Language of document : ECLI:EU:T:2003:271

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

(Quinta Secção Alargada)

16 de Outubro de 2003 (1)

«Auxílios de Estado - Direito nivelador compensatório - Modo de financiamento dos auxílios - Regime de ajudas comunitárias ao algodão - Recurso de anulação - Admissibilidade - Actos susceptíveis de recurso - Recusa de a Comissão intentar uma acção por incumprimento - Princípio da autonomia das vias de recurso»

No processo T-148/00,

The Panhellenic Union of Cotton Ginners and Exporters, com sede em Tessalonica (Grécia), representada por K. Adamantopoulos, V. Akritidis e J. Gutiérrez Gisbert, advogados, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrente,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada por M. Condou e D. Triantafyllou, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrida,

apoiada pela

República Helénica, representada por I. Chalkias e C. Tsiavou, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

interveniente,

que tem por objecto um pedido de anulação parcial da Decisão 2000/206/CE da Comissão, de 20 de Julho de 1999, relativa ao regime de auxílio aplicado na Grécia para o algodão pelo Instituto grego do algodão (JO 2000, L 63, p. 27),

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Quinta Secção Alargada),

composto por: R. García-Valdecasas, presidente, P. Lindh, J. D. Cooke, P. Mengozzi e H. Legal, juízes,

secretário: J. Plingers, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 27 de Fevereiro de 2003,

profere o presente

Acórdão

Enquadramento jurídico

1.
    O Protocolo n.° 4 relativo ao algodão, anexo às condições de adesão da República Helénica (JO 1979, L 291, p. 174, a seguir «Protocolo n.° 4»), instaura um regime destinado, nomeadamente, a apoiar a produção de algodão nas regiões da Comunidade onde essa produção é importante para a economia agrícola, a permitir um rendimento equitativo aos produtores em causa e a estabilizar o mercado através da melhoria das estruturas ao nível da oferta e da colocação no mercado.

2.
    O n.° 3 do Protocolo n.° 4 prevê que este regime inclui «a concessão de um auxílio à produção» que, «[p]ara facilitar a gestão e o controlo, [...] será concedido através das empresas de descaroçamento».

3.
    Este número indica igualmente que o montante desse auxílio será fixado periodicamente com base na diferença existente entre um preço de objectivo fixado para o algodão não descaroçado e o preço do mercado mundial, determinado com base nas ofertas e cotações verificadas no mercado mundial. O preço de objectivo é estabelecido pelo Conselho (n.° 8 do Protocolo n.° 4), enquanto a Comissão determina o preço do mercado mundial e o montante do auxílio (n.° 10 do Protocolo n.° 4).

4.
    Nos termos do n.° 5 do Protocolo n.° 4, «[o] regime das trocas comerciais da Comunidade com países terceiros não pode ser afectado [e] não pode, em especial, ser prevista qualquer medida que restrinja as importações».

5.
    Nos termos do n.° 9 do Protocolo n.° 4, o Conselho adoptou, em 27 de Julho de 1981, o Regulamento (CEE) n.° 2169/81, que fixa as regras gerais do regime de ajuda para o algodão (JO L 211, p. 2; EE 03 F22 p. 245). Este regulamento foi substituído pelo Regulamento (CE) n.° 1554/95 do Conselho, de 29 de Junho de 1995, que fixa as regras gerais do regime de ajuda ao algodão e revoga o Regulamento n.° 2169/81 (JO L 148, p. 48).

6.
    Nos termos do terceiro considerando do Regulamento n.° 2169/81:

«[P]ara facilitar a gestão e o controlo do citado regime [de ajuda ao algodão], convém conceder ajuda às empresas de descasque; [...] com o objectivo de beneficiar os agricultores deste regime, convém subordinar a concessão da ajuda à condição de que estes tenham obtido um preço pelo menos igual a um preço mínimo a determinar, sendo este preço mínimo próximo do preço de objectivo, nos termos do n.° 8 do Protocolo [n.° 4], ou que a ajuda será repercutida sobre ele.»

7.
    O artigo 6.° do Regulamento n.° 2169/81 regulava as relações financeiras entre as empresas de descaroçamento e os produtores de algodão. Previa que o auxílio só era concedido às empresas de descasque que tivessem feito o pedido e que tivessem depositado quer um contrato prevendo, nomeadamente, o pagamento ao produtor de um preço pelo menos igual ao preço mínimo referido no artigo 9.° desse regulamento, quer, no caso de efectuarem o descasque por conta de um produtor individual ou associado, uma declaração explicitando as condições nas quais o descasque era efectuado e a ajuda era repercutida nos produtores. O artigo 9.° do Regulamento n.° 2169/81 precisava que o Conselho fixava todos os anos, ao mesmo tempo que o preço de objectivo, um preço mínimo para o algodão não descascado, e isso «a um nível que [garantisse] aos produtores a realização das suas vendas a um preço o mais próximo possível do preço de objectivo». O artigo 7.° do Regulamento n.° 1554/95 reproduziu, no essencial, o artigo 6.° do Regulamento n.° 2169/81.

8.
    O artigo 5.°, n.° 3, do Regulamento n.° 2169/81 previa nomeadamente que «o direito à ajuda [era] adquirido no momento do descasque» e que «[a] ajuda [podia], no entanto, ser adiantada desde a entrada do algodão não descascado na empresa de descasque, com a condição de que [fosse] constituída uma garantia suficiente». O artigo 5.°, n.° 3, do Regulamento n.° 1554/95 reproduziu, no essencial, esta última disposição.

9.
    Em 3 de Maio de 1989, a Comissão adoptou o Regulamento (CEE) n.° 1201/89, que estabelece as regras de execução do regime de ajuda para o algodão (JO L 123, p. 23). O artigo 7.°, n.° 2, deste regulamento, modificado pelo Regulamento (CE) n.° 2878/95 da Comissão, de 13 de Dezembro de 1995, que altera o Regulamento n.° 1201/89 (JO L 301, p. 21), previa que «[q]uando apresentado antes da apresentação do pedido de colocação sob controlo, o pedido de ajuda só [era] admissível se [fosse] constituída uma garantia de 12 ecus/100 kg». O n.° 3 do mesmo artigo dispunha que essa garantia era «constituída sob uma das formas referidas no artigo 8.° do Regulamento (CEE) n.° 2220/85 da Comissão [, de 22 de Julho de 1985, que fixa as regras comuns de aplicação do regime de garantias para os produtos agrícolas (JO L 205, p. 5; EE 03 F36 p. 206)]», a qual era «liberada proporcionalmente às quantidades em relação às quais [tivesse] sido cumprida a obrigação prevista no n.° 1 do artigo 9.°» e «[ficava] perdida proporcionalmente às quantidades em relação às quais não [tivesse] sido cumprida a obrigação prevista no n.° 1 do artigo 9.°» O artigo 9.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1201/89 previa a apresentação por «[t]odas as empresas de descaroçamento [...], no momento da entrada do algodão descaroçado, [de] um pedido de colocação sob controlo». O n.° 8 do mesmo artigo, modificado pelo Regulamento (CE) n.° 2064/95 da Comissão, de 29 de Agosto de 1995, que altera o Regulamento n.° 1201/89 (JO L 204, p. 8), previa, a partir da colocação sob controlo, a concessão, pelos Estados-Membros aos interessados que o solicitassem, de um adiantamento sobre a ajuda, desde que fosse constituída uma garantia pelo menos igual a 110% do montante da ajuda a adiantar, o cálculo do montante do adiantamento com base nas quantidades colocadas sob controlo, a constituição da garantia sob uma das formas referidas no artigo 8.° do Regulamento n.° 2220/85 e sua execução no montante em que o adiantamento pago excedesse o montante da ajuda a conceder.

10.
    Em 23 de Abril de 1992, a República Helénica adoptou a Lei n.° 2040/92, relativa à regulamentação das questões da competência do Ministério da Agricultura e das pessoas colectivas colocadas sob seu controlo (Jornal Oficial da República Helénica, primeira parte, n.° 79) (a seguir «Lei n.° 2040/92»).

11.
    O artigo 30.°, n.° 1, da Lei n.° 2040/92, intitulado «reajustamento dos recursos do Instituto grego do algodão», dispõe:

«A contar da data da publicação da presente lei, as empresas de descaroçamento de algodão serão sujeitas a um direito nivelador compensatório a favor do Instituto grego do algodão, equivalente a 1% do preço pago ao produtor por quilograma de algodão não descaroçado [...]»

12.
    O artigo 30.°, n.° 3, da Lei n.° 2040/92 previa, além disso, uma imposição especial a favor do Instituto grego do algodão imposta sobre o algodão para fins industriais importado do estrangeiro, bem como sobre as fibras artificiais ou sintéticas importadas do estrangeiro, até três deniers, que se elevava a 1% do seu valor (a seguir «imposição especial»).

Antecedentes do litígio

13.
    A recorrente é uma associação profissional de direito grego que agrupa as empresas de descaroçamento e os negociantes de algodão gregos.

14.
    O Instituto grego do algodão é uma entidade pública sem fins lucrativos que, segundo os respectivos estatutos, tem por objectivo fornecer uma série de serviços aos produtores e aos descaroçadores de algodão. Estes serviços eram financiados pelo direito nivelador compensatório mencionado no n.° 11 supra (a seguir «direito nivelador compensatório») e pela imposição especial.

15.
    Por carta de 12 de Novembro de 1992, a recorrente apresentou uma queixa à Direcção-Geral (DG) «Agricultura» da Comissão, em que alegava que o direito nivelador compensatório era ilegal porque calculado sobre o montante total obtido pelos produtores em contrapartida da venda do algodão não descaroçado, ou seja, inclusive sobre o montante da ajuda comunitária. Sustentava igualmente que as empresas de descaroçamento não beneficiavam dos referidos serviços do Instituto grego do algodão e que este subordinava a restituição das garantias que essas empresas eram obrigadas a prestar, para poderem obter um adiantamento, ao pagamento efectivo do direito nivelador compensatório.

16.
    Na sequência desta queixa, a DG «Agricultura» enviou diversos pedidos de informações às autoridades gregas, respeitantes ao funcionamento do Instituto grego do algodão e à «imposição parafiscal» cobrada a favor deste último. As autoridades gregas responderam a estes pedidos e a recorrente apresentou as suas observações sobre estas respostas.

17.
    Em 17 de Junho de 1994, a recorrente informou a DG «Agricultura» de que havia processado o Instituto grego do algodão nos tribunais gregos a fim de obter o reembolso do direito nivelador compensatório, na medida em que este era aplicado sobre o montante da ajuda comunitária.

18.
    Em 27 de Janeiro de 1995, a Comissão enviou uma carta ao Governo grego em que indicava que não tinha objecções contra certas actividades do Instituto grego do algodão, que outras actividades desse instituto eram «serviços da competência do Estado e não [apresentavam], por isso, o carácter de auxílio a empresas específicas» e que havia decidido instaurar o procedimento previsto no artigo 93.°, n.° 2, do Tratado CE (actual artigo 88.°, n.° 2, CE) no que respeitava às restantes actividades do Instituto grego do algodão.

19.
    Na mesma carta, a Comissão indicava que «no tocante a auxílios financiados por um encargo obrigatório, naquele caso o direito nivelador compensatório e a imposição especial, [tinha] examinado igualmente o financiamento de todos esses auxílios». Concluía, a este respeito, o seguinte:

-    a imposição especial incidia também sobre os produtos importados dos outros Estados-Membros;

-    de acordo com a jurisprudência, o financiamento de um auxílio estatal por uma imposição obrigatoriamente consignada constituía um elemento essencial desse auxílio e, na sua apreciação, importava examinar, à luz do direito comunitário, tanto o auxílio como o seu financiamento;

-    «mesmo se os auxílios são compatíveis quer na sua forma, quer nos seus objectivos, não se altera o facto de que, de acordo com a jurisprudência [...], o seu financiamento por imposições consignadas que incidem também nos produtos comunitários importados de outros Estados-Membros e dos países do Espaço Económico Europeu tem um efeito protector que ultrapassa o auxílio enquanto tal»;

-    «[c]om efeito, mesmo se os auxílios financiados pelo Instituto grego do algodão podiam beneficiar, em certa medida, os produtos importados, isso não altera o facto de que eles não determinam uma participação efectiva nessas vantagens igualmente favorável para todos, já que, no plano prático, [...] se cria[va] uma situação mais favorável, pela força das circunstâncias, aos operadores [helénicos], já que as acções realizadas se inspira[vam] nas especializações, necessidades e lacunas nacionais»;

-    «a aplicação de uma condição suplementar (pagamento efectivo da imposição parafiscal) não prevista na regulamentação comunitária para o pagamento do auxílio constitu[ía] uma infracção ao Regulamento (CEE) n.° 2169/81»;

-    a aplicação da imposição especial era contrária ao artigo 5.° do Protocolo n.° 4 anexo ao acto de adesão da Grécia bem como ao artigo 12.° do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 25.° CE).

20.
    A Comissão precisava que, tendo em conta estes elementos, também havia decidido instaurar o procedimento previsto no artigo 88.°, n.° 2, CE relativamente ao conjunto dos auxílios «uma vez que o seu financiamento através da imposição especial incid[ia] igualmente nos produtos importados dos outros Estados-Membros e dos países do Espaço Económico Europeu e que o financiamento através do direito nivelador compensatório e da imposição especial se revest[ia] de um aspecto de infracção à regulamentação comunitária».

21.
Por último, por carta de 27 de Janeiro de 1995, a Comissão convidava o Governo grego a apresentar as suas observações e a transmitir-lhe certas informações. Através da publicação desta carta no Jornal Oficial das Comunidades Europeias de 24 de Outubro de 1995 (JO C 278, p. 4), os outros Estados-Membros e as partes interessadas foram informados da abertura do procedimento e convidados a apresentar as suas eventuais observações. Por carta de 12 de Abril de 1995, o Governo grego comunicou as suas observações, bem como as informações que lhe haviam sido solicitadas. Terceiros interessados, entre os quais a recorrente, por carta de 23 de Novembro de 1995, apresentaram igualmente as suas observações.

22.
    Paralelamente ao procedimento previsto no artigo 88.°, n.° 2, CE, a Comissão instaurou contra a República Helénica, por carta de 15 de Janeiro de 1996, o procedimento previsto no artigo 169.° do Tratado CE (actual artigo 226.° CE) (a seguir «procedimento por infracção»). Considerava, no essencial, que o facto de o Instituto grego do algodão subordinar a liberação das garantias bancárias ao pagamento efectivo do direito nivelador compensatório constituía uma violação dos artigos 7.°, n.° 3, e 9.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1210/89, das regras da organização comum dos mercados no sector do algodão e, mais particularmente, do Regulamento n.° 2169/81, do princípio da proporcionalidade e do artigo 40.°, n.° 3, do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 34.°, n.° 2, CE). Intimava o Governo grego a apresentar as suas observações e a fornecer certas informações. Por fax de 25 de Janeiro de 1996, a DG «Agricultura» informou a recorrente da instauração do procedimento por infracção.

23.
    Em 14 de Maio de 1996, a recorrente enviou à DG «Agricultura» uma segunda queixa contra a República Helénica, com base no artigo 226.° CE. Alegava, por um lado, que o artigo 30.°, n.° 1, da Lei n.° 2040/92 violava o artigo 5.°, n.° 3, do Regulamento n.° 2169/81, o artigo 7.° do Regulamento n.° 1201/89, as disposições do Protocolo n.° 4, o artigo 189.° do Tratado CE (actual artigo 294.° CE) e o artigo 34.°, n.° 2, CE. Por outro lado, sustentava que o artigo 30.°, n.° 3, da mesma lei violava os artigos 9.° e 12.° do Tratado CE (que passaram, após alteração, respectivamente, a artigos 23.° CE e 25.° CE), o artigo 249.° CE, as disposições do Protocolo n.° 4, a os artigos 18.° a 27.° do Tratado CE (revogados pelo Tratado de Amsterdão), os artigos 28.° e 29.° do Tratado CE (que passaram, após alteração, respectivamente, a artigos 26.° CE e 27.° CE) e os artigos 113.° (que passou, após alteração, a artigo 133.° CE) e seguintes do Tratado CE, bem como as regras do Acordo Geral sobre Pautas Aduaneiras e Comércio (GATT). Num memorando anexo a esta queixa, a recorrente referia também que o mecanismo de financiamento das actividades do Instituto grego do algodão constituía um auxílio de Estado ilegal e incompatível com o mercado comum. Além disso, pedia a adopção, pela Comissão, de medidas provisórias, a saber, que esta obtivesse da República Helénica a suspensão da aplicação da Lei n.° 2040/92.

24.
    Por fax de 19 de Novembro de 1997, a DG «Agricultura» solicitou à recorrente, no quadro do procedimento por infracção, que lhe fornecesse certos documentos. A recorrente satisfez este pedido por carta de 28 de Novembro de 1997 e apresentou uma série de observações por cartas de 8 de Julho e de 2 e 16 de Setembro de 1998.

25.
    Em 2 de Dezembro de 1998, a Comissão decidiu arquivar o dossier relativo ao procedimento por infracção.

26.
    Em 20 de Julho de 1999, a Comissão adoptou a Decisão 2000/206/CE, relativa ao regime de auxílio aplicado na Grécia para o algodão pelo Instituto grego do algodão (JO 2000, L 63, p. 27, a seguir «decisão controvertida»)

27.
    O ponto IV, n.° 2, da decisão controvertida indica:

«No que diz respeito à posição da Comissão quanto às questões relativas à compatibilidade do direito compensatório de 1% sobre a produção nacional grega e sobre as ajudas comunitárias pagas aos produtores gregos com a organização comum de mercado do algodão, essa questão foi examinada no âmbito do procedimento por infracção. Devido ao facto de as disposições do Regulamento (CE) n.° 1554/95 não excluírem explicitamente um direito desse tipo, a Comissão decidiu, em 2 de Dezembro de 1998, arquivar o procedimento.»

28.
    O ponto IV, n.° 3, da decisão controvertida enuncia:

«Conclui-se das observações apresentadas à Comissão, no âmbito do procedimento previsto no n.° 2 do artigo 88.° [CE], que as imposições parafiscais em questão apresentam um certo grau de subsídio cruzado. Com efeito, as imposições são cobradas no plano das empresas de descaroçamento, para financiar medidas que são principalmente orientadas para os produtores agrícolas. A prática estabelecida da Comissão em matéria de imposições parafiscais é a de aceitar que as imposições são cobradas num nível diferente da fileira produtiva (por exemplo: imposições cobradas no plano dos matadouros, para financiar a luta contra as epizootias). No caso vertente não se afigura possível aos descaroçadores transferirem o pagamento da imposição para os produtores agrícolas, devido aos mecanismos da organização comum de mercado do algodão.

Em virtude do que precede a Comissão conclui que, na medida em que o método de financiamento dos auxílios pelo direito de 1% sobre a produção nacional grega e sobre as ajudas comunitárias pagas aos produtores gregos é conforme com a organização comum de mercado do algodão, não haveria razões para levantar objecções quanto ao método de financiamento, nos termos dos artigos 87.°[CE] a 89.° [CE].»

29.
    O dispositivo da decisão controvertida dispõe:

«Artigo 1.°

Os auxílios de Estado concedidos na Grécia, no âmbito das funções estatutárias do Instituto grego do algodão, financiados pelas quotizações obrigatórias previstas pelo n.° 3 do artigo 30.° da Lei n.° 2040/92, são incompatíveis com o mercado comum, na medida em que são financiados por imposições parafiscais impostas aos produtos importados.

Artigo 2.°

A Grécia deve alterar o regime de auxílio referido no artigo 1.°, a fim de o tornar compatível com a presente decisão.

Artigo 3.°

1. A Grécia tomará todas as medidas necessárias para recuperar, junto dos beneficiários, o auxílio referido no artigo 1.°, posto ilegalmente à sua disposição.

2. A recuperação terá lugar em conformidade com os procedimentos do direito nacional. As somas a recuperar produzem juros a partir da data em que foram postas à disposição dos beneficiários e até à sua recuperação efectiva. Os juros são calculados com base na taxa de referência utilizada para o cálculo do equivalente-subsídio no âmbito dos auxílios com finalidade regional.

Artigo 4.°

A Grécia informará a Comissão, dentro do prazo de dois meses a contar da notificação da presente decisão, sobre as medidas que tenciona tomar para se conformar com ela.

Artigo 5.°

A República Helénica é a destinatária da presente decisão.»

Tramitação processual e pedidos das partes

30.
    Por petição que deu entrada na Secretaria do Tribunal em 2 de Junho de 2000, a recorrente interpôs o presente recurso.

31.
    Por requerimento separado, que deu entrada na Secretaria do Tribunal em 14 de Julho de 2000, a Comissão suscitou uma questão prévia de admissibilidade, nos termos do artigo 114.°, n.° 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância. Em 15 de Setembro de 2000, a recorrente apresentou as suas observações sobre esta questão.

32.
    Por requerimento que deu entrada na Secretaria do Tribunal em 28 de Fevereiro de 1997, a República Helénica pediu para intervir no presente litígio em apoio do pedido da Comissão. O presidente da Terceira Secção Alargada autorizou essa intervenção por despacho de 9 de Março de 2001.

33.
    Por despacho de 15 de Dezembro de 2000, o Tribunal decidiu conhecer da questão prévia da admissibilidade do recurso com a apreciação do mérito da causa.

34.
    A República Helénica apresentou as suas alegações de intervenção em 23 de Abril de 2001, relativamente às quais a recorrente apresentou as suas observações. A Comissão não apresentou observações sobre as referidas alegações.

35.
    Com base no relatório do juiz-relator, o Tribunal de Primeira Instância (Quinta Secção Alargada) decidiu dar início à fase oral do processo. No âmbito das medidas de organização do processo, convidou a Comissão a responder a algumas perguntas escritas e a apresentar determinados documentos. A Comissão satisfez esses pedidos.

36.
    Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às perguntas colocadas pelo Tribunal na audiência de 27 de Fevereiro de 2003.

37.
    A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    declarar o recurso admissível;

-    anular o artigo 1.° da decisão controvertida «na medida em que se limita a declarar o artigo 30.°, n.° 3, da Lei n.° 2040/92 [...] e não o artigo 30.°, n.° 1, [da mesma lei] incompatível com o mercado comum»;

-    condenar a Comissão nas despesas.

38.
    A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    julgar o recurso inadmissível;

-    subsidiariamente, negar provimento ao recurso;

-    condenar a recorrente nas despesas.

39.
    A República Helénica conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    julgar o recurso inadmissível;

-    a título subsidiário, negar provimento ao recurso.

Questão de direito

Argumentação das partes

40.
    A Comissão e a República Helénica sustentam que o recurso é inadmissível.

41.
    Em primeiro lugar, constitui uma utilização indevida do processo.

42.
    Efectivamente, «não se debruçando sobre os aspectos relativos ao auxílio de Estado», a recorrente pretende, na realidade, que o Tribunal se pronuncie sobre a legalidade do direito nivelador compensatório e da decisão da Comissão de encerrar o procedimento por infracção. Ora, «considerada isoladamente», uma violação do direito comunitário como a que é invocada pela recorrente não está abrangida pelo controlo dos auxílios de Estado e só pode ser examinada no quadro de uma acção por incumprimento, nos termos do artigo 226.° CE. Além disso, segundo jurisprudência constante, os particulares não têm legitimidade para impugnar uma recusa da Comissão de instaurar um processo dessa natureza (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 22 de Maio de 1996, AITEC/Comissão, T-277/94, Colect., p. II-351, n.° 55).

43.
    Seguidamente, a recorrente utiliza também o presente recurso de anulação como uma acção por omissão na acepção do artigo 175.° do Tratado CE (actual artigo 232.° CE). Com efeito, a recorrente critica o facto de a Comissão não ter igualmente declarado incompatível com o mercado comum o artigo 30.°, n.° 1, da Lei n.° 2040/92. Ora, o artigo 232.° CE diz respeito à omissão por não decisão ou não tomada de posição e não à adopção de um acto diferente daquele que os interessados desejavam ou consideravam necessário.

44.
    Em segundo lugar, a Comissão, apoiada pela República Helénica, alega que a recorrente não é individualmente afectada pela decisão controvertida, que tem como destinatária a República Helénica.

45.
    Começa por afirmar que, segundo jurisprudência, as associações só são consideradas individualmente afectadas por uma decisão no domínio dos auxílios de Estado se agruparem empresas concorrentes das beneficiárias dos auxílios em causa, tiverem desempenhado um papel activo no procedimento instaurado nos termos do artigo 88.°, n.° 2, CE e tiverem sido afectadas na sua qualidade de negociadoras ou se, ao interporem o seu recurso, se tiverem substituído a um ou mais dos membros que representam, na condição de os seus próprios membros terem estado em situação de interpor um recurso admissível (acórdãos do Tribunal de Justiça de 28 de Janeiro de 1986, Cofaz/Comissão, 169/84, Colect., p. 391, n.° 25; de 2 de Fevereiro de 1988, Van der Kooy/Comissão, 67/85, 68/85 e 70/85, Colect., p. 219, n.os 21 a 24; de 24 de Março de 1993, CIRFS e o./Comissão, C-313/90, Colect., p. I-1125, n.os 28 a 30, e de 23 de Maio de 2000, Comité d'entreprise de la Société française de production e o./Comissão, C-106/98 P, Colect., p. I-3659, n.° 42; acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 12 de Dezembro de 1996, AIUFFASS e AKT/Comissão, T-380/94, Colect., p. II-2169, n.° 50). Ora, no caso vertente, a recorrente não preenche tais condições, à excepção da que respeita à participação activa no procedimento.

46.
    Seguidamente, a Comissão sublinha que a decisão controvertida versa sobre um regime geral de auxílios e que, segundo jurisprudência constante, as empresas concorrentes de uma empresa potencialmente beneficiária de um auxílio, ao abrigo de um regime dessa natureza, não têm qualidade para agir contra uma decisão da Comissão que autoriza o mesmo regime (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 5 de Junho de 1996, Kahn Scheepvaart/Comissão, T-398/94, Colect., p. II-477). O mesmo se passa, a fortiori, com as empresas não concorrentes e as associações que as representam. Invoca igualmente o acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 11 de Fevereiro de 1999, Arbeitsgemeinschaft Deutscher Luftfarht-Unternehmen e Hapag-Lloyd/Comissão (T-86/96, Colect., p. II-179, n.° 45), no qual este último considerou que os beneficiários potenciais de um regime geral de auxílios não são individualmente afectados por uma decisão da Comissão relativa a esse regime.

47.
    Em terceiro lugar, a Comissão alega, na contestação, que, mesmo admitindo que representa os interesses de empresas beneficiárias das medidas de auxílio em causa, a recorrente não tem interesse em agir. Com efeito, a recorrente não ataca a decisão controvertida na medida em que esta recusa a concessão de um benefício aos seus membros, mas na medida em que não é «suficientemente desfavorável no que respeita ao financiamento do auxílio». Se tivesse aceite as críticas da recorrente a respeito do artigo 30.°, n.° 1, da Lei n.° 2040/92, a Comissão teria declarado os auxílios de Estado em causa incompatíveis, a todos os títulos, com o mercado comum, isto é, não só na medida em que são financiados através da imposição especial, mas também na medida em que o são através do direito nivelador compensatório.

48.
    A Comissão observa igualmente que a recorrente contesta o facto de um dos dois modos de financiamento das medidas de auxílio em causa não ter sido declarado incompatível e, por consequência, não pôr em causa o dispositivo da decisão controvertida, uma vez que este visa as medidas de auxílio, em si mesmas, e não o seu financiamento. A incompatibilidade da imposição especial não é senão o fundamento da incompatibilidade do auxílio. Sublinha que as apreciações formuladas nos fundamentos de uma decisão só podem ser objecto de um recurso de anulação se constituírem o suporte necessário da parte decisória do acto que lesa a recorrente (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 17 de Setembro de 1992, NBV e NVB/Comissão, T-138/89, Colect., p. II-2181, n.° 31). No caso vertente, uma vez que as apreciações acerca da compatibilidade do direito nivelador compensatório apontam no sentido de uma declaração de compatibilidade das medidas de auxílio, no dispositivo da decisão controvertida, a recorrente, na qualidade de associação de empresas beneficiárias destas medidas de auxílio, não tem qualquer interesse em contestá-las. Além disso, as referidas apreciações não constituem o suporte do dispositivo da decisão controvertida, uma vez que apenas a incompatibilidade da imposição especial impede que as medidas possam ser autorizadas.

49.
    Em quarto lugar, na tréplica, a Comissão sustenta que a recorrente procedeu, na réplica, a uma «reorientação fundamental da petição» e a uma «reformulação da maioria dos fundamentos de origem». Observa nomeadamente que, na réplica, a recorrente «evita cuidadosamente a questão da compatibilidade do direito nivelador [compensatório] com a organização comum do mercado do algodão, quando este era o principal argumento da petição». Assim, a recorrente não só suscitou fundamentos novos, inadmissíveis nos termos do artigo 48.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, como também adoptou uma posição contraditória com o pedido da petição.

50.
    A recorrente contesta, em primeiro lugar, que o recurso constitua uma utilização indevida do processo.

51.
    Nas suas observações sobre a questão prévia de admissibilidade, alega, em primeiro lugar, que o recurso não é dirigido contra o direito nivelador compensatório, mas «tem por objectivo evidente provar que a Comissão cometeu um erro manifesto ao não ter cumprido a sua obrigação de examinar a compatibilidade do aspecto de auxílio do artigo 30.°, n.° 1, da Lei n.° 2040/92, ao abrigo das regras aplicáveis aos auxílios de Estado, separada e independentemente do exame do modo de financiamento». Mais particularmente, a recorrente alega que critica a apreciação jurídica feita pela Comissão no ponto IV, n.° 3, segundo parágrafo, da decisão controvertida. A este respeito, explica que «quando aprecia, à luz dos artigos 87.° [CE] e 88.° CE, a compatibilidade com o mercado comum de uma medida como o artigo 30.°, n.os 1 e 3, da Lei n.° 2040/92, a Comissão deve, em primeiro lugar, considerar o método através do qual o auxílio é financiado e, em segundo lugar, separadamente, a compatibilidade do aspecto de auxílio». Entende que, no caso vertente, na medida em que declarou o modo de financiamento previsto no artigo 30.°, n.° 3, da Lei n.° 2040/92 «incompatível com o mercado comum, uma vez que viola as regras da organização comum do mercado do algodão», a Comissão não era obrigada a examinar ainda a compatibilidade desta disposição à luz das regras aplicáveis aos auxílios de Estado. Diversamente, no que respeita ao artigo 30.°, n.° 1, da Lei n.° 2040/92, uma vez que o havia declarado compatível com as regras da organização comum dos mercados no sector do algodão, cabia ainda à Comissão, segundo a recorrente, examinar o respectivo «aspecto de auxílio de Estado», à luz das regras aplicáveis aos auxílios de Estado. Precisa que, através do presente recurso, «tem como principal objectivo que o Tribunal decida no sentido de confirmar que a Comissão cometeu um erro manifesto de apreciação dos factos, ao concluir pela compatibilidade do aspecto de auxílio do artigo 30.°, n.° 1, da Lei n.° 2040/92 com os artigos 87.° [CE] a 89.° [...] CE, sem proceder a uma análise rigorosa e correcta, ou seja, do ponto de vista de saber se o artigo 30.°, n.° 1, da Lei n.° 2040/92 satisfaz as quatro condições previstas no artigo 87.° [...] CE».

52.
    Seguidamente, a recorrente alega que, através do presente recurso, não invoca qualquer omissão por parte da Comissão nem contesta a decisão desta de pôr termo ao procedimento por infracção.

53.
    Em segundo lugar, a recorrente entende que, na qualidade de associação que reúne empresas beneficiárias das medidas de auxílio em causa, deve ser considerada individualmente afectada pela decisão controvertida. Por outro lado, contesta o mérito dos argumentos que a Comissão retira do facto de a decisão controvertida versar sobre um regime geral de auxílios. Sustenta que as referências da Comissão aos acórdãos Kahn Scheepvaart/Comissão e Arbeitsgemeinschaft Deutscher Luftfarht-Unternehmen e Hapag-Lloyd/Comissão, já referidos, carecem de pertinência.

54.
    Em terceiro lugar, alega que o argumento da Comissão segundo o qual a recorrente não tem qualquer interesse em pedir a anulação da decisão controvertida por esta não ser «suficientemente desfavorável» é irrelevante. Dada a sua qualidade de associação que reúne empresas beneficiárias das medidas de auxílio em causa, e independentemente do motivo que a levou a interpor o presente recurso, a recorrente tem, efectivamente, legitimidade para impugnar a decisão controvertida.

Apreciação do Tribunal

55.
    Importa, em primeiro lugar, considerar o objecto do recurso.

56.
    No seu pedido, a recorrente pretende obter a anulação «do artigo 1.° da [decisão controvertida] na medida em que se limita a declarar o artigo 30.°, n.° 3, da Lei n.° 2040/92 [...] e não o artigo 30.°, n.° 1, [da mesma lei] incompatível com o mercado comum».

57.
    Ora, este artigo 1.° não declara - nem outras passagens do dispositivo da decisão controvertida o fazem - o artigo 30.°, n.° 3, da Lei n.° 2040/92 incompatível com o mercado comum. Efectivamente, a declaração de incompatibilidade nele prevista apenas visa as medidas de auxílio concedidas pelo Instituto grego do algodão e financiadas pela imposição especial instituída por aquela disposição, aspecto da decisão controvertida cujo mérito a recorrente não contesta.

58.
    Na realidade, a recorrente põe em causa não o dispositivo da decisão controvertida em si mesmo mas certas apreciações formuladas pela Comissão nos fundamentos dessa mesma decisão, mais particularmente, as relativas ao direito nivelador compensatório, que constam do seu ponto IV, n.os 2 e 3.

59.
    Importa referir, em segundo lugar, que resulta claramente da petição que, ao invés da posição que adopta nos seus articulados subsequentes (v., nomeadamente, n.° 51, supra), a recorrente contesta, a título principal, o mérito da conclusão da Comissão segundo a qual o direito nivelador compensatório é consentâneo com a organização comum dos mercados no sector do algodão (ponto IV, n.° 2, da decisão controvertida). Assim, o essencial da argumentação jurídica que a recorrente desenvolve na petição é dedicada a esta questão e põe em causa a posição adoptada pela Comissão no quadro do procedimento por infracção.

60.
    Ora, a recorrente não tem legitimidade para impugnar esta conclusão.

61.
    De facto, por um lado, a referida conclusão resulta, na realidade, da decisão de 2 de Dezembro de 1998, relativa ao arquivamento do procedimento por infracção. O ponto IV, n.° 2, da decisão controvertida limita-se a recordar a posição já tomada pela Comissão na sua decisão de 2 de Dezembro de 1998 e não contém qualquer elemento novo susceptível de produzir efeitos jurídicos obrigatórios de natureza a afectar os interesses da recorrente, modificando de forma caracterizada a sua situação jurídica.

62.
    Por outro lado, é manifesto que, ao contestar desta forma a apreciação contida no ponto IV, n.° 2, da decisão controvertida, a recorrente pretende, na realidade, pôr em causa, a coberto de um recurso de anulação dirigido contra uma decisão em matéria de auxílios de Estado, o desfecho do procedimento por infracção. Ora, além de se tratar de uma violação do princípio da autonomia das vias de recurso, importa recordar que os particulares não têm legitimidade para impugnar uma decisão da Comissão de não instaurar uma acção por incumprimento contra um Estado-Membro (acórdãos do Tribunal de Justiça de 1 de Maio de 1966, Lütticke e o./Comissão, 48/65, Colect. 1965-1968, p. 305, n.° 39; de 14 de Fevereiro de 1989, Star Fruit/Comissão, 247/87, Colect., p. 291, n.os 11 e 12, e de 17 de Maio de 1990, Sonito e o./Comissão, C-87/89, Colect., p. I-1981, n.os 6 e 7).

63.
    Além disso, a recorrente invoca um argumento subsidiário - que, nos seus articulados subsequentes à petição, procura fazer passar por argumento principal - segundo o qual, mesmo admitindo que o artigo 30.°, n.° 1, da Lei n.° 2040/92 é consentâneo com a organização comum dos mercados no sector do algodão, cabia ainda à Comissão analisar, «separada e independentemente do método de financiamento», a compatibilidade daquela disposição «à luz da regulamentação em matéria de auxílios de Estado». Critica assim a apreciação contida no ponto IV, n.° 3, segundo parágrafo, da decisão controvertida, mais particularmente o facto de a Comissão ter alegadamente considerado o artigo 30.°, n.° 1, da Lei n.° 2040/92 compatível com as regras em matéria de auxílios de Estado com o mero fundamento de que o mesmo é consentâneo com a organização comum dos mercados no sector do algodão.

64.
    Impõe-se concluir que esta tese subsidiária evoluiu ao longo do processo mas que, independentemente da versão considerada, o recurso deve ser declarado inadmissível.

65.
    Efectivamente, a argumentação subsidiária, tal como foi apresentada na petição, assenta na ideia de que o artigo 30.°, n.° 1, da Lei n.° 2040/92 é, em si mesmo, um auxílio de Estado (v. n.os 157 a 159 da petição) ou que comporta um «aspecto de auxílio de Estado» (v. n.os 160 e 162 a 164 da petição). Ora, é bem evidente - como, aliás, a própria recorrente admite nos seus articulados subsequentes - que esta disposição não é um auxílio de Estado nem contém esse «aspecto», limitando-se a constituir um dos dois métodos de financiamento dos auxílios de Estado concedidos pelo Instituto grego do algodão. É de igual modo evidente que a Comissão não podia ter declarado a referida disposição compatível ou incompatível com o mercado comum, à luz do artigo 87.° CE, uma vez que tais declarações só podem visar medidas de auxílio propriamente ditas.

66.
    Na realidade, é óbvio que, ao equiparar indevidamente o artigo 30.°, n.° 1, da Lei n.° 2040/92 a um auxílio de Estado, a recorrente tem, uma vez mais, como único objectivo que o Tribunal fiscalize a legalidade desta disposição, e isto quando a Comissão já se pronunciou sobre a mesma, no quadro do procedimento por infracção. Ao agir deste modo, a recorrente comete uma violação do princípio da autonomia das vias de recurso.

67.
    Esta conclusão é corroborada pelo facto de, na réplica, afastando-se da sua tese inicial, a recorrente alegar estar «perfeitamente consciente de que um direito nivelador não pode ser equiparado a um auxílio» e ter «sempre considerado que as medidas de auxílio de Estado controvertidas são constituídas pelos serviços fornecidos pelo Instituto [grego do algodão] e não pelo próprio direito nivelador» (v. n.os 3, 17, 36 e 39 da réplica). Na réplica, a recorrente centra, deste modo, mais particularmente, a sua argumentação subsidiária já não no artigo 30.°, n.° 1, da Lei n.° 2040/92, enquanto tal, mas nos referidos serviços, enquanto serviços financiados pelo direito nivelador compensatório (v. n.os 19, 20, 26 e 39 da réplica).

68.
    Contudo, a alteração assim introduzida à argumentação subsidiária enunciada na petição deve ser rejeitada. Com efeito, constitui um fundamento novo, inadmissível nos termos do artigo 48.°, n.° 2, do Regulamento de Processo.

69.
    Resulta de tudo quanto precede que o recurso deve ser julgado inadmissível, sem que seja necessário analisar os outros fundamentos de inadmissibilidade invocados pela Comissão.

Quanto às despesas

70.
    Nos termos do disposto no artigo 87.°, n.° 2, primeiro parágrafo, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená-la a suportar, além das suas próprias despesas, as despesas efectuadas pela Comissão, em conformidade com o pedido desta última.

71.
    Nos termos do artigo 87.°, n.° 4, do mesmo regulamento, a República Helénica suportará as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quinta Secção Alargada)

decide:

1)    O recurso é inadmissível.

2)    A recorrente suportará as suas próprias despesas, bem como as da Comissão.

3)    A República Helénica suportará as suas próprias despesas.

García-Valdecasas
Lindh
Cooke

Mengozzi

Legal

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 16 de Outubro de 2003.

O secretário

O presidente

H. Jung

P. Lindh


1: Língua do processo: inglês.