Language of document : ECLI:EU:C:2022:614

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Décima Secção)

1 de agosto de 2022 (*)

«Reenvio prejudicial — Fiscalidade — Imposto sobre o valor acrescentado (IVA) — Diretiva 2006/112/CE — Artigo 56.o — Prestações de serviços de seguros — Lugar de conexão para efeitos fiscais — Serviços de regularização de sinistros prestados por sociedades terceiras em nome e por conta de uma seguradora»

No processo C‑267/21,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pela Înalta Curte de Casaţie şi Justiţie (Tribunal Superior de Cassação e Justiça, Roménia), por Decisão de 25 de março de 2021, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 23 de abril de 2021, no processo

Uniqa Asigurări SA

contra

Agenţia Naţională de Administrare Fiscală — Direcţia Generală de Soluţionare a Contestaţiilor,

Direcţia Generală de Administrare a Marilor Contribuabili,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Décima Secção),

composto por: I. Jarukaitis, presidente de secção, M. Ilešič e Z. Csehi (relator), juízes,

advogado‑geral: A. M. Collins,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

–        em representação da Uniqa Asigurări SA, por R. Bufan, avocat,

–        em representação do Governo romeno, por E. Gane e A. Rotăreanu, na qualidade de agentes,

–        em representação da Comissão Europeia, por A. Armenia e E. A. Stamate, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 59.o da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (JO 2006, L 347, p. 1), conforme alterada pela Diretiva 2008/8/CE do Conselho, de 12 de fevereiro de 2008 (JO 2008, L 44, p. 11).

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Uniqa Asigurări SA (a seguir «Uniqa»), com sede na Roménia, à Agenţia Naţională de Administrare Fiscală — Direcţia Generală de Soluţionare a Contestaţiilor (Agência Nacional da Administração Tributária — Direção‑Geral de Resolução de Reclamações, Roménia) e à Direcţia Generală de Administrare a Marilor Contribuabili (Agência Nacional da Administração Fiscal — Direção‑Geral dos Grandes Contribuintes, Roménia) (a seguir, em conjunto, «Administração Tributária»), a respeito da determinação do lugar onde se deve considerar que a prestação de serviços foi efetuada para efeitos da cobrança do imposto sobre o valor acrescentado (IVA).

 Quadro jurídico

 Direito da União

 Sexta Diretiva

3        O artigo 9.o, sob a epígrafe «Prestações de serviços», da Sexta Diretiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios — sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria coletável uniforme (JO 1977, L 145, p. 1; a seguir «Sexta Diretiva»), dispunha:

«1.      Por “lugar da prestação de serviços” entende‑se o lugar onde o prestador dos mesmos tenha a sede da sua atividade económica ou um estabelecimento estável a partir do qual os serviços são prestados ou, na falta de sede ou de estabelecimento estável, o lugar do seu domicílio ou da sua residência habitual.

2.      Todavia:

[…]

c)      Por lugar das prestações de serviços que tenham como objeto:

[…]

–        peritagens relativas a bens móveis corpóreos;

[…]

entende‑se o lugar onde as referidas prestações de serviços são materialmente executadas;

e)      Por lugar das prestações de serviços a seguir referidas, efetuadas a destinatários estabelecidos fora da Comunidade ou a sujeitos passivos estabelecidos na Comunidade, mas fora do país do prestador, entende‑se o lugar onde o destinatário tenha a sede da sua atividade económica ou um estabelecimento estável para o qual o serviço tenha sido prestado ou, na falta de sede ou de estabelecimento estável, o lugar do seu domicílio ou da sua residência habitual:

[…]

–        prestações de serviços de consultores, engenheiros, gabinetes de estudo, advogados, peritos contabilistas e demais prestações similares e, bem assim, o tratamento de dados e o fornecimento de informações;

[…]»

4        A Sexta Diretiva foi revogada e substituída pela Diretiva 2006/112, que entrou em vigor em 1 de janeiro de 2007.

 Diretiva 2006/112/CE

5        O título V da Diretiva 2006/112, intitulado «Lugar das operações tributáveis», incluía, nomeadamente, um capítulo 3, intitulado «Lugar das prestações de serviços», no qual figuravam os artigos 43.o a 59.o desta diretiva.

6        O artigo 56.o, n.o 1, alínea c) da referida diretiva dispunha:

«O lugar das prestações de serviços adiante enumeradas, efetuadas a destinatários estabelecidos fora da [União Europeia] ou a sujeitos passivos estabelecidos na [União], mas fora do país do prestador, é o lugar onde o destinatário tem a sede da sua atividade económica ou dispõe de um estabelecimento estável para o qual foi prestado o serviço ou, na falta de sede ou de estabelecimento estável, o lugar onde tem domicílio ou residência habitual:

[…]

c)      Prestações de serviços de consultores, engenheiros, gabinetes de estudo, advogados, peritos contabilistas e outras prestações similares e, bem assim, tratamento de dados e fornecimento de informações;

[…]»

7        O artigo 59.o, alínea c), da Diretiva 2006/112, conforme alterada pela Diretiva 2008/8, dispõe, a partir de 1 de janeiro de 2010:

«O lugar das prestações dos serviços a seguir enumerados, efetuadas a pessoas que não sejam sujeitos passivos e estejam estabelecidas ou tenham domicílio ou residência habitual fora da [União], é o lugar onde essas pessoas estão estabelecidas ou têm domicílio ou residência habitual:

[…]

c)      Prestações de serviços de consultores, engenheiros, gabinetes de estudo, advogados, peritos contabilistas e outras prestações similares e, bem assim, tratamento de dados e fornecimento de informações;

[…]»

 Direito romeno

8        O artigo 133.o da Legea nr. 571/2003 privind Codul fiscal (Lei n.o 571/2003 que Aprova o Código Tributário), na sua versão aplicável ao litígio no processo principal (a seguir «Código Tributário»), dispõe:

«(1)      Considera‑se lugar da prestação do serviço o lugar onde o prestador tem a sua sede ou onde dispõe de um estabelecimento a partir do qual é efetuada a prestação de serviços.

(2)      Em derrogação do disposto no n.o 1, em relação às seguintes prestações, considera‑se lugar da prestação:

[…]

g)      o lugar onde o cliente beneficiário dos serviços tem a sua sede ou dispõe de um estabelecimento, desde que o cliente em causa tenha a sua sede ou disponha de um estabelecimento fora da [União] ou seja um sujeito passivo agindo nessa qualidade, [ou] tenha a sua sede ou um estabelecimento na [União], mas não no mesmo Estado do prestador, no caso dos seguintes serviços:

[…]

5.      prestações de serviços de consultores, engenheiros, juristas e advogados, técnicos de contas e revisores de contas, gabinetes de estudo e outras prestações similares;

[…]»

 Litígio no processo principal e questões prejudiciais

9        A Uniqa propõe, na Roménia, apólices de seguro que cobrem acidentes rodoviários e despesas médicas fora do território deste Estado‑Membro.

10      Quanto aos seguros de responsabilidade civil que resultam da circulação de veículos automóveis, a Uniqa celebrou acordos de parceria com 26 sociedades cuja sede se situa fora do território romeno (a seguir «sociedades parceiras»). Estas sociedades parceiras procedem à regularização dos sinistros dos clientes da Uniqa no país onde ocorre o acidente. Gerem os pedidos de indemnização procedendo, nomeadamente, à abertura de processos de reclamação, à verificação da validade da apólice do seguro, ao exame das causas e circunstâncias do sinistro, à constatação dos danos, à avaliação dos danos, à proposta de soluções de substituição ou reparação, à elaboração de uma estimativa da indemnização, à verificação do orçamento, bem como à indemnização das reparações e à análise do direito de regresso. Quando estão em causa danos materiais provocados por um acidente de montante inferior ou igual a 15 000 euros, estas sociedades parceiras têm autonomia para aprovar ou recusar os pedidos de indemnização, sendo responsáveis, tanto perante os segurados como perante a Uniqa, pela fundamentação e pelo montante dos pagamentos efetuados no contexto da regularização de sinistros. Relativamente aos danos materiais de montante superior a 15 000 euros, as referidas sociedades são obrigadas a cooperar com a Uniqa para efeitos de regularização dos pedidos de indemnização.

11      Quanto aos seguros de saúde, a Coris International gere, em nome e por conta da Uniqa, os pedidos de indemnização apresentados pelos tomadores de seguro. Em particular, a Coris International compromete‑se a garantir aos segurados uma assistência 24 horas por dia, bem como a prestar‑lhes assistência técnica, organizativa e jurídica. Além disso, esta sociedade fixa o montante das indemnizações, garante o respetivo pagamento e informa a Uniqa dos factos ocorridos.

12      A Uniqa não declarou o IVA devido ao abrigo do regime de autoliquidação das prestações que lhe tinham sido faturadas pelas sociedades parceiras e pela Coris International, no período compreendido entre 1 de janeiro de 2007 e 31 de dezembro de 2009, pelos seus honorários de gestão e de regularização das reclamações, com o fundamento de que, em conformidade com o artigo 133.o, n.o 1, do Código Tributário, o lugar dessas prestações era o lugar de estabelecimento do prestador de serviços.

13      Na sequência de uma inspeção relativa ao período compreendido entre 1 de janeiro de 2007 e 31 de dezembro de 2011, a Administração Tributária exigiu à Uniqa o pagamento de IVA suplementar no montante total de 3 439 412 lei romenos (RON) (cerca de 698 596 euros), bem como o pagamento de obrigações acessórias no montante total de 3 706 077 RON (cerca de 752 760 euros) relativo às prestações mencionadas no número anterior.

14      A Administração Tributária considerou que não era aplicável a regra geral prevista no artigo 133.o, n.o 1, do Código Tributário, mas sim a exceção enunciada no artigo 133.o, n.o 2, alínea g), ponto 5, do mesmo código. Por conseguinte, considerou que o lugar da prestação dos serviços prestados pelas sociedades parceiras e pela Coris International se situava no Estado‑Membro em que o destinatário desses serviços está estabelecido, a saber, na Roménia.

15      Por Decisão de 15 de setembro de 2016, foi indeferida a reclamação fiscal apresentada pela Uniqa contra as notas de liquidação e contra o auto de inspeção fiscal no qual era exigido o pagamento dos montantes mencionados no n.o 13 do presente acórdão. Em 23 de dezembro de 2016, a Uniqa interpôs recurso de anulação desta decisão, bem como da nota de liquidação e do auto de inspeção fiscal, perante a Curtea de Apel București (Tribunal de Recurso de Bucareste, Roménia).

16      Por Acórdão de 19 de junho de 2018, este órgão jurisdicional confirmou que o lugar da prestação dos serviços de regularização dos sinistros é o lugar onde o destinatário tem a sua sede, no caso em apreço a Roménia, considerando que tais prestações eram análogas às dos engenheiros, mencionadas no artigo 9.o, n.o 2, alínea e), terceiro travessão, da Sexta Diretiva, conforme interpretado no Acórdão de 7 de outubro de 2010, Kronospan Mielec (C‑222/09, EU:C:2010:593). Assim sendo, a Curtea de Apel București (Tribunal de Recurso de Bucareste) anulou parcialmente os atos da Administração Tributária mencionados no n.o 15 do presente acórdão, com base na duração injustificada da inspeção fiscal, e negou provimento ao recurso quanto ao restante.

17      Quer a Uniqa quer a Administração Tributária interpuseram recurso deste acórdão no órgão jurisdicional de reenvio.

18      Este último salienta que o Tribunal de Justiça já interpretou as exceções relativas à determinação do lugar da prestação de serviços. Em particular, declarou no seu Acórdão de 16 de setembro de 1997, von Hoffmann (C‑145/96, EU:C:1997:406), que a expressão «demais prestações similares» não visava profissões, como as de advogados, de consultores, de peritos contabilistas ou de engenheiros, mas unicamente prestações. Além disso, esta expressão não se refere a nenhum elemento comum das atividades heterogéneas mencionadas na Sexta Diretiva, mas a prestações similares relativamente a cada uma destas atividades, consideradas separadamente.

19      Todavia, esta jurisprudência não permite resolver o problema, suscitado no litígio no processo principal, da qualificação de prestações de serviços complexos que comportam atividades múltiplas que devem ser analisadas como um todo, tais como as relativas à gestão e à regularização dos sinistros prestadas pelas sociedades parceiras e pela Coris International.

20      Nestas circunstâncias, o Înalta Curte de Casație și Justiție (Tribunal Superior de Cassação e Justiça) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«No âmbito da interpretação das disposições do artigo 59.o da Diretiva [2006/112, conforme alterada pela Diretiva 2008/8,] podem os serviços de regularização de sinistros prestados por sociedades [parceiras] a uma sociedade de seguros, em nome e por conta desta última, ser abrangidos pela categoria das prestações de serviços de consultores, engenheiros, gabinetes de estudo, advogados, peritos contabilistas e outras prestações similares e, bem assim, tratamento de dados e fornecimento de informações?»

 Quanto à questão prejudicial

21      Há que recordar que, segundo jurisprudência constante, no âmbito do processo de cooperação entre os órgãos jurisdicionais nacionais e o Tribunal de Justiça instituído pelo artigo 267.o TFUE, cabe a este dar ao juiz nacional uma resposta útil que lhe permita decidir o litígio que lhe foi submetido. Nesta ótica, incumbe ao Tribunal, se necessário, reformular as questões que lhe são submetidas. Além disso, o Tribunal pode ser levado a tomar em consideração normas de direito da União a que o juiz nacional não fez referência no enunciado da sua questão (Acórdão de 15 de julho de 2021, Ministrstvo za obrambo, C‑742/19, EU:C:2021:597, n.o 31 e jurisprudência referida).

22      A este respeito, importa salientar que o artigo 59.o da Diretiva 2006/112, conforme alterada pela Diretiva 2008/8, se tornou aplicável a partir de 1 de janeiro de 2010. Ora, resulta das indicações dadas pelo órgão jurisdicional de reenvio que o litígio no processo principal se refere ao facto de a Uniqa não ter declarado o IVA que incidia sobre as prestações das sociedades parceiras e da Coris International no período compreendido entre 1 de janeiro de 2007 e 31 de dezembro de 2009. Nestas condições, do ponto de vista da aplicação da lei no tempo, esta disposição não é aplicável ao litígio no processo principal.

23      No entanto, tendo em conta os factos em causa no processo principal e a redação da questão submetida, há que constatar que é a interpretação do artigo 56.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2006/112 que é pertinente para a solução deste litígio.

24      Nestas condições, a fim de dar ao órgão jurisdicional de reenvio uma resposta útil que lhe permita decidir o litígio que lhe foi submetido, há que reformular a questão submetida e considerar que, através desta, este órgão jurisdicional pergunta, em substância, se o artigo 56.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2006/112 deve ser interpretado no sentido de que os serviços de regularização de sinistros prestados por sociedades terceiras, em nome e por conta de uma sociedade de seguros, são abrangidos pela categoria das «prestações de serviços de consultores, engenheiros, gabinetes de estudo, advogados, peritos contabilistas e outras prestações similares e, bem assim, [de] tratamento de dados e [de] fornecimento de informações» prevista nesta disposição.

25      Para responder a esta questão, cumpre começar por recordar que o artigo 56.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2006/112 não visa profissões, como as de advogados, consultores, peritos contabilistas ou engenheiros, mas sim prestações de serviços. O legislador da União utiliza as profissões que são mencionadas nesta disposição como um meio para definir as categorias de prestações de serviços que nela são referidas (v., por analogia, Acórdão de 7 de outubro de 2010, Kronospan Mielec, C‑222/09, EU:C:2010:593, n.o 19 e jurisprudência referida).

26      Por conseguinte, importa determinar se os serviços de regularização de sinistros prestados em nome e por conta de uma sociedade de seguros estão abrangidos pelas prestações de serviços que são principal e habitualmente efetuadas no quadro das profissões enumeradas no artigo 56.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2006/112 (v., por analogia, Acórdão de 16 de setembro de 1997, von Hoffmann, C‑145/96, EU:C:1997:406, n.o 16 e jurisprudência referida).

27      A este respeito, importa precisar, a título preliminar, que, tendo em conta a dupla circunstância de, por um lado, cada prestação de serviço normalmente dever ser considerada distinta e independente e, por outro, de a operação constituída por uma só prestação de serviço no plano económico não dever ser artificialmente dividida, para que o funcionamento do sistema do IVA não seja alterado, importa averiguar os elementos característicos da operação em causa para determinar se as prestações de serviços fornecidas constituem várias prestações principais distintas ou uma prestação única. Em particular, no quadro da cooperação instituída em virtude do artigo 267.o TFUE, incumbe aos órgãos jurisdicionais nacionais determinar se o sujeito passivo fornece uma prestação única num caso específico e proceder com caráter definitivo a todas as apreciações da matéria de facto a esse respeito (v., neste sentido, Acórdão de 27 de setembro de 2012, Field Fisher Waterhouse, C‑392/11, EU:C:2012:597, n.os 18 e 20 e jurisprudência referida).

28      Ora, segundo o órgão jurisdicional de reenvio, os serviços de regularização de sinistros em causa no processo principal constituem prestações de serviços complexas, que incluem atividades múltiplas que devem ser analisadas como um todo. Em particular, como referido nos n.os 10 e 11 do presente acórdão, os serviços prestados pelas sociedades parceiras abrangem todas as atividades de regularização dos sinistros que envolvam os clientes da Uniqa nos países onde esses sinistros ocorram. Estes serviços comportam igualmente a possibilidade de exercício de um poder decisório, na medida em que exigem, relativamente aos danos materiais de montante inferior ou igual a 15 000 euros causados por um sinistro, a aprovação ou recusa dos pedidos de indemnização. Do mesmo modo, no que se refere aos seguros de saúde, a Coris International gere, em nome e por conta da Uniqa, os pedidos de indemnização apresentados pelos tomadores de seguro, prestando todos os serviços de assistência técnica, organizativa e jurídica necessários.

29      Feita esta precisão preliminar, importa em primeiro lugar recordar que o exercício da profissão de engenheiro abrange prestações caracterizadas, não só pela aplicação de conhecimentos e processos existentes a problemas concretos, mas também pela aquisição de novos conhecimentos e pelo desenvolvimento de novos procedimentos para resolver esse problemas ou problemas novos (Acórdão de 7 de outubro de 2010, Kronospan Mielec, C‑222/09, EU:C:2010:593, n.o 21).

30      Ora, os serviços de regularização de sinistros prestados em nome e por conta de uma companhia de seguros, como os indicados nos n.os 10 e 11 do presente acórdão, não estão incluídos no tipo de prestações que correspondem a tais características. Em particular, embora não seja de excluir que a avaliação dos danos resultantes de um acidente rodoviário possa ser realizada por um engenheiro, tal atividade não se enquadra, manifestamente, nas prestações que são principal e habitualmente efetuadas no âmbito desta profissão, como identificadas no número anterior do presente acórdão. Além disso, também não é de considerar tal possibilidade no que diz respeito à avaliação dos pacientes no contexto de um seguro de saúde para as viagens no estrangeiro.

31      Por conseguinte, há que constatar que os serviços de regularização de sinistros prestados em nome e por conta de uma sociedade de seguros não estão abrangidos pelo conceito de prestações de serviços de engenheiro, na aceção do artigo 56.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2006/112.

32      Em segundo lugar, no que respeita às prestações efetuadas no quadro da profissão de advogado, o Tribunal de Justiça já salientou que as mesmas tinham principal e habitualmente por objeto a representação e a defesa dos interesses de uma pessoa, regra geral num contexto de contraditório e na presença de interesses opostos (v., neste sentido, Acórdãos de 16 de setembro de 1997, von Hoffmann, C‑145/96, EU:C:1997:406, n.o 17, e de 6 de dezembro de 2007, Comissão/Alemanha, C‑401/06, EU:C:2007:759, n.os 36 e 37).

33      Além disso, o Tribunal de Justiça precisou que as prestações de um advogado visam, antes de mais, ver triunfar uma pretensão de ordem jurídica (v., neste sentido, Acórdão de 6 de dezembro de 2007, Comissão/Alemanha, C‑401/06, EU:C:2007:759, n.o 39).

34      Ora, prestações de serviços como as fornecidas pelas sociedades parceiras e pela Coris International ao abrigo da regularização de sinistros não estão abrangidas pelas prestações que são principal e habitualmente efetuadas no âmbito da profissão de advogado. Com efeito, estas últimas caracterizam‑se pela sua contribuição para a administração da justiça, ao passo que os serviços de regularização de sinistros em nome e por conta de uma sociedade de seguros decorrem, de modo mais abrangente, de uma atividade económica.

35      Em particular, esses serviços de regularização de sinistros têm essencialmente por objeto a verificação e a avaliação dos danos ou das despesas médicas incorridas, bem como a avaliação da indemnização devida ao segurado e, se for caso disso, o pagamento efetivo dessa indemnização, sendo que, a esse título, os referidos serviços não fazem necessariamente parte do domínio do contencioso. Assim, estas prestações não requerem a priori a representação e a defesa dos interesses da companhia de seguros num contexto de contraditório, na presença de interesses opostos, mesmo que o recurso aos serviços de um advogado possa eventualmente revelar‑se necessário num momento posterior.

36      Daqui resulta que os serviços de regularização de sinistros prestados em nome e por conta de uma sociedade de seguros não estão abrangidos pelo conceito de prestações de advogado, na aceção do artigo 56.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2006/112.

37      Em terceiro lugar, há que constatar que os serviços de regularização de sinistros como os prestados pelas sociedades parceiras e pela Coris International não correspondem às prestações que são principal e habitualmente fornecidas por um consultor, por um gabinete de estudo ou por um perito contabilista. Em particular, ao contrário dos serviços de consultoria, os serviços de regularização de sinistros em nome e por conta de uma sociedade de seguros implicam o exercício de um poder decisório quanto à concessão ou não concessão de uma indemnização, os quais não podem ser reconduzidos a serviços de consultoria.

38      Em quarto lugar, há que determinar se os serviços de regularização de sinistros prestados em nome e por conta de uma sociedade de seguros estão abrangidos pelas «outras prestações similares» mencionadas no artigo 56.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2006/112.

39      A expressão «outras prestações similares» não se refere a nenhum elemento comum das atividades heterogéneas assim mencionadas nesta disposição, mas a prestações similares em relação a cada uma dessas atividades, consideradas separadamente. Assim, uma prestação deve ser considerada similar a uma das atividades mencionadas nesse artigo, quando ambas responderem à mesma finalidade (v., neste sentido, Acórdão de 6 de dezembro de 2007, Comissão/Alemanha, C‑401/06, EU:C:2007:759, n.o 31 e jurisprudência referida).

40      A este respeito, basta salientar que a finalidade de tais serviços é a gestão e o tratamento dos pedidos de indemnização de sinistros apresentados pelos segurados da sociedade de seguros em nome e por conta da qual são prestados.

41      Assim, resulta das indicações transmitidas pelo órgão jurisdicional de reenvio que as prestações de regularização de sinistros pelas sociedades parceiras incluem serviços complexos de gestão e de regularização de reclamações, que comportam atividades múltiplas que devem ser consideradas como um todo cujo objetivo é remediar um dano sofrido por uma pessoa lesada fora do seu Estado‑Membro de residência segundo procedimentos com os quais esta está familiarizada. Além disso, relativamente às prestações fornecidas pela Coris International, o órgão jurisdicional de reenvio precisou que se trata de atividades exercidas com vista à regularização das reclamações apresentadas pelos detentores de apólices de seguro de saúde para viagens no estrangeiro emitidas pela Uniqa em benefício dos seus clientes, que abrangem, nomeadamente, a garantia da assistência dos segurados 24 horas por dia, bem como a prestação aos segurados de uma assistência técnica, organizativa e jurídica.

42      Ora, nenhuma das prestações de engenheiros, de advogados, de peritos contabilistas, de gabinetes de estudos ou de consultores enumeradas no artigo 56.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2006/112 prossegue a finalidade identificada no n.o 40 do presente acórdão.

43      Daqui resulta que os serviços de regularização de sinistros prestados em nome e por conta de uma sociedade de seguros não podem ser considerados «outras prestações similares», na aceção do artigo 56.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2006/112.

44      Em quinto e último lugar, há também que constatar que esses serviços de regularização de sinistros não são suscetíveis de ser vistos como aproximados dos serviços de tratamento de dados ou equiparados aos serviços de fornecimento de informações.

45      Tendo em conta todas as considerações precedentes, há que responder à questão prejudicial que o artigo 56.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2006/112 deve ser interpretado no sentido de que os serviços de regularização de sinistros prestados por sociedades terceiras, em nome e por conta de uma sociedade de seguros, não são abrangidos pela categoria das «prestações de serviços de consultores, engenheiros, gabinetes de estudo, advogados, peritos contabilistas e outras prestações similares e, bem assim, [de] tratamento de dados e [de] fornecimento de informações» prevista nesta disposição.

 Quanto às despesas

46      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Décima Secção) declara:

O artigo 56.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, deve ser interpretado no sentido de que os serviços de regularização de sinistros prestados por sociedades terceiras, em nome e por conta de uma sociedade de seguros, não são abrangidos pela categoria das «prestações de serviços de consultores, engenheiros, gabinetes de estudo, advogados, peritos contabilistas e outras prestações similares e, bem assim, [de] tratamento de dados e [de] fornecimento de informações» prevista nesta disposição.

Assinaturas


*      Língua do processo: romeno.