Language of document : ECLI:EU:T:2003:328

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quarta Secção)

3 de Dezembro de 2003 (*)

«Marca comunitária – Marca tridimensional – Forma de uma garrafa – Motivos absolutos de recusa – Carácter distintivo – Artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento (CE) n.° 40/94»

No processo T‑305/02,

Nestlé Waters France, com sede em Issy‑les‑Moulineaux (França), representada por A. Cléry, advogado,

recorrente,

contra

Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), representado por A. Rassat e O. Waelbroeck, na qualidade de agentes,

recorrido,

que tem por objecto um pedido de anulação da decisão da Quarta Câmara de Recurso do Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) de 12 de Julho de 2002 (processo R 719/2000‑4) que indeferiu o registo de uma marca tridimensional constituída pela forma de uma garrafa transparente,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Quarta Secção),

composto por: V. Tiili, presidente, P. Mengozzi e M. Vilaras, juízes,

secretário: B. Pastor, secretária adjunta,

vistos os autos e após a audiência de 10 de Julho de 2003,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1       Em 7 de Setembro de 1998, a sociedade Perrier Vittel France, actualmente designada Nestlé Waters France (a seguir «recorrente»), apresentou um pedido de marca comunitária ao Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), nos termos do Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1), com redacção alterada.

2       A marca cujo registo foi requerido consiste no sinal tridimensional a seguir reproduzido:

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3       A marca tridimensional pedida é descrita do seguinte modo:

«A garrafa compõe‑se de um corpo com uma base de forma ligeiramente troncocónica tendo em relevo na parte plana uma estrela estilizada. O corpo sensivelmente cilíndrico de alto a baixo comporta, na sua parte inferior, uma primeira série de caneluras de forma ondulatória e, na sua parte superior, com um diâmetro ligeiramente inferior em forma de ‘diabolo’ caneluras em espirais que, à transparência, desenham losangos. A parte superior ligeiramente troncocónica termina num gargalo cilíndrico que recebe uma cápsula de obturação de cor azul.»

4       São igualmente reivindicadas cores, detalhadas nos termos seguintes no formulário ad hoc: «Garrafa transparente com tampa azul sobre fundo azul».

5       Os produtos para os quais foi requerido o registo da marca são abrangidos pela classe 32 na acepção do Acordo de Nice relativo à classificação internacional dos produtos e serviços para efeitos do registo das marcas, de 15 de Junho de 1957, revisto e alterado, e correspondem à seguinte descrição: «Águas minerais, águas gasosas e gaseificadas, águas de nascente, águas aromatizadas e, em especial, bebidas aromatizadas à base de água mineral e de frutas ou de extractos de frutas, bebidas com frutas, sumos de fruta, néctares, limonadas, sodas e, generalizando, bebidas não alcoólicas».

6       Por decisão de 8 de Maio de 2000, o examinador recusou o pedido de registo nos termos do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, em virtude de a marca pedida ser considerada desprovida de carácter distintivo.

7       Em 20 de Junho de 2000, a sociedade Perrier Vittel France interpôs recurso da referida decisão para o IHMI, ao abrigo do artigo 59.° do Regulamento n.° 40/94.

8       Foi negado provimento ao recurso por decisão de 12 de Julho de 2002 da Quarta Câmara de Recurso do IHMI, notificada à recorrente em 6 de Agosto seguinte (a seguir «decisão impugnada»), pelo facto de a marca pedida ser desprovida de carácter distintivo.

 Tramitação processual e pedidos das partes

9       Foi nestas circunstâncias que, por petição entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 3 de Outubro de 2002, a recorrente interpôs o presente recurso.

10     Por carta de 3 de Março de 2003, recebida na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância no mesmo dia, a recorrente solicitou autorização para apresentar réplica e juntar documentos complementares. Em resposta a este pedido, a recorrente foi unicamente autorizada a juntar os documentos complementares invocados, ao que procedeu em 16 de Abril de 2003.

11     A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–       anular a decisão impugnada;

–       condenar o IHMI nas despesas.

12     O IHMI conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–       negar provimento ao recurso;

–       condenar a recorrente nas despesas.

 Questão de direito

13     Tendo sido convidada pelo Tribunal de Primeira Instância, na audiência, a esclarecer o teor da sua argumentação, a recorrente referiu que o seu único fundamento para a anulação assenta na violação do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 e não em qualquer violação dos n.os 1, alínea e), ou 3 do mesmo artigo, o que ficou a constar da acta da audiência.

 Argumentos das partes

14     A recorrente afirma, em primeiro lugar, que a Câmara de Recurso fez confusão ao apreciar o carácter distintivo da forma apresentada relativamente às garrafas, produtos abrangidos pela classe 21 que não estão em causa no pedido, e não em relação às bebidas, únicos produtos referidos no pedido de registo, que são abrangidos pela classe 32.

15     A recorrente afirma, em segundo lugar, que a conclusão da Câmara de Recurso resulta de uma amálgama entre o carácter de originalidade e o carácter distintivo. Para que um sinal possa ser considerado distintivo, basta que não seja usual nem necessário, o que é exactamente o caso no presente processo, devido à forma particular dada à garrafa resultante do aspecto arqueado da mesma na parte superior e dos diversos elementos decorativos, puramente arbitrários, inseridos no próprio material da garrafa.

16     Estes elementos são constituídos pelas ranhuras oblíquas que se enrolam à volta do corpo da garrafa na sua parte superior e pelas seis nervuras horizontais onduladas que se situam na parte inferior. Por outro lado, no entender da recorrente, a forma da garrafa e a sua decoração superior invocam a parte superior de um corpo de mulher envolvido num véu ligeiro. Esta representação simbólica, aplicada a uma garrafa, é simultaneamente nova e original.

17     A recorrente considera, por isso, que a forma e a decoração global da garrafa conferem um carácter distintivo ao sinal requerido. Esta conclusão é confirmada pelos resultados de duas sondagens, realizadas em Abril de 1997, ou seja, mais de um ano antes do pedido de marca comunitária, e em Julho de 2000, o que a Câmara de Recurso, erradamente, não teve em conta.

18     Em terceiro lugar, a recorrente refere que, embora o IHMI e a Câmara de Recurso não neguem a «capacidade em abstracto de uma garrafa só por si poder servir como marca», uma apreciação demasiado restritiva do carácter distintivo leva a privar as garrafas «nuas» de qualquer protecção no âmbito do direito das marcas.

19     Em quarto e último lugar, a recorrente invoca a existência de diversas decisões de registo do sinal apresentado proveniente de autoridades nacionais especializadas e reivindica para o referido sinal uma protecção idêntica à que foi concedida pelo IHMI a duas marcas constituídas pela forma de uma garrafa.

20     O IHMI afirma que a Câmara de Recurso aplicou correctamente o artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94.

21     Em primeiro lugar, o IHMI refere que a ausência de carácter distintivo resulta da natureza usual da forma aplicada aos produtos em causa e que é unicamente neste sentido que deve ser entendida a decisão impugnada, mais particularmente os n.os 12 e 17. Em parte alguma desta decisão a Câmara de Recurso considerou como condições prévias para beneficiar da protecção prevista pelo direito das marcas a originalidade particular ou o carácter individual, critérios esses respeitantes aos direitos de autor.

22     Em segundo lugar, o IHMI alega que é pacífico que o motivo absoluto de recusa do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 só pode ser apreciado, por um lado, tomando a marca no seu conjunto e, por outro, relativamente aos únicos produtos em relação aos quais é requerido o registo do sinal [acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 8 de Julho de 1999, Procter & Gamble/IHMI (BABY‑DRY), T‑163/98, Colect., p. II‑2383, n.os 20 e 21], e em relação à percepção que o público consumidor tem dos referidos produtos [acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 20 de Março de 2002, DaimlerChrysler/IHMI (TELE AID), T‑355/00, Colect., p. II‑1939, n.° 25].

23     Após recordar que as bebidas não podem ser postas à venda sem mais, devido à sua própria natureza, mas em embalagens sólidas que tradicionalmente são garrafas, o IHMI afirma que a recorrente não pode declarar que a Câmara de Recurso cometeu uma «lamentável confusão» ao apreciar o carácter distintivo da garrafa em relação às garrafas, uma vez que resulta claramente da decisão impugnada que a garrafa em causa foi apreciada tendo em conta apenas os produtos designados no pedido.

24     Constituindo as bebidas não alcoólicas, referidas no pedido de registo, produtos de consumo corrente, o público a tomar em consideração para apreciar o carácter distintivo do sinal em causa é o grande público constituído pelo conjunto dos potenciais compradores dessas bebidas em toda a União Europeia.

25     Em terceiro lugar, o IHMI afirma que a Câmara de Recurso deu por provado que a marca comunitária requerida é apenas uma soma de características «muito frequentes nas embalagens habituais» dos produtos em causa que, de modo algum, pode constituir um conjunto distintivo, uma vez que se trata apenas de uma variante de uma forma de acondicionamento ordinária, que ocorre naturalmente, e que não é apta a funcionar ab initio como indicador de origem. Por outro lado, o argumento assente no simbolismo da garrafa é irrelevante, uma vez que, no entender do recorrido, a representação simbólica invocada pela recorrente certamente não será apercebida pelo consumidor médio razoavelmente atento e advertido, confrontado pela primeira vez com a garrafa em questão, o que a recorrente admite expressamente.

26     O IHMI pede, em quarto lugar, que sejam considerados improcedentes os argumentos da recorrente assentes na existência de registos comunitários, respeitantes a duas marcas que não são idênticas à marca pedida, ou nacionais, os quais não constituem de modo algum «precedentes», na acepção jurídica deste termo, que vinculem o Instituto.

 Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

27     Nos termos do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, deve ser recusado o registo «de marcas desprovidas de carácter distintivo».

28     Deve recordar‑se, em primeiro lugar, que, segundo a jurisprudência, as marcas a que o artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 se refere são designadamente aquelas que, do ponto de vista do público‑alvo, são comummente utilizadas, no comércio, para a apresentação dos produtos ou dos serviços em causa ou a respeito das quais existem, pelo menos, indícios concretos que permitam concluir que são susceptíveis de ser utilizadas desta maneira [acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 20 de Novembro de 2002, Bosch/IHMI (Kit Pro e Kit Super Pro), T‑79/01 e T‑86/01, Colect., p. II‑4881, n.° 19]. Por outro lado, os sinais a que se refere este artigo são incapazes de exercer a função essencial da marca, isto é, identificar a origem do produto ou do serviço, para assim permitir ao consumidor que adquire o produto ou o serviço que a marca designa fazer no momento de uma aquisição posterior a mesma escolha, se a experiência for positiva, ou outra escolha, se a experiência for negativa [acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 27 de Fevereiro de 2002, Rewe Zentral/IHMI (LITE), T‑79/00, Colect., p. II‑705, n.° 26; Kit Pro e Kit Super Pro, já referido, n.° 19, e de 30 de Abril de 2003, Axions e Belce/IHMI (forma de cigarro de cor castanha e forma de lingote de ouro), T‑324/01 e T‑110/02, Colect., p. II‑1897, n.° 29].

29     Consequentemente, o carácter distintivo de uma marca só pode ser apreciado, por um lado, em relação com os produtos ou os serviços para os quais é pedido o registo e, por outro, em relação com a percepção que deles tem o público‑alvo [acórdãos LITE, já referido, n.° 27; Kit Pro e Kit Super Pro, já referido, n.° 20; e Axions e Belce/IHMI (Forma de cigarro de cor castanha e forma de lingote de ouro), já referido, n.° 30].

30     Quanto à primeira análise acima referida deve recordar‑se que o sinal reivindicado é constituído pela forma do meio de acondicionamento do produto em causa e não pela forma do próprio produto, de tal forma é evidente que, pela sua própria natureza, as bebidas não podem ser vendidas no estado natural e necessitam de um meio de acondicionamento.

31     Nestas condições, a Câmara de Recurso apreciou o carácter distintivo tendo em conta a forma e o aspecto da garrafa apresentada, não como tal, mas como contentor dos produtos referidos no pedido de registo. Assim, após proceder a uma análise comparativa entre a garrafa em questão e outras garrafas contendo bebidas não alcoólicas e concluído pelo carácter «clássico» da primeira, a Câmara de Recurso referiu que o seu raciocínio «é aplicável a todos os produtos referidos no pedido e, mais em especial, às águas minerais, águas gasosas e gaseificadas, águas de nascente e águas aromatizadas» (n.° 13 da decisão impugnada).

32     Daqui resulta que improcede a crítica da recorrente segundo a qual a Câmara de Recurso fez confusão ao apreciar o carácter distintivo da forma apresentada relativamente às garrafas, produtos abrangidos pela classe 21 que não estão em causa no pedido, e não em relação às bebidas, únicos produtos referidos no pedido de registo, que são abrangidos pela classe 32.

33     No que respeita ao público relevante, deve salientar‑se que as bebidas não alcoólicas são produtos de consumo corrente. O público ao qual respeitam estes produtos é constituído por todos os consumidores finais. Há, assim, que apreciar o carácter distintivo da marca pedida tendo em consideração a presumível expectativa de um consumidor médio, normalmente informado e razoavelmente atento e avisado (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 22 de Junho de 1999, Lloyd Schuhfabrik Meyer, C‑342/97, Colect., p. I‑3819, n.° 26), o que a Câmara de Recurso fez na decisão impugnada.

34     Há igualmente que recordar que a percepção das marcas pelo público relevante é influenciada pelo seu nível de atenção, que é susceptível de variar em função da categoria de produtos ou serviços em causa (acórdão Lloyd Schuhfabrik Meyer, já referido, n.° 26). No caso concreto, é pacífico que os operadores presentes no mercado dos produtos em questão, caracterizado por uma forte concorrência, são todos confrontados com o imperativo técnico do acondicionamento para a comercialização dos referidos produtos e sujeitos à necessária rotulagem dos mesmos. Neste contexto, alguns operadores têm procurado na forma da embalagem, desde há vários anos, um meio de diferenciar os seus produtos dos da concorrência e de chamar a atenção do público. Afigura‑se, por isso, que o consumidor médio está plenamente apto a apreender a forma da embalagem dos produtos em causa como uma indicação da origem comercial dos mesmos, na medida em que essa forma apresente características suficientes para reterem a sua atenção.

35     Deve salientar‑se, em segundo lugar, que o artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 não faz qualquer distinção entre as várias categorias de marcas. Por conseguinte, na avaliação do carácter distintivo de marcas tridimensionais constituídas pela forma dos próprios produtos, ou, como no caso vertente, pela forma do meio de acondicionamento dos referidos produtos, não se justifica a aplicação de critérios mais rigorosos do que os aplicáveis a outras categorias de marcas [v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 7 de Fevereiro de 2002, Mag Instrument/IHMI (forma de lanternas portáteis), T‑88/00, Colect., p. II‑467, n.° 32].

36     Na decisão impugnada, a Câmara de Recurso concluiu no sentido da falta de carácter distintivo da marca pedida, considerando que «a forma geral da garrafa é clássica, quer pela sua base plana, pela forma cilíndrica ligeiramente apertada a partir do terceiro quarto superior e depois novamente mais larga, terminando em forma troncocónica ou pela sua tampa azul». No que respeita à decoração da garrafa em causa, a Câmara de Recurso referiu que as «reentrâncias que comporta em diferentes níveis fazem igualmente parte da panóplia normal deste tipo de acondicionamento» e que «as caneluras diagonais e ondulações horizontais bem como o motivo em losango que aparece à transparência, designadamente, nada acrescentam à falta de carácter distintivo do conjunto, na medida em que se trata de símbolos simples, orientados e posicionados de modo clássico sobre este tipo de suporte» (n.° 12 da decisão impugnada).

37     Na contestação, o IHMI afirma, por um lado, que a Câmara de Recurso não cometeu qualquer erro de apreciação e apresentou, por outro, um conjunto de documentos contendo reproduções fotográficas, extraídas de um site da Internet mencionado na decisão impugnada, de diversas garrafas que apresentam um aspecto arqueado na parte superior, ondulações horizontais na parte inferior ou ranhuras oblíquas.

38     Esta conclusão da Câmara de Recurso, essencialmente baseada numa análise individual dos diferentes elementos de apresentação, deriva de uma aplicação incorrecta do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94.

39     Deve lembrar‑se que, para apurar se a forma da garrafa em causa pode ser apreendida pelo público como um indicador de origem, há que analisar a impressão de conjunto produzida pela aparência da referida garrafa [v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 11 de Novembro de 1997, SABEL, C‑251/95, Colect., p. I‑6191, n.° 23, e acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 4 de Março de 2003, Unilever/IHMI (pastilha oval), T‑194/01, Colect., p. II‑383, n.° 54].

40     No presente caso, embora seja certo que se deva ter em conta o aspecto cintado da garrafa, bem como que as ranhuras horizontais e oblíquas presentes em grande número de garrafas actualmente disponíveis no mercado, é sobretudo de referir o modo como estes diferentes elementos estão organizados. A este respeito, deve salientar‑se que um sinal constituído por uma combinação de elementos, sem que qualquer deles tenha carácter distintivo, pode possuir esse carácter desde que haja indícios concretos, que consistam, designadamente, no modo como os diferentes elementos estão combinados, que indiquem que o sinal em causa representa mais do que a soma pura e simples dos elementos que o compõem [v. acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 2 de Julho de 2002, SAT.1/IHMI (SAT.2), T‑323/00, Colect., p. II‑2839, n.° 49, e Kit Pro e Kit Super Pro, já referido, n.° 29].

41     Ora, é forçoso concluir que resulta da análise do conjunto dos documentos apresentados nos debates pelas partes que a combinação dos elementos de apresentação acima referidos, que constitui a marca pedida, é verdadeiramente específica e não pode ser considerada absolutamente comum. Assim, o corpo sensivelmente cilíndrico da garrafa contém caneluras oblíquas que, por um lado, cobrem totalmente a parte cintada da garrafa e acentuam o efeito abaulado e côncavo da parte superior da mesma, e, por outro, são realçadas pela presença na parte inferior da garrafa de ranhuras de orientação oposta, formando o conjunto um design assinalável e facilmente memorizável. Esta combinação confere, por isso, à garrafa em causa uma aparência particular que, tendo em conta também o resultado estético do conjunto, é susceptível de chamar a atenção do público em causa e de permitir que este, pela forma da embalagem dos produtos em causa, distinga os produtos visados no pedido de registo dos que têm outra origem comercial [v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 6 de Março de 2003, DaimlerChrysler/IHMI (grelha de um veículo), T‑128/01, Colect., p. II‑701, n.os 46 e 48].

42     Por outro lado, é de salientar que, ao considerar que a marca pedida é desprovida de carácter distintivo, a Câmara de Recurso não teve em conta a redacção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, da qual resulta que basta um mínimo de carácter distintivo para que o motivo de recusa definido nesse artigo não seja aplicável [acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 27 de Fevereiro de 2002, Eurocool Logistik/IHMI (EUROCOOL), T‑34/00, Colect., p. II‑683, n.° 39, e grelha de um automóvel, já referido, n.° 49]. Ora, na medida em que, como foi acima referido, a marca pedida é constituída por uma combinação de elementos de apresentação característica que a distingue das restantes formas presentes no mercado para os produtos em questão, há que considerar que a marca pedida, tida em conta no seu conjunto, possui o mínimo de carácter distintivo exigido.

43     Resulta das considerações que antecedem, sem que seja necessário que o Tribunal se pronuncie quanto aos restantes argumentos da recorrente, que a Câmara de Recurso considerou erradamente que a marca pedida era desprovida de carácter distintivo na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94.

44     Consequentemente, deve ser julgado procedente o fundamento invocado e anulada a decisão impugnada.

 Quanto às despesas

45     Por força do disposto no n.° 2 do artigo 87.° do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, a parte vencida é condenada nas despesas, se a parte vencedora o tiver requerido.

46     Tendo o Instituto sido vencido, há que condená‑lo nas despesas, em conformidade com o pedido da recorrente.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quarta Secção)

decide:

1)      É anulada a decisão da Quarta Câmara de Recurso do Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos), de 12 de Julho de 2002 (processo R 719/2000‑4).

2)      O recorrido é condenado nas despesas.

Tiili

Mengozzi

Vilaras

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 3 de Dezembro de 2003.

O secretário

 

      O presidente

H. Jung

 

      V. Tiili


* Língua do processo: francês.