Language of document : ECLI:EU:C:2003:460

Conclusions

CONCLUSÕES DO ADVOGADO-GERAL
PHILIPPE LÉGER
apresentadas em 11 de Setembro de 2003 (1)



Processos apensos C-133/02 e C-134/02



Timmermans Transport & Logistics BV, anteriormente Timmermans Diessen BV

contra

Inspecteur der Belastingdienst‑Douanedistrict Roosendaal

e


[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Gerechtshof te Amsterdam (Países Baixos)]




Hoogenboom Production Ltd

contra

Inspecteur der BelastingdienstDouanedistrict Rotterdam


[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Gerechtshof te Amsterdam (Países Baixos)]


«Direito aduaneiro – Classificação das mercadorias – Informação pautal vinculativa – Condições de revogação – Regulamento (CE) n.° 82/97 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 19 de Dezembro de 1996, que altera o Regulamento (CEE) n.° 2913/92 que estabelece o Código Aduaneiro Comunitário – Princípios da protecção da confiança legítima e da segurança jurídica»






1.       As autoridades aduaneiras nacionais têm o direito de revogar discricionariamente as informações pautais vinculativas (a seguir «IPV») que prestam aos operadores económicos com vista à classificação pautal das mercadorias quando estas autoridades nacionais alterem a sua interpretação da nomenclatura aduaneira aplicável?

2.       Esta é a questão submetida pelo Gerechtshof te Amsterdam (Países Baixos) no âmbito dos litígios que opõem duas empresas, uma estabelecida nos Países Baixos, a outra em Chipre, às autoridades aduaneiras neerlandesas, quanto à classificação pautal de objectos móveis e de produtos agrícolas.

3.       Esta questão convida o Tribunal de Justiça a precisar o sentido e o âmbito de determinadas disposições do Regulamento (CEE) n.° 2913/92 do Conselho, de 12 de Outubro de 1992, que estabelece o Código Aduaneiro Comunitário (a seguir «CAC»)  (2) , alterado pelo Regulamento (CE) n.° 82/97 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 19 de Dezembro de 1996  (3) .

I – Enquadramento jurídico

4.       Uma IPV é um documento através do qual as autoridades aduaneiras dos Estados‑Membros da Comunidade Europeia informam, a seu pedido, os operadores económicos da posição pautal (prevista pela nomenclatura aduaneira) na qual deve ser classificada uma mercadoria quando pretendem proceder à sua importação ou exportação. Esta informação, que pressupõe uma determinada interpretação da nomenclatura aduaneira, permite aos operadores económicos prever os direitos de importação ou de exportação (de que podem ser devedores) bem como calcular o montante das restituições à exportação (de que podem beneficiar no âmbito da política agrícola comum).

5.       As autoridades aduaneiras estão obrigadas a emitir IPV e, em princípio, a respeitá‑las durante um determinado prazo, quando do cumprimento das formalidades aduaneiras, ou seja, durante a realização da operação de importação ou de exportação pretendida.

6.       Esta dupla obrigação foi instituída pelo Regulamento (CEE) n.° 1715/90 do Conselho, de 20 de Junho de 1990, relativo às informações prestadas pelas autoridades aduaneiras dos Estados‑Membros em matéria de classificação das mercadorias na nomenclatura aduaneira  (4) . Tem por objectivo garantir uma certa segurança jurídica aos operadores económicos no exercício da sua actividade, facilitar o trabalho das autoridades aduaneiras e obter uma maior uniformidade na aplicação do direito aduaneiro comunitário  (5) . Este sistema foi amplamente retomado pelo CAC  (6) e pelo seu regulamento de aplicação  (7) .

7.       Um pedido de IPV é formulado por escrito e dirigido quer às autoridades aduaneiras competentes do Estado‑Membro (ou dos Estados‑Membros) no qual (ou nos quais) a referida informação será utilizada, quer às autoridades aduaneiras competentes do Estado‑Membro em que o requerente se encontra estabelecido  (8) . A aceitação de um pedido de IPV pelas autoridades aduaneiras competentes está dependente da transmissão pelo requerente de diversos elementos de informação  (9) .

8.       Uma IPV tem uma validade de seis anos contados a partir da data da sua emissão  (10) . Durante este período, vincula as autoridades aduaneiras que a emitiram bem como as de todos os outros Estados‑Membros nas mesmas condições  (11) .

9.       Contudo, uma IPV pode ser anulada se tiver sido emitida com base em elementos inexactos ou incompletos fornecidos pelo requerente  (12) .

10.     Por outro lado, segundo o artigo 12.°, n.° 5, do CAC – na versão em vigor à data dos factos  (13) –, as IPV deixam de ser válidas:

a)
Em matéria pautal:

i) quando, na sequência da adopção de um regulamento, deixam de estar conformes com o direito assim estabelecido,

ii) quando se tornam incompatíveis com a interpretação de uma das nomenclaturas referidas no n.° 6 do artigo 20.°:

a nível comunitário, na sequência de uma alteração das notas explicativas da Nomenclatura Combinada ou de um acórdão do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias  (14) ,

a nível internacional, na sequência de uma ficha de classificação ou de uma alteração das notas explicativas da nomenclatura do sistema harmonizado de designação e codificação das mercadorias [...];

iii)
quando são revogadas ou alteradas nos termos do artigo 9.°, sob reserva de a revogação ou a alteração ser notificada ao titular [...]’

11.     O artigo 9.°, para o qual remetem estas últimas disposições, prevê que:

«1. A decisão favorável ao interessado será revogada ou alterada se, em casos distintos dos previstos no artigo 8.° (caso em que a decisão favorável é anulada quando é emitida com base em elementos inexactos ou incompletos), uma ou várias das condições previstas para a sua aprovação não estiverem ou tiverem deixado de estar preenchidas.

2. A decisão favorável ao interessado pode ser revogada se o seu destinatário não cumprir uma obrigação a que esteja eventualmente adstrito por força dessa decisão [...]»

12.     As autoridades aduaneiras estão obrigadas a transmitir à Comissão uma cópia da IPV notificada ao operador económico em causa bem como os dados conexos e a informá‑la da sua eventual anulação ou da cessação da sua validade  (15) .

13.     Em determinadas situações particulares, está especificamente previsto um período de transição de uma IPV que deixe de ser válida em benefício do seu titular.

14.     Com efeito, segundo o artigo 12.°, n.° 6, do CAC (na versão em vigor à data dos factos), «[os] titulares de [IPV] que deixem de ser válidas nos termos das alíneas a), subalíneas ii) e iii), do n.° 5 podem continuar a invocá‑las durante um período de seis meses após a data de publicação ou notificação desde que, antes da aprovação da medida em questão tenham celebrado contratos firmes e definitivos relativos à compra ou venda das mercadorias em causa com base em [IPV]». Este mesmo parágrafo refere que «[t]odavia, no caso de produtos relativamente aos quais é apresentado um certificado de importação, de exportação ou de pré‑fixação na altura do cumprimento das formalidades aduaneiras, esse período de seis meses é substituído pelo período para o qual o referido certificado continua válido».

II – Os factos e o processo principal

A – O processo C‑133/02

15.     Em 12 de Janeiro de 1999, a sociedade Timmermans Diessen BV (a seguir «sociedade Timmermans»), estabelecida nos Países Baixos, requereu às autoridades aduaneiras neerlandesas (região de Roosendaal) a emissão de uma IPV relativamente a objectos móveis produzidos pela empresa PartyLite Trading SA), descritos como sendo castiçais em vidro que se incluíam, na sua opinião, na posição pautal 9405 50 00 90. Em apoio do seu pedido, salientou que já havia sido emitida uma IPV para mercadorias deste tipo e juntou um catálogo de apresentação de todos os produtos que propunha para venda que incluía designadamente fotografias do produto em causa.

16.     Em 15 de Janeiro de 1999, as autoridades aduaneiras emitiram uma IPV em tudo de acordo com o pedido da sociedade Timmermans (quanto à descrição das mercadorias e à sua classificação pautal).

17.     Contudo, em 19 de Março de 1999, as autoridades aduaneiras revogaram esta IPV porque, após um exame mais aprofundado e ouvidas as autoridades aduaneiras de um distrito vizinho quanto à interpretação da nomenclatura aplicável, chegaram à conclusão de que as mercadorias em causa deviam ser classificadas na posição pautal 7013 29 91 00 (e não na inicialmente referida), enquanto objectos de vidro para serviço de mesa, cozinha, tocador, escritório, etc. A entrada em vigor desta decisão de revogação ocorreu no mesmo dia em que foi adoptada.

18.     Em 29 de Março de 1999, a sociedade Timmermans apresentou uma reclamação contra esta decisão de revogação. Esta reclamação foi indeferida por decisão de 20 de Maio seguinte. A referida sociedade interpôs então um recurso para o órgão jurisdicional de reenvio, em 12 Maio seguinte, contra esta última decisão.

19.     Em apoio do seu recurso, a sociedade alega que a emissão da IPV em causa criou a expectativa de que a classificação pautal que aí figura seria obrigatória nos anos seguintes e que não seria alterada, pelo que a sua revogação teria violado os princípios da protecção da confiança legítima e da segurança jurídica. Segundo as autoridades aduaneiras competentes, a revogação controvertida baseia‑se nas disposições conjugadas dos artigos 9.°, n.° 1, e 12.°, n.° 5, alínea a), iii), do CAC, na versão alterada.

B – O processo C‑134/02

20.     Em 9 de Outubro de 1997, a sociedade Hoogenboom Production Ltd (a seguir «sociedade Hoogenboom»), estabelecida em Chipre, solicitou às autoridades aduaneiras neerlandesas (região de Roterdão) a emissão de uma IPV relativa a produtos descritos como sendo «damascos conservados com adição de açúcar cristalizado» que, em seu entender, se incluíam na posição pautal 2008 50 61 00.

21.     Em 5 de Dezembro de 1997, as autoridades aduaneiras em causa emitiram uma IPV em tudo de acordo com o pedido da referida sociedade (quanto à descrição dos produtos e à sua posição pautal).

22.     Em 6 de Fevereiro de 1998, a mesma sociedade solicitou às mesmas autoridades aduaneiras a emissão de quatro IPV relativamente a produtos (comparáveis aos visados na anterior IPV) descritos como maçãs, avelãs, sementes de girassol conservados com adição de açúcar cristalizado (que, segundo a requerente, se incluíam nas posiᄃões pautais 2008 99 49 30 00, 2008 19 19 10 00, 2008 19 19 90 00) e de amendoins não torrados (que segundo a requerente se incluíam também na posição pautal 2008 11 94 00 00).

23.     Em 26 de Fevereiro de 1998, as autoridades aduaneiras em causa emitiram quatro IPV, em tudo conformes aos pedidos apresentados pela sociedade Hoogenboom.

24.     Todavia, em 6 de Outubro de 1998, as autoridades aduaneiras revogaram todas estas IPV (cinco no total), com fundamento em que os produtos em causa deveriam ser classificados na posição pautal 1701  (16) e não na inicialmente prevista porque o texto desta posição na nomenclatura aduaneira a isso se oporia  (17) . Nesta mesma data, concederam à sociedade Hoogenboom a possibilidade de continuar a invocar as IPV revogadas até 31 de Dezembro de 1998.

25.     Em 9 de Novembro de 1998, a referida sociedade apresentou uma reclamação contra esta decisão de revogação, a qual foi indeferida por uma decisão de 25 de Março de 1999. Em 23 de Abril seguinte, a requerente interpôs no órgão jurisdicional de reenvio um recurso contra esta última decisão.

26.     Em apoio do seu recurso, alega que a decisão de revogação em causa não tem fundamento legal, nem no artigo 9.° nem no artigo 12.°, n.° 5, do CAC. A interpretação destas disposições é contestada pelas autoridades aduaneiras, considerando estas, pelo contrário, que o artigo 12.°, n.° 5, alínea a), iii), prevê explicitamente a possibilidade de uma tal revogação em caso de erro flagrante das autoridades aduaneiras na classificação aduaneira de mercadorias.

III – A questão prejudicial

27.     Face às teses invocadas pelas partes, o Gerechtshof te Amsterdam decidiu submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«As disposições conjugadas dos artigos 9.°, n.° 1, e 12.°, n.° 5, alínea a), iii), do Código Aduaneiro Comunitário oferecem às autoridades aduaneiras uma base jurídica para a revogação de uma informação pautal vinculativa [IPV], caso essas autoridades alterem a sua interpretação, constante dessa informação, das disposições legais aplicáveis à classificação pautal das mercadorias em causa, ainda que a alteração tenha lugar antes de decorrido o período de seis anos?»

IV – As observações das partes

28.     Segundo as sociedades Timmermans e Hoogenboom, que participaram na audiência, decorre da jurisprudência do Tribunal de Justiça que uma IPV não pode ser unilateralmente alterada pelas autoridades aduaneiras nacionais  (18) . A alteração de uma IPV pelas autoridades aduaneiras nacionais não pode decorrer da sua própria iniciativa mas apenas da da Comissão. Admitir o contrário colocaria em risco as exigências da segurança jurídica (contrariamente ao objectivo prosseguido pela instituição das IPV) e da aplicação uniforme do direito comunitário (especialmente na hipótese em que a mesma IPV poderia ser modificada por vontade das autoridades aduaneiras de todos os Estados‑Membros).

29.     Segundo o Governo neerlandês, as autoridades aduaneiras nacionais teriam base jurídica para alterar uma IPV quando considerarem, após uma análise mais detalhada, que as mercadorias em causa, devido a um erro de apreciação ou de uma evolução dos conceitos em matéria de classificação aduaneira, deveriam ter sido classificadas noutra posição pautal.

30.     Em apoio desta tese, sustenta que o artigo 9.°, n.° 1, do CAC [para o qual remete o artigo 12.°, n.° 5, alínea a), iii) do CAC, na versão alterada] prevê – implicitamente, mas necessariamente – que a concessão de uma IPV está subordinada à sua conformidade com a nomenclatura aduaneira tal como esta devia ser entendida no momento da declaração das mercadorias na alfândega, ou seja quando da realização da operação de importação ou exportação. Quando esta condição, que parecia estar preenchida no momento da emissão da IPV, já não o esteja no momento da realização da operação económica, as autoridades aduaneiras teriam o direito de revogar ou alterar a IPV em questão. Excluir uma tal possibilidade de revogação ou de alteração durante todo o período de validade de uma IPV (isto é, durante seis anos) implicaria uma inaceitável distorção da concorrência entre os operadores económicos. Por outro lado, uma tal medida de revogação ou de alteração não será contrária aos princípios da protecção da confiança legítima e da segurança jurídica pois, por força do artigo 12.°, n.° 6, do CAC, o titular da IPV em causa pode continuar a invocá‑la durante um determinado período.

31.     No mesmo sentido, a Comissão sustenta que as disposições conjugadas dos artigos 9.°, n.° 1, e 12.°, n.° 5, alínea a), iii), do CAC autorizam as autoridades aduaneiras nacionais a alterar ou a revogar uma IPV para corrigirem erros em matéria de classificação pautal das mercadorias. Esta tese não seria contrária nem ao princípio segundo o qual as IPV vinculam as autoridades aduaneiras no momento da verificação de dívidas aduaneiras ou de restituições, nem aos princípios da confiança legítima e da segurança jurídica dado que, por um lado, a possibilidade de revogação ou de alteração de uma IPV estaria claramente prevista nas referidas disposições do CAC excluindo deste modo qualquer confiança legítima na sua manutenção e, por outro, o titular de uma IPV pode ainda invocá‑la durante seis meses após a sua revogação, de forma que o princípio da segurança jurídica estaria assegurado.

V – Análise

32.     A título preliminar, sublinhamos que nenhum dos despachos de reenvio precisa se a classificação pautal referida nas IPV controvertidas enferma efectivamente de um erro na interpretação da nomenclatura aduaneira. Se as autoridades aduaneiras alegam ter cometido um erro neste domínio durante a emissão das referidas IPV, nada no processo nos permite considerar que este alegado erro se verificou.

33.     Com efeito, as autoridades aduaneiras emitentes limitaram‑se a fazer um exame mais aprofundado da nomenclatura aduaneira e da classificação pautal das mercadorias em questão daí resultante, assim como, no processo Timmermans, a uma concertação sobre este ponto apenas com as autoridades aduaneiras da região vizinha. Não podemos considerar que estes elementos sejam suficientes para afirmar com certeza que tenha sido cometido um erro.

34.     Segue‑se que, nessas circunstâncias, as autoridades aduaneiras revogaram as IPV em causa de forma discricionária, isto é, em função da alteração da sua própria interpretação da nomenclatura aduaneira.

35.     Em nossa opinião, há então que entender a questão prejudicial como querendo saber se as disposições conjugadas dos artigos 9.°, n.° 1, e 12.°, n.° 5, alínea a), iii), do CAC, na versão alterada, devem ser interpretadas no sentido de que as autoridades aduaneiras têm o direito, com base nestas disposições, de revogar discricionariamente uma IPV que emitiram desde que alterem (segundo a sua própria apreciação, eventualmente no seguimento de uma simples concertação com as autoridades aduaneiras de uma região vizinha) a sua interpretação da nomenclatura aduaneira.

36.     Como o Tribunal de Justiça salientou no acórdão Lopex Export, já referido, «afigura‑se necessário, tanto para garantir uma certa segurança jurídica aos operadores económicos no exercício das suas actividades como para facilitar o trabalho dos próprios serviços aduaneiros e para obter uma maior uniformidade na aplicação do direito aduaneiro comunitário, elaborar uma regulamentação que crie a obrigação de as autoridades aduaneiras emitirem informações que vinculem as administrações, mediante determinadas condições bem definidas»  (19) . Estes são os objectivos que foram prosseguidos pelo Regulamento n.° 1715/90 bem como pelo regulamento que lhe sucedeu, que estabelece o CAC, designadamente na versão aplicável ao processo principal.

37.     É à luz destes objectivos e da economia geral do sistema em vigor que importa determinar se as autoridades aduaneiras dos Estados‑Membros, com base nas disposições conjugadas dos artigos 9.°, n.° 1 e 12.°, n.° 5, alínea a), iii), do CAC, têm o direito de revogar discricionariamente uma IPV quando alterem a sua interpretação da nomenclatura aduaneira aplicável. Em nossa opinião, impõe‑se uma resposta negativa.

38.     Como já referimos, o artigo 12.°, n.os 2 e 4, do CAC prevê que uma IPV vincula as autoridades aduaneiras perante o seu titular quanto à classificação pautal de uma mercadoria, em princípio durante seis anos a contar da data da sua emissão. Este princípio responde à preocupação de dar ao operador económico determinadas garantias ou segurança quanto à futura classificação pautal das mercadorias que pretende importar ou exportar tendo em conta as grandes dificuldades que pode encontrar nesta matéria devido ao carácter particularmente técnico da nomenclatura aduaneira  (20) .

39.     Com efeito, só uma informação pautal vinculativa pode oferecer tais garantias. Só ela permite ao operador económico prever com alguma fiabilidade a classificação aduaneira pertinente e, consequentemente, as condições pautais (direitos ou restituições) em que pode efectuar as operações de importação ou de exportação projectadas relativamente às mercadorias em causa  (21) . Dado que uma IPV é, em princípio, vinculativa durante seis anos, o seu titular tem a possibilidade, desde a sua emissão, de elaborar previsões a maior ou menor longo prazo, de se posicionar com conhecimento de causa num ou noutro mercado de comercialização das mercadorias e de efectuar os investimentos necessários. Esta previsibilidade é sem dúvida determinante, particularmente para as pequenas e médias empresas, uma vez que a alteração da classificação pautal referida na IPV (quando essa alteração se traduza num aumento do montante dos direitos a pagar ou numa diminuição do montante das restituições a receber) cria o risco de se repercutir de forma significativa no custo da operação pretendida, a ponto de a realização desta operação vir a ter em última análise pouco ou nenhum interesse, podendo mesmo colocar a empresa em grandes dificuldades.

40.     Tendo em conta a importância da classificação pautal das mercadorias e das consequências daí decorrentes para os operadores económicos, compete às autoridades demonstrarem uma particular diligência no momento da emissão da IPV, assegurando‑se nomeadamente de que dispõem de todos os elementos necessários para, com conhecimento de causa, se pronunciarem sobre a classificação pautal das mercadorias em questão  (22) .

41.     Este dever de diligência impõe‑se tanto mais que, por força do artigo 11.° do regulamento de aplicação, uma IPV que tenha sido emitida pelas autoridades aduaneiras competentes de um Estado‑Membro vincula as autoridades aduaneiras de todos os Estados‑Membros nas mesmas condições. Este princípio significa que as autoridades competentes do Estado‑Membro no qual as formalidades aduaneiras são cumpridas no que diz respeito a determinadas mercadorias não têm o direito de se afastar dos termos da IPV emitida pelas autoridades aduaneiras competentes doutro Estado‑Membro em relação às mesmas mercadorias (em particular, pelas autoridades do Estado‑Membro em que o titular da IPV em questão está estabelecido)  (23) . Este princípio significa também que a classificação pautal de mercadorias equivalentes não deve variar de um Estado‑Membro para outro, em função de apreciações divergentes das autoridades aduaneiras de cada um dos Estados‑Membros, sob pena de não respeitar o objectivo de aplicação uniforme da nomenclatura aduaneira no seio da Comunidade, que se destina nomeadamente a evitar tratamentos discriminatórios entre os operadores económicos em causa  (24) .

42.     O conjunto destes desenvolvimentos demonstra que uma IPV tem, por natureza, um efeito vinculativo relativamente ao seu titular, que dela se pode prevalecer. Tem também vocação para vincular não apenas as autoridades aduaneiras que a emitiram mas também todas as outras autoridades aduaneiras dos Estados‑Membros.

43.     Só em determinadas circunstâncias bem particulares é que uma IPV não tem carácter vinculativo, por força de nulidade, ou quando deixa de ser válida, de forma que o seu titular não pode ou já não pode dela se prevalecer. Estas circunstâncias estão enumeradas de forma exaustiva no artigo 12.°, n.os 4 e 5, alínea a), do CAC, na versão alterada. Uma vez que prevêem excepções ao princípio segundo o qual uma IPV vincula as autoridades aduaneiras face ao seu titular, há que as interpretar estritamente.

44.     Salientamos que as disposições do artigo 12.°, n.os 4 e 5, alínea a), i) e ii), do CAC, na versão alterada, visam expressamente circunstâncias exteriores às autoridades aduaneiras (relacionadas com os titulares da IPV ou com as instituições comunitárias), com excepção de circunstâncias cuja superveniência decorre delas próprias. Em contrapartida, forçoso é concluir que o texto das disposições do artigo 12.°, n.° 5, alínea a), iii), e do artigo 9.° do CAC, na versão alterada, para o qual é feita remissão, não permite que nos pronunciemos claramente sobre este aspecto. Posto isto, em nossa opinião, as disposições em questão não cobrem a hipótese, idêntica à dos processos principais, em que as autoridades aduaneiras alteram de forma totalmente autónoma (segundo a sua própria apreciação) a sua interpretação da nomenclatura aduaneira aplicável. É o que iremos agora tentar demonstrar.

45.     A título preliminar, há que recordar que o artigo 12.°, n.° 4, segundo período, do CAC, na versão alterada, prevê que uma IPV é anulada no caso de ter sido emitida com base em elementos inexactos ou incompletos fornecidos pelo requerente. Como já afirmámos, estas disposições remetem expressamente para circunstâncias que se prendem essencialmente com o comportamento do titular da IPV e não com as autoridades aduaneiras, ainda que caiba a estas últimas demonstrar uma certa diligência na emissão de uma IPV, assegurando‑se que o processo transmitido pelo requerente está completo  (25) .

46.     Quanto ao artigo 12.°, n.° 5, alínea a), i), do CAC, na versão alterada, prevê a hipótese em que uma IPV não está conforme a um regulamento comunitário adoptado após a sua emissão (e no decurso do seu período de validade, isto é, dentro dos seis anos contados a partir da data da sua emissão). Esta situação foi analisada pelo Tribunal de Justiça no processo Lopex Export, já referido, a propósito de uma questão prejudicial relativa à validade das disposições do artigo 13.°, primeiro parágrafo, primeiro travessão, do Regulamento n.° 1715/90, comparáveis às já referidas actualmente em vigor  (26) .

47.     O Tribunal de Justiça teve então o cuidado de precisar que, «[t]al como o Conselho e a Comissão justamente referiram, o objectivo da informação pautal vinculativa é oferecer ao operador económico toda a segurança quando existam dúvidas acerca da classificação de uma mercadoria na nomenclatura aduaneira existente, protegendo‑o assim relativamente a qualquer ulterior modificação da posição adoptada pelas autoridades aduaneiras relativamente à classificação das mercadorias»  (27) . E declarou que «[e]m contrapartida, essa [IPV] não se destina e não pode ter por efeito garantir ao operador que a posição pautal a que se refere não virá a ser ulteriormente modificada por um acto adoptado pelo legislador comunitário»  (28) .

48.     O Tribunal de Justiça acrescentou que este princípio decorre de forma clara e precisa da redacção das disposições em causa, de forma a responder às exigências do princípio da segurança jurídica (pois estas permitem aos operadores económicos conhecer sem ambiguidade os seus direitos e obrigações), como também impede que estes últimos possam alimentar, com base apenas numa IPV, uma confiança legítima no facto de a posição pautal em causa não vir a ser modificada por um acto adoptado pelo legislador comunitário  (29) . O Tribunal de Justiça concluiu que o exame das disposições em causa não revelou a existência de elementos susceptíveis de afectar a sua validade  (30) .

49.     Em nossa opinião, este caso de cessação da validade de uma IPV tem a ver com circunstâncias radicalmente diferentes das invocadas nos processos principais. Com efeito, esta cessação da validade está subordinada à adopção de uma regulamentação pelas instituições comunitárias, ou seja, a uma alteração no seio da Comunidade do estado do direito aplicável, e não a uma simples evolução da interpretação que seria levada a cabo livremente – à escala regional ou mesmo nacional – por quaisquer autoridades aduaneiras, o que seria dificilmente compatível com o objectivo da aplicação uniforme da nomenclatura aduaneira bem como com a preocupação de evitar a introdução de tratamentos discriminatórios entre os operadores económicos.

50.     Quanto às disposições do artigo 12.°, n.° 5, alínea a), ii), primeiro travessão, do CAC, na versão alterada, inscrevem‑se na mesma lógica. É certo que prevêem que uma IPV deixe de ser válida quando se torne incompatível com uma determinada interpretação da nomenclatura aduaneira pertinente. Contudo, a interpretação à qual é feita referência no plano comunitário não tem nada a ver com a que é invocada nos processos principais. Não se trata apenas de uma diferença de grau, mas de uma diferença de natureza. Com efeito, a interpretação visada pelas referidas disposições decorre exclusivamente de uma alteração das notas explicativas da nomenclatura em causa ou de um acórdão do Tribunal de Justiça. Ora, tais medidas ou decisões têm necessariamente por objecto e por efeito garantir uma aplicação correcta e uniforme da nomenclatura aduaneira no seio da Comunidade. Destinam‑se precisamente ao conjunto das autoridades aduaneiras dos Estados‑Membros com o fim de as guiar no seu exercício de aplicação da nomenclatura aduaneira e de evitar assim erros ou divergências de interpretação na matéria.

51.     Quanto a nós, as disposições do artigo 12.°, n.° 5, alínea a), iii), do CAC, na versão alterada, não podem deixar de se inscrever na mesma lógica de aplicação correcta e uniforme da nomenclatura aduaneira.

52.     Por outro lado, já foram adoptadas pela Comissão diversas decisões com base nestas disposições (bem como com base nas do artigo 9.°, do regulamento de aplicação  (31) ) para pôr fim a divergências de interpretação persistentes ou a erros revelados neste domínio que conduziram a situações que contrariam as IPV (entre as emitidas pelas autoridades aduaneiras de determinados Estados‑Membros em desrespeito pelas regras gerais para a interpretação da nomenclatura combinada ou de um regulamento que determina a classificação de uma mercadoria na nomenclatura aduaneira e as emitidas correctamente pelas autoridades competentes de outros Estados‑Membros)  (32) .

53.     Estas decisões da Comissão impuseram às autoridades aduaneiras que emitiram IPV incorrectas a sua revogação no mais breve espaço de tempo possível, não deixando de recordar que, de acordo com as disposições do artigo 14.°, n.° 1, do regulamento de aplicação (conjugadas com as disposições do artigo 12.°, n.° 6, do CAC, na versão alterada), o titular das IPV em questão pode, caso seja necessário, invocá‑las durante um determinado período.

54.     Estes precedentes clarificam de forma interessante a interpretação das disposições conjugadas do artigo 12.°, n.° 5, alínea a), iii), e 9.°, n.° 1, do CAC, na versão alterada.

55.     Sustentam em parte a interpretação defendida pelo Governo neerlandês e pela Comissão, em particular no que diz respeito ao artigo 9.°, n.° 1, do CAC, na versão alterada, nos termos do qual «[a] decisão favorável ao interessado (como uma IPV) será revogada ou alterada se [...] uma ou várias das condições previstas para a sua aprovação não estiverem ou tiverem deixado de estar preenchidas».

56.     Com efeito, podemos supor que a classificação pautal incluída numa IPV respeita a nomenclatura aduaneira aplicável, dado que essa classificação é fixada pelas autoridades aduaneiras, isto é, pelas autoridades nacionais que são as que estão em melhor posição para conhecer as diversas subtilezas técnicas na matéria. Posto isto, à semelhança do Governo neerlandês e da Comissão, podemos considerar que a classificação pautal em questão só é válida se respeitar a nomenclatura aduaneira aplicável, de forma que, quando essa condição de conformidade não está ou deixe de estar preenchida, impõe‑se a revogação da IPV em causa nos termos do artigo 9.°, n.° 1, do CAC, na versão alterada.

57.     Esta interpretação vai no mesmo sentido das disposições do artigo 12.°, n.° 5, alínea a), i) e ii), do CAC, na versão alterada, que analisámos anteriormente, uma vez que estas últimas prevêem que uma IPV deixe de ser válida quando a classificação pautal aplicável deixe de estar conforme com o quadro jurídico aplicável ou se torne incompatível com a interpretação que se impõe da nomenclatura aduaneira.

58.     Na linha destas disposições, podemos considerar que se impõe a revogação de uma IPV quando as autoridades aduaneiras tenham efectivamente cometido um erro (verificado e não apenas alegado pelas referidas autoridades) na interpretação da nomenclatura aduaneira e consequentemente na classificação pautal das mercadorias visadas pela IPV em questão. As decisões da Comissão a que fizemos referência confirmam esta ideia uma vez que obrigaram certas autoridades aduaneiras a revogar IPV que continham uma classificação pautal cujo carácter erróneo foi constatado (no sentido de que era contrária às regras gerais de interpretação da Nomenclatura Combinada ou a um regulamento de classificação das mercadorias em questão).

59.     Em contrapartida, não partilhamos a tese defendida pelo Governo neerlandês e pela Comissão, segundo a qual as autoridades aduaneiras teriam o direito de revogar uma IPV quando discricionariamente considerem (com base apenas na sua própria apreciação) ter cometido um erro na interpretação da nomenclatura aduaneira e na correspondente classificação pautal. Com efeito, recordamos que uma tal revogação não está necessariamente justificada porque o erro em causa não se verificou necessariamente. Por outro lado, o reconhecimento de uma tal possibilidade de revogação é dificilmente compatível quer com o objectivo da aplicação uniforme da nomenclatura aduaneira quer com o objectivo da segurança jurídica prosseguido pela instituição das IPV.

60.     Relativamente ao objectivo da aplicação uniforme da nomenclatura aduaneira, consideramos que, se uma decisão da Comissão que ordena a revogação de uma IPV tem necessariamente por objecto e por efeito garantir a aplicação correcta e uniforme da nomenclatura aduaneira, o mesmo já não podemos dizer quanto à prática segundo a qual as autoridades aduaneiras decidem discricionariamente revogar IPV que emitiram no seguimento de uma modificação da sua própria interpretação da nomenclatura aduaneira aplicável, mesmo que seja possível que, ao fazê‑lo, as autoridades em questão estejam animadas pela preocupação de se aproximarem da interpretação feita por outras autoridades aduaneiras.

61.     Com efeito, há que ter presente que, contrariamente à Comissão, as autoridades aduaneiras emitentes não têm necessariamente uma visão de conjunto da totalidade das IPV emitidas por todas as outras autoridades aduaneiras no seio da Comunidade para mercadorias idênticas ou semelhantes  (33) .

62.     Em nossa opinião, quando as autoridades aduaneiras entendam ter cometido um erro na interpretação da nomenclatura aduaneira quando da emissão de uma IPV, devem avisar desse facto a Comissão para se assegurarem de que se trata efectivamente de um erro que permite justificar a revogação da IPV em causa. Só um tal mecanismo pode garantir a aplicação correcta ou pelo menos uniforme da nomenclatura aduaneira. Em nosso entender, a necessidade de uma tal diligência por parte das autoridades aduaneiras junto da Comissão decorre simultaneamente dos objectivos de segurança jurídica e da aplicação uniforme da nomenclatura aduaneira, visados pela instituição das IPV, e da obrigação de cooperação leal dos Estados‑Membros face às instituições comunitárias, prevista no artigo 10.° CE  (34)

63.     De resto, como a Comissão referiu na audiência, ela é frequentemente solicitada pelas autoridades aduaneiras de certos Estados‑Membros que contestam a validade de IPV emitidas por outras autoridades aduaneiras relativamente à interpretação que estas desenvolveram da nomenclatura aduaneira. A Comissão acrescentou que lhe compete assim apreciar se há lugar a adoptar uma decisão relativa à validade das IPV em causa que ordene às autoridades aduaneiras visadas a sua revogação.

64.     Quanto a nós, podemos questionar se uma decisão seria também necessária quando a interpelação da Comissão proviesse das próprias autoridades aduaneiras emitentes (e não de outras autoridades aduaneiras) e se, nesse caso, não seria suficiente uma simples carta da Comissão dirigida às autoridades aduaneiras em questão, ou seja, uma resposta cuja adopção ou transmissão não estariam subordinadas a exigências processuais demasiado pesadas.

65.     Relativamente ao objectivo da segurança jurídica, há que referir que a interpretação defendida pelo Governo neerlandês e pela Comissão tende a deitar por terra o efeito útil do princípio segundo o qual uma IPV é por natureza vinculativa e a desrespeitar assim o objectivo da instituição do sistema de IPV criado pelo legislador comunitário, tal como foi recordado pelo Tribunal de Justiça no acórdão Lopex Export, já referido  (35) . Com efeito, o princípio relativo ao carácter vinculativo das IPV seria esvaziado do seu conteúdo caso as autoridades aduaneiras tivessem o direito de revogar discricionariamente uma IPV que emitiram, pelo simples motivo de, em sua opinião, terem cometido um erro ou de terem evoluído na sua própria interpretação da nomenclatura aduaneira.

66.     Em qualquer caso, relativamente a este objectivo de segurança jurídica, custa‑nos imaginar que o legislador comunitário se tenha podido dar por satisfeito com uma simples protecção provisória dos interesses dos titulares de IPV (segundo as modalidades previstas no artigo 12.°, n.° 6, do CAC, na versão alterada) na hipótese (que rejeitamos) em que as autoridades aduaneiras teriam o direito [baseado no artigo 12.°, n.° 5, alínea a), iii), do CAC, na versão alterada] de proceder à sua revogação nas circunstâncias controvertidas.

67.     A este propósito, não estamos convencidos com as explicações dadas pela Comissão na audiência, segundo as quais a duração desta protecção corresponderia aos prazos habituais de entrega das mercadorias (que seria de cerca de seis meses), de forma que o titular de uma IPV não teria que sofrer as consequências da sua revogação, uma vez que a poderia invocar durante um período de tempo e concluir assim a operação de comercialização.

68.     Desde logo, não podemos excluir que certos contratos tenham prazos de entrega mais longos. Por outro lado, na hipótese de esta duração de protecção corresponder efectivamente ao prazo de entrega das mercadorias em causa, também não podemos excluir que a revogação de uma IPV tenha sérias incidências nas actividades de comercialização do operador económico abrangido.

69.     Com efeito, se nesta hipótese o titular da IPV estaria efectivamente em condições de a invocar durante o cumprimento das formalidades aduaneiras relativas às mercadorias em causa, já não o poderia fazer posteriormente no âmbito da comercialização de mercadorias idênticas. O operador económico em causa poderia vir a ficar numa situação difícil por causa da revogação da IPV em questão porque esta revogação poderia pôr em causa as suas previsões quanto à classificação pautal de mercadorias idênticas e assim comprometer largamente a pertinência da sua política comercial e dos seus investimentos, em particular na hipótese de exercer a sua actividade no âmbito de uma pequena ou média empresa e de a revogação da referida IPV ocorrer pouco tempo após a sua emissão, isto é muito antes da expiração do seu prazo de validade de seis anos.

70.     Tal situação não é de todo compatível com o objectivo prosseguido pela instituição das IPV que consiste em dar ao operador económico garantias significativas quanto à classificação pautal das mercadorias para que este último esteja em condições de exercer as suas actividades em condições satisfatórias. A este respeito, ao mesmo tempo que compreendemos que o legislador comunitário tenha previsto, no seguimento de uma ponderação dos interesses em causa (o dos titulares de IPV e os relativos à aplicação correcta e uniforme da nomenclatura aduaneira), uma simples protecção provisória dos interesses dos titulares de IPV quando estas se tornem incompatíveis com a interpretação da nomenclatura aduaneira que é dada pelas instituições comunitárias, em particular pelo Tribunal de Justiça, também temos dificuldade em imaginar que o legislador comunitário tenha decidido submeter os titulares de IPV a um tal regime na hipótese em que estas são discricionariamente revogadas pelas autoridades aduaneiras.

71.     Consequentemente, há que responder à questão prejudicial que as disposições conjugadas dos artigos 9.°, n.° 1, e 12.°, n.° 5, alínea a), iii), do CAC, na versão alterada, devem ser interpretadas no sentido de que não oferecem às autoridades aduaneiras que emitiram uma IPV base jurídica para procederem à sua revogação de maneira discricionária, caso estas últimas alterem a sua própria interpretação da nomenclatura aduaneira aplicável.

VI – Conclusão

72.     Tendo em conta o conjunto destas considerações, propomos que o Tribunal de Justiça responda à questão prejudicial colocada pelo Gerechtshof te Amsterdam da seguinte forma:

«As disposições conjugadas dos artigos 9.°, n.° 1, e 12.°, n.° 5, alínea a), iii), do Regulamento (CEE) n.° 2913/92 do Conselho, de 12 de Outubro de 1992, que estabelece o Código Aduaneiro Comunitário, alterado pelo Regulamento (CE) n.° 82/97 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 19 de Dezembro de 1992, devem ser interpretadas no sentido de que não oferecem às autoridades aduaneiras que emitiram uma informação pautal vinculativa uma base jurídica para proceder à sua revogação de maneira discricionária, caso estas últimas alterem a sua própria interpretação da nomenclatura aduaneira aplicável.»


1
Língua original: francês.


2
JO L 302, p. 1.


3
JO L 17, p. 1.


4
JO L 160, p. 1.


5
Terceiro considerando.


6
Título I, capítulo 2, secção 3.


7
Título II do Regulamento (CEE) n.° 2454/93 da Comissão, de 2 de Julho de 1993, que fixa determinadas disposições de aplicação do CAC (JO L 253, p. 1, a seguir «regulamento de aplicação»).


8
Artigos 12.°, n.° 1, do CAC e 6.°, n.° 1, do regulamento de aplicação.


9
Artigo 6.°, n.os 3 e 4, do regulamento de aplicação.


10
Artigo 12.°, n.° 4 , do CAC.


11
Artigos 12.°, n.° 2, do CAC e 11.° do regulamento de aplicação.


12
Artigo 12.°, n.° 4, do CAC.


13
Regulamento n.° 82/97, que entrou em vigor em 1 de Janeiro de 1997 (JO L 17, p. 1), tal como rectificado durante o ano de 1997 (JO L 179, p. 11).


14
É referido que a data em que a IPV deixa de ser válida é a data da publicação das referidas «medidas».


15
Artigos 8.°, n.° 1 e 13.° do regulamento de aplicação.


16
A posição pautal 1701 aplica‑se ao «açúcar de cana ou de beterraba e sacarose quimicamente pura, no estado sólido».


17
A posição pautal 2008 aplica‑se às «frutas e outras partes comestíveis de plantas, preparadas ou conservadas de outro modo, com ou sem adição de açúcar ou de outros adulcorantes ou de álcool, não especificadas nem compreendidas noutras posições».


18
As recorrentes fizeram referência aos acórdãos de 1 de Abril de 1993, Hewlett Packard France (C‑250/91, Colect., p. I‑1819), e de 29 de Janeiro de 1998, Lopex Export (C‑315/96, Colect., p. I‑317).


19
N.° 19.


20
O Regulamento n.° 1715/90 salientou, no seu quinto considerando, que as informações relativas à classificação das mercadorias na nomenclatura aduaneira constituem a categoria de informações mais importante e útil para os operadores económicos devido ao carácter altamente técnico da Nomenclatura Combinada e das nomenclaturas comunitárias dela decorrentes.


21
Há que salientar que a classificação pautal referida numa IPV não estabelece uma presunção sobre a taxa dos direitos ou das restituições decorrentes dessa classificação que será aplicável quando do cumprimento das formalidades aduaneiras relativas às mercadorias em questão. Foi o que o Regulamento n.° 1715/90 sublinhou no seu sétimo considerando. A prática demonstra que estas taxas variam frequentemente em função da evolução dos mercados.


22
V., neste sentido, artigo 6.°, n.os 3 e 4, do regulamento de aplicação.


23
V., as disposições do artigo 6.°, n.° 1, do regulamento de aplicação que determinam as autoridades aduaneiras destinatárias dos pedidos de IPV.


24
Foi o que o advogado‑geral G. Tesauro teve ocasião de salientar nas suas conclusões de 22 de Outubro de 1992, no processo Hewlett Packard France (já referido, n.° 5, quarto parágrafo) relativamente ao Regulamento n.° 1715/90.


25
No caso em apreço, é certo que a sociedade Hoogenboom forneceu dados exactos e completos quando dos seus diversos pedidos de IPV (v., ponto 2.3 do despacho de reenvio bem como o ponto 18 das observações da Comissão). Ainda que o órgão jurisdicional de reenvio não tenha sido preciso quanto a este ponto relativamente à sociedade Timmermans, supomos que também tenha sido o caso.


26
Estas disposições previam que, «quando na sequência da adopção quer de um regulamento que altere a nomenclatura aduaneira, quer de um regulamento que determine ou diga respeito à classificação de uma mercadoria na nomenclatura aduaneira, uma (IPV) previamente emitida já não estiver em conformidade com o direito comunitário assim estabelecido, essa informação deixa de ser válida a partir do momento do início da aplicação do referido regulamento».


27
Acórdão Lopex Export, já referido, n.° 28).


28
Idem.


29
.Ibidem (n.os 28 e 29).


30
.Ibidem (n.° 31).


31
Salientamos que só as disposições incluídas no n.° 1 deste artigo são pertinentes, com exclusão das que estão incluídas no n.° 2. Com efeito, como foi revelado na audiência, uma IPV não impõe obrigações ao seu titular, contrariamente ao que acontece com as decisões visadas pelo n.° 2 em causa.


32
Podemos referir, designadamente, as Decisões da Comissão 98/405/CE, de 16 de Junho de 1998, relativa à validade de certas informações pautais vinculativas [emitidas pelas autoridades aduaneiras francesas, neerlandesas e do Reino Unido (JO L 178, p. 42)]; 1999/637/CE, de 12 de Julho de 1999, relativa à validade de certas informações pautais vinculativas [emitidas pelas autoridades aduaneiras do Reino Unido (JO L 251, p. 17)]; 1999/747/CE, de 8 de Novembro de 1999, relativa à validade de certas informações pautais vinculativas [emitidas pelas autoridades aduaneiras neerlandesas e alemãs (JO L 298, p. 37)]; 2000/41/CE, de 29 de Dezembro de 1999, relativa à validade de certas informações pautais vinculativas [emitidas pelas autoridades aduaneiras irlandesas, do Reino Unido e da Irlanda do Norte (JO L 13, p. 27)], e 2003/97/CE , de 31 de Janeiro de 2003, relativa à validade de certas informações pautais vinculativas (IPV) emitidas pela República Federal da Alemanha (JO L 36, p. 40).


33
A Comissão dispõe de todas as informações necessárias na matéria uma vez que está encarregada de gerir uma base de dados que guarda uma cópia de todas as IPV emitidas assim como das informações com elas relacionadas [v., os artigos 6.°, n.° 3, alínea k), e 8.°, n.° 1, do regulamento de aplicação]. Estes dados podem ser transmitidos pela Comissão às autoridades aduaneiras que o solicitem (artigo 8, n.° 2, do regulamento de aplicação). Dito isto, não é seguro que as autoridades aduaneiras que pretendam revogar por sua própria iniciativa uma IPV tenham o cuidado de dirigir à Comissão um tal pedido de informação para tomarem a sua decisão com conhecimento de causa.


34
V., mutatis mutandis, acórdão de 28 de Fevereiro de 1991, Delimitis (C‑234/89, Colect., p. I‑935, n.os 44, 45, 47, 49, 52 e 53) a propósito das competências respectivas dos órgãos jurisdicionais nacionais e da Comissão para aplicar as disposições dos artigos 85.°, n.° 1 e 86.° do Tratado CE (actuais artigos 81.° CE e 82.° CE) em matéria de concorrência.


35
N.os 19 e 28.