Language of document : ECLI:EU:C:2019:346

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Oitava Secção)

2 de maio de 2019 (*)

«Reenvio prejudicial — Diretiva 97/67/CE — Regras comuns para o desenvolvimento do mercado interno dos serviços postais — Prestação do serviço postal universal — Direitos exclusivos do operador designado — Emissões de meios de franquia diferentes dos selos postais»

No processo C‑259/18,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Juzgado de lo Mercantil n° 3 de Madrid (Tribunal de Comércio n.o 3 de Madrid, Espanha), por decisão de 20 de junho de 2017, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 11 de abril de 2018, no processo

Sociedad Estatal Correos y Telégrafos SA

contra

Asendia Spain SLU,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Oitava Secção),

composto por: F. Biltgen, presidente de secção, J Malenovský e L. S. Rossi (relatora), juízes,

advogado‑geral: E. Sharpston,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

–        em reapresentação da Asendia Spain SLU, por I. Moreno‑Tapia Rivas, E. de Félix Parrondo, abogadas, e J. Botella Carretero, abogado,

–        em representação do Governo espanhol, inicialmente por V. Ester Casas, e em seguida por M. J. García‑Valdecasas Dorrego, na qualidade de agentes,

–        em representação do Governo francês, por A.‑L. Desjonquères, E. de Moustier e R. Coesme, na qualidade de agentes,

–        em representação da Comissão Europeia, por L. Nicolae e J. Rius Riu, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvida a advogada‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação da Diretiva 97/67/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de dezembro de 1997, relativa às regras comuns para o desenvolvimento do mercado interno dos serviços postais comunitários e a melhoria da qualidade de serviço (JO 1998, L 15, p. 14), conforme alterada pela Diretiva 2008/6/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de fevereiro de 2008 (JO 2008, L 52, p. 3; retificação no JO 2015, L 225, p. 49) (a seguir «Diretiva 97/67»).

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Sociedad Estatal Correos y Telégrafos SA (a seguir «Correos») à Asendia Spain SLU, a propósito da comercialização por esta última de meios de franquia diferentes dos selos postais.

 Quadro jurídico

 Direito da União

 Diretiva 97/67

3        Os considerandos 8, 16 e 20 da Diretiva 97/67 enunciam:

«(8)      Considerando que são necessárias medidas destinadas a garantir a liberalização gradual e controlada do mercado e a assegurar um justo equilíbrio na sua aplicação para garantir em toda a Comunidade, no respeito das obrigações e direitos dos prestadores do serviço universal, a livre prestação de serviços no próprio setor postal;

[…]

(16)      Considerando que, para assegurar o funcionamento do serviço universal em condições financeiras equilibradas, se afigura justificado manter um conjunto de serviços que podem ser reservados, no respeito das regras do Tratado e sem prejuízo da aplicação das regras de concorrência; […]

[…]

(20)      Considerando que, por razões de ordem e de segurança públicas, os Estados‑Membros podem ter interesse legítimo em conferir a uma ou mais entidades por eles designadas o direito de colocar na via pública caixas e marcos de correio destinados à receção de envios postais; que, pelas mesmas razões, têm direito a designar a entidade ou entidades encarregadas da emissão de selos postais que identificam o país de origem e a entidade ou entidades responsáveis pela prestação dos serviços de correio registado utilizados em procedimentos judiciais ou administrativos, em conformidade com a respetiva legislação nacional; […]»

4        O artigo 7.o, n.os 1 a 4, desta diretiva dispõe:

«1.      Os Estados‑Membros não concedem nem mantêm em vigor direitos exclusivos ou especiais para o estabelecimento e a prestação de serviços postais. Os Estados‑Membros podem financiar a prestação do serviço universal de acordo com um ou mais dos meios previstos nos n.os 2, 3 e 4 ou com outros meios compatíveis com o Tratado.

2.      Os Estados‑Membros podem assegurar a prestação do serviço universal através da adjudicação desse serviço de acordo com as regras e a regulamentação aplicáveis aos contratos públicos, incluindo, como previsto na Diretiva 2004/18/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de março de 2004, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de contratos nos setores da água, da energia, dos transportes e dos serviços postais [JO 2004, L 134, p. 114], o diálogo concorrencial e os procedimentos diretamente negociados, com ou sem publicação de anúncio de concurso.

3.      Caso um Estado‑Membro determine que as obrigações do serviço universal previstas na presente diretiva implicam um custo líquido, calculado de acordo com o Anexo I, e representam um encargo financeiro não razoável para o prestador ou os prestadores do serviço universal, pode estabelecer:

a)      Um mecanismo para compensar a empresa ou empresas em causa através de fundos públicos; ou

b)      Um mecanismo para partilhar o custo líquido das obrigações do serviço universal entre os prestadores de serviços e/ou os utilizadores.

4.      Quando o custo líquido é partilhado nos termos da alínea b) do n.o 3, os Estados‑Membros podem criar um fundo de compensação que pode ser financiado por taxas aplicáveis aos prestadores de serviço e/ou aos utilizadores e que é gerido para esse efeito por um organismo independente do beneficiário ou beneficiários. Os Estados‑Membros podem subordinar a concessão de autorizações aos prestadores de serviços, nos termos do n.o 2 do artigo 9.o, à obrigação de uma contribuição financeira para o fundo ou ao cumprimento das obrigações do serviço universal. As obrigações de serviço universal do prestador ou prestadores de serviço universal estabelecidas no artigo 3.o podem beneficiar desta forma de financiamento.»

5        O artigo 8.o da referida diretiva prevê:

«O artigo 7.o não prejudica o direito de os Estados‑Membros organizarem a colocação de marcos e caixas de correio na via pública, a emissão de selos postais e o serviço de correio registado utilizado em procedimentos judiciais ou administrativos, em conformidade com a respetiva legislação nacional.»

 Diretiva 2008/6

6        Os considerandos 2, 10, 11, 13 e 25 da Diretiva 2008/6 têm a seguinte redação:

«(2)      A Diretiva 97/67/CE […] instituiu um quadro regulamentar para o setor postal a nível comunitário, incluindo medidas destinadas a garantir um serviço universal e o estabelecimento de limites máximos para os serviços postais que podem ser reservados pelos Estados‑Membros ao prestador ou prestadores do serviço universal com o fim de preservar o referido serviço universal, os quais deverão ser reduzidos de forma gradual e progressiva, e um calendário para o processo de tomada de decisões no que respeita a uma maior abertura do mercado à concorrência, tendo em vista a criação de um mercado interno dos serviços postais».

[…]

(10)      Em conformidade com a Diretiva 97/67/CE, foi efetuado um estudo prospetivo que avalia, para cada Estado‑Membro, o impacto produzido no serviço universal pela plena realização do mercado interno dos serviços postais comunitários em 2009. A Comissão procedeu igualmente a uma análise aprofundada do setor postal comunitário, que incluiu a encomenda de estudos sobre a evolução económica, social e tecnológica do setor, e consultou amplamente as partes interessadas.

(11)      De acordo com esse estudo prospetivo, o objetivo básico de assegurar a prestação sustentável de um serviço universal que satisfaça a norma de qualidade definida pelos Estados‑Membros em conformidade com a Diretiva 97/67/CE pode ser assegurado em toda a Comunidade até 2009 sem ser necessária uma área reservada.

[…]

(13)      O estudo prospetivo demonstra que a área reservada deverá deixar de ser a solução privilegiada para o financiamento do serviço universal. […]

[…]

(25)      Com base nos estudos realizados e tendo em vista libertar todo o potencial do mercado interno dos serviços postais, é conveniente pôr termo à utilização da área reservada e aos direitos especiais como modo de assegurar o financiamento do serviço universal.»

 Direito espanhol

7        O artigo 33.o da ley 43/2010 del servicio universal postal, de los derechos de los usuarios y del mercado postal (Lei 43/2010 relativa ao serviço postal universal, aos direitos dos utilizadores e ao mercado postal), de 30 de dezembro de 2010 (BOE n.o 318, de 31 de dezembro de 2010, p. 109195, a seguir «Lei 43/2010»), que transpõe a Diretiva 2008/6, tem a seguinte redação:

«A fim de assegurar a prestação do serviço postal universal e o seu bom funcionamento, é garantido ao operador designado:

[…]

e)      a distribuição de selos postais ou de outros meios de franquia, podendo a venda a retalho ser efetuada através da rede postal ou de terceiros.»

 Litígio no processo principal e questões prejudiciais

8        A Correos é designada pela Lei 43/2010 como o operador responsável pelo serviço postal universal em Espanha.

9        A Asendia Spain é um operador autorizado a prestar serviços postais no mercado espanhol.

10      Dado que esta última comercializa meios de franquia diferentes dos selos postais, a Correos intentou no órgão jurisdicional de reenvio, o Juzgado de lo Mercantil n° 3 de Madrid (Tribunal de Comércio n.o 3 de Madrid, Espanha), uma ação por concorrência desleal.

11      Neste contexto, a Correos acusa a Asendia Spain de três comportamentos alegadamente desleais que lhe causaram prejuízo, concretamente, em primeiro lugar, a comercialização de meios de franquia ou de etiquetas pré‑pagas que imitam os selos utilizados pela Correos e que podem ser confundidos com estes últimos; em segundo lugar, a comercialização destes meios de franquia fora da sua rede postal interna e, em terceiro lugar, a omissão de informar suficientemente os utilizadores dos referidos meios de franquia de que a correspondência com os referidos meios só pode ser depositada em algumas caixas de correio.

12      Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, o caráter desleal dos comportamentos de Asendia Spain depende do âmbito das garantias concedidas à Correos pela Lei 43/2010. A este respeito, o referido órgão jurisdicional menciona uma jurisprudência do Tribunal Supremo (Supremo Tribunal, Espanha) à luz da qual não se pode excluir que o artigo 33.o, alínea e), da Lei 43/2010 deva ser interpretado no sentido de que há que reconhecer à Correos um direito exclusivo no que se refere à comercialização de meios de franquia diferentes dos selos postais.

13      Tendo dúvidas quanto à compatibilidade desta disposição com o direito da União, o Juzgado de lo Mercantil n° 3 de Madrid (Tribunal de Comércio n.o 3 de Madrid, Espanha) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      Opõe‑se o artigo 7.o, n.o 1, e o artigo 8.o da [Diretiva 97/67] a uma legislação nacional nos termos da qual a garantia concedida ao operador postal designado para a prestação do serviço postal universal [implica que este] seja o único autorizado a distribuir outros meios de franquia diferentes dos selos?

2)      Em caso de resposta afirmativa à questão anterior, é compatível com a legislação postal da União Europeia exigir aos operadores postais privados que disponham de estabelecimentos físicos de atendimento ao público para que possam distribuir e comercializar meios de franquia diferentes dos selos?»

 Quanto às questões prejudiciais

 Quanto à admissibilidade das questões

14      Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o processo instituído pelo artigo 267.o TFUE é um instrumento de cooperação entre o Tribunal de Justiça e os órgãos jurisdicionais nacionais, graças ao qual o primeiro fornece aos segundos os elementos de interpretação do direito da União que lhes são necessários para a resolução do litígio que lhes cabe decidir (Acórdão de 27 de novembro de 2012, Pringle, C‑370/12, EU:C:2012:756, n.o 83 e jurisprudência referida).

15      Neste contexto, o juiz nacional, a quem foi submetido o litígio e que deve assumir a responsabilidade pela decisão judicial a tomar, tem competência exclusiva para apreciar, tendo em conta as especificidades do processo, tanto a necessidade de uma decisão prejudicial para poder proferir a sua decisão como a pertinência das questões que submete ao Tribunal de Justiça. Consequentemente, desde que as questões submetidas sejam relativas à interpretação do direito da União, o Tribunal de Justiça é, em princípio, obrigado a pronunciar‑se (Acórdão de 27 de junho de 2017, Congregación de Escuelas Pías Provincia Betania, C‑74/16, EU:C:2017:496, n.o 24 e jurisprudência referida).

16      Daqui se conclui que as questões relativas à interpretação do direito da União submetidas pelo juiz nacional no quadro regulamentar e factual que define sob a sua responsabilidade, e cuja exatidão não cabe ao Tribunal de Justiça verificar, gozam de uma presunção de pertinência. O Tribunal de Justiça só pode recusar pronunciar‑se sobre uma questão prejudicial submetida por um órgão jurisdicional nacional se for manifesto que a interpretação do direito da União solicitada não tem nenhuma relação com a realidade ou com o objeto do litígio no processo principal, quando o problema for hipotético ou ainda quando o Tribunal de Justiça não dispuser dos elementos de facto e de direito necessários para dar uma resposta útil às questões que lhe são submetidas (Acórdão de 6 de setembro de 2016, Petruhhin, C‑182/15, EU:C:2016:630, n.o 20 e jurisprudência referida).

17      A este último respeito, a necessidade de obter uma interpretação do direito da União que seja útil ao juiz nacional exige que este defina o quadro factual e regulamentar em que se inserem as questões que submete ou que, pelo menos, explique as hipóteses factuais em que essas questões assentam. Com efeito, o Tribunal de Justiça apenas está habilitado a pronunciar‑se sobre a interpretação de um diploma da União a partir dos factos que lhe são indicados pelo órgão jurisdicional nacional (Despacho de 21 de junho de 2018, Idroenergia, C‑166/18, não publicado, EU:C:2018:476, n.o 12 e jurisprudência referida).

18      O órgão jurisdicional de reenvio deve indicar igualmente as razões precisas que o levaram a interrogar‑se sobre a interpretação de certas disposições do direito da União e a considerar necessário submeter questões prejudiciais ao Tribunal de Justiça. Além disso, é indispensável que o órgão jurisdicional nacional forneça um mínimo de explicações sobre as razões da escolha das disposições do direito da União cuja interpretação solicita e sobre o nexo que estabelece entre essas disposições e a legislação nacional aplicável ao litígio que lhe foi submetido (Despacho de 21 de junho de 2018, Idroenergia, C‑166/18, não publicado, EU:C:2018:476, n.o 13 e jurisprudência referida).

19      Essas exigências relativas ao conteúdo de um pedido de decisão prejudicial figuram expressamente no artigo 94.o do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, que é suposto o órgão jurisdicional de reenvio conhecer e respeitar escrupulosamente, no quadro da cooperação instituída pelo artigo 267.o TFUE (Despacho de 21 de junho de 2018, Idroenergia, C‑166/18, não publicado, EU:C:2018:476, n.o 14 e jurisprudência referida).

20      Por outro lado, as referidas exigências estão igualmente refletidas no ponto 15 das Recomendações do Tribunal de Justiça da União Europeia à atenção dos órgãos jurisdicionais nacionais, relativas à apresentação de processos prejudiciais (JO 2018, C 257, p. 1). Resulta, além disso, do ponto 16 das referidas recomendações que «o órgão jurisdicional de reenvio deve fornecer as referências precisas das disposições nacionais aplicáveis aos factos do litígio no processo principal» (v., neste sentido, Despacho de 21 de junho de 2018, Idroenergia, C‑166/18, não publicado, EU:C:2018:476, n.os 16 e 17).

21      Nas suas observações escritas, a Comissão alega que a decisão de reenvio não contém elementos suficientes sobre o quadro factual do litígio no processo principal e a legislação nacional pertinente para compreender a primeira questão. Por conseguinte, esta questão deve ser julgada inadmissível.

22      Ora, resulta claramente da referida decisão, por um lado, que o órgão jurisdicional de reenvio é chamado a pronunciar‑se sobre o caráter desleal da prática comercial da Asendia Spain, que consiste em colocar à venda meios de franquia diferentes dos selos postais e, por outro, que o caráter desleal dessa prática depende da questão de saber se o direito exclusivo concedido pelo artigo 33.o, alínea e), da Lei 43/2010 à Correos para a distribuição desses meios de franquia é ou não compatível com os artigos 7.o e 8.o da Diretiva 97/67.

23      O facto de a Comissão considerar que a interpretação do direito espanhol pelo órgão jurisdicional de reenvio não é correta e, consequentemente, que o artigo 33.o, e), da Lei 43/2010 não confere nenhum direito exclusivo à Correos, não pode ser pertinente, tendo em conta a jurisprudência referida nos n.os 16 e 17 do presente acórdão.

24      Daqui se conclui que a primeira questão é admissível.

25      Em contrapartida, o mesmo não sucede com a segunda questão.

26      Com efeito, como salientam, em substância, tanto o Governo francês como a Comissão nas suas observações escritas, o órgão jurisdicional de reenvio não define de modo nenhum o quadro factual e regulamentar em que se inscreve esta segunda questão. Em especial, não explica com que fundamento considera que se deve deduzir da única disposição nacional referida na decisão de reenvio, concretamente, o artigo 33.o, alínea e), da Lei 43/2010, que a mesma exige aos operadores postais privados que disponham de pontos de venda físicos abertos ao público para poderem distribuir e comercializar meios de franquia diferentes dos selos postais.

27      Por outro lado, a decisão de reenvio não identifica, com exceção de uma referência genérica à «legislação postal da União Europeia», as disposições de direito da União cuja interpretação pede, o que impede o Tribunal de Justiça de compreender a relação entre este direito e a legislação nacional aplicável ao litígio no processo principal.

28      Nestas condições, o Tribunal de Justiça não dispõe dos elementos de facto e de direito necessários para dar uma resposta útil à segunda questão que, devido a esse facto, é manifestamente inadmissível.

 Quanto à primeira questão

29      Com a primeira questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 7.o, n.o 1, e o artigo 8.o da Diretiva 97/67 devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma legislação nacional, como a que está em causa no processo principal, que garante ao operador designado para a prestação do serviço postal universal um direito exclusivo para a distribuição de meios de franquia diferentes dos selos postais.

30      Para responder a esta questão, basta salientar que resulta da própria redação do referido artigo 7.o, n.o 1, que «[o]s Estados‑Membros não concedem nem mantêm em vigor direitos exclusivos ou especiais para o estabelecimento e a prestação de serviços postais».

31      Assim, esta disposição opõe‑se a qualquer legislação nacional, como a que está em causa no processo principal, que concede direitos exclusivos aos prestadores de serviços postais, incluindo, por conseguinte, o direito exclusivo de comercializar meios de franquia diferentes dos selos postais.

32      Aponta igualmente nesse sentido a interpretação histórica e teleológica da Diretiva 97/67.

33      Com efeito, como resulta do considerando 16 da Diretiva 97/67, na sua versão inicial, a manutenção de setores reservados constituía a opção privilegiada para o financiamento do serviço postal universal. No entanto, decorre dos considerandos 10, 11, 13 e 25 da Diretiva 2008/6 que, com a adoção desta última diretiva, o legislador da União acabou por considerar, à luz dos estudos prospetivos que foram realizados com o objetivo de avaliar o impacto produzido no serviço universal pela plena realização do mercado interno dos serviços postais, que o objetivo básico de garantir a prestação sustentável de um serviço universal podia ser assegurado sem ser necessária uma área reservada e que, por conseguinte, «[era] conveniente pôr termo à utilização da área reservada e aos direitos especiais como modo de assegurar o financiamento do serviço universal».

34      De resto, mesmo quando continua a ser necessário um financiamento externo dos custos líquidos residuais do serviço universal, o artigo 7.o, n.os 2 a 4, da Diretiva 97/67 não menciona, entre as opções expressamente autorizadas para o financiamento do serviço universal, a atribuição de direitos exclusivos ou especiais ao operador designado.

35      As considerações precedentes não são contrariadas pelo artigo 8.o da Diretiva 97/67, nos termos do qual o disposto no artigo 7.o não prejudica o direito de os Estados‑Membros organizarem, nomeadamente a emissão de selos postais, em conformidade com a sua legislação nacional.

36      Com efeito, a emissão de meios de franquia diferentes dos selos postais, como os distribuídos pela Asendia Spain, manifestamente não está abrangida pelo âmbito de aplicação material do referido artigo 8.o, que se refere apenas à colocação de marcos e caixas de correio na via pública, à emissão de selos postais e ao serviço de correio registado utilizado em procedimentos judiciais ou administrativos.

37      Esta conclusão é, aliás, confirmada pelo facto de, por um lado, uma vez que o referido artigo 8.o introduz uma exceção à regra de princípio constante do artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva 97/67 e destinada a realizar o objetivo principal da Diretiva 2008/6, a saber, como resulta do seu próprio título, a plena realização do mercado interno dos serviços postais, o referido artigo 8.o deve ser objeto de interpretação estrita. Por outro lado, resulta do considerando 20 da Diretiva 97/67 que só por razões de ordem pública e de segurança pública, e não por qualquer outra razão relacionada com o financiamento do serviço universal, continua a competir aos Estados‑Membros designar nomeadamente uma ou mais entidades que têm o direito de emitir selos postais identificando o país de origem.

38      Resulta das considerações precedentes que há que responder à primeira questão prejudicial que o artigo 7.o, n.o 1, e o artigo 8.o da Diretiva 97/67 devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma legislação nacional, como a que está em causa no processo principal, que garante ao operador designado para a prestação do serviço postal universal um direito exclusivo para a distribuição de meios de franquia diferentes dos selos postais.

 Quanto às despesas

39      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Oitava Secção) declara:

O artigo 7.o, n.o 1, e o artigo 8.o da Diretiva 97/67/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de dezembro de 1997, relativa às regras comuns para o desenvolvimento do mercado interno dos serviços postais comunitários e a melhoria da qualidade de serviço, conforme alterada pela Diretiva 2008/6/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de fevereiro de 2008, devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma legislação nacional, como a que está em causa no processo principal, que garante ao operador designado para a prestação do serviço postal universal um direito exclusivo para a distribuição de meios de franquia diferentes dos selos postais.

Assinaturas


*      Língua do processo: espanhol.