Language of document : ECLI:EU:C:2013:430

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)

27 de junho de 2013 (*)

«Reconhecimento de diplomas e títulos ― Diretiva 2005/36/CE ― Profissão de fisioterapeuta ― Reconhecimento parcial e limitado das qualificações profissionais ― Artigo 49.° TFUE»

No processo C‑575/11,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.° TFUE, apresentado pelo Symvoulio tis Epikrateias (Grécia), por decisão de 10 de novembro de 2011, entrado no Tribunal de Justiça em 16 de novembro de 2011, no processo

Eleftherios‑Themistoklis Nasiopoulos

contra

Ypourgos Ygeias kai Pronoias,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),

composto por: A. Tizzano, presidente de secção, M. Berger, A. Borg Barthet, E. Levits (relator) e J.‑J. Kasel, juízes,

advogado‑geral: P. Mengozzi,

secretário: L. Hewlett, administradora principal,

vistos os autos e após a audiência de 7 de fevereiro de 2013,

vistas as observações apresentadas:

─        em representação de E.‑T. Nasiopoulos, por A. N. Dendrinos, dikigoros,

─        em representação do Governo helénico, por E. Skandalou, Z. Chatzipavlou e I. Bakopoulos, na qualidade de agentes,

─        em representação do Governo checo por M. Smolek e D. Hadroušek, na qualidade de agentes,

─        em representação do Governo alemão, por J. Möller, na qualidade de agente,

─        em representação do Governo francês, por G. de Bergues, N. Rouam e F. Gloaguen, na qualidade de agentes,

─        em representação do Governo italiano, por W. Ferrante, avvocato dello Stato,

─        em representação do Governo austríaco, por A. Posch, na qualidade de agente,

─        em representação do Governo polaco, por B. Majczyna e M. Szpunar, na qualidade de agentes,

─        em representação da Comissão Europeia, por H. Tserepa‑Lacombe e H. Støvlbæk, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 49.° TFUE.

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe E.‑T. Nasiopoulos ao Ypourgos Ygeias kai Pronoias (Ministro da Saúde e da Previdência), a propósito de um pedido de E.‑T. Nasiopoulos, nacional grego, no sentido de ser autorizado a exercer a profissão de fisioterapeuta na Grécia, ao abrigo de uma qualificação profissional obtida na Alemanha.

 Quadro jurídico

 Direito da União

3        A Diretiva 2005/36/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de setembro de 2005, relativa ao reconhecimento das qualificações profissionais (JO L 255, p. 22), que substituiu os diferentes sistemas de reconhecimento revogados a partir de 20 de outubro de 2007, nomeadamente a Diretiva 89/48/CEE do Conselho, de 21 de dezembro de 1988, relativa a um sistema geral de reconhecimento dos diplomas de ensino superior que sancionam formações profissionais com uma duração mínima de três anos (JO 1989, L 19 p. 16) e a Diretiva 92/51/CEE, do Conselho, de 18 de junho de 1992, relativa a um segundo sistema geral de reconhecimento das formações profissionais, que completa a Diretiva 89/48/CEE (JO L 209, p. 25), sem alterar o seu mecanismo, prevê no seu artigo 1.°:

«A presente diretiva estabelece as regras segundo as quais um Estado‑Membro que subordina o acesso a uma profissão regulamentada ou o respetivo exercício no seu território à posse de determinadas qualificações profissionais (adiante denominado ‘Estado‑Membro de acolhimento’) reconhece, para o acesso a essa profissão e para o seu exercício, as qualificações profissionais adquiridas noutro ou em vários outros Estados‑Membros (adiante denominados ‘Estado‑Membro de origem’) que permitem ao seu titular nele exercer a mesma profissão.»

4        O artigo 4.° da referida diretiva enuncia os efeitos do reconhecimento:

«1.      O reconhecimento das qualificações profissionais pelo Estado‑Membro de acolhimento permitirá ao beneficiário ter acesso nesse Estado‑Membro à profissão para a qual está qualificado no Estado‑Membro de origem, e nele exercer essa profissão nas mesmas condições que os respetivos nacionais.

2.      Para efeitos da presente diretiva, a profissão que o requerente pretende exercer no Estado‑Membro de acolhimento será a mesma para a qual está qualificado no Estado‑Membro de origem, se as atividades abrangidas forem comparáveis.»

5        O artigo 11.° da mesma diretiva descreve os níveis de qualificação da seguinte forma:

«[…]

a)      Declaração de competência emitida por uma autoridade competente do Estado‑Membro de origem, designada nos termos das disposições legislativas, regulamentares ou administrativas desse Estado, […]

[…]

b)      Certificado comprovativo de um ciclo de estudos secundários:

[…]

[…]

d)      Diploma comprovativo de uma formação a nível do ensino pós‑secundário com uma duração mínima de três anos e não superior a quatro anos, ou durante um período equivalente a tempo parcial, ministrada numa universidade, num estabelecimento de ensino superior ou noutro estabelecimento que dispense o mesmo nível de formação, e da formação profissional eventualmente exigida para além do ciclo de estudos pós‑secundários;

e)      Diploma comprovativo da conclusão pelo titular de um ciclo de estudos pós‑secundários de duração superior a quatro anos ou durante um período equivalente a tempo parcial, numa universidade ou num estabelecimento de ensino superior ou noutro estabelecimento que dispense o mesmo nível de formação e, se for o caso, da conclusão da formação profissional exigida em complemento do ciclo de estudos pós‑secundários.»

6        O artigo 13.°, n.° 1, da Diretiva 2005/36 apresenta as condições para o reconhecimento:

«Quando, num Estado‑Membro de acolhimento, o acesso a uma profissão regulamentada ou o seu exercício estiver subordinado à posse de determinadas qualificações profissionais, a autoridade competente desse Estado‑Membro permitirá o acesso a essa profissão e o seu exercício, nas mesmas condições que aos seus nacionais, aos requerentes que possuam a declaração de competência ou o título de formação exigido por outro Estado‑Membro para aceder à mesma profissão no seu território ou para nele a exercer.

As declarações de competência ou os títulos de formação deverão preencher as seguintes condições:

a)      Terem sido emitidos por uma autoridade competente de um Estado‑Membro, designada nos termos das disposições legislativas, regulamentares ou administrativas desse Estado;

b)      Comprovarem a posse de um nível de qualificação profissional no mínimo equivalente ao nível imediatamente inferior àquele que é exigido no Estado‑Membro de acolhimento, conforme o disposto no artigo 11.°»

7        O artigo 14.° da referida diretiva versa sobre as medidas de compensação:

«1.      O artigo 13.° não obsta a que o Estado‑Membro de acolhimento exija que o requerente realize um estágio de adaptação durante um máximo de três anos ou se submeta a uma prova de aptidão […]

[…]

4.      Para efeitos da aplicação […] do n.° 1, entende‑se por ‘matérias substancialmente diferentes’ as matérias cujo conhecimento é essencial ao exercício da profissão e relativamente às quais a formação recebida pelo migrante contém diferenças substanciais, em termos de duração ou de conteúdo, em relação à formação exigida no Estado‑Membro de acolhimento.

5.      O n.° 1 deverá ser aplicado no respeito pelo princípio da proporcionalidade. Em especial, se o Estado‑Membro de acolhimento tencionar exigir do requerente a realização de um estágio de adaptação ou de uma prova de aptidão deverá, em primeiro lugar, verificar se os conhecimentos por ele adquiridos no decurso da sua experiência profissional num Estado‑Membro e/ou num país terceiro são suscetíveis de compensar, no todo ou em parte, a diferença substancial a que se refere o n.° 4.»

 Direito helénico

8        Segundo o Decreto Presidencial 90/1995 ― Direitos profissionais dos titulares de diplomas da secção de fisioterapia da escola de profissões de saúde e de previdência dos estabelecimentos de ensino técnico, a profissão de fisioterapeuta é uma profissão regulamentada, estando o seu exercício subordinado à posse de um diploma da referida escola, um estabelecimento do mesmo nível de formação (superior) que as universidades e os estabelecimentos de ensino superior, outorgado na sequência de estudos com uma duração mínima de três anos.

9        Assim, para permitir o acesso à profissão de fisioterapeuta a uma pessoa que obteve um título profissional noutro Estado‑Membro, a autoridade competente deve estabelecer que esse título não constitui apenas uma declaração de competência ou um certificado, na aceção do artigo 11.° da Diretiva 2005/36, mas é também um diploma.

 Litígio no processo principal e questão prejudicial

10      E.‑T. Nasiopoulos é um nacional grego, titular de um certificado de fim de estudos secundários obtido num liceu helénico. Depois de ter seguido, na Alemanha, uma formação de massagista‑hidroterapeuta médico («Masseur und medizinischer Bademeister») com a duração de dois anos e meio, compreendendo ensino teórico e um estágio, obteve um título que o autorizava a exercer esta profissão. Na Alemanha, o nível da formação de massagista‑hidroterapeuta médico equivale ao ensino profissional de grau intermédio (secundário).

11      Invocando as qualificações profissionais adquiridas na Alemanha, o recorrente apresentou, no Ministério da Saúde da Grécia, um pedido de reconhecimento do direito de aceder à profissão de fisioterapeuta, que, na Grécia, era a profissão mais próxima da de massagista‑hidroterapeuta médico.

12      Este pedido foi indeferido. Por um lado, a profissão de «massagista‑hidroterapeuta médico» não está regulamentada na Grécia. Por outro, o recorrente não pode exercer a profissão de fisioterapeuta, dado que só possui um certificado de formação de dois anos e meio, enquanto o acesso à profissão de fisioterapeuta, na Grécia, está subordinado à posse de um diploma de ensino superior emitido na sequência de estudos com uma duração mínima de três anos.

13      E.‑T. Nasiopoulos interpôs recurso desta decisão no Symvoulio tis Epikrateias, alegando que a mesma infringia o sistema de reconhecimento de qualificações profissionais da União Europeia e violava o seu direito ao livre estabelecimento previsto no artigo 49.° TFUE.

14      O órgão jurisdicional de reenvio considera que o facto de as autoridades helénicas não lhe terem concedido um acesso, ainda que parcial, à profissão regulamentada de fisioterapeuta na Grécia, para que possa exercer nesse país a parte das atividades profissionais dos fisioterapeutas (serviços de massagem e hidroterapia) que o recorrente pode exercer legalmente na Alemanha, não está isento de dúvidas razoáveis à luz a jurisprudência do Tribunal de Justiça (acórdão de 19 de janeiro de 2006, Colegio de Ingenieros de Caminos, Canales y Puertos, C‑330/03, Colet., p. I‑801).

15      Nestas condições, o Symvoulio tis Epikrateias decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«Tendo em consideração o [artigo 49.° TFUE] que institui a Comunidade Europeia e o princípio da proporcionalidade, o objetivo de garantir a prestação de serviços de saúde de nível elevado é suficiente para justificar uma restrição da liberdade de estabelecimento resultante do sistema das disposições vigentes num Estado‑Membro (Estado‑Membro de acolhimento), que:

a)      permitem o exercício de algumas atividades profissionais exclusivamente a pessoas que têm o direito de exercer nesse Estado‑Membro a profissão regulamentada de fisioterapeuta;

b)      excluem a possibilidade de um acesso parcial a essa profissão; e

c)      implicam, por conseguinte, para o cidadão do Estado‑Membro de acolhimento ― que tenha obtido noutro Estado‑Membro (Estado‑Membro de origem) um título que lhe permite exercer neste último Estado‑Membro uma profissão regulamentada conexa com a prestação de cuidados de saúde (título que, no entanto, por não preencher os requisitos da [diretiva], não lhe permite exercer a profissão de fisioterapeuta no Estado‑Membro de acolhimento) ― a impossibilidade absoluta de exercer no Estado‑Membro de acolhimento, mediante um acesso parcial à profissão de fisioterapeuta, algumas das atividades suscetíveis de serem reconduzidas à referida profissão, isto é, as que o interessado tem o direito de exercer no Estado‑Membro de origem?»

 Quanto à questão prejudicial

16      Com a sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 49.° TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional que exclui o acesso parcial à profissão de fisioterapeuta, regulamentada no Estado‑Membro de acolhimento, a um nacional desse mesmo Estado que tenha obtido noutro Estado‑Membro um título, como o de massagista‑hidroterapeuta médico, que o autoriza a exercer, nesse segundo Estado‑Membro, uma parte das atividades abrangidas pela profissão de fisioterapeuta.

17      Há que analisar esta questão à luz dos princípios enunciados pelo acórdão Colegio de Ingenieros de Caminos, Canales y Puertos, já referido, que tinha por objeto o reconhecimento parcial das qualificações profissionais.

18      Nesse acórdão, o Tribunal de Justiça examinou a questão de saber se o artigo 49.° TFUE se opõe a que as autoridades competentes do Estado‑Membro de acolhimento excluam a possibilidade de um acesso parcial à profissão regulamentada, limitado ao exercício de uma ou várias atividades abrangidas por essa profissão.

19      A este propósito, o Tribunal de Justiça recordou que, nos termos do artigo 49.°, segundo parágrafo, TFUE, a liberdade de estabelecimento é exercida nas condições definidas pela legislação do país de estabelecimento para os seus próprios nacionais. Daqui resulta que, quando o acesso a uma atividade específica, ou o seu exercício, estiver regulamentado no Estado‑Membro de acolhimento, o nacional de outro Estado‑Membro que pretenda exercer essa atividade deve, em princípio, obedecer às condições da referida regulamentação (acórdão de 30 de novembro de 1995, Gebhard, C‑55/94, Colet., p. I‑4165, n.° 36).

20      Não tendo as condições de acesso à profissão de fisioterapeuta, até ao momento, sido objeto de uma harmonização a nível da União, os Estados‑Membros continuam a ser competentes para definir as ditas condições, não limitando a Diretiva 2005/36 a sua competência nesta matéria. Não deixa, porém, de ser verdade que os Estados‑Membros devem exercer as suas competências neste domínio respeitando as liberdades fundamentais garantidas pelo Tratado (v. acórdãos de 1 de fevereiro de 2001, Mac Quen e o., C‑108/96, Colet., p. I‑837, n.os 24 e 25, e Colegio de Ingenieros de Caminos, Canales y Puertos, já referido, n.os 28 e 29).

21      Assim, uma regulamentação do Estado‑Membro de acolhimento que exclua totalmente o acesso parcial a uma profissão regulamentada e, portanto, suscetível de impedir ou de tornar menos atrativo o exercício da liberdade de estabelecimento, apenas pode ser justificada, nomeadamente, quando responde a razões imperativas de interesse geral e não ultrapassa o que é necessário para atingir esse objetivo.

22      Ora, quanto ao objetivo de uma regulamentação como a que está em causa no processo principal, as razões imperativas de interesse geral invocadas pelos governos que apresentaram observações são, por um lado, a proteção dos consumidores e, por outro, a proteção da saúde.

23      No que se refere à proteção dos consumidores, há que salientar que, na verdade, um reconhecimento parcial das qualificações profissionais pode, em princípio, ter como resultado dividir as profissões regulamentadas num Estado‑Membro em diferentes atividades. Tal significaria, no fundo, o risco da confusão no espírito dos destinatários dos serviços, que poderiam ser induzidos em erro quanto ao alcance das ditas qualificações associadas à profissão de fisioterapeuta.

24      Contudo, excluir o acesso, ainda que parcial, à profissão de fisioterapeuta ultrapassa o que é necessário para atingir o objetivo da proteção dos consumidores.

25      Com efeito, como o Tribunal de Justiça já salientou no acórdão Colegio de Ingenieros de Caminos, Canales y Puertos, já referido, o objetivo legítimo da proteção dos consumidores pode ser alcançado por meios menos coercivos do que a total exclusão de acesso, ainda que parcial, a uma profissão, nomeadamente pela obrigação de usar o título profissional de origem ou o título de formação quer na língua em que foi obtido e segundo a forma original quer na língua oficial do Estado‑Membro de acolhimento. (v., por analogia, acórdão Colegio de Ingenieros de Caminos, Canales y Puertos, já referido, n.° 38).

26      No que respeita à proteção da saúde, o Governo checo alegou que as profissões da saúde pertencem a um domínio particularmente sensível e o Governo francês é de opinião que essas profissões são específicas e não podem ser assimiladas às outras profissões regulamentadas. Esta abordagem é partilhada, nomeadamente, pelo Governo italiano, que não concebe atividades profissionais desligadas do conjunto de atividades que são objeto da profissão de saúde sem pôr em causa a proteção da saúde pública, o nível das prestações e a confiança depositada pelos utentes no título de estudos correspondente.

27      A este respeito, há que salientar que, na verdade, impõe‑se uma vigilância particular, aliás referida no artigo 52.° TFUE, quando da apreciação das medidas nacionais que visam a proteção da saúde pública. Assim, como salienta o Governo francês, a simples circunstância de um Estado‑Membro ter escolhido um sistema de proteção diferente do adotado por outro Estado‑Membro não pode ter incidência na apreciação da necessidade e da proporcionalidade das disposições adotadas na matéria (v., designadamente, acórdãos Mac Quen e o., já referido, n.os 33 e 34; de 11 de julho de 2002, Gräbner, C‑294/00, Colet., p. I‑6515, n.os 46 e 47, e de 11 de setembro de 2008, Comissão/Alemanha, C‑141/07, Colet., p. I‑6935, n.° 51).

28      Contudo, em primeiro lugar, é forçoso sublinhar que a profissão de fisioterapeuta e, portanto, a de um massagista de qualquer tipo, não pertence ao setor das profissões médicas propriamente ditas, mas ao domínio paramédico. Este domínio, que abrange uma vasta gama de atividades de natureza heterogénea, não pode escapar por definição ao sistema de reconhecimento mútuo das profissões regulamentadas, conforme estabelecido pelo direito da União.

29      Em segundo lugar, há que salientar que o destinatário dos serviços fornecidos por um massagista‑hidroterapeuta médico goza, de facto, da vigilância particular que se impõe no que respeita à proteção da saúde. Com efeito, como especificou nomeadamente o Governo helénico durante a audiência, as prestações de serviços fornecidas por um massagista‑hidroterapeuta médico consistem apenas na execução de uma terapia prescrita ao paciente não por esse massagista, mas por um médico. É a esse médico que o paciente se dirige em primeiro lugar e é esse médico que, em seguida, indica ao referido massagista a metodologia a seguir a nível da execução técnica da terapia. Assim, o massagista‑hidroterapeuta médico não é escolhido diretamente pelo paciente e não atua sob as instruções deste último, mas é designado por um representante da profissão médica e age em ligação estreita com ele, numa relação de dependência e de cooperação.

30      Embora decorra do que precede que excluir o acesso, ainda que parcial, à profissão de fisioterapeuta ultrapassa não só o que é necessário para atingir o objetivo da proteção dos consumidores mas também o que é necessário a nível da proteção da saúde, há que distinguir, contudo, as duas hipóteses seguintes.

31      Na primeira hipótese, trata‑se de casos em que, no Estado‑Membro de origem e no de acolhimento, o grau de semelhança das duas profissões é tal que podem ser qualificadas como «comparáveis» e, portanto, a «mesma profissão», na aceção do artigo 4.°, n.° 2, da Diretiva 2005/36. Nestes casos, as lacunas na formação do requerente relativamente ao que é exigido no Estado‑Membro de acolhimento podem ser efetivamente colmatadas pela aplicação das medidas de compensação previstas no artigo 14.°, n.° 1, da Diretiva 2005/36, assegurando, assim, uma integração completa do interessado no sistema profissional do Estado‑Membro de acolhimento (v. acórdão Colegio de Ingenieros de Caminos, Canales y Puertos, já referido, n.° 34). Por conseguinte, nestas circunstâncias, o artigo 49.° TFUE não é violado quando o Estado‑Membro de acolhimento não permite o acesso parcial a uma profissão.

32      Ao invés, na segunda hipótese, trata‑se de casos não abrangidos pela Diretiva 2005/36, no sentido de que as diferenças entre os domínios de atividade são de tal modo importantes que é necessário na realidade que o requerente siga uma formação completa para poder exercer, noutro Estado‑Membro, as atividades para as quais está qualificado. Ora, tal constitui um fator objetivamente suscetível de incitar o interessado a não exercer essas atividades no Estado‑Membro de acolhimento (v. acórdão Colegio de Ingenieros de Caminos, Canales y Puertos, já referido, n.° 35). Nestas circunstâncias, o artigo 49.° TFUE é suscetível de ser violado.

33      A este respeito, o Tribunal de Justiça salientou que, por um lado, cabe às autoridades e, em especial, aos órgãos jurisdicionais competentes do Estado‑Membro de acolhimento determinar até que ponto, em cada caso concreto, o conteúdo da formação obtida pelo interessado é diferente do exigido neste Estado (v. acórdão Colegio de Ingenieros de Caminos, Canales y Puertos, já referido, n.° 36).

34      Por outro lado, o Tribunal de Justiça também já precisou que um dos critérios decisivos, que deve ser examinado em primeiro lugar pelas autoridades nacionais, é saber se a atividade profissional que o interessado pretende exercer no Estado‑Membro de acolhimento é ou não objetivamente dissociável do conjunto das atividades abrangidas pela profissão correspondente neste Estado, servindo de indício a este respeito a possibilidade de saber se a atividade pode ser exercida, sob forma independente ou autónoma, no Estado‑Membro em que a qualificação profissional em causa foi obtida. Se esse for o caso, há que concluir que o efeito dissuasor causado pela exclusão de qualquer possibilidade de reconhecimento parcial da qualificação profissional em causa é demasiado importante para poder ser contrabalançado pelo receio de uma eventual ofensa dos direitos dos destinatários dos serviços (v. acórdão Colegio de Ingenieros de Caminos, Canales y Puertos, já referido, n.os 37 e 38).

35      Tendo em conta o que precede, há que responder à questão submetida que o artigo 49.° TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional que exclui o acesso parcial à profissão de fisioterapeuta, regulamentada no Estado‑Membro de acolhimento, a um nacional desse mesmo Estado que tenha obtido noutro Estado‑Membro um título, como o de massagista‑hidroterapeuta médico, que o autoriza a exercer, nesse segundo Estado‑Membro, uma parte das atividades abrangidas pela profissão de fisioterapeuta, quando as diferenças entre os domínios de atividade são de tal modo importantes que é necessário na realidade seguir uma formação completa para aceder à profissão de fisioterapeuta. Compete ao órgão jurisdicional nacional determinar se tal se verifica.

 Quanto às despesas

36      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) declara:

O artigo 49.° TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional que exclui o acesso parcial à profissão de fisioterapeuta, regulamentada no Estado‑Membro de acolhimento, a um nacional desse mesmo Estado que tenha obtido noutro Estado‑Membro um título, como o de massagista‑hidroterapeuta médico, que o autoriza a exercer, nesse segundo Estado‑Membro, uma parte das atividades abrangidas pela profissão de fisioterapeuta, quando as diferenças entre os domínios de atividade são de tal modo importantes que é necessário na realidade seguir uma formação completa para aceder à profissão de fisioterapeuta. Compete ao órgão jurisdicional nacional determinar se tal se verifica.

Assinaturas


* Língua do processo: grego.