ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)

24 de setembro de 2019 (*)

«Reenvio prejudicial — Dados pessoais — Proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento destes dados que figuram em páginas web — Diretiva 95/46/CE — Regulamento (UE) 2016/679 — Motores de busca na Internet — Tratamento dos dados contidos em sítios web — Categorias de dados específicos visadas no artigo 8.o desta diretiva e nos artigos 9.o e 10.o deste regulamento — Aplicabilidade destes artigos ao operador do motor de busca — Âmbito das obrigações deste operador face aos referidos artigos — Publicação dos dados em sítios web apenas para fins jornalísticos ou de expressão artística ou literária — Impacto no tratamento de um pedido de supressão de referências — Artigos 7.o, 8.o e 11.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia»

No processo C‑136/17,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Conseil d’État (Conselho de Estado, em formação jurisdicional, França), por Decisão de 24 de fevereiro de 2017, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 15 de março de 2017, no processo

GC,

AF,

BH,

ED

contra

Commission nationale de l'informatique et des libertés (CNIL),

sendo intervenientes:

Premier ministre,

Google LLC, sucessora da Google Inc.,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção),

composto por: K. Lenaerts, presidente, A. Arabadjiev, A. Prechal, T. von Danwitz, C. Toader e F. Biltgen, presidentes de secção, M. Ilešič (relator), L. Bay Larsen, M. Safjan, D. Šváby, C. G. Fernlund, C. Vajda e S. Rodin, juízes,

advogado‑geral: M. Szpunar,

secretário: V. Giacobbo‑Peyronnel, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 11 de setembro de 2018,

vistas as observações apresentadas:

–        em representação de AF, pelo próprio,

–        em representação de BH, por L. Boré, avocat,

–        em representação da Commission nationale de l’informatique et des libertés (CNIL), por I. Falque‑Pierrotin, J. Lessi e G. Le Grand, na qualidade de agentes,

–        em representação da Google LLC, por P. Spinosi, Y. Pelosi e W. Maxwell, avocats,

–        em representação do Governo francês, por D. Colas, R. Coesme, E. de Moustier e S. Ghiandoni, na qualidade de agentes,

–        em representação da Irlanda, por M. Browne, G. Hodge, J. Quaney e A. Joyce, na qualidade de agentes, assistidos por M. Gray, BL,

–        em representação do Governo helénico, por E.‑M. Mamouna, G. Papadaki, E. Zisi e S. Papaioannou, na qualidade de agentes,

–        em representação do Governo italiano, por G. Palmieri, na qualidade de agente, assistida por F. De Luca e P. Gentili, avvocati dello Stato,

–        em representação do Governo austríaco, por G. Eberhard e G. Kunnert, na qualidade de agentes,

–        em representação do Governo polaco, por B. Majczyna, M. Pawlicka e J. Sawicka, na qualidade de agentes,

–        em representação do Governo do Reino Unido, por S. Brandon, na qualidade de agente, assistido por C. Knight, barrister,

–        em representação da Comissão Europeia, por A. Buchet, H. Kranenborg e D. Nardi, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 10 de janeiro de 2019,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação da Diretiva 95/46/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 24 de outubro de 1995, relativa à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados (JO 1995, L 281, p. 31).

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe GC, AF, BH e ED à Commission nationale de l’informatique et des libertés (Comissão Nacional de Informática e das Liberdades) (CNIL) (França) a respeito de quatro decisões desta última por meio das quais se recusou a notificar a Google Inc., atualmente Google LLC, para que suprimisse referências a diversas hiperligações constantes de uma lista de resultados, que é exibida depois de ser efetuada uma pesquisa a partir dos seus respetivos nomes, e que conduz a páginas web publicadas por terceiros.

 Quadro jurídico

 Direito da União

 Diretiva 95/46

3        A Diretiva 95/46, de acordo com o seu artigo 1.o, n.o 1, tem por objeto a proteção das liberdades e dos direitos fundamentais das pessoas singulares, nomeadamente do direito à vida privada, no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais, bem como a eliminação dos obstáculos à livre circulação destes dados.

4        Os considerandos 33 e 34 da Diretiva 95/46 enunciam:

«(33)       Considerando que os dados suscetíveis, pela sua natureza, de pôr em causa as liberdades fundamentais ou o direito à vida privada só deverão ser tratados com o consentimento explí[cit]o da pessoa em causa; que, no entanto, devem ser expressamente previstas derrogações a esta proibição no que respeita a necessidades específicas […]

(34)      Considerando que, sempre que um motivo de interesse público importante o justifique, os Estados‑Membros devem também ser autorizados a estabelecer derrogações à proibição de tratamento de categorias de dados sensíveis […]; que lhes incumbe, todavia, estabelecer garantias adequadas e específicas para a proteção dos direitos fundamentais e da vida privada das pessoas».

5        O artigo 2.o desta diretiva dispõe:

«Para efeitos da presente diretiva, entende‑se por:

a)      “Dados pessoais”, qualquer informação relativa a uma pessoa singular identificada ou identificável (“pessoa em causa”); […]

b)      “Tratamento de dados pessoais” (“tratamento”), qualquer operação ou conjunto de operações efetuadas sobre dados pessoais, com ou sem meios automatizados, tais como a recolha, registo, organização, conservação, adaptação ou alteração, recuperação, consulta, utilização, comunicação por transmissão, difusão ou qualquer outra forma de colocação à disposição, com comparação ou interconexão, bem como o bloqueio, apagamento ou destruição;

[…]

d)      “Responsável pelo tratamento”, a pessoa singular ou coletiva, a autoridade pública, o serviço ou qualquer outro organismo que, individualmente ou em conjunto com outrem, determine as finalidades e os meios de tratamento dos dados pessoais; […]

[…]

h)      “Consentimento da pessoa em causa”, qualquer manifestação de vontade, livre, específica e informada, pela qual a pessoa em causa aceita que dados pessoais que lhe dizem respeito sejam objeto de tratamento.»

6        Inserido no capítulo II, secção I, da referida diretiva, intitulada «Princípios relativos à qualidade dos dados», o artigo 6.o da mesma diretiva tem a seguinte redação:

«1.      Os Estados‑Membros devem estabelecer que os dados pessoais serão:

a)      Objeto de um tratamento leal e lícito;

b)      Recolhidos para finalidades determinadas, explícitas e legítimas, e que não serão posteriormente tratados de forma incompatível com essas finalidades. […]

c)      Adequados, pertinentes e não excessivos relativamente às finalidades para que são recolhidos e para que são tratados posteriormente;

d)      Exatos e, se necessário, atualizados; devem ser tomadas todas as medidas razoáveis para assegurar que os dados inexatos ou incompletos, tendo em conta as finalidades para que foram recolhidos ou para que são tratados posteriormente, sejam apagados ou retificados;

e)      Conservados de forma a permitir a identificação das pessoas em causa apenas durante o período necessário para a prossecução das finalidades para que foram recolhidos ou para que são tratados posteriormente. Os Estados‑Membros estabelecerão garantias apropriadas para os dados pessoais conservados durante períodos mais longos do que o referido, para fins históricos, estatísticos ou científicos.

2.       Incumbe ao responsável pelo tratamento assegurar a observância do disposto no n.o 1.»

7        Inserido no capítulo II, secção II, da Diretiva 95/46, intitulada «Princípios relativos à legitimidade do tratamento de dados», o artigo 7.o desta diretiva dispõe:

«Os Estados‑Membros estabelecerão que o tratamento de dados pessoais só poderá ser efetuado se:

[…]

f)      O tratamento for necessário para prosseguir interesses legítimos do responsável pelo tratamento ou do terceiro ou terceiros a quem os dados sejam comunicados, desde que não prevaleçam os interesses ou os direitos e liberdades fundamentais da pessoa em causa, protegidos ao abrigo do n.o 1 do artigo 1.o»

8        Os artigos 8.o e 9.o desta mesma diretiva estão inseridos no capítulo II, secção III, da referida diretiva, intitulada «Categorias específicas de tratamentos». Este artigo 8.o, intitulado «Tratamento de certas categorias específicas de dados», prevê:

«1.       Os Estados‑Membros proibirão o tratamento de dados pessoais que revelem a origem racial ou étnica, as opiniões políticas, as convicções religiosas ou filosóficas, a filiação sindical, bem como o tratamento de dados relativos à saúde e à vida sexual.

2.      O n.o 1 não se aplica quando:

a)      A pessoa em causa tiver dado o seu consentimento explícito para esse tratamento, salvo se a legislação do Estado‑Membro estabelecer que a proibição referida no n.o 1 não pode ser retirada pelo consentimento da pessoa em causa;

ou

[…]

e)      O tratamento disser respeito a dados manifestamente tornados públicos pela pessoa em causa ou for necessário à declaração, ao exercício ou à defesa de um direito num processo judicial.

[…]

4.      Sob reserva de serem prestadas as garantias adequadas, os Estados‑Membros poderão estabelecer, por motivos de interesse público importante, outras derrogações para além das previstas no n.o 2, quer através de disposições legislativas nacionais, quer por decisão da autoridade de controlo referida no artigo 28.o

5.      O tratamento de dados relativos a infrações, condenações penais ou medidas de segurança só poderá ser efetuado sob o controlo das autoridades públicas ou se o direito nacional estabelecer garantias adequadas e específicas, sob reserva das derrogações que poderão ser concedidas pelo Estado‑Membro com base em disposições nacionais que prevejam garantias específicas e adequadas. Contudo, o registo completo das condenações penais só pode ser mantido sob o controlo das autoridades públicas.

Os Estados‑Membros podem estabelecer que o tratamento de dados relativos a sanções administrativas ou decisões cíveis fique igualmente sujeito ao controlo das autoridades públicas.

[…]»

9        O artigo 9.o da Diretiva 95/46, intitulado «Tratamento de dados pessoais e liberdade de expressão», enuncia:

«Os Estados‑Membros estabelecerão isenções ou derrogações ao disposto no presente capítulo e nos capítulos IV e VI para o tratamento de dados pessoais efetuado para fins exclusivamente jornalísticos ou de expressão artística ou literária, apenas na medida em que sejam necessárias para conciliar o direito à vida privada com as normas que regem a liberdade de expressão.»

10      O artigo 12.o desta diretiva, intitulado «Direito de acesso», prevê:

«Os Estados‑Membros garantirão às pessoas em causa o direito de obterem do responsável pelo tratamento:

[…]

b)      Consoante o caso, a retificação, o apagamento ou o bloqueio dos dados cujo tratamento não cumpra o disposto na presente diretiva, nomeadamente devido ao caráter incompleto ou inexato desses dados;

[…]»

11      O artigo 14.o da referida diretiva, intitulado «Direito de oposição da pessoa em causa», dispõe:

«Os Estados‑Membros reconhecerão à pessoa em causa o direito de:

a)      Pelo menos nos casos referidos nas alíneas e) e f) do artigo 7.o, se opor em qualquer altura, por razões preponderantes e legítimas relacionadas com a sua situação particular, a que os dados que lhe digam respeito sejam objeto de tratamento, salvo disposição em contrário do direito nacional. Em caso de oposição justificada, o tratamento efetuado pelo responsável deixa de poder incidir sobre esses dados;

[…]»

12      O artigo 28.o da mesma diretiva, intitulado «Autoridade de controlo», tem a seguinte redação:

«1.      Cada Estado‑Membro estabelecerá que uma ou mais autoridades públicas serão responsáveis pela fiscalização da aplicação no seu território das disposições adotadas pelos Estados‑Membros nos termos da presente diretiva.

[…]

3.      Cada autoridade do controlo disporá, nomeadamente:

–        de poderes de inquérito, tais como o poder de aceder aos dados objeto de tratamento e de recolher todas as informações necessárias ao desempenho das suas funções de controlo,

–        de poderes efetivos de intervenção, tais como, por exemplo, o […] de ordenar o bloqueio, o apagamento ou a destruição dos dados, o de proibir temporária ou definitivamente o tratamento […]

[…]

As decisões da autoridade de controlo que lesem interesses são passíveis de recurso jurisdicional.

4.      Qualquer pessoa ou associação que a represente pode apresentar à autoridade de controlo um pedido para proteção dos seus direitos e liberdades no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais. A pessoa em causa será informada do seguimento dado ao seu pedido.

[…]

6.      Cada autoridade de controlo é competente, independentemente do direito nacional aplicável ao tratamento em causa, para o exercício no território do seu Estado‑Membro dos poderes que lhe foram atribuídos em conformidade com o n.o 3. Cada autoridade de controlo pode ser solicitada a exercer os seus poderes por uma autoridade de outro Estado‑Membro.

As autoridades de controlo cooperarão entre si na medida do necessário ao desempenho das suas funções, em especial através do intercâmbio de quaisquer informações úteis.

[…]»

 Regulamento (UE) 2016/679

13      O Regulamento (UE) 2016/679 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de abril de 2016, relativo à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados e que revoga a Diretiva 95/46 (Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados) (JO 2016, L 119, p. 1, e retificação no JO 2018, L 127, p. 2), é aplicável, nos termos do seu artigo 99.o, n.o 2, desde 25 de maio de 2018. O artigo 94.o, n.o 1, deste regulamento dispõe que a Diretiva 95/46 é revogada com efeitos a partir desta mesma data.

14      Os considerandos 1, 4, 51, 52 e 65 do referido regulamento enunciam:

«(1)      A proteção das pessoas singulares relativamente ao tratamento de dados pessoais é um direito fundamental. O artigo 8.o, n.o 1, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia ([a seguir] “Carta”) e o artigo 16.o, n.o 1, [TFUE] estabelecem que todas as pessoas têm direito à proteção dos dados de caráter pessoal que lhes digam respeito.

[…]

(4)      O tratamento dos dados pessoais deverá ser concebido para servir as pessoas. O direito à proteção de dados pessoais não é absoluto; deve ser considerado em relação à sua função na sociedade e ser equilibrado com outros direitos fundamentais, em conformidade com o princípio da proporcionalidade. O presente regulamento respeita todos os direitos fundamentais e observa as liberdades e os princípios reconhecidos na Carta, consagrados nos Tratados, nomeadamente o respeito pela vida privada e familiar, […] a proteção dos dados pessoais, a liberdade de pensamento, de consciência e de religião, a liberdade de expressão e de informação, a liberdade de empresa […]

[…]

(51)      Merecem proteção específica os dados pessoais que sejam, pela sua natureza, especialmente sensíveis do ponto de vista dos direitos e liberdades fundamentais, dado que o contexto do tratamento desses dados poderá implicar riscos significativos para os direitos e liberdades fundamentais. […]

(52)      As derrogações à proibição de tratamento de categorias especiais de dados pessoais deverão ser igualmente permitidas quando estiverem previstas no direito da União ou dos Estados‑Membros e sujeitas a salvaguardas adequadas, de forma a proteger os dados pessoais e outros direitos fundamentais […]

[…]

(65)      Os titulares dos dados deverão ter […] “direito a serem esquecidos” quando a conservação desses dados violar o presente regulamento ou o direito da União ou dos Estados‑Membros aplicável ao responsável pelo tratamento. […] No entanto, o prolongamento da conservação dos dados pessoais deverá ser efetuado de forma lícita quando tal se revele necessário para o exercício do direito de liberdade de expressão e informação […]»

15      O artigo 4.o, ponto 11, do Regulamento 2016/679 define o conceito de «consentimento» como «uma manifestação de vontade, livre, específica, informada e explícita, pela qual o titular dos dados aceita, mediante declaração ou ato positivo inequívoco, que os dados pessoais que lhe dizem respeito sejam objeto de tratamento».

16      O artigo 5.o deste regulamento, intitulado «Princípios relativos ao tratamento de dados pessoais», enuncia, no seu n.o 1, alíneas c) a e):

«Os dados pessoais são:

[…]

c)      Adequados, pertinentes e limitados ao que é necessário relativamente às finalidades para as quais são tratados (“minimização dos dados”);

d)      Exatos e atualizados sempre que necessário; devem ser adotadas todas as medidas adequadas para que os dados inexatos, tendo em conta as finalidades para que são tratados, sejam apagados ou retificados sem demora (“exatidão”);

e)      Conservados de uma forma que permita a identificação dos titulares dos dados apenas durante o período necessário para as finalidades para as quais são tratados; os dados pessoais podem ser conservados durante períodos mais longos; […] (“limitação da conservação”)».

17      O artigo 9.o do referido regulamento, intitulado «Tratamento de categorias especiais de dados pessoais», dispõe:

«1.      É proibido o tratamento de dados pessoais que revelem a origem racial ou étnica, as opiniões políticas, as convicções religiosas ou filosóficas, ou a filiação sindical, bem como o tratamento de dados genéticos, dados biométricos para identificar uma pessoa de forma inequívoca, dados relativos à saúde ou dados relativos à vida sexual ou orientação sexual de uma pessoa.

2.      O disposto no n.o 1 não se aplica se se verificar um dos seguintes casos:

a)      Se o titular dos dados tiver dado o seu consentimento explícito para o tratamento desses dados pessoais para uma ou mais finalidades específicas, exceto se o direito da União ou de um Estado‑Membro previr que a proibição a que se refere o n.o 1 não pode ser anulada pelo titular dos dados;

[…]

e)      Se o tratamento se referir a dados pessoais que tenham sido manifestamente tornados públicos pelo seu titular;

[…]

g)      Se o tratamento for necessário por motivos de interesse público importante, com base no direito da União ou de um Estado‑Membro, que deve ser proporcional ao objetivo visado, respeitar a essência do direito à proteção dos dados pessoais e prever medidas adequadas e específicas que salvaguardem os direitos fundamentais e os interesses do titular dos dados;

[…]»

18      O artigo 10.o do mesmo regulamento, intitulado «Tratamento de dados pessoais relacionados com condenações penais e infrações», enuncia:

«O tratamento de dados pessoais relacionados com condenações penais e infrações ou com medidas de segurança conexas com base no artigo 6.o, n.o 1, só é efetuado sob o controlo de uma autoridade pública ou se o tratamento for autorizado por disposições do direito da União ou de um Estado‑Membro que prevejam garantias adequadas para os direitos e liberdades dos titulares dos dados. Os registos completos das condenações penais só são conservados sob o controlo das autoridades públicas.»

19      O artigo 17.o do Regulamento 2016/679, intitulado «Direito ao apagamento dos dados (“direito a ser esquecido”)», tem a seguinte redação:

«1.      O titular tem o direito de obter do responsável pelo tratamento o apagamento dos seus dados pessoais, sem demora injustificada, e este tem a obrigação de apagar os dados pessoais, sem demora injustificada, quando se aplique um dos seguintes motivos:

a)      Os dados pessoais deixaram de ser necessários para a finalidade que motivou a sua recolha ou tratamento;

b)      O titular retira o consentimento em que se baseia o tratamento dos dados nos termos do artigo 6.o, n.o 1, alínea a), ou do artigo 9.o, n.o 2, alínea a) e se não existir outro fundamento jurídico para o referido tratamento;

c)      O titular opõe‑se ao tratamento nos termos do artigo 21.o, n.o 1, e não existem interesses legítimos prevalecentes que justifiquem o tratamento, ou o titular opõe‑se ao tratamento nos termos do artigo 21.o, n.o 2;

d)      Os dados pessoais foram tratados ilicitamente;

e)      Os dados pessoais têm de ser apagados para o cumprimento de uma obrigação jurídica decorrente do direito da União ou de um Estado‑Membro a que o responsável pelo tratamento esteja sujeito;

f)      Os dados pessoais foram recolhidos no contexto da oferta de serviços da sociedade da informação referida no artigo 8.o, n.o 1.

2.      Quando o responsável pelo tratamento tiver tornado públicos os dados pessoais e for obrigado a apagá‑los nos termos do n.o 1, toma as medidas que forem razoáveis, incluindo de caráter técnico, tendo em consideração a tecnologia disponível e os custos da sua aplicação, para informar os responsáveis pelo tratamento efetivo dos dados pessoais de que o titular dos dados lhes solicitou o apagamento das ligações para esses dados pessoais, bem como das cópias ou reproduções dos mesmos.

3.      Os n.os 1 e 2 não se aplicam na medida em que o tratamento se revele necessário:

a)      Ao exercício da liberdade de expressão e de informação;

[…]»

20      O artigo 21.o deste regulamento, intitulado «Direito de oposição», prevê, no seu n.o 1:

«O titular dos dados tem o direito de se opor a qualquer momento, por motivos relacionados com a sua situação particular, ao tratamento dos dados pessoais que lhe digam respeito com base no artigo 6.o, n.o 1, alínea e) ou f), ou no artigo 6.o, n.o 4, incluindo a definição de perfis com base nessas disposições. O responsável pelo tratamento cessa o tratamento dos dados pessoais, a não ser que apresente razões imperiosas e legítimas para esse tratamento que prevaleçam sobre os interesses, direitos e liberdades do titular dos dados, ou para efeitos de declaração, exercício ou defesa de um direito num processo judicial.»

21      O artigo 85.o do referido regulamento, intitulado «Tratamento e liberdade de expressão e de informação», enuncia:

«1.      Os Estados‑Membros conciliam por lei o direito à proteção de dados pessoais nos termos do presente regulamento com o direito à liberdade de expressão e de informação, incluindo o tratamento para fins jornalísticos e para fins de expressão académica, artística ou literária.

2.      Para o tratamento efetuado para fins jornalísticos ou para fins de expressão académica, artística ou literária, os Estados‑Membros estabelecem isenções ou derrogações do capítulo II (princípios), do capítulo III (direitos do titular dos dados), do capítulo IV (responsável pelo tratamento e subcontratante), do capítulo V (transferência de dados pessoais para países terceiros e organizações internacionais), do capítulo VI (autoridades de controlo independentes), do capítulo VII (cooperação e coerência) e do capítulo IX (situações específicas de tratamento de dados) se tais isenções ou derrogações forem necessárias para conciliar o direito à proteção de dados pessoais com a liberdade de expressão e de informação.

[…]»

 Direito francês

22      A loi n.o 78‑17, du 6 janvier 1978, relative à l’informatique, aux fichiers et aux libertés (Lei n.o 78‑17, de 6 de janeiro de 1978, relativa à informática, aos ficheiros e às liberdades), na sua versão aplicável aos factos no processo principal, assegura a transposição para o direito francês da Diretiva 95/46.

23      O artigo 11.o desta lei especifica que, de entre as suas missões, cabe à CNIL assegurar que os tratamentos de dados pessoais sejam realizados em conformidade com o disposto na referida lei, cabendo à CNIL, a este título, receber reclamações, pedidos e queixas relativos à implementação que é feita dos tratamentos de dados pessoais e informar os respetivos autores do seguimento que lhes é dado.

 Litígios nos processos principais e questões prejudiciais

24      GC, AF, BH e ED pediram, cada um, à Google que suprimisse, da lista de resultados que é exibida pelo motor de busca explorado por esta sociedade em resposta a um pedido de pesquisa efetuado a partir dos seus respetivos nomes, as referências a diversas hiperligações que conduzem a páginas web publicadas por terceiros. Esta sociedade recusou esses pedidos.

25      Mais concretamente, GC pediu que fosse suprimida a referência a uma hiperligação que remete para uma fotomontagem satírica publicada, sob pseudónimo, em 18 de fevereiro de 2011 no Youtube, na qual GC surge ao lado do presidente de uma câmara municipal de quem era chefe de gabinete, evocando essa fotomontagem de forma explícita a relação íntima que existiria entre os dois, bem como o impacto que essa relação teve no seu próprio percurso político. Esta fotomontagem foi colocada em linha por ocasião da campanha eleitoral para as eleições do cantão às quais GC concorreu como candidata. Na data em que o seu pedido de supressão de referências foi recusado, a interessada não tinha sido eleita nem era candidata a um mandato eletivo de nível local e já não exercia funções de chefe de gabinete do presidente da câmara municipal.

26      AF pediu que fossem suprimidas as referências a hiperligações que conduzem a um artigo do jornal diário Libération de 9 de setembro de 2008, reproduzido no sítio Internet do Centre contre les manipulations mentales (Centro Contra a Manipulação Mental) (CCMM) (França), relativo ao suicídio de uma seguidora da Igreja da Cientologia, ocorrido em dezembro de 2006. AF é citado neste artigo na sua qualidade de responsável pelas relações públicas da Igreja da Cientologia, profissão que já não exerce. Por outro lado, o autor do referido artigo indica que contactou AF para obter a sua versão dos factos e relata as declarações recolhidas nessa ocasião.

27      BH pediu que fossem suprimidas as referências a hiperligações que conduzem a artigos, principalmente de imprensa, relativos ao processo judicial iniciado em junho de 1995 que teve por objeto o financiamento do parti républicain (Partido Republicano) (PR) em cujo âmbito vários homens de negócios e vários políticos, e ele próprio, foram constituídos arguidos. Em 26 de fevereiro de 2010, foi proferido despacho de não pronúncia no processo respeitante a BH. A maioria das hiperligações controvertidas conduzem a artigos redigidos quando da abertura da instrução e, por conseguinte, deles não consta o resultado final do processo.

28      ED pediu que fossem suprimidas as referências a hiperligações que conduzem a dois artigos publicados nos jornais NiceMatin e Le Figaro que dão conta de uma audiência de julgamento na qual ED foi condenado ao cumprimento de uma pena de sete anos de prisão e numa pena acessória de dez anos de acompanhamento sociojudiciário por factos relativos a abusos sexuais cometidos sobre menores de quinze anos. Um destes artigos relativo ao processo judicial menciona, entre outros, vários pormenores íntimos relativos a ED, revelados por ocasião do processo.

29      Tendo a Google recusado os respetivos pedidos de supressão de referências, os recorrentes no processo principal apresentaram queixas à CNIL e pediram a esta última que notificasse àquela sociedade a obrigação de suprimir as referências às hiperligações em causa. Por cartas datadas, respetivamente, de 24 de abril de 2015, 28 de agosto de 2015, 21 de março de 2016 e 9 de maio de 2016, a presidente da CNIL informou os recorrentes no processo principal de que as suas queixas tinham sido arquivadas.

30      Os recorrentes no processo principal interpuseram no órgão jurisdicional de reenvio, o Conseil d’État (Conselho de Estado, em formação jurisdicional, França), recurso destas recusas da CNIL de notificar a Google no sentido de proceder às supressões de referências que foram pedidas. Estes recursos foram apensados pelo órgão jurisdicional de reenvio.

31      Tendo constatado que os referidos recursos suscitam várias dificuldades sérias de interpretação da Diretiva 95/46, o Conseil d’État (Conselho de Estado, em formação jurisdicional) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      Tendo em conta as responsabilidades, as competências e as possibilidades específicas do operador de um motor de busca, a proibição imposta aos demais responsáveis pelo tratamento de tratar dados que se enquadram nos n.os 1 e 5 do artigo 8.o da Diretiva [95/46], sob reserva das exceções previstas neste diploma, é também aplicável ao operador de um motor de busca enquanto responsável pelo tratamento que esse motor de busca constitui?

2)      Em caso de resposta afirmativa à primeira questão:

[a)]      [D]evem as disposições do artigo 8.o, n.os 1 e 5, da Diretiva [95/46] ser interpretadas no sentido de que a proibição imposta, sob reserva das exceções previstas por esta diretiva, ao operador de um motor de busca de tratar dados que se enquadram nessas disposições o obriga a deferir sistematicamente os pedidos de [supressão de referências a hiperligações] para páginas web que tratam esses dados?

[b)]      [N]essa perspetiva, como devem ser interpretadas as exceções previstas no artigo 8.o, n.o 2, alíneas a) e e), da Diretiva [95/46], quando se aplicam ao operador de um motor de busca, tendo em conta as suas responsabilidades, as suas competências e as suas possibilidades específicas? Em especial, pode esse operador recusar deferir um pedido de [supressão de referências a hiperligações] quando constata que as [hiperligações] em causa dão acesso a conteúdos que, embora integrem dados que se enquadram nas categorias enumeradas no n.o 1 do artigo 8.o, também se enquadram no âmbito de aplicação das exceções previstas no n.o 2 do mesmo artigo, nomeadamente as das alíneas a) e e)?

[c)]      [D]o mesmo modo, devem as disposições da Diretiva [95/46] ser interpretadas no sentido de que, quando as [hiperligações cuja supressão de referências] é pedida dão acesso a tratamentos de dados pessoais efetuados para fins exclusivamente jornalísticos ou de expressão artística ou literária que, por esse facto, nos termos do artigo 9.o da Diretiva [95/46], podem coligir e tratar dados que se enquadram nas categorias mencionadas no artigo 8.o, n.os 1 e 5, desta diretiva, o operador de um motor de busca pode, por esse motivo, recusar deferir um pedido de [supressão de referências a hiperligações]?

3)      Em caso de resposta negativa à primeira questão:

[a)]      [Q]ue requisitos específicos da Diretiva [95/46] deve o operador de um motor de busca cumprir, tendo em conta as suas responsabilidades, as suas competências e as suas possibilidades?

[b)]      [Q]uando constata que as páginas web, às quais se acede pelas [hiperligações cuja supressão de referências] é pedida, integram dados cuja publicação, nas referidas páginas, é ilícita, devem as disposições da Diretiva [95/46] ser interpretadas no sentido de que:

–        impõem que o operador de um motor de busca suprima essas [hiperligações] da lista de resultados obtidos na sequência de uma pesquisa efetuada a partir do nome do requerente?

–        ou de que implicam apenas que tome em conta essa circunstância para apreciar o mérito do pedido de [supressão de referências a hiperligações]?

–        ou de que essa circunstância não tem relevância na apreciação que deve fazer?

Além disso, se essa circunstância não for inoperante, como apreciar a licitude da publicação dos dados controvertidos nas páginas web que provêm de tratamentos que não se enquadram no âmbito de aplicação territorial da Diretiva [95/46] e, consequentemente, nas legislações nacionais que a transpõem?

4)      Qualquer que seja a resposta dada à primeira questão:

[a)]      [I]ndependentemente da licitude da publicação dos dados pessoais na página web à qual acede a [hiperligação] controvertida, devem as disposições da Diretiva [95/46] ser interpretadas no sentido de que:

–        quando o requerente demonstre que esses dados estão incompletos, inexatos, ou desatualizados, o operador do motor de busca deve deferir o pedido de [supressão de referências] correspondente?

–        mais especificamente, quando o requerente demonstre que, tendo em conta a tramitação do processo judicial, as informações relativas a uma fase anterior do processo já não correspondem à realidade atual da sua situação, o operador do motor de busca está obrigado a [suprimir as referências a hiperligações] de acesso a páginas web que integram essas informações?

[b)]      [D]evem as disposições do artigo 8.o, n.o 5, da Diretiva [95/46] ser interpretadas no sentido de que as informações relativas à constituição de uma pessoa como arguido ou que descrevam um processo, e a condenação que daí decorra, constituem dados relativos às infrações e às condenações penais? De uma maneira geral, quando uma página web integra dados que relatam condenações ou processos judiciais de que uma pessoa singular foi objeto, tal página web entra no âmbito de aplicação dessas disposições?»

 Quanto às questões prejudiciais

32      As questões colocadas dizem respeito à interpretação da Diretiva 95/46, que era aplicável na data em que o pedido de decisão prejudicial deu entrada. Esta diretiva foi revogada com efeitos a partir de 25 de maio de 2018, data a partir da qual o Regulamento 2016/679 passou a ser aplicável.

33      O Tribunal examinará as questões colocadas sob a perspetiva da Diretiva 95/46, tomando, no entanto, igualmente em consideração o Regulamento 2016/679 na análise que efetuará das questões, para garantir que as suas respostas serão, em qualquer hipótese, úteis para o órgão jurisdicional de reenvio.

 Quanto à primeira questão

34      Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se as disposições do artigo 8.o, n.os 1 e 5, da Diretiva 95/46 devem ser interpretadas no sentido de que a proibição ou as restrições relativas ao tratamento das categorias específicas de dados pessoais, visadas nestas disposições, também se aplicam, sob reserva das exceções previstas nesta diretiva, ao operador de um motor de busca no âmbito das suas responsabilidades, das suas competências e das suas possibilidades enquanto responsável pelo tratamento efetuado para efeitos das necessidades do funcionamento desse motor.

35      A este respeito, há que recordar, por um lado, que a atividade de um motor de busca que consiste em encontrar informações publicadas ou inseridas na Internet por terceiros, indexá‑las automaticamente, armazená‑las temporariamente e, por último, pô‑las à disposição dos internautas por determinada ordem de preferência deve ser qualificada de «tratamento de dados pessoais», na aceção do artigo 2.o, alínea b), da Diretiva 95/46, quando essas informações contenham dados pessoais, e, por outro, que o operador desse motor de busca deve ser considerado «responsável» pelo referido tratamento, na aceção do artigo 2.o, alínea d), desta diretiva (Acórdão de 13 de maio de 2014, Google Spain e Google, C‑131/12, EU:C:2014:317, n.o 41).

36      Com efeito, o tratamento de dados pessoais efetuado no contexto da atividade de um motor de busca distingue‑se do efetuado pelos editores de sítios web, que consiste em fazer figurar esses dados numa página web, e essa atividade tem um papel decisivo na difusão global dos referidos dados, na medida em que os torna acessíveis a qualquer internauta que efetue uma pesquisa a partir do nome da pessoa em causa, incluindo aos internautas que, de outra forma, não teriam encontrado a página web onde esses mesmos dados estão publicados. Além disso, a organização e a agregação das informações publicadas na Internet, efetuadas pelos motores de busca com o objetivo de facilitar aos seus utilizadores o acesso às mesmas, podem conduzir, quando a pesquisa desses utilizadores é feita a partir do nome de uma pessoa singular, a que estes obtenham, com a lista de resultados, uma visão global mais estruturada das informações sobre essa pessoa, que se podem encontrar na Internet, que lhes permita estabelecer um perfil mais ou menos detalhado da pessoa em causa (Acórdão de 13 de maio de 2014, Google Spain e Google, C‑131/12, EU:C:2014:317, n.os 35 a 37).

37      Por conseguinte, na medida em que a atividade de um motor de busca é suscetível de afetar, significativamente e por acréscimo à dos editores de sítios web, os direitos fundamentais à vida privada e à proteção dos dados pessoais, o operador desse motor, como pessoa que determina as finalidades e os meios dessa atividade, deve assegurar, no âmbito das suas responsabilidades, das suas competências e das suas possibilidades, que essa atividade satisfaça as exigências da Diretiva 95/46, para que as garantias nesta previstas possam produzir pleno efeito e possa efetivamente realizar‑se uma proteção eficaz e completa das pessoas em causa, designadamente do seu direito ao respeito pela sua vida privada (Acórdão de 13 de maio de 2014, Google Spain e Google, C‑131/12, EU:C:2014:317, n.o 38).

38      A primeira questão prejudicial visa determinar se, no âmbito das suas responsabilidades, das suas competências e das suas possibilidades, o operador de um motor de busca deve igualmente respeitar as exigências que a Diretiva 95/46 prevê relativamente às categorias específicas de dados pessoais, visadas no seu artigo 8.o, n.os 1 e 5, quando tais dados figurem de entre as informações publicadas ou inseridas na Internet por terceiros e são objeto de um tratamento por esse operador para efeitos das necessidades do funcionamento do seu motor de busca.

39      No que respeita a estas categorias específicas de dados, o artigo 8.o, n.o 1, da Diretiva 95/46 dispõe que os Estados‑Membros proibirão o tratamento de dados pessoais que revelem a origem racial ou étnica, as opiniões políticas, as convicções religiosas ou filosóficas, a filiação sindical, bem como o tratamento de dados relativos à saúde e à vida sexual. Este artigo 8.o, n.o 2, prevê, nomeadamente, algumas exceções e derrogações a esta proibição.

40      O artigo 8.o, n.o 5, da Diretiva 95/46 enuncia que o tratamento de dados relativos a infrações, condenações penais ou medidas de segurança só poderá ser efetuado sob o controlo das autoridades públicas ou se o direito nacional estabelecer garantias adequadas e específicas, sob reserva das derrogações que poderão ser concedidas pelo Estado‑Membro com base em disposições nacionais que prevejam garantias específicas e adequadas. Contudo, o registo completo das condenações penais só pode ser mantido sob o controlo das autoridades públicas. Os Estados‑Membros podem estabelecer que o tratamento de dados relativos a sanções administrativas ou decisões cíveis fique igualmente sujeito ao controlo das autoridades públicas.

41      O conteúdo do artigo 8.o, n.os 1 e 5, da Diretiva 95/46 foi, com algumas alterações, retomado no artigo 9.o, n.o 1, e no artigo 10.o do Regulamento 2016/679.

42      Há que começar por constatar que resulta da redação destas disposições da Diretiva 95/46 e do Regulamento 2016/679 que a proibição e as restrições que preveem se aplicam, sob reserva das exceções previstas nesta diretiva e neste regulamento, a qualquer tipo de tratamento das categorias específicas de dados visadas pelas referidas disposições e a todos os responsáveis que procedem a esses tratamentos.

43      Em seguida, nenhuma outra disposição da referida diretiva ou do referido regulamento prevê uma derrogação geral a esta proibição ou a estas restrições em benefício de um tratamento como o que foi efetuado no âmbito da atividade de um motor de busca. Pelo contrário, conforme decorre do n.o 37 do presente acórdão, resulta da economia geral destes diplomas que o operador de tal motor deve, à semelhança de qualquer outro responsável pelo tratamento, assegurar, no âmbito das suas responsabilidades, das suas competências e das suas possibilidades, que o tratamento dos dados pessoais que efetua satisfaz as exigências, respetivamente, da Diretiva 95/46 ou do Regulamento 2016/679.

44      Por último, uma interpretação do artigo 8.o, n.os 1 e 5, da Diretiva 95/46 ou do artigo 9.o, n.o 1, e do artigo 10.o do Regulamento 2016/679 que, a priori e de forma geral, excluísse a atividade de um motor de busca das exigências específicas que estas disposições preveem relativamente aos tratamentos que dizem respeito às categorias específicas de dados nelas visadas contrariaria a finalidade das referidas disposições, a qual consiste em assegurar uma maior proteção contra tais tratamentos que, devido à sensibilidade específica destes dados, podem constituir, conforme também resulta do considerando 33 desta diretiva e do considerando 51 deste regulamento, uma ingerência especialmente grave nos direitos fundamentais ao respeito pela vida privada e à proteção dos dados pessoais, garantidos pelos artigos 7.o e 8.o da Carta.

45      Se, ao contrário do que nomeadamente a Google alega, as especificidades do tratamento efetuado pelo operador de um motor de busca no âmbito da sua atividade não puderem assim justificar que este operador fique isento da observância do artigo 8.o, n.os 1 e 5, da Diretiva 95/46, bem como do artigo 9.o, n.o 1, e do artigo 10.o do Regulamento 2016/679, estas especificidades podem, contudo, influenciar o âmbito da responsabilidade e das obrigações concretas do referido operador à luz destas disposições.

46      A este respeito, importa salientar que, conforme a Comissão Europeia sublinha, o operador de um motor de busca não é responsável pelo facto de dados pessoais visados pelas referidas disposições figurarem numa página web publicada por um terceiro, sendo responsável pelas referências a dados pessoais dessa página e, mais especificamente, pela exibição da hiperligação que conduz a essa página na lista de resultados que é exibida aos internautas após a realização de uma pesquisa efetuada a partir do nome de uma pessoa singular, podendo tal exibição da hiperligação em questão numa lista afetar significativamente os direitos fundamentais da pessoa em causa ao respeito pela sua vida privada e à proteção dos seus dados pessoais (v., neste sentido, Acórdão de 13 de maio de 2014, Google Spain e Google, C‑131/12, EU:C:2014:317, n.o 80).

47      Nestas condições, atendendo às responsabilidades, às competências e às possibilidades do operador de um motor de busca na qualidade de responsável pelo tratamento efetuado no âmbito da atividade desse motor, as proibições e as restrições previstas no artigo 8.o, n.os 1 e 5, da Diretiva 95/46, bem como no artigo 9.o, n.o 1, e no artigo 10.o do Regulamento 2016/679, só se podem aplicar, conforme indicou o advogado‑geral no n.o 56 das suas conclusões e como salientam em substância todos os interessados que se exprimiram a este respeito, a esse operador devido a essas referências a dados pessoais e, por conseguinte, por intermédio de uma verificação a efetuar, sob o controlo das autoridades nacionais competentes, no seguimento de um pedido apresentado pela pessoa em causa.

48      Decorre do exposto que há que responder à primeira questão que as disposições do artigo 8.o, n.os 1 e 5, da Diretiva 95/46 devem ser interpretadas no sentido de que a proibição ou as restrições relativas ao tratamento das categorias específicas de dados pessoais, visadas nestas disposições, também se aplicam, sob reserva das exceções previstas nesta diretiva, ao operador de um motor de busca no âmbito das suas responsabilidades, das suas competências e das suas possibilidades enquanto responsável pelo tratamento efetuado quando da atividade desse motor, por ocasião de uma verificação efetuada por esse operador, sob o controlo das autoridades nacionais competentes, no seguimento de um pedido apresentado pela pessoa em causa.

 Quanto à segunda questão

49      Com a sua segunda questão, que compreende três partes, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância:

–        se as disposições do artigo 8.o, n.os 1 e 5, da Diretiva 95/46 devem ser interpretadas no sentido de que, em conformidade com estas, o operador de um motor de busca é obrigado, sob reserva das exceções previstas nesta diretiva, a deferir os pedidos de supressão de referências relativos a hiperligações que conduzem a páginas web nas quais figuram dados pessoais pertencentes às categorias específicas visadas por estas disposições;

–        se o artigo 8.o, n.o 2, alíneas a) e e), da Diretiva 95/46 deve ser interpretado no sentido de que, em aplicação deste, esse operador pode recusar deferir um pedido de supressão de referências quando constatar que as hiperligações em causa conduzem a conteúdos que contêm dados pessoais pertencentes a categorias visadas neste artigo 8.o, n.o 1, mas cujo tratamento é abrangido por uma das exceções previstas no referido artigo 8.o, n.o 2, alíneas a) e e); e

–        se as disposições da Diretiva 95/46 devem ser interpretadas no sentido de que o operador de um motor de busca também pode recusar deferir um pedido de supressão de referências por as hiperligações cuja supressão de referências é pedida conduzirem a páginas web nas quais os dados pessoais pertencentes a categorias específicas visadas no artigo 8.o, n.os 1 ou 5, desta diretiva só são publicados para fins exclusivamente jornalísticos ou de expressão artística ou literária, estando esta publicação assim abrangida pela exceção prevista no artigo 9.o da referida diretiva.

50      A título preliminar, há que salientar que, no âmbito da Diretiva 95/46, pedidos de supressão de referências como os que estão em causa no processo principal se baseiam nomeadamente no seu artigo 12.o, alínea b), nos termos do qual os Estados‑Membros garantirão às pessoas em causa o direito de obterem do responsável pelo tratamento o apagamento dos dados cujo tratamento não cumpra o disposto nesta diretiva.

51      Por outro lado, de acordo com o artigo 14.o, primeiro parágrafo, alínea a), da Diretiva 95/46, os Estados‑Membros reconhecerão à pessoa em causa o direito de, pelo menos nos casos referidos nas alíneas e) e f) do artigo 7.o desta diretiva, se opor em qualquer altura, por razões preponderantes e legítimas relacionadas com a sua situação particular, a que os dados que lhe digam respeito sejam objeto de tratamento, salvo disposição em contrário do direito nacional.

52      A este respeito, importa recordar que o Tribunal declarou que os artigos 12.o, alínea b), e 14.o, primeiro parágrafo, alínea a), da Diretiva 95/46 devem ser interpretados no sentido de que, para respeitar os direitos previstos nestas disposições e desde que as condições por elas previstas estejam efetivamente satisfeitas, o operador de um motor de busca é obrigado a suprimir da lista de resultados, exibida na sequência de uma pesquisa efetuada a partir do nome de uma pessoa, as hiperligações a outras páginas web publicadas por terceiros e que contenham informações sobre essa pessoa, também na hipótese de esse nome ou de essas informações não serem prévia ou simultaneamente apagadas dessas páginas web, isto, se for caso disso, mesmo quando a sua publicação nas referidas páginas seja, em si mesma, lícita (Acórdão de 13 de maio de 2014, Google Spain e Google, C‑131/12, EU:C:2014:317, n.o 88).

53      Por outro lado, o Tribunal precisou que, no âmbito da apreciação das condições de aplicação destas mesmas disposições, importa designadamente examinar se a pessoa em causa tem o direito de que a informação em questão sobre a sua pessoa deixe de ser associada ao seu nome através de uma lista de resultados exibida na sequência de uma pesquisa efetuada a partir do seu nome, sem que, todavia, a constatação desse direito pressuponha que a inclusão dessa informação nessa lista causa prejuízo a essa pessoa. Na medida em que esta pode, tendo em conta os seus direitos fundamentais nos termos dos artigos 7.o e 8.o da Carta, requerer que a informação em questão deixe de estar à disposição do grande público devido à sua inclusão nessa lista de resultados, esses direitos prevalecem, em princípio, não só sobre o interesse económico do operador do motor de busca mas também sobre o interesse desse público em aceder à referida informação numa pesquisa sobre o nome dessa pessoa. No entanto, não será esse o caso se se afigurar que, por razões especiais como, por exemplo, o papel desempenhado por essa pessoa na vida pública, a ingerência nos seus direitos fundamentais é justificada pelo interesse preponderante do referido público em ter acesso à informação em questão, em virtude dessa inclusão (Acórdão de 13 de maio de 2014, Google Spain e Google, C‑131/12, EU:C:2014:317, n.o 99).

54      No âmbito do Regulamento 2016/679, o legislador da União Europeia previu, no artigo 17.o deste regulamento, uma disposição que rege especificamente o «direito ao apagamento dos dados», também denominado, no título deste artigo, «direito a ser esquecido».

55      Em aplicação deste artigo 17.o, n.o 1, o titular dos dados tem o direito de obter do responsável pelo tratamento o apagamento dos seus dados pessoais, sem demora injustificada, e este tem a obrigação de apagar os dados pessoais, sem demora injustificada, quando se aplique um dos motivos enumerados por esta disposição. De entre estes motivos, a referida disposição menciona o facto de os dados deixarem de ser necessários à luz das finalidades que motivaram o tratamento, de a pessoa em causa retirar o consentimento em que se baseia o tratamento e de não existir outro fundamento jurídico para este, de a pessoa em causa se opor ao tratamento nos termos do artigo 21.o, n.os 1 ou 2, do Regulamento 2016/679, que substitui o artigo 14.o da Diretiva 95/46, de os dados terem sido tratados ilicitamente, de os dados terem de ser apagados para o cumprimento de uma obrigação jurídica ou de terem sido recolhidos no contexto da oferta de serviços da sociedade da informação prestados a crianças.

56      No entanto, o artigo 17.o, n.o 3, do Regulamento 2016/679 especifica que o artigo 17.o, n.o 1, deste regulamento não se aplica na medida em que o tratamento em causa seja necessário por um dos motivos enumerados nesta primeira disposição. De entre estes motivos figura, no artigo 17.o, n.o 3, alínea a), do referido regulamento, o exercício do direito relativo, nomeadamente, à liberdade de informação.

57      A circunstância de o artigo 17.o, n.o 3, alínea a), do Regulamento 2016/679 prever agora expressamente que o direito ao apagamento dos dados da pessoa em causa fica excluído quando o tratamento seja necessário ao exercício do direito relativo, nomeadamente, à liberdade de informação, garantida pelo artigo 11.o da Carta, constitui uma expressão do facto de o direito à proteção dos dados pessoais não ser um direito absoluto, devendo, como sublinha o considerando 4 deste regulamento, ser considerado em relação à sua função na sociedade e ser equilibrado com outros direitos fundamentais, em conformidade com o princípio da proporcionalidade [v., igualmente, Acórdão de 9 de novembro de 2010, Volker und Markus Schecke e Eifert, C‑92/09 e C‑93/09, EU:C:2010:662, n.o 48, e Parecer 1/15 (Acordo PNR UE‑Canadá), de 26 de julho de 2017, EU:C:2017:592, n.o 136].

58      Neste contexto, importa recordar que o artigo 52.o, n.o 1, da Carta admite a introdução de restrições ao exercício de direitos como os consagrados pelos seus artigos 7.o e 8.o, desde que essas restrições sejam previstas por lei, respeitem o conteúdo essencial dos referidos direitos e liberdades e, na observância do princípio da proporcionalidade, sejam necessárias e correspondam efetivamente a objetivos de interesse geral reconhecidos pela União, ou à necessidade de proteção dos direitos e das liberdades de terceiros (Acórdão de 9 de novembro de 2010, Volker und Markus Schecke e Eifert, C‑92/09 e C‑93/09, EU:C:2010:662, n.o 50).

59      O Regulamento 2016/679, nomeadamente o seu artigo 17.o, n.o 3, alínea a), consagra assim expressamente a exigência de uma ponderação entre, por um lado, os direitos fundamentais ao respeito pela vida privada e à proteção dos dados pessoais, consagrados pelos artigos 7.o e 8.o da Carta, e, por outro, o direito fundamental à liberdade de informação, garantido pelo artigo 11.o da Carta.

60      Há que tomar estas considerações em conta para examinar em que condições o operador de um motor de busca está obrigado a deferir um pedido de supressão de referências e assim apagar da lista de resultados, exibida após uma pesquisa efetuada a partir do nome da pessoa em causa, a hiperligação para uma página web, na qual figuram dados pessoais, abrangidos pelas categorias específicas visadas no artigo 8.o, n.os 1 e 5, da Diretiva 95/46.

61      A este respeito, há que começar por constatar que o tratamento que o operador de um motor de busca faz das categorias específicas de dados visadas no artigo 8.o, n.o 1, da Diretiva 95/46 é, em princípio, suscetível de ser abrangido pelas exceções previstas neste artigo 8.o, n.o 2, alíneas a) e e), ao qual o órgão jurisdicional de reenvio se refere e que prevê que a proibição de tratamento destas categorias específicas de dados não se aplica quando a pessoa em causa tenha dado o seu consentimento explícito para esse tratamento, salvo se a legislação do Estado‑Membro em causa proibir esse consentimento ou quando o tratamento disser nomeadamente respeito a dados manifestamente tornados públicos por essa pessoa. Estas exceções estão agora consagradas no artigo 9.o, n.o 2, alíneas a) e e), do Regulamento 2016/679. Além disso, este artigo 9.o, n.o 2, alínea g), que retoma em substância o artigo 8.o, n.o 4, da Diretiva 95/46, permite que se proceda ao tratamento das referidas categorias de dados quando este tratamento seja necessário por motivos de interesse público importante, com base no direito da União ou de um Estado‑Membro, que deve ser proporcional ao objetivo visado, respeitar a essência do direito à proteção dos dados pessoais e prever medidas adequadas e específicas que salvaguardem os direitos fundamentais e os interesses da pessoa em causa.

62      No que respeita à exceção visada no artigo 8.o, n.o 2, alínea a), da Diretiva 95/46 e no artigo 9.o, n.o 2, alínea a), do Regulamento 2016/679, resulta da definição do conceito de «consentimento» constante do artigo 2.o, alínea h), desta diretiva e do artigo 4.o, ponto 11, deste regulamento que este consentimento deve ser «específic[o]» e, por conseguinte, incidir especificamente sobre o tratamento efetuado no âmbito da atividade do motor de busca e assim sobre o facto de este tratamento permitir que terceiros obtenham, através de uma pesquisa efetuada a partir do nome dessa pessoa, uma lista de resultados que inclui hiperligações que conduzem a páginas web que contêm dados sensíveis que lhe dizem respeito. Ora, na prática, dificilmente se concebe, e não resulta, aliás, dos autos submetidos ao Tribunal, que o operador de um motor de busca solicite o consentimento específico das pessoas em causa antes de proceder, para efeitos das necessidades da sua atividade de referências a dados pessoais, ao tratamento dos dados pessoais que lhes dizem respeito. Seja como for, conforme observado nomeadamente pelos Governos francês e polaco, bem como pela Comissão, o facto de uma pessoa apresentar um pedido de supressão de referências significa, em princípio, que, pelo menos na data em que esse pedido é apresentado, essa pessoa já não consente no tratamento efetuado pelo operador do motor de busca. Neste contexto, há igualmente que recordar que o artigo 17.o, n.o 1, alínea b), do referido regulamento visa, de entre os motivos que justificam o «direito a ser esquecido», a circunstância de a pessoa em causa retirar o consentimento em que se baseia o tratamento, em conformidade com o artigo 9.o, n.o 2, alínea a), do mesmo regulamento, e que não exista outro fundamento jurídico para o tratamento.

63      Em contrapartida, a circunstância, visada no artigo 8.o, n.o 2, alínea e), da Diretiva 95/46 e no artigo 9.o, n.o 2, alínea e), do Regulamento 2016/679, de os dados em causa terem manifestamente sido tornados públicos pela pessoa em causa destina‑se, como em substância salientaram todos os interessados que se exprimiram a este respeito, a aplicar‑se tanto ao operador do motor de busca como ao editor da página web em questão.

64      Por conseguinte, nesta hipótese, não obstante a presença, na página web referenciada, de dados pessoais abrangidos pelas categorias específicas visadas no artigo 8.o, n.o 1, da Diretiva 95/46 e no artigo 9.o, n.o 1, do Regulamento 2016/679, o tratamento destes dados pelo operador do motor de busca no âmbito da sua atividade é conforme com estes textos, sob reserva de também preencher as outras condições de licitude previstas, nomeadamente, pelo artigo 6.o desta diretiva ou pelo artigo 5.o deste regulamento (v., neste sentido, Acórdão de 13 de maio de 2014, Google Spain e Google, C‑131/12, EU:C:2014:317, n.o 72).

65      No entanto, mesma nesta hipótese, a pessoa em causa pode, em aplicação do artigo 14.o, primeiro parágrafo, alínea a), da Diretiva 95/46 ou do artigo 17.o, n.o 1, alínea c), e do artigo 21.o, n.o 1, do Regulamento 2016/679, ter direito à supressão de referências à hiperligação em causa por motivos relacionados com a sua situação particular.

66      Seja como for, o operador de um motor de busca, perante um pedido de supressão de referências, deve verificar, a título dos motivos de interesse público importante visados no artigo 8.o, n.o 4, da Diretiva 95/46 ou no artigo 9.o, n.o 2, alínea g), do Regulamento 2016/679 e no respeito das condições previstas nestas disposições, se a inclusão da hiperligação para a página web em questão na lista exibida após uma pesquisa efetuada a partir do nome da pessoa em causa é necessária para o exercício do direito à liberdade de informação dos internautas potencialmente interessados em aceder a essa página web através dessa pesquisa, protegida pelo artigo 11.o da Carta. Embora, regra geral, os direitos da pessoa em causa protegidos pelos artigos 7.o e 8.o da Carta prevaleçam sobre a liberdade de informação dos internautas, este equilíbrio pode, todavia, depender, em determinados casos particulares, da natureza da informação em questão e da sua sensibilidade para a vida privada da pessoa em causa, bem como do interesse do público em dispor dessa informação, o qual pode variar, designadamente, em função do papel desempenhado por essa pessoa na vida pública (v., neste sentido, Acórdão de 13 de maio de 2014, Google Spain e Google, C‑131/12, EU:C:2014:317, n.o 81).

67      Acresce que, na hipótese de o tratamento incidir sobre as categorias específicas de dados visadas no artigo 8.o, n.os 1 e 5, da Diretiva 95/46 ou no artigo 9.o, n.o 1, e no artigo 10.o do Regulamento 2016/679, a ingerência nos direitos fundamentais ao respeito pela vida privada e à proteção dos dados pessoais da pessoa em causa é, conforme foi salientado no n.o 44 do presente acórdão, suscetível de ser especialmente grave devido à sensibilidade destes dados.

68      Por conseguinte, quando um pedido de supressão de referências relativo a uma hiperligação que conduz a uma página web na qual esses dados sensíveis estão publicados é apresentado a um operador de um motor de busca, este, baseando‑se em todos os elementos pertinentes do caso concreto e tomando em consideração a gravidade da ingerência nos direitos fundamentais da pessoa em causa ao respeito pela vida privada e à proteção dos dados pessoais, consagrados nos artigos 7.o e 8.o da Carta, deve verificar, a título dos motivos de interesse público importante visados no artigo 8.o, n.o 4, da Diretiva 95/46 ou no artigo 9.o, n.o 2, alínea g), do Regulamento 2016/679 e no respeito das condições previstas nestas disposições, se a inclusão dessa hiperligação na lista de resultados, que é exibida após uma pesquisa efetuada a partir do nome dessa pessoa, é estritamente necessária para proteger a liberdade de informação dos internautas potencialmente interessados em aceder a essa página web através dessa pesquisa, consagrada no artigo 11.o da Carta.

69      Resulta das considerações precedentes que há que responder à segunda questão da seguinte forma:

–        As disposições do artigo 8.o, n.os 1 e 5, da Diretiva 95/46 devem ser interpretadas no sentido de que, em conformidade com estas, o operador de um motor de busca é em princípio obrigado, sob reserva das exceções previstas nesta diretiva, a deferir os pedidos de supressão de referências relativos a hiperligações que conduzem a páginas web nas quais figuram dados pessoais pertencentes às categorias específicas visadas por estas disposições.

–        O artigo 8.o, n.o 2, alínea e), da Diretiva 95/46 deve ser interpretado no sentido de que, em aplicação deste, esse operador pode recusar deferir um pedido de supressão de referências quando constatar que as hiperligações em causa contêm dados pessoais que são abrangidos pelas categorias específicas visadas neste artigo 8.o, n.o 1, mas cujo tratamento é abrangido pela exceção prevista no referido artigo 8.o, n.o 2, alínea e), na condição de esse tratamento preencher todos os outros requisitos de licitude previstos nesta diretiva e desde que a pessoa em causa não tenha, nos termos do artigo 14.o, primeiro parágrafo, alínea a), da referida diretiva, direito de se opor ao referido tratamento por razões preponderantes e legítimas relacionadas com a sua situação específica.

–        As disposições da Diretiva 95/46 devem ser interpretadas no sentido de que, quando um pedido de supressão de referências relativo a uma hiperligação que conduz a uma página web na qual estão publicados dados sensíveis pertencentes a categorias específicas visadas no artigo 8.o, n.os 1 ou 5, desta diretiva é apresentado a um operador de um motor de busca, este, baseando‑se em todos os elementos pertinentes do caso concreto e tomando em consideração a gravidade da ingerência nos direitos fundamentais da pessoa em causa ao respeito pela vida privada e à proteção dos dados pessoais, consagrados nos artigos 7.o e 8.o da Carta, deve verificar, a título dos motivos de interesse público importante visados no artigo 8.o, n.o 4, da referida diretiva e no respeito das condições previstas nesta última disposição, se a inclusão dessa hiperligação na lista de resultados, que é exibida após uma pesquisa efetuada a partir do nome dessa pessoa, é estritamente necessária para proteger a liberdade de informação dos internautas potencialmente interessados em aceder a essa página web através dessa pesquisa, consagrada no artigo 11.o da Carta.

 Quanto à terceira questão

70      Tendo esta questão sido colocada na condição de vir a ser dada resposta negativa à primeira questão, atendendo à resposta afirmativa que foi dada a esta última, não há que responder à terceira questão.

 Quanto à quarta questão

71      Com a sua quarta questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se as disposições da Diretiva 95/46 devem ser interpretadas no sentido de que,

–        por um lado, as informações relativas a um processo judicial no qual foi arguida uma pessoa singular e, se for caso disso, as informações relativas à respetiva condenação constituem dados relativos a «infrações» e a «condenações penais», na aceção do artigo 8.o, n.o 5, da Diretiva 95/46, e,

–        por outro, o operador de um motor de busca é obrigado a deferir um pedido de supressão de referências relativo a hiperligações que conduzem a páginas web, nas quais figuram essas informações, quando essas informações digam respeito a uma fase anterior do processo judicial em causa e já não correspondem, após o decurso deste, à situação atual.

72      A este respeito, há que constatar que, conforme salientou o advogado‑geral no n.o 100 das suas conclusões e conforme alegam nomeadamente o Governo francês, a Irlanda, os Governos italiano e polaco, bem como a Comissão, as informações relativas a um processo judicial em que uma pessoa singular tenha sido constituída arguida, como as que relatam a sua constituição como arguido ou o processo, e, se for caso disso, a condenação que dele resultou constituem dados relativos a «infrações» e a «condenações penais», na aceção do artigo 8.o, n.o 5, primeiro parágrafo, da Diretiva 95/46 e do artigo 10.o do Regulamento 2016/679, independentemente do facto de, no decurso desse processo judicial, ter ou não sido efetivamente provado que a infração pela qual a pessoa foi constituída arguida foi cometida.

73      Por conseguinte, ao incluir na lista de resultados exibida após a realização de uma pesquisa efetuada a partir do nome da pessoa em causa hiperligações para páginas web nas quais esses dados são publicados, o operador de um motor de busca efetua um tratamento destes que, em aplicação do artigo 8.o, n.o 5, primeiro parágrafo, da Diretiva 95/46 e do artigo 10.o do Regulamento 2016/679, está sujeito a restrições especiais. Conforme observado pela Comissão, esse tratamento pode, ao abrigo destas disposições e sob reserva do respeito das outras condições de licitude previstas nesta diretiva e neste regulamento, ser lícito nomeadamente se no direito nacional estiverem previstas garantias adequadas e específicas, o que pode suceder quando a divulgação ao público, pelas autoridades públicas, das informações em questão tiver respeitado o direito nacional aplicável.

74      No que respeita a estas outras condições de licitude, importa recordar que decorre das exigências previstas no artigo 6.o, n.o 1, alíneas c) a e), da Diretiva 95/46, agora retomadas no artigo 5.o, n.o 1, alíneas c) a e), do Regulamento 2016/679, que mesmo um tratamento inicialmente lícito de dados exatos se pode tornar, com o tempo, incompatível com esta diretiva ou com este regulamento quando esses dados já não sejam necessários atendendo às finalidades para que foram recolhidos ou tratados. Tal é o caso, designadamente, quando são objetivamente inadequados, quando não são pertinentes ou já não são pertinentes ou quando são excessivos atendendo a essas finalidades ou ao tempo decorrido (Acórdão de 13 de maio de 2014, Google Spain e Google, C‑131/12, EU:C:2014:317, n.o 93).

75      Contudo, conforme foi constatado no n.o 66 do presente acórdão, mesmo na hipótese de o tratamento de dados visados no artigo 8.o, n.o 5, da Diretiva 95/46 e no artigo 10.o do Regulamento 2016/679 não respeitar as restrições previstas nestas disposições ou as outras condições de licitude, como as que constam do artigo 6.o, n.o 1, alíneas c) a e), desta diretiva e no artigo 5.o, n.o 1, alíneas c) a e), deste regulamento, o operador de um motor de busca deve ainda verificar, a título dos motivos de interesse público importante visados no artigo 8.o, n.o 4, da mesma diretiva ou no artigo 9.o, n.o 2, alínea g), do mesmo regulamento e no respeito das condições previstas nestas disposições, se a inclusão da hiperligação para a página web em questão na lista exibida após uma pesquisa efetuada a partir do nome da pessoa em causa é necessária para o exercício do direito à liberdade de informação dos internautas potencialmente interessados em aceder a essa página web através dessa pesquisa, protegida pelo artigo 11.o da Carta.

76      A este respeito, há que salientar que resulta da jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem que, perante pedidos apresentados pelas pessoas em causa para efeitos da proibição, ao abrigo do artigo 8.o da Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma, em 4 de novembro de 1950, de uma disponibilização na Internet, pelos diferentes media, de antigas reportagens relativas a processos penais que correram contra essas pessoas, deve ser efetuado um exame destinado a encontrar um justo equilíbrio entre o direito ao respeito pela vida privada das referidas pessoas e, nomeadamente, a liberdade de informação do público. Na procura deste justo equilíbrio, deve tomar‑se em consideração o papel essencial que a imprensa desempenha numa sociedade democrática e que inclui a redação de resumos e de comentários relativos a processos judiciais. Além disso, à função dos media que consiste em comunicar essas informações e ideias acresce o direito do público de as receber. O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem reconheceu, neste contexto, que o público tem um interesse não apenas em ser informado sobre uma questão de atualidade mas também em poder fazer pesquisas sobre acontecimentos passados, sendo contudo variável o interesse do público sobre os processos penais e podendo esse interesse evoluir ao longo do tempo, em função, designadamente, das circunstâncias do processo (TEDH, 28 de junho de 2018, M. L. e W. W. c. Alemanha, CE:ECHR:2018:0628JUD006079810, §§ 89 e 100 a 102).

77      Cabe assim ao operador de um motor de busca apreciar, no âmbito de um pedido de supressão de referências relativo a hiperligações que conduzem a páginas web nas quais estão publicadas informações relativas a um processo judicial em matéria penal em que é arguida a pessoa em causa, páginas essas que são relativas a uma fase anterior desse processo e que já não correspondem à situação atual, se, atendendo a todas as circunstâncias do caso concreto, tais como nomeadamente a natureza e a gravidade da infração em questão, o desenrolar e o resultado final do processo, o tempo decorrido, o papel desempenhado por essa pessoa na vida pública e o seu comportamento no passado, o interesse do público no momento em que o pedido é apresentado, o conteúdo e a forma da publicação, bem como as repercussões desta para a referida pessoa, esta última tem direito a que as informações em questão já não estejam, no momento atual, associadas ao seu nome através de uma lista de resultados, exibida após uma pesquisa efetuada a partir desse nome.

78      Importa contudo acrescentar que, ainda que o operador de um motor de busca viesse a constatar que tal não sucede pelo facto de a inclusão da hiperligação em causa ser estritamente necessária para conciliar os direitos ao respeito pela vida privada e à proteção dos dados da pessoa em causa com a liberdade de informação dos internautas potencialmente interessados, esse operador está, seja como for, obrigado, o mais tardar por ocasião do pedido de supressão de referências, a organizar a lista de resultados de tal forma que a imagem global que dela resulta para o internauta reflita a situação judicial atual, o que obriga nomeadamente a que hiperligações para páginas web que contenham informações a este respeito surjam em primeiro lugar nesta lista.

79      Atendendo às considerações precedentes, há que responder à quarta questão que as disposições da Diretiva 95/46 devem ser interpretadas no sentido de que,

–        por um lado, as informações relativas a um processo judicial no qual foi arguida uma pessoa singular e, se for caso disso, as informações relativas à respetiva condenação constituem dados relativos a «infrações» e a «condenações penais», na aceção do artigo 8.o, n.o 5, desta diretiva, e,

–        por outro, o operador de um motor de busca é obrigado a deferir um pedido de supressão de referências relativo a hiperligações que conduzem a páginas web, nas quais figuram essas informações, quando essas informações digam respeito a uma fase anterior do processo judicial em causa e já não correspondem, após o decurso deste, à situação atual, quando tenha sido constatado, no âmbito da verificação dos motivos de interesse público importante visados no artigo 8.o, n.o 4, da referida diretiva, que, atendendo a todas as circunstâncias do caso concreto, os direitos fundamentais da pessoa em causa, garantidos pelos artigos 7.o e 8.o da Carta, prevalecem sobre os dos internautas potencialmente interessados, protegidos pelo artigo 11.o da Carta.

 Quanto às despesas

80      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) declara:

1)      As disposições do artigo 8.o, n.os 1 e 5, da Diretiva 95/46/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 24 de outubro de 1995, relativa à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados, devem ser interpretadas no sentido de que a proibição ou as restrições relativas ao tratamento das categorias específicas de dados pessoais, visadas nestas disposições, também se aplicam, sob reserva das exceções previstas nesta diretiva, ao operador de um motor de busca no âmbito das suas responsabilidades, das suas competências e das suas possibilidades enquanto responsável pelo tratamento efetuado quando da atividade desse motor, por ocasião de uma verificação efetuada por esse operador, sob o controlo das autoridades nacionais competentes, no seguimento de um pedido apresentado pela pessoa em causa.

2)      As disposições do artigo 8.o, n.os 1 e 5, da Diretiva 95/46 devem ser interpretadas no sentido de que, em conformidade com estas, o operador de um motor de busca é em princípio obrigado, sob reserva das exceções previstas nesta diretiva, a deferir os pedidos de supressão de referências relativos a hiperligações que conduzem a páginas web nas quais figuram dados pessoais pertencentes às categorias específicas visadas por estas disposições.

O artigo 8.o, n.o 2, alínea e), da Diretiva 95/46 deve ser interpretado no sentido de que, em aplicação deste, esse operador pode recusar deferir um pedido de supressão de referências quando constatar que as hiperligações em causa contêm dados pessoais que são abrangidos pelas categorias específicas visadas neste artigo 8.o, n.o 1, mas cujo tratamento é abrangido pela exceção prevista no referido artigo 8.o, n.o 2, alínea e), na condição de esse tratamento preencher todos os outros requisitos de licitude previstos nesta diretiva e desde que a pessoa em causa não tenha, nos termos do artigo 14.o, primeiro parágrafo, alínea a), da referida diretiva, direito de se opor ao referido tratamento por razões preponderantes e legítimas relacionadas com a sua situação específica.

As disposições da Diretiva 95/46 devem ser interpretadas no sentido de que, quando um pedido de supressão de referências relativo a uma hiperligação que conduz a uma página web na qual estão publicados dados sensíveis pertencentes a categorias específicas visadas no artigo 8.o, n.os 1 ou 5, desta diretiva é apresentado a um operador de um motor de busca, este, baseandose em todos os elementos pertinentes do caso concreto e tomando em consideração a gravidade da ingerência nos direitos fundamentais da pessoa em causa ao respeito pela vida privada e à proteção dos dados pessoais, consagrados nos artigos 7.o e 8.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, deve verificar, a título dos motivos de interesse público importante visados no artigo 8.o, n.o 4, da referida diretiva e no respeito das condições previstas nesta última disposição, se a inclusão dessa hiperligação na lista de resultados, que é exibida após uma pesquisa efetuada a partir do nome dessa pessoa, é estritamente necessária para proteger a liberdade de informação dos internautas potencialmente interessados em aceder a essa página web através dessa pesquisa, consagrada no artigo 11.o da mesma Carta.

3)      As disposições da Diretiva 95/46 devem ser interpretadas no sentido de que,

–        por um lado, as informações relativas a um processo judicial no qual foi arguida uma pessoa singular e, se for caso disso, as informações relativas à respetiva condenação constituem dados relativos a «infrações» e a «condenações penais», na aceção do artigo 8.o, n.o 5, desta diretiva, e,

–        por outro, o operador de um motor de busca é obrigado a deferir um pedido de supressão de referências relativo a hiperligações que conduzem a páginas web, nas quais figuram essas informações, quando essas informações digam respeito a uma fase anterior do processo judicial em causa e já não correspondem, após o decurso deste, à situação atual, quando tenha sido constatado, no âmbito da verificação dos motivos de interesse público importante visados no artigo 8.o, n.o 4, da referida diretiva, que, atendendo a todas as circunstâncias do caso concreto, os direitos fundamentais da pessoa em causa, garantidos pelos artigos 7.o e 8.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, prevalecem sobre os dos internautas potencialmente interessados, protegidos pelo artigo 11.o da mesma Carta.

Assinaturas



*      Língua do processo: francês.