Language of document : ECLI:EU:T:2009:196

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Sétima Secção)

11 de Junho de 2009 (*)

«Marca comunitária – Processo de declaração de nulidade – Marca figurativa comunitária LAST MINUTE TOUR – Marca nacional anterior não registada LASTMINUTE.COM – Motivo relativo de recusa – Remissão para o direito nacional que rege a marca anterior – Regime da acção de common law por uso indevido de denominação (action for passing off) – Artigo 8.°, n.° 4, e artigo 52.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento (CE) n.° 40/94 [actuais artigo 8.°, n.° 4, e artigo 53.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento (CE) n.° 207/2009, respectivamente]»

Nos processos apensos T‑114/07 e T‑115/07,

Last Minute Network Ltd, com sede em Londres (Reino Unido), representada por P. Brownlow, solicitor, e S. Malynicz, barrister,

recorrente,

contra

Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), representado por D. Botis e A. Folliard‑Monguiral, na qualidade de agentes,

recorrido,

sendo a outra parte no processo na Câmara de Recurso do IHMI, interveniente no Tribunal de Primeira Instância,

Last Minute Tour SpA, com sede em Milão (Itália), representada por D. Caneva e G. Locurto, advogados,

que têm por objecto dois recursos interpostos das decisões da Segunda Câmara de Recurso do IHMI de 8 de Fevereiro de 2007 (processos R 256/2006‑2 e R 291/2006‑2), relativos aos processos de declaração de nulidade em que são partes a Last Minute Network Ltd e a Last Minute Tour SpA,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Sétima Secção),

composto por: N. J. Forwood, presidente, D. Šváby e L. Truchot (relator), juízes,

secretário: N. Rosner, administrador,

vistas as petições entradas na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 13 de Abril de 2007,

vistas as contestações do IHMI entradas na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 20 e 23 de Julho de 2007,

vistas as contestações da interveniente entradas na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 27 de Julho de 2007,

visto o despacho de apensação dos processos T‑114/07 e T‑115/07 para efeitos da fase oral do processo e do acórdão, de 14 de Outubro de 2008,

após a audiência de 5 de Novembro de 2008, na qual a interveniente não participou,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes dos litígios

 Processo de registo do sinal LASTMINUTE.COM como marca comunitária

1        Em 25 de Fevereiro de 2000, a sociedade Last Minute Network Ltd (a seguir «LMN» ou «recorrente») apresentou no Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), nos termos do Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1), conforme alterado [substituído pelo Regulamento (CE) n.° 207/2009 do Conselho, de 26 de Fevereiro de 2009, sobre a marca comunitária (JO L 78, p. 1)], um pedido de registo de marca comunitária relativo ao sinal nominativo LASTMINUTE.COM.

2        Os serviços para os quais o registo deste sinal foi pedido pertencem designadamente às classes 39 e 42, na acepção do acordo de Nice relativo à Classificação Internacional dos Produtos e dos Serviços para o registo de marcas, de 15 de Junho de 1957, conforme revisto e alterado, e correspondem, para cada uma destas classes, à seguinte descrição:

–        classe 39: «Agências de viagens; marcação de viagens; serviços de assessoria, informações e consultadoria relacionados com os serviços atrás referidos»;

–        classe 42: «Agências de viagens; marcação de restaurantes; fornecimento de serviços e equipamento para permitir o comércio através de meios electrónicos ou de meios não electrónicos; concepção de serviços para a pesquisa e a recuperação de informações através da Internet e bases de dados em linha, incluindo os respectivos sistemas de comunicação em rede; serviços de clubes para encontros/apresentação; serviços de acompanhamento em sociedade; prestação de informações através da Internet, bases de dados e outros meios electrónicos relacionados com os serviços atrás referidos; jardinagem; serviços de assessoria, informações e consultadoria relacionados com os serviços atrás referidos.»

3        Este pedido de registo foi indeferido por decisão do examinador de 29 de Outubro de 2001, com o fundamento de que o sinal nominativo LASTMINUTE.COM não tinha carácter distintivo na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 [actual artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009].

4        A LMN contestou esta decisão no IHMI, por recurso interposto em 18 de Dezembro de 2001.

5        Por decisão de 8 de Julho de 2003, a Segunda Câmara de Recurso do IHMI negou provimento ao recurso no que se refere aos serviços da classe 39 e aos serviços de «agências de viagens» e de «marcação de restaurantes» da classe 42, com fundamento na falta de carácter distintivo de LASTMINUTE.COM relativamente a esses serviços.

6        De acordo com a Câmara de Recurso, qualquer sociedade especializada na reserva de viagens, diversões ou jantares «de última hora» tem interesse em mencionar a expressão «last minute» para descrever os seus serviços. Uma expressão que é claramente do domínio público e que deve permanecer disponível para todos os operadores não é, em princípio, apta para distinguir os serviços de uma dada empresa.

7        A adição de «.com» a «lastminute» e a junção das duas palavras sem espaço nem travessão, frequente em inglês, não assume qualquer carácter distintivo. Simples referência a um endereço Internet, a extensão «.com» não transforma em marca um termo não distintivo.

 Processo de registo do sinal LAST MINUTE TOUR como marca comunitária

8        Em 11 de Março de 2000, a sociedade Last Minute Tour SpA (a seguir «LMT») apresentou no IHMI, nos termos do Regulamento n.° 40/94, um pedido de registo de marca comunitária relativo ao sinal figurativo a seguir representado, constituído pelos três elementos nominativos «last», «minute» e «tour», a preto, e pela reprodução de cor vermelha de um símbolo que alegadamente evoca viagens em língua rapanui antiga:

9        Os produtos e serviços para os quais o registo deste sinal foi pedido integram, respectivamente, a classe 16, por um lado, e as classes 39 e 42, por outro, e correspondem, para cada uma destas classes, à descrição seguinte:

–        classe 16: «Papel, cartão e produtos nestas matérias, não incluídos noutras classes; produtos de impressão; catálogos; horários impressos; panfletos; livros; jornais, revistas (publicações periódicas); artigos para encadernação; fotografias; rótulos; papelaria; adesivos (matérias colantes) para papelaria ou para uso doméstico; material para artistas; pincéis; máquinas de escrever e artigos de escritório (com excepção dos móveis); material de instrução ou de ensino (com excepção dos aparelhos); matérias plásticas para a embalagem (não incluídas noutras classes); cartas de jogar; caracteres de imprensa; clichés (estereótipos)»;

–        classe 39: «Agências de viagens e turismo; marcação de viagens; organização de viagens; organização de cruzeiros e excursões; transporte e acompanhamento de viajantes; transportes aéreos; aluguer de meios de transporte; informações sobre transportes»;

–        classe 42: «Serviços de hotéis, restaurantes, pensões, aldeamentos turísticos, bares, clubes privados; serviços relativos à reserva de hotéis e de aldeamentos turísticos; elaboração (concepção) de software; aluguer de software informático».

10      O pedido de marca foi publicado no Boletim de Marcas Comunitárias n.° 25/2001, de 19 de Março de 2001.

11      Em 19 de Junho de 2001, a LMN deduziu oposição ao registo do sinal apresentado pela LMT invocando a existência no Reino Unido da marca nominativa não registada LASTMINUTE.COM, que utilizava na vida comercial desde 1998, na acepção do artigo 8.°, n.° 4, do Regulamento n.° 40/94 (actual artigo 8.°, n.° 4, do Regulamento n.° 207/2009).

12      A oposição foi rejeitada por decisão de 12 de Julho de 2002 da Divisão de Oposição do IHMI, porque a LMN não produziu no prazo estabelecido prova do uso do direito anterior que tinha invocado como fundamento da sua oposição.

13      A marca comunitária LAST MINUTE TOUR foi registada em 14 de Maio de 2003 sob o n.° 1 552 231.

 Processo de declaração de nulidade da marca LAST MINUTE TOUR intentado pela LMN

14      Em 30 de Maio de 2003, a LMN apresentou um pedido de declaração de nulidade da marca comunitária LAST MINUTE TOUR com base nas disposições conjugadas do artigo 8.°, n.° 4, e do artigo 52.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94 [actual artigo 53.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 207/2009].

15      Em apoio do seu pedido, a LMN sustentou que a sua marca nacional anterior não registada LASTMINUTE.COM lhe dava, de acordo com o direito do Reino Unido, aplicável em razão do reenvio para esta legislação operado pelo artigo 8.°, n.° 4, do Regulamento n.° 40/94, o direito de proibir a utilização de uma marca mais recente e, consequentemente, de obter a sua anulação, nos termos do artigo 52.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94, para os serviços das classes 39 e 42 no que respeita a férias, voos, alojamento, fins‑de‑semana na cidade, divertimentos, saídas, locações, compras, outros serviços de viagens e de lazer fornecidos em linha bem como às acções publicitárias e promoções de outros materiais associados.

16      O pedido visa a anulação da marca comunitária para todos os produtos e serviços abrangidos por esta, com excepção dos serviços de concepção e de locação de software informático.

17      Por decisão de 23 de Dezembro de 2005, a Divisão de Anulação admitiu o pedido da LMN de anulação da marca comunitária LAST MINUTE TOUR em relação a todos os serviços em causa das classes 39 e 42, mas indeferiu este pedido no que se refere aos produtos em causa da classe 16.

18      A Divisão de Anulação decidiu que, nos termos do artigo 8.°, n.° 4, do Regulamento n.° 40/94, a LMN era titular, anteriormente à apresentação do pedido de marca comunitária, de um direito sobre o sinal LASTMINUTE.COM para serviços das classes 39 e 42, cujo alcance não era apenas local.

19      De acordo o direito do Reino Unido, que lhe é aplicável, este sinal conferia à LMN o direito de proibir a utilização de uma marca mais recente, desde que se verificassem os três requisitos da acção de common law por uso indevido de denominação (action for passing off), a saber, a reputação dos bens do demandante na acção (goodwill), uma apresentação enganosa dos produtos e dos serviços no sentido de que a sua oferta sob a marca comunitária LAST MINUTE TOUR poderia induzir o público pertinente a atribuir a sua origem comercial à LMN (misrepresentation) sendo susceptível de daí resultar um prejuízo comercial para a LMN.

20      A este respeito, a Divisão de Anulação admitiu desde logo que a LASTMINUTE.COM tinha adquirido no Reino Unido, desde 1998, uma reputação comprovada pelo orçamento promocional da sociedade, pelos importantes investimentos publicitários, pelos numerosos artigos de imprensa consagrados ao site Internet «lastminute.com» e pelo sucesso da entrada da sociedade em bolsa. A Divisão de Anulação deduziu desses elementos que a LMN tinha adquirido junto do público relevante do Reino Unido uma reputação considerável associada ao seu sinal.

21      Para apurar o carácter enganoso da apresentação de bens e serviços sob o sinal LAST MINUTE TOUR, a Divisão de Anulação considerou que bastava demonstrar que o público relevante podia considerar que aqueles eram provenientes da LMN, devido à semelhança das duas marcas, e que haveria, portanto, que avaliar o risco de confusão existente entre as mesmas.

22      Após ter constatado a identidade dos serviços das classes 39 e 42 designados pelas duas marcas, a Divisão de Anulação entendeu que, embora representada de modo diferente para cada uma, a expressão «lastminute» constituía o seu elemento dominante comum. Daí deduziu a existência de importantes semelhanças visuais e de algumas diferenças.

23      No plano fonético, a Divisão de Anulação considerou que os dois sinais, idênticos na sua parte inicial, apenas se diferenciavam pela terminação.

24      A Divisão de Anulação entendeu que existia identidade conceptual das duas marcas, uma vez que ambas se referiam ao conceito de transacção «de última hora», muito utilizado na Internet para identificar as ofertas a preços baixos de voos, estadias em hotéis, serviços de restauração e entradas para espectáculos.

25      Considerando estes elementos, a Divisão de Anulação entendeu existirem semelhanças significativas entre as duas marcas, não obstante alguns elementos de diferenciação. Daí deduziu a existência de um risco de confusão.

26      Por último, a Divisão de Anulação considerou que, por esse facto, a LMN poderia sofrer um prejuízo comercial.

27      Assim, a Divisão de Anulação anulou a marca comunitária LAST MINUTE TOUR para todos os serviços das classes 39 e 42, mas indeferiu o pedido da LMN de anulação desta marca para os produtos da classe 16, por falta de prova de uso anterior do sinal LASTMINUTE.COM relativamente a esses produtos.

28      Por recurso interposto no IHMI em 15 de Fevereiro de 2006 e registado sob a referência R 256/2006‑2, a LMT pediu a anulação da decisão da Divisão de Anulação na parte em que tinha declarado nula a sua marca comunitária LAST MINUTE TOUR para os serviços controvertidos das classes 39 e 42.

29      Por recurso interposto em 20 de Fevereiro de 2006 e registado sob a referência R 291/2006‑2, a LMN, por seu turno, pediu a anulação da decisão da Divisão de Anulação na parte em que esta indeferiu o seu pedido de declaração de nulidade da marca comunitária para os produtos da classe 16.

30      Por duas decisões de 8 de Fevereiro de 2007 (a seguir «decisões impugnadas»), a Segunda Câmara de Recurso do IHMI, por um lado, admitiu o recurso da LMT e anulou a decisão de nulidade do registo de LAST MINUTE TOUR para os serviços das classes 39 e 42 e, por outro, negou provimento ao recurso da LMN e confirmou o indeferimento pela Divisão de Anulação do seu pedido de declaração de nulidade em relação aos produtos da classe 16.

31      Nas duas decisões impugnadas, a Câmara de Recurso entendeu que, face à natureza dos produtos e dos serviços em causa e à qualidade de marca do Reino Unido não registada do sinal anterior, o público relativamente ao qual a análise do risco de confusão devia ser feita era constituído por consumidores médios destes produtos e serviços residentes no Reino Unido, normalmente informados e razoavelmente atentos e avisados.

32      A Câmara de Recurso realçou, seguidamente, que a menção «last minute» era constituída por duas palavras inglesas correntes e imediatamente compreendidas pelo público relevante. Aplicada aos produtos e serviços em causa, esta expressão indica clara e imediatamente que os mesmos são oferecidos em condições muito vantajosas devido à sua aquisição de última hora.

33      De acordo com a Câmara de Recurso, a menção «last minute» era, portanto, descritiva e desprovida de carácter distintivo relativamente aos produtos e serviços em causa e não podia ser registada, por aplicação do artigo 7.°, n.° 1, alíneas b) e c), do Regulamento n.° 40/94 [actual artigo 7.°, n.° 1, alíneas b) e c), do Regulamento n.° 207/2009], excepto se acompanhada por outros elementos, figurativos ou nominativos, susceptíveis de lhe conferirem um mínimo de carácter distintivo.

34      Acrescentou que a associação dos três elementos nominativos «last» «minute» e «tour» com o seu elemento gráfico tinha sem dúvida permitido à marca comunitária não colidir com os motivos absolutos de recusa definidos nas duas disposições já referidas, mas que o titular de tal marca não se podia opor ao uso das expressões «last minute» ou «tour» por outras empresas de turismo e de viagens.

35      De acordo com a Câmara de Recurso, era importante saber se, confrontado com a expressão «last minute», o público do Reino Unido se considerava solicitado pelo titular da marca LASTMINUTE.COM ou perante propostas «last minute» (de última hora) provenientes de qualquer empresa de turismo e de viagens. De todo o modo, a LMN não demonstrou que, em face da menção «last minute», este público pensaria imediatamente tratar‑se de serviços propostos pelo titular da marca LASTMINUTE.COM.

36      A Câmara de Recurso considerou assim que a reputação da LMN estava associada ao sinal LASTMINUTE.COM, enquanto tal, com todos os seus elementos, e não à menção genérica «last minute». Esta reputação era reconhecida exclusivamente no âmbito e unicamente para efeitos da acção por uso indevido de denominação prevista pelo direito do Reino Unido e não pode servir para conceder um monopólio da menção «last minute», que é não distintiva no que respeita aos produtos e serviços em causa.

37      Sendo muito limitado o carácter distintivo das duas marcas, o público concentraria a sua atenção sobre os elementos distintivos e dominantes, a saber, a combinação das diferentes palavras que compõem os dois sinais, a sua contracção numa única palavra, «lastminute», e a presença da extensão «.com» no sinal não registado, e o elemento gráfico na marca comunitária.

38      A Câmara de Recurso acrescentou que a influência dos elementos comuns das duas marcas e da componente «tour» na comparação dos sinais está fortemente atenuada, no plano visual, por carecer de carácter distintivo. Ao invés, dado a extensão «.com» e o símbolo gráfico vermelho serem completamente diferentes, prevalecem as dissemelhanças sobre as semelhanças gráficas das duas marcas.

39      Do ponto de vista fonético, a Câmara de Recurso constatou que as duas marcas continham uma menção idêntica, «lastminute», e duas componentes diferentes, «.com» (pronunciado em inglês «dot com») e «tour». Face às considerações relativas ao carácter distintivo dos diferentes elementos, a extensão «dot com» permite distinguir foneticamente as duas marcas.

40      Além disso, o impacto da menção «last minute», que evoca o conceito, comum às duas marcas, de ofertas de última hora, é atenuado pelo seu carácter descritivo, de modo que a referência directa a um endereço electrónico contida na extensão «.com» permite estabelecer uma diferença conceptual entre as duas marcas.

41      Ao apreciar a existência de um risco de confusão, a Câmara de Recurso entendeu que, confrontado com LAST MINUTE TOUR e o seu símbolo gráfico, o público do Reino Unido pensaria tratar‑se de uma empresa que propõe viagens «last minute», sem imaginar que estas ofertas provêem do titular da marca LASTMINUTE.COM. Com efeito, este público prestaria atenção aos elementos distintivos de cada sinal a fim de estabelecer a diferença relativamente a todos os outros prestadores de serviços semelhantes que utilizam também a expressão «last minute» nas suas ofertas de serviços.

42      A Câmara de Recurso deduziu destes elementos que, não obstante a semelhança dos elementos menos distintivos, as duas marcas não eram, no seu conjunto, suficientemente semelhantes para suscitar um risco de confusão, quer para produtos complementares dos serviços em causa quer mesmo para serviços idênticos.

 Pedidos das partes

43      A LMN conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        anular as decisões impugnadas proferidas nos processos R 256/2006‑2 (processo T‑114/07) e R 291/2006‑2 (processo T‑115/07);

–        declarar nula a marca comunitária LAST MINUTE TOUR para os produtos e serviços abrangidos, respectivamente, na classe 16 (processo T‑115/07), por um lado, e nas classes 39 e 42 (processo T‑114/07), por outro;

–        condenar o IHMI nas despesas.

44      O IHMI e a LMT concluem pedindo que o Tribunal se digne:

–        negar provimento aos recursos na sua totalidade;

–        condenar a recorrente nas despesas.

 Questão de direito

45      Nos termos do artigo 52.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94, a marca comunitária é declarada nula, na sequência de um pedido apresentado ao IHMI, sempre que exista um direito anterior referido no n.° 4 do artigo 8.°, deste regulamento e se encontrem preenchidas as condições enunciadas nesse número.

46      Resulta da conjugação destas duas disposições que o titular de uma marca não registada ou de outro sinal utilizado na vida comercial cujo alcance não seja apenas local pode obter a anulação de uma marca comunitária mais recente, quando e na medida em que, de acordo com o direito do Estado‑Membro aplicável, por um lado, tenham sido adquiridos direitos sobre este sinal antes da data do depósito do pedido de marca comunitária e, por outro, este sinal confira ao seu titular o direito de proibir a utilização de uma marca mais recente.

47      Para efeitos de aplicação do artigo 8.°, n.° 4, do Regulamento n.° 40/94, incumbe à Câmara de Recurso tomar em consideração quer a legislação nacional aplicável por força do reenvio operado por esta disposição quer as decisões dos tribunais proferidas no Estado‑Membro em causa. Com base neste fundamento, o requerente da declaração de nulidade deve demonstrar que o sinal em causa é abrangido pelo âmbito de aplicação do direito do Estado‑Membro invocado e que ele permite proibir a utilização de uma marca posterior [v., por analogia, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 12 de Junho de 2007, Budějovický Budvar/IHMI – Anheuser‑Busch (BUDWEISER), T‑53/04 a T‑56/04, T‑58/04 e T‑59/04, não publicado na Colectânea, n.° 74].

48      No caso presente, é pacífico que o direito do Estado‑Membro aplicável à marca nacional não registada é o Trade Marks Act, 1994 (lei do Reino Unido sobre as marcas), cuja Section 5(4) dispõe:

«Uma marca só pode ser registada na medida em que o seu uso no Reino Unido não seja susceptível de ser impedido:

a)      devido a qualquer norma jurídica [designadamente por força do direito relativo ao uso indevido de denominação (law of passing off)] que protege uma marca não registada ou qualquer outro sinal utilizado na vida comercial […]»

49      Resulta deste texto, conforme interpretado pelos órgãos jurisdicionais nacionais [Reckitt & Coleman Products Ltd v Borden Inc. & Ors (1990) R.P.C. 341 HL], que, para obter no caso presente a declaração de nulidade da marca comunitária LAST MINUTE TOUR para efeitos de protecção da marca nacional não registada LASTMINUTE.COM, a recorrente deve demonstrar, em conformidade com o regime jurídico da acção por uso indevido de denominação prevista pelo direito do Reino Unido, que se verificam os três requisitos seguintes.

50      Em primeiro lugar, os serviços oferecidos pela LMN gozam, no espírito do público relevante, de uma reputação associada à sua apresentação. No regime da acção por uso indevido de denominação, essa reputação deve ser demonstrada na data em que o demandado na acção começou a oferecer os seus produtos ou serviços [Cadbury Schweppes/Pub Squash (1981]) R.P.C. 429].

51      O artigo 8.°, n.° 4, do Regulamento n.° 40/94 impõe, contudo, que se atenda não a esta data, mas à data do depósito do pedido de marca comunitária, uma vez que exige que o requerente da declaração de nulidade desta marca tenha adquirido direitos sobre a sua marca nacional não registada antes da data do referido depósito, ou seja, no caso presente, 11 de Março de 2000.

52      Em segundo lugar, a oferta no Reino Unido, sob o sinal LAST MINUTE TOUR, de serviços idênticos aos da LMN e de produtos complementares constituiu, em 11 de Março de 2000, uma apresentação enganosa, isto é, susceptível de induzir o público relevante a atribuir à LMN a origem comercial destes produtos e serviços, sendo irrelevante o carácter intencional de tal apresentação.

53      Em terceiro lugar, a LMN pode, por este facto, sofrer um prejuízo comercial.

54      No caso presente, a identidade dos serviços respectivamente designados pelas marcas em presença não merece contestação. Por outro lado, como observou a Câmara de Recurso, os produtos em causa da classe 16 são complementares dos serviços já referidos. Este elemento deve, assim, ser tomado em consideração para efeitos da apreciação do carácter enganoso da apresentação dos produtos e serviços em causa feita pela LMT no Reino Unido sob o sinal LAST MINUTE TOUR, na data do depósito do pedido de marca comunitária.

55      Resulta do n.° 31 da decisão R 256/2006‑2 e do n.° 32 da decisão R 291/2006‑2 que a marca nacional não registada LASTMINUTE.COM gozava, enquanto tal, de reputação à data do depósito do pedido de marca comunitária. Tal não é contestado pelo IHMI, que admitiu na audiência que a LASTMINUTE.COM tinha adquirido grande reputação no Reino Unido.

56      Em apoio do seu recurso, a recorrente invoca um fundamento único relativo à violação do artigo 8.°, n.° 4, do Regulamento n.° 40/94. Este fundamento pode ser subdividido em três acusações relativas, respectivamente, à definição do público relevante, à reputação autónoma de que gozava a expressão «last minute» no dia do depósito do pedido de marca comunitária e, por último, ao carácter enganoso que poderia ter, nessa data, uma oferta de serviços idênticos aos da LMN e de produtos complementares efectuada no Reino Unido sob o sinal LAST MINUTE TOUR.

 Quanto à primeira acusação, relativa à definição do público relevante

 Argumentos das partes

57      A recorrente acusa a Câmara de Recurso de ter qualificado de público relevante o consumidor médio do Reino Unido normalmente informado e razoavelmente atento e avisado, em vez de procurar saber se, tendo em conta a sua reputação, os seus clientes, ao depararem com o sinal LAST MINUTE TOUR no Reino Unido em relação aos bens e serviços designados por este sinal, não teriam sido induzidos, no período de referência, a acreditar erradamente na existência de um nexo entre a recorrente e estes bens e serviços.

58      O IHMI, apoiado pela LMT, responde que os bens e serviços em causa não se dirigem a um tipo especial de consumidor, mas ao grande público. Na prática, é, portanto, indiferente que se qualifique um ou outro grupo de público relevante e é, aliás, impossível diferenciá‑los.

59      De todo o modo, ao tomar em consideração a reputação do sinal nacional anterior, a Câmara de Recurso baseou, na realidade, a comparação das duas marcas em presença na hipótese de o público relevante conhecer já, na sua grande maioria, a marca nacional anterior da recorrente.

 Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

60      Resulta da jurisprudência dos órgãos jurisdicionais do Reino Unido que a apresentação enganosa dos produtos e dos serviços do demandado na acção por uso indevido de denominação deve ser apreciada tendo em conta os clientes do demandante na acção e não o conceito abstracto de consumidor médio adoptado pela Câmara de Recurso (Reckitt & Coleman Products Ltd v Borden Inc. & Ors, já referido).

61      Com efeito, a propriedade protegida pela acção por uso indevido de denominação não incide sobre uma palavra ou sobre um nome cujo uso por terceiros esteja limitado, mas sobre a própria clientela que é afectada pela utilização controvertida [per Lord Parker in Burberry v. Cording (1909) 26 R.P.C.693], sendo a reputação de uma marca a sua força de atracção sobre a clientela e o critério que permite distinguir uma empresa consolidada de uma empresa nova [IRC v Muller & Co’s Margarine (1901) A.C. 217].

62      No caso em apreço, a Câmara de Recurso ignorou a definição do público relevante dada pelos órgãos jurisdicionais do Reino Unido, ao considerar que este público era constituído pelo utilizador médio dos produtos e serviços em causa residente no Reino Unido, normalmente informado e razoavelmente atento e avisado, quando deveria referir‑se aos clientes do titular da marca nacional não registada.

63      O IHMI não pode defender que, quando os produtos e serviços em causa não visam um tipo particular de consumidor, mas sim o grande público, não existe qualquer razão, na prática, para distinguir vários grupos a fim de identificar o público relevante.

64      Com efeito, não é indiferente definir o público relevante optando pelo consumidor médio do Reino Unido, como decidiu a Câmara de Recurso e como prevê o artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 [actual artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 2007/2009], ou pelo contrário limitar este público, para efeitos da apreciação da acção por uso indevido de denominação, unicamente aos clientes de uma empresa que, como a LMN, está efectivamente presente no mercado.

65      O risco que corre um consumidor de ser enganado por uma marca que alegadamente é susceptível de o induzir a atribuir a origem comercial dos produtos e dos serviços designados à empresa titular de uma marca anterior não registada não é necessariamente o mesmo quando esse consumidor é já cliente desta empresa.

66      Além disso, não pode pretender‑se que, uma vez que tomou em consideração a reputação da LASTMINUTE.COM, a Câmara de Recurso baseou a comparação dos dois sinais na hipótese de uma parte importante do público relevante conhecer já o sinal da recorrente. Com efeito, resulta das decisões impugnadas que, embora tenha constatado que à LASTMINUTE.COM estava associada uma reputação, concluiu pela ausência de risco de confusão entre os dois sinais em causa sem ter em qualquer conta essa reputação e limitou‑se a proceder a uma simples comparação desses dois sinais.

67      Por conseguinte, ao considerar como público relevante os consumidores médios dos produtos e serviços em causa residentes no Reino Unido, normalmente informados e razoavelmente atentos e avisados, quando, no regime da acção por uso indevido de denominação, esse público é composto unicamente pelos clientes do demandante, a Câmara de Recurso ignorou o reenvio feito pelo artigo 8.°, n.° 4, do Regulamento n.° 40/94 para o direito do Reino Unido, aplicável à marca nacional anterior não registada LASTMINUTE.COM, utilizada pela recorrente na vida comercial à data do depósito do pedido de marca comunitária.

 Quanto à segunda acusação, relativa à recusa de reconhecer uma reputação autónoma à expressão «last minute»

 Argumentos das partes

68      A recorrente critica a Câmara de Recurso por ter procedido a uma comparação das duas marcas em presença com base no artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, e não procurar saber se a marca nacional não registada LASTMINUTE.COM lhe daria, por força do artigo 8.°, n.° 4, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 [actual artigo 8.°, n.° 4, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009], o direito de proibir o uso da marca comunitária mais recente e, por conseguinte, obter a declaração da sua nulidade nos termos do artigo 52.°, n.° 1, alínea c), deste regulamento, por aplicação do regime da acção por uso indevido de denominação previsto pelo direito do Reino Unido.

69      Para esse efeito, a Câmara de Recurso deveria ter examinado a reputação da marca LASTMINUTE.COM, de «Last Minute» ou de «Lastminute», no decurso do período em causa, e verificar se um cliente médio da recorrente no Reino Unido teria feito, erradamente, uma associação entre a recorrente e a LMT se tivesse sido confrontado com o sinal LAST MINUTE TOUR no Reino Unido no que se refere aos serviços designados por este.

70      A reputação da marca do demandante na acção por uso indevido de denominação, que constitui a força de atracção da clientela, pode estar ligada a elementos desta marca que tinham inicialmente um sentido descritivo, se se puder demonstrar que adquiriram pelo uso uma reputação autónoma (secondary meaning), distinta da da marca.

71      Devido à publicidade e à promoção em grande escala resultante da presença frequente da recorrente nos jornais do Reino Unido, o utilizador médio do seu site Internet «lastminute.com» teria sido capaz, no dia do depósito do pedido de marca comunitária, de identificar a origem comercial dos seus serviços, quer fossem oferecidos sob a sua marca não registada LASTMINUTE.COM ou sob as denominações «lastminute» ou «last minute» utilizadas pela imprensa do Reino Unido para designar a recorrente, tal como foi observado pela Câmara de Recurso.

72      A recorrente demonstrou perante a Divisão de Anulação que a menção «last minute» não visava unicamente designar um tipo de serviços, mais servia também para identificar os serviços que oferece.

73      A Câmara de Recurso afastou, contudo, o carácter distintivo da expressão «last minute» isolando‑a do seu contexto factual, em vez de apreciar concretamente a importância da reputação da recorrente.

74      Por conseguinte, a Câmara de Recurso não teve em conta o despacho de 17 de Dezembro de 1999 pelo qual a High Court of Justice (England and Wales) [Supremo Tribunal (Inglaterra e País de Gales)] proibiu, a título cautelar, às sociedades recorridas no processo Last Minute Network Ltd (denominação social «lastminute.com»)/Lastminute.com Plc e o., o exercício de qualquer actividade comercial recorrendo ou referindo‑se às denominações comerciais «lastminute.com», «lastminute.co.uk», «lastminute» e «last minute», ou a qualquer termo ou associação de termos que apresentem uma semelhança enganosa com uma destas denominações.

75      A Câmara de Recurso entendeu, erradamente, que esse despacho não era susceptível de demonstrar que a marca da recorrente lhe conferia o direito de proibir o uso de uma marca mais recente, por aplicação da legislação do Reino Unido, com base no facto de a High Court of Justice apenas ter ordenado uma medida cautelar, sem decidir quanto ao mérito, e de o referido despacho ter sido proferido sem debate aprofundado.

76      Pelo contrário, a recorrente sustenta que o órgão jurisdicional nacional teve de proceder a um exame aprofundado dos seus argumentos quanto ao mérito antes de pronunciar a injunção a seu favor.

77      O IHMI, apoiado pela LMT, responde que a acção por uso indevido de denominação está condicionada, tal como a aplicação do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, à existência de um risco de confusão, na falta do qual não pode existir nem apresentação enganosa de bens e serviços sob o sinal LAST MINUTE TOUR nem, consequentemente, uso indevido de denominação.

78      A Câmara de Recurso concluiu, correctamente, que a reputação da recorrente apenas estava ligada ao sinal LASTMINUTE.COM, único susceptível de ser protegido pela acção por uso indevido de denominação, e não à expressão genérica «last minute». Com efeito, esta expressão é composta por duas palavras inglesas imediatamente perceptíveis pelo público de referência e indica clara e directamente que os serviços da recorrente são propostos em condições muito vantajosas, porque são objecto de transacções de «última hora».

79      Está assim demonstrado que a recorrente utilizou unicamente o sinal LASTMINUTE.COM, no seu conjunto, como indicador da origem dos seus serviços e que, na grande maioria dos casos, é citada sob o nome de «lastminute.com».

80      As palavras «last» e «minute», dado que não são entendidas pelo público relevante como um indicador de origem, conservam, pelo contrário, um significado genérico, independentemente da reputação adquirida pela expressão «lastminute.com» devido ao seu uso na vida comercial.

81      O público interessado não confunde os sinais em questão. A inclusão das palavras «last» e «minute» nos dois sinais não surpreende o público relevante nem provoca, no seu espírito, uma associação susceptível de o levar a atribuir os dois sinais à mesma sociedade ou a sociedades economicamente ligadas. Pelo contrário, este público entende aí a utilização concomitante e legítima por operadores comerciais, sem qualquer ligação entre si, de um termo que informa sobre determinada qualidade dos produtos e serviços em causa.

82      Nestas condições, na falta de carácter distintivo dos termos «last» e «minute» e atendendo às diferenças resultantes da apresentação distinta da marca comunitária e dos seus elementos adicionais, não pode ter existido risco de confusão entre as duas marcas nem, consequentemente, uma oferta enganosa dos bens e serviços em causa sob o sinal LAST MINUTE TOUR.

83      Por último, nem o IHMI nem o Tribunal de Primeira Instância estão vinculados pelo despacho já referido da High Court of Justice, devido à autonomia do regime de registo das marcas comunitárias. Além disso, esta decisão não pode constituir um precedente válido, mesmo por força do direito do Reino Unido, devido à sua natureza meramente cautelar, à sua adopção à revelia das partes recorridas, à falta de fundamentação e à diferença do contexto factual.

 Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

84      Resulta da jurisprudência do Reino Unido que um sinal que serve para designar bens ou serviços pode ter adquirido uma reputação no mercado, na acepção do direito aplicável à acção por uso indevido de denominação, apesar de apresentar, inicialmente, um carácter descritivo ou de ser desprovido de carácter distintivo.

85      Foi assim considerado que a expressão «Camel Hair» tinha adquirido na realidade uma reputação autónoma, devido ao uso que o requerente dela tinha feito a título de indicação da origem comercial dos seus produtos, que se distinguiam a partir daí dos bens das outras empresas, ainda que esta expressão não fosse susceptível de registo como marca [Reddaway v. Banham (1896) 13 R.P.C. 218; v. igualmente, neste sentido, Cellular Clothing Co. Ltd v Maxton & Murray (1899) A.C. 326, 16, R.P.C. 397 HL].

86      Além disso, no regime da acção por uso indevido de denominação previsto pelo direito do Reino Unido, a reputação de bens e serviços oferecidos por uma empresa pode proceder, de acordo com as circunstâncias de cada caso concreto, não só da reputação de uma marca nacional mas também da dos seus elementos constitutivos, desde que tenham adquirido uma reputação autónoma, distinta da da marca considerada na sua totalidade.

87      No caso presente, a Câmara de Recurso constatou que «a reputação [estava] associada ao sinal LASTMINUTE.COM como tal, com todos os seus elementos, mas não à menção genérica ‘last minute’». Acrescentou que «[e]sta reputação [era] reconhecida exclusivamente no quadro e unicamente para efeitos da aplicação da lei [do Reino Unido] sobre o uso indevido [de denominação] (passing off) e não [podia] servir para atribuir um monopólio sobre a menção [‘last minute’], que [era] desprovida de carácter distintivo relativamente aos serviços em causa e aos produtos complementares».

88      Todavia, à luz da jurisprudência nacional já referida, a Câmara de Recurso não podia recusar‑se a reconhecer à menção «last minute» uma reputação autónoma unicamente pelo simples facto do seu carácter genérico e da sua falta de carácter distintivo relativamente aos serviços em causa e aos produtos complementares.

89      Daí resulta que a Câmara de Recurso não teve em conta a remissão feita pelo artigo 8.°, n.° 4, do Regulamento n.° 40/94 para a legislação do Reino Unido, aplicável à marca nacional anterior não registada LASTMINUTE.COM utilizada pela recorrente na vida comercial à data do depósito do pedido de marca comunitária.

 Quanto à terceira acusação, relativa à não tomada em consideração da reputação autónoma da expressão «last minute» para efeitos de apreciação do carácter enganoso de uma apresentação dos produtos e serviços em causa sob o sinal LAST MINUTE TOUR

 Argumentos das partes

90      A recorrente sustenta que, por não ter verificado a capacidade dos seus clientes para reconhecer a expressão «last minute» como indicador dos seus serviços, a Câmara de Recurso também não verificou se, confrontados com uma oferta dos bens e serviços em causa apresentada no Reino Unido sob o sinal LAST MINUTE TOUR, à data do depósito do pedido de marca comunitária, esses mesmos clientes não teriam sido levados a atribuir à recorrente a origem comercial desses bens e serviços ou a considerar que a recorrente e a LMT estavam financeiramente ligadas.

91      Para o IHMI, dado que o público não entenderá a expressão «last minute» como um indicador da origem, não pode assim existir risco de confusão entre os dois sinais nem, por extensão, uma apresentação enganosa.

 Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

92      Resulta da jurisprudência dos órgãos jurisdicionais do Reino Unido que a apresentação enganosa, intencional ou não, pelo demandado na acção por uso indevido de denominação é a que é susceptível de levar os clientes do demandante a atribuir‑lhe a origem comercial dos produtos e dos serviços oferecidos pelo demandado (Reckitt & Coleman Products Ltd v Borden Inc. & Ors, já referido).

93      A existência de um risco de confusão é, assim, um requisito comum ao artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 e ao regime da acção por uso indevido de denominação, expressamente previsto pelo primeiro e inerente ao requisito de apresentação enganosa dos produtos e serviços em causa exigido pelo segundo.

94      Todavia, a Câmara de Recurso não podia, sem ignorar as exigências próprias da acção por uso indevido de denominação a que se refere o artigo 8.°, n.° 4, do Regulamento n.° 40/94, aplicável, no caso presente, por remissão do artigo 52.°, n.° 1, alínea c), limitar‑se, num primeiro momento, a considerar, com base no artigo 8.°, n.° 1, alínea b), deste regulamento, a que se referiu nos n.os 22 e 23 das decisões impugnadas, que, devido ao fraco carácter distintivo dos dois sinais em presença, o público concentra a sua atenção sobre os elementos distintivos e dominantes, a saber, a combinação das diferentes palavras em cada sinal, o reagrupamento numa única palavra «lastminute» e o elemento «.com» no sinal não registado e o elemento gráfico da marca comunitária, para, num segundo momento, comparar estes sinais nos planos visual, fonético e conceptual.

95      Com efeito, a verificação da existência de uma apresentação enganosa na acepção do direito nacional não se limita ao exame comparativo das duas marcas em presença, mas inclui a tomada em consideração de outros factores, como, no caso presente, as circunstâncias em que os produtos ou serviços eram oferecidos no Reino Unido sob o sinal LAST MINUTE TOUR na data do depósito do pedido de marca comunitária.

96      É verdade que existe uma dificuldade de aplicação do regime da acção por uso indevido de denominação do direito do Reino Unido no âmbito do pedido de declaração de nulidade instituído pelo artigo 52.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94, pelo facto de a obrigação prevista no artigo 8.°, n.° 4, do Regulamento n.° 40/94 se referir, como foi indicado no n.° 51, supra, à data do depósito do pedido de marca comunitária e não à do início da oferta dos produtos e serviços controvertidos pelo demandado na acção por uso indevido de denominação.

97      Assim, a apreciação das circunstâncias em que os produtos ou serviços em causa eram oferecidos no Reino Unido sob o sinal LAST MINUTE TOUR na data do depósito do pedido de marca comunitária é, por hipótese, impossível, dado que, nessa data não era suposto a LMT já ter começado a oferecer os seus produtos e serviços no Reino Unido sob o sinal LAST MINUTE TOUR.

98      Contudo, esta adaptação do regime jurídico aplicável à acção por uso indevido de denominação, inerente ao pedido de declaração de nulidade da marca comunitária, não dispensava a Câmara de Recurso de aplicar as disposições deste regime que o artigo 52.°, n.° 1, alínea c), e o artigo 8.°, n.° 4, do Regulamento n.° 40/94 não permitiam afastar.

99      Muito embora tendo constatado a existência de uma grande reputação associada à marca nacional não registada LASTMINUTE.COM, ao mesmo tempo que nega tal reputação à expressão «last minute» erradamente, à luz do regime jurídico da acção por uso indevido de denominação, devido ao seu carácter genérico e à falta de carácter distintivo, a Câmara de Recurso inferiu a ausência de risco de confusão entre os dois sinais apenas do seu exame comparativo.

100    Ao fazê‑lo, não procurou averiguar se esta conclusão não podia ser afectada pela existência da reputação da marca LASTMINUTE.COM ou da que pode estar relacionada com a expressão «last minute», quando essas reputações poderiam ser susceptíveis de aumentar o risco de os clientes da LMN considerarem que os bens ou serviços alegadamente oferecidos no Reino Unido sob o sinal LAST MINUTE TOUR, à data do depósito do pedido de registo, eram bens ou serviços oferecidos pela LMN.

101    Daí que, ao limitar‑se a proceder a essa comparação formal dos dois sinais em presença, sem atender à existência eventual de uma reputação autónoma da expressão «last minute» junto dos clientes da LMN, para excluir, no n.° 40 da Decisão R 256/2006‑2 e no n.° 41 da Decisão R 291/2006‑2, que o público do Reino Unido possa crer que os bens e serviços oferecidos pela empresa titular da marca LAST MINUTE TOUR são provenientes da empresa titular da marca nacional anterior não registada LASTMINUTE.COM, a Câmara de Recurso ignorou a remissão operada pelo artigo 8.°, n.° 4, do Regulamento n.° 40/94 para o direito do Reino Unido, aplicável a esta marca, utilizada pela recorrente na vida comercial à data do depósito do pedido de marca comunitária.

102    Procede assim o fundamento baseado numa aplicação errada do artigo 8.°, n.° 4, do Regulamento n.° 40/94 e, consequentemente, há que anular as decisões impugnadas.

103    Incumbe ao IHMI, nos termos do artigo 63.°, n.° 6, do Regulamento n.° 40/94 (actual artigo 65.°, n.° 6, do Regulamento n.° 207/2009), reexaminar o pedido de declaração de nulidade da marca comunitária LAST MINUTE TOUR à luz do conjunto dos requisitos da acção por uso indevido de denominação, incluindo, sendo caso disso, o relativo ao prejuízo decorrente do carácter eventualmente enganoso, no espírito dos clientes da LMN, de uma oferta dos bens e serviços em causa que se presume ter ocorrido no Reino Unido, sob o sinal LAST MINUTE TOUR, à data do depósito do pedido de marca comunitária.

104    Não há, por isso, que decidir quanto à segunda parte do pedido da recorrente.

 Quanto às despesas

105    Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

106    Tendo o IHMI sido vencido, há que condená‑lo nas suas próprias despesas e nas despesas da recorrente, em conformidade com os pedidos por esta apresentados, devendo a interveniente suportar as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Sétima Secção)

decide:

1)      As decisões da Segunda Câmara de Recurso do Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI) de 8 de Fevereiro de 2007 (processos R 256/2006‑2 e R 291/2006‑2) são anuladas.

2)      Não há que decidir quanto à segunda parte do pedido da Last Minute Network Ltd.

3)      O IHMI suportará as suas próprias despesas e as despesas da Last Minute Network.

4)      A Last Minute Tour SpA suportará as suas próprias despesas.

Forwood

Šváby

Truchot

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 11 de Junho de 2009.

Assinaturas


* Língua do processo: inglês.