ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)

1 de julho de 2014 (*)

«Reenvio prejudicial — Regime nacional de apoio que prevê a concessão de certificados verdes negociáveis para as instalações que produzem eletricidade a partir de fontes de energia renováveis — Obrigação de os fornecedores de eletricidade e de certos utilizadores restituírem anualmente à autoridade competente uma certa quota de certificados verdes — Recusa em conceder certificados verdes a instalações de produção situadas fora do Estado‑Membro em causa — Diretiva 2009/28/CE — Artigos 2.°, segundo parágrafo, alínea k), e 3.°, n.° 3 — Livre circulação de mercadorias — Artigo 34.° TFUE»

No processo C‑573/12,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.° TFUE, pelo förvaltningsrätten i Linköping (Suécia), por decisão de 4 de dezembro de 2012, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 6 de dezembro de 2012, no processo

Ålands Vindkraft AB

contra

Energimyndigheten,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção),

composto por: V. Skouris, presidente, K. Lenaerts, vice‑presidente, A. Tizzano, L. Bay Larsen, T. von Danwitz, M. Safjan e C. G. Fernlund, presidentes de secção, E. Levits, A. Ó Caoimh, A. Arabadjiev, C. Toader, D. Šváby, M. Berger, A. Prechal (relatora) e E. Jarašiūnas, juízes,

advogado‑geral: Y. Bot,

secretário: C. Strömholm, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 5 de novembro de 2013,

vistas as observações apresentadas:

–        em representação da Ålands Vindkraft AB, por F. Distefano, avvocatessa,

–        em representação da Energimyndigheten, por E. Brandsma e J. Johansson, na qualidade de agentes, assistidos por K. Forsbacka, advokat,

–        em representação do Governo sueco, por A. Falk, C. Meyer‑Seitz, C. Stege, U. Persson e S. Johannesson, na qualidade de agentes,

–        em representação do Governo alemão, por T. Henze e K. Petersen, na qualidade de agentes,

–        em representação do Governo neerlandês, por M. de Ree e M. Bulterman, na qualidade de agentes,

–        em representação do Governo norueguês, por M. Emberland e B. Gabrielsen, na qualidade de agentes,

–        em representação da Comissão Europeia, por K. Herrmann, E. Kružíková e J. Enegren, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 28 de janeiro de 2014,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação dos artigos 2.°, segundo parágrafo, alínea k), e 3.°, n.° 3, da Diretiva 2009/28/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de abril de 2009, relativa à promoção da utilização de energia proveniente de fontes renováveis que altera e subsequentemente revoga as Diretivas 2001/77/CE e 2003/30/CE (JO L 140, p.16), bem como do artigo 34.° TFUE.

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Ålands Vindkraft AB (a seguir «Ålands Vindkraft») à Energimyndigheten (Agência da energia) a propósito da recusa desta última de aprovar, para obtenção de certificados de eletricidade, um parque eólico situado na Finlândia explorado pela Ålands Vindkraft.

 Quadro jurídico

 Direito da União

3        A Diretiva 2009/28 entrou em vigor em 25 de junho de 2009 e devia ser transposta para o direito nacional, o mais tardar, em 5 de dezembro de 2010. Esta diretiva revogou a Diretiva 2001/77/CE do Parlamento e do Conselho, de 27 de setembro de 2001, relativa à promoção da eletricidade produzida a partir de fontes de energia renováveis no mercado interno da eletricidade (JO L 283, p. 33), a partir de 1 de janeiro de 2012.

4        Os considerandos 1, 15, 25, 52 e 56 da Diretiva 2009/28 enunciam:

«(1)      O controlo do consumo de energia na Europa e a utilização crescente de energia proveniente de fontes renováveis, a par da poupança de energia e do aumento da eficiência energética, constituem partes importantes do pacote de medidas necessárias para reduzir as emissões de gases com efeito de estufa e cumprir o Protocolo de Quioto à Convenção‑Quadro das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas, bem como outros compromissos, assumidos a nível comunitário e internacional, de redução das emissões de gases com efeito de estufa para além de 2012. Estes fatores têm também um importante papel a desempenhar na promoção da segurança do aprovisionamento energético, na promoção do desenvolvimento tecnológico e da inovação e na criação de oportunidades de emprego e desenvolvimento regional, especialmente em zonas rurais e isoladas.

[...]

(15)      O ponto de partida, o potencial de energias renováveis e o cabaz energético variam de Estado‑Membro para Estado‑Membro. É consequentemente necessário traduzir o objetivo comunitário global de 20% em objetivos individuais para cada Estado‑Membro, tendo na devida conta uma repartição justa e adequada que pondere o ponto de partida e o potencial de cada Estado‑Membro, incluindo o nível existente de energia proveniente de fontes renováveis e o cabaz energético. Para esse efeito, o aumento total da utilização de energia proveniente de fontes renováveis necessário deverá ser repartido entre os Estados‑Membros com base num aumento igual da quota de cada Estado‑Membro, ponderada em função do seu [produto interno bruto (PIB)], modulada de modo a refletir os respetivos pontos de partida e fazendo a contabilização em termos de consumo final bruto de energia, tendo na devida conta os esforços já efetuados no passado pelos Estados‑Membros quanto à utilização da energia proveniente de fontes renováveis.

[...]

(25)      Os Estados‑Membros têm potenciais diferentes de energia renovável e utilizam diferentes regimes de apoio a nível nacional para as fontes de energia renováveis. A maioria dos Estados‑Membros aplica regimes de apoio que só concedem incentivos a energias provenientes de fontes renováveis produzidas no seu território. Para que os regimes de apoio nacionais funcionem adequadamente, é importante que os Estados‑Membros possam controlar o efeito e os custos desses mesmos regimes em função dos seus diferentes potenciais. Uma forma importante de alcançar o objetivo da [presente diretiva] é garantir o correto funcionamento dos regimes de apoio nacionais, à semelhança do disposto na Diretiva [2001/77], a fim de manter a confiança dos investidores e permitir aos Estados‑Membros conceberem medidas nacionais eficazes para o cumprimento dos objetivos. A presente diretiva destina‑se a facilitar a concessão de apoio transfronteiriço à energia proveniente de fontes renováveis sem afetar os regimes de apoio nacionais. Introduz mecanismos facultativos de cooperação entre Estados‑Membros que lhes permitem chegar a acordo quanto ao grau em que um Estado‑Membro apoia a produção de energia noutro Estado‑Membro e ao grau em que a produção de energia a partir de fontes renováveis deverá ser contabilizada para efeitos da avaliação do cumprimento dos objetivos nacionais globais de cada um. Para assegurar a eficácia de ambas as medidas de cumprimento dos objetivos, ou seja, os regimes de apoio nacionais e os mecanismos de cooperação, é essencial que os Estados‑Membros possam determinar se, e em que medida, os seus regimes de apoio se aplicam à energia produzida a partir de fontes renováveis noutros Estados‑Membros e chegar a acordo sobre a questão através da aplicação dos mecanismos de cooperação previstos na presente diretiva.

[...]

(52)      As garantias de origem emitidas para efeitos da presente diretiva têm como única função provar ao consumidor final que uma dada quota ou quantidade de energia foi produzida a partir de fontes renováveis. A garantia de origem pode ser transferida, independentemente da energia a que se refere, de um titular para outro. No entanto, a fim de garantir que uma unidade de eletricidade produzida a partir de fontes de energia renováveis só possa ser comunicada uma vez ao consumidor, deverá ser evitada a dupla contabilização e a dupla comunicação das garantias de origem. A energia proveniente de fontes renováveis cuja garantia de origem tenha sido vendida separadamente pelo produtor não deverá ser comunicada ou vendida ao consumidor final como energia produzida a partir de fontes renováveis. Importa, por outro lado, estabelecer uma distinção entre os certificados verdes utilizados para os regimes de apoio e as garantias de origem.

[...]

(56)      As garantias de origem não conferem por si só o direito de beneficiar de regimes de apoio nacionais.»

5        Nos termos do artigo 1.° desta diretiva, com a epígrafe «Objeto e âmbito de aplicação»:

«A presente diretiva estabelece um quadro comum para a promoção de energia proveniente das fontes renováveis. Fixa objectivos nacionais obrigatórios para a quota global de energia proveniente de fontes renováveis no consumo final bruto de energia [...]. Estabelece regras em matéria de transferências estatísticas entre Estados‑Membros, projectos conjuntos entre Estados‑Membros e com países terceiros, garantias de origem, procedimentos administrativos, informação e formação e acesso à rede de eletricidade no que se refere à energia produzida a partir de fontes renováveis. [...]»

6        O artigo 2.°, segundo parágrafo, alíneas j) a l), da referida diretiva inclui as seguintes definições:

«[…]

j)      ‘garantia de origem’: um documento eletrónico com a única função de provar ao consumidor final que uma dada quota ou quantidade de energia foi produzida a partir de fontes renováveis, exigido pelo n.° 6 do artigo 3.° da Diretiva 2003/54/CE [do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2003, que estabelece regras comuns para o mercado interno da eletricidade e que revoga a Diretiva 96/92/CE (JO L 176, p. 37)];

k)      ‘Regime de apoio’ qualquer instrumento, sistema ou mecanismo aplicado por um Estado‑Membro ou por um grupo de Estados‑Membros que promove a utilização de energia proveniente de fontes renováveis, reduzindo o custo dessa energia, aumentando o preço pelo qual esta pode ser vendida ou aumentando, por meio da obrigação de utilizar energias renováveis ou de outra forma, o volume das aquisições de energias renováveis. Estão incluídos, designadamente, a ajuda ao investimento, as isenções ou reduções fiscais, o reembolso de impostos, os regimes de apoio à obrigação de utilização de energias renováveis, nomeadamente os que utilizam certificados verdes, e os regimes de apoio direto ao preço, nomeadamente as tarifas de aquisição e os pagamentos de prémios;

l)      ‘Obrigação de energias renováveis’: um regime de apoio nacional que obriga os produtores de energia a incluírem uma determinada percentagem de energia proveniente de fontes renováveis na sua produção, que obriga os fornecedores de energia a incluírem uma determinada percentagem de energia proveniente de fontes renováveis no seu aprovisionamento ou que obriga os consumidores de energia a incluírem uma determinada percentagem de energia proveniente de fontes renováveis no seu consumo. Estão incluídos os regimes ao abrigo dos quais estes requisitos podem ser satisfeitos mediante a utilização de certificados verdes».

7        O artigo 3.°, n.os 1 a 3, da Diretiva 2009/28 dispõe:

«1.      Cada Estado‑Membro deve assegurar que a sua quota de energia proveniente de fontes renováveis, calculada nos termos dos artigos 5.° a 11.°, no consumo final bruto de energia em 2020 seja, pelo menos, igual ao objetivo nacional para a quota de energia proveniente de fontes renováveis estabelecida para esse ano na terceira coluna do quadro da parte A do anexo I. Estes objetivos globais nacionais obrigatórios devem ser coerentes com uma quota de pelo menos 20% de energia proveniente de fontes renováveis no consumo final bruto de energia da Comunidade até 2020. [...]

2.      Os Estados‑Membros devem introduzir medidas efetivamente concebidas para assegurar que a sua quota de energia proveniente de fontes renováveis seja igual ou superior à fixada na trajetória indicativa fixada na parte B do anexo I.

3.      Para alcançar os objetivos fixados nos n.os 1 e 2, os Estados‑Membros podem, nomeadamente, aplicar as seguintes medidas:

a)      Regimes de apoio;

b)      Medidas de cooperação entre vários Estados‑Membros e com países terceiros para alcançarem os seus objetivos nacionais globais nos termos dos artigos 5.° a 11.°

Sem prejuízo dos artigos [107.° TFUE] e [108.° TFUE], os Estados‑Membros têm o direito de decidir, nos termos dos artigos 5.° a 11.° da presente diretiva, em que medida apoiam a energia proveniente de fontes renováveis produzida noutros Estados‑Membros.»

8        Nos termos do artigo 5.°, n.os 1 e 3, desta diretiva:

«1.      O consumo final bruto de energia proveniente de fontes renováveis em cada Estado‑Membro é calculado como a soma:

a)      Do consumo final bruto de eletricidade produzida a partir de fontes de energia renováveis;

[...]

3.      Para efeitos da alínea a) do n.° 1, o consumo final bruto de eletricidade proveniente de fontes de energia renováveis é calculado como a quantidade de eletricidade produzida num Estado‑Membro a partir de fontes de energia renováveis [...]»

9        Com a epígrafe «Regimes de apoio conjuntos», o artigo 11.°, n.° 1, da referida diretiva prevê:

«Sem prejuízo das obrigações dos Estados‑Membros decorrentes do artigo 3.°, dois ou mais Estados‑Membros podem decidir, numa base voluntária, combinar ou coordenar parcialmente os seus regimes de apoio nacionais. Nestes casos, uma certa quantidade de energia produzida a partir de fontes renováveis no território de um Estado‑Membro participante pode contar para o objetivo global nacional de outro Estado‑Membro participante, desde que os Estados‑Membros interessados:

a)      Façam uma transferência estatística de quantidades de energia proveniente de fontes renováveis especificadas, de um Estado‑Membro para outro, nos termos do artigo 6.°;

b)      Estabeleçam uma regra de distribuição que reparta as quantidades de energia proveniente de fontes renováveis entre os Estados‑Membros participantes. Essa regra deve ser notificada à Comissão no prazo máximo de três meses após o final do primeiro ano em que é aplicada.»

10      O artigo 15.° da mesma diretiva, consagrado às garantias de origem, prevê nomeadamente:

«1. Para efeitos de prova ao consumidor final da quota ou quantidade de energia proveniente de fontes renováveis presente no cabaz energético de um produtor, nos termos do n.° 6 do artigo 3.° da Diretiva [2003/54], os Estados‑Membros devem assegurar que a origem da eletricidade produzida a partir de fontes de energia renováveis possa ser garantida como tal na aceção da presente diretiva de acordo com critérios objetivos, transparentes e não discriminatórios.

2.      [...]

A garantia de origem não tem qualquer função em termos do cumprimento do disposto no artigo 3.° por parte de um Estado‑Membro. As transferências de garantias de origem, separadamente ou conjuntamente com as transferências físicas de energia, não devem ter qualquer efeito na decisão dos Estados‑Membros de utilizar transferências estatísticas, projetos conjuntos ou regimes de apoio conjuntos para cumprimento dos objetivos ou no cálculo do consumo final bruto de energia produzida a partir de fontes renováveis nos termos do artigo 5.°

[...]

9.      Os Estados‑Membros devem reconhecer as garantias de origem emitidas por outros Estados‑Membros nos termos da presente diretiva exclusivamente enquanto prova dos elementos referidos no n.° 1 e nas alíneas a) a f) do n.° 6. [...]

[...]»

 Direito sueco

11      O regime dos certificados de eletricidade foi criado pela Lei (2003:113) relativa aos certificados de eletricidade [lagen (2003:113) om elcertifikat, a seguir, «Lei de 2003»]. Trata‑se de um regime de apoio à produção de eletricidade a partir de fontes de energia renováveis (a seguir «eletricidade verde»). Esta lei foi substituída, com efeitos a partir de 1 de janeiro de 2012, pela Lei (2011:1200) relativa aos certificados de eletricidade [lagen (2011:1200) om elcertifikat, a seguir «Lei de 2011»], que visava, nomeadamente, garantir a transposição da Diretiva 2009/28.

12      Por força da Lei de 2011, é atribuído aos produtores autorizados um certificado de eletricidade por megawatt‑hora (MWh) de eletricidade verde produzida. O órgão jurisdicional de reenvio indica que, ainda que essa restrição não figure expressamente no texto da Lei de 2011, decorre claramente dos trabalhos preparatórios desta e dos da Lei de 2003 que só as instalações de eletricidade verde situadas na Suécia podem ser aprovadas para a obtenção destes certificados. Em contrapartida, não é possível a aprovação de instalações situadas fora do território sueco.

13      Ainda que não preveja que a aquisição de certificados de eletricidade deve ser acompanhada da correspondente aquisição de eletricidade, a Lei de 2011 não exclui a possibilidade de uma aquisição agrupada.

14      Os certificados de eletricidade são negociáveis num mercado concorrencial no qual o preço é determinado pelo jogo da oferta e da procura.

15      O pedido de certificados de eletricidade tem origem no facto de os fornecedores de eletricidade e de certos utilizadores serem obrigados a deter e restituir ao Estado, em 1 de abril de cada ano, uma certa quota de certificados correspondente a uma quota‑parte do total dos seus fornecimentos ou do seu consumo de eletricidade durante o ano transato.

16      Nos termos do § 1 do capítulo 4 da Lei de 2011:

«Estão sujeitos à obrigação de quota:

1)      os fornecedores de eletricidade;

2)      os utilizadores de eletricidade que utilizem a eletricidade que eles próprios produziram se a quantidade utilizada for superior a 60 MWh por ano de referência numa instalação cuja potência instalada for superior a 50 [quilowatts (kW)];

3)      os utilizadores de eletricidade na medida em que utilizaram eletricidade importada ou comprada na Bolsa nórdica de eletricidade; e

4)      as empresas com forte intensidade elétrica que tenham sido registadas.»

17      A quota de certificados de eletricidade, determinada em função do objetivo de produção de eletricidade verde que o Reino da Suécia visa atingir, varia em função dos períodos em causa. Para o período compreendido entre 2010 e 2012, essa quota foi fixada em 0,179.

18      O fornecedor repercute o preço de aquisição dos certificados de eletricidade no consumidor.

19      Decorre igualmente das observações das partes no processo principal, como reproduzidas na decisão de reenvio, que, caso não estejam em medida de restituir o número de certificados de eletricidade exigido na data prevista, os fornecedores de eletricidade e os utilizadores em causa devem pagar um montante em dinheiro. Nas suas observações escritas apresentadas no Tribunal de Justiça, o Governo sueco fez igualmente referência à obrigação de pagamento desse direito, que qualificou de «específico» (a seguir «direito específico»).

20      Por outro lado, é pacífico que, na falta de um acordo internacional celebrado em conformidade com o artigo 11.° da Diretiva 2009/28, a obrigação de quota só pode ser cumprida através de certificados de eletricidade entregues ao abrigo da Lei de 2011.

21      A este respeito, o § 5 do capítulo 1 da Lei de 2011 dispõe:

«Os certificados de eletricidade emitidos para a produção de eletricidade renovável noutro Estado podem ser utilizados para perfazer a obrigação de quota nos termos da presente lei, se o regime sueco de certificados de eletricidade tiver sido coordenado com o regime de certificados de eletricidade no outro Estado através de acordo internacional.»

22      Em 29 de junho de 2011, o Reino da Suécia celebrou tal acordo com o Reino da Noruega. Em contrapartida, não existe um acordo deste tipo entre o Reino da Suécia e a República da Finlândia.

 Litígio no processo principal e questões prejudiciais

23      Em 30 de novembro de 2009, a Ålands Vindkraft solicitou à autoridade sueca competente a aprovação do seu parque eólico Oskar, situado na Finlândia, no arquipélago das ilhas Åland, com vista à concessão de certificados de eletricidade.

24      Este pedido foi indeferido pela Energimyndigheten, por decisão de 9 de junho de 2010, pelo facto de só as instalações de produção de eletricidade verde situadas na Suécia serem suscetíveis de aprovação para efeitos da concessão de certificados de eletricidade.

25      A Ålands Vindkraft interpôs recurso no förvaltningsrätten i Linköping destinado a obter a anulação dessa decisão e o deferimento do seu pedido de aprovação. Alega, nomeadamente, uma violação do artigo 34.° TFUE e afirma, a este respeito, que, devido à quota de certificados de eletricidade, fixada para o período em causa em 0,179, o regime dos certificados de eletricidade teria como consequência reservar cerca de 18% do mercado sueco do consumo de eletricidade aos produtores de eletricidade verde situados na Suécia, e isso em detrimento das importações de eletricidade provenientes de outros Estados‑Membros. Este entrave às trocas não pode ser justificado por considerações relacionadas com a proteção ambiental, em particular, porque, na Suécia, o consumo de energia verde é favorecido pela concessão de certificados de eletricidade em função da eletricidade verde consumida na Suécia, mas produzida noutros Estados‑Membros.

26      O förvaltningsrätten i Linköping observa, antes de mais, que, apesar de a referida decisão ter sido adotada em aplicação da Lei de 2003, o litígio no processo principal deve, ao abrigo do direito sueco, ser resolvido com base na lei aplicável no momento da sua análise pelo juiz, concretamente, a Lei de 2011. De resto, esta última alterou muito pouco as regras aplicáveis à problemática do processo principal.

27      O referido órgão jurisdicional considera que importa, em primeiro lugar, determinar se o regime dos certificados de eletricidade em causa no processo principal constitui efetivamente um regime de apoio abrangido pelos artigos 2.°, segundo parágrafo, alínea k), e 3.°, n.° 3, da Diretiva 2009/28, uma vez que favorece, em particular, a produção de eletricidade verde, ao passo que, por seu turno, as referidas disposições remetem para a utilização ou para o consumo desta. A ser esse efetivamente o caso, haveria que determinar se este regime é autorizado pela referida diretiva, apesar de excluir do seu âmbito de aplicação as instalações que produzem eletricidade verde noutros Estados‑Membros.

28      Em seguida, o mesmo órgão jurisdicional observa, por um lado, que o referido regime permite que os produtores suecos de eletricidade verde beneficiem de uma vantagem económica direta relativamente aos produtores de outros Estados‑Membros. Observa, por outro lado, que, apesar de a Lei de 2011 não criar formalmente um nexo entre a venda dos certificados de eletricidade e a venda da eletricidade correspondente, esta legislação pode favorecer indiretamente a comercialização da eletricidade de origem nacional pelo facto de os fornecedores poderem sentir‑se inclinados a adquirir eletricidade sobretudo junto dos produtores nacionais pelo facto de estes últimos também lhes poderem fornecer os certificados de que estes fornecedores precisam para cumprir a obrigação de quota que sobre eles impende.

29      Caso a referida legislação constitua uma medida de efeito equivalente a uma restrição quantitativa à importação na aceção do artigo 34.° TFUE, importa então colocar a questão de saber se, no caso em apreço, esta medida pode ser justificada por razões imperiosas relacionadas com a proteção ambiental.

30      Neste contexto, o förvaltningsrätten i Linköping interroga‑se, nomeadamente, sobre a eventual pertinência do acórdão PreussenElektra (C‑379/98, EU:C:2001:160) uma vez que, por um lado, ao invés do regime de apoio alemão em causa no processo que deu origem àquele acórdão, o regime sueco de certificados de eletricidade não impõe aos fornecedores de eletricidade nenhuma obrigação formal de adquirir eletricidade aos produtores nacionais e que, por outro, desde a prolação do referido acórdão, o direito da União conheceu vários desenvolvimentos relacionados, nomeadamente, com a adoção das Diretivas 2001/77 e 2009/28.

31      Por último, o referido órgão jurisdicional pergunta‑se, em particular à luz do princípio da segurança jurídica, se a Lei de 2011 devia ter previsto expressamente que a eletricidade verde produzida fora do território sueco não é abrangida pelo âmbito de aplicação do regime de apoio em causa no processo principal.

32      Nestas condições, o förvaltningsrätten i Linköping decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      O regime sueco de certificados de eletricidade é um regime de apoio nacional que obriga os fornecedores e certos consumidores de eletricidade [desse] Estado‑Membro a adquirir certificados de eletricidade, correspondentes a uma determinada parte, respetivamente, das suas vendas ou do seu consumo, sem obrigação expressa de também adquirirem eletricidade da mesma fonte. Os certificados de eletricidade são concedidos pelo [Reino da Súecia] e constituem a prova de que foi produzida uma determinada quantidade de eletricidade renovável. Os produtores de eletricidade [verde] obtêm, através da venda de certificados de eletricidade, um proveito adicional, como receita suplementar da sua produção de eletricidade. Devem o artigo 2.°, [segundo parágrafo], alínea k), e o artigo 3.°, n.° 3, da [Diretiva 2009/28] ser interpretados no sentido de que permitem a um Estado‑Membro aplicar um regime de apoio nacional nos termos acima expostos, que apenas abrange produtores localizados geograficamente no território nacional, e que tem como consequência que esses produtores são economicamente favorecidos relativamente a produtores que não podem obter certificados de eletricidade?

2)      Pode um regime como o descrito na [primeira questão], à luz do artigo 34.° [TFUE], ser considerado uma restrição quantitativa à importação ou uma medida de efeito equivalente?

3)      Em caso de resposta afirmativa à [segunda questão], pode tal regime ser compatível com o artigo 34.° [TFUE], atendendo ao objetivo de promover a produção de eletricidade [verde]?

4)      De que modo a apreciação das questões precedentes é afetada pela circunstância de a delimitação do regime de apoio apenas aos produtores nacionais não estar expressamente regulada na legislação nacional?»

 Tramitação do processo no Tribunal de Justiça

33      Por peças, respetivamente, apresentadas na Secretaria do Tribunal de Justiça em 5 e 6 de fevereiro de 2014 e em 14 de março de 2014, o Parlamento Europeu, o Conselho da União Europeia e o Reino da Suécia requereram que fosse ordenada a reabertura da fase oral do processo.

34      Em apoio destes pedidos, alegam, no essencial, que, na sequência da leitura das conclusões do advogado‑geral, nas quais aquele propôs que o Tribunal de Justiça declarasse que o artigo 3.°, n.° 3, da Diretiva 2009/28 é inválido, e na medida em que, por essa razão, o Tribunal de Justiça poderia ser levado a decidir o processo com base numa argumentação que é relativa à invalidade da referida disposição, e não à sua interpretação, e que não pôde ser debatida entre os interessados, haveria que lhes permitiu que apresentassem os seus argumentos a este respeito.

35      Segundo o artigo 83.° do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, este último pode, ouvido o advogado‑geral, ordenar a reabertura da fase oral do processo, designadamente se considerar que não está suficientemente esclarecido, ou quando, após o encerramento dessa fase, uma parte invocar um facto novo que possa ter influência determinante na decisão do Tribunal, ou ainda quando o processo deva ser resolvido com base num argumento que não foi debatido entre as partes ou os interessados referidos no artigo 23.° do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia.

36      O Tribunal de Justiça considera que, ouvido o advogado‑geral, dispõe de todos os elementos necessários para decidir no caso em apreço. Observa, por outro lado, que o processo não deve ser decidido com base num argumento relativo à validade da Diretiva 2009/28 que não foi debatido entre os interessados visados no artigo 23.° do Estatuto do Tribunal de Justiça.

37      Nestas condições, não há que ordenar a reabertura da fase oral do processo.

 Quanto às questões prejudiciais

 Quanto à primeira questão

38      Com a primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se as disposições dos artigos 2.°, segundo parágrafo, alínea k), e 3.°, n.° 3, da Diretiva 2009/28 devem ser interpretadas no sentido de que permitem que um Estado‑Membro estabeleça um regime de apoio, como o que está em causa no processo principal, que prevê a atribuição de certificados negociáveis aos produtores de eletricidade verde apenas tendo em consideração a energia verde produzida no território desse Estado e que submete os fornecedores e certos utilizadores de eletricidade a uma obrigação de entregar anualmente à autoridade competente uma certa quantidade desses certificados, correspondente a uma quota‑parte do total das suas entregas ou da sua utilização de eletricidade.

39      Importa, em primeiro lugar, verificar se um regime de apoio à eletricidade verde como o que está em causa no processo principal constitui um «regime de apoio» na aceção dos artigos 2.°, segundo parágrafo, alínea k), e 3.°, n.° 3, da Diretiva 2009/28.

40      A este respeito, importa desde já observar que decorre do considerando 25 da referida diretiva que o legislador da União considerou que uma forma importante de alcançar o objetivo por aquela prosseguido é garantir o correto funcionamento dos regimes de apoio nacionais previstos pela Diretiva 2001/77.

41      Ora, decorre expressamente do considerando 14 da Diretiva 2001/77 que, de entre os diversos tipos de regimes de apoio nacionais previstos pela diretiva, já constavam os mecanismos de apoio que, à semelhança do regime de apoio em causa no processo principal, utilizam os «certificados verdes».

42      Por outro lado, as disposições do artigo 2.°, segundo parágrafo, alíneas k) e l), da Diretiva 2009/28 também se referem especificamente aos regimes de apoio nacionais que utilizam «certificados verdes».

43      No que diz respeito ao facto de o regime em causa no processo principal apoiar a «produção» de eletricidade verde mais do que a «utilização» ou o «consumo» desta na aceção dos artigos 2.°, segundo parágrafo, alínea k), e 3.°, n.° 1, desta diretiva, importa observar o seguinte.

44      Por um lado, quanto ao facto de a definição do «regime de apoio» constante do artigo 2.°, segundo parágrafo, alínea k), da Diretiva 2009/28 visar, como sublinha o órgão jurisdicional de reenvio, instrumentos, regimes ou mecanismos destinados a promover a «utilização» da energia verde, sendo caso disso, através de uma obrigação de «utilizar» a mesma, importa ter em conta, em primeiro lugar, que o artigo 1.° desta diretiva, relativo ao seu objeto e âmbito de aplicação, prevê que a referida diretiva define um quadro comum para a promoção da produção de energia verde.

45      Em segundo lugar, há que realçar que o artigo 2.°, segundo parágrafo, alínea l), da referida diretiva precisa o que há que entender por «obrigação de energias renováveis» na aceção do artigo 2.°, segundo parágrafo, alínea k), desta. A este respeito o referido parágrafo, alínea l), remete para os regimes de apoio nacionais que exigem que os produtores «incluam […] na sua produção» uma determinada proporção de energia verde ou que obrigam «os fornecedores de energia a incluírem uma determinada percentagem de energia proveniente de fontes renováveis no seu aprovisionamento ou que obriga[m] os consumidores de energia a incluírem uma determinada percentagem de energia proveniente de fontes renováveis no seu consumo», ao mesmo tempo que precisa expressamente que os regimes ao abrigo dos quais estes requisitos podem ser satisfeitos mediante a utilização de certificados verdes estão incluídos nesta categoria.

46      Ora, o regime de apoio em causa no processo principal tem efetivamente essas características, ao prever que os fornecedores de eletricidade e certos consumidores devem utilizar certificados verdes para cumprirem as suas respetivas obrigações de propor uma determinada proporção de eletricidade verde na sua oferta de eletricidade ou de utilizar eletricidade verde numa determinada proporção.

47      Por outro lado, no que respeita ao facto de os objetivos nacionais vinculativos, para os quais os regimes de apoio visados no artigo 3.° n.° 3, da Diretiva 2009/28 são chamados a contribuir, serem identificados no artigo 3.°, n.° 1, desta diretiva em termos de quota de energia verde no «consumo final» de energia, importa observar que decorre do artigo 5.°, n.os 1 e 3, da referida diretiva que este consumo é na realidade calculado tendo por referência a quantidade de eletricidade verde «produzida» num Estado‑Membro.

48      Assim, decorre das considerações constantes dos n.os 40 a 47 do presente acórdão que um regime de apoio à produção de eletricidade verde que utiliza certificados verdes, como o que está em causa no processo principal, tem as características exigidas para ser qualificado de «regime de apoio» na aceção dos artigos 2.°, segundo parágrafo, alínea k), e 3.°, n.° 3, da Diretiva 2009/28.

49      Em segundo lugar, no que respeita às dúvidas do órgão jurisdicional de reenvio a respeito do facto de o regime de apoio em causa no processo principal só prever a concessão de certificados de eletricidade apenas tendo em consideração a eletricidade verde produzida em território nacional, não se pode deixar de constatar que, ao adotar a Diretiva 2009/28, o legislador da União manteve a possibilidade de existência dessa limitação territorial.

50      A este respeito, decorre, antes de mais, do considerando 25 desta diretiva que, depois de ter verificado que a maioria dos Estados‑Membros aplica regimes de apoio que só concedem incentivos a energias provenientes de fontes renováveis produzidas no seu território, o referido legislador indicou que, para garantir a eficácia destes regimes enquanto medidas chamadas a contribuir para o respeito dos respetivos objetivos globais nacionais, é essencial que esses Estados possam determinar se, e em que medida, os seus regimes de apoio nacionais se aplicam à energia produzida a partir de fontes renováveis noutros Estados‑Membros e chegar a acordo sobre a questão através da aplicação dos mecanismos de cooperação previstos pela referida diretiva.

51      Em seguida, o artigo 3.°, n.° 3, da Diretiva 2009/28 dispõe expressamente que, sem prejuízo dos artigos 107.° TFUE e 108.° TFUE, os Estados‑Membros têm o direito de decidir, em conformidade com os artigos 5.° a 11.° da referida diretiva, em que medida é que apoiam a energia proveniente de fontes renováveis produzida noutro Estado‑Membro.

52      Por último, no que respeita mais especificamente aos regimes nacionais que utilizam certificados verdes, há que observar que o legislador da União teve o cuidado de precisar expressamente, nos considerandos 52 e 56 desta diretiva, que as garantias de origem emitidas nos diferentes Estados‑Membros em execução da referida diretiva devem ser distinguidas dos certificados verdes utilizados nos regimes de apoio nacionais e que por si só as mesmas não conferem o direito de beneficiar desses regimes. Como de resto decorre dos artigos 2.°, segundo parágrafo, alínea j), e 15.°, n.os 1 e 9, da mesma diretiva, as garantias de origem que têm como única função indicar ao consumidor final a quota de energia verde presente no cabaz energético de um fornecedor de energia só devem ser mutuamente reconhecidas entre os Estados‑Membros a esse título.

53      Tais precisões confirmam, por sua vez, que o legislador da União não pretendeu obrigar os Estados‑Membros que optaram por um regime de apoio que utiliza certificados verdes a ampliar o benefício deste à eletricidade verde produzida no território de outro Estado‑Membro.

54      Atendendo ao exposto, importa responder à primeira questão que as disposições dos artigos 2.°, segundo parágrafo, alínea k), e 3.°, n.° 3, da Diretiva 2009/28 devem ser interpretadas no sentido de que permitem que um Estado‑Membro estabeleça um regime de apoio, como o que está em causa no processo principal, que prevê a atribuição de certificados negociáveis aos produtores de eletricidade verde apenas tendo em consideração a eletricidade verde produzida no território desse Estado e que obriga os fornecedores e certos utilizadores de eletricidade a entregar, anualmente, à autoridade competente, uma determinada quantidade desses certificados correspondente a uma quota‑parte do total das suas entregas ou da sua utilização de eletricidade.

 Quanto à segunda e terceira questões

55      Com a segunda e terceira questões, que importa analisar em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se o artigo 34.° TFUE deve ser interpretado no sentido de que constitui uma medida de efeito equivalente a uma restrição quantitativa à importação na aceção daquela disposição uma legislação nacional, como a que está em causa no processo principal, que prevê a atribuição de certificados negociáveis aos produtores de eletricidade verde apenas tendo em consideração a eletricidade verde produzida no território do Estado‑Membro em causa e que obriga os fornecedores e certos utilizadores de eletricidade a entregarem, anualmente, à autoridade competente, uma certa quantidade desses certificados correspondente a uma quota‑parte do total das suas entregas ou das sua utilização de eletricidade sob pena de pagamento de um direito específico. Em caso de resposta afirmativa, esse órgão jurisdicional pergunta se essa legislação pode, contudo, ser justificada com base no objetivo de promoção da produção de eletricidade verde que a mesma prossegue.

 Quanto à aplicabilidade do artigo 34.° TFUE

56      Segundo a Energimyndigheten e os Governos sueco e alemão, a análise da limitação que caracteriza o âmbito de aplicação territorial da legislação em causa no processo principal à luz do artigo 34.° TFUE não tem razão de ser, uma vez que a Diretiva 2009/28 é uma medida de harmonização que prevê expressamente que os Estados‑Membros não são obrigados a abrir os seus regimes de apoio à eletricidade verde produzida noutros Estados‑Membros e que essa eventual abertura constitui para esses Estados uma mera faculdade que, nesse caso, deve ser exercida segundo as modalidades previstas por esta diretiva.

57      Importa a este respeito recordar que é de jurisprudência constante que toda e qualquer medida nacional, num domínio que foi objeto de uma harmonização exaustiva a nível da União, deve ser apreciada à luz das disposições dessa medida de harmonização e não das do direito primário (v., designadamente, acórdão Radlberger Getränkegesellschaft e S. Spitz, C‑309/02, EU:C:2004:799, n.° 53 e jurisprudência referida).

58      No caso vertente, importa, pois, determinar se deve considerar‑se que a Diretiva 2009/28 procedeu a uma harmonização que não permite a análise da compatibilidade de uma legislação como a que está em causa no processo principal com o artigo 34.° TFUE.

59      A este respeito, cumpre desde já que observar que, longe de pretender levar a cabo uma total harmonização dos regimes nacionais de apoio à produção de energia verde, o legislador da União partiu, como decorre, nomeadamente, do considerando 25 desta diretiva, por um lado, da constatação de que os Estados‑Membros aplicam diferentes regimes de apoio e, por outro, do princípio de que importa garantir o bom funcionamento dos mesmos para preservar a confiança dos investidores e permitir que esses Estados definam medidas nacionais eficazes para atingirem os objetivos vinculativos nacionais globais que a referida diretiva lhes impõe.

60      A definição do «regime de apoio», para efeitos da aplicação da mesma diretiva, como figura no seu artigo 2.°, segundo parágrafo, alínea k), evidencia igualmente a origem essencialmente estatal dos instrumentos, regimes ou mecanismos de apoio limitando‑se simultaneamente a referir, em termos muito gerais, os tipos de medidas de incentivo nacionais existentes, destinadas a promover a utilização de energia produzida a partir de fontes renováveis.

61      Por seu turno, o artigo 1.° da Diretiva 2009/28, que descreve o seu objeto, também não inclui indicações que permitam considerar que esta diretiva visa proceder a uma harmonização das características próprias dos regimes de apoio nacionais.

62      O artigo 3.°, n.° 3, da referida diretiva, que, no essencial, se limita a permitir e encorajar os regimes nacionais de apoio à produção de energia verde, também não inclui indicações a respeito dessas características, exceto quando precisa que os Estados‑Membros têm o direito de decidir, em conformidade com os artigos 5.° a 11.° da mesma diretiva, em que medida apoiam a energia verde produzida noutro Estado‑Membro.

63      Neste contexto, não pode considerar‑se que, ao tratar do aspeto relativo ao âmbito de aplicação territorial dos regimes de apoio nacionais, a Diretiva 2009/28 tenha levado a cabo, na aceção da jurisprudência recordada no n.° 57 do presente acórdão, uma harmonização exaustiva do domínio a eles relativo que permita excluir a análise da sua compatibilidade com o artigo 34.° TFUE (v., por analogia, acórdão Radlberger Getränkegesellschaft e S. Spitz, EU:C:2004:799, n.os 54 a 57).

64      Tendo em conta as considerações precedentes, importa interpretar as disposições do Tratado relativas à livre circulação de mercadorias na perspetiva enunciada na segunda e terceira questões.

 Quanto à existência de um entrave às trocas

65      A livre circulação de mercadorias entre Estados‑Membros é um princípio fundamental do Tratado que tem a sua expressão na proibição prevista no artigo 34.° TFUE (v., designadamente, acórdão Comissão/Dinamarca, C‑192/01, EU:C:2003:492, n.° 38).

66      É de jurisprudência constante que a referida disposição, ao proibir entre os Estados‑Membros as medidas de efeito equivalente a restrições quantitativas à importação, se aplica a qualquer medida nacional suscetível de entravar direta ou indiretamente, atual ou potencialmente o comércio intracomunitário (v., designadamente, acórdãos Dassonville, 8/74, EU:C:1974:82, n.° 5, e PreussenElektra, EU:C:2001:160, n.° 69).

67      Ora, importa constatar a este respeito que a legislação em causa no processo principal é suscetível de entravar, pelo menos indireta e potencialmente, a diversos títulos, as importações de eletricidade, em particular a verde, proveniente dos outros Estados‑Membros.

68      Por um lado, decorre da referida legislação que os fornecedores e certos consumidores são obrigados a deter, na data anualmente prevista, uma determinada quantidade de certificados de eletricidade, de modo a cumprirem a obrigação de quota que sobre eles impende e que depende da quantidade total de eletricidade que fornecem ou consomem.

69      Ora, na falta, nomeadamente, de uma convenção internacional para o efeito, só os certificados atribuídos a título do regime nacional podem ser utilizados para dar cumprimento a esta obrigação. Assim, regra geral, os referidos fornecedores e consumidores são obrigados a comprar esses certificados em função da eletricidade que importam, sob pena de pagamento de um direito específico.

70      Tais medidas são assim suscetíveis de colocar entraves às importações de eletricidade provenientes de outros Estados‑Membros (v., designadamente, por analogia, acórdão Ligur Carni e o., C‑277/91, C‑318/91 e C‑319/91, EU:C:1993:927, n.° 36).

71      Por outro lado, na sua decisão e nas suas questões, o órgão jurisdicional de reenvio salienta que, embora, no quadro do regime de apoio estabelecido pela legislação em causa no processo principal, os produtores de eletricidade verde possam vender os seus certificados de eletricidade num mercado aberto à concorrência, e dedicado a esta venda, nada nesta legislação proíbe esses produtores de venderem esses certificados conjuntamente com a eletricidade que produzem.

72      Ora, na prática, a existência dessa faculdade parece ser suscetível de favorecer a eventual abertura de negociações e a concretização de relações contratuais, sendo caso disso de longa duração, que têm por objeto o fornecimento de eletricidade nacional por esses produtores aos fornecedores ou aos utilizadores de eletricidade, estando assim estes últimos em medida de obter simultaneamente a eletricidade e os certificados verdes de que precisam para dar cumprimento à obrigação de quota que sobre eles impende.

73      Daqui decorre que, também nesta medida, o regime de apoio em causa no processo principal tem por efeito, pelo menos potencial, travar as importações de eletricidade provenientes de outros Estados‑Membros (v., neste sentido, acórdão Comissão/Irlanda, 249/81, EU:C:1982:402, n.os 27 a 29).

74      Neste contexto, importa nomeadamente recordar que o facto de um Estado‑Membro se abster de adotar as medidas suficientes para impedir obstáculos à livre circulação de mercadorias, nomeadamente por ações de operadores, mas que se tornaram possíveis devido a uma legislação particular que o Estado‑Membro instituiu, é suscetível de entravar as trocas comerciais intracomunitárias na mesma medida que uma ação desse Estado (v., neste sentido, acórdãos Comissão/França, C‑265/95, EU:C:1997:595, n.° 31, e Schmidberger, C‑112/00, EU:C:2003:333, n.° 58).

75      Atendendo ao exposto, importa declarar que uma legislação como a que está em causa no processo principal é suscetível de entravar as importações de eletricidade, em particular a verde, proveniente de outros Estados‑Membros e que, por conseguinte, constitui uma medida de efeito equivalente a restrições quantitativas às importações, em princípio incompatível com as obrigações do direito da União resultantes do artigo 34.° TFUE, a menos que esta legislação possa ser objetivamente justificada (v., neste sentido, designadamente, acórdão Comissão/Áustria, C‑320/03, EU:C:2005:684, n.° 69).

 Quanto à eventual justificação

76      Como decorre de jurisprudência constante, uma legislação ou uma prática nacional que constitui uma medida de efeito equivalente às restrições quantitativas pode ser justificada por uma das razões de interesse geral enumeradas no artigo 36.° TFUE ou por exigências imperativas. Em ambos os casos, a medida nacional deve, em conformidade com o princípio da proporcionalidade, ser adequada para garantir a realização do objetivo prosseguido e não ultrapassar o necessário para atingir esse objetivo (v., designadamente, acórdão Comissão/Áustria, C‑524/07, EU:C:2008:717, n.° 54 e jurisprudência referida).

–       Quanto ao objetivo de promoção do recurso às fontes de energia renováveis

77      Segundo jurisprudência constante, as medidas nacionais suscetíveis de entravar o comércio intracomunitário podem nomeadamente ser justificadas por exigências imperativas relacionadas com a proteção do ambiente (v., neste sentido, acórdão Comissão/Áustria, EU:C:2008:717, n.° 57 e jurisprudência referida).

78      A este respeito, importa recordar que a utilização de fontes de energia renováveis para a produção de eletricidade, que uma legislação como a que está em causa no processo principal visa promover, é útil para a proteção do ambiente, na medida em que contribui para a redução das emissões de gases com efeito de estufa que se encontram entre as principais causas das alterações climáticas que a União Europeia e os seus Estados‑Membros se comprometeram a combater (v., neste sentido, acórdão PreussenElektra, EU:C:2001:160, n.° 73).

79      A este respeito, o aumento desta utilização constitui, como é nomeadamente explicitado no considerando 1 da Diretiva 2009/28, um dos elementos importantes do pacote de medidas necessárias para reduzir as emissões de gases com efeito de estufa e cumprir o Protocolo de Quioto à Convenção‑Quadro das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas, bem como outros compromissos, assumidos a nível comunitário e internacional, de redução das emissões de gases com efeito de estufa para além de 2012.

80      Como o Tribunal de Justiça já observou, esse aumento também tem por objetivo a proteção da saúde e da vida das pessoas e dos animais, bem como a preservação dos vegetais, razões de interesse geral enumeradas no artigo 36.° TFUE (v., neste sentido, acórdão PreussenElektra, EU:C:2001:160, n.° 75).

81      Decorre, por outro lado, do artigo 194.°, n.° 1, alínea c), TFUE que o desenvolvimento das energias renováveis é um dos objetivos que deve guiar a política da União no domínio da energia.

82      Atendendo às considerações precedentes, há que admitir que um objetivo de promoção da utilização das fontes de energia renováveis para a produção de eletricidade como o que é prosseguido pela legislação em causa no processo principal é, em princípio, suscetível de justificar eventuais entraves à livre circulação de mercadorias.

–       Quanto à proporcionalidade

83      Como recordado no n.° 76 do presente acórdão, para que a referida legislação nacional possa ser justificada, importa contudo que preencha as exigências decorrentes do princípio da proporcionalidade, ou seja, que seja adequada para atingir o objetivo legítimo que prossegue e que seja necessária para o fazer.

84      Importa, a título preliminar e em resposta a determinadas interrogações suscitadas a este respeito pelo órgão jurisdicional de reenvio, voltar a analisar, à luz das evoluções sofridas pelo direito da União pertinente, certas particularidades do mercado da eletricidade que foram tomadas em consideração pelo Tribunal de Justiça no contexto da análise da proporcionalidade feita no acórdão PreussenElektra (EU:C:2001:160).

85      Em particular, como observou o advogado‑geral nos n.os 83 a 86 das suas conclusões, a constatação do Tribunal de Justiça no n.° 78 do referido acórdão segundo a qual a Diretiva 96/92/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 19 de dezembro de 1996, que estabelece regras comuns para o mercado interno da eletricidade (JO 1997, L 27, p. 20), então em vigor, correspondia apenas a uma fase de liberalização do mercado da eletricidade e deixava subsistir obstáculos às trocas de eletricidade entre Estados‑Membros já não é pertinente.

86      Com efeito, há que recordar que a União adotou em seguida várias regulamentações que têm como objetivo superar progressivamente os referidos entraves de modo a permitir pôr em prática um mercado interno da eletricidade plenamente operacional, no qual sejam nomeadamente intensificadas as trocas transfronteiriças de eletricidade na União e no qual todos os fornecedores possam fornecer os seus produtos e os consumidores possam escolher livremente o seu fornecedor. É esse em particular o caso das Diretivas, sucessivas, 2003/54 e 2009/72/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de julho de 2009, que estabelece regras comuns para o mercado interno da eletricidade e que revoga a Diretiva 2003/54 (JO L 211, p. 55), e dos Regulamentos, sucessivos, (CE) n.° 1228/2003 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2003, relativo às condições de acesso à rede para o comércio transfronteiriço de eletricidade (JO L 176, p. 1), e (CE) n.° 714/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de julho de 2009, relativo às condições de acesso à rede para o comércio transfronteiriço de eletricidade e que revoga o Regulamento n.° 1228/2003 (JO L 211, p. 15).

87      Em contrapartida, a constatação do Tribunal de Justiça no n.° 79 do acórdão PreussenElektra (EU:C:2001:160) segundo a qual a natureza da eletricidade é tal que, uma vez admitida na rede de transporte ou de distribuição, é difícil determinar a sua origem e, designadamente, a fonte de energia a partir da qual foi produzida, continua a ser pertinente.

88      O facto de as Diretivas, sucessivas, 2001/77 e 2009/28 terem previsto que a origem da eletricidade verde pode ser atestada através de garantias de origem não pode pôr em causa a referida constatação.

89      Por um lado, como já foi observado no n.° 52 do presente acórdão, essas garantias de origem têm como única função indicar ao consumidor final a quota de energia verde presente no cabaz energético de um produtor de energia.

90      Por outro lado, não se pode deixar de constatar que, atendendo à natureza fungível da eletricidade presente nas redes de transporte e de distribuição, as referidas garantias não permitem atestar que uma dada quantidade de eletricidade fornecida por essas redes é precisamente aquela que provém de fontes de energia renováveis, em função das quais essas mesmas garantias foram concedidas, de modo que continua a ser difícil pôr em prática uma separação sistemática da eletricidade como eletricidade verde nas fases de distribuição e de consumo.

91      À luz destas considerações preliminares, importa, em primeiro lugar, analisar um dos aspetos da legislação em causa no processo principal, realçado pelo órgão jurisdicional de reenvio nas suas questões e que esteve na origem da recusa da autorização à Ålands Vindkraft, concretamente, o facto de, ao abrigo desta legislação, os certificados de eletricidade só serem concedidos pela eletricidade verde produzida em território nacional.

92      A este respeito, há que admitir que, no estado atual do direito da União, essa limitação territorial pode ser considerada, em si mesma, como sendo necessária para atingir o objetivo legítimo prosseguido no caso concreto, que é o de promover um aumento do recurso à utilização das fontes de energia renováveis na produção de eletricidade.

93      É certo que, como nomeadamente sustentou a Ålands Vindkraft, o objetivo de proteção do ambiente subjacente ao aumento da produção e do consumo de eletricidade verde, concretamente, em particular, a redução das emissões de gases com efeito de estufa, assim como, de resto, os objetivos com aquele relacionados relativos à proteção da saúde e da vida das pessoas e dos animais e à preservação dos vegetais, parecem a priori poder ser prosseguidos na União independentemente de este aumento ter a sua origem nas instalações localizadas no território de um determinado Estado‑Membro.

94      Contudo, uma vez que o direito da União não procedeu à harmonização dos regimes de apoio nacionais à eletricidade verde, os Estados‑Membros podem, em princípio, limitar o benefício desses regimes à produção de eletricidade verde localizada no seu território.

95      Em primeiro lugar, o facto de um regime de apoio nacional ser concebido de modo a beneficiar diretamente a produção de eletricidade verde, em vez do mero consumo desta, pode nomeadamente ser explicado pelo facto de o caráter verde da eletricidade só estar relacionado com o modo de produção desta e de, assim, os objetivos ambientais relacionados com a redução das emissões de gás poderem efetivamente ser prosseguidos sobretudo na fase da produção.

96      Em contrapartida, como observado nos n.os 87 e 90 do presente acórdão, uma vez admitida a eletricidade verde na rede de transporte ou de distribuição, é difícil determinar a origem específica, sendo difícil proceder à sua distinção sistemática enquanto eletricidade verde na fase do consumo.

97      Há, por outro lado, que recordar que, como decorre nomeadamente dos considerandos 1 e 25 e dos artigos 3.°, n.° 1, e 5.°, n.os 1 e 3, da Diretiva 2009/28 e como foi exposto na análise da primeira questão, para garantir a realização dos compromissos ambientais internacionais assumidos pela União, o legislador da União fixou aos diferentes Estados‑Membros objetivos nacionais vinculativos na forma de quotas de produção de eletricidade verde.

98      Em segundo lugar, e quanto ao facto de o regime de apoio em causa no processo principal ser concebido de modo a beneficiar apenas a produção de eletricidade verde localizada em território nacional, importa observar que, como salientou o legislador da União no considerando 15 da Diretiva 2009/28, o ponto de partida, o potencial de energias renováveis e o cabaz energético variam de Estado‑Membro para Estado‑Membro, o que conduziu nomeadamente o referido legislador a considerar que, tendo em conta essas diferenças, havia que operar uma repartição justa e apropriada do esforço a consagrar para cumprir os referidos compromissos internacionais da União.

99      Por outro lado, como observou igualmente o mesmo legislador no considerando 25 da referida diretiva, parece essencial, para que os regimes de apoio nacionais funcionem adequadamente, que os Estados‑Membros possam controlar o efeito e os custos desses mesmos regimes em função dos seus diferentes potenciais ao mesmo tempo que mantêm a confiança dos investidores.

100    Há que recordar, além disso, que, preservando o caráter nacional e, em princípio, territorial dos regimes de apoio existentes, o legislador da União não deixou de prever igualmente diversos mecanismos destinados a permitir que os Estados‑Membros cooperem, na medida do possível, para atingir os objetivos vinculativos que a referida diretiva lhes impõe. Entre estes mecanismos figura a possibilidade, prevista no artigo 11.° da mesma diretiva, de pôr em prática regimes de apoio conjuntos.

101    Como realçado no n.° 22 do presente acórdão, essa faculdade foi nomeadamente exercida pelo Reino da Suécia e o Reino da Noruega que, na medida em que possuem ambos um regime de apoio que utiliza certificados verdes, procederam à sua integração.

102    No que diz respeito à circunstância, invocada pela Ålands Vindkraft, de os indicadores revelarem que o Reino da Suécia já dispõe da capacidade de produção de eletricidade verde que lhe permite atingir os objetivos nacionais obrigatórios que a referida diretiva lhe impõe, não se pode deixar de considerar, mesmo que tal venha a ser demonstrado, que tal circunstância não justifica a conclusão de que já não é necessária a limitação territorial que caracteriza o regime de apoio em causa no processo principal.

103    Com efeito, a este respeito, basta observar que esse regime de apoio à energia verde, cujo custo de produção parece, como recordaram nomeadamente o Governo sueco e a Comissão, ainda ser bastante elevado em comparação com o da eletricidade produzida a partir de fontes de energia não renováveis, visa, por natureza, favorecer, numa perspetiva de longo prazo, investimentos em novas instalações, dando aos produtores certas garantias quanto ao futuro escoamento da sua produção de eletricidade verde. Assim, a efetividade desse regime exige, por definição, uma certa perenidade que seja adequada, nomeadamente, a assegurar o respeito da confiança legítima dos investidores que escolheram esta via e a garantir a prossecução da exploração dessas instalações.

104    Tendo em conta o exposto, não se afigura que, pelo simples facto de ter limitado o benefício de um regime de apoio que utiliza certificados verdes como o que está em causa no processo principal à eletricidade verde produzida em território nacional, o Reino da Suécia tenha violado o princípio da proporcionalidade. No atual estado do direito da União, esse Estado‑Membro considerou legitimamente que essa limitação territorial não ultrapassava o necessário para atingir o objetivo de aumento da produção e, indiretamente, do consumo de eletricidade verde na União que quer o regime nacional quer a Diretiva 2009/28 no âmbito do qual aquele se inscreve prosseguem.

105    No entanto, em segundo lugar, importa analisar se, quando previstas em conjunto com a limitação territorial que acaba de ser abordada, as demais características da legislação em causa no processo principal, referidas pelo órgão jurisdicional de reenvio, permitem concluir que, no seu conjunto, esta legislação satisfaz efetivamente as exigências decorrentes do princípio da proporcionalidade.

106    A este respeito, cumpre com efeito recordar que decorre da decisão de reenvio que esta legislação se caracteriza, nomeadamente, por uma obrigação que se impõe anualmente aos fornecedores e a certos utilizadores de eletricidade de deterem e restituírem à autoridade competente uma certa quantidade de certificados de eletricidade correspondente a uma quota‑parte das suas entregas ou da sua utilização, sob pena de pagamento um direito específico.

107    Decorre igualmente da descrição constante da referida decisão, por um lado, que os interessados podem obter certificados de eletricidade, que os produtores vendem num mercado específico aberto à concorrência no qual o preço do certificado é determinado pelo jogo da oferta e da procura, e, por outro lado, que a referida legislação não exige nem exclui que a eletricidade e os certificados sejam conjuntamente adquiridos a um mesmo produtor.

108    Assim, decorre da legislação em causa no processo principal que, caso a eletricidade verde produzida pela Ålands Vindkraft na Finlândia seja importada para a Suécia, a comercialização ou o consumo desta eletricidade exigirão, regra geral, que os fornecedores ou os consumidores em causa, incluindo, eventualmente, a Ålands Vindkraft, na qualidade de fornecedor, adquiram certificados de eletricidade em função da quantidade de eletricidade assim importada.

109    Atendendo a estes diversos aspetos, importa observar, em primeiro lugar, que um regime de apoio nacional que, à semelhança do que está em causa no processo principal, utiliza certificados verdes visa nomeadamente fazer com que o mercado suporte diretamente o excesso de custo relacionado com a produção de eletricidade verde, concretamente, os fornecedores e os utilizadores de eletricidade que estão vinculados pela obrigação de quota e, in fine, os consumidores.

110    Ao fazer essa escolha, um Estado‑Membro não excede a margem de apreciação que continua a ser a sua na prossecução do objetivo legítimo de aumentar a produção de eletricidade verde.

111    Em segundo lugar, importa observar que, por exemplo, ao invés de um apoio ao investimento, este tipo de regime visa apoiar a exploração das instalações de produção de eletricidade verde, uma vez em atividade. A este respeito, a obrigação de quota destina‑se, nomeadamente, a garantir aos produtores de eletricidade verde a procura dos certificados que lhes foram atribuídos e a facilitar desse modo o escoamento da energia verde que estes produzem a um preço superior ao preço do mercado da energia clássica.

112    O efeito de incitamento que esse regime tem sobre os produtores de eletricidade em geral, de entre os quais, nomeadamente, os que cumulam as qualidades de produtor, por um lado, e de fornecedor ou de consumidor por outro, para os conduzir a aumentar a sua produção de eletricidade verde, não parece assim poder ser posto em causa, também não podendo, por conseguinte, ser posta em causa a capacidade deste regime para atingir o objetivo legítimo prosseguido no caso vertente.

113    Em terceiro lugar, há, contudo, que observar que o bom funcionamento desse regime implica, por natureza, a existência de mecanismos de mercado que permitam aos operadores sujeitos à obrigação de quota, e que ainda não dispõem dos certificados exigidos para dar cumprimento à referida obrigação, obterem certificados de modo efetivo e em condições equitativas.

114    Assim, importa que sejam instituídos mecanismos que assegurem a criação de um verdadeiro mercado de certificados em que a oferta e a procura possam efetivamente encontrar‑se e tender para o equilíbrio, para que seja efetivamente possível que os fornecedores e os utilizadores interessados se aprovisionem de certificados em condições equitativas.

115    Ora, segundo as observações do órgão jurisdicional de reenvio, os certificados verdes são efetivamente vendidos, no Estado‑Membro em causa, num mercado aberto à concorrência de modo a que o preço dos mesmos seja determinado pelo jogo da oferta e da procura.

116    Quanto ao facto de a legislação em causa no processo principal prever que estão obrigados ao pagamento de um direito específico os fornecedores e os utilizadores que não respeitam a obrigação de quota à qual estão sujeitos, importa indicar o seguinte. Embora seja certo que, apesar de a aplicação do referido direito poder ser considerada necessária para incitar, por um lado, os produtores a aumentarem a sua produção de eletricidade verde e, por outro, os operadores sujeitos a uma obrigação de quota a adquirirem efetivamente os certificados exigidos, é também necessário que as modalidades de determinação e o montante desse direito não ultrapassem o necessário a essas finalidades de incitamento, evitando‑se nomeadamente penalizar os operadores em causa de uma forma que se revele excessiva.

117    Em quarto lugar, há que recordar que o órgão jurisdicional de reenvio sublinha que a legislação em causa no processo principal não exclui que os fornecedores e os utilizadores submetidos a uma obrigação de quota possam simultaneamente aprovisionar‑se junto dos produtores nacionais de eletricidade verde em eletricidade e em certificados de eletricidade. A Ålands Vindkraft sustenta que, por esse facto, os produtores nacionais de eletricidade verde podem, ao juntar a cessão dos certificados de eletricidade e de eletricidade, favorecer o escoamento desta última.

118    A este respeito, importa observar que, desde que exista um mercado de certificados verdes que preencha os requisitos enunciados nos n.os 113 e 114 do presente acórdão, no qual os operadores que importaram eletricidade proveniente de outros Estados‑Membros podem obter certificados de modo efetivo e em condições equitativas, o facto de a legislação nacional em causa no processo principal não proibir que os produtores de eletricidade verde vendam conjuntamente a eletricidade e os certificados aos operadores sujeitos à obrigação de quota não implica que esta legislação ultrapasse o necessário para atingir o objetivo de aumento da produção de eletricidade verde. Com efeito, o facto de se manter essa possibilidade parece ter um efeito de incentivo suplementar nos produtores no sentido de aumentar a sua produção de eletricidade verde.

119    Atendendo ao exposto, importa responder à segunda e terceira questões que o artigo 34.° TFUE deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a uma legislação nacional, como a que está em causa no processo principal, que prevê a atribuição de certificados negociáveis aos produtores de eletricidade verde apenas tendo em consideração a eletricidade verde produzida no território do Estado‑Membro em causa e que obriga os fornecedores e certos utilizadores de eletricidade a entregar anualmente à autoridade competente uma certa quantidade desses certificados, correspondente a uma quota‑parte do total das suas entregas ou da sua utilização de eletricidade, sob pena de pagamento de um direito específico.

 Quanto à quarta questão

120    Através da quarta questão, lida à luz dos fundamentos constantes da decisão de reenvio, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, e caso o artigo 34.° TFUE deva ser interpretado no sentido de que não se opõe a uma legislação nacional, como a que está em causa no processo principal, que reserva o benefício das medidas de apoio por ela previstas à produção de eletricidade verde no território do Estado‑Membro em causa, se, em contrapartida, o direito da União, em particular o princípio da segurança jurídica por este consagrado, se opõe a que esta limitação do âmbito de aplicação territorial não esteja expressamente prevista nas disposições desta legislação.

121    Importa a este respeito recordar que o referido órgão jurisdicional considera que, ao abrigo da legislação nacional em causa no processo principal, as instalações de produção de eletricidade verde situadas fora do território sueco não dão direito ao benefício do regime dos certificados de eletricidade. Aquele órgão jurisdicional considera que, apesar de a referida limitação não resultar expressamente da letra desta legislação, há que fazer uma interpretação neste sentido, atendendo, nomeadamente, aos seus trabalhos preparatórios.

122    A Comissão alega, a este respeito, que esta limitação decorre expressamente da letra do § 5 da Lei de 2011, que figura no capítulo I desta, de modo que o Tribunal de Justiça não tem de responder à questão submetida.

123    Cumpre contudo observar que a questão de saber em que medida a eventual limitação do âmbito de aplicação territorial da legislação em causa no processo principal decorre ou não do texto desta legislação pertence à sua interpretação e, por conseguinte, é da competência exclusiva dos órgãos jurisdicionais nacionais (v., designadamente, neste sentido, acórdão ČEZ, C‑115/08, EU:C:2009:660, n.° 57 e jurisprudência referida).

124    No que diz respeito à questão submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio, importa desde já recordar que, segundo a resposta dada pelo Tribunal de Justiça à primeira questão, o regime de apoio em causa no processo principal constitui um regime de apoio na aceção dos artigos 2.°, segundo parágrafo, alínea k), e 3.°, n.° 3, da Diretiva 2009/28, que, por esse facto e como decorre desta última disposição, é chamado a contribuir para a realização, por parte do Reino da Suécia, dos objetivos vinculativos que a referida diretiva lhe impõe em termos de produção de eletricidade verde no seu território.

125    Ora, decorre de jurisprudência constante que, quando os Estados‑Membros adotam medidas através das quais põem em prática o direito da União, devem respeitar os princípios gerais deste direito, entre os quais figura, nomeadamente, o princípio da segurança jurídica (v., designadamente, neste sentido, acórdãos Plantanol, C‑201/08, EU:C:2009:539, n.° 43 e jurisprudência referida, e IBV & Cie, C‑195/12, EU:C:2013:598, n.° 49).

126    Incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio examinar se uma legislação nacional como a que está em causa no processo principal é conforme com o referido princípio, uma vez que o Tribunal de Justiça, ao conhecer de um reenvio prejudicial a título do artigo 267.° TFUE, só é competente para fornecer a esse órgão jurisdicional todos os elementos de interpretação do direito da União que possam permitir‑lhe apreciar essa conformidade (v., neste sentido, designadamente, acórdão Plantanol, EU:C:2009:539, n.° 45 e jurisprudência referida).

127    A este propósito, deve recordar‑se que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o princípio da segurança jurídica exige, por um lado, que as normas de direito sejam claras e precisas e, por outro, que a sua aplicação seja previsível para os cidadãos (v., designadamente, acórdão Plantanol, EU:C:2009:539, n.° 46 e jurisprudência referida).

128    O referido princípio exige, em particular, que a legislação permita aos interessados conhecer com exatidão a extensão das obrigações que ela lhes impõe e que estes últimos possam conhecer sem ambiguidade os seus direitos e obrigações e agir em conformidade (v., designadamente, acórdão ArcelorMittal Luxembourg/Comissão e Comissão/ArcelorMittal Luxembourg e o., C‑201/09 P e C‑216/09 P, EU:C:2011:190, n.° 68 e jurisprudência referida).

129    No que respeita ao âmbito de aplicação territorial do regime de apoio previsto pela legislação nacional em causa no processo principal, para determinar se as exigências do princípio da segurança jurídica estão preenchidas, o órgão jurisdicional de reenvio pode ter em conta todos os elementos pertinentes que decorrem da letra, da finalidade e da economia desta legislação (v., por analogia, acórdão Mitsui & Co. Deutschland, C‑256/07, EU:C:2009:167, n.° 32).

130    Esse órgão jurisdicional também pode tomar em consideração a circunstância de a referida legislação nacional se inscrever no contexto da aplicação da Diretiva 2009/28 para a qual de resto remetem expressamente os trabalhos preparatórios da Lei de 2011, na medida em que, em particular, como resulta da análise que o Tribunal de Justiça consagrou à primeira questão, esta diretiva permite expressamente que os Estados‑Membros estabeleçam regimes semelhantes de apoio territorialmente circunscritos, nomeadamente para permitir que esses Estados atinjam os objetivos vinculativos que a referida diretiva lhes impõe em termos de produção de energia verde no seu território.

131    Tendo em conta os elementos precedentes e sem prejuízo das apreciações finais que são da competência exclusiva do órgão jurisdicional nacional, a legislação em causa no processo principal não se afigura suscetível de violar o princípio da segurança jurídica.

132    Atendendo ao exposto, importa responder à quarta questão que incumbe ao órgão jurisdicional nacional verificar, tendo em conta todos os elementos pertinentes, entre os quais figura, nomeadamente, o contexto normativo do direito da União em que a legislação em causa no processo principal se inscreve, se, no que respeita ao seu âmbito de aplicação territorial, a referida legislação preenche as exigências decorrentes do princípio da segurança jurídica.

 Quanto às despesas

133    Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) declara:

1)      As disposições dos artigos 2.°, segundo parágrafo, alínea k), e 3.°, n.° 3, da Diretiva 2009/28/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de abril de 2009, relativa à promoção da utilização de energia proveniente de fontes renováveis que altera e subsequentemente revoga as Diretivas 2001/77/CE e 2003/30/CE, devem ser interpretadas no sentido de que permitem que um Estado‑Membro estabeleça um regime de apoio, como o que está em causa no processo principal, que prevê a atribuição de certificados negociáveis aos produtores de eletricidade a partir de fontes de energia renováveis apenas tendo em consideração a eletricidade produzida no território desse Estado a partir dessas fontes e que obriga os fornecedores e certos utilizadores de eletricidade a entregar, anualmente, à autoridade competente, uma determinada quantidade desses certificados correspondente a uma quota‑parte do total das suas entregas ou da sua utilização de eletricidade.

2)      O artigo 34.° TFUE deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a uma legislação nacional, como a que está em causa no processo principal, que prevê a atribuição de certificados negociáveis aos produtores de eletricidade a partir de fontes de energia renováveis apenas tendo em consideração a eletricidade produzida a partir dessas fontes no território do Estado‑Membro em causa e que obriga os fornecedores e certos utilizadores de eletricidade a entregar anualmente à autoridade competente uma certa quantidade desses certificados, correspondente a uma quota‑parte do total das suas entregas ou da sua utilização de eletricidade, sob pena de pagamento de um direito específico.

3)      Incumbe ao órgão jurisdicional nacional verificar, tendo em conta todos os elementos pertinentes, entre os quais figura, nomeadamente, o contexto normativo do direito da União em que a legislação em causa no processo principal se inscreve, se, no que respeita ao seu âmbito de aplicação territorial, a referida legislação preenche as exigências decorrentes do princípio da segurança jurídica.

Assinaturas


* Língua do processo: sueco.