Language of document : ECLI:EU:T:2021:601

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Segunda Secção)

22 de setembro de 2021 (*)

«Marca da União Europeia — Processo de oposição — Pedido de marca figurativa da União Europeia chic ÁGUA ALCALINA 9,5 PH — Marca nominativa anterior da União Europeia CHIC BARCELONA — Motivo relativo de recusa — Inexistência de risco de confusão — Artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento (UE) 2017/1001»

No processo T‑195/20,

Sociedade da Água de Monchique, SA, com sede nas Caldas de Monchique (Portugal), representada por M. Osório de Castro, advogado,

recorrente,

contra

Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia (EUIPO), representado por A. Folliard‑Monguiral, I. Ribeiro da Cunha e J. Crespo Carrillo, na qualidade de agentes,

recorrido,

tendo sido a outra parte no processo na Câmara de Recurso do EUIPO:

Pere Ventura Vendrell, residente em Sant Sadurni d’Anoia (Espanha),

que tem por objeto um recurso da Decisão da Quarta Câmara de Recurso do EUIPO de 20 de janeiro de 2020 (processo R 2524/2018‑4), relativa a um processo de oposição entre P. Ventura Vendrell e a Sociedade da Água de Monchique,

O TRIBUNAL GERAL (Segunda Secção),

composto por: V. Tomljenović (relatora), presidente, F. Schalin e P. Škvařilová‑Pelzl, juízes,

secretário: A. Juhász‑Tóth, administradora,

vista a petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 6 de abril de 2020,

vista a resposta apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 25 de setembro de 2020,

após a audiência de 15 de março de 2021,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1        Em 25 de julho de 2017, a recorrente, a Sociedade da Água de Monchique, SA, apresentou um pedido de registo de marca da União Europeia ao Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia (EUIPO), nos termos do Regulamento (CE) n.° 207/2009 do Conselho, de 26 de fevereiro de 2009, sobre a marca da União Europeia (JO 2009, L 78, p. 1), conforme alterado [substituído pelo Regulamento (UE) 2017/1001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de junho de 2017, sobre a marca da União Europeia (JO 2017, L 154, p. 1)].

2        A marca cujo registo foi pedido é o seguinte sinal figurativo:

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3        Os produtos para os quais o registo foi pedido pertencem à classe 32 na aceção do Acordo de Nice relativo à Classificação Internacional dos Produtos e dos Serviços para o registo de marcas, de 15 de junho de 1957, conforme revisto e alterado, e correspondem à seguinte descrição: «Bebidas sem álcool; Água engarrafada; Água mineral (não medicinal); Águas minerais [bebidas]».

4        O pedido de marca foi publicado no Boletim de Marcas da União Europeia n.° 2017/199, de 19 de outubro de 2017.

5        Em 17 de janeiro de 2018, P. Ventura Vendrell deduziu oposição, ao abrigo do artigo 46.° do Regulamento 2017/1001, ao registo da marca pedida para os produtos acima referidos no n.° 3.

6        A oposição baseou‑se, nomeadamente, na marca nominativa anterior da União Europeia CHIC BARCELONA, registada em 1 de novembro de 2017 sob o número 16980195 para os produtos pertencentes à classe 33 e que correspondem à seguinte descrição: «Bebidas alcoólicas (excluindo cerveja); Vinho; Vinhos espumantes; Licores; Bebidas espirituosas; Aguardente».

7        O fundamento invocado em apoio da oposição foi o previsto no artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009 [atual artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento 2017/1001].

8        Por Decisão de 29 de outubro de 2018, a Divisão de Oposição deferiu a oposição na parte em que esta tinha por objeto as «Bebidas não alcoólicas» pertencentes à classe 32, visadas pela marca pedida. A este respeito, a Divisão de Oposição salientou nomeadamente que as «Bebidas não alcoólicas» pertencentes à classe 32, visadas pela marca pedida, eram semelhantes, em grau reduzido, às «Bebidas alcoólicas (excluindo cervejas)» pertencentes à classe 33, visadas pela marca anterior. Existia assim um risco de confusão relativamente a estes produtos.

9        Em contrapartida, a Divisão de Oposição indeferiu a oposição, por inexistência de risco de confusão, por a oposição ter sido deduzida contra os produtos «Água engarrafada; Água mineral (não medicinal); Águas minerais [bebidas]» pertencentes à classe 32, visados pela marca pedida. A este respeito, em substância, considerou nomeadamente que estes produtos eram diferentes dos produtos pertencentes à classe 33, visados pela marca anterior. São produtos com natureza, finalidade e método de uso distintos. Para além do mais, são produtos que se consomem em ocasiões diferentes, correspondem a segmentos de preços diferentes e não têm a mesma origem comercial.

10      Em 19 de dezembro de 2018, P. Ventura Vendrell interpôs recurso no EUIPO, ao abrigo dos artigos 66.° a 71.° do Regulamento 2017/1001, da decisão da Divisão de Oposição, em cujo âmbito pediu que esta decisão fosse anulada na parte em que a sua oposição fora rejeitada. Em apoio do seu recurso, P. Ventura Vendrell invocou nomeadamente a existência de uma semelhança entre os produtos «Água engarrafada; Água mineral (não medicinal); Águas minerais [bebidas]» pertencentes à classe 32, visados pela marca pedida, e os produtos pertencentes à classe 33, visados pela marca anterior. Em seu entender, havia assim que concluir também pela existência de um risco de confusão para os produtos relativamente aos quais a Divisão de Oposição tinha rejeitado a oposição.

11      Por Decisão de 20 de janeiro de 2020 (a seguir «decisão impugnada»), a Quarta Câmara de Recurso do EUIPO julgou o recurso totalmente procedente. Em substância, em primeiro lugar, considerou que existia um reduzido grau de semelhança entre os produtos «Água engarrafada; Água mineral (não medicinal); Águas minerais [bebidas]» pertencentes à classe 32, visados pela marca pedida, e as «Bebidas alcoólicas» pertencentes à classe 33, visadas pela marca anterior. Em segundo lugar, a Câmara de Recurso considerou que as marcas em conflito apresentavam um elevado grau de semelhanças visual, fonética e conceptual. Com base nestas duas constatações, a Câmara de Recurso concluiu pela existência de um risco de confusão na aceção do artigo 8.°, n.° 1, do Regulamento 2017/1001, o qual, em seu entender, era aplicável ao caso em apreço.

 Pedidos das partes

12      Na sequência de uma desistência parcial na audiência, a recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        anular a decisão impugnada;

–        condenar o EUIPO nas despesas.

13      O EUIPO conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        admitir o recurso por ser procedente;

–        condenar as partes a suportar as despesas na proporção dos respetivos decaimentos.

 Questão de direito

 Quanto ao primeiro pedido do EUIPO

14      O primeiro pedido do EUIPO («admitir o recurso por ser procedente») suscita as seguintes observações.

15      Segundo jurisprudência constante, o EUIPO não pode ser obrigado a defender sistematicamente todas as decisões impugnadas que tenham sido proferidas pelas Câmaras de Recurso ou a pedir obrigatoriamente que seja negado provimento a todos os recursos interpostos dessas decisões [v. Acórdão de 7 de maio de 2019, mobile.de/EUIPO (Representação de um automóvel num balão), T‑629/18, EU:T:2019:292, n.° 18 e jurisprudência referida]. É igualmente jurisprudência constante que nada se opõe a que o EUIPO adira a um dos pedidos da recorrente ou ainda que se limite a remeter para o prudente arbítrio do Tribunal, embora apresente todos os argumentos que considere adequados para esclarecer o Tribunal Geral. Em contrapartida, o EUIPO não pode formular pedidos que visem a anulação ou a reforma da decisão da Câmara de Recurso sobre uma questão que não tenha sido suscitada na petição nem apresentar fundamentos não aduzidos na petição [v. Acórdão de 29 de abril de 2020, Lidl Stiftung/EUIPO — Plásticos Hidrosolubles (green cycles), T‑78/19, não publicado, EU:T:2020:166, n.° 47 e jurisprudência referida].

16      No presente processo, o primeiro pedido do EUIPO é admissível uma vez que este e os argumentos apresentados em seu apoio não saem do âmbito dos pedidos e dos fundamentos apresentados pela recorrente.

17      Além disso, é certo que, como resulta de uma leitura conjugada dos argumentos invocados pela recorrente na sua petição e das respostas do EUIPO a este respeito, as partes estão de acordo quanto a certos pontos relativos ao mérito do processo (v. n.os 37 e 38, infra). Além disso, os referidos pontos comuns das partes são suscetíveis de conduzir à anulação da decisão impugnada (v. n.° 79, infra). Não obstante estes elementos, o recurso não ficou contudo desprovido de objeto. Com efeito, a decisão impugnada não foi, no estado em que os autos atualmente se encontram, nem alterada nem retirada pela Câmara de Recurso. O EUIPO não tem poder para o fazer nem tem poder para dar instruções nesse sentido às Câmaras de Recurso, cuja independência está consagrada no artigo 166.°, n.° 7, do Regulamento 2017/1001. Por conseguinte, o Tribunal Geral não está dispensado de examinar a legalidade da decisão impugnada à luz dos fundamentos aduzidos na petição inicial e continua a ser necessário decidir quanto ao mérito.

 Quanto ao mérito

18      A título preliminar, importa sublinhar que, atendendo à data da apresentação do pedido de registo em causa, a saber, 25 de julho de 2017, que é determinante para efeitos da identificação do direito substantivo aplicável, os factos do presente litígio regem‑se pelas disposições substantivas do Regulamento n.° 207/2009 (v., neste sentido, Acórdãos de 8 de maio de 2014, Bimbo/IHMI, C‑591/12 P, EU:C:2014:305, n.° 12, e de 18 de junho de 2020, Primart/EUIPO, C‑702/18 P, EU:C:2020:489, n.° 2 e jurisprudência referida).

19      Na medida em que as disposições substantivas pertinentes aplicáveis ao presente caso são idênticas na sua versão resultante, respetivamente, do Regulamento n.° 207/2009 e do Regulamento 2017/1001, o facto de as partes se terem referido às disposições deste último regulamento é irrelevante para efeitos do presente processo e há que interpretar os seus argumentos no sentido de que se baseiam nas disposições pertinentes do Regulamento n.° 207/2009 [Acórdão de 5 de outubro de 2020, nanoPET Pharma/EUIPO — Miltenyi Biotec (viscover), T‑264/19, não publicado, EU:T:2020:470, n.° 23].

20      Em apoio do seu recurso, a recorrente invoca um fundamento único, relativo à violação do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009.

21      Nos termos do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009, após oposição do titular de uma marca anterior, o pedido de registo de marca será recusado quando, devido à sua identidade ou semelhança com uma marca anterior e devido à identidade ou semelhança dos produtos ou serviços designados pelas duas marcas, exista risco de confusão no espírito do público do território onde a marca anterior está protegida. O risco de confusão compreende o risco de associação com a marca anterior.

22      Segundo jurisprudência constante, constitui risco de confusão o risco de que o público possa crer que os produtos ou os serviços em causa provêm da mesma empresa ou de empresas ligadas economicamente. Segundo esta mesma jurisprudência, o risco de confusão deve ser apreciado globalmente, segundo a perceção que o público pertinente tem dos sinais e dos produtos ou dos serviços em causa, e tendo em conta todos os fatores pertinentes do caso em apreço, nomeadamente a interdependência entre a semelhança dos sinais e a semelhança dos produtos ou dos serviços designados [v. Acórdão de 9 de julho de 2003, Laboratorios RTB/IHMI — Giorgio Beverly Hills (GIORGIO BEVERLY HILLS), T‑162/01, EU:T:2003:199, n.os 30 a 33 e jurisprudência referida].

23      Quando a proteção da marca anterior se alarga a toda a União Europeia, é necessário ter em conta a perceção das marcas em conflito pelo consumidor dos produtos ou dos serviços em causa neste território. Todavia, há que recordar que, para recusar o registo de uma marca da União Europeia, basta que um motivo relativo de recusa na aceção do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009 exista numa parte da União [v., neste sentido, Acórdão de 14 de dezembro de 2006, Mast‑Jägermeister/IHMI — Licorera Zacapaneca (VENADO com quadro), T‑81/03, T‑82/03 e T‑103/03, EU:T:2006:397, n.° 76 e jurisprudência referida].

24      Para efeitos da aplicação do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009, o risco de confusão pressupõe simultaneamente uma identidade ou semelhança entre as marcas em litígio e uma identidade ou semelhança entre os produtos ou os serviços que designam. Trata‑se de condições cumulativas [v. Acórdão de 22 de janeiro de 2009, Commercy/IHMI — easyGroup IP Licensing (easyHotel), T‑316/07, EU:T:2009:14, n.° 42 e jurisprudência referida].

 Quanto aos produtos objeto do recurso

25      Em primeiro lugar, importa sublinhar que as «bebidas não alcoólicas» pertencentes à classe 32, visadas pela marca pedida (v. n.° 3, supra), não são objeto do recurso. Estes produtos também não foram objeto do recurso no âmbito do processo na Câmara de Recurso. É o que sucede neste caso dado que, primeiro, em relação a estes produtos, a Divisão de Oposição julgou procedente a oposição deduzida por P. Ventura Vendrell, pelo que, em conformidade com o artigo 67.° do Regulamento 2017/1001, aplicável à data da apresentação do seu recurso na Câmara de Recurso, a saber, 19 de dezembro de 2018 (v. n.° 10, supra), este recurso não visava esses produtos. De acordo com o artigo 67.° do Regulamento 2017/1001, em substância, só se pode interpor recurso na Câmara de Recurso de uma decisão tomada pela instância inferior na medida em que esta tenha indeferido uma pretensão ou um pedido. Segundo, a recorrente, por seu turno, não interpôs um recurso — principal ou subordinado — na Câmara de Recurso suscetível de alargar o alcance do recurso para além de todos os produtos que já eram objeto do processo na Câmara de Recurso pelo facto de P. Ventura Vendrell ter interposto o seu recurso. Por outro lado, há que constatar que a decisão da Divisão de Oposição se tornou definitiva na medida em que esta decisão visava as «bebidas não alcoólicas» pertencentes à classe 32, visadas pela marca pedida (v. n.° 3, supra).

26      Em segundo lugar, deve considerar‑se que, quando a Câmara de Recurso se referiu aos produtos pertencentes à classe 33 que deviam ser comparados com os produtos pertencentes à classe 32, visou todas as bebidas acima mencionadas no n.° 6 e não unicamente as «bebidas alcoólicas (excluindo cerveja)».

27      Com efeito, como resulta do dossiê do EUIPO, no seu recurso de 19 de dezembro de 2018, a outra parte no processo na Câmara de Recurso do EUIPO não só mencionou «bebidas alcoólicas (excluindo cerveja)», como insistiu no resultado a conferir à comparação dos produtos visados pela marca pedida, nomeadamente com os vinhos. Este facto foi relatado pela Câmara de Recurso no n.° 7 da decisão impugnada. Além disso, no n.° 23 da decisão impugnada, a Câmara de Recurso indicou que, em seu entender, «com a expressão “bebidas alcoólicas (excluindo cerveja)”, a marca anterior protege não apenas produtos com um elevado teor alcoólico, mas também produtos com baixo teor alcoólico, como a sangria, a sidra ou as misturas e as combinações de bebidas alcoólicas e não alcoólicas, como o vermute com soda, o whisky‑cola ou o licor de anis com água».

28      Ora, os produtos denominados «bebidas espirituosas; aguardente», visados pela marca anterior, são produtos de teor alcoólico elevado, ao passo que os produtos denominados «vinho; vinhos espumantes; licores» são produtos com baixo teor alcoólico. A decisão impugnada tinha assim como lógica subjacente considerar que as «bebidas alcoólicas (excluindo cerveja)» pertencem à categoria mais ampla de um conjunto de produtos entre os quais devem ser incluídos, igual e necessariamente, os produtos denominados «vinho; vinhos espumantes; licores; bebidas espirituosas; aguardentes».

29      É, aliás, assim que a recorrente o entende, como resulta dos n.os 23 e 25 da petição.

30      Importa igualmente acrescentar que foi declarado que resulta do texto claro e não ambíguo da classe 33 que esta compreende todas as bebidas alcoólicas e que as cervejas são a única exceção [Acórdão de 18 de junho de 2008, Coca‑Cola/IHMI — San Polo (MEZZOPANE), T‑175/06, EU:T:2008:212, n.° 74].

31      Por conseguinte, por razões de clarificação, há que considerar que os produtos objeto do recurso no presente processo são, por um lado, as bebidas denominadas «Água engarrafada; Água mineral (não medicinal); Águas minerais [bebidas]» pertencentes à classe 32, visadas pela marca pedida, e, por outro, todos os produtos pertencentes à classe 33 visados pela marca anterior, como acima mencionados no n.° 6 (a seguir, considerados em conjunto, «produtos em causa»).

 Quanto ao público pertinente e ao seu nível de atenção

32      Segundo a jurisprudência, no âmbito da apreciação global do risco de confusão, deve ter‑se em conta o consumidor médio da categoria de produtos em causa, normalmente informado e razoavelmente atento e avisado. Deve igualmente tomar‑se em consideração o facto de o nível de atenção do consumidor médio ser suscetível de variar em função da categoria de produtos ou de serviços em causa [v. Acórdão de 13 de fevereiro de 2007, Mundipharma/IHMI — Altana Pharma (RESPICUR), T‑256/04, EU:T:2007:46, n.° 42 e jurisprudência referida].

33      No n.° 17 da decisão impugnada, a Câmara de Recurso indicou que os produtos pertencentes à classe 33, visados pela marca anterior, se dirigiam ao público em geral. Este público está normalmente informado e é razoavelmente atento e avisado. Resulta do n.° 18 da decisão impugnada que, segundo a Câmara de Recurso, os produtos pertencentes à classe 32, visados pela marca pedida, se dirigem igualmente ao público em geral. Relativamente a estes produtos, o público em geral dá provas de um nível de atenção, quando muito, médio e habitualmente baixo no momento do seu consumo e da sua aquisição. Por último, resulta implicitamente dos n.os 31 e 43 da decisão impugnada que o público pertinente é o público hispanófono e que o território pertinente é o território da União.

34      Importa confirmar estas apreciações da Câmara de Recurso, que, de resto, não são contestadas pela recorrente.

 Quanto à comparação dos produtos

35      No n.° 29 da decisão impugnada, a Câmara de Recurso considerou que os «produtos contestados objeto do recurso» interposto perante si, a saber, «Água engarrafada; Água mineral (não medicinal); Águas minerais [bebidas]» pertencentes à classe 32, visadas pela marca pedida, apresentavam um reduzido grau de semelhança com as «bebidas alcoólicas (excluindo cerveja)» designadas pela marca anterior e pertencentes à classe 33, sendo recordado que esta categoria de produtos inclui nomeadamente os produtos denominados «vinho; vinhos espumantes; licores; bebidas espirituosas; aguardente», conforme visados por esta mesma marca (v. n.os 26 a 31, supra).

36      Para chegar à conclusão expressa no n.° 29 da decisão impugnada, a Câmara de Recurso afirmou, antes de mais, que as bebidas denominadas «Água engarrafada; Água mineral (não medicinal); Águas minerais [bebidas]» e alguns dos produtos em que se baseou a oposição, a saber, as «bebidas alcoólicas (excluindo cerveja)», eram líquidos destinados ao consumo humano. Assim, todos eles têm uma natureza idêntica (v. n.o 22 da decisão impugnada). Em seguida, no entendimento da Câmara de Recurso, alguns dos produtos visados pela expressão «bebidas alcoólicas (excluindo cerveja)» são assim parcialmente produtos que servem nomeadamente para saciar a sede e que são, portanto, em certa medida, concorrentes (v. n.o 23 da decisão impugnada). Além disso, segundo a Câmara de Recurso, a circunstância de os produtos em causa serem alcoólicos ou não alcoólicos, ainda que pertinente, não podia ser considerada decisiva para determinar se, no espírito do público pertinente, os produtos em causa podem ter uma origem comercial idêntica ou conexa (v. n.o 25 da decisão impugnada). É certo que as bebidas alcoólicas visadas pela marca anterior são geralmente consumidas em ocasiões especiais e reuniões sociais ou familiares, ao passo que a água mineral e engarrafada é, para um grande número de pessoas, um produto de consumo corrente. Todavia, esta circunstância não significa que não existe nenhum «tipo de semelhança» entre os produtos em causa (v. n.o 26 da decisão impugnada). Por último, segundo a Câmara de Recurso, ainda que o consumidor médio seja sensível à distinção entre a água e as bebidas alcoólicas (incluindo as bebidas com baixo teor alcoólico), o Tribunal Geral já declarou que estas diferenças eram insuficientes para excluir a existência de um reduzido grau de semelhança entre as bebidas alcoólicas e as águas minerais e engarrafadas. A este respeito, a Câmara de Recurso remeteu para o n.° 46 do Acórdão de 9 de março de 2005, Osotspa/IHMI — Distribution & Marketing (Hai) (T‑33/03, EU:T:2005:89), e para os n.os 31 e 32 do Acórdão de 5 de outubro de 2011, Cooperativa Vitivinícola Arousana/IHMI — Sotelo Ares (ROSALIA DE CASTRO) (T‑421/10, não publicado, EU:T:2011:565) (v. n.° 27 da decisão impugnada).

37      A recorrente considera que estas considerações da Câmara de Recurso contêm erros. Observa, por um lado, que a natureza dos produtos visados pela marca pedida e, por outro, das bebidas alcoólicas visadas pela marca anterior difere relativamente à presença ou ausência de álcool na sua composição, e no que respeita aos seus ingredientes de base, modo de produção, cor, odor e sabor. Ao contrário do que defende a Câmara de Recurso, estas questões prevalecem, segundo a recorrente, para o consumidor pertinente, sobre o eventual destino e método de utilização comuns. No que respeita ao destino e à utilização das águas e das bebidas não alcoólicas, sempre segundo a recorrente, o consumo de bebidas alcoólicas, mesmo que de baixo teor alcoólico, não exclui o consumo de bebidas não alcoólicas (águas) e vice‑versa, mas o consumo de uma dessas bebidas não implica necessariamente o consumo da outra. Além disso, as bebidas alcoólicas — mesmo as de baixo teor alcoólico — destinam‑se geralmente a ser degustadas e não a matar a sede e muito menos a zelar pela saúde humana, ao passo que as bebidas não alcoólicas visadas pela marca pedida se destinam geralmente, ou mesmo exclusivamente, no caso das águas minerais e gasosas, a matar a sede e a zelar pela saúde humana. Com efeito, o consumidor consome cada vez mais água não só porque tem sede mas também por uma questão de «mente sã em corpo são». Por último, na opinião da recorrente, os produtos em causa não têm caráter complementar nem caráter concorrente.

38      O EUIPO, por seu turno, partilha do ponto de vista da recorrente e considera que os produtos em causa são diferentes. A este respeito, o EUIPO concede que, nos n.os 31 e 32 do seu Acórdão de 5 de outubro de 2011, ROSALIA DE CASTRO (T‑421/10, não publicado, EU:T:2011:565), o Tribunal Geral entendeu que existia um reduzido grau de semelhança entre as bebidas alcoólicas e as águas minerais e engarrafadas. Todavia, nos n.os 77 a 85 do Acórdão de 4 de outubro de 2018, Asolo/EUIPO — Red Bull (FLÜGEL) (T‑150/17, EU:T:2018:641), o Tribunal Geral afastou‑se desta apreciação. Na mesma linha, na sua Decisão R 1720/2017 G, de 21 de janeiro de 2019, a Câmara de Recurso alargada do EUIPO decidiu que os produtos «águas minerais e gasosas; bebidas não alcoólicas; bebidas à base de frutas e sumos de frutas», pertencentes à classe 32, não são semelhantes à «vodka», pertencente à classe 33.

39      A título preliminar, há que recordar que, segundo a jurisprudência, para apreciar a semelhança entre os produtos e os serviços em causa, há que tomar em conta todos os fatores pertinentes que caracterizam a relação entre eles, em especial, a sua natureza, o seu destino, a sua utilização, bem como o seu caráter concorrente ou complementar. Também podem ser levados em conta outros fatores, como os canais de distribuição dos produtos em causa [v., neste sentido, Acórdão de 11 de julho de 2007, El Corte Inglés/IHMI — Bolaños Sabri (PiraÑAM diseño original Juan Bolaños), T‑443/05, EU:T:2007:219, n.° 37 e jurisprudência referida].

40      Em primeiro lugar, à semelhança do que a recorrente alega, há que constatar que, devido à inexistência de álcool na sua composição, a natureza dos produtos denominados «Água engarrafada; Água mineral (não medicinal); Águas minerais [bebidas]», visados pela marca pedida, é diferente da natureza de todos os produtos abrangidos pela marca anterior.

41      Já foi declarado que a presença ou a ausência de álcool numa bebida é entendida como uma diferença importante, no que respeita à natureza das bebidas em causa, pelo conjunto do público em geral da União. O público em geral da União é atento e consegue distinguir as bebidas alcoólicas das bebidas não alcoólicas mesmo quando escolhe uma bebida em função do seu estado de espírito nesse momento [Acórdão de 12 de dezembro de 2019, Super bock group/EUIPO — Agus (Crystal), T‑648/18, não publicado, EU:T:2019:857, n.° 32].

42      Já foi igualmente declarado que a distinção entre bebidas alcoólicas e bebidas não alcoólicas é necessária, na medida em que determinados consumidores não desejam, ou inclusivamente não podem, consumir álcool [v., neste sentido, Acórdãos de 15 de fevereiro de 2005, Lidl Stiftung/IHMI — REWE‑Zentral (LINDENHOF), T‑296/02, EU:T:2005:49, n.° 54; de 18 de junho de 2008, MEZZOPANE, T‑175/06, EU:T:2008:212, n.os 79 a 81; e de 4 de outubro de 2018, FLÜGEL, T‑150/17, EU:T:2018:641, n.° 82]. É certo que estas últimas apreciações foram feitas em relação aos consumidores alemães e austríacos (Acórdãos de 15 de fevereiro de 2005, LINDENHOF, T‑296/02, EU:T:2005:49, n.° 45; de 18 de junho de 2008, MEZZOPANE, T‑175/06, EU:T:2008:212, n.° 21; e de 4 de outubro de 2018, FLÜGEL, T‑150/17, EU:T:2018:641, n.° 69). Todavia, há que constatar que nenhum elemento permite concluir que esta apreciação não é igualmente válida para o consumidor médio hispanófono igualmente habituado e atento à distinção entre as bebidas alcoólicas visadas pela marca anterior e «Água engarrafada; Água mineral (não medicinal); Águas minerais [bebidas]» visadas pela marca pedida. Assim, por um lado, para a grande maioria dos consumidores — hispanófonos ou da União em geral —, o consumo de álcool pode, consoante a quantidade consumida, conduzir a um estado de ebriedade que se pode manifestar através de uma redução de determinados reflexos ou de um reduzido estado de vigilância. Esse consumo pode conduzir a uma alteração das capacidades motoras (perturbações do equilíbrio, da elocução), bem como a uma diminuição do campo de visão e a uma dificuldade em avaliar as distâncias, o que pode revelar‑se importante na vida corrente nomeadamente quando os consumidores pretendem exercer uma atividade específica que exige um determinado nível de atenção, como a condução de um veículo. Ora, estes efeitos do consumo de álcool não são idênticos aos que resultam do consumo das águas engarrafadas ou das águas minerais. Por outro lado, para uma parte não negligenciável do público hispanófono — ou da União em geral —, o consumo de álcool pode dar origem a um verdadeiro problema de saúde.

43      Em segundo lugar, como alega também, com razão, a recorrente, a finalidade e a utilização dos produtos em causa são diferentes. Antes de mais, as bebidas alcoólicas, mesmo as de baixo teor alcoólico, destinam‑se geralmente a ser degustadas e não a matar a sede. Em seguida, o consumo de bebidas alcoólicas como as visadas pela marca anterior não corresponde a uma necessidade vital e pode mesmo ser prejudicial à saúde. Além disso, como salientou corretamente a recorrente, as bebidas alcoólicas visadas pela marca anterior, mesmo aquelas de baixo teor alcoólico, são, em geral, menos leves e sensivelmente mais caras do que as bebidas denominadas «Água engarrafada; Água mineral (não medicinal); Águas minerais [bebidas]». Por último, muitas das bebidas visadas pela marca anterior destinam‑se a ser consumidas em ocasiões especiais e não diariamente.

44      Em contrapartida, as bebidas denominadas «Água engarrafada; Água mineral (não medicinal); Águas minerais [bebidas]», visadas pela marca pedida, destinam‑se nomeadamente a saciar a sede (v., para os vinhos espumantes, por um lado, e para as águas minerais e gaseificadas e para as outras bebidas não alcoólicas, por outro, Acórdão de 15 de fevereiro de 2005, LINDENHOF, T‑296/02, EU:T:2005:49, n.° 55). Ora, o consumo de água corresponde a uma necessidade vital e a sua ingestão várias vezes por dia torna‑a num bem de primeira necessidade (v., também, n.° 27 da decisão impugnada). As águas minerais são apenas uma subcategoria da categoria das águas. São artigos de consumo corrente.

45      Em terceiro lugar, os produtos em causa não se encontram numa relação de complementaridade.

46      A este respeito, cumpre recordar que os produtos ou os serviços complementares são aqueles entre os quais existe uma relação estreita, no sentido de que um é indispensável ou importante para a utilização do outro, de modo que os consumidores podem pensar que a responsabilidade pelo fabrico desses produtos ou pelo fornecimento desses serviços incumbe à mesma empresa [Acórdãos de 1 de março de 2005, Sergio Rossi/IHMI — Sissi Rossi (SISSI ROSSI), T‑169/03, EU:T:2005:72, n.° 60, e de 11 de julho de 2007, PiraÑAM diseño original Juan Bolaños, T‑443/05, EU:T:2007:219, n.° 48; v., também, Acórdão de 22 de janeiro de 2009, easyHotel, T‑316/07, EU:T:2009:14, n.° 57 e jurisprudência referida].

47      Ora, os produtos em causa não apresentam uma relação estreita no sentido de que a compra de um é indispensável ou importante para a utilização do outro. Com efeito, não se pode considerar que o comprador de um dos produtos pertencentes à classe 32 e denominados «Água engarrafada; Água mineral (não medicinal); Águas minerais [bebidas]», conforme visados pela marca pedida, será obrigado a comprar um produto pertencente à classe 33 visado pela marca anterior, e vice‑versa (v., para os vinhos, por um lado, e para as águas minerais e gaseificadas e para outras bebidas não alcoólicas, por outro, Acórdão de 18 de junho de 2008, MEZZOPANE, T‑175/06, EU:T:2008:212, n.° 84).

48      É certo que resulta do n.° 28 da decisão impugnada que as «bebidas com maior teor alcoólico» podem ser «combinadas com água […], para saciar a sede ou para se hidratar». Todavia, segundo a Câmara de Recurso, «[o] facto de a água ser um produto obtido diretamente a partir da natureza e de as bebidas alcoólicas sofrerem uma transformação para efeitos da sua elaboração também não significa que o público não possa considerar que a sua origem comercial é a mesma ou que existe uma ligação económica entre si». Ao argumentar desta forma e tendo em conta os elementos expostos no n.° 19 da decisão impugnada, ou seja, o facto de a Câmara de Recurso pretender aplicar nomeadamente o critério da «complementaridade», como desenvolvido na jurisprudência, há que considerar que, no n.° 28 da decisão impugnada, a Câmara de Recurso procurou demonstrar que, devido à possibilidade de misturar as bebidas alcoólicas, com exceção das cervejas designadas pela marca anterior, por um lado, e as águas minerais visadas pela marca pedida, por outro, existia uma relação de complementaridade entre estes produtos, pelo que apresentavam um «reduzido grau de semelhança» (v. n.° 29 da decisão impugnada).

49      Todavia, este raciocínio não pode ser acolhido no caso em apreço.

50      Com efeito, em primeiro lugar, considerar que o conceito de complementaridade diz respeito à mera possibilidade de misturar bebidas alcoólicas com águas minerais é dificilmente conciliável com o conceito de complementaridade conforme este conceito resulta da jurisprudência acima referida no n.° 46.

51      O conceito de complementaridade não visa a mera possibilidade de misturar produtos, antes dizendo respeito à existência da «relação estreita» acima definida no n.° 46. Esta «relação estreita» deve ser entendida no sentido de que um dos produtos é indispensável ou importante para a utilização do outro (Acórdão de 1 de março de 2005, SISSI ROSSI, T‑169/03, EU:T:2005:72, n.° 60).

52      Ora, não se pode considerar que a compra ou o consumo dos produtos pertencentes à classe 32, visados pela marca pedida, é indispensável para a compra ou para o consumo das bebidas alcoólicas pertencentes à classe 33, visadas pela marca anterior, e vice‑versa. Do mesmo modo, não se pode constatar que o consumo dos referidos produtos pertencentes à classe 32 é importante para o consumo das bebidas alcoólicas pertencentes à classe 33, visadas pela marca anterior.

53      Em segundo lugar e seja como for, é, sem dúvida, certo que as bebidas pertencentes à classe 32 designadas «Água engarrafada; Água mineral (não medicinal); Águas minerais [bebidas]», como as visadas pela marca pedida, podem muitas vezes ser misturadas com um grande número de bebidas pertencentes à classe 33, visadas pela marca anterior. De facto, de um modo geral, muitas bebidas alcoólicas e não alcoólicas podem ser misturadas, consumidas ou, inclusivamente, comercializadas juntas, nos mesmos estabelecimentos ou como bebidas alcoólicas pré‑misturadas.

54      No entanto, tal possibilidade não elimina a diferença que se fica a dever à presença ou à ausência de álcool nos produtos em causa. Além disso, se se considerasse que tais categorias de produtos devem ser qualificadas de semelhantes, pelo simples facto de os produtos poderem ser misturados e consumidos em bebidas mistas, apesar de não se destinarem a ser consumidos nem nas mesmas circunstâncias, nem no mesmo estado de espírito, nem, se for o caso, pelas mesmas categorias de consumidores, isso faria com que um número significativo de produtos passasse a ser suscetível de ser qualificado de «bebida» numa só e única categoria para efeitos da aplicação do artigo 8.°, n.° 1, do Regulamento n.° 207/2009 (Acórdãos de 15 de fevereiro de 2005, LINDENHOF, T‑296/02, EU:T:2005:49, n.° 57, e de 4 de outubro de 2018, FLÜGEL, T‑150/17, EU:T:2018:641, n.° 80).

55      Por último, na medida em que, no n.° 23 da decisão impugnada, a Câmara de Recurso recordou a existência do licor de anis, sem contudo tirar conclusões precisas a este respeito, há que salientar os seguintes elementos. É certo que o licor de anis só é consumido depois de ter necessariamente sido misturado com água. Todavia, esta bebida não se mistura, em regra, com água mineral (gaseificada), mas com água da torneira. Ora, a recorrente não indicou que queria registar a marca pedida para água da torneira. É o que sucede, aliás, com o raki e com o absinto, na medida em que estas bebidas se bebem, em princípio, depois de terem sido misturadas com água da torneira. Não se pode assim considerar que o licor de anis e as águas visadas pela marca pedida são complementares.

56      Em quarto lugar, no que respeita à natureza concorrente dos produtos em causa, cumpre recordar que, segundo a jurisprudência, para poderem ser considerados produtos concorrentes, estes devem ter uma relação de substituibilidade entre si [v. Acórdão de 17 de fevereiro de 2017, Hernández Zamora/EUIPO — Rosen Tantau (Paloma), T‑369/15, não publicado, EU:T:2017:106, n.° 26 e jurisprudência referida].

57      Ora, em primeiro lugar, devido à diferença resultante da presença ou da ausência de álcool, que é evitado por um grande número de consumidores por razões de saúde e de que resulta igualmente uma diferença a nível do sabor, não se pode concluir que o consumidor médio hispanófono considerará que os produtos em causa são permutáveis. De facto, a diferença devida à presença ou à ausência de álcool e a diferença de sabor têm como consequência que, em regra, o consumidor médio hispanófono que procura comprar água mineral não equiparará esse produto às bebidas pertencentes à classe 33 em causa. Procurará comprar água mineral ou uma destas bebidas alcoólicas (v., por analogia, Acórdão de 18 de junho de 2008, MEZZOPANE, T‑175/06, EU:T:2008:212, n.° 85).

58      Esta última apreciação é confirmada pela jurisprudência resultante do Acórdão de 15 de fevereiro de 2005, LINDENHOF (T‑296/02, EU:T:2005:49), no qual foi declarado que não se podia considerar que existia uma relação de concorrência entre os vinhos espumantes e as bebidas não alcoólicas, dado que os vinhos espumantes constituíam apenas uma bebida atípica de substituição das bebidas pertencentes à classe 32 denominadas «cervejas, bebidas mistas contendo cerveja, águas minerais e gasosas e outras bebidas não alcoólicas; bebidas de fruta e sumos de fruta, sumos de legumes; xaropes e outras preparações para fazer bebidas; bebidas à base de soro de leite [...]» (Acórdão de 15 de fevereiro de 2005, LINDENHOF, T‑296/02, EU:T:2005:49, n.os 2 e 56).

59      Por último, essa mesma jurisprudência considerou igualmente que o consumidor médio alemão considera normal e, assim, espera que, por um lado, os vinhos espumantes e, por outro, as bebidas denominadas «águas minerais e gasosas e outras bebidas não alcoólicas; bebidas de fruta e sumos de fruta» provenham de diferentes empresas (Acórdão de 15 de fevereiro de 2005, LINDENHOF, T‑296/02, EU:T:2005:49, n.° 51). O Tribunal Geral acrescentou que não se podia considerar que os vinhos espumantes e as referidas bebidas pertencem a uma mesma família de bebidas, ou mesmo que sejam considerados elementos de uma gama geral de bebidas, suscetíveis de ter uma origem comercial comum (Acórdão de 15 de fevereiro de 2005, LINDENHOF, T‑296/02, EU:T:2005:49, n.° 51).

60      Ora, esta última apreciação é transponível para o presente processo. Com efeito, o consumidor médio hispanófono — e, aliás, qualquer consumidor médio da União —, na presença, por um lado, de água mineral, gasosa ou não, e, por outro, de bebidas alcoólicas visadas pela marca anterior, não estará à espera que essas bebidas tenham a mesma origem comercial.

61      Em segundo lugar, impõe‑se observar que o preço pode ter um impacto determinante na questão da substituibilidade dos produtos.

62      Assim, foi declarado que, atendendo às grandes diferenças de qualidade e, por conseguinte, de preços existentes entre os vinhos, a relação de concorrência determinante entre a cerveja, bebida popular e largamente consumida, e o vinho deve ser estabelecida com os vinhos mais acessíveis ao grande público, que são, em geral, os mais leves e os menos caros (Acórdãos de 12 de julho de 1983, Comissão/Reino Unido, 170/78, EU:C:1983:202, n.° 8; de 9 de julho de 1987, Comissão/Bélgica, 356/85, EU:C:1987:353, n.° 10; e de 17 de junho de 1999, Socridis, C‑166/98, EU:C:1999:316, n.° 18).

63      Ora, isto é igualmente válido no que se refere aos produtos em causa. Com efeito, as bebidas pertencentes à classe 32 e denominadas «Água engarrafada; Água mineral (não medicinal); Águas minerais [bebidas]», visadas pela marca pedida, são, em geral, nitidamente menos caras do que os produtos pertencentes à classe 33 designados «bebidas alcoólicas (excluindo cerveja); vinho; vinhos espumantes; licores; bebidas espirituosas; aguardente», visados pela marca anterior. Embora o raciocínio do Tribunal de Justiça acima exposto no n.° 62 se aplique, há que concluir que, do ponto de vista do preço, os produtos em causa não são substituíveis.

64      Há que concluir que os produtos em causa não têm caráter concorrente.

65      Em quinto lugar, no que se refere aos canais de distribuição dos produtos em causa, há que salientar que o facto, mencionado pela Câmara de Recurso no n.° 24 da decisão impugnada, de esses produtos poderem ser vendidos «nos mesmos estabelecimentos» não permite fundamentar a sua conclusão de que existe uma reduzida semelhança entre os referidos produtos.

66      O Tribunal Geral já foi levado a pronunciar‑se sobre os canais de distribuição dos produtos incluídos nas classes 32 e 33 enquanto fator a tomar em conta quando da apreciação do grau de semelhança destes produtos.

67      Assim, foi constatado que os produtos pertencentes às classes 32 e 33 são normalmente objeto de uma distribuição generalizada, que vai desde a secção de alimentação de uma grande superfície aos bares e cafés (Acórdão de 9 de março de 2005, Hai, T‑33/03, EU:T:2005:89, n.° 44). Com base nesta constatação, o Tribunal Geral chegou à conclusão de que os produtos incluídos na classe 33 estavam de tal modo ligados aos produtos pertencentes à classe 32 que deviam ser considerados «semelhantes» (Acórdão de 9 de março de 2005, Hai, T‑33/03, EU:T:2005:89, n.° 46).

68      Além disso, no n.° 82 do Acórdão de 18 de junho de 2008, MEZZOPANE (T‑175/06, EU:T:2008:212), o Tribunal Geral salientou em substância que os vinhos enquanto «bebidas alcoólicas» estavam, enquanto tais, claramente separados das «bebidas não alcoólicas», tanto nas lojas como nas ementas e que o consumidor médio estava habituado à separação entre bebidas alcoólicas e bebidas não alcoólicas. Em conclusão, o Tribunal Geral entendeu que se devia considerar o vinho e as bebidas não alcoólicas como sendo «não semelhantes».

69      Por último, no seu Acórdão de 5 de outubro de 2011, ROSALIA DE CASTRO (T‑421/10, não publicado, EU:T:2011:565), embora recordando a constatação feita na jurisprudência acima mencionada no n.° 67, a saber, que as bebidas não alcoólicas eram frequentemente comercializadas e consumidas com as bebidas alcoólicas e que eram objeto de uma distribuição generalizada, que vai desde as secções de alimentação de uma grande superfície aos bares e cafés, o Tribunal Geral sublinhou, no entanto, que as referidas bebidas também apresentavam características diferentes. O Tribunal Geral indicou igualmente que, embora as bebidas alcoólicas sejam geralmente consumidas em circunstâncias especiais e de convívio, a água e as bebidas não alcoólicas são consumidas diariamente. Além disso, sublinhou que o consumo de água corresponde a uma necessidade vital e que o consumidor médio, que se presume estar normalmente informado, ser razoavelmente atento e avisado, é sensível à distinção entre bebidas alcoólicas e bebidas não alcoólicas, distinção que é necessária porque determinados consumidores não pretendem, ou inclusivamente não podem, consumir álcool. Atendendo a estes elementos, o Tribunal Geral considerou que a semelhança existente entre estes dois tipos de produtos só podia ser considerada como sendo «reduzida» (Acórdão de 5 de outubro de 2011, ROSALIA DE CASTRO, T‑421/10, não publicado, EU:T:2011:565, n.os 31 e 32).

70      Atendendo às diferentes respostas dadas em aplicação do critério relacionado com os canais de distribuição na jurisprudência do Tribunal Geral, há que considerar, para efeitos do presente acórdão, que, contrariamente ao que resulta do n.° 44 do Acórdão de 9 de março de 2005, Hai (T‑33/03, EU:T:2005:89), e do n.° 32 do Acórdão de 5 de outubro de 2011, ROSALIA DE CASTRO (T‑421/10, não publicado, EU:T:2011:565), o simples facto de os produtos pertencentes às classes 32 e 33 serem normalmente objeto de uma distribuição generalizada, que vai desde as secções de alimentação de uma grande superfície aos bares e cafés, não é por si só suficiente para se considerar que os produtos incluídos nas classes 32 e 33 «devem» ser considerados como tendo uma reduzida semelhança, ou inclusivamente que são produtos semelhantes.

71      Com efeito, na realidade e como resulta de jurisprudência desenvolvida a propósito do critério relacionado com os canais de distribuição muito antes da prolação dos Acórdãos de 9 de março de 2005, Hai (T‑33/03, EU:T:2005:89), e de 5 de outubro de 2011, ROSALIA DE CASTRO (T‑421/10, não publicado, EU:T:2011:565), o facto de os produtos poderem ser vendidos nos mesmos estabelecimentos comerciais, como em grandes superfícies ou em supermercados, não é particularmente significativo na medida em que se podem encontrar nestes pontos de venda produtos de natureza muito diversa, sem que os consumidores lhes atribuam automaticamente a mesma origem [Acórdão de 13 de dezembro de 2004, El Corte Inglés/IHMI — Pucci (EMILIO PUCCI), T‑8/03, EU:T:2004:358, n.° 43].

72      Tendo esta jurisprudência sido confirmada [Acórdãos de 24 de março de 2010, 2nine/IHMI — Pacific Sunwear of California (nollie), T‑364/08, não publicado, EU:T:2010:115, n.° 40, e de 2 de julho de 2015, BH Stores/IHMI — Alex Toys (ALEX), T‑657/13, EU:T:2015:449, n.° 83)], pode considerar‑se que é jurisprudência assente.

73      A jurisprudência precisou igualmente que só a presença dos produtos nas mesmas secções dessas lojas poderia constituir uma indicação da sua semelhança (Acórdão de 17 de fevereiro de 2017, Paloma, T‑369/15, não publicado, EU:T:2017:106, n.° 28).

74      Por último, há que recordar que os vinhos espumantes, por um lado, e as bebidas denominadas «águas minerais e gasosas e outras bebidas não alcoólicas; bebidas de fruta e sumos de fruta», por outro, são vendidos lado a lado, tanto nas lojas como nas ementas (v., neste sentido, Acórdão de 15 de fevereiro de 2005, LINDENHOF, T‑296/02, EU:T:2005:49, n.° 50). Isto é válido não apenas para os vinhos espumantes em causa no processo que deu origem a este último acórdão mas também para todas as bebidas alcoólicas visadas pela marca anterior em questão no presente processo.

75      Ora, salvo raras exceções, é certo que as bebidas pertencentes à classe 32 denominadas «Água engarrafada; Água mineral (não medicinal); Águas minerais [bebidas]», visadas pela marca pedida, e os produtos pertencentes à classe 33 designados «bebidas alcoólicas (excluindo cerveja); vinho; vinhos espumantes; licores; bebidas espirituosas; aguardente», visados pela marca anterior, são vendidos em secções adjacentes nos supermercados, mas não nas mesmas secções destes últimos.

76      Por último, na medida em que o Tribunal Geral se referiu aos bares e aos cafés (Acórdãos de 9 de março de 2005, Hai, T‑33/03, EU:T:2005:89, n.° 44, e de 5 de outubro de 2011, ROSALIA DE CASTRO, T‑421/10, não publicado, EU:T:2011:565, n.° 31), é certo que, em regra, estes estabelecimentos vendem todos os produtos em causa e fazem‑no frequentemente no mesmo balcão. O consumidor hispanófono continuará, no entanto, atento às diferenças existentes entre estas categorias de produtos, nomeadamente à presença ou à ausência de álcool, pelo que o simples facto de serem vendidos no mesmo balcão não prevalece sobre as diferenças entre esses produtos.

77      Atendendo a todas as apreciações precedentes, há que considerar que, contrariamente ao que a Câmara de Recurso alegou no n.° 29 da decisão impugnada, a semelhança entre as bebidas pertencentes à classe 32 denominadas «Água engarrafada; Água mineral (não medicinal); Águas minerais [bebidas]», visadas pela marca pedida, não é reduzida face aos produtos pertencentes à classe 33 designados «bebidas alcoólicas (excluindo cerveja); vinho; vinhos espumantes; licores; bebidas espirituosas; aguardente», visados pela marca anterior. Em contrapartida, deve considerar‑se que estes produtos são diferentes.

78      À luz do que foi acima referido no n.° 24, ou seja, tendo em conta a regra segundo a qual, em substância, a demonstração da existência de uma identidade ou de uma semelhança dos produtos ou dos serviços visados pelas marcas em litígio é uma condição sine qua non para a existência do risco de confusão na aceção do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009, do erro de apreciação que afeta a decisão impugnada resulta que o fundamento da recorrente deve ser acolhido.

79      Assim, há que julgar procedente o fundamento invocado pela recorrente e, por conseguinte, anular a decisão impugnada, não sendo necessário examinar se os sinais em litígio são ou não semelhantes.

 Quanto às despesas

80      Nos termos do artigo 134.°, n.° 1, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo o EUIPO sido vencido, há que condená‑lo nas despesas, em conformidade com os pedidos da recorrente e do EUIPO.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Segunda Secção)

decide:

1)      A Decisão da Quarta Câmara de Recurso do Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia (EUIPO) de 20 de janeiro de 2020 (processo R 2524/20184) é anulada.

2)      O EUIPO é condenado nas despesas.

Tomljenović

Schalin

Škvařilová-Pelzl

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 22 de setembro de 2021.

O Secretário

 

O Presidente

E. Coulon

 

      M. van der Woude


*      Língua do processo: português.