Language of document : ECLI:EU:C:2013:423

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)

25 de junho de 2013 (*)

«Incumprimento de Estado ― Diretiva 2003/41/CE ― Atividade e supervisão das instituições de realização de planos de pensões profissionais ― Não transposição parcial no prazo fixado ― Acórdão do Tribunal de Justiça que declara a existência de um incumprimento ― Não execução ― Artigo 260.°, n.° 2, TFUE ― Sanções pecuniárias ― Quantia fixa»

No processo C‑241/11,

que tem por objeto uma ação por incumprimento nos termos do artigo 260.°, n.° 2, TFUE, entrada em 19 de maio de 2011,

Comissão Europeia, representada por Z. Malůšková, N. Yerrell e K.‑P. Wojcik, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

demandante,

contra

República Checa, representada por M. Smolek e J. Očková, na qualidade de agentes,

demandada,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção),

composto por: V. Skouris, presidente, K. Lenaerts, vice‑presidente, R. Silva de Lapuerta, M. Ilešič, L. Bay Larsen, A. Rosas, G. Arestis, J. Malenovský e E. Jarašiūnas, presidentes de secção, E. Juhász, A. Borg Barthet, A. Ó Caoimh (relator), C. G. Fernlund, J. L. da Cruz Vilaça e C. Vajda, juízes,

advogado‑geral: N. Jääskinen,

secretário: M. Aleksejev, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 11 de dezembro de 2012,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 21 de março de 2013,

profere o presente

Acórdão

1        Com a sua petição, a Comissão Europeia pede ao Tribunal de Justiça que:

¾        declare que, não tendo tomado as medidas legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para se conformar com os artigos 8.°, 9.°, 13.°, 15.° a 18.° e 20.°, n.os 2 a 4, da Diretiva 2003/41/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 3 de junho de 2003, relativa às atividades e à supervisão das instituições de realização de planos de pensões profissionais (JO L 235, p. 10), e não tendo cumprido as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 22.°, n.° 1, desta diretiva, a República Checa não adotou as medidas necessárias à execução do acórdão de 14 de janeiro de 2010, Comissão/República Checa (C‑343/08, Colet., p. I‑275), e não cumpriu assim as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 260.° TFUE;

¾        condene a República Checa a pagar‑lhe, por depósito na conta «Recursos próprios da União Europeia», uma sanção pecuniária compulsória no montante de 22 364,16 euros por cada dia de atraso na adoção das medidas necessárias à execução do acórdão Comissão/República Checa, já referido, a partir da data da prolação do acórdão a proferir no presente processo e até à data da adoção das medidas necessárias à execução do acórdão Comissão/República Checa, já referido;

¾        condene a República Checa a pagar‑lhe, por depósito na referida conta, uma quantia fixa no montante de 5 644,80 euros por cada dia de atraso na adoção das medidas necessárias à execução do acórdão Comissão/República Checa, já referido, a partir da data da prolação daquele acórdão, em 14 de janeiro de 2010, até à data da prolação do acórdão no presente processo ou até à data da adoção das medidas necessárias, relativamente à República Checa, à execução do referido acórdão se essa data for anterior à data da prolação do acórdão no presente processo; e

¾        condene a República Checa nas despesas.

 Quadro jurídico

2        Os considerandos 1, 6, 8 e 9 da Diretiva 2003/41, que foi adotada com base nos artigos 47.°, n.° 2, CE, 55.° CE e 95.°, n.° 1, CE, dispõem:

«(1)      Um verdadeiro mercado interno dos serviços financeiros é fundamental para o crescimento económico e a criação de emprego na Comunidade.

[...]

(6)      A presente diretiva representa assim um primeiro passo na direção de um mercado interno de realização dos planos de pensões profissionais organizado à escala europeia. Ao definir‑se o princípio do ‘gestor prudente’ como princípio subjacente para o investimento de capitais e ao permitir que as instituições exerçam atividades transfronteiriças, encoraja‑se a reorientação da poupança para o setor de realização dos planos de pensões profissionais, contribuindo‑se assim para o progresso económico e social.

[...]

(8)      As instituições que sejam completamente distintas de qualquer empresa contribuinte e que operem em regime de capitalização, tendo por única finalidade assegurar prestações a título de reforma, deverão beneficiar da liberdade de prestação de serviços e da liberdade de investimento, subordinando‑se unicamente a requisitos prudenciais coordenados, independentemente de terem ou não personalidade jurídica.

(9)      Segundo o princípio [da] subsidiariedade, os Estados‑Membros deverão continuar a ser plenamente responsáveis pela organização dos seus sistemas de reformas e pela tomada de decisões quanto ao papel a desempenhar por cada um dos três ‘pilares’ do sistema de reformas nos diversos Estados‑Membros. Deverão também, no contexto do segundo pilar, ser plenamente responsáveis pelo papel e pelas funções a desempenhar pelas diferentes instituições de realização de planos de pensões profissionais, tais como os fundos de pensões por setor de atividade, os fundos de pensões empresariais e as empresas de seguros de vida. A presente diretiva não pretende pôr em causa essa prerrogativa.»

3        O artigo 8.° da referida diretiva prevê que cada Estado‑Membro deve assegurar a separação jurídica entre a empresa contribuinte e a instituição de realização de planos de pensões profissionais, a fim de garantir que, em caso de falência da empresa contribuinte, os ativos da instituição sejam salvaguardados no interesse dos membros e dos beneficiários.

4        O artigo 9.° da mesma diretiva dispõe, no seu n.° 1, que os Estados‑Membros devem assegurar que cada instituição de realização de planos de pensões profissionais situada no seu território respeite certas condições de funcionamento e, nomeadamente, que seja inscrita pela autoridade de supervisão competente num registo nacional ou esteja autorizada, que seja dirigida por pessoas idóneas que possuam as habilitações e a experiência profissionais adequadas ou recorram a assessores com as devidas habilitações e experiência profissionais e que sejam sujeitas a regras adequadas. O n.° 5 deste artigo prevê que, em caso de atividade transfronteiriça, as condições de funcionamento das instituições de realização de planos de pensões profissionais devem ser sujeitas a autorização prévia da autoridade competente do Estado‑Membro de origem.

5        Nos termos do artigo 13.° da Diretiva 2003/41, cada Estado‑Membro deve assegurar que as autoridades competentes disponham dos poderes e dos meios necessários para garantir a supervisão das atividades das instituições de realização de planos de pensões profissionais estabelecidas no seu território.

6        Os artigos 15.° a 18.° desta diretiva preveem, respetivamente, que os Estados‑Membros de origem devem certificar‑se de que as instituições de realização de planos de pensões profissionais constituem provisões técnicas para os diferentes planos de pensões, dispõem de ativos suficientes para a cobertura dessas provisões e de ativos adicionais para servir de proteção e investem os seus ativos em conformidade com o princípio do gestor prudente.

7        O artigo 20.°, n.os 2 a 4, da referida diretiva enuncia as regras em matéria de controlo das atividades transfronteiriças das instituições de realização de planos de pensões profissionais a observar pelos Estados‑Membros de origem.

8        O artigo 22.°, n.° 1, primeiro parágrafo, da Diretiva 2003/41 dispõe:

«Os Estados‑Membros devem pôr em vigor as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento à presente diretiva antes de 23 de setembro de 2005 e informar imediatamente a Comissão desse facto.»

 Acórdão Comissão/República Checa

9        Em 23 de julho de 2008, a Comissão decidiu‑se pela propositura, nos termos do artigo 226.° CE, de uma ação por incumprimento contra a República Checa, para que se declarasse que, não tendo transposto totalmente para a sua ordem jurídica interna a Diretiva 2003/41, designadamente pela não transposição dos seus artigos 8.°, 9.°, 13.°, 15.° a 18.° e 20.°, n.os 2 a 4, esse Estado‑Membro não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força da referida diretiva, designadamente do seu artigo 22.°, n.° 1.

10      O Tribunal de Justiça julgou procedente a ação da Comissão, declarando no n.° 1 do dispositivo do acórdão Comissão/República Checa, já referido, que, não tendo adotado, no prazo fixado, as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para se conformar com os referidos artigos da Diretiva 2003/41, a República Checa não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 22.°, n.° 1, desta diretiva.

 Procedimento pré‑contencioso

11      Por carta de 19 de fevereiro de 2010, a Comissão convidou a República Checa a comunicar‑lhe as medidas e o calendário exato que esse Estado‑Membro pretendia adotar para dar cumprimento ao acórdão Comissão/República Checa, já referido.

12      Por carta de 3 de fevereiro de 2010, registada em 24 de fevereiro do mesmo ano, a República Checa informou a Comissão de que, atendendo à situação política interna desse Estado‑Membro, designadamente a realização de eleições legislativas em 28 e 29 de maio de 2010, o prazo mais realista para o cumprimento das alterações necessárias para a transposição completa da Diretiva 2003/41 era de dois anos a contar da data da referida carta.

13      Por carta de 23 de março de 2010, a República Checa enviou à Comissão um calendário indicativo que mencionava as etapas da adoção de medidas de execução do acórdão Comissão/República Checa, já referido, do qual decorria que essas medidas seriam adotadas o mais tardar durante o mês de junho de 2012.

14      Por carta de 17 de junho de 2010, a República Checa informou a Comissão de que tinha preparado um documento de trabalho relativo à transposição da Diretiva 2003/41, que deveria ser examinado pelo governo em 31 de maio de 2010. Todavia, tendo em conta a realização de eleições legislativas, a decisão relativa ao modo de transposição desta diretiva devia, segundo esse Estado‑Membro, ser confiada ao novo governo saído dessas eleições, provavelmente no outono de 2010.

15      Por carta de 27 de setembro de 2010, a República Checa indicou que seria brevemente comunicado à Comissão um calendário exato das modalidades de transposição da referida diretiva.

16      Por carta de 1 de outubro de 2010, esse Estado‑Membro informou a Comissão de que um documento de trabalho preparado pelo Ministério das Finanças, relativo à transposição da Diretiva 2003/41 e análogo ao que deveria ter sido examinado em 31 de maio de 2010, seria submetido ao novo governo nas próximas semanas.

17      Em 29 de outubro de 2010, a Comissão enviou à República Checa uma notificação para cumprir em que indicava a esse Estado‑Membro que o mesmo ainda não tinha cumprido as obrigações que lhe incumbiam por força do acórdão Comissão/República Checa, já referido. A pedido do referido Estado‑Membro, o prazo concedido para responder à notificação para cumprir foi prorrogado até 28 de janeiro de 2011.

18      Por carta de 25 de janeiro de 2011, a República Checa informou a Comissão de que o projeto de lei preparado para a execução do referido acórdão seria submetido ao governo, após consulta das Administrações centrais competentes, no decorrer do primeiro trimestre de 2011. Esse Estado‑Membro previa que esse projeto seria submetido ao Parlamento nacional durante o mês de abril de 2011 e previa a entrada em vigor da lei no decurso do terceiro trimestre desse mesmo ano.

19      Não tendo sido informada da adoção das disposições necessárias para que o referido Estado‑Membro desse cumprimento ao acórdão Comissão/República Checa, já referido, a Comissão decidiu intentar a presente ação.

 Desenvolvimentos no decurso do presente processo

20      Em 2 de setembro de 2011, a República Checa informou a Comissão da publicação e da entrada em vigor, em 31 de agosto de 2011, da Lei n.° 260/2011, que assegurava, segundo esse Estado‑Membro, a execução integral do acórdão Comissão/República Checa, já referido, ao completar a Lei n.° 340/2006, de 24 de maio de 2006, relativa às atividades das instituições de realização de planos de pensões profissionais dos Estados‑Membros da União Europeia e dos outros Estados partes no Acordo sobre o Espaço Económico Europeu no território da Republica Checa e que altera a Lei n.° 48/1997, relativa ao seguro de doença público, que altera e completa várias leis conexas, que tinha procedido à transposição parcial da Diretiva 2003/41 para a ordem jurídica checa antes desse acórdão.

21      Após examinar o conteúdo da Lei n.° 260/2011, a Comissão considerou, na sua réplica, que a República Checa tornou a sua legislação conforme com o referido acórdão.

22      Por conseguinte, a Comissão já não pede a fixação de uma sanção pecuniária compulsória. Todavia, mantém o seu pedido de condenação da República Checa no pagamento de uma quantia fixa.

 Quanto ao incumprimento

23      Uma vez que o Tratado FUE suprimiu do processo por incumprimento nos termos do artigo 260.°, n.° 2, TFUE a etapa relativa à formulação de um parecer fundamentado, deve considerar‑se como data de referência para apreciar a existência de um incumprimento nos termos do artigo 260.° TFUE a data de expiração do prazo fixado na notificação para cumprir emitida ao abrigo do n.° 2, primeiro parágrafo, dessa disposição (v. acórdãos de 11 de dezembro de 2012, Comissão/Espanha, C‑610/10, n.° 67, e de 19 de dezembro de 2012, Comissão/Irlanda, C‑279/11, n.° 19).

24      No presente caso, como a República Checa admitiu, as medidas legislativas necessárias para assegurar a execução do acórdão Comissão/República Checa, já referido, só foram tomadas com a adoção da Lei n.° 260/2011, publicada e entrada em vigor em 31 de agosto de 2011, ou seja, depois do prazo fixado para tal na notificação para cumprir de 29 de outubro de 2010, que expirava em 28 de janeiro de 2011.

25      Nestas condições, há que declarar que, não tendo tomado, à data de expiração do prazo fixado na notificação para cumprir enviada à República Checa pela Comissão, em aplicação do artigo 260.°, n.° 2, TFUE, todas as medidas necessárias à execução do acórdão Comissão/República Checa, já referido, a República Checa não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 260.°, n.° 1, TFUE.

 Quanto à quantia fixa

 Argumentos das partes

26      A Comissão alega que o montante da quantia fixa pedida, a saber, 5 644,80 euros por cada dia de infração, foi definido em conformidade com os critérios previstos na Comunicação de 13 de dezembro de 2005 relativa à aplicação do artigo 228.° CE [SEC(2005) 1658], conforme atualizada pela Comunicação da Comissão relativa à aplicação do artigo 260.° TFUE e à atualização dos dados utilizados para o cálculo das quantias fixas e das sanções pecuniárias compulsórias que a Comissão proporá ao Tribunal de Justiça no âmbito de procedimentos de infração [SEC(2010) 923] (a seguir «comunicação de 2005»), e que se tornou aplicável aos procedimentos regulados pelo artigo 260.°, n.° 2, TFUE, por força da Comunicação da Comissão relativa à aplicação do artigo 260.°, n.° 3, TFUE (JO 2011, C 12, p. 1). Esse montante resulta da multiplicação de um montante fixo de base de 210 euros por dia pelo coeficiente de gravidade da infração fixado em 8 (numa escala de 1 a 20) e por um fator «n», que representa a capacidade de pagamento da República Checa, avaliado em 3,36. Uma vez que o montante total assim obtido, a saber, segundo a Comissão, de 3 364 891,20 euros para 594 dias de infração, é superior à quantia fixa mínima definida para a República Checa pela comunicação de 2005, é esta quantia fixa determinada com base no montante diário que deve ser paga por esse Estado‑Membro.

27      A Comissão considera que o coeficiente de gravidade seguido é adequado, uma vez que as normas em questão são essenciais para a prestação de serviços transfronteiriços pelas instituições de realização de planos de pensões profissionais e que, não tendo sido completamente transpostas para a ordem jurídica nacional, não foram criados os requisitos de funcionamento do mercado interno de realização dos planos de pensões profissionais, de que a Diretiva 2003/41 constitui a primeira etapa.

28      A Comissão contesta que a não transposição das disposições em questão não tenha tido praticamente nenhuma consequência devido à inexistência de um segundo pilar do sistema de pensões do referido Estado‑Membro. Na verdade, a Diretiva 2003/41 não prevê nenhuma regra que obrigue os Estados‑Membros a permitir que instituições de realização de planos de pensões profissionais se estabeleçam no seu território. Todavia, não tendo transposto as disposições pertinentes desta diretiva, a República Checa não teve o cuidado de se preparar para uma possível mudança da situação resultante de uma eventual decisão de completar o seu sistema nacional com um regime de planos de pensões profissionais.

29      A Comissão considera ainda que a definição dos requisitos técnicos necessários para o funcionamento de instituições de realização de planos de pensões profissionais é alheia, quanto ao mérito, ao debate sobre a criação de um segundo pilar.

30      Além disso, segundo a Comissão, o facto de a Diretiva 2003/41 ter sido parcialmente transposta não é pertinente. Com efeito, não seria possível deduzir dessa transposição parcial as condições de funcionamento das instituições de realização de planos de pensão profissionais submetidas ao controlo dos órgãos checos nem as normas prudenciais aplicáveis a essas instituições.

31      Por último, a Comissão recorda que a transposição da Diretiva 2003/41 constitui uma obrigação cuja execução não é deixada à discricionariedade dos Estados‑Membros. Além disso, as normas em questão da referida diretiva encontravam‑se claramente formuladas e não deixavam nenhuma margem de interpretação aos Estados‑Membros. De igual modo, o acórdão Comissão/República Checa, já referido, estava claramente formulado e não suscitava nenhuma dificuldade quanto às modalidades da sua execução.

32      A República Checa considera, por seu turno, que não devia ser condenada no pagamento de uma quantia fixa ou que esta devia ser reduzida. A gravidade do incumprimento declarado no acórdão Comissão/República Checa, já referido, era, com efeito, extremamente insignificante, se não inexistente.

33      Em primeiro lugar, esse Estado‑Membro alega que a apreciação da gravidade do incumprimento feita pela Comissão se baseia num postulado de base errado, visto que confunde esta questão com a da violação do direito da União. Este erro afetou a referida apreciação na medida em que a Comissão não teve em conta o facto de a Diretiva 2003/41 ter sido adotada sem que fosse tida em consideração a circunstância de que, em alguns dos Estados que iam aderir à União Europeia, ainda não tinha sido introduzido um segundo pilar no sistema de pensões, de modo que a referida diretiva podia entrar em conflito com as competências garantidas aos Estados‑Membros em matéria de segurança social pelo artigo 153.°, n.° 4, TFUE. Este mesmo erro afetou também a apreciação da gravidade da infração na medida em que a Comissão não teve em consideração o facto de que a República Checa não cometeu uma violação sistemática e continuada do direito da União nem o facto de a transposição parcial da Diretiva 2003/41 ter permitido a prestação transfronteiriça dos serviços em causa.

34      Em segundo lugar, a República Checa recorda que, para apreciar o grau de gravidade de uma infração, há que ter em consideração as consequências do incumprimento declarado nos interesses privados e públicos, a urgência que há de o Estado‑Membro em questão cumprir as suas obrigações, a importância da norma jurídica cuja violação foi verificada e a atitude deste último.

35      Ora, em primeiro lugar, no que se refere às consequências, nos interesses privados e públicos, da não execução em causa, a República Checa sublinha que, no acórdão Comissão/República Checa, o Tribunal de Justiça declarou expressamente que esse Estado‑Membro era livre para decidir a organização do seu próprio sistema de segurança social, incluindo a introdução de um segundo pilar do sistema de reformas. Assim, a não execução desse acórdão não causaria dano ao mercado interno nem aos interesses privados e públicos.

36      Em segundo lugar, no que diz respeito à urgência de adotar as medidas necessárias à execução do acórdão Comissão/República Checa, já referido, a República Checa alega que, uma vez que a transposição da Diretiva 2003/41 tem como único objetivo informar os sujeitos de direito potencialmente afetados em caso de introdução de um segundo pilar, essa urgência devia ser relativizada.

37      Em terceiro lugar, no que diz respeito à importância da Diretiva 2003/41 relativamente ao alegado incumprimento, o referido Estado‑Membro recorda que esta diretiva não tem por objeto a criação de instituições de realização de planos de pensões profissionais. Ao transpor a Diretiva 2003/41, um Estado‑Membro deve unicamente instituir um quadro jurídico com vista a uma eventual organização futura.

38      Em quarto lugar, no que diz respeito à atitude adotada pela República Checa para pôr termo ao incumprimento imputado, esse Estado‑Membro salienta que informou a Comissão de todos as diligências efetuadas. A conclusão da transposição da Diretiva 2003/41 foi contudo subordinada ao resultado de uma reforma complexa das pensões de reforma.

39      Por último, a República Checa considera que o prazo no qual o processo de transposição foi concluído, em 31 de agosto de 2011, não é excessivo atendendo à duração habitual da adoção dos atos legislativos.

 Apreciação do Tribunal

40      A condenação no pagamento de uma quantia fixa assenta essencialmente na apreciação das consequências da não execução das obrigações do Estado‑Membro em causa nos interesses privados e públicos, designadamente quando o incumprimento tiver persistido por um longo período após o acórdão que inicialmente o declarou (v., designadamente, acórdãos de 9 de dezembro de 2008, Comissão/França, C‑121/07, Colet., p. I‑9159, n.° 58; de 31 de março de 2011, Comissão/Grécia, C‑407/09, Colet., p. I‑2467, n.° 28; e Comissão/Irlanda, já referido, n.° 65).

41      Além disso, essa eventual condenação e a fixação, sendo caso disso, de uma quantia fixa devem, em cada caso, depender de todos os elementos pertinentes relacionados tanto com as características do incumprimento declarado como com a atitude do Estado‑Membro demandado no processo iniciado com base no artigo 260.° TFUE (v., designadamente, acórdãos, já referidos, Comissão/França, n.° 62; Comissão/Grécia, n.° 30; e Comissão/Irlanda, n.° 67).

42      Esta disposição investe o Tribunal de Justiça de um amplo poder de apreciação para decidir ou não a aplicação de uma sanção desta natureza e determinar, sendo caso disso, o seu montante (acórdão Comissão/Espanha, já referido, n.° 141). Em particular, a condenação de um Estado‑Membro numa quantia fixa não pode revestir caráter automático (v., neste sentido, acórdão Comissão/França, já referido, n.° 63).

43      Para o efeito, as propostas da Comissão não vinculam o Tribunal de Justiça e não constituem mais do que indicações. De igual modo, orientações em matéria de condenação no pagamento de quantias fixas, como as que figuram na comunicação de 2005, que a Comissão invoca no presente processo, não vinculam o Tribunal de Justiça, mas podem contribuir para garantir a transparência, a previsibilidade e a segurança jurídica da ação empreendida pela Comissão (v., neste sentido, acórdãos, já referidos, Comissão/França, n.° 61, e Comissão/Espanha, n.° 116 e jurisprudência referida).

44      No presente caso, para decidir quanto ao pedido de condenação da República Checa no pagamento de uma quantia fixa, há que recordar que, embora o artigo 260.° TFUE não especifique o prazo dentro do qual deve ter lugar a execução de um acórdão, a execução deve ser iniciada imediatamente e estar concluída o mais rapidamente possível (v., designadamente, acórdão Comissão/Grécia, já referido, n.° 34).

45      A fortiori, é esse o caso desde a entrada em vigor do Tratado FUE, uma vez que, como recordado no n.° 23 do presente acórdão, este Tratado suprimiu, no processo por incumprimento nos termos do artigo 260.°, n.° 2, TFUE, a etapa relativa à formulação de um parecer fundamentado.

46      No presente processo, há que observar que se passaram 19 meses entre a data de prolação, em 14 de janeiro de 2010, do acórdão Comissão/República Checa, já referido, e a da publicação e entrada em vigor, em 31 de agosto de 2011, da Lei n.° 260/2011, que tornou a legislação nacional conforme com o dispositivo do referido acórdão.

47      Ora, resulta dos autos apresentados ao Tribunal de Justiça que, embora as autoridades checas tenham, desde o mês seguinte à prolação do acórdão Comissão/República Checa, já referido, e até setembro de 2010, informado a Comissão do calendário indicativo da adoção das medidas necessárias à execução daquele acórdão, apenas em outubro daquele ano é que um documento de trabalho relativo às referidas medidas foi comunicado ao governo, tendo as autoridades checas decidido adiar essa comunicação até à constituição de um novo governo após as eleições legislativas, realizadas no final de maio de 2010.

48      Todavia, há que recordar que um Estado‑Membro não pode invocar disposições, práticas ou situações da sua ordem jurídica para justificar a inobservância das obrigações resultantes do direito da União (v., designadamente, acórdãos de 4 de junho de 2009, Comissão/Grécia, C‑568/07, Colet., p. I‑4505, n.° 50, e de 31 de março de 2011, Comissão/Grécia, já referido, n.° 36).

49      Consequentemente, o Tribunal de Justiça considera que, no caso em apreço, se justifica condenar a República Checa no pagamento de uma quantia fixa.

50      Em relação ao montante da referida quantia, há que ter em conta as seguintes circunstâncias, relativas à atitude do Estado‑Membro em questão, bem como a duração da infração e a sua gravidade.

51      Em primeiro lugar, no que respeita à atitude do Estado‑Membro em questão, esta, como decorre dos n.os 11 a 18 do presente acórdão, demonstra uma cooperação leal com a Comissão, uma vez que a República Checa a informou regularmente das medidas a adotar para a execução do acórdão Comissão/República Checa, já referido.

52      Em segundo lugar, no que respeita à duração da infração, há que salientar que se passaram 19 meses entre a data da prolação do acórdão Comissão/República Checa, já referido, e a data em que a República Checa procedeu à transposição completa da Diretiva 2003/41 para o direito interno e, consequentemente, tornou a sua legislação nacional conforme com o referido acórdão.

53      No que respeita, em terceiro lugar, à gravidade da infração, há que observar que, na inexistência, na República Checa, de um segundo pilar no sistema nacional de pensões de reforma, e tendo em conta que as instituições de realização de planos de pensão profissionais estavam proibidas de se estabelecerem no território desse Estado‑Membro, a execução tardia, por parte deste último, do acórdão Comissão/República Checa, já referido, teve um impacto limitado no mercado interno dos regimes de realização dos planos de pensões profissionais, que a Diretiva 2003/41, segundo os seus considerandos 1, 6 e 8, visa instituir, e, como tal, nos interesses privados e públicos.

54      Mais precisamente, a transposição integral da Diretiva 2003/41 visa principalmente informar os sujeitos de direito interessados na hipótese de, como o Tribunal de Justiça salientou no n.° 51 do acórdão Comissão/República Checa, já referido, o sistema nacional de pensões de reforma evoluir a este respeito.

55      Atendendo a estas considerações, será feita uma justa apreciação das circunstâncias do presente caso fixando em 250 000 euros o montante da quantia fixa que a República Checa será condenada a pagar à Comissão, por depósito na conta «Recursos próprios da União Europeia».

 Quanto às despesas

56      Nos termos do artigo 138.°, n.° 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a Comissão pedido a condenação da República Checa e tendo esta última sido vencida, há que condená‑la nas despesas.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) decide:

1)      Não tendo tomado, na data em que expirou o prazo fixado na notificação para cumprir enviada à República Checa pela Comissão Europeia, em aplicação do artigo 260.°, n.° 2, TFUE, todas as medidas necessárias para dar execução ao acórdão de 14 de janeiro de 2010, Comissão/República Checa (C‑343/08), a República Checa não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 260.°, n.° 1, TFUE.

2)      A República Checa é condenada a pagar à Comissão Europeia, por depósito na conta «Recursos próprios da União Europeia», uma quantia fixa de 250 000 euros.

3)      A República Checa é condenada nas despesas.

Assinaturas


* Língua do processo: checo.