Language of document : ECLI:EU:C:2017:347

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

HENRIK SAUGMANDSGAARD ØE

apresentadas em 4 de maio de 2017 (1)

Processo C‑566/15

Konrad Erzberger

contra

Tui AG

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Kammergericht Berlin (Tribunal Regional Superior de Berlim, Alemanha)]

«Reenvio prejudicial — Livre circulação dos trabalhadores — Igualdade de tratamento — Artigos 18.° e 45.° TFUE — Eleições para os representantes dos trabalhadores no conselho de supervisão de uma sociedade — Regulamentação nacional que limita o direito de voto e de elegibilidade apenas aos trabalhadores que prestam atividade no território nacional»






I.      Introdução

1.        O presente processo tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Kammergericht Berlin (Tribunal Regional Superior de Berlim, Alemanha) sobre a interpretação do artigo 18.° TFUE relativo ao princípio da não discriminação em razão da nacionalidade e do artigo 45.° TFUE relativo à livre circulação dos trabalhadores.

2.        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe K. Erzberger, um acionista, à TUI AG, uma sociedade alemã, a propósito da constituição do conselho de supervisão desta sociedade. O acionista invoca, designadamente, a incompatibilidade da legislação alemã em matéria de participação dos trabalhadores na sociedade com os artigos 18.° e 45.° TFUE, na parte em que prevê que apenas os trabalhadores que prestam atividade nos estabelecimentos de uma sociedade ou nas sociedades do grupo ao qual esta sociedade pertence, situados no território alemão, dispõem de um direito de voto e de elegibilidade nas eleições para os representantes dos trabalhadores no conselho de supervisão desta sociedade.

3.        A questão de princípio que está no centro do presente processo é a de saber se, no âmbito de um regime nacional de participação dos trabalhadores, os Estados‑Membros podem ser obrigados, por força dos artigos 18.° e 45.° TFUE, a atribuir aos trabalhadores que prestam atividade nas filiais estabelecidas noutros Estados‑Membros o mesmo direito de voto e de elegibilidade de que beneficiam os trabalhadores nacionais.

4.        Nas presentes conclusões, explicarei os motivos pelos quais considero que esta questão merece uma resposta negativa e que os artigos 18.° e 45.° TFUE não se opõem a uma regulamentação nacional como a que está em causa no processo principal.

II.    Quadro jurídico alemão

A.      A lei sobre a participação

5.        O § 1 da Gesetz über die Mitbestimmung der Arbeitnehmer (MitbestG) (Lei sobre a participação dos trabalhadores), de 4 de maio de 1976 (2) (a seguir «lei sobre a participação»), sob a epígrafe «Empresas abrangidas», determina, no seu n.° 1:

«Nas empresas

1.      constituídas sob a forma de sociedade anónima, de sociedade em comandita por ações, de sociedade de responsabilidade limitada ou de cooperativa e

2.      que empreguem, regra geral, mais de 2 000 pessoas,

a presente lei reconhece aos trabalhadores um direito à participação.»

6.        O § 3 da lei sobre a participação, sob a epígrafe «Os trabalhadores e a empresa», determina no seu n.° 1:

«São considerados trabalhadores na aceção da presente lei

1.      as pessoas indicadas no § 5, n.° 1, [da Betriebsverfassungsgesetz (BetrVG) (a seguir «lei sobre as relações coletivas na empresa»)], com exceção dos quadros superiores indicados no § 5, n.° 3, da referida lei,

2.      os quadros superiores indicados no § 5, n.° 3, da lei sobre as relações coletivas na empresa.

As pessoas referidas no § 5, n.° 2, da lei sobre as relações coletivas na empresa não são trabalhadores na aceção da presente lei.»

7.        O § 5 da lei sobre a participação, sob a epígrafe «Os grupos de empresas», determina, no seu n.° 1:

«Quando uma empresa […] é a empresa dominante no seio de um grupo [§ 18, n.° 1, da Aktiengesetz (a seguir «lei das sociedades anónimas»)], os trabalhadores das empresas do grupo são equiparados aos trabalhadores da empresa dominante para efeitos de aplicação desta lei […]»

8.        O § 7 da lei sobre a participação, sob a epígrafe «Composição do conselho de supervisão», determina, no seu n.° 1, ponto 3, n.° 2, ponto 3, e n.° 4 (3):

«(1)      O conselho de supervisão de uma empresa

[…]

3.      com, habitualmente, mais de 20 000 trabalhadores é composto por dez membros representantes dos acionistas e dez membros representantes dos trabalhadores.

[…]

(2)      Entre os membros do conselho de supervisão representantes dos trabalhadores devem encontrar‑se,

[…]

3.      num conselho de supervisão com dez representantes dos trabalhadores, sete trabalhadores da empresa e três representantes das organizações sindicais.

[…]

(4)      Os trabalhadores da empresa referidos no n.° 2 devem ter completado 18 anos de idade e pertencer à empresa há um ano. Para efeitos de contagem do ano de pertença à empresa, são considerados os períodos de pertença a uma outra empresa cujos trabalhadores participem nas eleições para os membros do conselho de supervisão da referida empresa por força da presente lei. Estes períodos devem ser imediatamente anteriores ao momento a partir do qual os trabalhadores adquiriram o direito de participar nas eleições para os membros do conselho de supervisão da empresa. Devem ser cumpridos os demais requisitos de elegibilidade previstos no § 8, n.° 1, da lei sobre as relações coletivas na empresa.»

9.        O § 10 da lei sobre a participação, sob a epígrafe «Eleição dos delegados», prevê nos seus n.os 1 a 3:

«(1)      Em cada estabelecimento da empresa, os trabalhadores elegem os delegados por voto secreto e de acordo com os princípios da representação proporcional.

(2)      O direito de voto na eleição dos delegados assiste aos trabalhadores da empresa que tenham completado 18 anos de idade. O § 7, n.° 2, da lei sobre as relações coletivas na empresa aplica‑se com as devidas adaptações.

(3)      São elegíveis como delegados os trabalhadores mencionados no n.° 2, primeira frase, que cumpram os demais requisitos de elegibilidade previstos no § 8 da lei sobre as relações coletivas na empresa.»

B.      A lei sobre as relações coletivas na empresa

10.      O § 7 da lei sobre as relações coletivas na empresa, na sua versão publicada em 25 de setembro de 2001 (4), sob a epígrafe «Direito de voto», determina:

«O direito de voto assiste a todos os trabalhadores do estabelecimento que tenham completado 18 anos de idade. No caso de serem cedidos trabalhadores de outra empresa, assiste‑lhes o direito de voto se tiverem sido admitidos no estabelecimento há mais de três meses.»

11.      O § 8 da lei sobre as relações coletivas na empresa, sob a epígrafe «Elegibilidade», determina:

«(1)      São elegíveis todos os eleitores que trabalhem no estabelecimento ou prestem trabalho no domicílio, principalmente para o estabelecimento, há mais de seis meses. Esta antiguidade de seis meses inclui os períodos imediatamente anteriores em que o trabalhador pertenceu a um outro estabelecimento da mesma empresa ou grupo de empresas (§ 18, n.° 1, da lei das sociedades anónimas). Não é elegível quem não disponha de capacidade para participar em eleições públicas em virtude de condenação penal.

(2)      Se o estabelecimento existir há menos de seis meses, em derrogação ao disposto no n.° 1 sobre a antiguidade de seis meses, são elegíveis os trabalhadores que no início da eleição do conselho de empresa já trabalhem no estabelecimento e cumpram os demais requisitos de elegibilidade.»

III. Litígio no processo principal, questão prejudicial e tramitação do processo no Tribunal de Justiça

12.      O demandante no litígio do processo principal, K. Erzberger, é acionista da demandada, a TUI, sociedade com sede em Berlim e em Hanôver (Alemanha). A TUI é a empresa‑mãe de um grupo de sociedades que ela controla (a seguir «grupo TUI»), que atua no setor do turismo. O grupo TUI desenvolve a sua atividade em todo o mundo e dispõe de 10 103 trabalhadores na Alemanha e de cerca de 39 536 trabalhadores nos outros Estados‑Membros da União Europeia. Nem a TUI nem qualquer outra sociedade do grupo TUI dispõem de sucursais dependentes ou de estabelecimentos noutros Estados‑Membros diferentes daqueles onde têm a sua sede.

13.      Em conformidade com o disposto na lei sobre a participação, o conselho de supervisão da TUI (5) tem 20 membros, dos quais dez membros representam os acionistas e dez membros representam os trabalhadores (6).

14.      O § 98 da lei das sociedades anónimas prevê a possibilidade de, em caso de litígio sobre as disposições legais aplicáveis à composição do conselho de supervisão, se obter uma decisão judicial. K. Erzberger utilizou esta prerrogativa.

15.      K. Erzberger alegou, designadamente, que a composição do conselho de supervisão da TUI não estava correta. O referido conselho apenas deveria ser composto por membros indicados pelos acionistas da sociedade. A regulamentação alemã em matéria de participação dos trabalhadores não deveria ter sido aplicada à sua composição, na medida em que viola os artigos 18.° e 45.° TFUE. Por sua vez, a TUI considera, no essencial, que esta regulamentação está conforme ao direito da União.

16.      Por despacho de 12 de maio de 2015, o Landgericht Berlin (Tribunal Regional de Berlim, Alemanha), que apreciou o caso em primeira instância, negou a existência de uma violação do direito da União por parte da legislação alemã em matéria de direito de participação.

17.      K. Erzberger interpôs recurso desta decisão junto do órgão jurisdicional de reenvio, o qual manifesta dúvidas quanto à conformidade da regulamentação alemã em matéria de participação com o direito da União.

18.      A este respeito, o órgão jurisdicional de reenvio salienta que, segundo o entendimento dominante na doutrina e na jurisprudência alemã (7), para efeitos de aplicação da lei sobre a participação, só são considerados «trabalhadores» os trabalhadores dos estabelecimentos que se situam em território nacional. Embora não decorra da letra da referida lei, esta conclusão resultaria da conjugação do «princípio da territorialidade», segundo o qual a ordem social alemã não pode estender‑se ao território de outros Estados, com a génese da referida lei (8).

19.      O órgão jurisdicional de reenvio também salienta que, segundo a jurisprudência do Bundesarbeitsgericht (Tribunal Federal do Trabalho, Alemanha) (9), a lei sobre as relações coletivas na empresa, cujo § 5, n.° 1, prevê uma definição do conceito de «trabalhador», para a qual remete o § 3 da lei sobre a participação (10), não é aplicável aos estabelecimentos de empresas alemãs que não se situam em território nacional.

20.      Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, decorre destes elementos que só os trabalhadores que prestam atividade na Alemanha podem eleger os trabalhadores membros do conselho de supervisão, ser eleitos delegados e pertencer ao conselho de supervisão. Por outro lado, o trabalhador tem de abandonar as funções que exerce no conselho de supervisão se aceitar um cargo noutro Estado‑Membro, ainda que continue a prestar atividade na sociedade alemã ou numa empresa do grupo.

21.      O órgão jurisdicional de reenvio considera possível que a legislação alemã em matéria de participação contenha uma discriminação fundada na nacionalidade, na aceção do artigo 18.° TFUE, na medida em que, contrariamente aos trabalhadores que prestam atividade na Alemanha, os que prestam atividade noutro Estado‑Membro — e que geralmente não são alemães — não podem eleger o órgão de supervisão da demandada e também não podem ser eleitos para o mesmo, pelo que não estão suficientemente representados no seu órgão de supervisão. O órgão jurisdicional de reenvio considera que não se identifica nenhuma justificação bastante para esta situação.

22.      De qualquer forma, o órgão jurisdicional de reenvio considera concebível que a liberdade de circulação dos trabalhadores, prevista no artigo 45.° TFUE, seja objeto de violação por parte da legislação alemã em matéria de direito de participação. Esta legislação pode levar a que, em face do risco de perda da qualidade de membro de um órgão de supervisão, os trabalhadores sejam dissuadidos de responder a ofertas de emprego efetivamente feitas e de se deslocar livremente, para o efeito, no território dos Estados‑Membros.

23.      Assim, o Kammergericht Berlin (Tribunal Regional Superior de Berlim) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«É compatível com o artigo 18.° TFUE (princípio da não discriminação) e com o artigo 45.° TFUE (livre circulação dos trabalhadores) que um Estado‑Membro só reconheça o direito de voto ativo e passivo nas eleições para os representantes dos trabalhadores no órgão de supervisão de uma empresa aos trabalhadores dos estabelecimentos da empresa ou das empresas do grupo situados em território nacional?»

24.      Foram apresentadas observações escritas por K. Erzberger, pela TUI, pela Betriebsrat der TUI AG/TUI Group Services GmbH, por Franz Jakobi e o. e por Vereinte Dienstleistungsgewerkschaft ver.di (a seguir, conjuntamente, «Betriebsrat der TUI e o.»), pela Vereinigung Cockpit e.V, que fez suas as observações da Betriebsrat der TUI e o., pelos Governos alemão e austríaco, bem como pela Comissão Europeia. Na audiência, que se realizou em 24 de janeiro de 2017, K. Erzberger, a TUI, a Betriebsrat der TUI e o., os Governos alemão, francês, luxemburguês, neerlandês e austríaco, o Órgão de Fiscalização da EFTA e a Comissão apresentaram as suas observações orais.

IV.    Análise jurídica

A.      Quanto à competência do Tribunal de Justiça

25.      A título preliminar, a TUI sustenta que o Tribunal de Justiça não tem competência para responder à questão prejudicial, uma vez que a situação em causa no processo principal não está abrangida pelo direito da União.

26.      Neste contexto, esta parte salienta, designadamente, que o demandante no processo principal, K. Erzberger, sendo acionista da sociedade demandada e não seu trabalhador, não é afetado pelos alegados efeitos discriminatórios ou restritivos da regulamentação alemã em causa, circunstância que também foi avançada pela Betriebsrat der TUI e o., bem como pelos Governos luxemburguês e austríaco.

27.      Observo, a este respeito, que, segundo jurisprudência assente, o Tribunal de Justiça não é competente para decidir a título prejudicial relativamente a uma regulamentação que não se situe no quadro do direito da União e quando o objeto do litígio não apresente nenhum elemento de conexão com qualquer uma das situações previstas nas disposições dos Tratados (11).

28.      No entanto, o Tribunal de Justiça só pode recusar responder a um pedido de decisão prejudicial formulado por um órgão jurisdicional nacional, quando for manifesto que a interpretação do direito da União solicitada não tem nenhuma relação com a realidade ou com o objeto do litígio do processo principal, quando o problema for hipotético ou ainda quando o Tribunal de Justiça não dispuser dos elementos de facto e de direito necessários para dar uma resposta útil às questões que lhe foram submetidas (12).

29.      Ora, não é esse o caso no processo em apreço.

30.      Com efeito, se é certo que, na qualidade de acionista da TUI, o demandante no processo principal, K. Erzberger, não está abrangido pelas disposições alemãs em matéria de participação dos trabalhadores, resulta da decisão de reenvio que o interessado fez uso do seu direito, previsto no direito nacional (13), de obter uma decisão judicial, em caso de diferendo quanto às disposições legais aplicáveis à composição do conselho de supervisão, invocando, designadamente, a inaplicabilidade destas disposições à composição do conselho de supervisão da TUI, em virtude de serem contrárias ao direito da União. Por outro lado, o órgão jurisdicional de reenvio considera que a sua decisão sobre o recurso interposto por K. Erzberger depende da resposta que será dada pelo Tribunal de Justiça à questão prejudicial. Com efeito, segundo este órgão jurisdicional, se a regulamentação alemã em matéria de participação se afigurar total ou parcialmente inaplicável por violar o direito da União, há que dar provimento total ou parcial ao recurso.

31.      Daqui resulta que a interpretação dos artigos 18.° e 45.° TFUE solicitada pelo órgão jurisdicional de reenvio tem uma ligação direta com o objeto do litígio no processo principal.

32.      Nestas circunstâncias, considero que o Tribunal de Justiça é competente para responder à questão prejudicial.

B.      Quanto ao mérito

1.      Quanto ao objeto da questão prejudicial

33.      Através da sua questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio questiona a compatibilidade da regulamentação alemã em matéria de participação (14) dos trabalhadores com os artigos 18.° e 45.° TFUE, a vários títulos.

34.      Por um lado, este órgão jurisdicional pergunta se, no que respeita aos trabalhadores do grupo TUI que prestam atividade noutros EstadosMembros que não a Alemanha, esta regulamentação implica uma discriminação em razão da nacionalidade, na medida em que, contrariamente aos trabalhadores do grupo que prestam atividade na Alemanha, os primeiros trabalhadores não dispõem de um direito de voto e de elegibilidade nas eleições para os representantes dos trabalhadores no conselho de supervisão da sociedade‑mãe do grupo (TUI).

35.      A este respeito, há que observar que a TUI não dispõe de sucursais dependentes ou de estabelecimentos noutros Estados‑Membros (15). A análise exposta nas presentes conclusões não incide, assim, no caso em que o trabalhador presta atividade num estabelecimento ou numa sucursal dependente situada num Estado‑Membro diferente daquele onde a sociedade está estabelecida. Pelo contrário, há que determinar se uma regulamentação como a que está em causa no processo principal implica uma discriminação dos trabalhadores do grupo TUI que prestam atividade em filiais do grupo estabelecidas noutros Estados‑Membros (16).

36.      Por outro lado, o órgão jurisdicional de reenvio questiona se, no que diz respeito aos trabalhadores do grupo TUI que prestam atividade na Alemanha, a legislação alemã constitui uma restrição à livre circulação dos trabalhadores, na medida em que, em face do risco de perda do direito de voto e de elegibilidade, esta legislação é suscetível de dissuadir os trabalhadores de se candidatarem ou de aceitarem um cargo noutro Estado‑Membro, ou de tornar menos atrativa essa transferência.

37.      A questão prejudicial visa, assim, duas situações diferentes relativas a duas categorias de trabalhadores, que cumpre distinguir claramente para a interpretação das disposições pertinentes do direito da União.

2.      Quanto às disposições do direito da União a interpretar

38.      Importa observar que a questão submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio se refere tanto ao artigo 18.° TFUE, que consagra o princípio geral da não discriminação em razão da nacionalidade, como ao artigo 45.° TFUE, relativo à livre circulação dos trabalhadores.

39.      Segundo jurisprudência assente, o artigo 18.° TFUE só deve ser aplicado autonomamente a situações regidas pelo direito da União em relação às quais o Tratado não preveja regras específicas de não discriminação (17). Ora, o princípio da não discriminação encontra uma expressão específica no artigo 45.°, n.° 2, TFUE, no que diz respeito à livre circulação de trabalhadores (18).

40.      Assim, não seria necessário o Tribunal de Justiça pronunciar‑se sobre o artigo 18.° TFUE, se o artigo 45.° TFUE fosse aplicável no presente processo.

41.      Devo referir, nesta fase, que, em meu entender, o artigo 45.° TFUE não se aplica aos trabalhadores do grupo TUI que prestam atividade fora da Alemanha, embora considere que esta disposição é suscetível de se aplicar aos trabalhadores do grupo que prestam atividade na Alemanha.

3.      Quanto à aplicabilidade do artigo 45.° TFUE

a)      Quanto à noção de «demais condições de trabalho»

42.      A título preliminar, cumpre recordar que o artigo 45.°, n.° 2, TFUE prevê que a livre circulação dos trabalhadores implica a abolição de toda e qualquer discriminação, em razão da nacionalidade, entre os trabalhadores dos Estados‑Membros, no que diz respeito ao emprego, à remuneração e demais condições de trabalho (19).

43.      Resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que deve entender‑se que a noção de «demais condições de trabalho» reveste um alcance extensivo, na medida em que esta disposição prevê a igualdade de tratamento em tudo o que se relacione direta ou indiretamente com o exercício de uma atividade assalariada no Estado‑Membro de acolhimento (20).

44.      Nestas circunstâncias, considero que o direito de voto e de elegibilidade nas eleições para os representantes dos trabalhadores no conselho de supervisão da sociedade, tal como previsto na regulamentação alemã em causa, está abrangido pela noção de «demais condições de trabalho», na aceção do artigo 45.°, n.° 2, TFUE (21). Com efeito, por força desta regulamentação, o direito de voto e de elegibilidade depende, precisamente, da questão de saber se uma pessoa tem a qualidade de «trabalhador», na aceção da referida regulamentação (22). Assim, relaciona‑se diretamente com o exercício de uma atividade assalariada na Alemanha.

b)      Quanto à existência de um elemento de conexão com o direito da União

1)      Observações gerais

45.      Para que o artigo 45.° TFUE seja aplicável ao processo em apreço, é ainda necessário que o processo principal apresente uma ligação com uma das situações abrangidas por esta disposição.

46.      A TUI, a Betriebsrat der TUI e o. e o Governo alemão contestam a aplicabilidade do artigo 45.° TFUE ao presente processo, invocando, no essencial, a ausência de um elemento transfronteiriço. Pelo contrário, K. Erzberger, o Órgão de Fiscalização da EFTA e a Comissão consideram que esse elemento está, efetivamente, presente, designadamente na medida em que um trabalhador de uma sociedade alemã que assume um cargo noutro Estado‑Membro perde o seu direito de voto e de elegibilidade nas eleições do conselho de supervisão, ainda que continue a ser trabalhador dessa sociedade.

47.      Observo que, tratando‑se da questão da aplicabilidade do artigo 45.° TFUE, cumpre distinguir as duas categorias de trabalhadores visados pela questão prejudicial, a saber, por um lado, os trabalhadores do grupo TUI que prestam atividade nas filiais estabelecidas noutros Estados‑Membros que não a Alemanha e, por outro, os que prestam atividade na Alemanha (23).

2)      Quanto aos trabalhadores do grupo TUI que prestam atividade nas filiais estabelecidas noutros EstadosMembros

48.      Tratando‑se dos trabalhadores do grupo TUI que prestam atividade nas filiais estabelecidas em Estados‑Membros que não a Alemanha, importa referir que estes trabalhadores não são, necessariamente, pessoas que tenham feito uso do seu direito à livre circulação, por força do artigo 45.° TFUE. Com efeito, é muito provável que esta categoria de trabalhadores inclua um grande número de pessoas que são nacionais ou residentes do Estado‑Membro no qual está estabelecida a filial e onde é exercida a sua atividade assalariada.

49.      Ora, reconhecer a aplicabilidade do artigo 45.° TFUE a tais pessoas, que nunca fizeram uso do seu direito à livre circulação e que não apresentam, além disso, nenhuma ligação com o mercado de trabalho do Estado‑Membro cuja legislação é contestada, pelo simples facto de a filial na qual prestam atividade ser controlada por uma sociedade estabelecida no referido Estado‑Membro, não encontraria, em meu entender, nenhum precedente na jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa à livre circulação dos trabalhadores (24).

50.      Com efeito, o Tribunal de Justiça constatou que todas as disposições do Tratado relativas à livre circulação de pessoas visam facilitar aos nacionais da União Europeia o exercício de atividades profissionais de qualquer natureza no território da União e opõem‑se às medidas que possam desfavorecer esses nacionais quando desejem exercer uma atividade económica no território de outro Estado‑Membro que não o seu Estado‑Membro de origem. Neste contexto, os nacionais dos Estados‑Membros dispõem, em especial, do direito, diretamente resultante do Tratado, de deixar o seu Estado‑Membro de origem a fim de se deslocarem para o território de outro Estado‑Membro e de nele permanecerem para aí exercerem uma atividade económica (25).

51.      O artigo 45.° TFUE garante, assim, em grande medida, a livre circulação em dois aspetos. Por um lado, os nacionais dos Estados‑Membros têm o direito, por força deste artigo, de beneficiar do mesmo tratamento que os trabalhadores nacionais no mercado de trabalho do EstadoMembro de acolhimento (26). Por outro lado, o referido artigo proíbe o EstadoMembro de origem de restringir indevidamente o direito dos seus nacionais de deixarem o seu território com vista a exercerem uma atividade económica noutro Estado‑Membro (27).

52.      A situação dos trabalhadores do grupo TUI que prestam atividade nas filiais estabelecidas noutros Estados‑Membros não corresponde a nenhum destes casos concretos, uma vez que jamais exerceram o seu direito à livre circulação (28). A aplicação do artigo 45.° TFUE a estes trabalhadores implicaria, assim, uma extensão considerável do âmbito de aplicação deste artigo (29).

53.      Ora, do ponto de vista teleológico, é difícil de entender como é que o objetivo do artigo 45.° TFUE poderia justificar tal extensão do âmbito de aplicação desta disposição. Com efeito, considero que o caráter transfronteiriço das relações no interior de um grupo de sociedades não altera o facto de que a situação desses trabalhadores é, na realidade, puramente interna, uma vez que todos os elementos que determinam a sua situação de trabalho se situam no interior de um só Estado‑Membro (30).

54.      A título de exemplo, considero que a situação de um trabalhador que presta atividade numa filial francesa do grupo TUI é puramente interna à República Francesa. Este trabalhador é, assim, empregado em França por uma sociedade constituída ao abrigo do direito francês (31), ao qual também estão sujeitos, regra geral, o seu contrato de trabalho (32) e, de forma geral, as suas condições de trabalho (33). A este respeito, a localização da propriedade ou do controlo da sociedade na qual presta atividade o referido trabalhador não tem incidência na sua situação de trabalho, que é, de facto, totalmente equiparável à de outros trabalhadores que prestam atividade em França.

55.      Nestas circunstâncias, considero que o facto de a sociedade que emprega o trabalhador ser detida ou controlada por uma sociedade estabelecida noutro Estado‑Membro não é, por si só, suficiente para constituir um elemento de conexão com qualquer uma das situações previstas no artigo 45.° TFUE. Por outras palavras, a livre circulação dos trabalhadores não deve ser afetada pelo facto de o empregador ser adquirido por uma sociedade estabelecida noutro Estado‑Membro. Com efeito, do ponto de vista da situação do trabalhador, esta circunstância constitui um fator externo, que não tem qualquer relação com as ações do trabalhador (34).

56.      Esta conclusão não é posta em causa pelos argumentos invocados por K. Erzberger, segundo os quais, por um lado, os trabalhadores que prestam atividade em filiais da TUI situadas noutros Estados‑Membros são diretamente afetados pelas decisões do conselho de supervisão da TUI (35) e, por outro, a exclusão dos primeiros trabalhadores do regime alemão de participação implica uma sobrerrepresentação dos interesses dos trabalhadores nacionais neste conselho, o que seria particularmente problemático no caso das decisões sobre o estabelecimento ou o encerramento de estabelecimentos noutros Estados‑Membros (36).

57.      Com efeito, sem prejuízo da pertinência destas considerações no contexto político nacional, há que notar que estas não são suscetíveis de incluir no âmbito de aplicação do artigo 45.° TFUE situações que não apresentam nenhum elemento de conexão com a livre circulação de trabalhadores.

58.      Tendo em conta o que precede, considero que o artigo 45.° TFUE não se aplica aos trabalhadores do grupo TUI que prestam atividade nas filiais do grupo situadas noutros Estados‑Membros (37).

59.      Além disso, observo que, contrariamente ao que parecem alegar K. Erzberger e a Comissão, o artigo 18.° TFUE também não é aplicável a estes trabalhadores. Tal como resulta da jurisprudência assente do Tribunal de Justiça, o princípio da não discriminação consagrado por este artigo não pode ser aplicado a situações puramente internas de um Estado‑Membro que não apresentem qualquer conexão com uma das situações previstas pelo direito da União (38).

3)      Quanto aos trabalhadores do grupo TUI que prestam atividade na Alemanha

60.      No que respeita aos trabalhadores do grupo TUI que prestam atividade na Alemanha, considero, por outro lado, que, contrariamente ao que alegam a TUI e o Governo alemão, o artigo 45.° é aplicável.

61.      Considero, assim, que nos encontramos na presença de uma situação visada pelo artigo 45.° TFUE, quando um trabalhador do grupo TUI que presta atividade na Alemanha deixa, ou pretende deixar, este Estado‑Membro para assumir um cargo numa filial pertencente ao mesmo grupo, estabelecida noutro Estado‑Membro.

62.      Ao contrário da TUI, considero que não se trata de uma perspetiva profissional puramente hipotética, suscetível de tornar o artigo 45.° inaplicável (39). Muito pelo contrário, no caso de um grupo de sociedades com caráter transfronteiriço, tal como aquele do qual faz parte a sociedade demandada (40), a possibilidade de um trabalhador ser transferido, seja por sua própria iniciativa, seja a pedido do seu empregador, entre duas sociedades afiliadas do grupo, situadas em diferentes Estados‑Membros, parece‑me perfeitamente concebível.

63.      Não posso concordar com o argumento que parece avançar o Governo alemão, segundo o qual o artigo 45.° TFUE não se aplica aos trabalhadores do grupo TUI que prestam atividade na Alemanha, uma vez que o artigo 45.°, n.° 3, alínea c), apenas confere aos trabalhadores o direito de residir num Estado‑Membro, a fim de nele exercer uma atividade laboral «em conformidade com as disposições legislativas, regulamentares e administrativas que regem o emprego dos trabalhadores nacionais».

64.      A este respeito, importa notar que o n.° 3 do artigo 45.° TFUE não visa delimitar o âmbito de aplicação do referido artigo, mas sobretudo especificar o conteúdo do direito à livre circulação, no caso em que este artigo é efetivamente aplicável (41).

65.      Por fim, observo que, contrariamente ao que parecem alegar a TUI e o Governo alemão, a ausência de harmonização ao nível da União em matéria de participação dos trabalhadores não pode ter nenhuma incidência na aplicabilidade do artigo 45.° TUFE no processo principal.

66.      Se é certo que, na ausência dessa harmonização (42), os Estados‑Membros são, em princípio, livres de determinar o grau de envolvimento dos trabalhadores na gestão das sociedades que operam nos seus respetivos territórios, esta competência deve ser exercida no respeito do direito da União, em especial das disposições do artigo 45.° TFUE, relativo à livre circulação dos trabalhadores (43).

67.      Com base no que precede, considero que o artigo 45.° TFUE é aplicável no que respeita aos trabalhadores do grupo TUI que prestam atividade na Alemanha, quando deixam ou pretendem deixar este Estado‑Membro para assumir um cargo numa filial pertencente ao mesmo grupo e situada noutro Estado‑Membro.

68.      Por conseguinte, tendo em conta este cenário, é necessário questionar a compatibilidade de uma regulamentação como a que está em causa no processo principal com o artigo 45.° TFUE. Pelo contrário, não é necessário avaliar esta regulamentação à luz do artigo 18.° TFUE (44).

69.      Na análise que se segue, exporei os motivos pelos quais considero que tal regulamentação não restringe a livre circulação dos trabalhadores [subtítulo a) do título 4]. A título subsidiário, explicarei as razões pelas quais considero que eventuais efeitos restritivos dessa regulamentação estão justificados por razões imperiosas de interesse geral [subtítulo b) do título 4].

4.      Quanto à compatibilidade de uma regulamentação como a que está em causa no processo principal com o artigo 45.° TFUE

a)      Quanto à ausência de restrição

70.      Há que recordar que, segundo jurisprudência assente do Tribunal de Justiça, mesmo que, segundo a sua redação, as disposições relativas à livre circulação de trabalhadores visem, designadamente, assegurar o benefício do tratamento nacional no Estado‑Membro de acolhimento, opõem‑se igualmente a que esse Estado‑Membro de origem entrave a livre aceitação e o exercício de um emprego por um dos seus nacionais noutro Estado‑Membro (45).

71.      Neste contexto, o Tribunal de Justiça já esclareceu que as disposições nacionais que impedem ou dissuadem um trabalhador nacional de um Estado‑Membro de abandonar o seu Estado de origem para exercer o direito de livre circulação constituem entraves a essa liberdade, mesmo que se apliquem independentemente da nacionalidade dos trabalhadores em causa (46). O Tribunal de Justiça observou ainda que o artigo 45.° TFUE opõe‑se a qualquer medida que, embora aplicável sem discriminação em razão da nacionalidade, seja suscetível de afetar ou de tornar menos atrativo o exercício, pelos nacionais da União, das liberdades fundamentais garantidas pelo Tratado (47).

72.      Com base nesta jurisprudência, K. Erzberger, o Órgão de Fiscalização da EFTA e a Comissão sustentam que a exclusão dos trabalhadores do grupo TUI que prestam atividade noutros Estados‑Membros do regime de participação alemão implica uma restrição à livre circulação dos trabalhadores na aceção do artigo 45.° TFUE. Alegam que o facto de um trabalhador que presta atividade na Alemanha perder o seu direito de voto e de elegibilidade nas eleições para os representantes dos trabalhadores no conselho de supervisão da sociedade‑mãe do grupo, se for transferido para uma filial do grupo estabelecida noutro Estado‑Membro, é suscetível de dissuadir o uso do seu direito à livre circulação ou, pelo menos, de tornar menos atrativo o exercício deste direito. Esse seria especialmente o caso dos trabalhadores que já foram eleitos para o conselho de supervisão, uma vez que teriam de renunciar ao seu mandato no conselho se fossem transferidos para uma filial estabelecida noutro Estado‑Membro (48).

73.      Por sua vez, a TUI, a Betriebsrat der TUI e o., os Governos alemão, luxemburguês, neerlandês e austríaco sustentam que não existe restrição à livre circulação dos trabalhadores.

74.      Observo, desde já, que, nos termos do artigo 45.°, n.° 3, alínea c), TFUE, o direito à livre circulação dos trabalhadores, consagrado neste artigo, compreende, designadamente, o direito de «[r]esidir num dos Estados‑Membros a fim de nele exercer uma atividade laboral, em conformidade com as disposições legislativas, regulamentares e administrativas que regem o emprego dos trabalhadores nacionais» (49).

75.      O trabalhador migrante beneficia, ainda, por força do artigo 45.° TFUE, de igualdade de tratamento com os trabalhadores nacionais do Estado‑Membro de acolhimento, de forma que possa aí exercer uma atividade económica em conformidade com a regulamentação deste Estado‑Membro. Pelo contrário, o artigo 45.° TFUE não confere ao referido trabalhador o direito de «exportar» as condições de trabalho de que beneficia no seu Estado‑Membro de origem para outro Estado‑Membro. Com efeito, tal como salientou o advogado‑geral N. Fennelly nas suas conclusões relativas ao processo Graf, «em situações normais, o trabalhador migrante deve aceitar o mercado de trabalho nacional tal como o encontra» (50).

76.      Logicamente, é jurisprudência assente que o artigo 45.° TFUE não tem em vista as eventuais disparidades de tratamento que possam resultar, de um Estado‑Membro para outro, das divergências que existem entre as legislações dos diferentes Estados‑Membros, desde que estas afetem todas as pessoas sujeitas à sua aplicação, segundo critérios objetivos e sem relação com a sua nacionalidade (51). No mesmo sentido, o Tribunal de Justiça já decidiu que, no que respeita ao artigo 18.° TFUE, não se pode considerar a aplicação de uma legislação nacional contrária ao princípio da não discriminação pelo simples facto de outros Estados‑Membros aplicarem disposições menos exigentes (52).

77.      Além disso, o Tribunal de Justiça já considerou que o direito primário da União não pode garantir a um segurado que uma deslocação para outro Estado‑Membro seja neutra em matéria de segurança social, podendo tal deslocação, consoante os casos e tendo em conta as divergências existentes entre os regimes e as legislações dos Estados‑Membros, ser mais ou menos vantajosa ou desvantajosa para a pessoa em causa no plano da proteção social (53). Este raciocínio é, em meu entender, diretamente transponível para os regimes dos Estados‑Membros relativos à participação dos trabalhadores. A este respeito, recordo que o direito de voto e de elegibilidade nas eleições para os representantes dos trabalhadores no conselho de supervisão da sociedade, tal como previsto pela regulamentação alemã em causa, constitui, em meu entender, uma condição de trabalho no sentido do artigo 45.°, n.° 2, TFUE (54).

78.      Daqui decorre, em meu entender, que um trabalhador que deixa a Alemanha para exercer uma atividade económica noutro Estado‑Membro não pode conservar, por força do artigo 45.° TFUE, o benefício dos direitos de participação previstos pela regulamentação alemã. Pelo contrário, esse trabalhador beneficiará de direitos de participação no outro Estado‑Membro, na medida em que a regulamentação desse Estado‑Membro lhe confira tais direitos.

79.      No presente processo, coloca‑se, porém, a questão de saber se estas conclusões também valem em caso de transferência de um trabalhador dentro de um grupo de sociedades. Por outras palavras, há que determinar se um trabalhador que é transferido de uma sociedade para outra, quando estas estão estabelecidas em diferentes Estados‑Membros mas pertencem ao mesmo grupo, pode invocar o artigo 45.° TFUE, a fim de conservar, após a transferência, determinados direitos em matéria de participação na sociedade‑mãe do grupo, que lhe conferia a legislação do seu Estados‑Membros de origem. É essencialmente o que alegam K. Erzberger, o Órgão de Fiscalização da EFTA e a Comissão.

80.      Considero que esta questão merece uma resposta negativa.

81.      Com efeito, não encontro nenhuma base nos Tratados ou na jurisprudência do Tribunal de Justiça que permita estabelecer uma distinção entre o trabalhador que muda de emprego entre duas sociedades não afiliadas estabelecidas em diferentes Estados‑Membros e aquele que é alvo de uma transferência entre duas sociedades que pertencem ao mesmo grupo de sociedades, embora estabelecidas em diferentes Estados‑Membros. Do ponto de vista da livre circulação dos trabalhadores, trata‑se, em ambos os casos, de uma deslocação de um Estado‑Membro para outro, com todas as implicações daí resultantes para o trabalhador, entre as quais, designadamente, uma alteração das condições de trabalho aplicáveis. Conforme já foi referido, o caráter transfronteiriço do grupo de sociedades não altera o facto de a situação de trabalho do trabalhador ser essencialmente determinada segundo a legislação do Estado‑Membro no qual é exercida a atividade assalariada (55).

82.      Embora simpatize com a ideia de que qualquer trabalhador que presta atividade num grupo de sociedades deveria beneficiar, na União, dos mesmos direitos de participação deste grupo, independentemente da localização do seu posto de trabalho, há que referir que, no estado atual do direito da União, a participação dos trabalhadores na gestão das sociedades nacionais dos Estados‑Membros não foi objeto de harmonização ao nível europeu (56). Na ausência de tal harmonização, considero que a questão de incluir ou não os trabalhadores do grupo que prestam atividade noutros Estados‑Membros no regime nacional de participação depende da escolha dos Estados‑Membros (57).

83.      Por outras palavras, considero que, no estado atual do direito da União, os Estados‑Membros não são obrigados, por força do artigo 45.° TFUE, a conferir aos trabalhadores que deixam o seu território para exercer uma atividade económica noutro Estado‑Membro os mesmos direitos de participação de que beneficiam os trabalhadores que prestam atividade no território nacional, antes permanecendo livres para o fazer com base no seu direito nacional (58).

84.      Assim, concluo que uma regulamentação, como a que está em causa no processo principal, que prevê que apenas os trabalhadores que prestam atividade nos estabelecimentos de uma sociedade ou nas sociedades do grupo situados no território nacional dispõem de um direito de voto e de elegibilidade nas eleições para os representantes dos trabalhadores no conselho de supervisão da sociedade, não constitui uma restrição à livre circulação dos trabalhadores na aceção do artigo 45.° TFUE.

85.      Por uma questão de exaustividade e na hipótese de o Tribunal de Justiça considerar que uma regulamentação nacional, como a que está em causa no processo principal, implica uma restrição à livre circulação dos trabalhadores, na aceção do artigo 45.° TUFE, exporei na secção seguinte os motivos pelos quais considero que tal restrição seria, em qualquer caso, justificada (59).

b)      A título subsidiário, quanto à existência eventual de uma justificação

86.      Em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, uma medida nacional que é suscetível de entravar a livre circulação de trabalhadores, o que, em princípio, é proibido pelo artigo 45.° TFUE, só é admissível se prosseguir um dos objetivos legítimos enunciados no Tratado ou se se justificar por razões imperiosas de interesse geral. Em tal caso, é ainda necessário que a aplicação dessa medida seja adequada a garantir a realização do objetivo em causa e não vá além do necessário para alcançar esse objetivo (60).

87.      No presente processo, nenhum dos objetivos legítimos expressamente enunciados no artigo 45.°, n.° 3, TFUE foram invocados pelas partes e interessados que apresentaram observações ao Tribunal de Justiça (61). Pelo contrário, estas partes e interessados invocam razões imperiosas de interesse geral, para o caso de o Tribunal de Justiça considerar que a legislação alemã em causa implica uma restrição à livre circulação dos trabalhadores na aceção do artigo 45.° TFUE.

1)      Quando às razões imperiosas de interesse geral invocadas

88.      A TUI e os Governos alemão e austríaco alegam, no essencial, justificações relativas ao princípio da territorialidade, como reconhecido pelo direito internacional e pelo direito da União (62). Resultaria deste princípio que a competência do legislador alemão está limitada ao território alemão, o que impede a inclusão de trabalhadores que prestam atividade noutros Estados‑Membros no regime alemão de participação. O Governo francês considera que o presente processo confere ao Tribunal de Justiça a oportunidade de identificar uma nova razão imperiosa de interesse geral, relacionada com a necessidade de reconhecer a diversidade dos modelos sociais dos Estados‑Membros em matéria de representação dos trabalhadores. Na mesma linha, a Betriebsrat der TUI e o. fazem referência ao artigo 4.°, n.° 2, TUE, nos termos do qual a União respeita a identidade nacional dos Estados‑Membros. Por fim, a Comissão considera que a necessidade de assegurar o bom funcionamento das regras em matéria de participação poderia justificar uma restrição da livre circulação de trabalhadores, o que competiria ao órgão jurisdicional nacional determinar (63).

89.      Pelo contrário, K. Erzberger e o Órgão de Fiscalização da EFTA entendem que as razões imperiosas de interesse geral invocadas no presente processo não podem justificar a restrição à livre circulação dos trabalhadores que resultaria da regulamentação em causa. Parece‑me que esta posição é partilhada pelo órgão jurisdicional de reenvio (64).

2)      Quanto à justificação relacionada com o princípio da territorialidade

90.      Importa observar, desde já, que, no âmbito do presente processo, o princípio da territorialidade é invocado como obstáculo a que o regime de participação alemão seja aplicado aos trabalhadores que prestam atividade fora da Alemanha. Com efeito, resultaria do referido princípio que o legislador alemão não possui a competência legislativa necessária para incluir estes trabalhadores no referido regime.

91.      Tal como resulta da análise acima exposta, considero que a República Federal da Alemanha não está obrigada, por força do artigo 45.° TFUE, a atribuir aos trabalhadores que deixam o seu território para exercer uma atividade económica noutro Estado‑Membro os mesmos direitos de participação de que beneficiam os trabalhadores que prestam atividade na República Federal da Alemanha, segundo a regulamentação alemã em causa (65). Caso o Tribunal de Justiça decida que esta regulamentação implica uma restrição à livre circulação dos trabalhadores, na aceção do artigo 45.° TFUE, considero, no entanto, que o princípio da territorialidade não impede a Alemanha de incluir os primeiros trabalhadores no seu regime de participação.

92.      O princípio da territorialidade foi reconhecido pelo Tribunal de Justiça como objetivo legítimo suscetível de justificar uma restrição à livre circulação, designadamente, no contexto das regulamentações nacionais em matéria de fiscalidade que constituem um obstáculo à liberdade de estabelecimento consagrada no Tratado (66). A este respeito, o referido princípio foi frequentemente analisado conjuntamente com outro objetivo legítimo, a saber, o da preservação da repartição do poder de tributação entre os Estados‑Membros (67). Neste contexto, o Tribunal de Justiça já declarou que a função do princípio da territorialidade consiste em introduzir, na aplicação do direito da União, a necessidade de tomar em consideração os limites das competências fiscais dos Estados‑Membros (68).

93.      Duvido seriamente que a jurisprudência em matéria de fiscalidade seja transponível para o presente caso concreto.

94.      Em primeiro lugar, no domínio da fiscalidade, o princípio da territorialidade, tal como reconhecido pelo Tribunal de Justiça, visa resolver problemáticas específicas deste domínio, designadamente, a de eliminar as duplas tributações (69) e a de prevenir comportamentos suscetíveis de comprometer o direito do Estado‑Membro de origem de exercer a sua competência fiscal em relação às atividades realizadas no seu território (70).

95.      Ora, no âmbito de um regime de participação dos trabalhadores, tais problemáticas não se levantam. Considero, assim, que nada se opõe a que um trabalhador que presta atividade numa filial estabelecida num Estado‑Membro diferente daquele onde se encontra a sociedade‑mãe beneficie de uma «dupla representação», a saber, por um lado, na filial, por força da regulamentação do Estado‑Membro de emprego, e, por outro, na sociedade‑mãe, em conformidade com a regulamentação do Estado‑Membro onde está estabelecida esta sociedade.

96.      Em segundo lugar, contrariamente ao que alegam a TUI e os Governos alemão e neerlandês, considero que a inclusão no regime de participação alemão dos trabalhadores que prestam atividade noutros Estados‑Membros não implicaria, por si só, uma ingerência na soberania ou nas competências legislativas de outros Estados‑Membros. Com efeito, considero, à semelhança do Órgão de Fiscalização da EFTA e da Comissão, que a questão de saber quais são os trabalhadores que podem participar nas eleições para os membros do conselho de supervisão de uma sociedade alemã compete inteiramente ao poder do legislador alemão (71). Dito de outro modo, não existe conflito de competência (72).

97.      Nestas circunstâncias, considero que a exclusão dos trabalhadores que prestam atividade noutros Estados‑Membros do regime de participação alemão não pode ser considerada uma emanação do princípio da territorialidade.

98.      O Governo alemão entende, no entanto, que a questão da extraterritorialidade se coloca no contexto do regime de participação alemão, pelo facto de o referido regime impor, no âmbito do regulamento eleitoral (73), determinadas obrigações ao nível da organização e da realização das eleições a todas as sociedades que pertençam ao grupo de sociedades, bem como aos trabalhadores que participem nas eleições (74). Assim, por força deste regulamento, as eleições para o conselho de supervisão da sociedade alemã seriam organizadas não de forma central pela direção desta sociedade, mas antes de forma descentralizada pelos próprios trabalhadores de cada sociedade do grupo. Ora, tendo em conta que as filiais estabelecidas noutros Estados‑Membros e os seus trabalhadores não estão sujeitos ao direito alemão, o legislador alemão não estaria em condições de lhes impor obrigações em conformidade com o regulamento eleitoral e, consequentemente, de os incluir no regime de participação alemão.

99.      Observo, assim, que é a conceção específica do regime de participação alemão e, designadamente, as obrigações decorrentes do regulamento eleitoral, que, segundo o Governo alemão, impedem os trabalhadores que prestam atividade noutros Estados‑Membros de serem incluídos neste regime. A exclusão destes trabalhadores é, assim, não uma necessidade absoluta relacionada com os limites do poder legislativo do legislador alemão, mas antes a consequência de determinadas escolhas que este legislador fez, no que respeita, designadamente, às modalidades das eleições (75).

100. Importa, desde já, questionar se a regulamentação em causa no processo principal é suscetível de ser justificada com o objetivo de garantir a participação dos trabalhadores na sociedade, em conformidade com as particularidades sociais, económicas e culturais nacionais, como alegam, no essencial, o Governo francês e a Betriebsrat der TUI e o. (76).

3)      Quanto à justificação relacionada com o objetivo de garantir a participação dos trabalhadores na sociedade, em conformidade com as particularidades sociais, económicas e culturais nacionais

101. Importa observar que, apesar de a Betriebsrat der TUI e o. se apoiarem no artigo 4.°, n.° 2, TUE (77), nos termos do qual a União respeita a identidade nacional dos Estados‑Membros, refletida nas estruturas políticas e constitucionais fundamentais de cada um deles, esta disposição não foi invocada pelo Governo alemão (78).

102. Este Governo refere, no entanto, que a regulamentação alemã relativa à participação dos trabalhadores e às disposições dos regulamentos eleitorais que regem, concretamente, as eleições para os membros do conselho de supervisão que representam os trabalhadores estão adaptados às estruturas empresariais, sociais e sindicais alemãs e que esta regulamentação serve não apenas os interesses dos trabalhadores, mas antes o interesse geral, na medida em que visa garantir a cooperação e a integração, tendo também em consideração outros interesses para além dos próprios interesses diretos (79). Na audiência, este Governo também referiu que a participação dos trabalhadores é um elemento central da cultura de cooperação na Alemanha e que constitui o desenvolvimento legal da liberdade sindical e permite o exercício desta liberdade, que é garantida pela Grundgesetz (Lei fundamental) (80).

103. Nestas circunstâncias, hesito em qualificar o regime de participação alemão como elemento de identidade nacional, na aceção do artigo 4.°, n.° 2, TUE. Todavia, é incontestável, a meu ver, que o regime constitui um elemento essencial do mercado de trabalho alemão e — mais amplamente — da ordem social alemã.

104. De seguida, importa observar que a participação dos trabalhadores na gestão da sociedade constitui um objetivo legítimo no âmbito do direito da União (81). O direito da União reconhece, no entanto, a diversidade das regras e práticas nacionais no domínio da política social (82) e, mais especialmente, no que respeita à forma como os representantes dos trabalhadores são envolvidos no processo de tomada de decisão das sociedades (83). No estado atual do direito da União, este deixa, assim, aos Estados‑Membros, por um lado, a escolha entre adotar, ou não, uma legislação em matéria de participação dos trabalhadores na sociedade e, por outro, a competência para determinar as modalidades dos seus respetivos regimes na matéria (84).

105. Tratando‑se das particularidades do regime de participação alemão, importa observar que este regime é caracterizado por um grau particularmente elevado de participação dos trabalhadores na gestão da sociedade (85). Ao mesmo tempo, o referido regime prevê, por força do regulamento eleitoral (86), procedimentos relativamente complexos, com várias etapas processuais, que visam assegurar o bom funcionamento das eleições para os representantes dos trabalhadores e garantir eleições livres, equitativas e secretas dos membros do conselho de supervisão que representam os trabalhadores (87). Neste contexto, o Governo alemão refere que o regime de participação alemão é concebido com base no princípio segundo o qual a organização e a realização das eleições para os representantes dos trabalhadores são confiadas aos trabalhadores, que devem, eles próprios, organizar‑se, em cada sociedade do grupo, e cooperar com os sindicatos e as sociedades do grupo.

106. Considero que, no âmbito desse regime nacional de participação dos trabalhadores, tais considerações relativas às modalidades da organização e da realização das eleições constituem a expressão de determinadas escolhas de política económica e social legítimas, cuja apreciação cabe, no estado atual do direito da União, aos Estados‑Membros (88). Assim, em meu entender, uma regulamentação como a que está em causa no processo principal é justificada pelo objetivo que consiste em garantir a participação dos trabalhadores na sociedade, em conformidade com as particularidades sociais, económicas e culturais nacionais.

107. Considero, por outro lado, que esta regulamentação é proporcional a este objetivo, ou seja, é adequada a garantir a realização da participação dos trabalhadores na sociedade, em conformidade com as particularidades sociais, económicas e culturais nacionais, e não vai além do que é necessário para atingir este objetivo.

108. A este respeito, recordo que o Tribunal de Justiça já precisou que não é indispensável que uma medida restritiva corresponda a uma conceção partilhada pela totalidade dos Estados‑Membros no que respeita às modalidades de proteção do direito fundamental ou do interesse legítimo em causa e que, pelo contrário, a necessidade e a proporcionalidade das disposições adotadas na matéria não são excluídas pelo simples facto de um Estado‑Membro ter escolhido um sistema de proteção diferente do adotado por outro Estado‑Membro (89).

109. Por outro lado, importa reconhecer que não é possível incluir no âmbito de aplicação pessoal do regime de participação alemão os trabalhadores que prestam atividade fora da Alemanha, sem ter de modificar as características fundamentais do referido regime. Com efeito, essa extensão do regime alemão pressuporia que a responsabilidade pela organização e pela realização das eleições devesse ser transferida dos trabalhadores e das sociedades do grupo para a direção da sociedade‑mãe alemã, o que iria contra os princípios nos quais assenta o referido regime.

110. Embora seja, efetivamente, possível, como sugere a Comissão, obrigar a sociedade‑mãe a conferir, para a composição do seu conselho de supervisão, um direito de voto e de elegibilidade também aos trabalhadores que prestam atividade noutros Estados‑Membros, em virtude da sua influência determinante nas sociedades do grupo, considero que os Estados‑Membros não estão obrigados, por força do direito da União, a optar por essa abordagem no âmbito dos seus regimes de participação dos trabalhadores na sociedade.

111. Nestas circunstâncias, considero que, caso o Tribunal de Justiça declare que uma regulamentação nacional como a que está em causa no processo principal implica uma restrição da livre circulação dos trabalhadores na aceção do artigo 45.° TFUE, importa considerar, no estado atual do direito da União, como justificada a manutenção dessa regulamentação, na medida em que esta é o reflexo de determinadas escolhas de política económica e social legítimas que competem aos Estados‑Membros.

112. Tendo em conta o conjunto destes elementos, considero que o artigo 45.° TFUE não se opõe a uma regulamentação como a que está em causa no processo principal, por força da qual apenas os trabalhadores que prestam atividade nos estabelecimentos de uma sociedade ou em sociedades do grupo que se situem no território nacional dispõem de um direito de voto e de elegibilidade nas eleições para os representantes dos trabalhadores no conselho de supervisão dessa sociedade.

V.      Conclusão

113. Tendo em conta as considerações precedentes, proponho que o Tribunal de Justiça responda do seguinte modo à questão prejudicial submetida pelo Kammergericht Berlin (Tribunal Regional Superior de Berlim, Alemanha):

Os artigos 18.° e 45.° TFUE devem ser interpretados no sentido de que não se opõem a uma regulamentação como a que está em causa no processo principal, que prevê que apenas os trabalhadores que prestam atividade nos estabelecimentos de uma sociedade ou em sociedades do grupo que se situem no território nacional dispõem de um direito de voto e de elegibilidade nas eleições para os representantes dos trabalhadores no conselho de supervisão desta sociedade.


1      Língua original: francês.


2      BGB1. 1976 I S., p. 1153.


3      Nos termos do § 7, n.° 1, pontos 1 e 2, e n.° 2, pontos 1 e 2, da lei sobre a participação, o conselho de supervisão é composto, respetivamente, no caso de empresas com, habitualmente, não mais de 10 000 trabalhadores e no caso de empresas com, habitualmente, mais de 10 000 trabalhadores, mas menos de 20 000 trabalhadores, por doze e dezasseis membros, metade dos quais são representantes dos trabalhadores (distribuídos entre trabalhadores da empresa e representantes das organizações sindicais).


4      BGB1. 2001 I, p. 2518.


5      O Governo alemão explica, nas suas observações escritas, que, por força do direito alemão, o conselho de supervisão e o conselho de administração são órgãos da sociedade. Enquanto o conselho de administração está encarregue da gestão da sociedade, o conselho de supervisão tem como missão supervisionar o conselho de administração (sistema dualista).


6      V. § 7 da lei sobre a participação, reproduzido no n.° 8 das presentes conclusões. Recorde‑se que, de entre os dez representantes dos trabalhadores, sete são trabalhadores da empresa e três são representantes das organizações sindicais.


7      O órgão jurisdicional de reenvio faz, designadamente, referência à decisão de 5 de junho de 1979 do Landgericht Düsseldorf (Tribunal Regional de Düsseldorf, Alemanha) (25 AktE 1/78, DB 1979, p. 1451). Resulta, porém, da decisão de reenvio que a jurisprudência alemã na matéria não é inequívoca. O órgão jurisdicional de reenvio refere, designadamente, que, por despacho de 16 de fevereiro de 2015, o Landgericht Frankfurt am Main (Tribunal Regional de Frankfurt am Main, Alemanha) (Beschluss Az. 3‑1  O 1/14) declarou que os trabalhadores a prestar atividade no estrangeiro não estavam excluídos do direito de participação e, por conseguinte, da participação na eleição dos representantes dos trabalhadores no conselho de supervisão. Segundo o Governo alemão, esta decisão ainda não transitou em julgado e o processo está atualmente suspenso a aguardar a decisão do Tribunal de Justiça no presente processo.


8      Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, a intenção do legislador alemão de não incluir na participação do grupo os trabalhadores que prestam atividade noutros Estados‑Membros retira‑se de um relatório da Ausschuss für Arbeit und Sozialordnung (Comissão do Trabalho e Assuntos Sociais do Bundestag alemão) de 10 de março de 1976 (BT‑Drucksache 7/4845, p. 4).


9      O órgão jurisdicional de reenvio faz referência à decisão de 22 de março de 2000 do Bundesarbeitsgericht (Tribunal Federal do Trabalho) (7 ABR 34/98, NZA 2000, p. 1119 [1121]).


10      V. n.° 6 das presentes conclusões.


11      V., designadamente, despacho de 25 de janeiro de 2007, Koval’ský (C‑302/06, não publicado, EU:C:2007:64, n.° 20).


12      V. acórdão de 12 de outubro de 2016, Ranks e Vasiļevičs (C‑166/15, EU:C:2016:762, n.° 22).


13       V. n.° 14 das presentes conclusões.


14      Observo que o direito alemão distingue dois tipos de participação dos trabalhadores, a saber: por um lado, a participação que é exercida ao nível do estabelecimento, através da comissão de trabalhadores (Betriebsrat) e, por outro, a participação ao nível da sociedade no conselho de supervisão (Aufsichtsrat). O processo em apreço apenas diz respeito ao segundo tipo de participação. V., designadamente, Henssler, M., «Arbeitnehmermitbestimmung im deutschen Gesellschaftsrecht», UnternehmensMitbestimmung der Arbeitnehmer im Recht der EUMitgliedstaaten, Verlag Recht und Wirtschaft GmbH, Heidelberg, 2004, p. 133.


15      V. n.° 12 das presentes conclusões.


16      V., também, nota 37 das presentes conclusões.


17      V., designadamente, acórdão de 4 de setembro de 2014, Schiebel Aircraft (C‑474/12, EU:C:2014:2139, n.° 20 e jurisprudência referida), bem como, neste sentido, acórdão de 29 de outubro de 2015, Nagy (C‑583/14, EU:C:2015:737, n.° 24).


18      V., neste sentido, acórdãos de 1 de dezembro de 2011, Comissão/Hungria (C‑253/09, EU:C:2011:795, n.° 44 e jurisprudência referida), e de 4 de setembro de 2014, Schiebel Aircraft (C‑474/12, EU:C:2014:2139, n.° 21 e jurisprudência referida).


19      V. acórdão de 2 de março de 2017, Eschenbrenner (C‑496/15, EU:C:2017:152, n.° 32).


20      V. acórdão de 8 de maio de 2003, Wählergruppe Gemeinsam (C‑171/01, EU:C:2003:260, n.° 85). Neste contexto, o Tribunal de Justiça já declarou, designadamente, que o artigo 45.°, n.° 2, TFUE se aplica ao direito de voto e ao direito de elegibilidade nas eleições organizadas por organismos como as câmaras profissionais, nos quais os trabalhadores estão obrigatoriamente filiados e para os quais devem pagar cotização e que estão encarregados da defesa e da representação dos interesses destes últimos. V. acórdão de 16 de setembro de 2004, Comissão/Áustria (C‑465/01, EU:C:2004:530, n.os 28 e 30 e jurisprudência referida). V., também, acórdão de 18 de maio de 1994, Comissão/Luxemburgo (C‑118/92, EU:C:1994:198).


21      Esta conclusão não é, aliás, contestada pelas partes, nem pelos interessados que apresentaram observações ao Tribunal de Justiça. Ora, embora reconhecendo que o direito de voto e de elegibilidade nas eleições para o conselho de supervisão constitui uma condição de trabalho na aceção do artigo 45.°, n.° 2, TFUE, a Betriebsrat der TUI e o. consideram que o mesmo não vale para o mandato no conselho de supervisão. Considero que não se deve proceder a tal distinção entre, por um lado, o direito de elegibilidade e, por outro, o mandato no conselho de supervisão. Com efeito, os dois aspetos estão, em meu entender, intrinsecamente ligados.


22      V. n.os 5 a 11 das presentes conclusões.


23      V. n.os 33 a 37 das presentes conclusões.


24      Saliento que, ao contrário do presente processo, o processo que deu origem ao acórdão de 8 de maio de 1994, Comissão/Luxemburgo (C‑118/92, EU:C:1994:198), dizia respeito a uma regulamentação que recusava aos nacionais dos outros Estados‑Membros, empregados no EstadoMembro em causa, o direito de participarem nas eleições organizadas nas câmaras profissionais.


25      V., designadamente, acórdão de 13 de julho de 2016, Pöpperl (C‑187/15, EU:C:2016:550, n.° 23 e jurisprudência referida).


26      V., também, artigos 7.° e 8.° do Regulamento (UE) n.° 492/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de abril de 2011, relativo à livre circulação dos trabalhadores na União (JO 2011, L 141, p. 1), que preveem a igualdade de tratamento de um trabalhador nacional de um Estado‑Membro empregado no território de outro EstadoMembro.


27      O Tribunal de Justiça já declarou que o artigo 45.° TFUE também se opõe a uma legislação que prejudica o trabalhador pelo simples facto de fazer uso do seu direito à livre circulação. V., neste sentido, acórdãos de 10 de março de 2011, Casteels (C‑379/09, EU:C:2011:131, n.os 29 e 30), e de 13 de julho de 2016, Pöpperl (C‑187/15, EU:C:2016:550, n.os 24 a 26).


28      Saliento que, na medida em que esse trabalhador não teria efetivamente exercido o seu direito à livre circulação, tendo sido transferido de um estabelecimento ou de uma filial do grupo situado na Alemanha para o estrangeiro, a sua situação estaria abrangida pela outra hipótese visada pela questão prejudicial, a saber, a relativa aos trabalhadores do grupo que prestam atividade na Alemanha. V. n.° 36 das presentes conclusões.


29      Saliento, a este respeito, que o raciocínio desenvolvido pelo Tribunal de Justiça no acórdão de 30 de abril de 1996, Boukhalfa (C‑214/94, EU:C:1996:174), invocado pela Comissão, não é, de todo, aplicável ao presente caso concreto. O mesmo é válido para os acórdãos de 6 de junho de 2000, Angonese (C‑281/98, EU:C:2000:296); de 16 de janeiro de 2003, Comissão/Itália (C‑388/01, EU:C:2003:30); e de 11 de janeiro de 2007, ITC (C‑208/05, EU:C:2007:16), invocados pelo Órgão de Fiscalização da EFTA.


30      Recorde‑se que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, as disposições do Tratado FUE em matéria de livre circulação de pessoas não podem ser aplicadas a atividades que não apresentem qualquer conexão com uma das situações previstas pelo direito da União e cujos todos os elementos se situam no interior de um só Estado‑Membro. V., designadamente, acórdão de 6 de outubro de 2015, Brouillard (C‑298/14, EU:C:2015:652, n.° 26 e jurisprudência referida). V., também, tratando‑se das disposições do Tratado FUE em matéria de liberdade de estabelecimento, de livre prestação de serviços e de livre circulação de capitais, acórdão de 15 de novembro de 2016, Ullens de Schooten (C‑268/15, EU:C:2016:874, n.° 47).


31      V., no que respeita à conexão de uma sociedade à ordem jurídica de um Estado‑Membro, acórdãos de 9 de março de 1999, Centros (C‑212/97, EU:C:1999:126, n.° 20); de 5 de novembro de 2002, Überseering (C‑208/00, EU:C:2002:632, n.° 57); de 30 de setembro de 2003, Inspire Art (C‑167/01, EU:C:2003:512, n.° 97); e de 12 de dezembro de 2006, Test Claimants in Class IV of the ACT Group Litigation (C‑374/04, EU:C:2006:773, n.° 43).


32      V., a este respeito, artigo 8.°, n.° 2, do Regulamento (CE) n.° 593/2008 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de junho de 2008, sobre a lei aplicável às obrigações contratuais (Roma I) (JO 2008, L 177, p. 6), por força do qual, se a lei aplicável ao contrato individual de trabalho não tiver sido escolhida pelas partes, o contrato é regulado pela lei do país em que o trabalhador presta habitualmente o seu trabalho em execução do contrato ou, na sua falta, a partir do qual o trabalhador presta habitualmente o seu trabalho em execução do contrato.


33 —      V., a este respeito, n.os 74 e 75 das presentes conclusões.


34      Pelo contrário, a estrutura e a composição do capital da filial podem mostrar‑se pertinentes no que diz respeito à aplicabilidade de outras disposições do Tratado relativas às liberdades fundamentais. Assim, de acordo com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, incluem‑se no âmbito de aplicação material das disposições do Tratado relativas à liberdade de estabelecimento as disposições nacionais que se aplicam à detenção, por um nacional do Estado‑Membro em causa, de uma participação no capital de uma sociedade estabelecida noutro Estado‑Membro que lhe permita exercer uma influência real nas decisões dessa sociedade e determinar as respetivas atividades. V. acórdão de 29 de março de 2007, Rewe Zentralfinanz (C‑347/04, EU:C:2007:194, n.° 22 e jurisprudência referida). Em contrapartida, as disposições nacionais aplicáveis a participações efetuadas com a única finalidade de realizar uma aplicação financeira sem intenção de influenciar a gestão e o controlo da empresa devem ser examinadas exclusivamente à luz da liberdade de circulação de capitais. V. acórdão de 13 de novembro de 2012, Test Claimants in the FII Group Litigation (C‑35/11, EU:C:2012:707, n.° 92).


35      A este respeito, K. Erzberger salienta que a área de influência do referido conselho não está limitada ao território alemão, abrangendo antes a totalidade do grupo de sociedades, incluindo os estabelecimentos e as filiais situados noutros Estados‑Membros.


36      V., no que respeita ao alegado «défice de legitimação» do regime de participação alemão, devido à exclusão dos trabalhadores que prestam atividade fora do território alemão, Hellgardt, A., «Unionsrechtswidrigkeit der deutschen Mitbestimmung», e Hellwig, H.‑J‑., «Vorschlag zur Einbeziehung im Ausland tätiger Arbeitnehmer in die deutsche Unternehmensmitbestimmung: Inpflichtnahme des Vorstands anstelle der Betriebsverfassungsorgane zur Organisation der Wahlen», Deutsche Mitbestimmung unter europäischem Reformzwang, Fachmedien Recht und Wirtschaft, dfv Mediengruppe, Frankfurt am Main, 2016, p. 25, 26, 162 e 163, relatório da Kommission Mitbestimmung, Mitbestimmung und neue Unternehmenskulturen, Bilanz und Perspektiven, Verlag Bertelsmann Stiftung, Gütersloh, 1998, pp. 106 e 107, e proposta do grupo de trabalho «Unternehmerische Mitbestimmung» (ZIP 2009, p. 885), secção A.II.1.


37      Devo salientar que a análise apresentada nas presentes conclusões não visa o caso em que o trabalhador presta atividade num estabelecimento ou numa sucursal dependente situada num Estado‑Membro diferente daquele em que a sociedade está estabelecida, uma vez que esta situação não se verifica no processo principal. V. n.os 12 e 35 das presentes conclusões. Assim, não é de excluir que, no futuro, possa ser necessário clarificar a aplicabilidade do artigo 45.° TFUE nessa situação. Com efeito, na medida em que o trabalhador seria diretamente empregado pela sociedade, a própria relação de trabalho revestiria um caráter transfronteiriço.


38      V., neste sentido, acórdão de 15 de janeiro de 1986, Hurd (44/84, EU:C:1986:2, n.° 55 e jurisprudência referida).


39      Observo, a este respeito, que o raciocínio desenvolvido pelo Tribunal de Justiça no acórdão de 28 de junho de 1984, Moser (180/83, EU:C:1984:233), invocado pela TUI, não é aplicável nas circunstâncias do presente processo, uma vez que visa um caso concreto distinto do que está submetido à apreciação do Tribunal de Justiça no âmbito do presente processo.


40      Recorde‑se que o grupo TUI tem cerca de 10 103 trabalhadores na Alemanha e cerca de 39 536 trabalhadores nos outros Estados‑Membros da União. V. n.° 12 das presentes conclusões.


41      Segundo o artigo 45.°, n.° 3, alínea c), TFUE, «[a] livre circulação dos trabalhadores compreende, sem prejuízo das limitações justificadas por razões de ordem pública, segurança pública e saúde pública, o direito de» «[r]esidir num dos Estados‑Membros a fim de nele exercer uma atividade laboral, em conformidade com as disposições legislativas, regulamentares e administrativas que regem o emprego dos trabalhadores nacionais» (o sublinhado é meu). Por outro lado, considero que esta disposição é muito pertinente, na medida em que se trata de determinar se a legislação impugnada implica uma restrição à livre circulação dos trabalhadores. V., a este respeito, n.os 74 e segs. das presentes conclusões.


42      Exceto no que diz respeito à sociedade europeia (SE), à sociedade cooperativa europeia (SCE), às empresas de dimensão comunitária e aos grupos de empresas de dimensão comunitária, bem como às fusões transfronteiriças das sociedades de responsabilidade limitada, a questão da participação dos trabalhadores da sociedade não é objeto, salvo erro da minha parte, de uma regulamentação ao nível europeu. V., a este respeito, respetivamente, Diretiva 2001/86/CE do Conselho, de 8 de outubro de 2001, que completa o estatuto da sociedade europeia no que respeita ao envolvimento dos trabalhadores (JO 2001, L 294, p. 22), Diretiva 2003/72/CE, do Conselho, de 22 de julho de 2003, que completa o estatuto da sociedade cooperativa europeia no que respeita ao envolvimento dos trabalhadores (JO 2003, L 207, p. 25), Diretiva 2009/38/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de maio de 2009, relativa à instituição de um Conselho de Empresa Europeu ou de um procedimento de informação e consulta dos trabalhadores nas empresas ou grupos de empresas de dimensão comunitária (JO 2009, L 122, p. 28) e artigo 16.° da Diretiva 2005/56/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de outubro de 2005, relativa às fusões transfronteiriças das sociedades de responsabilidade limitada (JO 2005, L 310, p. 1).


43      V., neste sentido, acórdão de 26 de fevereiro de 2015, Martens (C‑359/13, EU:C:2015:118, n.° 23).


44      V. n.os 39 e 40 das presentes conclusões.


45      V., designadamente, acórdão de 26 de maio de 2016, Kohll e Kohll‑Schlesser (C‑300/15, EU:C:2016:361, n.° 36 e jurisprudência referida).


46      V., designadamente, acórdão de 17 de março de 2005, Kranemann (C‑109/04, EU:C:2005:187, n.° 26 e jurisprudência referida).


47      V., designadamente, acórdão de 10 de março de 2011, Casteels (C‑379/09, EU:C:2011:131, n.° 22 e jurisprudência referida).


48      Além da perda de influência e de prestígio, um trabalhador membro do conselho de supervisão também perderia, segundo K. Erzberger, os direitos pecuniários relativos à sua participação neste conselho, em caso de transferência para outro Estado‑Membro. Segundo esta parte, os membros do conselho de supervisão da TUI obtêm, segundo os estatutos da sociedade demandada, uma compensação fixa de 50 000 euros anuais, acrescidos de uma compensação em função das prestações fornecidas, à qual se acrescentariam, ainda, as senhasde presença. Os presidentes e os seus representantes obteriam um múltiplo desta compensação.


49 —      O sublinhado é meu. V., também, artigo 2.° do Regulamento n.° 492/2011, por força do qual «[o]s nacionais de um Estado‑Membro e as entidades patronais que exerçam uma atividade no território de um Estado‑Membro podem trocar os seus pedidos e ofertas de emprego, celebrar e executar contratos de trabalho em conformidade com as disposições legislativas, regulamentares e administrativas em vigor, sem que disso possa resultar qualquer discriminação» (o sublinhado é meu).


50      Conclusões do advogado‑geral N. Fennelly no processo Graf (C‑190/98, EU:C:1999:423, n.° 32).


51      V., designadamente, acórdão de 28 de junho de 1978, Kenny (1/78, EU:C:1978:140, n.° 18).


52      V. acórdão de 17 de outubro de 1995, Fishermen’s Organisations e o. (C‑44/94, EU:C:1995:325, n.° 45 e jurisprudência referida).


53      V., designadamente, neste sentido, acórdão de 13 de julho de 2016, Pöpperl (C‑187/15, EU:C:2016:550, n.° 24). V., também, em matéria de tributação, acórdãos de 26 de abril de 2007, Alevizos (C‑392/05, EU:C:2007:251, n.° 76 e jurisprudência referida), e de 2 de março de 2017, Eschenbrenner (C‑496/15, EU:C:2017:152, n.° 46).


54      V. n.os 42 a 44 das presentes conclusões.


55      V. n.os 53 a 54 das presentes conclusões.


56       V. nota 42 das presentes conclusões. Saliento que a Comissão propôs, em 1972, uma harmonização parcial das regras dos Estados‑Membros relativas à participação dos trabalhadores na nomeação ou na revogação de membros do órgão de fiscalização das sociedades anónimas, proposta essa que não obteve, contudo, o apoio do Conselho. V., designadamente, oitavo considerando e artigo 4.° da proposta, apresentada pela Comissão em 9 de outubro de 1972, de uma Quinta Diretiva tendente a coordenar as garantias que, para proteção dos interesses dos sócios e de terceiros, são exigidas nos Estados‑Membros às sociedades, na aceção do n.° 2 do artigo 58.° do Tratado, no que respeita à estrutura das sociedades anónimas e aos poderes e obrigações dos seus órgãos [COM(1972) 887]. A proposta foi retirada pela comunicação da Comissão de 21 de dezembro de 2001 [COM(2001) 763 final/2].


57      Saliento que as legislações dos Estados‑Membros em matéria de participação dos trabalhadores são objeto de divergências consideráveis. V., a este respeito, anexo III do relatório final do grupo de peritos, Sistemas Europeus de Participação dos Trabalhadores, de maio de 1997 (relatório Davignon) (C4‑0455/97) e ponto 3.2 do relatório do Reflection Group On the Future of EU Company Law, de 5 de abril de 2011, ambos elaborados por iniciativa da Comissão. Os dois relatórios fazem expressamente menção ao regime de participação alemão. V., também, UnternehmensMitbestimmung der Arbeitnehmer im Recht der EUMitgliedstaaten (suprarreferido, nota 14) e Wansleben, T., «Arbeitnehmermitbestimmung auf Organebene in den Mitgliedstaaten der Europäischen Union im Rechtsvergleich», Deutsche Mitbestimmung unter europäischem Reformzwang (suprarreferido, nota 36), pp. 108 a 134.


58      Determinados Estados‑Membros conferem efetivamente aos trabalhadores que prestam atividade noutros Estados‑Membros o direito de voto e de elegibilidade nas eleições para os órgãos de administração ou de gestão das sociedades nacionais. V., no que respeita à Dinamarca, artigo 140.°, n.° 1, e artigo 141.°, n.os 1 e 3, do lovbekendtgørelse nr. 1089 om aktie‑ og anpartsselskaber (selskabsloven) (Decreto‑lei n.° 1089 das sociedades), de 14 de setembro de 2015, e artigos 2.°, 15.°, 16.° e 48.° do bekendtgørelse nr. 344 om medarbejderrepræsentation i aktie‑ og anpartsselskaber (Decreto n.° 344 sobre a representação dos trabalhadores nas sociedades), de 30 de março de 2012. Ao abrigo destas disposições, os trabalhadores que prestam atividade em estabelecimentos de uma sociedade dinamarquesa situados noutros Estados‑Membros da União e do Espaço Económico Europeu (EEE) estão incluídos no regime de participação no órgão de gestão desta sociedade. Além disso, a assembleia geral da sociedade dinamarquesa também pode decidir incluir os trabalhadores que prestam atividade em filiais desta sociedade situadas noutros Estados‑Membros da União e do EEE no regime de participação no órgão de gestão da sociedade‑mãe dinamarquesa. O Órgão de Fiscalização da EFTA refere que a legislação norueguesa também prevê a possibilidade de submeter os trabalhadores do grupo que prestam atividade no estrangeiro ao regime de participação no órgão de supervisão da sociedade‑mãe norueguesa.


59      Com vista a ser exaustivo, saliento que, nessa hipótese, a jurisprudência Graf (acórdão de 27 de janeiro de 2000, C‑190/98, EU:C:2000:49, n.os 24 e 25 e jurisprudência referida), invocada por várias partes e interessados, não é aplicável a uma regulamentação como a que está em causa no processo principal. Com efeito, a perda do direito de voto e de elegibilidade nas eleições para os representantes dos trabalhadores no conselho de supervisão da sociedade e, sendo caso disso, a perda do mandato neste conselho, em caso de transferência do trabalhador para outro Estado‑Membro, não pode ser considerada, em meu entender, uma circunstância muito aleatória ou indireta na aceção desta jurisprudência. V., a este respeito, acórdão de 1 de abril de 2008, Gouvernement de la Communauté française e Gouvernement wallon (C‑212/06, EU:C:2008:178, n.° 51). V., também, num sentido análogo, a propósito da livre circulação de capitais, consagrada nos artigos 63.° e segs. TFUE, acórdão de 14 de fevereiro de 2008, Comissão/Espanha (C‑274/06, não publicado, EU:C:2008:86, n.° 24).


60      V., neste sentido, acórdão de 5 de dezembro de 2013, Zentralbetriebsrat der gemeinnützigen Salzburger Landeskliniken (C‑514/12, EU:C:2013:799, n.os 35 e 36 e jurisprudência referida).


61      Recorde‑se que o artigo 45.°, n.° 3, TFUE admite restrições justificadas por razões de ordem pública, de segurança pública e de saúde pública.


62      É feita referência, designadamente, aos acórdãos de 24 de novembro de 1992, Poulsen e Diva Navigation (C‑286/90, EU:C:1992:453, n.os 9, 28 e 29); de 14 de julho de 1994, Peralta (C‑379/92, EU:C:1994:296, n.os 46 e 47); de 5 de outubro de 1994, van Schaik (C‑55/93, EU:C:1994:363, n.° 16); de 13 de dezembro de 2005, Marks & Spencer (C‑446/03, EU:C:2005:763, n.os 36 e segs.); e de 29 de novembro de 2011, National Grid Indus (C‑371/10, EU:C:2011:785, n.os 43 e segs.).


63      A este respeito, a Comissão considera que este órgão jurisdicional deveria, designadamente, verificar se, de um ponto de vista prático e organizacional, a participação ao abrigo da regulamentação alemã pode ser alargada aos trabalhadores que prestam atividade noutros Estados‑Membros.


64       V. n.° 21 das presentes conclusões.


65      V. n.° 83 das presentes conclusões. Além disso, as diretivas relativas ao envolvimento dos trabalhadores na sociedade europeia (SE) e na sociedade cooperativa europeia (SCE) também não preveem a aplicação do regime nacional de participação aos trabalhadores que prestam atividade noutros Estados‑Membros. V., designadamente, as disposições supletivas previstas na parte 1, alíneas a) e b), primeiro parágrafo, do anexo das Diretivas 2001/86 e 2003/72. O mesmo se aplica no que diz respeito à instituição do conselho de empresa europeu nas empresas e grupos de dimensão comunitária, segundo as prescrições subsidiárias adotadas pelos Estados‑Membros por força da Diretiva 2009/38. V. ponto 1, alínea b), do anexo I desta última diretiva.


66      V., designadamente, acórdão de 13 de dezembro de 2005, Marks & Spencer (C‑446/03, EU:C:2005:763, n.° 39). Por uma questão de exaustividade, devo esclarecer que o reconhecimento por parte do Tribunal de Justiça do princípio da territorialidade não se limita ao domínio da fiscalidade. No entanto, a jurisprudência relativa ao referido princípio noutros domínios não diz respeito às liberdades fundamentais do Tratado e não apresenta, assim, qualquer interesse para o presente processo.


67      V., designadamente, acórdãos de 7 de setembro de 2006, N (C‑470/04, EU:C:2006:525, n.os 41 a 46); de 29 de novembro de 2011, National Grid Indus (C‑371/10, EU:C:2011:785, n.os 45 a 48); de 16 de abril de 2015, Comissão/Alemanha (C‑591/13, EU:C:2015:230, n.os 64 e 65); e de 8 de junho de 2016, Hünnebeck (C‑479/14, EU:C:2016:412, n.° 65). V., também, acórdão de 21 de março de 2002, Cura Anlagen (C‑451/99, EU:C:2002:195, n.° 40), em que o Tribunal de Justiça declarou que é permitido aos Estados‑Membros «repartir entre si esta competência fiscal com base em critérios como o território no qual o veículo é realmente utilizado ou a residência do condutor, que constituem alguns dos vários elementos do princípio da territorialidade» (o sublinhado é meu).


68      V. acórdão de 29 de março de 2007, Rewe Zentralfinanz (C‑347/04, EU:C:2007:194, n.° 69). Neste contexto, o Tribunal de Justiça faz referência às conclusões do advogado‑geral M. Poiares Maduro no processo Rewe Zentralfinanz (C‑347/04, EU:C:2006:350, n.° 49).


69      V., designadamente, neste sentido, acórdão de 21 de dezembro de 2016, Comissão/Portugal (C‑503/14, EU:C:2016:979, n.os 50 e 51 e jurisprudência referida).


70      V., designadamente, acórdão de 16 de abril de 2015, Comissão/Alemanha (C‑591/13, EU:C:2015:230, n.° 65 e jurisprudência referida).


71      A este respeito, o presente processo distingue‑se do que deu origem ao acórdão de 14 de julho de 1994, Peralta (C‑379/92, EU:C:1994:296), invocado pela TUI e pelo Governo alemão.


72      V., a este respeito, acórdãos de 29 de março de 2007, Rewe Zentralfinanz (C‑347/04, EU:C:2007:194, n.° 69), e de 8 de junho de 2016, Hünnebeck (C‑479/14, EU:C:2016:412, n.° 66). Recorde‑se que determinados Estados‑Membros da União e do EEE conferem, efetivamente, aos trabalhadores que prestam atividade noutros Estados‑Membros o direito de voto e de elegibilidade nas eleições para os órgãos de administração ou de gestão das sociedades nacionais. V. nota 58 das presentes conclusões.


73      O Governo alemão faz referência, designadamente, ao Dritte Wahlordnung zum Mitbestimmungsgesetz (3. WOMitbestG) (Terceiro Regulamento Eleitoral relativo à aplicação da lei sobre a participação) de 27 de maio de 2002 (BGB1. 2002 I, p. 1741), na redação que lhe foi dada pelo Verordnung (regulamento) de 26 de agosto de 2015 (BGB1. 2015 I, p. 1443).


74      O Governo faz menção, designadamente, à obrigação de a filial apoiar o estabelecimento de conselhos eleitorais, de fornecer listas de pessoas e outros dados, com vista a que estes conselhos possam estabelecer listas eleitorais, em conformidade com as disposições alemãs pertinentes, e de dar licença com vencimento aos trabalhadores para poderem realizar as tarefas do conselho eleitoral.


75      Na audiência, o Governo alemão reconheceu, em resposta a uma questão colocada pelo Tribunal de Justiça, que, na medida em que a participação seria organizada de forma a que a direção da sociedade‑mãe atribuísse o direito de voto e de elegibilidade aos trabalhadores que prestam atividade nas suas filiais no estrangeiro e que ela própria organizasse a eleição, não existia ingerência nas competências de outros Estados‑Membros.


76      V. n.° 88 das presentes conclusões.


77      V. n.° 88 das presentes conclusões.


78      Recorde‑se que a salvaguarda da identidade nacional dos Estados‑Membros também foi reconhecida na jurisprudência do Tribunal de Justiça como constituindo um objetivo legítimo respeitado pela ordem jurídica da União. V. acórdão de 2 de julho de 1996, Comissão/Luxemburgo (C‑473/93, EU:C:1996:263, n.° 35). V., ainda, no que respeita ao artigo 4.°, n.° 2, TUE, acórdãos de 22 de dezembro de 2010, Sayn‑Wittgenstein (C‑208/09, EU:C:2010:806, n.° 92); de 12 de maio de 2011, Runevič‑Vardyn e Wardyn (C‑391/09, EU:C:2011:291, n.° 86); e de 2 de junho de 2016, Bogendorff von Wolffersdorff (C‑438/14, EU:C:2016:401, n.° 73).


79      Apoiando‑se na decisão do Bundesverfassungsgericht (Tribunal Constitucional Federal, Alemanha) de 1 de março de 1979 (1 BvR 532/77, 1 BvL 21/78, 1 BvR 419/78, e 1 BvR 533/77) (NJW 1979, p. 699), n.° 189, o Governo alemão salienta que a legislação em matéria de participação dos trabalhadores tem como objetivo atenuar, através de uma participação institucionalizada nas decisões empresariais, o poder decisório de terceiros que, nas sociedades com uma certa dimensão, é inerente ao facto de os trabalhadores estarem sujeitos ao poder de direção e de organização de pessoas externas à sociedade e de substituir a legitimação económica da direção da sociedade por uma legitimação social. V., no que respeita ao desenvolvimento do regime de participação alemão, capítulo 3 do relatório da Kommission Mitbestimmung, Mitbestimmung und neue Unternehmenskulturen, Bilanz und Perspektiven (suprarreferido, nota 36 das presentes conclusões).


80      O Governo faz ainda menção ao facto de, numa carta aberta comum, as organizações setoriais dos parceiros sociais alemães terem qualificado o referido regime como pilar social essencial do sistema social e do mercado de trabalho alemão. Ainda segundo este Governo, o Presidente alemão terá também referido que a participação representava um elemento de cultura nacional sólido, com um elemento fundador de identidade.


81      V., designadamente, n.° 17 da Carta Comunitária dos Direitos Sociais Fundamentais dos Trabalhadores, à qual é feita referência no artigo 151.°, primeiro parágrafo, TFUE. V., por outro lado, artigo 153.°, n.° 1, alínea f), TFUE. V., ainda, artigo 27.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, relativo ao direito à informação e à consulta dos trabalhadores na empresa.


82      V., designadamente, artigo 151.°, segundo parágrafo, TFUE e artigo 152.°, primeiro parágrafo, TFUE.


83      V. considerandos 5 e 9 das Diretivas 2001/86 e 2003/72. V., no que respeita ao princípio da subsidiariedade, considerando 20 da Diretiva 2009/38. Saliento que, ao contrário desta última diretiva, as Diretivas 2001/86 e 2003/72 foram adotadas não com base nas disposições do TFUE relativas à política social, mas sim com base no artigo 352.° TFUE.


84      V., no que respeita às divergências entre as legislações dos Estados‑Membros na matéria, nota 57 das presentes conclusões.


85      Recorde‑se que, por força da regulamentação alemã em matéria de participação, aos trabalhadores incluídos no regime de participação é atribuído, numa situação como a que está em causa no processo principal, o direito de designar, conjuntamente com os sindicatos, metade dos membros do conselho de supervisão da sociedade. V. n.° 8 das presentes conclusões.


86      V. nota 73 das presentes conclusões.


87      Segundo o Governo alemão, num grupo de uma determinada importância, as eleições dos referidos membros duram entre seis e doze meses e as preparações começam, na prática, ainda bem mais cedo.


88      V., neste sentido, acórdãos 14 de julho de 1981, Oebel (155/80, EU:C:1981:177, n.° 12), e de 23 de novembro de 1989, B & Q (C‑145/88, EU:C:1989:593, n.° 14).


89      V. acórdão de 2 de junho de 2016, Bogendorff von Wolffersdorff (C‑438/14, EU:C:2016:401, n.° 73 e jurisprudência referida).