Language of document : ECLI:EU:T:2022:736

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção alargada)

30 de novembro de 2022 (*)

«Direito institucional — Membro do CESE — Procedimento de quitação pela execução do orçamento do CESE para o exercício de 2019 — Resolução do Parlamento que designa o recorrente como autor de atos de assédio moral — Recurso de anulação — Ato insuscetível de recurso — Inadmissibilidade — Ação de indemnização — Proteção de dados pessoais — Presunção de inocência — Dever de confidencialidade — Princípio da boa administração — Proporcionalidade — Violação suficientemente caracterizada de uma norma jurídica que confere direitos aos particulares»

No processo T‑401/21,

KN, representado por M. Casado García‑Hirschfeld e M. Aboudi, advogados,

recorrente,

contra

Parlamento Europeu, representado por R. Crowe, C. Burgos e M. Allik, na qualidade de agentes,

recorrido,

O TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção alargada),

composto, aquando das deliberações, por: M. van der Woude, presidente, J. Svenningsen (relator), C. Mac Eochaidh, T. Pynnä e M. J. Laitenberger, juízes,

secretário: M. L. Ramette, administrador,

vistos os autos,

após a audiência de 14 de setembro de 2022,

profere o presente

Acórdão

1        Com o seu recurso, o recorrente, KN, pede, por um lado, com base no artigo 263.o TFUE, a anulação da Decisão (UE, Euratom) 2021/1552 do Parlamento Europeu, de 28 de abril de 2021, sobre a quitação pela execução do orçamento geral da União Europeia para o exercício de 2019, Secção VI Comité Económico e Social Europeu (JO 2021, L 340, p. 140, a seguir «decisão impugnada»), e da Resolução do Parlamento Europeu (UE) 2021/1553, de 29 de abril de 2021, que contém as observações que constituem parte integrante da decisão sobre a quitação pela execução do orçamento geral da União Europeia para o exercício de 2019, Secção VI — Comité Económico e Social Europeu (JO 2021, L 340, p. 141, a seguir «resolução impugnada») (a seguir, quando mencionada com a decisão impugnada, «atos impugnados»), e, por outro, com base no artigo 268.o TFUE, a reparação dos danos alegadamente sofridos em consequência dos atos impugnados.

 Antecedentes do litígio

2        O recorrente é membro do Comité Económico e Social Europeu (CESE). Foi presidente do grupo dos empregadores (a seguir «Grupo I») entre abril de 2013 e outubro de 2020.

3        Em 6 de dezembro de 2018, o Organismo Europeu de Luta Antifraude (OLAF), depois de ter sido informado de alegações respeitantes ao comportamento do recorrente relativamente a outros membros do CESE e a membros do seu pessoal, abriu um inquérito sobre ele.

4        Por carta de 16 de janeiro de 2020, o OLAF informou o recorrente da conclusão do inquérito e do envio do relatório final (a seguir «relatório do OLAF») à Procuradoria Federal belga e ao presidente do CESE. Tendo o OLAF concluído, designadamente, que o recorrente tinha assediado dois membros do pessoal do CESE, recomendou, por um lado, ao CESE que considerasse a possibilidade de instauração do procedimento previsto no artigo 8.o do Código de Conduta dos membros do CESE e que tomasse «todas as medidas necessárias para evitar a prática de qualquer ato de assédio por parte [do recorrente] no local de trabalho». Por outro lado, recomendou à Procuradoria Federal belga que instaurasse um processo judicial, uma vez que os factos estabelecidos no relatório do OLAF eram suscetíveis de constituir uma infração penal, na aceção do artigo 442.o bis do Code pénal (Código Penal) belga.

5        Pela Decisão (UE) 2020/1984 do Parlamento Europeu, de 13 de maio de 2020, sobre a quitação pela execução do orçamento geral da União Europeia para o exercício de 2018, Secção VI Comité Económico e Social Europeu (JO 2020, L 417, p. 469), o Parlamento Europeu adiou a decisão de dar quitação ao secretário‑geral do CESE pela execução do orçamento do CESE para o exercício de 2018.

6        No dia seguinte, o Parlamento adotou a Resolução (UE) 2020/1985, que contém as observações que constituem parte integrante da decisão sobre a quitação pela execução do orçamento geral da União Europeia para o exercício de 2018, Secção VI Comité Económico e Social Europeu (JO 2020, L 417, p. 470). No n.o 6 desta resolução, refere‑se, em substância, que o Parlamento espera que o CESE o informe sobre as medidas tomadas para dar seguimento ao relatório do OLAF.

7        Em 9 de junho de 2020, a Mesa do CESE adotou várias medidas para implementar as recomendações do OLAF. Particularmente, em primeiro lugar, solicitou ao recorrente que se demitisse das funções de presidente do Grupo I e que retirasse a sua candidatura à presidência do CESE e, em segundo lugar, dispensou o recorrente de qualquer atividade de enquadramento e de gestão do pessoal.

8        Por carta de 7 de julho de 2020, o presidente do CESE informou o Parlamento Europeu das medidas adotadas pela Mesa do CESE a 9 de junho de 2020.

9        Por Decisão de 15 de julho de 2020, a Assembleia Plenária do CESE, a requerimento do auditorat du travail de Bruxelles [Conselho de Auditores do Trabalho de Bruxelas (Bélgica)], procedeu ao levantamento da imunidade de que gozava o recorrente. Em seguida, por decisão de 28 de julho de 2020, a Assembleia Plenária do CESE decidiu que este órgão se constituiria parte civil no processo instaurado contra o recorrente no Tribunal Correctionnel de Bruxelles (Tribunal Correcional de Bruxelas, Bélgica).

10      Pela Decisão (UE) 2020/2046 do Parlamento Europeu, de 20 de outubro de 2020, sobre a quitação pela execução do orçamento geral da União Europeia para o exercício de 2018, Secção VI Comité Económico e Social Europeu (JO 2020, L 420, p.16), o Parlamento recusou dar quitação ao secretário‑geral do CESE pela execução do orçamento do CESE para o exercício de 2018. Nesta resolução, o Parlamento manifestou, designadamente, a sua preocupação com o seguimento dado pelo CESE ao relatório do OLAF.

11      Em 25 de março de 2021, a Comissão de Controlo Orçamental do Parlamento (a seguir «Cocobu»), no âmbito do procedimento de quitação pela execução do orçamento do CESE para o exercício de 2019, apresentou um relatório no qual recomendava que fosse dada quitação ao secretário‑geral do CESE.

12      Em 28 de abril de 2021, o Parlamento adotou a decisão impugnada, pela qual decidiu dar quitação ao secretário‑geral do CESE pela execução do orçamento daquele órgão para o exercício de 2019.

13      No dia seguinte, o Parlamento aprovou a resolução impugnada, que tem, designadamente, a seguinte redação:

«Recusa de quitação em 2018, conflito de interesses, assédio, denúncia de irregularidades

[O Parlamento]

66. Recorda que vários membros do pessoal foram vítimas de assédio moral por parte do antigo presidente do grupo I durante um longo período de tempo; lamenta que as medidas de combate ao assédio em vigor no Comité não tenham conseguido resolver e corrigir esta situação mais cedo devido à posição privilegiada do membro em causa […] condena o tempo que o Comité levou para tomar as medidas necessárias à adaptação do seu regimento interno e código de conduta, a fim de evitar uma situação desse tipo no futuro […]

68. Assinala que as falhas do Comité neste caso resultaram numa perda material de fundos públicos no que respeita a custos jurídicos, baixa por doença, proteção das vítimas, redução da produtividade, reuniões da Mesa e de outros órgãos, etc.; considera, portanto, que tal é motivo de preocupação quanto à responsabilização, ao controlo orçamental e à boa governação dos recursos humanos nas instituições, órgãos, organismos e agências da União […]

69. Recorda que o Parlamento recusou dar quitação ao Secretário‑Geral do Comité para o exercício de 2018, nomeadamente devido a uma flagrante violação do dever de diligência e à inação da administração, em conjunto com as consequências financeiras conexas; recorda ao Comité que uma recusa de quitação configura uma situação séria e que exige medidas imediatas; lamenta profundamente que, até à recusa da quitação para o exercício de 2018, o diretor de RH e Finanças da altura, e atual Secretário‑Geral, não tenha tomado medidas decisivas, nomeadamente medidas preventivas e de reparação;

70. Observa que, durante o processo de quitação de 2018 e em parte do de 2019, o secretário‑geral não foi capaz de fornecer informações suficientes, transparentes e fiáveis à Comissão do Controlo Orçamental do Parlamento […]

75. […] manifesta‑se particularmente preocupado com o facto de já após ter sido apresentada a recomendação do OLAF um membro considerado responsável por assédio ainda estar ativo na Mesa, tendo conseguido atrasar a adoção do novo código de conduta dos membros […]

80. […] contudo, manifesta profunda preocupação por o Conselho ter nomeado o perpetrador para um novo mandato como membro, correndo as vítimas e os denunciantes um risco de retaliação da sua parte ou de apoiantes seus no seio do Comité; destaca que o perpetrador não reconhece nem lamenta os seus erros, o que denota uma total falta de autoanálise e de respeito pelas vítimas em questão […]

83. Observa que a sessão plenária do Comité de 15 e 16 de julho de 2020 confirmou a decisão da Mesa, de 9 de junho de 2020, no que respeita à constituição do Comité como parte civil no processo que será aberto pelo auditor para as questões laborais de Bruxelas perante o Tribunal Penal de Bruxelas; observa que o auditor para as questões laborais de Bruxelas foi informado do levantamento da imunidade do membro, mas que até à data não foram recebidas mais informações sobre o processo; […]»

 Pedidos das partes

14      O recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        anular a decisão impugnada e a resolução impugnada;

–        condenar o Parlamento a pagar‑lhe o montante de 100 000 euros a título de indemnização por danos morais;

–        condenar o Parlamento nas despesas.

15      O Parlamento conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        julgar o recurso inadmissível e, a título subsidiário, negar‑lhe provimento;

–        julgar a ação de indemnização inadmissível e, a título subsidiário, improcedente;

–        condenar o recorrente nas despesas.

 Questão de direito

16      Sem suscitar formalmente a exceção de inadmissibilidade nos termos do artigo 130.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, o Parlamento alega que os pedidos de anulação e de indemnização são inadmissíveis.

 Quanto à admissibilidade do pedido de anulação

17      O Parlamento alega, por um lado, que os atos impugnados, que têm o CESE como único destinatário, não se destinam a produzir efeitos jurídicos vinculativos na esfera jurídica de terceiros. Por outro lado, defende que o recorrente não é direta nem individualmente afetado pelos atos impugnados, pelo que não tem legitimidade para impugná‑los.

18      O recorrente contesta esta argumentação e alega, em substância, que os atos impugnados o afetam negativamente, uma vez que se referem a ele no que toca a alegados comportamentos de assédio. A este respeito, indica que, tendo em conta a sua publicação, estes atos afetam diretamente a sua reputação e dignidade, individualizando‑o de maneira análoga à do destinatário dos atos.

19      A título preliminar, visto que a resolução impugnada contém observações que fazem parte integrante da decisão impugnada, é necessário examinar em conjunto a admissibilidade dos pedidos de anulação dos atos impugnados.

20      A este respeito, importa notar que o recorrente não pede a anulação das medidas impugnadas no que respeita à quitação dada pelo Parlamento ao secretário‑geral do CESE pela execução do orçamento deste órgão para o exercício de 2019, mas apenas naquelas em que ele seja identificado ou pelo menos identificável na resolução impugnada como autor de comportamentos de assédio moral.

21      Por outras palavras, o recorrente pede que os atos impugnados sejam anulados unicamente na medida em que é visado por certas observações contidas na resolução impugnada, as quais são parte integrante da decisão impugnada. Não põe em causa o dispositivo dessa decisão pela qual o Parlamento concede quitação ao CESE.

22      Neste contexto, importa recordar que, segundo jurisprudência constante, só a parte decisória de uma decisão é suscetível de produzir efeitos jurídicos e, em consequência, de causar prejuízo, quaisquer que sejam os fundamentos em que assenta essa decisão. Em contrapartida, as apreciações formuladas nos fundamentos de um ato não podem, enquanto tais, ser objeto de um recurso de anulação e só poderiam ser submetidas à fiscalização da legalidade do juiz da União na medida em que, enquanto fundamentos de um ato lesivo, constituam o suporte necessário da parte decisória desse ato (v., neste sentido, Acórdãos de 17 de setembro de 1992, NBV e NVB/Comissão, T‑138/89, EU:T:1992:95, n.o 31, e de 1 de fevereiro de 2012, Région wallonne/Comissão, T‑237/09, EU:T:2012:38, n.o 45).

23      Contudo, no caso em apreço, as observações constantes da resolução impugnada relativas ao recorrente não constituem fundamentação necessária da parte decisória da decisão impugnada. Com efeito, o Parlamento decidiu dar quitação ao secretário‑geral do CESE pela execução do orçamento desse órgão para o exercício de 2019, independentemente da parte da resolução impugnada que permite identificar o recorrente como o autor de comportamentos de assédio moral.

24      Consequentemente, na resolução impugnada, a referência ao recorrente como o autor de comportamentos de assédio não é, por si só, suscetível de recurso de anulação pelo recorrente perante o Tribunal Geral e, em qualquer caso, na impossibilidade de estar associada à parte decisória da decisão impugnada, tal referência não pode ser submetida à fiscalização da legalidade pelo juiz da União.

25      O argumento do recorrente de que é lesado pela parte da resolução impugnada que lhe diz respeito não prejudica esta conclusão. Com efeito, o recorrente não está privado do acesso à justiça porque a ação de indemnização em matéria de responsabilidade extracontratual prevista no artigo 268.o e no artigo 340.o, segundo parágrafo, TFUE é ainda possível se esse comportamento for suscetível de desencadear a responsabilidade da União (v., neste sentido, Acórdão de 12 de setembro de 2006, Reynolds Tobacco e o./Comissão, C‑131/03 P, EU:C:2006:541, n.o 82).

26      Relativamente a este aspeto, na medida em que o objeto do pedido de anulação coincide com o do pedido de indemnização, a inadmissibilidade do pedido de anulação, baseada na falta de ato impugnável pelo recorrente, não tem por efeito privar o Tribunal da possibilidade de invocar, quando pertinente, os fundamentos e argumentos invocados no pedido de anulação para, no âmbito do pedido de indemnização, apreciar a legalidade do comportamento imputado ao Parlamento (v., neste sentido, Acórdão de 9 de dezembro de 2010, Comissão/Strack, T‑526/08 P, EU:T:2010:506, n.o 50 e jurisprudência referida).

27      Tendo em conta o que precede, os pedidos de anulação devem ser julgados inadmissíveis.

 Quanto à admissibilidade do pedido de indemnização

28      Embora admitindo que um pedido de indemnização teria sido admissível se o recorrente não tivesse pedido também a anulação dos atos impugnados, o Parlamento alega, no entanto, que os pedidos de indemnização no caso vertente devem ser julgados inadmissíveis, em conformidade com a jurisprudência segundo a qual os pedidos de indemnização por danos materiais ou morais devem ser indeferidos quando estão estreitamente ligados a pedidos de anulação cujo provimento foi negado por carecerem de fundamento ou se revelarem inadmissíveis.

29      É verdade que, segundo jurisprudência constante em matéria de função pública, se um pedido de indemnização estiver estreitamente ligado a um pedido de anulação, como no caso vertente, a rejeição deste último pedido de anulação por inadmissibilidade ou falta de fundamento implica também a rejeição do pedido de indemnização (v., neste sentido, Acórdãos de 6 de março de 2001, Connolly/Comissão, C‑274/99 P, EU:C:2001:127, n.o 129, e de 30 de setembro de 2003, Martínez Valls/Parlamento, T‑214/02, EU:T:2003:254, n.o 43).

30      Contudo, no que respeita, concretamente, à inadmissibilidade de um pedido de anulação de um ato, essa jurisprudência resulta de processos em que os recorrentes não tinham impugnado, por meio de um recurso de anulação, os atos que estavam na origem dos danos que alegavam ter sofrido, ou o tinham feito tardiamente (v., neste sentido, Acórdão de 8 de novembro de 2018, Cocchi e Falcione/Comissão, T‑724/16 P, não publicado, EU:T:2018:759, n.o 82). Uma vez que se destina a impedir que sejam contornadas as vias de recurso disponíveis, esta jurisprudência só é aplicável quando o prejuízo alegado resulte exclusivamente de um ato que se tornou definitivo e que o interessado poderia ter impugnado por meio de um recurso de anulação (v., neste sentido, Despacho de 4 de maio de 2005 Holcim (France)/Comissão, T‑86/03 EU:T:2005:157, n.o 50).

31      No caso vertente, para excluir o fundamento da inadmissibilidade suscitado pelo Parlamento, bastará notar que os pedidos de anulação foram julgados inadmissíveis em virtude da inexistência de um ato impugnável, e não porque o recorrente não o tenha impugnado ou o tenha feito tardiamente.

32      Nestes termos, os pedidos de indemnização são admissíveis.

 Quanto ao mérito do pedido de indemnização

33      A responsabilidade extracontratual da União, na aceção do artigo 340.o, segundo parágrafo, TFUE, está sujeita à verificação de um conjunto de três requisitos cumulativos, a saber, a ilegalidade do comportamento imputado à instituição da União, a realidade de dano e a existência de um nexo de causalidade entre o comportamento dessa instituição e o dano invocado (v., neste sentido, Acórdão de 16 de dezembro de 2020, Conselho e o./K. Chrysostomides & Co. e o., C‑597/18 P, C‑598/18 P, C‑603/18 P e C‑604/18 P, EU:C:2020:1028, n.o 79).

34      Quando um destes requisitos não esteja preenchido, deve ser negado provimento ao recurso na totalidade, sem necessidade de apreciar os outros requisitos da responsabilidade extracontratual da União (v. Acórdão de 25 de fevereiro de 2021, Dalli/Comissão, C‑615/19 P, EU:C:2021:133, n.o 42 e jurisprudência referida).

35      No presente processo, para demonstrar que o Parlamento agiu ilicitamente, o recorrente formula quatro acusações, relativas a violações de normas jurídicas que visam conferir direitos aos particulares, concretamente, primeiro, o direito à proteção dos dados pessoais, segundo, o princípio da presunção de inocência, terceiro, o princípio da confidencialidade dos inquéritos do OLAF, e, quarto, o direito a uma boa administração e o princípio da proporcionalidade.

 Quanto à primeira acusação, relativa à violação do direito à proteção de dados pessoais

36      O recorrente alega que a publicação dos seus dados pessoais na resolução impugnada não constitui um tratamento lícito na aceção do artigo 5.o do Regulamento (UE) 2018/1725 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2018, relativo à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais pelas instituições, órgãos e organismos da União e à livre circulação desses dados, e que revoga o Regulamento (CE) n.o 45/2001 e a Decisão n.o 1247/2002/CE (JO 2018, L 295, p. 39).

37      Particularmente, alega que o tratamento dos seus dados pessoais não era necessário para o exercício de funções de interesse público, na aceção do artigo 5.o, n.o 1, alínea a), do referido regulamento, uma vez que o OLAF concluiu no seu relatório que o comportamento do recorrente não teve nenhum impacto financeiro no orçamento da União. Por conseguinte, a publicação das informações que lhe dizem respeito não era necessária para efeitos de tomada de uma decisão sobre a quitação relativa à execução do orçamento do CESE.

38      O Parlamento refuta esta argumentação.

39      Nos termos do artigo 5.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento 2018/1725, o tratamento de dados pessoais é lícito se, e na medida em que, for necessário para o exercício de funções de interesse público ou para o exercício da autoridade pública de que a instituição ou o órgão da União estão investidos.

40      A este respeito, importa referir que, nos termos do artigo 14.o TUE, o Parlamento exerce, conjuntamente com o Conselho da União Europeia, as funções legislativa e orçamental, bem como funções de controlo político e funções consultivas, em conformidade com as condições estabelecidas nos Tratados. No contexto do controlo democrático da utilização de fundos públicos, previsto no artigo 319.o TFUE, o Parlamento dispõe de uma ampla margem de apreciação nas suas observações sobre a maneira como as instituições e órgãos da União executaram a secção do orçamento que lhes diz respeito.

41      Por outro lado, as instituições dispõem de uma certa margem de apreciação para determinar até que ponto um tratamento de dados pessoais pode ser necessário para o desempenho de uma tarefa confiada às autoridades públicas (v. Acórdão de 20 de julho de 2016, Oikonomopoulos/Comissão, T‑483/13, não publicado, EU:T:2016:421, n.o 57 e jurisprudência referida).

42      Assim, a argumentação do recorrente implica verificar se o Parlamento excedeu a sua margem de apreciação ao considerar que o tratamento dos dados pessoais do recorrente era necessário para o exercício de funções de interesse público de controlo da execução do orçamento pelo CESE no exercício financeiro de 2019.

43      No caso em apreço, importa referir, em primeiro lugar, que, no âmbito do controlo da execução do orçamento para o exercício de 2018, o Parlamento recusou dar quitação ao CESE, designadamente por considerar que as medidas tomadas pelo referido órgão para dar seguimento ao relatório do OLAF e para evitar a repetição daquele tipo de situações no futuro se revelaram, em substância, insuficientes.

44      Ora, nos termos do artigo 262.o, n.o 2, do Regulamento (UE, Euratom) 2018/1046 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de julho de 2018, relativo às disposições financeiras aplicáveis ao orçamento geral da União, que altera os Regulamentos (UE) n.o 1296/2013 (UE) n.o 1301/2013 (UE) n.o 1303/2013 (UE) n.o 1304/2013 (UE) n.o 1309/2013 (UE) n.o 1316/2013 (UE) n.o 223/2014 e (UE) n.o 283/2014, e a Decisão n.o 541/2014/UE, e que revoga o Regulamento (UE, Euratom) n.o 966/2012 (JO 2018, L 193, p. 1), compete ao Parlamento assegurar o seguimento das medidas tomadas pelo destinatário da quitação, por forma a concretizar as observações que acompanham a decisão de quitação.

45      No caso vertente, tendo o Parlamento considerado insuficientes as medidas tomadas pelo CESE para concretizar as observações contidas na resolução sobre o exercício orçamental de 2018, o tratamento dos dados pessoais do recorrente revelou‑se necessário para o desempenho da função de controlo da execução do orçamento do CESE para o exercício orçamental de 2019.

46      Em segundo lugar, a gravidade das consequências financeiras do mau funcionamento constatado pelo Parlamento permitia também demonstrar a necessidade de tal tratamento.

47      Com efeito, tendo em conta que o comportamento de assédio moral imputado ao recorrente esteve na base de graves irregularidades no seio do CESE, e que destas resultaram despesas evitáveis das quais este órgão é acusado no n.o 68 da resolução impugnada, citado no n.o 13, supra, o Parlamento devia tomar tais atos em consideração.

48      Assim, tendo em conta o risco de repetição dessa conduta e os seus efeitos na boa governação dos recursos humanos, o tratamento dos dados pessoais do recorrente revelou‑se necessário para alcançar o objetivo estabelecido no considerando A da resolução impugnada, concretamente, em substância, reforçar a legitimidade democrática das instituições da União promovendo uma boa governação dos recursos humanos.

49      Em terceiro lugar, mesmo que o recorrente considere que a publicação da resolução impugnada constitui um tratamento dos seus dados pessoais em violação do artigo 5.o do Regulamento 2018/1725, é importante recordar que, nos termos do artigo 37.o, n.o 1, do Regulamento 2018/1046, «[o] orçamento é elaborado […] e as contas são apresentadas em conformidade com o princípio da transparência».

50      A este respeito, considerou‑se que o princípio da transparência, consagrado no artigo 15.o TFUE, permite assegurar uma maior participação dos cidadãos no processo decisório e garantir uma maior legitimidade, eficácia e responsabilidade da administração perante os cidadãos num sistema democrático (v. Acórdão de 9 de novembro de 2010, Volker und Markus Schecke/Eifert, C‑92/09 e C‑93/09, EU:C:2010:662, n.o 68). Esta disposição espelha o direito que, numa sociedade democrática, assiste aos contribuintes e à opinião pública em geral de serem informados sobre a utilização das receitas públicas, designadamente em matéria de despesas de pessoal. Tais informações são suscetíveis de contribuir para o debate público relativo a uma questão de interesse geral e que serve, portanto, o interesse público (v., neste sentido, Acórdão de 20 de maio de 2003, Österreichischer Rundfunk e o., C‑465/00, C‑138/01 e C‑139/01, EU:C:2003:294, n.o 85).

51      Assim, no contexto do procedimento de quitação, a publicação dos atos impugnados destina‑se a reforçar o controlo público da execução do orçamento e a contribuir para a adequada utilização dos fundos públicos pela administração da União (v., por analogia, Acórdão de 9 de novembro 2010, Volker und Markus Schecke e Eifert, C‑92/09 e C‑93/09, EU:C:2010:662, n.o 69 e jurisprudência referida).

52      Resulta das considerações precedentes que a publicação da resolução impugnada era necessária para o exercício das funções de interesse público do Parlamento.

53      Daqui resulta que o Parlamento não excedeu os limites do seu poder de apreciação ao considerar que era necessário tratar os dados pessoais do recorrente para o exercício das suas funções de controlo da execução do orçamento pelo CESE. O tratamento dos dados pessoais do recorrente é, portanto, lícito à luz do artigo 5.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento 2018/1725.

54      O argumento do recorrente de que o OLAF, no seu relatório, referiu que os atos que lhe são imputados não tinham tido impacto financeiro, não invalida esta conclusão.

55      Com efeito, a resolução impugnada foi adotada no contexto do controlo da execução do orçamento do CESE e, portanto, não visa fiscalizar ou formular um juízo sobre a conduta do recorrente.

56      A resolução impugnada visa apenas apreciar o modo como o CESE executou o seu orçamento e tecer observações sobre a execução das despesas no futuro. A este respeito, no n.o 68 da resolução impugnada, o Parlamento identificou claramente as repercussões financeiras que comportamentos de assédio moral, como os referidos no caso em apreço, podem ter no bom funcionamento dos órgãos e instituições da União. Atendendo à gravidade das irregularidades administrativas detetadas, o facto de o OLAF ter considerado que o comportamento do recorrente em relação a determinados membros do pessoal não teve impacto financeiro não obstava a que o Parlamento o mencionasse.

57      Decorre do exposto que a primeira acusação não permite concluir pela existência de um comportamento ilegal por parte do Parlamento.

 Quanto à segunda acusação, relativa a uma violação do princípio da presunção de inocência

58      O recorrente defende que o Parlamento ignorou o princípio da presunção de inocência ao identificá‑lo na resolução impugnada como autor de comportamentos de assédio moral quando nenhum tribunal o condenou por tais atos. Em resposta a uma medida de organização do processo do Tribunal Geral, o recorrente indicou a esse respeito que, quando a resolução impugnada foi adotada, o processo judicial estava apenas na fase de «instrução» e que o Auditeur du Travail de Bruxelles [auditor para as questões laborais de Bruxelas (Bélgica)] poderia ainda, nomeadamente, decidir arquivar o processo.

59      Neste contexto, as declarações do Parlamento refletem o sentimento de que o recorrente é culpado ou, no mínimo, levam o público a acreditar na culpabilidade do recorrente, podendo ainda prejudicar a avaliação dos factos pelo tribunal competente.

60      O Parlamento refuta esta argumentação.

61      A título preliminar, recorde‑se que o respeito pelo princípio da presunção de inocência, enunciado no artigo 6.o, n.o 2, da Convenção para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma a 4 de novembro de 1950 (a seguir «CEDH»), e no artigo 48.o, n.o 1, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta»), preconiza que todo o arguido se presume inocente até que a sua culpabilidade seja provada nos termos da lei (v., neste sentido, Acórdão de 6 de junho de 2019, Dalli/Comissão, T‑399/17, não publicado, EU:T:2019:384, n.o 168 e jurisprudência referida).

62      Por um lado, este princípio não se limita a uma garantia processual em matéria penal: o seu alcance é mais amplo e exige que nenhuma autoridade pública declare que alguém é culpado de uma infração antes de a sua culpabilidade ter sido declarada por um tribunal (v. Acórdão de 6 de junho de 2019, Dalli/Comissão, T‑399/17, não publicado, EU:T:2019:384, n.o 173 e jurisprudência referida). Com efeito, uma violação da presunção de inocência pode emanar não só de um juiz ou de um tribunal mas também de outras autoridades públicas (v. Acórdão de 12 de julho de 2012, Comissão/Nanopoulos, T‑308/10 P, EU:T:2012:370, n.o 92 e jurisprudência referida).

63      Por outro lado, o artigo 6.o, n.o 2, da CEDH e o artigo 48.o, n.o 1, da Carta não podem impedir, tendo em conta o artigo 10.o da CEDH e o artigo 11.o da Carta, respetivamente, as autoridades que garantem a liberdade de expressão de informar o público sobre os inquéritos penais pendentes, mas exige que o façam com toda a discrição e reserva exigidas pelo respeito do princípio da presunção de inocência (v., neste sentido, Acórdão de 8 de julho de 2008, Franchet e Byk/Comissão, T‑48/05, EU:T:2008:257, n.o 212 e jurisprudência referida).

64      Além disso, entendeu‑se que, enquanto o arguido não tiver sido condenado por sentença transitada em julgado, uma assembleia parlamentar é obrigada a respeitar o princípio da presunção de inocência e, por conseguinte, a usar de discrição e reserva quando se expressa, numa resolução, relativamente aos factos pelos quais o arguido é acusado (v., neste sentido, TEDH, 18 de fevereiro de 2016, Rywin/Polónia, EC:ECHR:2016:0218JUD000609106, n.os 207 e 208 e jurisprudência referida).

65      No caso vertente, é certo que, em 29 de abril de 2021, data da adoção da resolução impugnada, nenhum tribunal tinha dado como provada a culpa do recorrente relativamente às infrações de que é acusado. No máximo, nessa data, decorria uma ação penal, instaurada pelas autoridades belgas em 2020. Aliás, o recorrente declarou, sem ser contradito pelo Parlamento, que o processo judicial continuava pendente e que nenhum órgão jurisdicional competente quanto ao mérito havia sido chamado a conhecer dos factos controvertidos.

66      Assim sendo, não procede o argumento do recorrente de que o princípio da presunção de inocência impedia o Parlamento de mencionar o relatório do OLAF, que identificava o recorrente como autor de assédio moral sem esperar pelo resultado do processo.

67      Com efeito, tratando‑se de declarações prestadas por uma autoridade pública após o encerramento de um inquérito do OLAF, já foi considerado que o respeito pelo princípio da presunção de inocência não obsta a que, no interesse de informar o público da maneira mais precisa possível acerca das ações tomadas no contexto de eventuais irregularidades ou fraudes, uma instituição da União descreva, em termos equilibrados, ponderados e essencialmente factuais, as principais conclusões do relatório do OLAF sobre um membro de uma instituição (v., neste sentido, Acórdão de 6 de junho de 2019, Dalli/Comissão, T‑399/17, não publicado, EU:T:2019:384, n.os 175 a 178).

68      Deste modo, o simples facto de, nos n.os 66 a 70, 72, 75, 78, 79 e 82 da resolução impugnada, enumerados na audiência pelo recorrente, o Parlamento ter tornado possível a sua identificação como autor de assédio moral, o que corresponde à principal conclusão do relatório do OLAF, não constitui, em si, uma violação do princípio da presunção de inocência.

69      Em concreto, o que mais importa para avaliar a existência de uma violação deste princípio é a escolha dos termos utilizados na resolução impugnada.

70      A este respeito, refira‑se que, na petição, além das citações da resolução impugnada sem comentários na parte introdutória, o recorrente não identificou nenhum número da referida resolução que, a seu ver, infringisse o princípio da presunção de inocência na escolha dos termos utilizados. Além disso, na fase da réplica, o recorrente limitou‑se a remeter para determinados excertos dos documentos elaborados no âmbito do processo de quitação relativo ao exercício de 2018, ou seja, ao exercício anterior ao exercício anual em questão, pelo que tais excertos não podem ser submetidos à fiscalização do Tribunal Geral no âmbito do presente litígio.

71      Em resposta a uma pergunta do Tribunal na audiência, o recorrente criticou unicamente, de maneira específica, o n.o 75 da resolução impugnada, citado no n.o 13, supra, por tal número indicar que o recorrente tinha sido «considerado» responsável pela prática de assédio, quando não havia sido proferida nenhuma sentença a esse respeito.

72      Quanto a este aspeto, não tendo o recorrente sido condenado, a utilização e do termo «considerado» é reconhecidamente inadequada. Aliás, o Parlamento admitiu na audiência que esta formulação não tinha sido «particularmente feliz».

73      Contudo, para avaliar se houve uma violação do princípio da presunção de inocência, a jurisprudência salienta a importância de ter em conta o verdadeiro sentido das declarações em questão e não o sentido literal das mesmas, bem como as circunstâncias particulares em que foram formuladas (v., neste sentido, Acórdão de 8 de julho de 2008, Franchet e Byk/Comissão, T‑48/05 EU:T:2008:257, n.o 211) e jurisprudência referida).

74      No presente processo, as circunstâncias particulares do caso em apreço permitem compreender que a utilização do termo «jugé», na versão francesa da resolução impugnada, procura refletir as constatações do OLAF de que a conduta do recorrente relativamente a dois membros do pessoal configura assédio moral. Decorre do exposto que tal afirmação, que apenas refere as conclusões do OLAF, não afeta a presunção de inocência do recorrente.

75      Esta conclusão é corroborada por várias versões linguísticas do n.o 75 da resolução impugnada que não contêm nenhuma referência a uma decisão no sentido judicial do termo, particularmente nas versões inglesa («was found responsible»), alemã («verantwortlich gemacht wurde»), espanhola («fue declarado responsable») ou neerlandesa («verantwoordelijk werd bevonden»). O verdadeiro sentido destas declarações é, portanto, de realçar a responsabilidade do recorrente por atos de assédio moral, como resulta do relatório do OLAF, sem prejudicar de forma alguma a sua possível inocência no contexto do processo pendente perante as autoridades judiciais belgas.

76      Além disso, importa notar que, no n.o 83 da resolução impugnada, o Parlamento referiu igualmente que, até à data da adoção da resolução impugnada, não tinham sido recebidas mais informações sobre o processo. Tal referência permite dissipar qualquer confusão quanto a ter ou não sido proferido uma «sentença» no caso do recorrente.

77      Em suma, a utilização da palavra «jugé» no n.o 75 da versão francesa da resolução impugnada, embora inadequada e inoportuna, não prejudica a presunção de inocência do recorrente.

78      Tendo em conta que o recorrente apenas criticou especificamente o n.o 75 da resolução impugnada, não cabe ao Tribunal Geral investigar ou examinar se outras passagens da resolução podem ter afetado a sua presunção de inocência.

79      Decorre do exposto que a segunda acusação não permite concluir pela existência de um comportamento ilegal por parte do Parlamento.

 Quanto à terceira acusação, relativa à violação da confidencialidade dos inquéritos do OLAF.

80      Por um lado, o recorrente acusa, em substância, o OLAF de ter revelado o conteúdo confidencial do seu relatório de inquérito ao Parlamento numa reunião da Cocobu realizada a 3 de fevereiro de 2020, na sequência da qual esta apresentou um projeto de relatório sobre a quitação do CESE, referindo designadamente o recorrente pelo seu apelido. Assim, segundo o recorrente, a resolução impugnada, baseada nesse relatório da Cocobu, foi adotada em violação do Regulamento (UE, Euratom) n.o 883/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de setembro de 2013, relativo aos inquéritos efetuados pelo OLAF, que revoga o Regulamento (CE) n.o 1073/1999 do Parlamento Europeu e do Conselho e o Regulamento (Euratom) n.o 1074/1999 do Conselho (JO 2013, L 248, p. 1).

81      Por outro lado, o recorrente alega que o princípio da confidencialidade obsta a que o Parlamento revele o conteúdo de um relatório utilizado no contexto de um processo disciplinar ou judicial, princípio este que decorre dos artigos 10.o e 12.o, n.o 2, do Regulamento n.o 883/2013.

82      O Parlamento refuta esta argumentação.

83      Por um lado, na medida em que o recorrente acusa o OLAF de ter infringido o seu dever de confidencialidade numa reunião da Cocobu em 3 de fevereiro de 2020, basta salientar que tal argumentação é inadmissível, uma vez que visa demonstrar a ilicitude de um comportamento imputável ao referido organismo, e não ao recorrido. Ora, a Comissão, à qual o OLAF está administrativamente ligado, não é parte no presente processo.

84      Por outro lado, na medida em que o recorrente critica um comportamento do Parlamento, importa recordar que a obrigação de confidencialidade é corolário do princípio da presunção de inocência (v., neste sentido, Acórdão de 8 de agosto de 2008, Franchet e Byk/Comissão, T‑48/05, EU:T:2008:257, n.o 213).

85      Decorre do exposto que este princípio não impede o Parlamento, no âmbito da sua missão de controlo da utilização dos fundos públicos, de evocar as principais conclusões do relatório do OLAF. Nestas circunstâncias, quando o Parlamento refere a principal conclusão do relatório do OLAF na resolução impugnada, não pode ser acusado de ter ignorado a confidencialidade do relatório, do qual tomou conhecimento em aplicação do artigo 17.o, n.o 4, do Regulamento n.o 883/2013.

86      Resulta do exposto que a terceira acusação não permite concluir pela existência de um comportamento ilegal por parte do Parlamento.

 Quanto à quarta alegação, relativa à violação do direito a uma boa administração e do princípio da proporcionalidade

87      O recorrente acusa o Parlamento de ter infringido o seu dever de imparcialidade e de ter desrespeitado o princípio da proporcionalidade ao identificar uma pessoa singular num documento dirigido ao CESE sobre a gestão do orçamento.

88      O Parlamento refuta esta argumentação.

89      No que respeita ao direito a uma boa administração, previsto no artigo 41.o da Carta, deve recordar‑se que o mesmo não confere, por si próprio, direitos aos particulares, exceto quando constitui a expressão de direitos específicos, como o de ver os seus processos tratados de forma imparcial, equitativa e dentro de um prazo razoável (v. Acórdão de 4 de outubro de 2006, Tillack/Comissão, T‑193/04, EU:T:2006:292, n.o 127). Relativamente à exigência de imparcialidade, que o recorrente alega ter sido desrespeitada pelo Parlamento, esta abrange, por um lado, a imparcialidade subjetiva, no sentido de que nenhum membro da instituição em causa encarregada do processo deve manifestar ideias preconcebidas ou um juízo antecipado pessoal e, por outro, a imparcialidade objetiva, no sentido de que a instituição deve oferecer garantias suficientes para excluir a este respeito todas as dúvidas legítimas (v. Acórdão de 11 de julho de 2013, Ziegler/Comissão, C‑439/11 P, EU:C:2013:513, n.o 155 e jurisprudência referida).

90      No caso vertente, para demonstrar uma violação pelo Parlamento do seu dever de imparcialidade subjetiva, o recorrente limita‑se a argumentar que a resolução impugnada contém «informações relativas à [sua] culpa com base em alegadas ações apresentadas num relatório confidencial do OLAF».

91      No entanto, o facto de a resolução impugnada ter tornado o recorrente identificável como o autor de comportamentos de assédio moral, o que constitui uma das conclusões do relatório do OLAF, não permite de modo algum determinar que um membro do Parlamento tenha manifestado ideias preconcebidas ou um juízo antecipado pessoal contextua esse respeito.

92      Por outro lado, no que diz respeito ao dever de imparcialidade objetiva, o recorrente limita‑se a alegar que, segundo o OLAF, a sua conduta não teve nenhum impacto financeiro.

93      Ora, tal argumento não permite pôr em causa a imparcialidade objetiva do Parlamento.

94      Quanto à alegada violação do princípio da proporcionalidade, o recorrente, em resposta a uma pergunta do Tribunal Geral na audiência, referiu que a argumentação desenvolvida a esse respeito não era autónoma à luz da argumentação invocada em apoio na primeira acusação.

95      Nestas circunstâncias, deve concluir‑se que a quarta acusação não permite concluir pela existência de um comportamento ilegal por parte do Parlamento.

96      Tendo em conta as considerações precedentes, cumpre, pois, julgar improcedente o pedido de indemnização na sua totalidade, sem que haja necessidade de examinar se os outros dois requisitos da responsabilidade da União se encontram preenchidos. Também não é necessária a pronúncia sobre o pedido do Parlamento de que a alegada ata da reunião da Cocobu de 3 de fevereiro de 2020 seja retirada do processo, uma vez que, sendo invocada para demonstrar um comportamento ilícito do OLAF, a referida ata é desprovida de pertinência para o presente litígio.

 Quanto às despesas

97      Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas, se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo o recorrente sido vencido, há que condená‑lo nas despesas, em conformidade com o pedido do Parlamento.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção alargada)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      KN é condenado nas despesas.

van der Woude

Svenningsen

Mac Eochaidh

Pynnä

 

      Laitenberger

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 30 de novembro de 2022.

Assinaturas


*      Língua do processo: francês.