Language of document : ECLI:EU:C:2018:646

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção)

7 de agosto de 2018 (*)

«Reenvio prejudicial — Diretiva 2001/23/CE — Âmbito de aplicação — Artigo 1.o, n.o 1 — Transferências de empresas — Manutenção dos direitos dos trabalhadores — Contrato de serviços relativos à gestão de uma escola municipal de música — Cessação da atividade do primeiro adjudicatário antes do final do ano letivo em curso e designação de um novo adjudicatário no início do ano letivo seguinte — Artigo 4.o, n.o 1 — Proibição de despedimento em razão de transferência — Exceção — Despedimentos efetuados por razões económicas, técnicas ou de organização que impliquem mudanças da força de trabalho — Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia — Artigo 47.o»

No processo C‑472/16,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Tribunal Superior de Justicia de Castilla y León (Tribunal Superior de Justiça de Castela e Leão, Espanha), por decisão de 12 de maio de 2016, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 24 de agosto de 2016, no processo

Jorge Luís Colino Sigüenza

contra

Ayuntamiento de Valladolid,

InPulso Musical SC,

Miguel del Real Llorente,Administrador Concursal de Músicos y Escuela SL,

Músicos y Escuela SL,

Fondo de Garantía Salarial (Fogasa),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),

composto por: J. L. da Cruz Vilaça, presidente de secção, E. Levits, A. Borg Barthet (relator), M. Berger e F. Biltgen, juízes,

advogado‑geral: E. Tanchev,

secretário: L. Carrasco Marco, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 27 de setembro de 2017,

vistas as observações apresentadas:

–        em representação de J. L.Colino Sigüenza, por J. M. Blanco Martín, abogado,

–        em representação da In‑Pulso Musical SC, por J. Lozano Blanco, abogado,

–        em representação do Governo espanhol, por A. Gavela Llopis, na qualidade de agente,

–        em representação da Comissão Europeia, por J. Rius e M. Kellerbauer, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 6 de dezembro de 2017,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação dos artigos 1.o, n.o 1, e 4.o, n.o 1, da Diretiva 2001/23/CE do Conselho, de 12 de março de 2001, relativa à aproximação das legislações dos Estados‑Membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas ou de estabelecimentos, ou de partes de empresas ou de estabelecimentos (JO 2001, L 82, p. 16), bem como do artigo 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta»).

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe Jorge Luís Colino Sigüenza ao Ayuntamiento de Valladolid (Município de Valladolid, Espanha), à In‑pulso Musical SC, a Miguel del Real Llorente, Administrador Concursal de Músicos y Escuela SL (na sua qualidade de administrador judicial da Músicos y Escuela), à Músicos y Escuela e ao Fondo de Garantía Salarial (Fogasa) [Fundo de Garantia Salarial (Fogasa), Espanha], a respeito da licitude do despedimento de J. L. Colino Sigüenza no âmbito de um procedimento de despedimento coletivo.

 Quadro jurídico

 Direito da União

3        A Diretiva 2001/23 codifica a Diretiva 77/187/CEE do Conselho, de 14 de fevereiro de 1977, relativa à aproximação das legislações dos Estados‑Membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas ou de estabelecimentos, ou de partes de empresas ou de estabelecimentos (JO 1977, L 61, p. 26; EE 05 F2 p. 122), conforme alterada pela Diretiva 98/50/CE do Conselho, de 29 de junho de 1998 (JO 1998, L 201, p. 88).

4        O artigo 1.o, n.o 1, da Diretiva 2001/23 dispõe:

«a)      A presente diretiva é aplicável à transferência para outra entidade patronal de uma empresa, estabelecimento ou parte de empresa ou estabelecimento, quer essa transferência resulte de uma cessão convencional quer de uma fusão.

b)      Sob reserva do disposto na alínea a) e das disposições seguintes do presente artigo, é considerada transferência, na aceção da presente diretiva, a transferência de uma entidade económica que mantém a sua identidade, entendida como um conjunto de meios organizados, com o objetivo de prosseguir uma atividade económica, seja ela essencial ou acessória.

c)      A presente diretiva é aplicável a todas as empresas, públicas ou privadas, que exercem uma atividade económica, com ou sem fins lucrativ[o]s. A reorganização administrativa de instituições oficiais ou a transferência de funções administrativas entre instituições oficiais não constituem uma transferência na aceção da presente diretiva.»

5        O artigo 3.o, n.o 1, primeiro parágrafo, desta diretiva prevê:

«Os direitos e obrigações do cedente emergentes de um contrato de trabalho ou de uma relação de trabalho existentes à data da transferência são, por esse facto, transferidos para o cessionário.»

6        Nos termos do artigo 4.o, n.o 1, primeiro parágrafo, da Diretiva 2001/23:

«A transferência de uma empresa ou estabelecimento ou de uma parte de empresa ou de estabelecimento não constitui em si mesma fundamento de despedimento por parte do cedente ou do cessionário. Esta disposição não constitui obstáculo aos despedimentos efetuados por razões económicas, técnicas ou de organização que impliquem mudanças da força de trabalho.»

 Direito espanhol

7        As regras aplicáveis aos trabalhadores em caso de transferência de entidades económicas são definidas pelo Real Decreto Legislativo 1/1995 por el que se aprueba el texto refundido de la Ley del Estatuto de los Trabajadores [Real Decreto Legislativo 1/1995, que aprova a reformulação da Lei sobre o Estatuto dos Trabalhadores], de 24 de março de 1995 (BOE n.o 75, de 29 de março de 1995, p. 9654), na sua versão resultante da Lei 12/2001, de 9 de julho de 2001 (BOE n.o 164, de 10 de julho de 2001, p. 24890) (a seguir «Estatuto dos Trabalhadores»).

8        O artigo 44.o, n.os 1 e 2, do Estatuto dos Trabalhadores dispõe:

«1.      A transferência de uma empresa, de um centro de trabalho ou de uma unidade de produção autónoma desta empresa não extingue, só por si, a relação de trabalho, ficando o novo empregador sub‑rogado nos direitos e obrigações do empregador anterior nos termos do contrato de trabalho e da segurança social, incluindo obrigações relativas a pensões nos termos previstos na respetiva legislação específica aplicável, e, em geral, todas as obrigações do cedente em matéria de proteção social complementar.

2.      Para efeitos do presente artigo, é considerada transferência a transmissão de uma entidade económica que mantém a sua identidade, entendida como um conjunto de meios organizados, com o objetivo de prosseguir uma atividade económica, seja ela essencial ou acessória.»

9        O artigo 51.o deste estatuto, sob a epígrafe «Despedimento coletivo», prevê:

«Para efeitos do disposto na presente lei, entende‑se por “despedimento coletivo” a cessação de contratos de trabalho por razões económicas, técnicas, de organização ou de produção, quando, num período de 90 dias, a cessação afete, no mínimo:

a)      10 trabalhadores, nas empresas que empreguem menos de 100 trabalhadores;

b)      10% do número de trabalhadores nas empresas que empreguem entre 100 e 300 trabalhadores;

c)      30 trabalhadores, nas empresas que empreguem mais de 300 trabalhadores.

Consideram‑se razões económicas quando os resultados da empresa revelam uma situação económica negativa, em casos caracterizados pela existência de perdas atuais ou futuras, ou pela diminuição persistente do nível de receitas correntes ou de vendas. Em todo o caso, entende‑se que a diminuição é persistente se, durante três trimestres consecutivos, o nível de receitas correntes ou de vendas de cada trimestre for inferior ao registado no mesmo trimestre do ano anterior.

[…]

É igualmente considerado despedimento coletivo a cessação dos contratos de trabalho que afete a totalidade do pessoal da empresa, sempre que o número de trabalhadores afetados seja superior a cinco, quando resultar da cessação total da atividade da empresa pelas mesmas razões que as referidas acima.

[…]

2.      O despedimento coletivo será precedido de um período de consultas aos representantes legais dos trabalhadores durante um período máximo de 30 dias de calendário ou de 15 dias, no caso das empresas com menos de 50 trabalhadores.

[…]

A autoridade de trabalho deve assegurar a eficácia do período de consultas. Se for caso disso, pode dirigir avisos e recomendações às partes que não possam, em qualquer caso, interromper nem suspender o procedimento. Além disso, sem prejuízo do número anterior, durante o período de consultas, a autoridade de trabalho pode, mediante pedido conjunto das partes, tomar medidas de mediação adequadas à procura de soluções para os problemas colocados pelo despedimento coletivo. Para os mesmos fins, a autoridade de trabalho pode igualmente prestar assistência por sua própria iniciativa ou a pedido de uma parte.

Uma vez decorrido o período de consultas, a entidade patronal comunica o resultado à autoridade de trabalho. Caso tenha sido obtido um acordo, deve ser transmitida uma cópia integral do mesmo. No caso contrário, a decisão final de despedimento coletivo adotada e as respetivas condições devem ser transmitidas aos representantes dos trabalhadores e à autoridade de trabalho.

[…]

4.      Uma vez comunicada a decisão aos representantes dos trabalhadores, a entidade patronal pode notificar os despedimentos a cada um dos trabalhadores em causa, nas condições enunciadas no artigo 53.o, n.o 1, desta lei. Em qualquer caso, devem ter decorrido, pelo menos, trinta dias entre a data da comunicação de abertura do período de consultas à autoridade de trabalho e a data em que o despedimento produza efeitos.

[…]

6.      A decisão da entidade patronal pode ser objeto dos recursos previstos para esse despedimento. A interposição de um recurso pelos representantes dos trabalhadores suspende o tratamento das ações individuais até à decisão do recurso.»

10      O despedimento coletivo é regulado pelo artigo 124.o da Ley 36/2011 reguladora de la jurisdicción social (Lei 36/2011 reguladora da jurisdição social e do trabalho), de 10 de outubro de 2011 (BOE n.o 245, de 11 de outubro de 2011, p. 106584). Na sua versão em vigor a partir de 15 de julho de 2012, este artigo, sob a epígrafe «Despedimentos coletivos por razões económicas, de organização, técnicas, de produção ou de força maior», dispõe:

«1.      A decisão da entidade patronal pode ser impugnada pelos representantes legais dos trabalhadores por via do procedimento estabelecido nos números seguintes. Quando a ação for intentada pelos delegados sindicais, estes devem ter participado de forma suficiente no procedimento de despedimento coletivo.

2.      A ação pode ser baseada nos seguintes fundamentos:

a)      não se verifica o fundamento jurídico indicado na comunicação escrita;

b)      não decorreu o período de consultas, não foram apresentados os documentos referidos no artigo 51.o, n.o 2, do Estatuto dos Trabalhadores ou não foi cumprido o procedimento previsto no artigo 51.o, n.o 7, deste estatuto;

c)      a decisão de despedimento foi adotada por fraude, dolo, coação ou abuso de direito;

d)      a decisão de despedimento foi adotada em violação dos direitos fundamentais e das liberdades civis.

Os pedidos relativos à não aplicação das regras de prioridade de manutenção do emprego previstas na legislação, nos acordos coletivos ou no acordo adotado durante o período de consultas não podem, em qualquer caso, ser objeto deste processo. Esses pedidos devem ser apresentados no âmbito do processo individual referido no n.o 11 deste artigo.

[…]

6.      A ação deve ser intentada num prazo perentório de 20 dias a partir da data do acordo celebrado durante o período de consultas ou da notificação aos representantes dos trabalhadores da decisão de despedimento coletivo adotada pela entidade patronal.

[…]

9.      Uma vez declarada admissível, a Secretaria notifica‑a à entidade patronal demandada e solicita‑lhe que apresente, num prazo de 5 dias e de preferência através de suporte informático, os documentos e as atas do período de consultas, bem como a comunicação do resultado deste período à autoridade de trabalho.

Neste mesmo requerimento, a Secretaria fixa um prazo de 5 dias para a entidade patronal dar conhecimento da existência da ação intentada pelos representantes dos trabalhadores afetados pelo despedimento coletivo para que estes comuniquem ao órgão jurisdicional, num prazo de 15 dias, um endereço para efeitos de notificação da sentença.

[…]

11.      A sentença é proferida nos 5 dias seguintes à audiência e pode ser objeto de recurso.

A decisão de despedimento é declarada válida quando, em conformidade com o artigo 51.o, n.os 2 ou 7, do Estatuto dos Trabalhadores, a entidade patronal demonstra a existência do fundamento jurídico invocado.

A sentença declara a invalidade da decisão de despedimento quando a entidade patronal não demonstrar a existência do fundamento jurídico indicado na carta de despedimento.

[…]

12.      Uma vez transitada em julgado, a sentença é notificada às partes e aos trabalhadores afetados pelo despedimento coletivo que comunicaram o seu endereço ao órgão jurisdicional para efeitos das notificações, para os fins previstos no n.o 13, alínea b), deste artigo.

A sentença transitada em julgado é notificada para conhecimento da autoridade de trabalho, do fundo de desemprego e da administração da segurança social quando não tenham sido partes no processo.

13.      Quando o processo tenha por objeto a impugnação individual da rescisão do contrato de trabalho no Juzgado de lo Social [(Tribunal do Trabalho, Espanha)], os artigos 120.o a 123.o desta lei aplicam‑se com as seguintes especificações:

a)      quando o debate tenha por objeto a prioridade concedida a determinados trabalhadores, a ação deve ser igualmente intentada contra eles.

A ação deve ser igualmente intentada contra os representantes dos trabalhadores quando a medida tenha sido tomada com o seu consentimento, desde que os que não assinaram o acordo não tenham impugnado a decisão de despedimento nos termos dos números anteriores;

b)      se, nos termos dos números anteriores, os representantes dos trabalhadores intentarem uma ação contra a decisão da entidade patronal após a abertura do processo individual, esse processo é suspenso até que seja proferida a decisão no processo intentado pelos representantes dos trabalhadores, que, uma vez transitada em julgado, terá força de caso julgadorelativamente ao processo individual, nos termos previstos no artigo 160.o, n.o 5, da presente lei;

c)      além dos fundamentos referidos no artigo 122.o, n.o 2, da presente lei, o despedimento é nulo quando a entidade patronal não tenha aberto o período de consultas, apresentado os documentos referidos no artigo 51.o, n.o 2, do Estatuto dos Trabalhadores, cumprido o procedimento previsto no artigo 51.o, n.o 7, deste estatuto nem obtido a autorização judicial do juiz de insolvência no caso em que é exigida por lei.

É igualmente nula a rescisão do contrato por iniciativa da entidade patronal sem respeitar as prioridades de manutenção de postos de trabalho que podem resultar da legislação, das convenções coletivas ou do acordo celebrado aquando do período de consultas. Esta nulidade não se estende às rescisões de contratos ocorridas durante o mesmo despedimento coletivo que tenham cumprido as prioridades de manutenção de postos de trabalho.»

11      O artigo 160.o, n.o 5, desta lei prevê:

«A decisão final tem força de caso julgado relativamente às ações individuais pendentes ou que possam ser instauradas e que tenham o mesmo objeto do litígio ou que estejam diretamente relacionadas com o mesmo, independentemente de serem ações apresentadas junto dos tribunais do trabalho ou dos tribunais administrativos. Esses processos devem, por conseguinte, ser suspensos enquanto o processo coletivo corre termos. A suspensão é ordenada, independentemente de a decisão ter sido proferida em primeira instância e da pendência de um recurso ou de um recurso de cassação, estando o tribunal competente vinculado pela decisão final proferida no processo coletivo, ainda que o caráter contraditório ou incongruente dessa decisão final não tenha sido invocado no processo de recurso interposto no Tribunal Supremo [(Supremo Tribunal, Espanha)] cuja finalidade é assegurar a consistência da jurisprudência.»

 Litígio no processo principal e questões prejudiciais

12      J. L. Colino Sigüenza prestou serviços na qualidade de professor de música na Escola Municipal de Música de Valladolid (Espanha) desde 11 de novembro de 1996. Inicialmente, esta escola era gerida diretamente pelo Município de Valladolid, de forma que J. L. Colino Sigüenza começou por ser contratado por este último.

13      A partir de 1997, o Município de Valladolid deixou de efetuar a gestão direta da referida escola e abriu sucessivos concursos públicos para a contratação desse serviço. O adjudicatário escolhido no final desses procedimentos sucessivos foi, de forma ininterrupta desde esse momento até 31 de agosto de 2013, a Músicos y Escuela, que continuou a atividade da escola ao assumir a gestão das instalações, instrumentos e meios úteis à prestação desse serviço. A Músicos y Escuela também reintegrou uma parte dos trabalhadores que tinham sido contratados pelo referido município, entre os quais J. L. Colino Sigüenza. Esta atividade continuou a ser considerada um serviço prestado aos cidadãos pelo Município de Valladolid, enquanto Escola Municipal de Música.

14      Devido à diminuição do número de alunos da Escola Municipal de Música de Valladolid durante o ano letivo de 2012/2013, as propinas pagas pelos alunos por esse serviço já não eram adequadas ao montante da contrapartida a cargo do Município de Valladolid ao abrigo do contrato celebrado com a Músicos y Escuela, o que levou esta última a reclamar ao referido município o montante de 58 403,73 euros para o primeiro trimestre desse ano letivo e de 48 592,74 euros para o segundo trimestre do mesmo.

15      Tendo o Município de Valladolid recusado pagar esses montantes, a Músicos y Escuela requereu, em 19 de fevereiro de 2013, a rescisão do contrato de adjudicação do serviço por incumprimento do referido município, exigindo a correspondente indemnização. Em resposta, esse município rescindiu o contrato, em agosto de 2013, alegando incumprimento da Músicos y Escuela por ter cessado as suas atividades antes do termo acordado. O processo foi remetido para a Sala de lo Contencioso‑Administrativo du Tribunal Superior de Justicia de Castilla y León (Secção do Contencioso Administrativo do Tribunal Superior de Justiça de Castela e Leão, Espanha) que, através de várias sentenças transitadas em julgado proferidas durante os anos de 2014 e 2015, decidiu, por um lado, que o Município de Valladolid tinha violado o contrato celebrado com a Músicos y Escuela, na medida em que este previa uma garantia de receita independentemente do número de alunos matriculados, e que, ao não cumpri‑la, o próprio município tinha impedido a continuação das atividades da Músicos y Escuela, justificando assim a rescisão desse contrato em razão do seu incumprimento. Por outro lado, uma vez que a Músicos y Escuela não cumpriu as suas obrigações ao ter decidido unilateralmente cessar as suas atividades em 31 de março de 2013, foi‑lhe recusada a indemnização que reclamava.

16      Entretanto, em 4 de março de 2013, a Músicos y Escuela iniciou o período de negociação e consulta necessário para proceder ao despedimento coletivo do conjunto do seu pessoal devido à situação económica resultante do conflito com o Município de Valladolid. Em 27 de março de 2013, na falta de acordo com os representantes dos trabalhadores, a Músicos y Escuela tomou a decisão de despedir coletivamente todo o seu pessoal.

17      Em 31 de março de 2013, ou seja, alguns meses antes do final do ano letivo em curso, a Músicos y Escuela cessou a sua atividade e, a partir de 1 de abril, devolveu ao Município de Valladolid as instalações, instrumentos e meios adstritos ao funcionamento da Escola Municipal de Música de Valladolid cuja gestão lhe havia sido confiada. Em 4 de abril de 2013, a Músicos y Escuela entregou uma carta de despedimento a todo o seu pessoal, incluindo a J. L. Colino Sigüenza, com efeitos a partir de 8 de abril de 2013. Esta sociedade foi declarada insolvente em 30 de julho de 2013.

18      Sendo apenas admitido aos representantes dos trabalhadores da Músicos y Escuela, segundo a Lei reguladora da jurisdição social e do trabalho, intentar uma ação no âmbito de um despedimento coletivo, estes impugnaram a decisão de despedimento coletivo na Sala de lo Social de Valladolid du Tribunal Superior de Justicia de Castilla y León (Secção do Trabalho de Valladolid do Tribunal Superior de Justiça de Castela e Leão, Espanha), que, por Decisão de 19 de junho de 2013, julgou o pedido improcedente.

19      Os representantes dos trabalhadores recorreram dessa decisão para o Tribunal Supremo (Supremo Tribunal), que, por Acórdão de 17 de novembro de 2014, também negou provimento ao recurso. Esse acórdão transitou em julgado.

20      Entretanto, em agosto de 2013, o Município de Valladolid adjudicou a gestão da Escola Municipal de Música de Valladolid à In‑pulso Musical e confiou‑lhe, tal como o tinha feito com a Músicos y Escuela, a utilização das instalações, dos instrumentos e dos meios necessários a esse fim. A In‑pulso Musical iniciou as suas atividades em setembro de 2013, para o ano letivo de 2013/2014. Na sequência de um novo concurso público, o Município de Valladolid adjudicou, uma vez mais, à In‑pulso Musical, na qualidade de adjudicatário, esse contrato para os anos letivos de 2014/2015 e de 2015/2016. Esta sociedade não contratou nenhum dos trabalhadores que antes trabalhavam na referida escola municipal de música e que foram despedidos coletivamente pela Músicos y Escuela.

21      J. L. Colino Sigüenza intentou, a título individual, uma ação no Juzgado de lo Social n.o 4 de Valladolid (Tribunal do Trabalho n.o 4 de Valladolid, Espanha) contra a Músicos y Escuela, o Município de Valladolid e a In‑pulso Musical no sentido de impugnar o seu despedimento.

22      Por Acórdão de 30 de setembro de 2015, esse órgão jurisdicional julgou improcedente o pedido de J. L. Colino Sigüenza com o fundamento de que a força de caso julgado do Acórdão do Tribunal Supremo (Supremo Tribunal) de 17 de novembro de 2014, que julgou improcedente a ação intentada pelos representantes dos trabalhadores contra o despedimento coletivo, o vincula no que diz respeito à ação individual intentada pelo interessado contra o seu despedimento, apesar de este último não ter sido parte, a título individual, no processo que está na origem desse acórdão. Além disso, o Juzgado de lo Social n.o 4 de Valladolid (Tribunal do Trabalho n.o 4 de Valladolid) considerou que a In‑pulso Musical não tinha sucedido à Músicos y Escuela como empregador de J. L. Colino Sigüenza, na medida em que decorreram quase cinco meses entre o seu despedimento e a tomada da gestão da Escola Municipal de Música de Valladolid pela In‑pulso Musical.

23      J. L. Colino Sigüenza recorreu dessa decisão para o órgão jurisdicional de reenvio, o Tribunal Superior de Justicia de Castilla y León (Tribunal Superior de Justiça de Castela e Leão, Espanha).

24      Em apoio do seu recurso, alega, em substância, por um lado, que a força de caso julgado do Acórdão do Tribunal Supremo (Supremo Tribunal) de 17 de novembro de 2014, que julgou improcedente a ação intentada contra o despedimento coletivo, não o pode afetar, a título individual, na medida em que não foi parte nesse processo, pelo que essa extensão da força de caso julgado viola o seu direito a um recurso judicial efetivo, garantido pelo artigo 47.o da Carta. Por outro lado, alega que ocorreu, no caso em apreço, uma transferência de empresa a favor da In‑pulso Musical, pelo que esta operação não pode justificar a rescisão do seu contrato de trabalho.

25      Esse órgão jurisdicional interroga‑se, por conseguinte, em substância, por um lado, quanto à questão de saber se a interrupção temporária, pela Músicos y Escuela, das suas prestações de serviços entre 1 de abril de 2013 e o início do mês de setembro de 2013, data em que a gestão da Escola Municipal de Música de Valladolid foi tomada pela In‑pulso Musical, obsta a que seja demonstrado que se trata uma «transferência» de empresa ou de estabelecimento, na aceção do artigo 1.o da Diretiva 2001/23, e, por outro, se, numa situação como aquela que lhe foi submetida, a aplicação da legislação nacional relativa à força de caso julgado tem por efeito violar o direito a um recurso efetivo de J. L. Colino Sigüenza.

26      Nestas circunstâncias, o Tribunal Superior de Justicia de Castilla y León (Tribunal Superior de Justiça de Castela e Leão) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      Deve considerar‑se que existe uma “transferência” para efeitos da Diretiva [2001/23] quando o titular de uma concessão de uma Escola de Música de [um município], que recebe todos os meios materiais [desse município] (instalações, instrumentos, salas de aula, mobiliário), contrata o seu próprio pessoal e presta os seus serviços por anos letivos, abandona a atividade em 1 de abril de 2013, dois meses antes do fim do ano letivo, restituindo todos os meios materiais [ao município], que não retoma a atividade para completar o ano letivo [de] 2012/13, mas efetua uma nova adjudicação a um novo prestador, que retoma a atividade em setembro de 2013, no início do novo ano letivo [de] 2013/14, transferindo [o município], para esse efeito, para o novo prestador, os meios materiais necessários de que antes dispunha o anterior prestador (instalações, instrumentos, salas de aula, mobiliário)?

2)      Em caso de resposta afirmativa à questão anterior, nas condições descritas, em que o incumprimento das suas obrigações por parte da empresa principal ([município]) obriga o primeiro prestador a cessar a sua atividade e despedir todo o seu pessoal e depois essa empresa principal transfere os meios materiais para um segundo prestador, que prossegue com a mesma atividade, deve interpretar‑se, para efeitos do artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva [2001/23], que o despedimento dos trabalhadores do primeiro prestador foi efetuado por “razões económicas, técnicas ou de organização que impliquem mudanças da força de trabalho” ou que o fundamento do mesmo foi “[a] transferência de uma empresa ou estabelecimento ou de uma parte de em[pr]esa ou de estabelecimento”, proibida pelo referido artigo?

3)      Se a resposta à questão anterior for que o fundamento do despedimento foi a transferência e, portanto, contrário à Diretiva [2001/23], deve o artigo 47.o da [Carta] ser interpretado no sentido de que impede que a legislação nacional proíba um juiz ou tribunal de decidir sobre o mérito das alegações de um trabalhador que impugna o seu despedimento num processo individual, efetuado no quadro de um despedimento coletivo, para defender os direitos que decorram da aplicação das Diretivas 2001/23 […] e 98/59/CE do Conselho, de 20 de julho de 1998, relativa à aproximação das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos despedimentos coletivos [JO 1998, L 225, p. 16], pelo facto de ter sido proferida uma decisão anterior transitada em julgado sobre o despedimento coletivo num processo em que o trabalhador não tenha podido ser parte, ainda que o tenham sido ou tenham podido ser os sindicatos com implantação na empresa e/ou os representantes legais coletivos dos trabalhadores?»

 Quanto às questões prejudiciais

 Quanto à primeira questão

27      Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 1.o, n.o 1, da Diretiva 2001/23 deve ser interpretado no sentido de que é suscetível de ser abrangida pelo âmbito de aplicação desta diretiva uma situação como a que está em causa no processo principal, em que o adjudicatário de um contrato público de serviços relativo à gestão de uma escola municipal de música, ao qual o município tinha fornecido todos os meios materiais necessários ao exercício desta atividade, põe termo à mesma dois meses antes do final do ano letivo em curso, procedendo ao despedimento do pessoal e devolvendo esses meios materiais ao município, que procede a uma nova adjudicação apenas para o ano letivo seguinte e fornece ao novo adjudicatário os mesmos meios materiais.

28      A título preliminar, há que recordar que o Tribunal de Justiça declarou que o âmbito de aplicação da Diretiva 2001/23 se estende a todas as situações de mudança, no âmbito de relações contratuais, da pessoa singular ou coletiva responsável pela exploração da empresa, que, por esse facto, contrai as obrigações de entidade patronal relativamente aos empregados da empresa, sem que tenha importância saber se a propriedade dos elementos corpóreos é transmitida (Acórdão de 26 de novembro de 2015, Aira Pascual e Algeposa Terminales Ferroviarios, C‑509/14, EU:C:2015:781, n.o 28 e jurisprudência referida).

29      Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, a Diretiva 2001/23 visa assegurar a continuidade das relações de trabalho existentes no quadro de uma entidade económica, independentemente da mudança de proprietário. O critério decisivo para demonstrar a existência de uma transferência, na aceção dessa diretiva, consiste na circunstância de a entidade em questão preservar a sua identidade, o que resulta, designadamente, da prossecução efetiva da exploração ou da sua retoma (Acórdão de 9 de setembro de 2015, Ferreira da Silva e Brito e o., C‑160/14, EU:C:2015:565, n.o 25 e jurisprudência referida).

30      Para determinar se este requisito está preenchido, há que tomar em consideração o conjunto das circunstâncias de facto que caracterizam a operação em causa, entre as quais figuram, designadamente, o tipo de empresa ou de estabelecimento de que se trata, a transferência ou não de elementos corpóreos, tais como os edifícios e os bens móveis, o valor dos elementos incorpóreos no momento da transferência, a reintegração ou não, por parte do novo empresário, do essencial dos efetivos, a transferência ou não da clientela, bem como o grau de similitude das atividades exercidas antes e depois da transferência e a duração de uma eventual suspensão destas atividades. Entende‑se que estes elementos constituem, contudo, apenas aspetos parciais da avaliação de conjunto que se impõe e não podem, por isso, ser apreciados isoladamente (Acórdão de 9 de setembro de 2015, Ferreira da Silva e Brito e o., C‑160/14, EU:C:2015:565, n.o 26 e jurisprudência referida).

31      Em especial, o Tribunal de Justiça sublinhou que a importância respetiva a atribuir aos diferentes critérios varia necessariamente em função da atividade exercida, ou mesmo dos métodos de produção ou de exploração utilizados na empresa, no estabelecimento ou na parte do estabelecimento em questão (Acórdão de 9 de setembro de 2015, Ferreira da Silva e Brito e o., C‑160/14, EU:C:2015:565, n.o 27 e jurisprudência referida).

32      O Tribunal de Justiça declarou, a este respeito, que, num setor em que a atividade assenta essencialmente na mão de obra, a identidade de uma entidade económica não pode ser mantida se o essencial dos seus efetivos não for integrado pelo presumido cessionário (Acórdão de 26 de novembro de 2015, Aira Pascual e Algeposa Terminales Ferroviarios, C‑509/14, EU:C:2015:781, n.o 35 e jurisprudência referida).

33      Em contrapartida, num setor em que a atividade se baseia essencialmente nos equipamentos, o facto de o novo empresário não ter integrado uma parte essencial dos efetivos que o seu antecessor empregava na execução da mesma atividade não basta para excluir a existência de transferência de uma entidade que mantém a sua identidade na aceção da Diretiva 2001/23 (v., neste sentido, Acórdão de 26 de novembro de 2015, Aira Pascual e Algeposa Terminales Ferroviarios, C‑509/14, EU:C:2015:781, n.o 41).

34      É à luz destes ensinamentos jurisprudenciais que deve ser apreciada a questão submetida, tendo em conta os principais elementos de facto indicados pelo órgão jurisdicional nacional na decisão de reenvio.

35      Em primeiro lugar, importa sublinhar que, numa situação como a que está em causa no processo principal, os meios materiais, tais como os instrumentos musicais, os equipamentos e as instalações, surgem como elementos indispensáveis ao exercício da atividade económica em causa, sendo esta relativa à gestão de uma escola de música. Ora, no caso em apreço, é pacífico que o Município de Valladolid colocou à disposição do novo adjudicatário o conjunto dos meios materiais que tinha fornecido ao adjudicatário anterior.

36      Além disso, uma vez que a atividade económica em causa no processo principal não parece poder ser considerada uma atividade que assenta essencialmente na mão de obra, na medida em que requer equipamentos importantes, a mera circunstância de a In‑pulso Musical não ter reintegrado os trabalhadores da Músicos y Escuela não permite excluir a existência de uma transferência de empresa, na aceção da Diretiva 2001/23.

37      Em seguida, no que diz respeito à circunstância de todos os elementos corpóreos indispensáveis ao exercício da atividade em causa no processo principal terem pertencido sempre ao Município de Valladolid, importa recordar que, como resulta do n.o 28 deste acórdão, a questão de saber se a propriedade dos elementos corpóreos é transferida não é pertinente para efeitos da aplicação da Diretiva 2001/23.

38      A este respeito, o Tribunal de Justiça declarou, em especial, que a circunstância de os elementos corpóreos assumidos pelo novo empregador não pertencerem ao seu antecessor, mas terem sido simplesmente colocados à disposição pelo cedente, não pode levar a excluir a existência de uma transferência de empresa na aceção da referida diretiva (Acórdão de 26 de novembro de 2015, Aira Pascual e Algeposa Terminales Ferroviarios, C‑509/14, EU:C:2015:781, n.o 39 e jurisprudência referida).

39      Daqui resulta que uma interpretação do artigo 1.o, n.o 1, alínea b), da Diretiva 2001/23 que excluísse do âmbito de aplicação dessa diretiva uma situação em que os elementos corpóreos indispensáveis ao desenvolvimento da atividade em questão nunca deixaram de pertencer ao cessionário (o Município de Valladolid) privaria a referida diretiva de uma parte do seu efeito útil (v. Acórdão de 26 de novembro de 2015, Aira Pascual e Algeposa Terminales Ferroviarios, C‑509/14, EU:C:2015:781, n.o 40).

40      Por último, outros elementos apresentados ao Tribunal de Justiça corroboram, tendo em conta os critérios recordados no n.o 30 do presente acórdão, a existência, no processo principal, de uma «transferência de empresa» na aceção do artigo 1.o, n.o 1, da Diretiva 2001/23. O mesmo se aplica à reintegração dos alunos da Músicos y Escuela pela In‑pulso Musical e à retomada por esta última, a partir de setembro de 2013, dos serviços prestados pela Músicos y Escuela até 1 de abril de 2013.

41      Além disso, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que a suspensão temporária, durante apenas alguns meses, das atividades da empresa não é suscetível de excluir que a entidade económica em causa no processo principal tenha mantido a sua identidade e, por conseguinte, de afastar a existência de uma transferência de empresa, na aceção da mesma diretiva (v., neste sentido, Acórdão de 9 de setembro de 2015, Ferreira da Silva e Brito e o., C‑160/14, EU:C:2015:565, n.o 31).

42      A este respeito, o Tribunal de Justiça declarou nomeadamente que o facto de a empresa estar, no momento da transferência, temporariamente encerrada e não ter trabalhadores ao seu serviço constitui evidentemente um elemento a ter em consideração para decidir se uma entidade económica ainda existente foi transferida. Todavia, o encerramento temporário da empresa e a consequente ausência de pessoal no momento da transferência não são, por si sós, suscetíveis de excluir a existência de uma transferência de empresa na aceção do artigo 1.o, n.o 1, da Diretiva 2001/23 (Acórdão de 15 de junho de 1988, Bork International e o., 101/87, EU:C:1988:308, n.o 16 e jurisprudência referida).

43      Esta conclusão impõe‑se nomeadamente numa situação como a que está em causa no processo principal, em que, apesar de a interrupção da atividade da empresa se ter prolongado por um período de cinco meses, este compreendia três meses de férias escolares.

44      Por conseguinte, a suspensão temporária das atividades da empresa e a não reintegração dos trabalhadores da Músicos y Escuela pela In‑pulso Musical não são suscetíveis de excluir que a entidade económica em causa no processo principal tenha mantido a sua identidade e, consequentemente, de afastar a existência de uma transferência de empresa, na aceção desta diretiva.

45      Em definitivo, caberá ao órgão jurisdicional de reenvio determinar, à luz das considerações precedentes, e tendo em conta o conjunto das circunstâncias de facto que caracterizam a operação em questão, a existência ou não uma transferência de empresa no processo principal.

46      Nestas circunstâncias, há que responder à primeira questão que o artigo 1.o, n.o 1, da Diretiva 2001/23 deve ser interpretado no sentido de que é suscetível de ser abrangida pelo âmbito de aplicação desta diretiva uma situação, como a que está em causa no processo principal, em que o adjudicatário de um contrato público de serviços relativos à gestão de uma escola municipal de música, a quem o município tinha fornecido todos os meios materiais necessários ao exercício dessa atividade, põe termo à mesma dois meses antes do final do ano letivo em curso, procedendo ao despedimento do pessoal e devolvendo esses meios materiais ao município, que procede a uma nova adjudicação apenas para o ano letivo seguinte e fornece ao novo adjudicatário os mesmos meios materiais.

 Quanto à segunda questão

47      Com a sua segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva 2001/23 deve ser interpretado no sentido de que, em circunstâncias como as que estão em causa no processo principal, em que o adjudicatário de um contrato público de serviços relativos à gestão de uma escola municipal de música põe termo a essa atividade dois meses antes do fim do ano letivo em curso e procede ao despedimento do pessoal, sendo a atividade retomada pelo novo adjudicatário no início do ano letivo seguinte, o despedimento dos trabalhadores deve ser considerado como tendo sido efetuado por «razões económicas, técnicas ou de organização que impliquem mudanças da força de trabalho» ou que a causa deste despedimento foi «a transferência de uma empresa ou estabelecimento ou de uma parte de empresa ou de estabelecimento».

48      A título preliminar, há que recordar que, como o Tribunal de Justiça tem vindo a decidir reiteradamente, a Diretiva 2001/23 tem por objetivo assegurar a manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de mudança de empresário, permitindo‑lhes ficar ao serviço da nova entidade patronal nas mesmas condições que as acordadas com o cedente (Acórdão de 27 de novembro de 2008, Juuri, C‑396/07, EU:C:2008:656, n.o 28 e jurisprudência referida). A finalidade da referida diretiva é assegurar, tanto quanto possível, a continuação dos contratos ou das relações de trabalho com o cessionário, sem modificação, a fim de impedir que os trabalhadores em causa sejam colocados numa posição menos favorável apenas por causa dessa transferência (Acórdãos de 17 de dezembro de 1987, Ny Mølle Kro, 287/86, EU:C:1987:573, n.o 25, e de 26 de maio de 2005, Celtec, C‑478/03, EU:C:2005:321, n.o 26).

49      Assim sendo, como decorre da própria redação do artigo 3.o, n.o 1, primeiro parágrafo, da Diretiva 2001/23, a proteção que a referida diretiva visa assegurar só diz respeito aos trabalhadores que tenham um contrato de trabalho ou uma relação de trabalho existente à data da transferência.

50      Neste contexto, importa recordar que, segundo jurisprudência do Tribunal de Justiça, salvo disposição específica em contrário, o benefício da Diretiva 2001/23 apenas pode ser invocado pelos trabalhadores cujo contrato ou relação de trabalho subsista à data da transferência. A existência ou não de um contrato ou de uma relação de trabalho nessa data deve ser apreciada à luz do direito nacional, sob reserva, todavia, do respeito pelas regras imperativas desta diretiva relativas à proteção dos trabalhadores contra os despedimentos resultantes de uma transferência (Acórdão de 15 de junho de 1988, Bork International e o., 101/87, EU:C:1988:308, n.o 17).

51      Relativamente a esta questão, há que salientar que, nos termos do artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva 2001/23, a transferência de uma empresa ou estabelecimento ou de uma parte de empresa ou de estabelecimento não constitui em si mesma fundamento de despedimento por parte do cedente ou do cessionário.

52      Por conseguinte, os trabalhadores cujo contrato ou relação de trabalho tenham cessado com efeitos a uma data anterior à da transferência, em violação do artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva 2001/23, devem ser considerados como continuando ao serviço da empresa na data da transferência, com a consequência, designadamente, de as obrigações da entidade patronal relativamente a eles se transferirem automaticamente do cedente para o cessionário (Acórdão de 12 de março de 1998, Dethier Équipement, C‑319/94, EU:C:1998:99, n.o 35 e jurisprudência referida).

53      Para determinar se o despedimento se ficou unicamente a dever à transferência, contrariamente ao que dispõe o artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva 2001/23, há que ponderar as circunstâncias objetivas em que o despedimento ocorreu (Acórdão de 15 de junho de 1988, Bork International e o., 101/87, EU:C:1988:308, n.o 18).

54      A este respeito, é especificado na decisão de reenvio que o despedimento de J. L. Colino Sigüenza ocorreu numa data bem anterior à da transferência de atividade para a In‑pulso Musical e que essa rutura da relação de trabalho foi motivada pela impossibilidade de a Músicos y Escuela remunerar o seu pessoal, situação que resulta de uma violação, pelo Município de Valladolid, das disposições do contrato que o vincula à Músicos y Escuela. Assim, estas circunstâncias parecem militar a favor de uma qualificação do despedimento do pessoal da Músicos y Escuela por «razões económicas, técnicas ou de organização», na aceção do artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva 2001/23, na medida em que, contudo, as circunstâncias que levaram ao despedimento de todo o pessoal e a adjudicação tardia do novo prestador de serviços não constituem uma medida deliberada com vista a privar os trabalhadores em causa dos direitos conferidos pela Diretiva 2001/23, o que caberá ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

55      Tendo em conta as considerações precedentes, há que responder à segunda questão que o artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva 2001/23 deve ser interpretado no sentido de que, em circunstâncias como as que estão em causa no processo principal, em que o adjudicatário de um contrato público de serviços relativos à gestão de uma escola municipal de música põe termo a essa atividade dois meses antes do final do ano letivo e procede ao despedimento do pessoal, sendo a atividade retomada pelo novo adjudicatário no início do ano letivo seguinte, se afigura que o despedimento dos trabalhadores foi efetuado por «razões económicas, técnicas ou de organização que impliquem mudanças da força de trabalho», na aceção desta disposição, na medida em que as circunstâncias que deram lugar ao despedimento do conjunto de trabalhadores e a adjudicação tardia de um novo prestador de serviços não fazem parte de uma medida deliberada com vista a privar esses trabalhadores dos direitos conferidos pela Diretiva 2001/23, o que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

 Quanto à terceira questão

56      Com a sua terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se a Diretiva 2001/23 e o direito a um recurso efetivo, consagrado no artigo 47.o da Carta, devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma regulamentação nacional relativa à força de caso julgado, como a que está em causa no processo principal, que proíbe aos órgãos jurisdicionais nacionais de se pronunciarem sobre a impugnação, baseada na Diretiva 2001/23, do despedimento individual do trabalhador ocorrido no âmbito de um despedimento coletivo, quando já tiver sido proferida uma decisão judicial num processo relativo a esse despedimento coletivo, no âmbito da qual apenas podem intervir os representantes dos trabalhadores.

57      Importa recordar que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o processo instituído no artigo 267.o TFUE é um instrumento de cooperação entre o Tribunal de Justiça e os órgãos jurisdicionais nacionais, graças ao qual o primeiro fornece aos segundos os elementos de interpretação do direito da União que lhes são necessários para a resolução do litígio que lhes cabe decidir (v., designadamente, Acórdãos de 16 de julho de 1992, Meilicke, C‑83/91, EU:C:1992:332, n.o 22, e de 24 de março de 2009, Danske Slagterier, C‑445/06, EU:C:2009:178, n.o 65).

58      No âmbito desta cooperação, cabe ao juiz nacional a quem foi submetido o litígio, que é o único que tem um conhecimento direto dos factos que lhe estão subjacentes e que deve assumir a responsabilidade pela decisão judicial a tomar, apreciar, tendo em conta as especificidades do processo, tanto a necessidade de uma decisão prejudicial para poder proferir a sua decisão como a pertinência das questões que submete ao Tribunal. Consequentemente, desde que as questões colocadas pelo juiz nacional sejam relativas à interpretação do direito da União, o Tribunal de Justiça é, em princípio, obrigado a decidir (v., designadamente, Acórdãos de 13 de março de 2001, PreussenElektra, C‑379/98, EU:C:2001:160, n.o 38; de 6 de dezembro de 2001, Clean Car Autoservice, C‑472/99, EU:C:2001:663, n.o 13; e de 5 de fevereiro de 2004, Schneider, C‑380/01, EU:C:2004:73, n.o 21).

59      No entanto, a necessidade de obter uma interpretação do direito da União que seja útil ao juiz nacional exige que este defina o quadro factual e regulamentar em que se inserem as questões que submete ou que, pelo menos, explique as hipóteses factuais em que essas questões assentam (v., designadamente, Acórdão de 26 de janeiro de 1993, Telemarsicabruzzo e o., C‑320/90 a C‑322/90, EU:C:1993:26, n.o 6, e Despacho de 13 de julho de 2006, Eurodomus, C‑166/06, não publicado, EU:C:2006:485, n.o 9).

60      Há que salientar que a decisão de reenvio não inclui informações suficientes no que diz respeito ao quadro jurídico nacional pertinente. Com efeito, o órgão jurisdicional de reenvio não apresenta nenhuma informação quanto à aplicação do princípio da força de caso julgado, na aceção do artigo 124.o, n.o 13, alínea b), da Lei 36/2011 reguladora da jurisdição social e do trabalho.

61      Além disso, o artigo 160.o, n.o 5, desta lei, para o qual remete o seu artigo 124.o, n.o 13, alínea b), dispõe que a força de caso julgado é limitada ao objeto do processo. Ora, por um lado, a decisão de reenvio não inclui nenhuma informação sobre o artigo 160.o, n.o 5, da referida lei e, por outro, como salientou o Governo espanhol na audiência, para examinar se o objeto do processo é idêntico, no presente caso, dada a natureza coletiva tanto do despedimento como da transferência que diz respeito a todo o pessoal, há que tomar em consideração igualmente outras disposições do direito processual espanhol.

62      Nestas condições, uma vez que o Tribunal de Justiça não dispõe dos elementos necessários para responder utilmente à terceira questão, esta deve ser declarada inadmissível.

 Quanto às despesas

63      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quinta Secção) declara:

1)      O artigo 1.o, n.o 1, da Diretiva 2001/23/CE do Conselho, de 12 de março de 2001, relativa à aproximação das legislações dos EstadosMembros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas ou de estabelecimentos, ou de partes de empresas ou de estabelecimentos, deve ser interpretado no sentido de que é suscetível de ser abrangida pelo âmbito de aplicação desta diretiva uma situação, como a que está em causa no processo principal, em que o adjudicatário de um contrato público de serviços relativos à gestão de uma escola municipal de música, a quem o município tinha fornecido todos os meios materiais necessários ao exercício desta atividade, põe termo à mesma dois meses antes do final do ano letivo em curso, procedendo ao despedimento do pessoal e devolvendo esses meios materiais ao município, que procede a uma nova adjudicação apenas para o ano letivo seguinte e fornece ao novo adjudicatário os mesmos meios materiais.

2)      O artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva 2001/23 deve ser interpretado no sentido de que, em circunstâncias como as que estão em causa no processo principal, em que o adjudicatário de um contrato público de serviços relativos à gestão de uma escola municipal de música põe termo a essa atividade dois meses antes do final do ano letivo e procede ao despedimento do pessoal, sendo a atividade retomada pelo novo adjudicatário no início do ano letivo seguinte, se afigura que o despedimento dos trabalhadores foi efetuado por «razões económicas, técnicas ou de organização que impliquem mudanças da força de trabalho», na aceção desta disposição, na medida em que as circunstâncias que deram lugar ao despedimento do conjunto de trabalhadores e a adjudicação tardia de um novo prestador de serviços não fazem parte de uma medida deliberada com vista a privar esses trabalhadores dos direitos conferidos pela Diretiva 2001/23, o que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

Assinaturas


*      Língua do processo: espanhol.