Language of document : ECLI:EU:T:2011:70

Processos apensos T‑122/07 a T‑124/07

Siemens AG Österreich e o.

contra

Comissão Europeia

«Concorrência – Acordos, decisões e práticas concertadas – Mercado dos projectos de mecanismos de comutação isolados a gás – Decisão que declara uma infracção ao artigo 81.° CE e ao artigo 53.° do Acordo EEE – Repartição do mercado – Efeitos no interior do mercado comum – Conceito de infracção continuada – Duração da infracção – Prescrição – Coimas – Proporcionalidade – Limite de 10% do volume de negócios – Responsabilidade solidária pelo pagamento da coima ‑ Circunstâncias atenuantes – Cooperação – Direitos de defesa»

Sumário do acórdão

1.      Concorrência – Procedimento administrativo – Decisão da Comissão que declara a existência de uma infracção – Ónus da prova da infracção e da respectiva duração a cargo da Comissão – Alcance do ónus da prova

(Artigo 81.°, n.° 1, CE; Regulamento n.° 1/2003 do Conselho)

2.      Concorrência – Acordos, decisões e práticas concertadas – Infracção à concorrência – Critérios de apreciação – Objecto anticoncorrencial Carácter suficiente para se declarar uma infracção

(Artigo 81.°, n.° 1, CE)

3.      Concorrência – Acordos, decisões e práticas concertadas – Infracção – Carácter único da infracção – Critérios de apreciação

(Artigo 81.°, n.° 1, CE; acordo EEE, artigo 53.°)

4.      Concorrência – Coimas – Princípio da individualização das sanções – Conciliação com o conceito de empresa

(Artigo 81.°, n.° 1,CE)

5.      Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Critérios – Volume de negócios tomado em consideração

(Artigo 81.°, n.° 1,CE)

6.      Concorrência – Regras comunitárias – Infracção cometida por uma filial – Imputação à sociedade‑mãe – Ónus da prova da Comissão – Limites

(Artigo 81.°, n.° 1,CE)

7.      Concorrência – Regras comunitárias – Infracções – Imputação – Imputação da infracção cometida por uma filial à sociedade‑mãe – Limites

(Artigo 81.°, n.° 1, CE; acordo EEE, artigo 53.°)

8.      Concorrência – Acordos, decisões e práticas concertadas – Empresa – Conceito – Unidade económica – Imputação das infracções – Sociedade‑mãe e empresas filiais – Responsabilidade solidária das sociedades em causa

(Artigos 81.°, n.° 1, CE e 82.° CE; Acordo EEE, artigo 53.°, n.° 1; Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 15.°, n.° 2) (Artigo 81.°, n.° 1, CE; acordo EEE, artigo 53.°; Regulamento n.° 1/2003 do Conselho, artigo 23.°, n.° 2)

9.      Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Critérios – Tomada em conta do volume de negócios mundial realizado com as vendas das mercadorias objecto da infracção – Admissibilidade – Requisitos

(Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 15.°)

10.    Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Margem de apreciação reservada à Comissão

(Artigo 81.°, n.° 1, CE)

11.    Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Montante máximo – Cálculo – Volume de negócios a tomar em consideração – Volume de negócios cumulado de todas as sociedades que constituem a entidade económica que actua enquanto empresa

(Artigos 81.° CE e 1.° CE; Regulamento n.° 1/2003 do Conselho, artigo 23.°, n.os 2 e 3)

12.    Concorrência – Regras comunitárias – Infracção cometida por uma filial – Imputação à sociedade‑mãe – Efeitos – Manutenção da responsabilidade individual da filial

(Artigo 81.°, n.° 1, CE)

13.    Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Critérios – Circunstâncias atenuantes – Margem de apreciação reservada à Comissão

(Artigo 81.°, n.° 1, CE; Regulamento n.° 1/2003 do Conselho, artigo 23.°, n.° 2; Comunicação da Comissão 98/C 9/03, ponto 3)

14.    Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Circunstâncias atenuantes – Alcance

(Artigo 81.°, n.° 1, CE; Regulamento n.° 1 do Conselho, artigo 23.°, n.° 2; Comunicação 98/C 9/03 da Comissão)

15.    Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Não aplicação ou redução da coima em contrapartida da cooperação da empresa acusada – Necessidade de um comportamento que tenha facilitado a declaração da infracção pela Comissão

(Artigo 81.° CE; Regulamento do Conselho n.° 1/2003, artigo 23.°; comunicação da Comissão 2002/C 45/03)

16.    Concorrência – Procedimento administrativo – Respeito dos direitos de defesa – Alcance do princípio – Limites – Direito de a empresa interrogar as testemunhas de acusação – Exclusão

(Artigo 81.°, n.° 1, CE)

17.    Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Poder de apreciação da Comissão – Fiscalização jurisdicional – Declaração de uma ilegalidadeNecessidade de o Tribunal se pronunciar sobre a alteração da decisão no exercício da sua competência de plena jurisdição

(Artigo 229.° CE)

1.      Incumbe à parte ou à autoridade que alega uma violação das regras da concorrência fazer a respectiva prova demonstrando os factos constitutivos de uma infracção e incumbe à empresa que invoca um meio de defesa contra a declaração da existência de uma infracção fazer prova de que se encontram preenchidos os requisitos de aplicação desse meio de defesa, devendo a referida autoridade recorrer, então, a outros elementos de prova.

O princípio segundo o qual incumbe à Comissão provar todos os elementos constitutivos da infracção, incluindo a sua duração, e susceptíveis de terem uma incidência sobre as suas conclusões definitivas quanto à gravidade da referida infracção, não é posto em causa pelo facto de as empresas em causa terem invocado um fundamento de defesa relativo à prescrição, cujo ónus da prova lhes incumbe em princípio. Com efeito, a invocação desse fundamento de defesa implica necessariamente que a duração da infracção e a data em que esta terminou estejam provadas. Ora, estas circunstâncias não podem justificar, por si só, uma inversão do ónus da prova a este respeito desfavorável a essas empresas. Por um lado, a duração de uma infracção, conceito que pressupõe que seja conhecida a sua data final, constitui um dos elementos essenciais da infracção, cujo ónus da prova incumbe à Comissão, independentemente do facto de a contestação desses elementos fazer igualmente parte do fundamento de defesa relativo à prescrição. Por outro lado, esta conclusão justifica‑se atendendo ao facto de a não‑prescrição do procedimento instaurado pela Comissão, nos termos das disposições do Regulamento n.° 1/2003, constituir um critério legal objectivo que decorre do princípio da segurança jurídica, e, portanto, uma condição da validade de qualquer decisão que aplique uma sanção. Com efeito, o seu respeito impõe‑se à Comissão mesmo que não seja invocado um fundamento de defesa pela empresa a esse propósito.

No entanto, essa repartição do ónus da prova pode variar na medida em que os elementos de facto invocados por uma parte podem ser susceptíveis de obrigar a outra parte a fornecer uma explicação ou uma justificação, sob pena de se poder concluir que foi feita a prova. Nomeadamente, quando a Comissão tiver feito prova da existência de um acordo, incumbe às empresas que nele tomaram parte provar que se distanciaram, prova essa que deve demonstrar uma vontade clara e levada ao conhecimento das outras empresas participantes de se subtrair ao acordo.

(cf. n.os 52‑55, 60)

2.      Decorre do próprio texto do artigo 81.°, n.° 1, CE que os acordos entre empresas são proibidos, independentemente de qualquer efeito, se tiverem um objectivo anticoncorrencial. Consequentemente, a demonstração de efeitos anticoncorrenciais reais não é exigida quando estiver provado o objectivo anticoncorrencial dos comportamentos controvertidos.

(cf. n.° 75)

3.      Os órgãos jurisdicionais da União identificaram vários critérios pertinentes para apreciar o carácter único de uma infracção do artigo 81.° CE e do artigo 53.° CE do acordo sobre o Espaço Económico Europeu, a saber, a identidade dos objectivos das práticas em causa, a identidade dos produtos e dos serviços abrangidos, a identidade das empresas que nela participaram e a identidade das regras da sua execução. Outros critérios pertinentes são a identidade das pessoas singulares envolvidas por conta das empresas e a identidade do âmbito de aplicação geográfica das práticas em causa.

(cf. n.° 90)

4.      Por força do princípio da individualização das penas e das sanções, uma pessoa, singular ou colectiva, só deve ser punida por factos que lhe sejam individualmente imputados, princípio que é aplicável em qualquer procedimento administrativo susceptível de conduzir a sanções nos termos das normas comunitárias da concorrência. No entanto, este princípio deve conjugar‑se com o conceito de empresa, na acepção do artigo 81.° CE. A este propósito o conceito de empresa inclui entidades económicas constituídas, cada uma, numa organização unitária de elementos pessoais, materiais e incorpóreos, que prossegue, de forma duradoura, um objectivo económico determinado, organização esta que pode concorrer para a prática de uma das infracções previstas nesta disposição. Com efeito, o direito comunitário da concorrência reconhece que as sociedades diferentes pertencentes a um mesmo grupo constituem uma entidade económica e, portanto, uma empresa na acepção do artigo 81.° CE se as sociedades filiais do grupo não determinarem de forma autónoma o seu comportamento no mercado.

Consequentemente, há que rejeitar a afirmação de que o facto de uma empresa que participa numa infracção ser constituída por diversas sociedades diferentes não leva a que estas últimas devam ser tratadas como um único participante na infracção. Com efeito, esta afirmação advém de uma confusão entre o conceito de empresa e o de sociedade e não tem apoio na jurisprudência.

(cf. n.os 122, 123)

5.      Em matéria de concorrência, a aplicação retroactiva, pela Comissão, do conceito da unidade económica, para efeitos do cálculo do montante da coima, não implica um agravamento da sanção e, portanto, não viola o artigo 7.°, n.° 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, segundo o qual não pode ser aplicada uma pena mais grave do que a aplicável no momento em que a infracção foi cometida. Com efeito, uma vez que a prática da Comissão que consiste em tomar em consideração, para o cálculo do montante da coima, o volume de negócios da empresa – e, portanto, se for o caso, o volume de negócios cumulado de todas as sociedades que a constituem – era uniforme ao longo do tempo e, portanto, deve ser conhecida pelos actores económicos. Por outro lado, a prática constante da Comissão que consiste em tomar em consideração, para efeitos da determinação do montante de partida das coimas, o volume de negócios relativo ao último ano completo da infracção, foi implicitamente aceite pela jurisprudência.

A este propósito, em primeiro lugar, o carácter dissuasivo das coimas constitui um dos elementos em função dos quais deve ser determinada a gravidade das infracções. Ora, o carácter dissuasivo de uma coima depende em larga medida do seu carácter suficientemente sensível para a empresa em causa. Assim, a fim de poder medir o carácter dissuasor de uma coima em relação a uma empresa que tenha participado numa infracção, há que tomar em consideração a situação como existia no final da infracção e não a que podia existir num momento anterior. Em segundo lugar, seria impraticável e inteiramente excessivo, face ao princípio de boa administração e às exigências de economia processual administrativa, pedir à Comissão que tivesse em consideração a evolução do volume de negócios das empresas em causa durante todo o período de funcionamento de um cartel. Essa abordagem implicava que se calculasse um montante de partida da coima distinto para cada ano de pertença ao cartel e, para este efeito, que se determinassem as quotas de mercado respectivas dos participantes em cada ano da infracção.

(cf. n.os 124‑127)

6.      Em matéria de concorrência, a Comissão pode presumir razoavelmente que uma filial a 100% de uma sociedade‑mãe aplica no essencial as instruções que lhe são dadas por esta e que essa presunção implica que a Comissão não seja obrigada a verificar se a sociedade‑mãe exerceu efectivamente esse poder. A imputação à sociedade‑mãe do comportamento de uma filial a 100% não pressupõe, pois, a prova de que a sociedade‑mãe tinha conhecimento dos comportamentos da sua filial. Pelo contrário, é à sociedade‑mãe que incumbe, quando considera que, apesar da participação a 100% no capital da sua filial, esta última determina autonomamente o seu comportamento no mercado, ilidir essa presunção apresentando elementos de prova suficientes.

(cf. n.° 130)

7.      As entidades jurídicas que participaram a título independente numa infracção ao artigo 81.° CE e ao artigo 53.° do acordo sobre o Espaço Económico Europeu (EEE) e que, em seguida, foram adquiridas por outra sociedade continuam a responder pelo seu comportamento ilícito anterior à sua aquisição, desde que essas sociedades não tenham sido pura e simplesmente absorvidas pelo adquirente, tendo prosseguido as suas actividades como filiais. Nesse caso, o adquirente poderá unicamente ser considerado responsável pelo comportamento da sua filial a partir da aquisição desta se a filial prosseguir a infracção e se a responsabilidade da nova sociedade‑mãe puder ser provada.

Além disso, deve aplicar‑se o mesmo princípio, mutatis mutandis, na hipótese de, anteriormente à sua aquisição, a sociedade adquirida ter participado na infracção não a título independente, mas enquanto filial de um outro grupo.

(cf. n.os 139, 141)

8.      A solidariedade pelo pagamento das coimas devidas por uma infracção ao artigo 81.° CE e ao artigo 53.° do acordo sobre o Espaço Económico Europeu (EEE) é um efeito jurídico que decorre, de pleno direito, das disposições substantivas desses artigos.

A unidade do comportamento da empresa no mercado justifica, para efeitos de aplicação do direito da concorrência, que as sociedades ou, mais em geral, os sujeitos de direito que possam ser pessoalmente responsabilizados sejam obrigados solidariamente. A solidariedade no pagamento das coimas aplicadas por força de uma infracção ao artigo 81.° CE e ao artigo 53.° do Acordo EEE, na medida em que ajuda a garantir a cobrança efectiva das coimas, participa no objectivo de dissuasão que é geralmente prosseguido pelo direito da concorrência, respeitando‑se o princípio ne bis in idem, princípio fundamental do direito da União, igualmente consagrado no artigo 4.° do Protocolo n.° 7 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, que proíbe, por uma mesma infracção ao direito da concorrência, punir mais de uma vez um mesmo comportamento da empresa no mercado através de sujeitos de direito que possam ser pessoalmente responsabilizados.

O facto de as responsabilidades pessoais de várias sociedades pela participação de uma mesma empresa numa infracção não serem idênticas não obsta a que lhes seja aplicada uma coima solidariamente, uma vez que a solidariedade no pagamento da coima só abrange o período da infracção em que formavam uma unidade económica e constituíam, portanto, uma empresa, na acepção do direito da concorrência. A este respeito, decorre do princípio da individualidade das penas e das sanções, que cada sociedade deve poder deduzir da decisão que lhe aplica uma coima a pagar solidariamente com uma ou várias sociedades a parte que deverá suportar na sua relação com os seus co‑devedores solidários, depois de a Comissão ter recebido. Com este objectivo, a Comissão deve designadamente especificar os períodos durante os quais as sociedades em causa são (co)responsáveis pelos comportamentos ilícitos das empresas que participaram no cartel e, se for o caso, o grau de responsabilidade das referidas sociedades quanto a estes comportamentos.

Assim sendo, a decisão pela qual a Comissão impõe que várias sociedades paguem solidariamente uma coima produz necessariamente todos os efeitos ligados juridicamente ao regime jurídico do pagamento das coimas no direito da concorrência, tanto nas relações entre o credor e os co‑devedores solidários como nas relações dos co‑devedores solidários entre si.

Cabe à Comissão, no âmbito do exercício da sua competência para aplicar coimas, por força do artigo 23.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1/2003, determinar a percentagem respectiva da diferentes sociedades nos montantes em que foram solidariamente condenadas, na medida em que faziam parte de uma mesma empresa, e, contrariamente ao que a Comissão sugeriu na audiência, esta função em particular não pode ser deixada aos tribunais nacionais.

Na falta de indicação em sentido contrário na decisão em que aplica uma coima solidariamente a várias sociedades pelo comportamento ilícito de uma empresa, a Comissão imputa esse comportamento em partes iguais. As sociedades a que seja aplicada uma coima solidariamente e que, salvo indicação em contrário na decisão que a aplica, incorrem em igual responsabilidade na prática da infracção, devem, em princípio, contribuir em partes iguais para o pagamento da coima aplicada por essa infracção. Embora, a decisão de aplicação de uma coima solidariamente a várias sociedades não permita determinar a priori qual delas será efectivamente chamada a pagar o montante da coima à Comissão, não deixa subsistir qualquer dúvida sobre as quotas‑partes do montante da coima que lhes cabem especificamente, de modo que cada uma delas possa, se for o caso, exercer o seu direito de regresso sobre os seus co‑devedores solidários pelas quantias que pagou para além da sua quota‑parte.

(cf. n.os 149, 151‑153, 156‑158)

9.      No caso de um cartel de dimensão mundial, e que, além da fixação dos preços, inclui a repartição dos mercados, a Comissão pode apoiar‑se no volume de negócios mundial realizado com a venda do produto em causa, para exprimir, em termos de montantes de partida, a natureza da infracção, a sua incidência real sobre o mercado, bem como a dimensão do mercado geográfico, tendo em conta a disparidade de dimensão entre os membros do cartel. Visto que o Reino Unido e a Irlanda, em conjunto, constituem uma parte importante do mercado comum, um prejuízo causado à concorrência nesses mercados não pode ser qualificado como menor. Uma vez que a infracção imputada às partes recorrentes na decisão impugnada inclui precisamente a alegação de que as empresas em causa repartiram entre si diferentes mercados nacionais ao nível europeu, por meio de um sistema de «países construtores», o facto de a empresa recorrente, em conformidade com esse acordo ilícito, ter limitado as suas actividades no mercado interno aos seus mercados domésticos não pode ser considerado uma circunstância atenuante. Por último, quando os próprios participantes num cartel ilícito tiveram em consideração os seus volumes de negócios mundiais, para fixar as suas quotas individuais no cartel, as quais eram aplicáveis tanto ao nível europeu – excepto «países construtores» – como ao nível mundial, a Comissão, a fim de apreciar o peso específico das diferentes empresas envolvidas, pode igualmente tomar em consideração o seu volume de negócios ao nível mundial.

(cf. n.os 170, 171)

10.    O direito comunitário não exige que as coimas aplicadas a diferentes sociedades no interior de uma mesma empresa sejam proporcionais à duração da participação que é imputada a cada uma dessas sociedades. Consequentemente, uma comparação entre o montante em euros, por mês de participação na infracção, aplicado a várias sociedades que são acusadas das participações de diferente duração, não pode revelar um tratamento desigual.

Portanto, não se verifica que a prática da Comissão que consiste em fixar as coimas de uma maneira não estritamente proporcional à duração exceda os limites do poder de apreciação que lhe é reconhecido pela jurisprudência.

(cf. n.os 181, 182)

11.    O facto de várias sociedades serem solidariamente obrigadas a pagar uma coima pelo facto de constituírem uma empresa na acepção do artigo 81.° CE não implica, no que diz respeito à aplicação do limite máximo previsto no artigo 23.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1/2003, que a obrigação de cada uma delas se limite a 10% do volume de negócios que realizou durante o último exercício. Com efeito, o limite máximo de 10%, na acepção dessa disposição, deve ser calculado com base no volume de negócios cumulado de todas as sociedades que constituem a entidade económica única que age como empresa na acepção do artigo 81.° CE, uma vez que só o volume de negócios cumulado das sociedades que a compõem pode constituir uma indicação da dimensão e do poder económico da empresa em questão.

O conceito de empresa, na acepção do artigo 23.°, n.os 2 e 3, do Regulamento n.° 1/2003, não é, pois, diferente do conceito de empresa na acepção do artigo 81.°, n.° 1, CE. Portanto, em caso de responsabilidade solidária de várias sociedades no seio de um grupo que constitui uma empresa na acepção dessas disposições, não há que determinar o limite por referência à sociedade com o mais reduzido volume de negócios.

(cf. n.os 186, 187)

12.    O facto de se imputar a uma sociedade‑mãe o comportamento da sua filial, por ter determinado o comportamento seu comercial, não tem por consequência que a referida sociedade‑mãe deva ser considerada a autora desse comportamento em vez da filial. Noutros termos, a responsabilidade de uma sociedade‑mãe pelo comportamento da sua filial em nenhum caso exonera a filial da sua própria responsabilidade enquanto pessoa colectiva, pelo que esta continua individualmente responsável pelas práticas anticoncorrenciais em que participou.

(cf. n.° 196)

13.    As Orientações fixadas pela Comissão para o cálculo das coimas aplicadas por força do n.° 2 do artigo 15.° do Regulamento n.° 17 e do n.° 5 do artigo 65.° do Tratado CECA prevêem, no ponto 3, a diminuição do montante de base para «circunstâncias atenuantes especiais» como, designadamente, o papel exclusivamente passivo ou seguidista das empresas recorrentes e ter posto termo às infracções logo com as primeiras intervenções da Comissão. Esse texto não indica de forma imperativa as circunstâncias atenuantes que a Comissão tem de tomar em conta. Por conseguinte, a Comissão conserva uma certa margem para apreciar de forma global a importância de uma eventual redução do montante das coimas por circunstâncias atenuantes.

Neste contexto, de modo nenhum a Comissão poderá ser obrigada, no quadro do seu poder de apreciação, a aplicar uma redução da coima pela cessação de uma infracção manifesta, tenha essa cessação ocorrido antes ou após as suas intervenções. Mesmo que, no passado, a Comissão tenha considerado a cessação voluntária de uma infracção como uma circunstância atenuante, pode ter em conta, nos termos das orientações, o facto de as infracções manifestas muito graves serem ainda, apesar de a sua ilegalidade estar bem declarada desde o início da política comunitária de concorrência, relativamente frequentes e, portanto, considerar que importa abandonar esta prática generosa e já não recompensar a cessação de uma tal infracção com uma redução da coima.

(cf. n.os 207, 208, 211, 213)

14.    O facto de uma empresa, de cuja participação num cartel proibido pelas normas da concorrência – infracção que, assume um carácter muito grave – a Comissão fez prova bastante, ter sido enganada pelos outros participantes no mesmo cartel, que, deste modo, procuraram obter benefícios suplementares em relação aos que geraram através do referido cartel, não pode levar a que o comportamento dessa empresa seja considerado menos grave. Assim, essas circunstâncias não são passíveis de constituir uma circunstância atenuante e, em especial, não demonstram o papel exclusivamente passivo ou seguidista da referida empresa no cartel.

(cf. n.° 218)

15.    A redução do montante das coimas em caso de cooperação das empresas participantes em infracções ao direito comunitário da concorrência baseia‑se no entendimento de que essa cooperação facilita a função da Comissão de declarar a existência de uma infracção e, eventualmente, de lhe pôr termo.

Como é mencionado no ponto 29 da comunicação relativa à imunidade em matéria de coimas e à redução do seu montante nos processos relativos a cartéis, criou expectativas legítimas nas quais se baseiam as empresas que desejem informar a Comissão da existência de um cartel. Atenta a confiança legítima que as empresas que pretendam colaborar com a Comissão pode inferir dessa comunicação, a Comissão está obrigada a respeitá‑la no momento da apreciação da sua cooperação, no âmbito da determinação do montante da coima aplicada a uma empresa. Dentro dos limites estabelecidos pela comunicação sobre a cooperação, a Comissão goza, de um vasto poder de apreciação para avaliar se os elementos de prova comunicados por uma empresa apresentam ou não um valor acrescentado, na acepção do ponto 22 da referida comunicação, e se, por isso, há que conceder uma redução a uma empresa nos termos desta comunicação. Essa avaliação é objecto de fiscalização jurisdicional restrita.

(cf. n.os 219‑221)

16.    O princípio fundamental do respeito dos direitos da defesa exige, com efeito, que às empresas e às associações de empresas em causa seja dada a possibilidade de, logo na fase do procedimento administrativo, dar a conhecer utilmente o seu ponto de vista sobre a realidade e a relevância dos factos, acusações e circunstâncias alegados pela Comissão. Em contrapartida, o referido princípio não exige que seja facultada a estas empresas a possibilidade de interrogarem elas mesmas, no âmbito do procedimento administrativo, as testemunhas ouvidas pela Comissão.

(cf. n.os 233, 234)

17.    Quando a análise dos fundamentos invocados por uma empresa contra a legalidade de uma decisão da Comissão que lhe aplica uma coima por violação das regras comunitárias da concorrência tiver revelado uma ilegalidade, o Tribunal Geral deve analisar, fazendo uso da sua competência de plena jurisdição, se deve alterar a decisão impugnada.

(cf. n.° 238)