento, relativamente ao período anterior a 29 de Junho de 2007.

2)      O artigo 2.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 2580/2001 deve ser interpretado no sentido de que visa a transferência para uma pessoa colectiva, grupo ou entidade que consta da lista prevista no artigo 2.°, n.° 3, deste regulamento, por um membro dessa pessoa colectiva, grupo ou entidade, de fundos, outros activos financeiros ou recursos económicos angariados ou obtidos de terceiros.

Assinaturas


* Língua do processo: alemão.