Language of document : ECLI:EU:C:2021:958

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

JEAN RICHARD DE LA TOUR

apresentadas em 25 de novembro de 2021 (1)

Processo C519/20

K

sendo interveniente

Landkreis Gifhorn

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Amtsgericht Hannover (Tribunal de Primeira Instância de Hanôver, Alemanha)]

«Espaço de liberdade, segurança e justiça — Diretiva 2008/115/CE — Normas e procedimentos comuns relativos ao regresso de nacionais de países terceiros em situação irregular — Detenção para efeitos de afastamento — Artigo 16.o, n.o 1 — Conceito de “centro de detenção especializado” — Artigo 18.o, n.o 1 — Conceito de “situação de emergência” — Legislação nacional segundo a qual a detenção pode ocorrer num estabelecimento prisional devido a uma situação de emergência — Âmbito de apreciação da autoridade judiciária responsável pela detenção»






I.      Introdução

1.        No presente processo, o Tribunal de Justiça é convidado a clarificar diversas modalidades relativas à detenção de nacionais de países terceiros que aguardam o afastamento, enunciadas na Diretiva 2008/115/CE (2), na linha dos Acórdãos de 17 de julho de 2014, Bero e Bouzalmate (3), de 17 de julho de 2014, Pham (4), e de 2 de julho de 2020, Stadt Frankfurt am Main (5).

2.        Este processo inscreve‑se no caso particular em que a República Federal da Alemanha invoca uma situação de emergência na aceção do artigo 18.o, n.o 1, desta diretiva para derrogar a regra segundo a qual estes nacionais são colocados, para efeitos do seu afastamento, em centros de detenção especializados. Foi com base nessa legislação que K, um nacional paquistanês, foi colocado em detenção na unidade de Langenhagen do estabelecimento prisional da cidade de Hanôver (Alemanha) em setembro de 2020.

3.        O Amtsgericht Hannover (Tribunal de Primeira Instância de Hanôver, Alemanha) deve agora apreciar a legalidade desta medida à luz das disposições dos artigos 16.o e 18.o da Diretiva 2008/115. É para este efeito que submete ao Tribunal de Justiça várias questões prejudiciais.

4.        Antes de mais, o órgão jurisdicional de reenvio pede ao Tribunal de Justiça que especifique as condições em que um Estado‑Membro pode invocar uma situação de emergência, na aceção do artigo 18.o, n.o 1, desta diretiva, para permitir a detenção dos nacionais de países terceiros em estabelecimentos prisionais enquanto aguardam o afastamento. Em seguida, este órgão jurisdicional convida o Tribunal de Justiça a determinar os poderes que, neste contexto, incumbem à autoridade judiciária responsável pela detenção. Por último, o referido órgão jurisdicional pretende saber se a unidade de Langenhagen na qual foi colocado K pode ser qualificada de «centro de detenção especializado», na aceção do artigo 16.o, n.o 1, da referida diretiva. Esta questão permitirá ao Tribunal de Justiça definir os critérios com base nos quais um centro de detenção especializado se distingue de um estabelecimento prisional, em particular, tendo em conta a direção da estrutura, ao regime da detenção e as condições materiais desta.

5.        Nas presentes conclusões, exporei, num primeiro momento, as razões pelas quais considero que uma legislação nacional que permite, por um período de três anos, a colocação em detenção de nacionais de países terceiros que aguardam o afastamento em estabelecimentos prisionais, não preenche os requisitos de emergência enunciados pelo legislador da União no artigo 18.o, n.o 1, da Diretiva 2008/115.

6.        Num segundo momento, explicarei que a adoção de medidas excecionais com base no referido artigo não pode dispensar a autoridade judiciária responsável pela detenção de verificar, caso acaso, se as circunstâncias que justificaram o reconhecimento de uma situação de emergência ainda se verificam.

7.        Num terceiro momento, irei expor os motivos pelos quais considero que, à luz das indicações fornecidas tanto pelo órgão jurisdicional de reenvio como pelo Governo alemão, a unidade de Langenhagen do estabelecimento prisional da cidade de Hanôver não parece poder ser qualificada, à data em que K foi detido, de «centro de detenção especializado», na aceção do artigo 16.o, n.o 1, primeiro período, da Diretiva 2008/115.

II.    Quadro jurídico

A.      Diretiva 2008/115

8.        Os considerandos 13, 16, 17 e 24 da Diretiva 2008/115 enunciam:

«(13)      O recurso a medidas coercivas deverá estar expressamente sujeito aos princípios da proporcionalidade e da eficácia no que respeita aos meios utilizados e aos objetivos perseguidos […] Os Estados‑Membros deverão poder recorrer a várias possibilidades de fiscalização de regressos forçados.

[…]

(16)      O recurso à detenção para efeitos de afastamento deverá ser limitado e sujeito ao princípio da proporcionalidade no que respeita aos meios utilizados e aos objetivos perseguidos. A detenção só se justifica para preparar o regresso ou para o processo de afastamento e se não for suficiente a aplicação de medidas coercivas menos severas.

(17)      Os nacionais de países terceiros detidos deverão ser tratados de forma humana e digna, no respeito pelos seus direitos fundamentais e nos termos do direito internacional e do direito nacional. Sem prejuízo da detenção inicial pelas entidades competentes para a aplicação da lei, que se rege pelo direito nacional, a detenção deverá, por norma, ser executada em centros de detenção especializados.

[…]

(24)      A presente diretiva respeita os direitos fundamentais e os princípios consagrados, em especial, na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.»

9.        O artigo 1.o da Diretiva 2008/115 prevê:

«A presente diretiva estabelece normas e procedimentos comuns a aplicar nos Estados‑Membros para o regresso de nacionais de países terceiros em situação irregular, no respeito dos direitos fundamentais enquanto princípios gerais do direito da [União] e do direito internacional, nomeadamente os deveres em matéria de proteção dos refugiados e de direitos do Homem.»

10.      O artigo 16.o da Diretiva 2008/115, sob a epígrafe «Condições de detenção», dispõe, no seu n.o 1:

«Regra geral, a detenção tem lugar em centros de detenção especializados. Se um Estado‑Membro não tiver condições para assegurar aos nacionais de países terceiros a sua detenção num centro especializado e tiver de recorrer a um estabelecimento prisional, os nacionais de países terceiros colocados em detenção ficam separados dos presos comuns.»

11.      O artigo 17.o, n.o 2, desta diretiva tem a seguinte redação:

«As famílias detidas enquanto se aguarda o afastamento ficam alojadas em locais separados que garantam a devida privacidade.»

12.      O artigo 18.o da referida diretiva, sob a epígrafe «Situações de emergência», prevê:

«1.      Caso um número excecionalmente elevado de nacionais de países terceiros que devam ser objeto de uma operação de regresso sobrecarregue de forma imprevista a capacidade dos centros de detenção de um Estado‑Membro ou o seu pessoal administrativo ou judicial, o Estado‑Membro em causa, pode, enquanto persistir a situação excecional, […] tomar medidas urgentes em relação às condições de detenção, em derrogação das previstas no n.o 1 do artigo 16.o e no n.o 2 do artigo 17.o

2.      O Estado‑Membro em causa informa a Comissão [Europeia] sempre que recorra a medidas excecionais deste tipo. Deve igualmente informar a Comissão logo que os motivos que conduziram à aplicação dessas medidas deixem de existir.

3.      O presente artigo em nada prejudica o dever geral dos Estados‑Membros de tomarem todas as medidas adequadas, de caráter geral ou específico, para assegurarem o cumprimento das obrigações decorrentes da presente diretiva.»

13.      No âmbito da sua proposta de reformulação da Diretiva 2008/115 (6), a Comissão não propõe qualquer alteração das regras enunciadas nos seus artigos 16.o e 18.o

B.      Direito alemão

14.      Nos termos dos §§ 83 e 84 da Grundgesetz für die Bundesrepublik Deutschland (Lei Fundamental da República Federal da Alemanha), cabe aos Bundesländer (Estados federados) assegurar a execução das detenções ordenadas com vista ao afastamento de nacionais de países terceiros em situação irregular.

15.      O § 62a, n.o 1, da Gesetz über den Aufenthalt, die Erwerbstätigkeit und die Integration von Ausländern im Bundesgebiet (Lei Relativa à Residência, ao Emprego e à Integração dos Estrangeiros no Território Federal) (7), de 30 de julho de 2004, na versão em vigor de 29 de julho de 2017 a 20 de agosto de 2019, que tem por objeto transpor para a ordem jurídica alemã o artigo 16.o, n.o 1, da Diretiva 2008/115, tinha a seguinte redação:

«Regra geral, a detenção para efeitos de afastamento tem lugar em centros de detenção especializados. Se no território federal não houver centros de detenção especializados ou se o estrangeiro constituir uma ameaça grave para a integridade física e para a vida de terceiros ou para interesses importantes de segurança interna legalmente protegidos, a detenção pode ser executada noutros estabelecimentos prisionais; nesse caso, os detidos para efeitos de afastamento devem ficar separados dos presos comuns.»

16.      Esta disposição foi alterada na sequência da entrada em vigor da Zweiten Gesetzes zur besseren Durchsetzung der Ausreisepflicht (Segunda Lei Destinada a Melhorar o Cumprimento da Obrigação de Abandonar o Território) (8), de 15 de agosto de 2019.

17.      O § 1.o, ponto 22, desta lei dispõe:

«O § 62a, n.o 1, [da AufenthG] é substituído pelo seguinte texto:

“(1)      Os detidos para efeitos de afastamento devem estar separados dos presos comuns. Quando forem detidos vários membros de uma família, devem ficar alojados separadamente dos outros detidos para efeitos de afastamento. Há que lhes garantir a devida privacidade”».

18.      A exposição de motivos do projeto da referida lei precisa, no que respeita ao § 1, ponto 22 (9):

«Em consequência da alteração do § 62a, deixa temporariamente de ser exigido, em aplicação do artigo 18.o, n.o 1, da Diretiva 2008/115, que as pessoas detidas para efeitos de afastamento sejam alojadas em centros de detenção especializados. A detenção para efeitos de afastamento pode ter lugar temporariamente em qualquer centro de detenção e, até ao limite de 500 lugares, em estabelecimentos prisionais. Continua a ser exigido que as pessoas detidas para efeitos de afastamento e os presos comuns sejam separados. A regra atual sobre o alojamento de vários membros da mesma família enunciada no § 62a, n.o 1, terceiro e quarto períodos, bem como os requisitos dos artigos 16.o e 17.o da Diretiva 2008/115 ainda se aplicam. Além disso, continua a ser necessário apreciar e decidir a questão de saber se um alojamento num estabelecimento prisional é aceitável e legal no caso concreto, por exemplo, quando se trata de pessoas pertencentes a um grupo vulnerável. Prevê‑se que as autoridades judiciárias dos [Estados federados] disponibilizem até 500 lugares para pessoas detidas para efeitos de afastamento de modo a que, tendo em conta o aumento previsto do número de lugares de detenção para efeitos de afastamento nos centros de detenção dos [Estados federados], estejam disponíveis no total, cerca de 1 000 lugares para detenção para efeitos de afastamento […] O artigo 18.o, n.o 1, da Diretiva 2008/115 prevê, para as situações de emergência, a possibilidade de derrogar a obrigação de separação prevista no artigo 16.o, n.o 1, bem como a obrigação de as famílias disporem de um alojamento separado, prevista no artigo 17.o, n.o 2. Atualmente, a obrigação de separação foi transposta para o direito alemão pelo § 62a, n.o 1, primeiro e segundo períodos. A exigência relativa ao alojamento das famílias está prevista no § 62a, n.o 1, terceiro e quarto períodos. A condição para poder utilizar a possibilidade de derrogação prevista no artigo 18.o, n.o 1, é que um número excecionalmente elevado de nacionais de países terceiros, sujeitos a uma obrigação de regresso, faça recair sobre a capacidade dos centros de detenção ou sobre o pessoal administrativo e judicial um encargo que exceda essa capacidade. Esta condição está preenchida no que respeita à República Federal da Alemanha. A capacidade da Alemanha (em 27 de março de 2019) é de cerca de 487 lugares de detenção para efeitos de afastamento em todo o território federal. Devido ao desequilíbrio entre o número de pessoas sujeitas a uma obrigação de abandonar o território e o número de lugares de detenção para efeitos de afastamento, é manifesto que impende uma sobrecarga excessiva sobre a capacidade existente. Esta sobrecarga superior à capacidade constitui, de facto, um importante estrangulamento, que obsta à execução da obrigação de abandonar o território. Os lugares de detenção para efeitos de afastamento existentes já são utilizados, na melhor das hipóteses, à escala federal através de uma coordenação entre [os Estados federados]. Assim, o Gemeinsame Zentrum zur Unterstützung der Rückkehr [Centro Comum de Apoio ao Regresso, Alemanha (ZUR)], criado em 2017, tem por objetivo melhorar a gestão dos lugares de detenção para efeitos de afastamento. A taxa dos lugares de detenção ocupados, em todo o território federal, por intermédio do ZUR, é de dez por cento. Isto significa, na prática, que muitos pedidos de detenção não podem ser apresentados, mesmo que as condições estejam preenchidas. Por outro lado, era imprevisível que a sobrecarga excedesse assim a capacidade. Dado que o número de requerentes de proteção [internacional] recém‑chegados desceu de forma constante durante anos, até 2015, os [Estados federados] foram adaptando, ao longo dos anos, a capacidade de lugares de detenção para efeitos de afastamento às necessidades, então menos elevadas, reduzindo o seu número. Em consequência da alteração da situação durante o ano de 2015 e da subida em flecha do número de requerentes de proteção [internacional], a primeira obrigação do Estado federal e dos [Estados federados] era a criação de capacidade para prover às necessidades das pessoas. Esta obrigação resulta, designadamente, do direito [da União], nomeadamente, da Diretiva 2013/33/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, que estabelece normas em matéria de acolhimento dos requerentes de proteção internacional (JO 2013, L 180, p. 96), e da Diretiva 2011/95/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de dezembro de 2011, que estabelece normas relativas às condições a preencher pelos nacionais de países terceiros ou por apátridas para poderem beneficiar de proteção internacional, a um estatuto uniforme para refugiados ou pessoas elegíveis para proteção subsidiária e ao conteúdo da proteção concedida (JO 2011, L 337, p. 9), bem como, além disso, a Convenção para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais [(10)]. Nesta situação, a tomada a cargo das pessoas recém‑chegadas tinha prioridade sobre o aumento da capacidade de detenção, com o objetivo de satisfazer numa data posterior (depois da conclusão do procedimento de pedido de asilo e de recurso) as exigências da Diretiva 2008/115. Com efeito, a regra derrogatória prevista no artigo 18.o [desta diretiva] tem, precisamente, por objetivo e finalidade permitir em tal situação às autoridades zelar de forma prioritária pelo atendimento aos recém‑chegados sem violar, de forma previsível, obrigações no futuro. A Diretiva 2008/115 não se limita a enunciar exigências no que respeita às condições de detenção, impõe igualmente, no seu artigo 8.o, n.o 1, aos Estados‑Membros que tomem todas as medidas necessárias para executar a decisão de regresso. O artigo 18.o da Diretiva 2008/115 tem justamente por objetivo resolver o eventual conflito de objetivos numa situação excecional imprevisível, tal como existia em 2015 e nos anos seguintes; pelo que há que o aplicar. Após a situação excecional ter terminado, os [Estados federados] começaram imediatamente a desenvolver a capacidade de detenção e já conseguiram aumentar o número de lugares de detenção para 487 em todo o território federal (em 27 de março de 2019). Tendo em conta o tempo normalmente necessário para a realização de projetos de construção e a criação de centros de detenção para efeitos de afastamento, ainda não foi alcançada uma adequação completa do número de lugares de detenção para efeitos de afastamento às necessidades atuais. Tendo em conta as medidas tomadas, espera‑se que o número de lugares de detenção para efeitos de afastamento corresponda às necessidades em 30 de junho de 2022. Até lá, a situação excecional persiste, de modo que o § 62a, n.o 1, na sua redação atual não será aplicável até essa data. Por conseguinte, a legislação atualmente aplicável voltará a entrar vigor.»

19.      O artigo 6.o da Segunda Lei Destinada a Melhorar o Cumprimento da Obrigação de Abandonar o Território, sob a epígrafe «Outra modificação da Aufenth[G] com efeitos a partir de 1 de julho de 2022», dispõe:

«O § 62a, n.o 1, da AufenthG, conforme publicado em 25 de fevereiro de 2008 (BGB1, 2008 I, p. 162), alterado pela última vez pelo artigo 1.o da presente lei, passa a ter a seguinte redação:

“Regra geral, a detenção para efeitos de afastamento tem lugar em centros de detenção especializados. Se não existir no território federal nenhum centro de detenção especializado ou se o estrangeiro constituir uma ameaça grave para a integridade física e para a vida de terceiros ou para interesses importantes de segurança interna legalmente protegidos, a detenção pode ser executada noutros estabelecimentos prisionais; neste caso, as pessoas detidas para efeitos de afastamento devem estar separadas dos presos comuns. Quando forem detidos vários membros de uma família, devem ficar alojados separadamente das outras pessoas detidas para efeitos de afastamento. Há que lhes garantir a devida privacidade.”»

III. Litígio no processo principal e questões prejudiciais

20.      O recorrente, K, é um nacional paquistanês que foi colocado em detenção para efeitos de afastamento na unidade de Langenhagen do estabelecimento prisional da cidade de Hanôver em 11 de agosto de 2020. Esta medida foi prorrogada até 12 de novembro de 2020, por despacho de 25 de setembro de 2020. O recorrente interpôs recurso deste despacho por considerar que a medida de detenção a que foi submetido entre 25 de setembro e 2 de outubro de 2020 era contrária à obrigação de colocar os nacionais de países terceiros que aguardam afastamento num «centro de detenção especializado» na aceção do § 62a, n.o 1, da AufenthG, na versão em vigor de 29 de julho de 2017 a 20 de agosto de 2019.

21.      É no âmbito deste recurso de apreciação da legalidade que o órgão jurisdicional de reenvio se interroga sobre a legalidade das alterações introduzidas pelo § 62a, n.o 1, da AufenthG, a partir de 15 de agosto de 2019, à luz dos requisitos previstos no artigo 18.o da Diretiva 2008/115.

22.      Tendo em conta as suas dúvidas relativas à interpretação desta disposição, o Amtsgericht Hannover (Tribunal de Primeira Instância de Hanôver) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      Deve o direito da União, em especial o artigo 18.o, n.os 1 e 3, da Diretiva [2008/115], ser interpretado no sentido de que um órgão jurisdicional nacional que se pronuncia sobre a detenção para efeitos de afastamento deve verificar em cada caso os requisitos dessa disposição, em especial se a situação excecional persiste, quando o legislador nacional, com base no artigo 18.o, n.o 1, se afasta no direito nacional dos requisitos previstos no artigo 16.o, n.o 1[, desta diretiva]?

2)      Deve o direito da União, em especial o artigo 16.o, n.o 1, da Diretiva [2008/115], ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional que permite temporariamente, até 1 de julho de 2022, o alojamento de pessoas detidas que aguardam o afastamento num estabelecimento [prisional], apesar da existência de centros de detenção especializados no Estado‑Membro e de não se verificar uma situação de emergência na aceção do artigo 18.o, n.o 1, da [referida diretiva] que o torne absolutamente necessário?

3)      Deve o artigo 16.o, n.o 1, da Diretiva [2008/115] ser interpretado no sentido de que não existe um “centro de detenção especializado” para pessoas detidas que aguardam o afastamento pelo simples facto de:

—        o “centro de detenção especializado” estar indiretamente submetido [à autoridade do] mesmo membro do Governo que os centros de detenção dos presos comuns, a saber, [a Justizministerin (ministra da Justiça, Alemanha)],

—        o “centro de detenção especializado” estar organizado como unidade de um estabelecimento prisional e, assim, embora tenha a sua própria responsável, estar em geral sujeito, enquanto uma de várias unidades do estabelecimento prisional, à direção desse estabelecimento?

4)      Em caso de resposta negativa à [terceira] questão:

Deve o artigo 16.o, n.o 1, da Diretiva [2008/115] ser interpretado no sentido de que existe uma colocação num “centro de detenção especializado” de pessoas detidas que aguardam o afastamento se um estabelecimento prisional cria uma unidade [específica] destinada à detenção para efeitos de afastamento, quando essa unidade gere uma área [específica] com três edifícios no interior da vedação onde se encontram pessoas detidas para efeitos de afastamento e um desses três edifícios é ocupado temporariamente apenas por presos que cumprem penas de prisão substitutiva ou de curta duração, velando o estabelecimento prisional pela separação entre os detidos para efeitos de afastamento e os presos comuns, em particular, dispondo cada [edifício] de instalações próprias (o seu próprio armazém de roupas, a sua própria enfermaria, o seu próprio ginásio) e, embora o pátio/a zona exterior sejam visíveis desde [todos os edifícios], cada [um deles] tem a sua área própria para os presos, [vedada] com cerca de arame, de modo que não existe um acesso direto entre [os edifícios]?»

23.      O recorrente, os Governos alemão e neerlandês e a Comissão apresentaram observações escritas. Estas partes, com exceção do Governo neerlandês, responderam igualmente às questões para resposta escrita que lhes foram dirigidas pelo Tribunal de Justiça e apresentaram as suas observações orais na audiência realizada em 16 de setembro de 2021.

IV.    Análise

24.      Responderei às questões prejudiciais por uma ordem diferente daquela em que foram submetidas pelo órgão jurisdicional de reenvio.

25.      Começarei por analisar a segunda questão, relativa às circunstâncias em que um Estado‑Membro pode invocar a existência de uma situação de emergência, na aceção do artigo 18.o, n.o 1, da Diretiva 2008/115, para ordenar a detenção dos nacionais de países terceiros enquanto aguardam o afastamento num estabelecimento prisional. Com efeito, parece‑me que esta preocupação está no cerne do presente reenvio prejudicial. Embora o Tribunal de Justiça já se tenha pronunciado sobre as medidas de emergência que foram adotadas pelo Conselho da União Europeia em resposta à crise migratória de 2015 (11), não teve ainda oportunidade de fornecer orientações sobre o âmbito de aplicação do artigo 18.o, n.o 1, da Diretiva 2008/115 e, em particular, sobre a possibilidade de os Estados‑Membros para garantirem a detenção de nacionais de países terceiros que aguardam o afastamento num estabelecimento prisional por motivos relacionados com a existência de uma situação de emergência nacional.

26.      Em seguida, analisarei a primeira questão, relativa à função do órgão jurisdicional que se pronuncia sobre a detenção, a fim de determinar em que medida este deve verificar, em cada caso, a existência, ou mesmo a persistência, de uma situação de emergência na aceção do artigo 18.o, n.o 1, desta diretiva.

27.      Por último, para responder à terceira e quarta questões, especificarei os critérios com base nos quais há que distinguir a situação em que o nacional de um país terceiro está colocado num centro de detenção especializado daquela em que está colocado num estabelecimento prisional, separado dos presos comuns, à luz, nomeadamente, da direção da estrutura, do regime da detenção e das condições materiais desta.

A.      Quanto às razões que justificam a detenção dos nacionais de países terceiros enquanto aguardam o afastamento num estabelecimento prisional (segunda questão)

28.      Com a sua segunda questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, ao Tribunal de Justiça se o artigo 16.o, n.o 1, da Diretiva 2008/115 se opõe a uma legislação nacional que permite, durante um período de três anos, colocar nacionais de países terceiros que aguardam o afastamento em regime de detenção em estabelecimentos prisionais, quando não se verifica uma situação de emergência na aceção do artigo 18.o, n.o 1, desta diretiva.

29.      Antes de responder a esta questão, devo recordar, em primeiro lugar, os princípios estabelecidos pelo Tribunal de Justiça nos Acórdãos Bero e Bouzalmate, Pham e Stadt Frankfurt am Main, quanto às condições de detenção que o legislador da União prevê no artigo 16.o, n.o 1, da Diretiva 2008/115, na versão em língua francesa da mesma (12). Estes acórdãos foram proferidos no âmbito de litígios relativos à apreciação da legalidade de uma detenção com base no § 62a, n.o 1, da AufenthG, nas suas versões anteriores.

30.      Em seguida, num segundo momento, analisarei em que medida um Estado‑Membro pode invocar a existência de uma situação de emergência, na aceção do artigo 18.o, n.o 1, da Diretiva 2008/115, para justificar a execução da detenção num estabelecimento prisional, à margem das circunstâncias particulares de um caso concreto.

31.      Por último, examinarei em que medida uma legislação como a estabelecida no § 62a, n.o 1, da AufenthG, na versão aplicável a partir de 15 de agosto de 2019, cumpre as condições estabelecidas nesse artigo.

1.      Regime geral previsto no artigo 16.o, n.o 1, da Diretiva 2008/115

32.      Em conformidade com o artigo 79.o, n.o 2, TFUE, o objetivo da Diretiva 2008/115 é definir uma política eficaz de afastamento e repatriamento, baseada em normas e garantias jurídicas comuns, para proceder aos repatriamentos em condições humanamente dignas e com pleno respeito pelos direitos fundamentais e pela dignidade das pessoas. (13).

33.      Decorre dos considerandos 13 e 16 e da redação do artigo 15.o, n.o 1, desta diretiva que os Estados‑Membros devem proceder ao afastamento dos nacionais em situação irregular, através de medidas o menos coercivas possível. A fim de assegurar a eficácia dos procedimentos de afastamento, a referida diretiva prevê, portanto, uma gradação das medidas que vai da medida que mais liberdade deixa ao interessado, a saber, a concessão de um prazo para a sua partida voluntária, às medidas que mais a restringem, a saber, a sua detenção num centro especializado. Só no caso de a execução da decisão de regresso sob a forma de afastamento correr o risco, tendo em conta uma apreciação de cada situação específica, de ficar comprometida pelo comportamento do interessado, é que esses Estados podem privar este último da liberdade mediante a sua detenção (14).

34.      Esta última medida constitui a medida restritiva de liberdade mais grave que a referida diretiva permite no âmbito de um procedimento de afastamento forçado (15). Constitui, em princípio, uma medida de última instância (16). É, portanto, uma medida estritamente enquadrada pelo legislador da União no capítulo IV desta diretiva de modo a garantir, por um lado, o respeito do princípio da proporcionalidade no que diz respeito aos meios utilizados e aos objetivos prosseguidos e, por outro, o respeito dos direitos fundamentais dos nacionais em causa (17).

35.      É neste contexto que o artigo 16.o, n.o 1, da Diretiva 2008/115 estabelece as regras relativas às condições e ao regime de detenção.

36.      Em conformidade com o primeiro período deste artigo, a detenção para efeitos de afastamento de nacionais de países terceiros em situação irregular é efetuada, regra geral, em centros de detenção especializados. No caso de um Estado‑Membro «não tiver» condições para cumprir esta exigência e ordenar a colocação em detenção num estabelecimento prisional, o segundo período do referido artigo exige a separação dos nacionais de países terceiros dos presos comuns.

37.      O artigo 16.o, n.o 1, da Diretiva 2008/115 visa garantir o respeito da dignidade humana e dos direitos fundamentais daquele que não cometeu nenhuma infração, garantindo que a medida de detenção se distingue da execução de uma pena e se desenrola em condições e sob um regime adaptados ao seu estatuto jurídico.

38.      No que diz respeito à obrigação de colocação num centro de detenção especializado, prevista no artigo 16.o, n.o 1, primeiro período, da Diretiva 2008/115, o Tribunal de Justiça considera que o seu cumprimento se impõe aos Estados‑Membros enquanto tais, e não aos Estados‑Membros em função da sua respetiva estrutura administrativa ou constitucional (18). As autoridades judiciárias responsáveis pela colocação em detenção devem, portanto, poder ordenar a detenção em centros de detenção especializados, recorrendo se necessário, a acordos de cooperação administrativa celebrados para o efeito (19).

39.      No que diz respeito à derrogação prevista no artigo 16.o, n.o 1, segundo período, da Diretiva 2008/115, deve ser objeto de interpretação estrita (20). Segundo o Tribunal de Justiça, a referida diretiva «autoriza os Estados‑Membros, a título excecional e com exclusão das situações expressamente previstas no artigo 18.o, n.o 1, [desta] diretiva […], a colocar nacionais de países terceiros em situação irregular em detenção para efeitos de afastamento num estabelecimento prisional nos casos em que, em razão das circunstâncias especiais do caso concreto, os referidos Estados‑Membros não possam respeitar os objetivos prosseguidos pela [referida] diretiva, assegurando a sua detenção em centros especializados» (21). O Tribunal de Justiça considera que tal pode ser o caso quando o interessado representar uma ameaça real, atual e suficientemente grave que afete um interesse fundamental da sociedade ou a segurança interna ou externa do Estado‑Membro em causa (22), considerando‑se que as exigências de ordem pública devem ser entendidas estritamente (23). Por outro lado, o Tribunal de Justiça considera que nem a vontade expressa pelo interessado (24) nem a falta de um centro de detenção especializado num Land da República Federal da Alemanha (25) podem, por si só, justificar a detenção para efeitos de afastamento num estabelecimento prisional nos termos do artigo 16.o, n.o 1, segundo período, da Diretiva 2008/115.

40.      Quanto à obrigação, prevista no artigo 16.o, n.o 1, da Diretiva 2008/115, de separar os nacionais de países terceiros colocados em detenção num estabelecimento prisional dos presos comuns, o Tribunal de Justiça considera que a mesma é incondicional (26), «não [vindo] acompanhada de nenhuma exceção e [constituindo] uma garantia de respeito dos direitos expressamente reconhecida pelo legislador da União» (27).

2.      Medidas excecionais previstas no artigo 18.o da Diretiva 2008/115

41.      O artigo 18.o da Diretiva 2008/115, sob a epígrafe «Situações de emergência», tem por objeto definir as condições em que um Estado‑Membro «pode» decidir tomar medidas urgentes em derrogação das condições de detenção previstas no artigo 16.o, n.o 1, e no artigo 17.o, n.o 2, desta diretiva devido à existência de uma sobrecarga imprevista sobre a capacidade dos centros de detenção. Trata‑se de uma disposição facultativa, dispondo os Estados‑Membros de margem para apreciar em que medida a gestão da pressão migratória a que estão sujeitos exige uma derrogação às condições e ao regime de detenção de nacionais de países terceiros estabelecidos no artigo 16.o, n.o 1, da referida diretiva.

42.      Contudo, o alcance desta margem de apreciação não é ilimitado.

43.      Considero, com efeito, que a adoção de medidas urgentes é suscetível de ter consequências extremamente pesadas em relação aos nacionais de países terceiros em causa, uma vez que o regime de execução da detenção pode, assim, confundir‑se com o regime de execução de uma pena.

44.      Resulta dos próprios termos do artigo 18.o da Diretiva 2008/115 que as medidas urgentes podem derrogar as condições de detenção enunciadas «no artigo 16.o, n.o 1, e no artigo 17.o, n.o 2» desta diretiva. O legislador da União não distinguiu o artigo 16.o, n.o 1, primeiro período, da referida diretiva (o princípio da detenção num centro especializado) do seu segundo período (a obrigação de separação dos nacionais de países terceiros e dos presos comuns em caso de colocação num estabelecimento prisional). Por outras palavras, a existência de uma situação de emergência permite aos Estados‑Membros colocar em detenção os nacionais de países terceiros que aguardam o afastamento em estabelecimentos prisionais, sem que estejam obrigados a garantir a sua separação dos presos comuns (28), nem a disponibilizar um local de alojamento separado para as famílias.

45.      É certo que os Estados‑Membros, mesmo nas situações de emergência previstas no artigo 18.o da Diretiva 2008/115, não podem derrogar as obrigações previstas no artigo 16.o, n.os 2 a 5, e no artigo 17.o, n.os 1 e 3 a 5, desta diretiva, que visam garantir o cumprimento dos direitos dos nacionais de países terceiros e, em particular, dos menores colocados em detenção (29). Dito isto, não creio que isto seja suficiente para garantir o respeito pela dignidade humana e pelos direitos fundamentais das pessoas em causa, ainda mais numa situação em que a medida de colocação em detenção num estabelecimento prisional não depende de um comportamento particular das pessoas, mas da situação administrativa e judiciária do Estado‑Membro em que se encontram. Com efeito, é claro que a colocação em detenção num estabelecimento prisional implica, por si só, um entrave à liberdade ainda mais estrito do que a limitação inerente a uma colocação num centro de detenção especializado. Além disso, existe o risco de que, a ausência de separação, em meio carcerário, entre os nacionais de países terceiros e os presos comuns se traduza, para esses nacionais de países terceiros, na aplicação do regime da execução das penas. A detenção assume, portanto, a forma, de facto, de uma medida punitiva (30).

46.      Tendo em conta a gravidade, que acabo de descrever, das consequências que o regime de exceção previsto no artigo 18.o da Diretiva 2008/115 acarreta, parece‑me essencial que este seja aplicado de forma excecional e proporcionada, com base numa interpretação estrita das condições de fundo impostas pelo legislador da União (31).

47.      Analisarei, em primeiro lugar, estas condições com base numa interpretação literal do artigo 18.o, n.o 1, da Diretiva 2008/115, para precisar depois o seu âmbito de aplicação à luz da economia e da finalidade da referida diretiva.

a)      Interpretação literal do artigo 18.o, n.o 1, da Diretiva 2008/115

48.      A adoção das medidas urgentes previstas no artigo 18.o, n.o 1, da Diretiva 2008/115 está sujeita ao cumprimento de um conjunto de requisitos materiais e formais que têm por objetivo enquadrar estritamente o recurso a este regime de exceção.

49.      Em primeiro lugar, o artigo 18.o da Diretiva 2008/115 exige, como se depreende do seu título, a existência de uma situação de emergência.

50.      O termo francês «urgence» é definido no dicionário Larousse como «caráter […] do que não sofre qualquer atraso».

51.      No domínio processual, a urgência consiste numa situação em que pode ocorrer um prejuízo grave e irreparável se não for corrigida com a maior brevidade possível, permitindo ao juiz adotar determinadas medidas através de um procedimento rápido (32). No direito da União e, em particular, no âmbito do espaço de liberdade, segurança e justiça, a tramitação processual urgente permite que o caso seja examinado com a «maior brevidade possível» quando o interessado é privado da sua liberdade (33).

52.      No domínio da política de imigração e de asilo, as dificuldades relativas à gestão dos fluxos migratórios e as medidas urgentes que esta exige estão previstas pelo legislador da União em numerosos textos de direito primário e derivado.

53.      Por exemplo, a urgência é ilustrada no artigo 78.o, n.o 3, TFUE, que aborda a situação em que os Estados‑Membros são confrontados por um súbito fluxo de nacionais de países terceiros (34). Foi com base nesta disposição que, na sequência da crise migratória dos anos 2014 e 2015, o Conselho instituiu, em setembro de 2015, um mecanismo temporário e excecional de recolocação de pessoas com manifesta necessidade de proteção internacional (35).

54.      A urgência também é ilustrada no artigo 29.o do Regulamento (UE) 2016/399 (36), que abrange as situações em que um Estado‑Membro pode reintroduzir, a título excecional e de forma imediata, o controlo nas fronteiras internas quando razões de ordem pública ou segurança interna exijam uma ação urgente (37). Foi com base no artigo 25.o do Regulamento (CE) n.o 562/2006 (38), que foi substituído pelo artigo 29.o do Regulamento 2016/399, e em resposta à crise migratória de 2014 e 2015, que a República Federal da Alemanha, durante o ano de 2015, reintroduziu o controlo nas suas fronteiras internas.

55.      Como demonstram estes textos, uma situação de emergência impõe, portanto, uma ação rápida, ou mesmo imediata.

56.      Em segundo lugar, constato que o legislador da União define com precisão as circunstâncias em que um Estado‑Membro pode invocar a existência de uma situação de emergência no contexto do afastamento dos nacionais de países terceiros. Nos termos do artigo 18.o, n.o 1, da Diretiva 2008/115, esta situação deve caracterizar‑se por «um número excecionalmente elevado de nacionais de países terceiros que devam ser objeto de uma operação de regresso [que] sobrecarregue de forma imprevista a capacidade dos centros de detenção de um Estado‑Membro ou o seu pessoal administrativo e judicial».

57.      A precisão destes motivos implica, na minha opinião, que o Estado‑Membro proceda a uma avaliação tão completa e atualizada quanto possível das circunstâncias que determinem a necessidade das medidas urgentes.

58.      Neste contexto, considero que não é suficiente que o Estado‑Membro comunique os dados relativos ao número de nacionais de países terceiros sujeitos a uma obrigação de regresso. Na minha opinião, estes não permitem apreciar, com a precisão exigida, a sobrecarga real e atual que recai sobre a capacidade dos centros de detenção especializados. Por um lado, a detenção constitui uma medida de último recurso contra nacionais de países terceiros sujeitos a uma obrigação de regresso. Resulta assim da jurisprudência do Tribunal de Justiça que só no caso de o afastamento correr o risco de, atendendo à apreciação de cada situação específica, ficar comprometido pelo comportamento do interessado, e quando não houver qualquer outra alternativa, é que os Estados‑Membros o podem privar da liberdade mediante a sua detenção (39). Por outro lado, a taxa de detenção dos nacionais de países terceiros objeto de uma obrigação de regresso varia significativamente consoante os Estados‑Membros e, num Estado‑Membro como a República Federal da Alemanha, consoante os Estados federados.

59.      Além disso, resulta dos termos do artigo 18.o, n.o 1, da Diretiva 2008/115 que os dados comunicados pelo Estado‑Membro devem permitir demonstrar a existência de uma «sobrecar[ga] […] imprevista» sobre a capacidade material e humana do Estado‑Membro. Estes dois critérios são cumulativos. Ao visar uma sobrecarga «imprevista», o legislador da União mostra a sua vontade de limitar a aplicação do regime derrogatório previsto no artigo 18.o desta diretiva apenas aos casos em que o Estado‑Membro não pode prever essa pressão sobre a capacidade dos seus centros de detenção especializados ou sobre o seu pessoal. Em contrapartida, ao referir‑se a uma «sobrecarga», não exige que se demonstre que a capacidade está saturada.

60.      Em terceiro e último lugar, o legislador da União precisa, no artigo 18.o, n.o 1, da Diretiva 2008/115, que o Estado‑Membro só pode tomar medidas urgentes enquanto persistir a situação excecional. Daqui resulta, por um lado, que estas medidas devem ser levantadas assim que a situação excecional termina e, por outro, que esta diretiva não fixa uma duração máxima para essas medidas. A referida diretiva distingue‑se dos outros instrumentos do sistema europeu comum de asilo, nos quais as medidas urgentes devem ser adotadas por um período curto e renovável. As medidas em causa devem apresentar as mesmas características. A natureza «excecional» da situação implica, em si, medidas de curta duração. No âmbito dos trabalhos preparatórios da reformulação da Diretiva 2008/115, o Parlamento Europeu propõe, assim, que o prazo de aplicação destas medidas seja limitado a três meses (40). Além disso, ao condicionar a aplicação das referidas medidas à persistência da situação de emergência, o legislador da União exige que os Estados‑Membros procedam a uma reavaliação periódica da situação, de modo a garantir, em conformidade com o princípio da proporcionalidade, que a duração das medidas urgentes não exceda a que é estritamente necessária para a gestão da crise.

61.      O alcance destas condições deve igualmente ser examinado à luz da economia em que se inscreve o artigo 18.o da Diretiva 2008/115 e dos objetivos que o legislador da União prossegue.

b)      Economia e finalidade da Diretiva 2008/115

62.      Como já referi, a Diretiva 2008/115 tem como objetivo definir uma política eficaz de afastamento e repatriamento, baseada em normas comuns, para proceder aos repatriamentos em condições humanamente dignas e com pleno respeito pelos direitos fundamentais e a dignidade das pessoas (41).

63.      O artigo 18.o desta diretiva destina‑se a atingir estes objetivos não obstante uma situação de emergência nacional.

64.      Por um lado, ao autorizar a detenção dos nacionais de países terceiros que aguardam o afastamento em estabelecimentos prisionais sem separação dos presos comuns, o legislador da União visa dar aos Estados‑Membros os meios para garantir o seu afastamento, apesar do risco de saturação da capacidade de acolhimento dos centros de detenção. Esta medida deve assim participar na definição de uma política eficaz de afastamento e, mais globalmente, na gestão eficaz dos fluxos migratórios, que constitui, em conformidade com o artigo 79.o, n.o 1, TFUE, um dos objetivos da União (42).

65.      Por outro lado, o legislador da União tem igualmente o cuidado de precisar, no artigo 18.o, n.o 3, da Diretiva 2008/115, que, apesar da situação de emergência, os Estados‑Membros não estão autorizados a derrogar o dever geral que lhes incumbe de tomarem todas as medidas adequadas, de caráter geral ou específico, para assegurarem o cumprimento das obrigações decorrentes desta diretiva (43).

66.      Esta disposição reflete a vontade do legislador da União de garantir, independentemente da urgência da situação, o respeito pelo direito à dignidade humana e pelos direitos fundamentais dos nacionais de países terceiros, em conformidade com o artigo 1.o e os considerandos 2, 17 e 24 da Diretiva 2008/115, mas também pelo princípio da proporcionalidade, em conformidade com os considerandos 13 e 16 desta diretiva (44). De acordo com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, o respeito pelo princípio da proporcionalidade implica que as medidas adotadas não excedam, pela sua duração e modalidades de aplicação, os limites do que é adequado e necessário para a realização dos objetivos prosseguidos pelo legislador da União (45).

67.      Daqui decorre, em primeiro lugar, que as medidas urgentes não podem conduzir a um mecanismo através do qual a detenção num estabelecimento prisional sem separação dos presos comuns seja sistemática e generalizada. A emergência que caracteriza a situação visada no artigo 18.o da Diretiva 2008/115 não o justifica, uma vez que a sobrecarga que recai sobre a capacidade de acolhimento dos centros de detenção especializados não pode impedir as autoridades responsáveis pela detenção de procurar saber, a cada instante e prioritariamente, se existem lugares disponíveis nesses centros de detenção.

68.      Daqui decorre, em segundo lugar, que as medidas urgentes não podem privar as autoridades administrativas ou judiciárias responsáveis pela detenção de proceder a um exame individualizado de cada situação, de modo a determinar se a detenção, se tiver de decorrer num estabelecimento prisional, além do mais sem separação dos presos comuns, é proporcionada (46).

69.      Por um lado, numa situação caracterizada pelo risco de saturação da capacidade dos centros de detenção especializada, isso implica verificar se não pode ser tomada uma medida menos restritiva para remediar de forma eficaz a emergência constatada (47). Neste contexto, considero que as medidas urgentes adotadas em aplicação do artigo 18.o da Diretiva 2008/115 devem ser acompanhadas de um recurso maior a medidas alternativas à detenção, como as previstas no artigo 7.o, n.o 3, desta diretiva, em particular no que respeita às pessoas mais vulneráveis (48).

70.      Por outro lado, isso implica verificar, caso a caso, se a detenção num estabelecimento prisional com a possibilidade de ausência de separação dos presos comuns é adaptada à situação do nacional em causa devido, por exemplo, à sua idade, ao seu estado de saúde física ou mental, ao seu estatuto ou à sua situação familiar. Recordo, quanto a este ponto, que o artigo 18.o, n.o 1, da Diretiva 2008/115 não autoriza os Estados‑Membros a derrogar as suas obrigações que figuram no artigo 16.o, n.os 2 a 5, e no artigo 17.o, n.os 1 e 3 a 5, desta diretiva, relativas à situação das pessoas vulneráveis e dos menores (49). Esta regra só tem sentido se as autoridades nacionais competentes puderem proceder a uma análise da situação particular de cada um dos nacionais em causa à luz das condições materiais de execução da sua detenção.

71.      Esta interpretação parece‑me corroborada pela jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem.

72.      Com efeito, o referido tribunal considera que as decisões generalizadas ou automáticas de detenção de requerentes de proteção internacional podem ser contrárias ao artigo 5.o, n.o 1, alínea f) do TEDH (50), se não forem precedidas de uma apreciação individual das necessidades específicas das pessoas em causa. As autoridades nacionais competentes são, assim, obrigadas a tomar a cargo o interessado através da adoção de medidas adequadas e a averiguar se é possível substituí‑las por outras menos radicais (51). Assim, no Acórdão Rahimi c. Grécia (52), o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem condenou a República Helénica por considerar que a decisão de privação de liberdade do menor não acompanhado era «o resultado da aplicação automática» da legislação, uma vez que esta decisão tinha sido adotada sem que as autoridades gregas tivessem examinado a sua situação particular de menor não acompanhado e tivessem tido em conta o seu interesse superior (53).

73.      Em terceiro lugar, decorre do respeito pelo princípio da proporcionalidade que a duração da aplicação do regime de exceção não deve exceder o estritamente necessário para responder à urgência da situação. O artigo 18.o, n.o 2, da Diretiva 2008/115 exige, ainda, que os Estados‑Membros informem a Comissão logo que os motivos que justificam a aplicação das medidas excecionais deixem de existir. Este regime deve, portanto, ser tão curto quanto possível e exige que os Estados‑Membros prevejam uma reavaliação da situação, de modo que o referido regime seja permanentemente adaptado às circunstâncias.

74.      É à luz de todos estes fatores que se deve apreciar se uma legislação como a enunciada no § 62a, n.o 1, da AufenthG, na sua versão aplicável a partir de 15 de agosto de 2019, cumpre as condições enunciadas no artigo 18.o, n.o 1, da Diretiva 2008/115.

3.      Quanto à apreciação da legislação nacional

75.      Resulta dos elementos dos autos de que dispõe o Tribunal de Justiça que, por força da legislação em causa, os Estados federados já não são obrigados a ordenar a detenção de nacionais de países terceiros que aguardam o afastamento em centros de detenção especializados. Podem colocá‑los em estabelecimentos prisionais, desde que essa colocação garanta uma separação dos presos comuns e que esteja assegurado o alojamento separado das famílias. É também necessário garantir que a colocação num estabelecimento prisional é «aceitável e legal no caso concreto», por exemplo, tratando‑se de pessoas vulneráveis (54).

76.      Resulta igualmente das informações de que dispõe o Tribunal de Justiça que esta legislação foi notificada à Comissão em 27 de agosto de 2019, com base no artigo 18.o, n.o 2, da Diretiva 2008/115, tendo o Governo alemão indicado tanto a data da sua entrada em vigor como a duração da sua aplicação. As medidas urgentes e a derrogação que estas implicam à legislação da União aplicam‑se durante um período de três anos, a saber, de 15 de agosto de 2019 a 30 de junho de 2022, data em que o Governo alemão prevê o fim da situação de emergência.

77.      Pelas razões que vou agora expor, considero que a legislação em causa, tendo em conta, nomeadamente, a sua natureza e o objetivo que prossegue, não cumpre as condições impostas pelo artigo 18.o, n.o 1, da Diretiva 2008/115.

78.      É certo que esta legislação prevê sem ambiguidade um mecanismo de duração determinada, pelo que o seu caráter provisório não pode ser contestado. Todavia, não penso que a situação que a referida legislação visa sanar possa ser qualificada de «situação de emergência» na aceção do artigo 18.o desta diretiva.

79.      Em primeiro lugar, a urgência de uma situação implica uma tomada de decisão rápida e imediata. Ora, a legislação em causa foi adotada em 15 de agosto de 2019, ou seja, quatro anos após o início da crise migratória, o que não demonstra nem a rapidez nem o imediatismo que exige a urgência de uma situação. Embora seja inegável que, em 2015, a situação poderia ser descrita como «excecional» e «imprevisível» — como sublinha a exposição de motivos do projeto da Segunda Lei Destinada a Melhorar o Cumprimento da Obrigação de Abandonar o Território — considero, por outro lado, que as autoridades nacionais competentes podiam razoavelmente esperar um aumento exponencial da pressão exercida sobre a capacidade dos seus centros de detenção nos anos que se seguiram, uma vez que os dados do Gabinete Europeu de Apoio em matéria de Asilo (EASO), da Agência Europeia da Guarda de Fronteiras e Costeira (Frontex) e do Serviço de Estatística da União Europeia (Eurostat) atestavam um forte e constante aumento do número de nacionais de países terceiros em situação irregular ao longo dos anos de 2015 a 2017, antes de se estabilizarem e depois diminuírem. Nestas circunstâncias, penso que, em 2019, a sobrecarga que recaía sobre a capacidade dos centros de detenção especializados não podia ser qualificada de «imprevista» na aceção do artigo 18.o, n.o 1, da Diretiva 2008/115.

80.      Em segundo lugar, parece‑me que a duração da aplicação da legislação em causa excede a que deveria ser estritamente necessária para a gestão de uma situação excecional como a prevista no artigo 18.o, n.o 1, desta diretiva. Com efeito, o legislador alemão optou por aplicar esta legislação não por um período curto e renovável, mas por um período determinado de três anos, até 30 de junho de 2022, data em que prevê a conclusão dos projetos de construção de centros de detenção especializados. Na exposição de motivos do projeto da Segunda Lei Destinada a Melhorar o Cumprimento da Obrigação de Abandonar o Território, este legislador sublinha que, «até [30 de junho de 2022], mantém‑se a situação excecional». Tal parece‑me dificilmente conciliável com a exigência que decorre do artigo 18.o, n.o 1, da referida diretiva de reavaliar periodicamente a situação. Isto parece‑me igualmente estar em contradição com a afirmação do Governo alemão segundo a qual, para levar a cabo essa reavaliação, procede a inquéritos frequentes sobre a taxa de ocupação dos centros de detenção especializados.

81.      Em terceiro lugar, nenhum elemento dos autos permite apreciar em que medida a legislação em causa assenta numa avaliação precisa da relação, em 2019, entre o número de nacionais de países terceiros objeto de uma decisão de detenção e a capacidade dos centros de detenção especializados. O Governo alemão indica que não dispõe dessas informações para o mês de agosto de 2019 nem para os meses seguintes. Da mesma forma, a Comissão salienta que a notificação nos termos do artigo 18.o, n.o 2, da Diretiva 2008/115, de 27 de agosto de 2019, não continha nenhuma dessas indicações para o ano de 2019 nem para os anos precedentes, tendo o legislador alemão comunicado simplesmente o número insuficiente de lugares nos centros de detenção especializados atendendo ao elevado número de nacionais de países terceiros obrigados a abandonar o território.

82.      Na realidade, pergunto‑me se a legislação em causa não se baseia erradamente no artigo 18.o da Diretiva 2008/115, cujas condições de aplicação não estão preenchidas, quando as motivações que conduziram à adoção desta legislação parecem ser totalmente diferentes.

83.      Com efeito, constato, antes de mais, que esta legislação prevê, é verdade, que a detenção é feita nos estabelecimentos prisionais, mas que os nacionais de países terceiros que aguardam o afastamento devem ser separados dos presos comuns e que o alojamento separado das famílias deve ser assegurado. Ora, como já referi, a aplicação do artigo 18.o da Diretiva 2008/115 tem por objetivo permitir aos Estados‑Membros derrogar tanto a obrigação de separar os nacionais dos países terceiros dos presos comuns como a de assegurar o alojamento separado das famílias. Por conseguinte, a referida legislação tem por único efeito permitir a detenção nos estabelecimentos prisionais, o que é permitido pelo artigo 16.o, n.o 1, da Diretiva 2008/115 quando, em razão das circunstâncias especiais do caso concreto, os Estados‑Membros não possam respeitar os objetivos prosseguidos por esta diretiva, assegurando a sua detenção em centros especializados (55).

84.      Em segundo lugar, parece resultar da exposição de motivos do projeto da Segunda Lei Destinada a Melhorar o Cumprimento da Obrigação de Abandonar o Território que essa legislação é, antes de mais, uma lei de programação. Esta foi adotada a fim de combater a insuficiência da capacidade de acolhimento dos centros de detenção especializados, tendo o Governo alemão privilegiado o acolhimento dos requerentes de proteção internacional na crise migratória dos anos de 2014 e 2015. Por conseguinte, a referida legislação tem agora por objetivo permitir, durante um período de três anos, a construção de centros de detenção especializados em número suficiente. Esta exposição de motivos especifica, no que diz respeito ao § 1, ponto 22, da Segunda Lei Destinada a Melhorar o Cumprimento da Obrigação de Abandonar o Território, que, «[e]m consequência da alteração da situação durante o ano de 2015 e da subida em flecha do número de requerentes de proteção [internacional], a principal obrigação do Estado Federal e dos [Estados Federados] era criar capacidade para atender às necessidades das pessoas […] Nesta situação, a tomada a cargo das pessoas recém‑chegadas tinha prioridade sobre o aumento da capacidade de detenção, com o objetivo de satisfazer numa data posterior (depois de o procedimento de pedido de asilo e de recurso ter sido concluído) as exigências da Diretiva 2008/115. Com efeito, a regra derrogatória prevista no artigo 18.o [da referida diretiva] tem precisamente por objetivo e finalidade permitir que numa tal situação as autoridades deem prioridade ao tratamento dos recém‑chegados sem que no futuro se verifiquem violações previsíveis das obrigações […] O artigo 18.o da Diretiva 2008/115 tem precisamente por objetivo resolver o eventual conflito de objetivos numa situação excecional e imprevisível».

85.      Ora, não partilho do ponto de vista expresso pelo legislador alemão na referida exposição de motivos. Embora as normas relativas ao acolhimento dos requerentes de proteção internacional enunciadas na Diretiva 2013/33 e as relativas à detenção dos nacionais de países terceiros que aguardam o afastamento enunciadas na Diretiva 2008/115 estejam abrangidas pelo sistema europeu comum de asilo, estas diretivas têm, todavia, um âmbito de aplicação próprio e prosseguem finalidades distintas. Nenhuma das normas previstas nas referidas diretivas permite considerar que a preservação dos direitos fundamentais dos primeiros deve ser feita em detrimento dos direitos dos segundos.

86.      Tendo em conta estes elementos, considero que o § 62a, n.o 1, da AufenthG, na sua versão de 15 de agosto de 2019, não cumpre, portanto, as condições enunciadas no artigo 18.o, n.o 1, da Diretiva 2008/115, devido tanto às razões apresentadas pelo legislador alemão para justificar a execução da detenção de nacionais de países terceiros que aguardam o afastamento em estabelecimentos prisionais, como devido às condições em que essa legislação foi adotada e às modalidades de aplicação. Admitir o contrário equivaleria a desculpar um incumprimento pelos Estados‑Membros das obrigações que lhes incumbem por força do artigo 16.o, n.o 1, desta diretiva, o que prejudicaria o objetivo da referida diretiva e o seu efeito útil.

87.      Considero que esta opinião é igualmente partilhada pela Comissão. Com efeito, na audiência, a Comissão informou o Tribunal de Justiça de que, nos termos do Regulamento (UE) n.o 1053/2013 do Conselho, de 7 de outubro de 2013, que cria um mecanismo de avaliação e de monitorização para verificar a aplicação do acervo de Schengen e que revoga a Decisão do Comité Executivo de 16 de setembro de 1998 relativa à criação de uma comissão permanente de avaliação e de aplicação de Schengen (56), procedeu, a partir de fevereiro de 2020, a visitas no local. Tendo estas permitido constatar a inexistência de uma situação de emergência na Alemanha, a Comissão recomendou então a este Estado‑Membro que reavaliasse a situação e apresentasse um plano de ação.

88.      À luz de todas estas considerações, proponho ao Tribunal de Justiça que declare que o artigo 18.o, n.o 1, da Diretiva 2008/115 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional que permite, por um período de três anos, a detenção de nacionais de países terceiros que aguardam o afastamento em estabelecimentos prisionais, quando nem os motivos em que assenta essa legislação, nem as condições da sua adoção, nem as modalidades da sua aplicação revelam uma situação de emergência na aceção deste artigo.

B.      Quanto ao âmbito dos poderes de que dispõe a autoridade judiciária responsável pela detenção (primeira questão)

89.      Com a sua primeira questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, ao Tribunal de Justiça se o artigo 18.o, n.os 1 e 3, da Diretiva 2008/115 deve ser interpretado no sentido de que exige que a autoridade judiciária responsável pela detenção verifique, em cada caso, a existência, ou mesmo a persistência, de uma situação de emergência que justifique a detenção do interessado num estabelecimento prisional.

90.      Pelas razões que passo a expor, considero que a autoridade judiciária responsável pela detenção deve poder verificar, em cada momento, se estão reunidas as condições enunciadas no artigo 18.o, n.o 1, desta diretiva e que justificam a adoção de medidas excecionais.

91.      É certo que as constatações relativas à existência de uma situação de emergência e à adoção das medidas excecionais daí decorrentes são, antes de mais, da responsabilidade do Estado‑Membro. Tendo em conta a natureza e a gravidade das circunstâncias referidas no artigo 18.o, n.o 1, da Diretiva 2008/115, é ao Estado‑Membro que incumbe proceder a estas verificações com base numa análise generalizada e aprofundada que tenha em conta todos os dados de que dispõe relativos à sobrecarga que recai sobre a capacidade dos seus centros de detenção especializados ou sobre o seu pessoal administrativo e judicial. Nos termos do artigo 18.o, n.o 2, desta diretiva, a Comissão só é informada da adoção e da revogação destas medidas urgentes sem que o legislador da União preveja uma fiscalização ex ante das referidas medidas. Com exceção do controlo que o juiz da União pode efetuar no âmbito do reenvio prejudicial, estas medidas só estão sujeitas ao procedimento de avaliação e de monitorização instituído pelo Regulamento n.o 1053/2013 depois da sua adoção.

92.      Contudo, a autoridade judiciária responsável pela detenção de um nacional de país terceiro enquanto aguarda o afastamento deve poder exercer um certo controlo.

93.      Com efeito, este controlo parece‑me justificado pelo facto de as medidas urgentes só poderem ser mantidas, em conformidade com o artigo 18.o, n.o 1, da Diretiva 2008/115, na medida em que a situação excecional persista, estando o Estado‑Membro obrigado a informar a Comissão «logo que os motivos que conduziram à aplicação dessas medidas deixem de existir», nos termos do artigo 18.o, n.o 2, desta diretiva. Por conseguinte, considero que a autoridade judiciária responsável pela detenção deve ter a possibilidade, em cada caso que lhe é submetido, de verificar se as medidas urgentes são justificadas à luz das condições enunciadas no artigo 18.o, n.o 1, da referida diretiva.

94.      Um tal controlo parece‑me tanto mais necessário quanto a existência de uma situação de emergência e o risco de saturação da capacidade que implica — se for comprovada — constituem critérios objetivos que a autoridade judiciária responsável pela detenção deve ter em conta na decisão de detenção. Com efeito, resulta do considerando 6 da Diretiva 2008/115, bem como da jurisprudência do Tribunal de Justiça, que as decisões de detenção devem ser tomadas caso a caso e ter em conta critérios objetivos, não se limitando ao mero facto da permanência irregular (57). Por conseguinte, compete a esta autoridade verificar, com base numa análise individualizada tendo em conta as necessidades particulares do nacional em causa, se é possível recorrer a uma medida alternativa à detenção e, se não for o caso, se é possível colocar este último num centro de detenção especializado ou, em caso de saturação, num estabelecimento prisional.

95.      Além disso, este controlo parece‑me ser tanto mais indispensável quanto se deve considerar que o artigo 16.o, n.o 1, da Diretiva 2008/115 tem efeito direto (58). Com efeito, este artigo não precisa de ser clarificado por disposições do direito da União ou do direito nacional para conferir aos nacionais de países terceiros que aguardam o afastamento um direito invocável como tal. Nestas circunstâncias e em conformidade com a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, incumbe à autoridade judiciária assegurar a aplicação efetiva dos princípios e exigências enunciadas nesse artigo pelo legislador da União.

96.      Tendo em conta estes elementos, considero que o artigo 18.o da Diretiva 2008/115 deve ser interpretado no sentido de que a autoridade judiciária responsável pela detenção deve verificar, caso a caso individual, se as circunstâncias enunciadas no artigo 18.o, n.o 1, desta diretiva, que justificaram a adoção de medidas excecionais, ainda se verificam.

C.      Quanto ao conceito de «centro de detenção especializado» (terceira e quarta questões)

97.      Com a terceira e quarta questões prejudiciais, o órgão jurisdicional de reenvio pede, em substância, ao Tribunal de Justiça que clarifique os critérios com base nos quais um centro de detenção especializado se distingue de um estabelecimento prisional, na aceção do artigo 16.o, n.o 1, da Diretiva 2008/115, em especial, à luz da direção da estrutura, do regime da detenção e das condições materiais deste último.

98.      O órgão jurisdicional de reenvio pergunta, num primeiro momento, se o conceito de «centro de detenção especializado» exclui uma estrutura que se apresenta como uma unidade específica de um estabelecimento prisional, cuja direção está subordinada em conjunto à direção do estabelecimento prisional e está abrangida, à semelhança desse estabelecimento, pela autoridade do ministro da Justiça.

99.      No caso de essa estrutura poder revestir esta qualificação, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em segundo lugar, se o conceito de «centro de detenção especializado» abrange uma estrutura que se apresenta como uma unidade específica de um estabelecimento prisional na qual os nacionais de países terceiros que aguardam o afastamento estão separados dos presos comuns, que se compõe de três edifícios vedados por uma cerca de arame, entre os quais não existe qualquer acesso direto, dispondo cada um de instalações próprias (armazém de roupas, enfermaria, ginásio, pátio), um dos desses edifícios está destinado temporariamente à execução de penas privativas de liberdade substitutivas ou de curta duração.

100. Recordo que o Tribunal de Justiça, ao decidir no âmbito de um reenvio prejudicial, pode fornecer esclarecimentos que permitam orientar o órgão jurisdicional nacional na sua interpretação de uma norma da União. Todavia, é a este último que compete verificar os elementos concretos do litígio que lhe foi submetido e, designadamente, decidir a questão de saber se as condições materiais da detenção na unidade de Langenhagen do estabelecimento prisional da cidade de Hanôver, entre 25 de setembro e 2 de outubro de 2020, se opõem à qualificação de «centro de detenção especializado» (59). Essa análise constitui uma questão de facto, que escapa à competência do Tribunal de Justiça no âmbito de um procedimento nos termos do artigo 267.o TFUE e é da competência do órgão jurisdicional nacional.

1.      Detenção num centro especializado

101. O legislador da União não definiu com precisão o regime e os critérios materiais próprios de um centro de detenção especializado. No entanto, é possível retirá‑los a partir da definição do conceito de «detenção», dos direitos reconhecidos aos nacionais de países terceiros durante a sua detenção e dos princípios enunciados tanto pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem como pelo Conselho da Europa.

102. O conceito de «detenção» não está definido na Diretiva 2008/115. Em contrapartida, está especificado na Diretiva 2013/33 em relação à detenção de requerentes de proteção internacional. Segundo o Tribunal de Justiça, esta definição é aplicável no contexto da Diretiva 2008/115 (60).

103. Em conformidade com o artigo 2.o, alínea h), da Diretiva 2013/33, a «detenção» é definida como «qualquer medida de reclusão de um requerente [de proteção internacional] por um Estado‑Membro numa zona especial, no interior da qual o requerente é privado da liberdade de circulação» (61). Segundo o Tribunal de Justiça, a colocação de um nacional de um país terceiro num centro de detenção especializado constitui uma «medida privativa de liberdade» (62) ou ainda uma «medida coerciva que priva [o interessado] da sua liberdade de circulação e o isola do resto da população, impondo‑lhe que permaneça permanentemente num perímetro restrito e fechado» (63).

104. A natureza e a finalidade da detenção distinguem‑se, na sua essência, das de uma medida punitiva, uma vez que a detenção não tem outra finalidade que não seja contribuir para a realização do afastamento do nacional de país terceiro em situação irregular (64). Ao enunciar, no artigo 16.o, n.o 1, primeiro período, da Diretiva 2008/115, o princípio segundo o qual a detenção deve decorrer num centro especializado, o legislador da União revela assim a sua vontade de que sejam criados no território dos Estados‑Membros centros especificamente concebidos para preparar e executar o afastamento dos nacionais de países terceiros.

105. Além disso, a distinção que faz no artigo 16.o, n.o 1, da Diretiva 2008/115, entre a colocação em detenção num centro de detenção especializado e a colocação em detenção num estabelecimento prisional, exige que a primeira se distinga da segunda, tanto pelas suas regras de funcionamento internas como pela configuração das suas instalações. A este respeito, importa salientar que a distinção entre estas duas categorias de estabelecimentos deve ser tanto mais clara quanto os centros de detenção especializados estão destinados igualmente a assegurar a detenção de certos requerentes de proteção internacional (para fins diferentes do afastamento), em conformidade com o artigo 8.o, n.o 3, da Diretiva 2013/33 (65).

106. O regime e as condições materiais da detenção resultam igualmente dos artigos 16.o e 17.o da Diretiva 2008/115. O legislador da União tem o cuidado de enunciar os direitos que os Estados‑Membros devem garantir durante a execução da detenção, tais como o acesso a cuidados de saúde urgentes ou os contactos com os membros da família, os representantes legais ou ainda as autoridades consulares. Precisa igualmente as condições materiais exigidas para efeitos da detenção das famílias e dos menores, exigindo que os Estados‑Membros concedam uma consideração primordial ao superior interesse da criança, em conformidade com as obrigações previstas no artigo 7.o, no artigo 14.o, n.o 1, e no artigo 24.o da Carta dos Direitos Fundamentais e que são igualmente enunciadas no considerando 22 e no artigo 5.o desta diretiva. As famílias devem, assim, poder beneficiar de um local de alojamento separado que lhes garanta a devida privacidade e os menores devem poder praticar atividades recreativas adaptadas à sua idade, bem como, se for caso disso, ter acesso à educação. Quanto aos menores não acompanhados, devem, na medida do possível, ser objeto de cuidados específicos, por parte de pessoal qualificado e em instalações adaptadas.

107. Por último, o regime e as condições materiais da detenção resultam das obrigações que incumbem a cada um dos Estados‑Membros de respeitar a dignidade das pessoas privadas de liberdade, bem como o seu direito a não serem expostas a tratamento desumano ou degradante (66).

108. As exigências impostas pelo legislador da União integram, em substância, as enunciadas pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem e pelo Conselho da Europa.

109. O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem aprecia o caráter «adequado» do regime da detenção à luz dos direitos consagrados nos artigos 3.o, 5.o e 8.o da CEDH com base em indícios relativos ao local, às condições e à duração da detenção. Procede a uma apreciação casuística, tendo em conta os efeitos cumulados das condições de detenção à luz, nomeadamente, da situação particular dos nacionais de países terceiros em causa (67).

110. O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem está particularmente atento à disposição e aos equipamentos das instalações, bem como às qualificações do pessoal que enquadram os nacionais de países terceiros, em especial, à localização das famílias. Estas instalações devem estar limpas e oferecer um espaço para viver suficiente para o número de pessoas que aí podem ser colocadas. Em especial, devem dispor de equipamentos sanitários de acesso livre e em número suficiente, de um espaço e do material necessários à restauração, bem como de um telefone de acesso livre. As referidas instalações devem igualmente dispor de equipamento médico bem como de um local reservado ao acolhimento das famílias e das autoridades consulares. Devem, além disso, dispor de um espaço de aprendizagem e de lazer e, em particular, de um espaço para caminhadas ao ar livre. Por último, na hipótese de as instalações do centro deverem acolher famílias, o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem exige que os quartos estejam especialmente equipados com as infraestruturas essenciais exigidas para a detenção de crianças de tenra idade com material de puericultura adaptado e seguro (68).

111. Além disso, o princípio 10 das «Vinte orientações sobre o regresso forçado», que o Comité de Ministros do Conselho da Europa aprovou em 4 de maio de 2005 e às quais a Diretiva 2008/115 faz referência no seu considerando 3, exige, no seu n.o 1, que as pessoas detidas antes do afastamento sejam «normalmente» colocadas em locais especialmente destinados a esse efeito, que ofereçam condições materiais e um regime adaptados ao seu estatuto jurídico (69). Impõe igualmente, no seu n.o 4, que essas pessoas sejam separadas das pessoas acusadas e condenadas. Quanto ao princípio 11 destes princípios orientadores, exige, nos seus n.os 2 a 4, que as famílias beneficiem de locais de alojamento separados a fim de preservar a sua privacidade e dotados de pessoal e de instalações que tenham em conta as necessidades específicas dos filhos, permitindo‑lhes, nomeadamente, ter acesso a educação e a atividades recreativas (70).

112. Estas indicações permitem identificar os critérios essenciais de um centro de detenção especializado.

113. Deve, acima de tudo, ser um estabelecimento distinto, pela sua finalidade e organização, de um estabelecimento prisional, sob pena de privar de todo o significado e efeito útil a distinção feita pelo legislador da União no artigo 16.o, n.o 1, da Diretiva 2008/115.

114. Deve, em seguida, tratar‑se de um estabelecimento que permita assegurar a execução da detenção por pessoal qualificado, segundo um regime privativo de liberdade e de condições materiais adaptados ao estatuto jurídico dos nacionais de países terceiros, em especial dos mais vulneráveis, respeitando a dignidade humana e os direitos fundamentais.

115. Importa agora analisar as condições em que deve decorrer a detenção quando esta tenha lugar num estabelecimento prisional, conforme previsto no artigo 16.o, n.o 1, segundo período, da Diretiva 2008/115.

2.      Detenção num estabelecimento prisional

116. Recordo que, quando um Estado‑Membro não pode colocar o nacional de país terceiro enquanto aguarda o afastamento num centro de detenção especializado e o coloca num estabelecimento prisional, deve garantir a separação deste último dos presos comuns, em conformidade com o artigo 16.o, n.o 1, segundo período, da Diretiva 2008/115.

117. Recordo igualmente que, no Acórdão Pham, o Tribunal de Justiça declarou que a obrigação de separação é mais do que uma simples modalidade de execução específica da colocação em situação de detenção em estabelecimentos prisionais e constitui um requisito material dessa colocação, sem o qual, em princípio, esta não é conforme com a referida diretiva (71). Além disso, o Tribunal de Justiça declarou que esta obrigação de separação é incondicional e que não vem acompanhada de nenhuma exceção (72).

118. A força dos princípios estabelecidos pelo Tribunal de Justiça implica uma separação geográfica e organizacional entre os nacionais de países terceiros que aguardam o afastamento e os presos comuns. Com efeito, os estabelecimentos prisionais estão concebidos para uma utilização diferente da detenção enquanto se aguarda o afastamento. A administração e o regime prisional traduzem‑se em regras internas de funcionamento, bem como em restrições administrativas e materiais que respondem a finalidades específicas ligadas à execução de uma pena.

119. O respeito desta obrigação de separação implica, portanto, uma separação estrita através da criação de uma estrutura distinta e isolada do resto do estabelecimento prisional. Implica, além disso, um tratamento distinto entre os nacionais de países terceiros que aguardam o afastamento e os presos comuns. Assim, o Estado‑Membro deve assegurar que, na estrutura destinada ao afastamento de nacionais de países terceiros, as modalidades de execução da detenção se distinguem das modalidades de execução de uma pena. Isto pressupõe a criação de um regime e de condições materiais de detenção que se adaptem ao seu estatuto jurídico e sejam capazes de responder às suas necessidades particulares, o que implica destacar para esta estrutura pessoal cuja missão se distinga da missão exercida junto dos presos comuns.

120. É com base nestes elementos que se deve analisar em que medida uma estrutura como a descrita pelo órgão jurisdicional de reenvio é suscetível de ser qualificada de «centro de detenção especializado», na aceção do artigo 16.o, n.o 1, primeiro período, da Diretiva 2008/115.

3.      Unidade de Langenhagen do estabelecimento prisional da cidade de Hanôver

121. À luz das indicações fornecidas tanto pelo órgão jurisdicional de reenvio como pelo Governo alemão, parece‑me que a medida de colocação em detenção de que foi objeto K na unidade de Langenhagen do estabelecimento prisional da cidade de Hanôver, entre 25 de setembro e 2 de outubro de 2020, é mais uma medida de colocação num estabelecimento prisional na aceção do artigo 16.o, n.o 1, segundo período, da Diretiva 2008/115, do que uma medida de colocação num centro de detenção especializado na aceção do primeiro período desta disposição.

122. Esta apreciação assenta numa ponderação das diferentes características que esta estrutura parece revestir.

123. Determinadas características poderiam permitir qualificar a referida estrutura de «centro de detenção especializado». Com efeito, parece existir uma separação geográfica entre a unidade de Langenhagen e o estabelecimento prisional da cidade de Hanôver à qual está associada, uma vez que a primeira se situa a alguns quilómetros do segundo. Esta unidade compõe‑se, além disso, de três edifícios dispondo, cada um, de instalações próprias, ou seja, de uma enfermaria, de um armazém de roupas, de um ginásio e de um pátio. Os quartos são ocupados por uma só pessoa, com exceção dos casos em que as pessoas em causa peçam para ser alojadas em conjunto. Existe livre acesso às instalações sanitárias durante todo o dia. As pessoas detidas podem receber uma visita diária, possuir um telemóvel e aceder à Internet.

124. O facto de a direção da unidade de Langenhagen estar subordinada à do estabelecimento prisional da cidade de Hanôver e, à semelhança deste estabelecimento, depender da autoridade do ministro da Justiça, não basta para excluir essa unidade da qualificação de «centro de detenção especializado». Com efeito, as missões das direções prisionais, como as dos ministérios, diferem consoante os Estados‑Membros e estes podem, por conseguinte, exercer a sua autoridade sobre estruturas de natureza muito diferente.

125. Em contrapartida, a unidade de Langenhagen apresenta outras características que, devido à sua importância, parecem excluí‑la da qualificação de «centro de detenção especializado».

126. Com efeito, esta unidade pode acolher presos comuns. Assim, um dos três edifícios que compõem a referida unidade foi utilizado para efeitos da execução de penas privativas de liberdade de curta duração ou das penas de prisão substitutivas. Ora, parece razoável supor que as autoridades judiciárias competentes não ordenaram a execução de uma pena privativa de liberdade, ainda que de curta duração ou substitutiva, numa estrutura que seria um «centro de detenção especializado» destinado ao afastamento de nacionais de países terceiros, e segundo as condições e modalidades diferentes das previstas na Gesetz über den Vollzug der Freiheitsstrafe und der freiheitsentziehenden Maßregeln der Besserung und Sicherung (Lei Relativa à Execução de Penas de Prisão e de Medidas de Segurança Privativas de Liberdade) (73), de 16 de março de 1976. Resulta dos elementos dos autos de que o Tribunal de Justiça dispõe que a execução da detenção na unidade de Langenhagen decorre efetivamente segundo o regime de execução das penas e que o pessoal encarregado do enquadramento e da vigilância dos nacionais de países terceiros que aguardam o afastamento é o pessoal da administração prisional responsável pelos presos comuns. Nas suas respostas às questões colocadas pelo Tribunal de Justiça, o Governo alemão indicou igualmente que, «[na] sequência do despacho proferido pelo Amtsgericht Hannover (Tribunal de Primeira Instância de Hanôver) em 30 de setembro de 2020» (74), os 15 presos alojados na unidade de Langenhagen tinham sido transferidos «para outros estabelecimentos prisionais do Land». Estes elementos demonstram que esta estrutura pode ser utilizada para efeitos da execução tanto das medidas de detenção como das penas privativas de liberdade tendo em conta o regime aplicável e as modalidades concretas de funcionamento.

127. Nestas condições, considero que a medida de colocação em detenção na unidade de Langenhagen do estabelecimento prisional da cidade de Hanôver constitui uma medida de colocação num estabelecimento prisional na aceção do artigo 16.o, n.o 1, segundo período, da Diretiva 2008/115.

128. À luz de todas estas considerações, proponho ao Tribunal de Justiça que declare que o artigo 16.o, n.o 1, primeiro período, da Diretiva 2008/115, deve ser interpretado no sentido de que constitui um centro de detenção especializado um estabelecimento destinado a preparar o afastamento dos nacionais de países terceiros, no qual a execução da detenção decorre segundo um regime privativo de liberdade e em condições materiais adaptadas ao estatuto jurídico e à vulnerabilidade desses nacionais.

129. Não está abrangida pelo conceito de «centro de detenção especializado» uma estrutura que pode ser utilizada para efeitos da execução tanto de medidas de detenção dos nacionais de países terceiros enquanto aguardam o afastamento como de penas privativas de liberdade, na qual a detenção decorre segundo a legislação sobre a execução das penas e sob a vigilância do pessoal de administração prisional dessa estrutura.

V.      Conclusão

130. Tendo em conta todas as considerações precedentes, proponho ao Tribunal de Justiça que responda às questões prejudiciais submetidas pelo Amtsgericht Hannover (Tribunal de Primeira Instância de Hanôver, Alemanha) do seguinte modo:

1)      O artigo 18.o, n.o 1, da Diretiva 2008/115/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de dezembro de 2008, relativa a normas e procedimentos comuns nos Estados‑Membros para o regresso de nacionais de países terceiros em situação irregular, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional que permite, por um período de três anos, a detenção de nacionais de países terceiros que aguardam o afastamento em estabelecimentos prisionais quando nem as razões em que assenta essa legislação, nem as condições da sua adoção, nem as modalidades da sua aplicação revelam uma situação de emergência na aceção deste artigo.

2)      O artigo 18.o da Diretiva 2008/115 deve ser interpretado no sentido de que a autoridade judiciária responsável pela detenção deve verificar, caso a caso, se as circunstâncias enunciadas no artigo 18.o, n.o 1, desta diretiva que justificaram a adoção de medidas excecionais ainda se verificam.

3)      O artigo 16.o, n.o 1, primeiro período, da Diretiva 2008/115 deve ser interpretado no sentido de que constitui um «centro de detenção especializado» um estabelecimento destinado a preparar o afastamento dos nacionais de países terceiros, no qual a execução da detenção decorre segundo um regime privativo de liberdade e em condições materiais adaptadas ao estatuto jurídico e à vulnerabilidade desses nacionais.

4)      Não está abrangida pelo conceito de «centro de detenção especializado» uma estrutura que pode ser utilizada para efeitos da execução tanto de medidas de detenção dos nacionais de países terceiros enquanto aguardam o afastamento como de penas privativas de liberdade e na qual a detenção decorre segundo a legislação sobre a execução das penas e sob a vigilância do pessoal de administração prisional dessa estrutura.


1      Língua original: francês.


2      Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de dezembro de 2008, relativa a normas e procedimentos comuns nos Estados‑Membros para o regresso de nacionais de países terceiros em situação irregular (JO 2008, L 348, p. 98).


3      C‑473/13 e C‑514/13, a seguir «Acórdão Bero e Bouzalmate», EU:C:2014:2095.


4      C‑474/13, a seguir «Acórdão Pham», EU:C:2014:2096.


5      C‑18/19, a seguir «Acórdão Stadt Frankfurt am Main», EU:C:2020:511.


6      Proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa a normas e procedimentos comuns nos Estados‑Membros para o regresso de nacionais de países terceiros em situação irregular [COM(2018) 634 final].


7      BGBl. 2004 I, p. 1950, a seguir «AufenthG».


8      BGBl. 2019 I, p. 1294.


9      V. Deutscher Bundestag, Drucksache 19/10047, disponível no endereço Internet seguinte: https://dserver.bundestag.de/btd/19/100/1910047.pdf (pp. 44 e 45).


10      Assinada em Roma, em 4 de novembro de 1950, a seguir «CEDH».


11      V., a este respeito, Acórdão de 6 de setembro de 2017, Eslováquia e Hungria/Conselho (C‑643/15 e C‑647/15, EU:C:2017:631), relativo à Decisão (UE) 2015/1601 do Conselho, de 22 de setembro de 2015, que estabelece medidas provisórias no domínio da proteção internacional a favor da Itália e da Grécia (JO 2015, L 248, p. 80).


12      O artigo 16.o, n.o 1, da Diretiva 2008/115 não está formulado de forma idêntica em todas as versões linguísticas, como salientou o Tribunal de Justiça no Acórdão Bero e Bouzalmate (n.os 26 e 27).


13      V. artigo 1.o, e considerandos 2 e 11 da Diretiva 2008/115, bem como Acórdão Stadt Frankfurt am Main (n.o 37 e jurisprudência referida).


14      V., a este respeito, Acórdão de 28 de abril de 2011, El Dridi (C‑61/11 PPU, EU:C:2011:268, n.os 39 e 41).


15      V., a este respeito, Acórdão de 28 de abril de 2011, El Dridi (C‑61/11 PPU, EU:C:2011:268, n.o 42).


16      No seu Acórdão de 19 de janeiro de 2012, Popov c. França, CE:ECHR:2012:0119JUD003947207, § 119, o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem recordou assim que «a detenção administrativa [é] uma medida de último recurso para a qual não [existe] nenhuma alternativa». V., igualmente, Resolução 1707 (2010), intitulada «Detenção administrativa dos requerentes de asilo e dos migrantes em situação irregular na Europa», adotada em 28 de janeiro de 2010, na qual a Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa recorda que «a detenção […] dos migrantes em situação irregular é uma medida excecional que só é aplicável quando se examinou todas as outras alternativas e nenhuma se revelou probatória» (n.o 9.1.1).


17      V. considerandos 13, 16, 17 e 24 da Diretiva 2008/115.


18      V. Acórdão Bero e Bouzalmate n.o 28.


19      V. Acórdão Bero e Bouzalmate n.o 31.


20      V. Acórdão Stadt Frankfurt am Main (n.o 31 e jurisprudência referida).


21      V. Acórdão Stadt Frankfurt am Main (n.o 39).


22      V. Acórdão Stadt Frankfurt am Main (n.o 46 e jurisprudência referida).


23      Acórdão Stadt Frankfurt am Main (n.o 42 e jurisprudência referida).


24      V. Acórdão Pham (n.o 22).


25      Acórdão Bero e Bouzalmate (n.o 31).


26      V. Acórdão Pham (n.o 17).


27      Acórdão Pham (n.o 19).


28      Recordo, no entanto, que, no Acórdão Pham, o Tribunal de Justiça, interpretando o artigo 16.o, n.o 1, segundo período, da Diretiva 2008/115, declarou que a obrigação de separar os nacionais de países terceiros em situação irregular dos presos comuns «não vem acompanhada de nenhuma exceção» e «constitui um requisito material [da colocação em detenção dos nacionais de países terceiros em estabelecimentos prisionais] sem o qual, em princípio, esta não é conforme com [esta] diretiva» (n.os 19 e 21).


29      V., a título de exemplo, Acórdão de 14 de janeiro de 2021, Staatssecretaris van Justitie en Veiligheid (Regresso de um menor não acompanhado) (C‑441/19, EU:C:2021:9, n.o 42), bem como «Returning unaccompanied children: fundamental rights considerations», Agência dos Direitos Fundamentais da União Europeia (FRA), setembro de 2019, p. 7.


30      O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem exige que exista um nexo entre o motivo invocado para a privação da liberdade autorizada e o local e o regime de detenção. V., nomeadamente, Acórdão do TEDH, de 13 de dezembro de 2011, Kanagaratnam e o. c. Bélgica, CE:ECHR:2011:1213JUD001529709, § 84.


31      A Comissão propõe interpretar esta margem de forma ainda mais estrita no âmbito da sua proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à resposta a situações de crise e de força maior no domínio da migração e do asilo [COM(2020) 613 final]. Segundo a Comissão, «[o] direito à liberdade e à liberdade de circulação está protegido, uma vez que, se for utilizada a detenção no contexto das regras derrogatórias relativas aos procedimentos de fronteira em matéria de asilo e de regresso, essas regras apenas podem ser aplicadas num quadro com regulamento rigoroso e por um tempo limitado» (n.o 3.3, p. 13). V., igualmente, Recomendação (UE) 2020/1366 da Comissão, de 23 de setembro de 2020, relativa ao mecanismo da UE de preparação para a migração e gestão de crises relacionadas com a migração (Mecanismo de preparação para a migração e gestão de crises migratórias) (JO 2020, L 317, p. 26).


32      V. Despacho do vice‑presidente do Tribunal de Justiça, de 14 de janeiro de 2016, AGC Glass Europe e o./Comissão (C‑517/15 P‑R, EU:C:2016:21, n.o 27 e jurisprudência referida).


33      V., para uma ilustração, Despacho de 12 de fevereiro de 2019, RH (C‑8/19 PPU, EU:C:2019:110, n.os 33 e 34).


34      Em conformidade com o artigo 78.o, n.o 3, TFUE, no caso de um ou mais Estados‑Membros serem confrontados com uma situação de emergência, caracterizada por um súbito fluxo de nacionais de países terceiros, o Conselho, sob proposta da Comissão, e após consulta ao Parlamento Europeu, pode adotar medidas provisórias a favor desse ou desses Estados‑Membros.


35      V., por exemplo, Decisão 2015/1601.


36      Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de março de 2016, que estabelece o código da União relativo ao regime de passagem de pessoas nas fronteiras (Código das Fronteiras Schengen) (JO 2016, L 77, p. 1).


37      V. processos apensos Landespolizeidirektion Steiermark (Duração máxima do controlo nas fronteiras internas) (C‑368/20) e Bezirkshauptmannschaft Leibnitz (Duração máxima do controlo nas fronteiras internas) (C‑369/20), atualmente pendentes no Tribunal de Justiça.


38      Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de março de 2006, que estabelece o código comunitário relativo ao regime de passagem de pessoas nas fronteiras (Código das Fronteiras Schengen) (JO 2006, L 105, p. 1).


39      V. artigo 15.o, n.o 1, da Diretiva 2008/115, bem como o Acórdão de 28 de abril de 2011, El Dridi  (C‑61/11 PPU, EU:C:2011:268, n.os 39 e 41).


40      Saliento, neste contexto, que no âmbito dos trabalhos preparatórios para a reformulação da Diretiva 2008/115, o Parlamento propõe limitar ainda mais esta margem de apreciação substituindo a expressão «enquanto persistir a situação excecional» por um período máximo específico de três meses: v. alterações à proposta de diretiva referida na nota de rodapé 6 das presentes conclusões, apresentadas pelo Parlamento, disponíveis no seguinte endereço de internet: https://www.europarl.europa.eu/doceo/document/LIBE‑AM‑658738_FR.pdf, sob o artigo 21.o, n.o 1 (p. 357).


41      V., nomeadamente, Acórdãos Stadt Frankfurt am Main (n.o 37 e jurisprudência referida); de 14 de janeiro de 2021, Staatssecretaris van Justitie en Veiligheid (Regresso de um menor não acompanhado) (C‑441/19, EU:C:2021:9, n.o 70 e jurisprudência referida), e de 24 de fevereiro de 2021, M e o. (Transferência para um Estado‑Membro) (C‑673/19, EU:C:2021:127, n.o 28).


42      No âmbito da agenda europeia em matéria de migração, o regresso efetivo dos nacionais de países terceiros em situação irregular constitui uma componente essencial, como testemunha a proposta de diretiva referida na nota de rodapé 6 das presentes conclusões (p. 1).


43      V. Acórdão de 17 de dezembro de 2020, Comissão/Hungria (Acolhimento dos requerentes de proteção internacional) (C‑808/18, EU:C:2020:1029, n.o 264 e jurisprudência referida).


44      V. Acórdãos de 14 de maio de 2020, Országos Idegenrendészeti Főigazgatóság Dél‑alföldi Regionális Igazgatóság (C‑924/19 PPU e C‑925/19 PPU, EU:C:2020:367, n.o 274 e jurisprudência referida), e Stadt Frankfurt am Main (n.o 38).


45      V., por analogia, Acórdão de 15 de fevereiro de 2016, N. (C‑601/15 PPU, EU:C:2016:84, n.o 54 e jurisprudência referida).


46      V., no contexto da detenção de um requerente de proteção internacional, Acórdão de 14 de maio de 2020, Országos Idegenrendészeti Főigazgatóság Dél‑alföldi Regionális Igazgatóság (C‑924/19 PPU e C‑925/19 PPU, EU:C:2020:367, n.o 258 e jurisprudência referida).


47      Decorre dos considerandos 13 e 16, bem como do artigo 15.o, n.o 1, da Diretiva 2008/115, que os Estados‑Membros devem proceder ao afastamento através de medidas o menos coercivas possível. No caso de várias medidas serem suscetíveis de permitir alcançar o objetivo visado, deve ser dada preferência à medida menos restritiva. V., a este respeito, Acórdão de 22 de junho de 2021, Ordre des barreaux francophones et germanophone e o. (Medidas preventivas com vista ao afastamento) (C‑718/19, EU:C:2021:505, n.o 58).


48      O artigo 7.o, n.o 3, desta diretiva prevê a possibilidade de os Estados‑Membros imporem obrigações ao nacional de um país terceiro para evitar o risco de fuga deste último durante o prazo de partida voluntária, sendo as obrigações expressamente enumeradas para esse efeito a apresentação periódica às autoridades, o depósito de uma caução adequada, a apresentação de documentos ou a obrigação de permanecer em determinado local.


49      O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem considera que estes últimos devem beneficiar de uma maior proteção quando se trata de apreciar a gravidade de uma medida restritiva da liberdade, ou mesmo da existência de tratamentos desumanos ou degradantes (v., em especial, Acórdão TEDH, de 28 de fevereiro de 2019, Khan c. França, CE:ECHR:2019:0228JUD001226716).


50      V., nomeadamente, Acórdãos TEDH, de 23 de julho de 2013, Suso Musa c. Malta, CE:ECHR:2013:0723JUD004233712; de 22 de novembro de 2016, Abdullahi Elmi e Aweys Abubakar c. Malta, CE:ECHR:2016:1122JUD002579413, e de 4 de abril de 2017, Thimothawes c. Bélgica, CE:ECHR:2017:0404JUD003906111.


51      V. Acórdãos TEDH de 5 de abril de 2011, Rahimi/Grécia, CE:ECHR:2011:0405JUD000868708, e de 13 de dezembro de 2011, Kanagaratnam e o. c. Bélgica, CE:ECHR:2011:1213JUD001529709, relativo à detenção dos requerentes (uma mãe e os seus três filhos) num edifício fechado concebido para adultos.


52      TEDH, 5 de abril de 2011, CE:ECHR:2011:0405JUD000868708.


53      § 108 do referido acórdão.


54      V. exposição de motivos do projeto da Segunda Lei Destinada a Melhorar o Cumprimento da Obrigação de Abandonar o Território.


55      Acórdão Stadt Frankfurt am Main (n.o 39).


56      JO 2013, L 295, p. 27.


57      V. Acórdão Stadt Frankfurt am Main (n.o 38 e jurisprudência).


58      Por força do princípio do primado do direito da União, se não lhe for possível proceder a uma interpretação da legislação nacional conforme com as exigências do direito da União, o juiz nacional, chamado a pronunciar‑se no âmbito da sua competência, tem, enquanto órgão de um Estado‑Membro, a obrigação de não aplicar as disposições nacionais contrárias a uma disposição de direito da União que produzam efeito direto no litígio sobre o qual é chamado a pronunciar‑se [Acórdão de 15 de abril de 2021, Braathens Regional Aviation (C‑30/19, EU:C:2021:269, n.o 58 e jurisprudência referida).


59      V., por analogia, Acórdão de 5 de junho de 2014, Mahdi (C‑146/14 PPU, EU:C:2014:1320, n.os 79 e segs.).


60      V. Acórdão de 14 de maio de 2020, Országos Idegenrendészeti Főigazgatóság Dél‑alföldi Regionális Igazgatóság (C‑924/19 PPU e C‑925/19 PPU, EU:C:2020:367, n.o 224).


61      Esta definição é relevante no contexto de uma detenção ordenada ao abrigo da Diretiva 2008/115, nos termos do artigo 8.o, n.o 3, alínea d) da Diretiva 2013/33.


62      Despacho de 3 de junho de 2021, Republika Slovenija (Detenção de um requerente de proteção internacional) (C‑186/21 PPU, EU:C:2021:447, n.o 26 e jurisprudência referida).


63      V. Acórdão de 14 de maio de 2020 Országos Idegenrendészeti Főigazgatóság Dél‑alföldi Regionális Igazgatóság (C‑924/19 PPU e C‑925/19 PPU, EU:C:2020:367, n.os 216‑223).


64      V. artigo 15.o da Diretiva 2008/115. V., igualmente, a este respeito, os desenvolvimentos que o advogado‑geral Y. Bot consagrou a esta questão nas suas Conclusões nos processos Bero e Bouzalmate  (C‑473/13, C‑474/13 e C‑514/13, EU:C:2014:295, n.o 91 e segs.). De acordo com o advogado‑geral Y. Bot, o legislador da União transpõe a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem segundo a qual uma privação de liberdade só pode ser conciliada com o artigo 5.o, n.o 1, alínea f), da CEDH se a mesma for efetuada para efeitos de execução de um processo de expulsão e se for proporcional a esse objetivo (v. TEDH, 15 de novembro de 1996, Chahal c. Reino Unido, CE:ECHR:1996:1115JUD002241493, § 112 e 113, e de 19 de janeiro de 2012, Popov/França, CE:ECHR:2012:0119JUD003947207, § 140) (nota de rodapé 33).


65      Os conceitos de «detenção» e de «centro de detenção especializado» são, com efeito, conceitos comuns a vários instrumentos do sistema europeu comum de asilo.


66      V. considerando 24 e artigo 1.o da Diretiva 2008/115. V., igualmente, Acórdão do TEDH, de 15 de dezembro de 2016, Khlaifia e o./Itália, CE:ECHR:2016:1215JUD001648312, § 161 e segs.


67      V., nomeadamente, Acórdãos do TEDH, de 19 de janeiro de 2012, Popov c. França, CE:ECHR:2012:0119JUD003947207, § 89 e segs., e de 15 de dezembro de 2016, Khlaifia e o. c. Itália, CE:ECHR:2016:1215JUD001648312, § 163 e segs.


68      V. Acórdão do TEDH, de 19 de janeiro de 2012, Popov c. França, CE:ECHR:2012:0119JUD003947207.


69      V., igualmente, relatório da Comissão das Migrações, dos Refugiados e dos Deslocados Internos, Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa, de 11 de janeiro de 2010, intitulado «A detenção administrativa dos requerentes de asilo e dos migrantes em situação irregular na Europa», em especial o princípio 8 do anexo 1 relativo aos «[d]ez princípios orientadores sobre as circunstâncias em que a detenção dos requerentes de asilo e dos migrantes em situação irregular é legalmente admissível», no qual a Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa refere que o local, as condições e o regime de detenção devem ser adequados; bem como documento temático do Comissário para os Direitos do Homem do Conselho da Europa, intitulado «Os direitos fundamentais dos migrantes em situação irregular na Europa» (título III, ii, pp. 16 e 17).


70      Na mesma ordem de ideias, a Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa, no ponto 9.2 da sua Resolução 1707 (2010) (v. nota de rodapé 15 das presentes conclusões), exige, entre as «15 regras europeias que definem as normas mínimas aplicáveis às condições de detenção dos migrantes e dos requerentes de asilo», que as pessoas detidas sejam alojadas em centros especialmente concebidos para a detenção relacionada com a imigração e não em prisões (regra 2). Impõe, igualmente, que os locais afetados para esse efeito ofereçam condições materiais e um regime de detenção adaptados à situação jurídica e factual dos interessados (regras 5 e 6).


71      V. Acórdão Pham (n.o 21).


72      V. Acórdão Pham (n.os 17 e 19).


73      BGBl. 1976 I, p. 581.


74      Os autos de que o Tribunal de Justiça dispõe não fazem nenhuma menção a este Despacho de 30 de setembro de 2020.