Language of document : ECLI:EU:C:2010:349

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção)

17 de Junho de 2010 (*)

«Directiva 92/12/CEE – Produtos sujeitos a imposto especial de consumo – Importação de tabaco em bruto não sujeito a imposto especial de consumo ao abrigo do regime de aperfeiçoamento activo – Transformação em tabaco cortado – Circulação entre Estados‑Membros – Documento de acompanhamento»

No processo C‑550/08,

que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 234.° CE, apresentado pelo Finanzgericht München (Alemanha), por decisão de 13 de Novembro de 2008, entrado no Tribunal de Justiça em 11 de Dezembro de 2008, no processo

British American Tobacco (Germany) GmbH

contra

Hauptzollamt Schweinfurt,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção),

composto por: J.‑C. Bonichot (relator), presidente de secção, C. Toader, K. Schiemann, P. Kūris e L. Bay Larsen, juízes,

advogada‑geral: V. Trstenjak,

secretário: B. Fülöp, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 28 de Janeiro de 2010,

vistas as observações apresentadas:

–        em representação da British American Tobacco (Germany) GmbH, por T. Englert e H.‑M. Pott, Rechtsanwälte,

–        em representação do Hauptzollamt Schweinfurt, por J. Muhlert, na qualidade de agente,

–        em representação do Governo checo, por M. Smolek, na qualidade de agente,

–        em representação do Governo polaco, por M. Dowgielewicz, na qualidade de agente,

–        em representação da Comissão Europeia, por W. Mölls e A. Sauka, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvida a advogada‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objecto a interpretação dos artigos 5.°, n.° 2, primeiro parágrafo, primeiro travessão, e 15.°, n.° 4, da Directiva 92/12/CEE do Conselho, de 25 de Fevereiro de 1992, relativa ao regime geral, à detenção, à circulação e aos controlos dos produtos sujeitos a impostos especiais de consumo (JO L 76, p. 1), na versão aplicável aos factos do processo principal (a seguir «Directiva 92/12»).

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a British American Tobacco (Germany) GmbH (a seguir «BAT») ao Hauptzollamt Schweinfurt (Serviço Aduaneiro Principal de Schweinfurt) relativamente a duas decisões deste que impunham o pagamento do imposto especial de consumo sobre o tabaco em razão da expedição de lotes de tabaco cortado da Alemanha para França.

 Quadro jurídico

 Directiva 92/12

3        O décimo e décimo quinto considerandos da Directiva 92/12 têm a seguinte redacção:

«Considerando que a passagem do território de um Estado‑[M]embro para outro não pode originar controlos susceptíveis de criar obstáculos à livre circulação intracomunitária; que as restrições inerentes à exigibilidade impõem, contudo, o conhecimento dos movimentos dos produtos sujeitos a impostos especiais de consumo; que é pois necessário prever um documento de acompanhamento para esses produtos;

[…]

Considerando, por outro lado, que não será necessário utilizar o documento de acompanhamento quando os produtos sujeitos a impostos especiais de consumo circularem ao abrigo de um regime aduaneiro comunitário diverso da colocação em livre prática […]»

4        O artigo 3.°, n.° 1, da Directiva 92/12 dispõe:

«A presente directiva é aplicável, a nível comunitário, aos produtos seguintes, tal como definidos nas respectivas directivas:

[…]

–        tabacos manufacturados.»

5        O artigo 4.°, alínea c), desta directiva define o conceito de «regime de suspensão» do seguinte modo:

«Regime de suspensão: regime fiscal aplicável à produção, transformação, detenção e circulação dos produtos em regime de suspensão do imposto especial de consumo».

6        O artigo 5.° da dita directiva prevê:

«1.      Os produtos referidos no n.° 1 do artigo 3.° ficam sujeitos ao imposto especial de consumo no momento da sua produção no território da Comunidade, tal como definido no artigo 2.°, ou da sua importação nesse território.

Considera‑se ‘importação de um produto sujeito ao imposto especial de consumo’ a entrada desse produto na Comunidade […]

Contudo, quando, à entrada na Comunidade, esse produto for colocado sob um regime aduaneiro comunitário, a importação desse produto é considerada como tendo lugar no momento em que o produto sai do regime aduaneiro comunitário.

2.      Sem prejuízo das disposições nacionais e comunitárias em matéria de regimes aduaneiros, quando os produtos sujeitos ao imposto especial de consumo:

–        provierem ou se destinarem a países terceiros [...] e se encontrarem ao abrigo de um dos regimes suspensivos referidos no n.° 1, alínea a), do artigo 84.° do Regulamento (CEE) n.° 2913/92 [do Conselho, de 12 de Outubro de 1992, que estabelece o Código Aduaneiro Comunitário (JO L 302, p. 1), a seguir ‘Código Aduaneiro Comunitário’] […]

[…]

são considerados em regime de suspensão do imposto especial de consumo.

[…]»

7        O artigo 6.°, n.° 1, da Directiva 92/12 define os requisitos de exigibilidade do imposto especial de consumo do seguinte modo:

«O imposto especial de consumo é exigível no momento da introdução no consumo ou da constatação das faltas que devem ser sujeitas ao imposto especial de consumo em conformidade com o n.° 3 do artigo 14.°

Considera‑se como introdução no consumo de produtos sujeitos ao imposto especial de consumo:

a)      Toda e qualquer saída, mesmo irregular, de um regime de suspensão;

b)      Todo e qualquer fabrico, mesmo irregular, desses produtos fora de um regime de suspensão;

c)      Toda e qualquer importação, mesmo irregular, desses produtos quando estes não se encontrem em regime de suspensão.»

8        O artigo 15.°, n.° 4, da Directiva 92/12 enuncia:

«[…] [A] responsabilidade do depositário autorizado expedidor e, eventualmente, do transportador só poderá ser libertada quando se provar que o destinatário assumiu a responsabilidade dos produtos, nomeadamente através do documento de acompanhamento referido no artigo 18.°, nas condições fixadas no artigo 19.°»

9        O artigo 18.° da Directiva 92/12 prevê:

«1.      Não obstante a eventual utilização de processos informatizados, todos os produtos sujeitos a impostos especiais de consumo que circulem em regime de suspensão entre os Estados‑Membros [...] devem ser acompanhados de um documento emitido pelo expedidor. Este documento pode ser um documento administrativo ou um documento comercial. A forma e o conteúdo deste documento, bem como o processo a seguir quando[...] de forma objectiva se considerar inadequada a sua utilização, serão definidos de acordo com o processo previsto no artigo 24.° da presente directiva.

[…]

4.      O n.° 1 não é aplicável quando os produtos sujeitos ao imposto especial de consumo circularem nas condições referidas no n.° 2 do artigo 5.°

[…]»

10      O artigo 19.° da Directiva 92/12 dispõe:

«1.      As autoridades fiscais dos Estados‑Membros serão informadas pelos operadores das remessas expedidas e recebidas por meio do documento ou de uma referência ao documento referido no artigo 18.° Este documento será emitido em quatro exemplares […]

[…]

O Estado‑Membro de destino poderá estipular que o exemplar destinado a reenvio ao expedidor, para apuramento, seja autenticado ou visado pelas autoridades nacionais competentes. Os Estados‑Membros que aplicarem esta disposição deverão informar a Comissão, que, por sua vez, informará os restantes Estados‑Membros.

[…]

2.      Sempre que os produtos sujeitos a impostos especiais de consumo circulem em regime de suspensão, com destino a um depositário autorizado ou a um operador registado ou não registado, o destinatário deve enviar ao expedidor, para efeitos de apuramento, o mais tardar até ao dia 15 do mês seguinte ao da recepção, um exemplar do documento administrativo de acompanhamento ou uma cópia do documento comercial devidamente anotada.

[…]

3.      O regime de suspensão, tal como definido na alínea c) do artigo 4.°, é apurado pela colocação dos produtos sujeitos a impostos especiais de consumo numa das situações referidas no n.° 2 do artigo 5.°, e em conformidade com esse número, após recepção pelo expedidor do exemplar de reenvio do documento administrativo de acompanhamento ou de uma cópia do documento comercial devidamente anotados no que se refere a essa colocação.

[…]»

 Código Aduaneiro Comunitário

11      O Código Aduaneiro Comunitário prevê, no seu artigo 59.°, n.° 1, que qualquer mercadoria destinada a ser sujeita a um regime aduaneiro deve ser objecto de uma declaração para esse regime aduaneiro.

12      O artigo 64.°, n.° 1, do mesmo diploma dispõe:

«Sob ressalva do disposto no artigo 5.°, a declaração aduaneira pode ser feita por qualquer pessoa habilitada para apresentar ou mandar apresentar ao serviço aduaneiro competente a mercadoria em causa, bem como qualquer documento cuja apresentação seja necessária para permitir a aplicação dos regimes aduaneiros para que a mercadoria foi declarada.»

13      Nos termos do artigo 84.°, n.° 1, do Código Aduaneiro Comunitário:

«Para efeitos dos artigos 85.° a 90.°:

a)      Quando é utilizada a expressão ‘regime suspensivo’, deverá entender‑se que se aplica, no caso das mercadorias não comunitárias, aos regimes seguintes:

[…]

–        aperfeiçoamento activo, sob a forma de sistema suspensivo,

[…]

b)      Quando é utilizada a expressão ‘regime aduaneiro económico’, deverá entender‑se que se aplica aos seguintes regimes:

[…]

–        aperfeiçoamento activo,

[…]»

14      O artigo 85.° do Código Aduaneiro Comunitário prevê que o recurso a qualquer regime aduaneiro económico fica subordinado à emissão de uma autorização pelas autoridades aduaneiras. O artigo 86.° do mesmo código precisa da seguinte forma as condições em que essa autorização pode ser emitida:

«Sem prejuízo das condições específicas, previstas no âmbito do regime em causa, a autorização referida no artigo 85.° [...] só será concedida:

–        às pessoas que ofereçam todas as garantias necessárias à boa execução das operações

         e

–        se as autoridades aduaneiras puderem assegurar a fiscalização e o controlo do regime sem que, para tal, tenham de criar um dispositivo administrativo desproporcionado em relação às necessidades económicas em causa.»

15      O artigo 87.° do Código Aduaneiro Comunitário enuncia:

«1.      As condições para a utilização do regime em causa serão fixadas na autorização.

2.      O titular da autorização deve informar as autoridades aduaneiras de todos os elementos surgidos após a emissão dessa autorização, susceptíveis de terem incidência na sua manutenção ou no seu conteúdo.»

16      O artigo 88.° do mesmo código prevê:

«As autoridades aduaneiras podem subordinar a sujeição das mercadorias sujeitas a um regime suspensivo à constituição de uma garantia, destinada a assegurar o pagamento da dívida aduaneira susceptível de se constituir relativamente a estas mercadorias.

[…]»

17      Nos termos do artigo 114.° do mesmo diploma:

«1.      Sem prejuízo do disposto no artigo 115.°, o regime do aperfeiçoamento activo permite a utilização no território aduaneiro da Comunidade, em uma ou mais operações de aperfeiçoamento:

a)      Das mercadorias não comunitárias destinadas à reexportação do território aduaneiro da Comunidade sob a forma de produtos compensadores, sem que tais mercadorias sejam sujeitas a direitos de importação nem a medidas de política comercial;

[…]

2.      Entende‑se por:

a)      Sistema suspensivo: o regime de aperfeiçoamento activo na forma prevista na alínea a) do n.° 1;

[…]

c)      Operações de aperfeiçoamento:

[…]

–        a transformação de mercadorias,

[…]

d)      Produtos compensadores: todos os produtos resultantes de operações de aperfeiçoamento;

[…]»

 Direito nacional

18      O § 18, n.° 3, da Lei relativa ao imposto sobre o tabaco (Tabaksteuergesetz, Bundesgesetzblatt, 1992 I, p. 2150) prevê que, quando tenham sido expedidos tabacos manufacturados ao abrigo do trânsito interno comunitário de um entreposto fiscal situado no território fiscal para um entreposto fiscal, destinatário autorizado ou estância aduaneira de saída noutro Estado‑Membro e o expedidor não apresentar a prova, dentro de um prazo de quatro meses a contar do início da expedição, de que os tabacos manufacturados chegaram ao local de destino, estes consideram‑se subtraídos ao regime de suspensão no território fiscal.

19      O § 21, primeiro parágrafo, ponto 1, desta lei dispõe que, para os tabacos manufacturados colocados em regime aduaneiro, as disposições aduaneiras aplicam‑se por analogia à constituição e à extinção do imposto.

20      O § 23, n.° 2, do Regulamento de aplicação da referida lei (Verordnung zur Duchführung des Tabaksteuergesetzes, Bundesgesetzblatt 1993 I, p. 1738) especifica que o § 21 acima mencionado não é aplicável ao regime suspensivo de aperfeiçoamento activo para a produção de tabacos manufacturados.

 Processo principal e questões prejudiciais

21      A BAT importa para a Alemanha, no âmbito do regime de aperfeiçoamento activo sob a forma de sistema suspensivo, tabaco em bruto proveniente de países terceiros, que transforma em tabaco cortado.

22      A BAT beneficiou, a partir de 1 de Julho de 2002, para este tabaco em bruto, produto não sujeito a imposto especial de consumo, de uma autorização única para efeitos de admissão no regime do aperfeiçoamento activo sob a forma de sistema suspensivo, válido para todos os Estados‑Membros, concedida pelas autoridades aduaneiras do Reino Unido. Esta autorização permite‑lhe, para as expedições de lotes de tabaco cortado da Alemanha para outros Estados‑Membros, utilizar guias de remessa («IPR‑Delivery Document») em substituição do documento de acompanhamento exigido em princípio por aplicação do artigo 18.°, n.° 1, da Directiva 92/12, no âmbito da circulação entre Estados‑Membros, em regime de suspensão, dos produtos sujeitos a imposto especial.

23      Durante os meses de Janeiro e Abril de 2003, a BAT expediu da sua fábrica na Alemanha lotes de tabaco cortado com destino a um entreposto fiscal de uma sociedade estabelecida em França. Esta certificou a recepção das guias de remessa acima referidas, as quais indicavam que tinham sido também utilizadas como documentos de acompanhamento.

24      Por decisões de 27 de Maio e 20 de Agosto de 2003, a Administração alemã exigiu à BAT o pagamento dos impostos especiais de consumo sobre estes lotes de tabaco, no montante global de 144 550 euros, uma vez que esta empresa, ao não ter apresentado o documento de acompanhamento certificado pelas autoridades aduaneiras francesas, não demonstrara que os ditos lotes tinham chegado ao entreposto fiscal em França.

25      Em face do indeferimento das suas reclamações, a BAT recorreu destas decisões para o Finanzgericht München (Tribunal Tributário de Munique).

26      O órgão jurisdicional de reenvio entende que a resolução do litígio que lhe foi submetido implica antes de mais verificar se os produtos em causa circulam nas condições previstas no artigo 5.°, n.° 2, primeiro parágrafo, primeiro travessão, da Directiva 92/12, uma vez que, nessa hipótese, o artigo 18.°, n.° 4, desta directiva permite, por derrogação, a circulação entre os Estados‑Membros sem documento de acompanhamento. O órgão jurisdicional de reenvio pergunta concretamente se produtos sujeitos a imposto especial de consumo como os que estão em causa no processo principal, fabricados num Estado‑Membro ao abrigo do regime de aperfeiçoamento activo a partir de produtos que não estavam sujeitos a imposto especial de consumo no momento da importação na Comunidade ao abrigo do dito regime aduaneiro, podem ser considerados produtos sujeitos a imposto especial de consumo provenientes de países terceiros na acepção do artigo 5.°, n.° 2, primeiro parágrafo, primeiro travessão, da Directiva 92/12.

27      O órgão jurisdicional de reenvio pergunta‑se também se, caso o Tribunal de Justiça entenda não estarem preenchidas as condições previstas no artigo 5.°, n.° 2, primeiro parágrafo, primeiro travessão, da Directiva 92/12, o artigo 15.°, n.° 4, desta directiva deve ser interpretado no sentido de que admite a prova de que o destinatário assumiu a responsabilidade dos produtos sujeitos a imposto especial de consumo através de um documento diferente do documento de acompanhamento.

28      Neste contexto, o Finanzgericht München decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões:

«1)      O artigo 5.°, n.° 2, primeiro parágrafo, primeiro travessão, da Directiva 92/12[...] deve ser interpretado no sentido de que [produtos] não comunitári[o]s sujeit[o]s a imposto especial de consumo que se encontram sob o regime de aperfeiçoamento activo, nos termos do artigo 84.°, n.° 1, alínea a), do [Código Aduaneiro Comunitário], também se consideram em regime suspensivo quando só são produzid[o]s a partir de [produtos] não sujeit[o]s ao imposto especial de consumo mediante operações de aperfeiçoamento activo após a respectiva importação, pelo que, em conformidade com o décimo quinto considerando da Directiva 92/12[...], não é necessário utilizar para a sua circulação o documento de acompanhamento nos termos do artigo 18.°, n.° 1, da Directiva 92/12[...]?

2)      No caso de a primeira questão dever ser respondida negativamente, [o] artigo 15.°, n.° 4, da Directiva 92/12[...] deve ser interpretado no sentido de que a prova de que o destinatário assumiu a responsabilidade dos produtos sujeitos ao imposto especial de consumo pode ser feita por meio diferente da apresentação do documento de acompanhamento referido no artigo 18.° da Directiva 92/12[…]?»

 Quanto às questões prejudiciais

 Quanto à primeira questão

29      Com a primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se o artigo 5.°, n.° 2, primeiro parágrafo, primeiro travessão, da Directiva 92/12 deve ser interpretado no sentido de que os produtos sujeitos a imposto especial de consumo (como o tabaco manufacturado), fabricados a partir de produtos não sujeitos a imposto (como o tabaco em bruto) importados na Comunidade no regime de aperfeiçoamento activo, se consideram em regime de suspensão de imposto especial de consumo na acepção desta disposição, porquanto só se tornaram produtos sujeitos ao imposto especial de consumo pela sua transformação no território da Comunidade, de modo que podem circular entre os Estados‑Membros sem que a Administração possa exigir o documento administrativo ou comercial previsto no artigo 18.°, n.° 1, da Directiva 92/12.

30      Importa lembrar que o artigo 18.°, n.° 1, da Directiva 92/12 prevê que todos os produtos sujeitos a impostos especiais de consumo que circulem em regime de suspensão entre os Estados‑Membros devem ser acompanhados de um documento de acompanhamento.

31      Contudo, o n.° 4 deste artigo afasta essa obrigação quando o produto circula nas condições referidas no artigo 5.°, n.° 2, primeiro parágrafo, primeiro travessão, da mesma directiva.

32      O artigo 5.°, n.° 2, primeiro parágrafo, primeiro travessão, da Directiva 92/12 visa designadamente o caso em que os produtos sujeitos a imposto especial de consumo provêm ou se destinam a países terceiros e se encontram ao abrigo de um dos regimes suspensivos referidos no n.° 1, alínea a), do artigo 84.° do Código Aduaneiro Comunitário. Nesta hipótese, o dito artigo 5.°, n.° 2, primeiro parágrafo, primeiro travessão, especifica que esses produtos se consideram em regime de suspensão do imposto especial de consumo.

33      No processo principal, não suscita discussão, por um lado, que os produtos em causa no processo principal sejam os tabacos manufacturados sujeitos a imposto especial de consumo por aplicação do artigo 3.° da Directiva 92/12 e, por outro, que estes circulam ao abrigo do regime de aperfeiçoamento activo sob a forma de sistema suspensivo previsto no n.° 1, alínea a), terceiro travessão, do artigo 84.° do Código Aduaneiro Comunitário.

34      Ao invés, a primeira questão submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio implica apreciar se produtos como os que estão em causa no processo principal devem ser considerados produtos sujeitos ao imposto especial de consumo provenientes ou com destino a um país terceiro na acepção do artigo 5.°, n.° 2, primeiro parágrafo, primeiro travessão, da Directiva 92/12, apesar de só terem entrado na categoria de produtos sujeitos a imposto especial de consumo em razão da sua transformação num Estado‑Membro.

35      A este propósito, importa lembrar que resulta de jurisprudência assente que, na interpretação de uma disposição de direito comunitário, há que atender não apenas aos respectivos termos mas também ao seu contexto e aos objectivos prosseguidos pela regulamentação em que está integrada (v., designadamente, acórdão de 29 de Janeiro de 2009, Petrosian e o., C‑19/08, Colect., p. I‑495, n.° 34).

36      No caso, a redacção do artigo 5.°, n.° 2, primeiro parágrafo, primeiro travessão, da Directiva 92/12 não dá indicação útil para responder à questão submetida, de modo que se deve interpretar esta disposição atendendo ao seu contexto e aos objectivos prosseguidos pela directiva, mais exactamente pelo seu artigo 18.°, n.° 4, que, quando estão preenchidas as condições enunciadas no referido artigo 5.°, n.° 2, primeiro parágrafo, primeiro travessão, afasta a obrigação relativa ao documento de acompanhamento.

37      A este propósito, importa realçar que o décimo considerando da Directiva 92/12 precisa que, se esta tem como objectivo evitar que a passagem de um produto de um Estado‑Membro para outro possa originar controlos susceptíveis de criar obstáculos à livre circulação intracomunitária, as restrições inerentes à exigibilidade impõem, contudo, o conhecimento dos movimentos dos produtos sujeitos a impostos especiais de consumo e justificam a exigência de um documento de acompanhamento para esses produtos. O décimo quinto considerando enuncia, entretanto, que tal exigência não se justifica quando esses produtos circulam ao abrigo de um regime aduaneiro comunitário como o regime de aperfeiçoamento activo, sob a forma de sistema da suspensão.

38      A Directiva 92/12 pretende assim limitar a exigência relativa ao documento de acompanhamento tão‑só às hipóteses em que essa formalidade é realmente necessária para assegurar o controlo dos movimentos dos produtos sujeitos a imposto especial de consumo e o cumprimento das regras de exigibilidade deste.

39      Daqui resulta que a Directiva 92/12, através da remissão operada pelo seu artigo 18.°, n.° 4, para as disposições do artigo 5.°, n.° 2, primeiro parágrafo, primeiro travessão, exonerou o expedidor da exigência relativa ao documento de acompanhamento no caso de os produtos sujeitos a imposto especial de consumo se encontrarem ao abrigo de um regime aduaneiro comunitário, desde que esse regime, atendendo às regras que lhe são próprias, permita assegurar um controlo do movimento dos produtos em causa equivalente ao que permite um documento de acompanhamento, de molde a garantir o cumprimento das regras relativas à cobrança do imposto especial de consumo.

40      Nestas condições, a fim de determinar se produtos como os que estão em causa no processo principal entram no âmbito de aplicação do artigo 5.°, n.° 2, primeiro parágrafo, primeiro travessão, da Directiva 92/12 e podem, assim, circular sem um documento de acompanhamento específico para os produtos sujeitos a imposto especial de consumo, há que verificar se o regime jurídico aplicável a produtos de origem não comunitária, não sujeitos a esse imposto, importados na Comunidade ao abrigo do regime de aperfeiçoamento activo sob a forma de sistema suspensivo, assegura, no que toca à sua circulação, um controlo equivalente ao que resulta da exigência relativa ao documento de acompanhamento, no caso de a operação de aperfeiçoamento que sofreram no território da Comunidade os inserir na categoria de produtos sujeitos a imposto especial de consumo.

41      A este respeito, importa salientar que as obrigações relativas ao regime de aperfeiçoamento activo sob a forma de sistema suspensivo, destinadas a assegurar o controlo de produtos sujeitos a este regime aduaneiro, se aplicam do mesmo modo quer os produtos em causas estivessem já, no momento da sua importação na Comunidade a coberto desse regime, sujeitos a imposto especial de consumo quer só tenham entrado no âmbito desse imposto após o seu fabrico na Comunidade a partir de produtos que a ele não estavam sujeitos, importados na União Europeia ao abrigo do dito regime.

42      É assim em especial no caso das obrigações previstas nos artigos 59.° e 64.° do Código Aduaneiro Comunitário, que exigem uma declaração para efeitos da colocação das mercadorias num regime aduaneiro, cuja aceitação desencadeia o controlo aduaneiro.

43      O mesmo acontece no caso das obrigações previstas nos artigos 85.° a 88.° do mesmo código, que exigem uma autorização para o recurso a um regime aduaneiro económico e que permitem às autoridades competentes estabelecer nessa autorização todos os requisitos pertinentes para a aplicação correcta desse regime, designadamente no que toca à «boa execução das operações», à fiscalização e ao controlo do referido regime e à constituição de garantias.

44      Por conseguinte, há que considerar que o artigo 5.°, n.° 2, primeiro parágrafo, primeiro travessão, da Directiva 92/12 se aplica não só a produtos sujeitos ao imposto especial de consumo provenientes de países terceiros mas também a produtos como os que estão em causa no processo principal, fabricados a partir de produtos não comunitários, não sujeitos ao imposto especial de consumo e importados na Comunidade no âmbito do regime de aperfeiçoamento activo sob a forma de sistema suspensivo.

45      Nestas condições, não há que determinar se esses produtos devem também ser considerados produtos destinados a países terceiros na acepção do artigo 5.°, n.° 2, primeiro parágrafo, primeiro travessão, da Directiva 92/12.

46      Tendo em conta o que precede, cumpre responder à primeira questão submetida que o artigo 5.°, n.° 2, primeiro parágrafo, primeiro travessão, da Directiva 92/12 deve ser interpretado no sentido de que produtos sujeitos ao imposto especial de consumo (como o tabaco manufacturado), fabricados a partir de produtos não sujeitos a esse imposto (como o tabaco em bruto) importados na Comunidade no regime de aperfeiçoamento activo, se consideram em regime de suspensão do imposto especial de consumo na acepção desta disposição, porquanto só se tornaram produtos sujeitos ao imposto especial de consumo pela sua transformação no território da Comunidade, de modo que podem circular entre Estados‑Membros sem que a Administração possa exigir o documento administrativo ou comercial previsto no artigo 18.°, n.° 1, desta directiva.

 Quanto à segunda questão

47      Em face da resposta dada à primeira questão, não cabe responder à segunda questão submetida.

 Quanto às despesas

48      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quarta Secção) declara:

O artigo 5.°, n.° 2, primeiro parágrafo, primeiro travessão, da Directiva 92/12/CEE do Conselho, de 25 de Fevereiro de 1992, relativa ao regime geral, à detenção, à circulação e aos controlos dos produtos sujeitos a impostos especiais de consumo, deve ser interpretado no sentido de que produtos sujeitos a imposto especial de consumo (como o tabaco manufacturado), fabricados a partir de produtos não sujeitos a esse imposto (como o tabaco em bruto) importados na Comunidade no regime de aperfeiçoamento activo, se consideram em regime de suspensão do imposto especial de consumo na acepção desta disposição, porquanto só se tornaram produtos sujeitos ao imposto especial de consumo pela sua transformação no território da Comunidade, de modo que podem circular entre Estados‑Membros sem que a Administração possa exigir o documento administrativo ou comercial previsto no artigo 18.°, n.° 1, desta directiva.

Assinaturas


* Língua do processo: alemão.