Language of document : ECLI:EU:C:2014:2032

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

MELCHIOR WATHELET

apresentadas em 25 de junho de 2014 (1)

Processo C‑249/13

Khaled Boudjlida

contra

Préfet des Pyrénées‑Atlantiques

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo tribunal administratif de Pau (França)]

«Espaço de liberdade, de segurança e de justiça — Diretiva 2008/115/CE Regresso de nacionais de países terceiros em situação irregular — Processo de adoção de uma decisão de regresso — Princípio do respeito dos direitos de defesa — Direito de ser ouvido antes da adoção de uma decisão suscetível de afetar os interesses de um nacional de país terceiro em situação irregular — Conteúdo dos direitos de defesa e do direito de ser ouvido — Direito de expressar um ponto de vista com um prazo de reflexão suficiente — Direito de beneficiar da assistência de um advogado — Limitações do direito de ser ouvido»





I –    Introdução

1.        O presente pedido de decisão prejudicial, apresentado na Secretaria do Tribunal de Justiça em 6 de maio de 2013, pelo tribunal administratif de Pau (França), tem por objeto a natureza e o alcance do direito de ser ouvido, previsto no artigo 41.°, n.° 2, alínea a), da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta») antes da adoção de uma decisão de regresso nos termos da Diretiva 2008/115/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de dezembro de 2008, relativa a normas e procedimentos comuns nos Estados‑Membros para o regresso de nacionais de países terceiros em situação irregular (2).

2.        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe K. Boudjlida ao préfet des Pyrénées‑Atlantiques. K. Boudjlida pede, designadamente, a anulação da decisão de 15 de janeiro de 2013, na qual o préfet des Pyrénées‑Atlantiques lhe recusou a emissão de um título de residência, o obrigou a abandonar o território francês no prazo de trinta dias e fixou a Argélia, ou qualquer outro país no qual ele demonstre ser legalmente admitido, como lugar de destino do seu eventual afastamento.

3.        Nestas conclusões, analisaremos as condições e modalidades nas quais um nacional de um país terceiro em situação irregular sujeito a uma decisão de regresso, pode exercer o seu direito de ser ouvido, conforme consagrado pela jurisprudência do Tribunal de Justiça e confirmado pelo artigo 41.°, n.° 2, alínea a), da Carta, quer se trate, designadamente, da sua possibilidade de analisar a totalidade dos elementos que lhe são imputados no que diz respeito ao seu direito de residência, de expressar o seu ponto de vista após um tempo de reflexão e de beneficiar da assistência de um advogado à sua escolha.

II – Diretiva 2008/115

4.        O artigo 3.° da Diretiva 2008/115, sob a epígrafe «Definições», enuncia:

«Para efeitos da presente diretiva, entende‑se por:

[...]

4)      ‘Decisão de regresso’, uma decisão ou ato administrativo ou judicial que estabeleça ou declare a situação irregular de um nacional de país terceiro e imponha ou declare o dever de regresso;

[...]»

5.        O artigo 5.° da Diretiva 2008/115, com a epígrafe «Não‑repulsão, interesse superior da criança, vida familiar e estado de saúde», dispõe:

«Na aplicação da presente diretiva, os Estados‑Membros devem ter em devida conta o seguinte:

a)     O interesse superior da criança;

b)     A vida familiar;

c)     O estado de saúde do nacional de país terceiro em causa;

e respeitar o princípio da não‑repulsão.»

6.        O artigo 6.° desta diretiva, que tem por epígrafe «Decisão de regresso», dispõe:

«1.      Sem prejuízo das exceções previstas nos n.os 2 a 5, os Estados‑Membros devem emitir uma decisão de regresso relativamente a qualquer nacional de país terceiro que se encontre em situação irregular no seu território.

[…]

4.      Os Estados‑Membros podem, a qualquer momento, conceder autorizações de residência autónomas ou de outro tipo que, por razões compassivas, humanitárias ou outras, confiram o direito de permanência a nacionais de países terceiros em situação irregular no seu território. Neste caso, não pode ser emitida qualquer decisão de regresso. Nos casos em que já tiver sido emitida decisão de regresso, esta deve ser revogada ou suspensa pelo prazo de vigência da autorização de residência ou outra que confira direito de permanência.

[…]

6.      A presente diretiva não obsta a que os Estados‑Membros tomem decisões de cessação da permanência regular a par de decisões de regresso, ordens de afastamento, e/ou proibições de entrada, por decisão ou ato administrativo ou judicial […]»

III – Litígio no processo principal e questões prejudiciais

7.        K. Boudjlida, de nacionalidade argelina, chegou a França em 26 de setembro de 2007 e beneficiou de vários títulos de residência na qualidade de estudante. Não requereu a renovação do seu último título de residência, cuja validade expirava em 31 de outubro de 2012, nem solicitou a emissão de um novo título.

8.        Apesar de estar em situação irregular no território francês, pediu em 7 de janeiro de 2013 o registo como empresário independente junto da Union de recouvrement des cotisations de sécurité sociale et d’allocations familiales (Urssaf), a fim de criar uma microempresa no setor da engenharia.

9.        Em razão da sua situação irregular, foi convocado, em 15 de janeiro de 2013, pelos serviços da polícia de fronteiras e deu voluntariamente cumprimento à referida convocatória. K. Boudjlida foi ouvido pelos referidos serviços quanto à sua situação a respeito do direito de residência em França. A audição, que durou 30 minutos, incidiu sobre o pedido de registo como empresário independente bem como sobre as circunstâncias da sua chegada a França, sobre as condições da sua residência como estudante a partir dessa data e sobre as suas relações familiares em França e na Argélia. À questão de saber se aceitaria abandonar o território francês, se fosse essa a decisão da prefeitura, respondeu afirmativamente.

10.      Na sequência desta audição, o préfet des Pyrénées‑Atlantique adotou no mesmo dia 15 de janeiro de 2003 uma decisão que obrigava K. Boudjlida a abandonar o território francês, concedendo‑lhe um prazo de regresso voluntário de 30 dias e fixando a Argélia como país de destino.

11.      Em 18 de fevereiro de 2013, K. Boudjlida interpôs recurso de anulação desta decisão para o tribunal administratif de Pau.

12.      K. Boudjlida alegou, designadamente, no órgão jurisdicional de reenvio que a decisão de 15 de janeiro de 2013 estava ferida de um erro de direito uma vez que, tendo em conta a sua integração em França e o seu percurso universitário bem como a presença em França de dois tios seus professores universitários, constituía uma violação desproporcionada da sua vida privada. Por outro lado, alega que o prazo de 30 dias era demasiado curto para alguém presente no território há mais de cinco anos e que não tinha efetivamente beneficiado do direito de ser ouvido utilmente, antes de ter sido tomada a decisão que lhe ordenou que abandonasse o território francês.

13.      O préfet des Pyrénées‑Atlantiques salientou que não foi tomada nenhuma decisão de recusa de título de residência a respeito de K. Boudjlida. Com efeito, K. Boudjlida obteve sem dificuldade a renovação dos seus cartões de residência entre 26 de setembro de 2007 e 31 de outubro de 2012 e não solicitou a renovação do seu último título nas condições previstas pela legislação francesa, isto é, nos dois meses que precedem a expiração do título anterior. Segundo o préfet des Pyrénées‑Atlantiques, K. Boudjlida estava assim em situação irregular no dia da decisão impugnada. Acrescenta que a obrigação de abandonar o território francês era fundamentada uma vez que, no caso em apreço, o estrangeiro estava em situação irregular. Por outro lado, à falta de vínculos familiares mais estreitos em França do que no seu país de origem, a decisão controvertida não viola desproporcionadamente o direito de K. Boudjlida conduzir a sua vida privada e familiar. Acresce que o prazo fixado para a execução dessa obrigação é o prazo, em princípio, aplicável nestes casos e, segundo o préfet des Pyrénées‑Atlantiques, não foi invocada nenhuma circunstância específica que justificasse um prazo mais dilatado.

14.      O préfet des Pyrénées‑Atlantiques defende a legalidade da sua decisão referindo um acórdão da cour administrative d’appel de Lyon do qual resulta que o direito de ser ouvido previsto pelo artigo 41.° da Carta não implica a obrigação de a administração organizar, por sua própria iniciativa, uma audição do interessado ou de o convidar a apresentar as suas observações, uma vez que, de resto, uma infração desse direito só é suscetível de afetar a regularidade do processo se o interessado demonstrar que dessa forma foi privado da possibilidade de apresentar elementos pertinentes suscetíveis de influenciar o conteúdo da decisão (acórdão de 14 de março de 2013, processo n.° 12LY02737).

15.      Por outro lado, o prefeito indicou que o direito de ser ouvido de K. Boudjlida foi respeitado, uma vez que foi ouvido durante 30 minutos pelos serviços de polícia a respeito do seu pedido de registo como empresário independente, das circunstâncias da sua chegada a França, das suas condições de residência enquanto estudante a partir dessa data e da situação da sua família. Daí resultou que se encontrava em situação irregular, que não tinha mais vínculos em França do que na Argélia e que nenhuma circunstância específica justificava um prazo mais dilatado de partida voluntária.

16.      O órgão jurisdicional de reenvio salienta que nem a Diretiva 2008/115 nem as disposições francesas previstas para a transpor fixaram as condições em que um estrangeiro deve ser ouvido antes de uma decisão de regresso que, por definição, o afeta desfavoravelmente, ser tomada a seu respeito. Todavia, considera que decorre do acórdão M. (C‑277/11, EU:C:2012:744) que, nos termos do direito previsto no artigo 41.°, n.° 2, alínea a), da Carta, a administração deve, antes de obrigar um estrangeiro em situação irregular a abandonar o território nacional, dar‑lhe a possibilidade de ser ouvido, ainda que a Diretiva 2008/115 e a legislação francesa que a transpõe não o prevejam expressamente.

17.      Segundo este órgão jurisdicional, os direitos de defesa e o direito de ser ouvido que é o respetivo corolário pressupõem, no âmbito mais geral do princípio do contraditório, que uma pessoa objeto de uma medida desfavorável tenha a possibilidade de analisar a totalidade dos elementos que lhe são imputados (3) e de exprimir o seu ponto de vista (4), após um tempo de reflexão suficiente para ele e simultaneamente adequado à necessidade de a administração agir com eficácia (5), se for o caso, com assistência de um advogado que possa intervir na fase de instrução prévia (6). Não obstante, considera que, à luz da jurisprudência referida, estes diferentes componentes do princípio do contraditório e dos direitos da defesa dependem da natureza dos objetivos prosseguidos pela administração e das prerrogativas de que esta dispõe para os atingir. Considera portanto que não é certo que todos estes componentes estejam ligados ao direito de ser ouvido utilmente e efetivamente tal como se encontra previsto no artigo 41.° da Carta.

18.      O órgão jurisdicional considera igualmente que importa saber se o ponto de equilíbrio entre, por um lado, a necessidade de respeitar o artigo 41.° da Carta e, por outro, de por em prática uma política de regresso eficaz pode justificar que um nacional de um país terceiro em situação irregular sofra uma ou mais modulações ou limitações do seu direito de ser posto em posição de analisar os elementos que lhe são imputados no que diz respeito ao seu direito de permanência, de exprimir um ponto de vista, oralmente ou por escrito, com um tempo de reflexão suficiente, sendo o caso, com o apoio de um advogado da sua escolha e, em caso de resposta afirmativa, se a amplitude destes ajustamentos deve depender da duração e da natureza dos vínculos com o Estado‑Membro da União Europeia em que se encontra ou de qualquer outro critério que deva ser tomado em conta.

19.      Nestas circunstâncias, o tribunal administratif de Pau decidiu suspender a instância e submeter as seguintes questões prejudiciais ao Tribunal de Justiça:

«1)      Qual é, para um estrangeiro nacional de um país terceiro em situação irregular que deve ser objeto de uma decisão de regresso, o conteúdo do direito de ser ouvido, definido no artigo 41.° da [Carta]?

Em particular, esse direito compreende o direito a que lhe seja facultada a possibilidade de analisar todos os elementos que lhe são opostos no que respeita ao seu direito de residência, o direito de expressar um ponto de vista, oralmente ou por escrito, decorrido um tempo de reflexão suficiente, e o direito de beneficiar da assistência de um advogado à sua escolha?

2)      Se necessário, esse conteúdo deve ser alterado ou limitado em função do objetivo de interesse geral da política de regresso exposto na Diretiva [2008/115]?

3)      Em caso afirmativo, que ajustamentos devem ser admitidos e com base em que critérios devem ser determinados?»

IV – Tramitação do Tribunal de Justiça

20.      Foram apresentadas observações escritas por K. Boudjlida, pelo Governo francês, pelo Governo neerlandês e pela Comissão Europeia. Na audiência realizada em 8 de maio de 2014, K. Boudjlida, o Governo francês e a Comissão Europeia apresentaram observações orais.

V –    Análise

A –    Argumentação das partes

21.      K. Boudjlida considera que não pôde fazer valer os seus argumentos nem discutir os fundamentos da sua expulsão na medida em que a prefeitura não tomou a sua decisão de regresso no âmbito de um procedimento administrativo contraditório. Salienta que a decisão de regresso «se torna automática a partir do momento em que a prefeitura constata a existência da permanência irregular e não há nenhuma possibilidade real de se defender efetivamente em relação à mesma antes de a decisão ser tomada, uma vez que a decisão de obrigação de abandonar o território é imediata, não havendo na prática outra alternativa senão recorrer ao tribunal administrativo para a contestar posteriormente».

22.      K. Boudjlida refere que nunca foi ouvido formalmente pelos serviços do préfet, que são os únicos competentes a esse título, quanto à renovação do seu direito de residência nem sobre uma decisão de regresso. Considera que a audição com a polícia não lhe permitia solicitar a sua autorização de residência nem fazer valer junto da prefeitura os seus argumentos contra uma decisão de regresso, até porque ignorava totalmente que decisão a autoridade administrativa ia tomar. K. Boudjlida não pensava de todo que uma decisão de regresso pudesse se tomada no próprio dia, sem que fosse ouvido quanto aos fundamentos da mesma. Não pode por isso defender‑se, uma vez que não foi ouvido quanto ao conteúdo prosseguido pela decisão de regresso. Segundo K. Boudjlida, este explicou na audição com a polícia que aguardava resposta ao seu pedido de naturalização e, à questão colocada sobre se aceitava abandonar o território caso fosse essa a decisão da prefeitura, confirma ter respondido que estaria pronto a abandonar o território se fosse necessário. Considera que nada nesta audição indica que tenha tido o direito de apresentar as suas observações e de ser ouvido antes de uma decisão de regresso que iria ser tomada no próprio dia.

23.      K. Boudjlida salienta que, se tivesse sido informado de que iria ser tomada uma decisão de regresso, teria podido fazer valer junto da prefeitura argumentos suscetíveis de alterar essa decisão. Acrescenta que poderia, caso tivesse tido a possibilidade, antes da decisão de regresso, invocar uma violação desproporcionada do direito ao respeito pela sua vida privada e a violação das disposições do artigo L.313‑11 7.° do code de l’entrée et du séjour des étrangers et du droit d’asile (Código de Entrada e Permanência dos Estrangeiros e do Direito de Asilo) («Ceseda»), dada a sua perfeita integração em França.

24.      K. Boudjlida observa igualmente que «tem que se considerar que a única audição de 30 minutos com a polícia não corresponde de forma alguma ao conteúdo do direito de ser ouvido pela administração durante o procedimento administrativo como enunciado pelo» Tribunal de Justiça na sua jurisprudência. A decisão de regresso foi portanto tomada na sequência da audição com a polícia, sem assistência de um advogado e em violação da jurisprudência do Tribunal de Justiça.

25.      Segundo K. Boudjlida, o direito a uma boa administração, como prevê designadamente o artigo 41.°, n.° 2, da Carta implica, no âmbito da transposição da Diretiva 2008/115, o direito de qualquer pessoa ser ouvida antes que uma medida individual que a afetará desfavoravelmente seja contra ele tomada. Considera que o direito de ser ouvido deve ser definido como o direito de qualquer pessoa expressar, de maneira útil e efetiva, as suas observações escritas ou orais num procedimento administrativo antes da adoção de qualquer decisão suscetível de a prejudicar. K. Boudjlida acrescenta que o conteúdo do direito de ser ouvido pressupõe que a pessoa, objeto da medida desfavorável, tenha a possibilidade de analisar todos os elementos que lhe são imputados, possa exprimir o seu ponto de vista após um tempo de reflexão apropriado e com o apoio de um advogado que possa intervir a partir da fase de instrução prévia à notificação das acusações.

26.      O Governo francês considera que resulta da própria redação do artigo 41.° da Carta que este não se dirige aos Estados‑Membros mas apenas às instituições, órgãos e organismos da União (7). No entanto, acrescenta que, segundo jurisprudência constante, o direito de ser ouvido constitui um princípio geral do direito da União que se insere não só no direito a uma boa administração, consagrado no artigo 41.° da Carta mas também no respeito dos direitos de defesa e no direito a um processo equitativo, garantidos nos artigos 47.° e 48.° da Carta. Segundo este Governo, o respeito do direito de ser ouvido impõe‑se não só às instituições da União, por força do artigo 41.°, n.° 2, alínea a), da Carta, mas igualmente, por constituir um princípio geral do direito da União, às administrações de cada um dos Estados‑Membros quando adotam decisões abrangidas pelo âmbito de aplicação do direito da União, e isto mesmo quando a regulamentação aplicável não prevê expressamente essa formalidade (8).

27.      O Governo francês salienta que a Diretiva 2008/115 apenas se aplica ao regresso de nacionais de países terceiros que se encontrem em situação irregular, não tendo, portanto, por objeto harmonizar completamente as regras nacionais relativas à permanência de estrangeiros (9). Assim, segundo este Governo, as modalidades de exame do caráter regular ou não da permanência de um nacional de um país terceiro e as modalidades segundo as quais o nacional é, sendo caso disso, ouvido no âmbito deste exame, decorrem do direito nacional dos Estados‑Membros. Todavia, uma vez estabelecido o caráter irregular da permanência, a adoção de uma decisão de regresso constituiria uma obrigação para os Estados‑Membros, em conformidade com o artigo 6.°, n.° 1, da Diretiva 2008/115, salvo nos casos específicos previstos nos n.os 2 a 5 deste artigo. Dado que a decisão de regresso decorre necessariamente da decisão que declara o caráter irregular da permanência da pessoa em causa, o Governo francês considera que esta não deve ser ouvida de novo antes da adoção de uma decisão de regresso uma vez que, por força do direito do Estado‑Membro em causa, essa pessoa foi ouvida no âmbito do procedimento de exame do seu direito de permanência. Em contrapartida, considera que, caso o direito de um Estado‑Membro não preveja que a pessoa em causa seja ouvida no âmbito do exame do seu direito de permanência, esta deve ter a possibilidade de apresentar as suas observações antes da adoção de uma decisão de regresso a seu respeito.

28.      O Governo francês acrescenta que, como no processo principal, a adoção de uma decisão de regresso pode seguir‑se ao controlo por parte dos serviços de polícia de um nacional de país terceiro desprovido de título de título de residência válido. Nessa hipótese, a administração deve, antes da adoção de uma decisão de regresso, examinar a situação pessoal da pessoa em causa e dar‑lhe a possibilidade de apresentar as suas observações relativas a um eventual direito de residência. No entanto, a pessoa em causa deve ser ouvida em condições que não prejudiquem a eficácia do procedimento de regresso e que tenham em conta tanto a urgência com que a administração deve agir como o risco de fuga. Essa audição pode ter lugar, como no processo principal, quando a pessoa aceita comparecer nas instalações dos serviços de polícia para ser ouvido sobre a sua situação. Noutros casos, a verificação da situação da pessoa em causa pode igualmente implicar privá‑la temporariamente da sua liberdade.

29.      Segundo o Governo francês, embora no âmbito de um processo de custódia policial, como o de detenção para verificação do direito de residência, o direito francês preveja a possibilidade de se ser assistido por um advogado, esta exigência resulta unicamente de a pessoa em causa então se encontrar em situação de privação de liberdade. Em contrapartida, o direito de beneficiar livremente do consultor da sua escolha no âmbito do procedimento administrativo prévio à adoção de uma decisão de regresso não se pode considerar uma componente do direito de ser ouvido. O mesmo Governo considera que, embora o artigo 47.°, n.° 3, da Carta previa que seja concedia assistência judiciária a quem não disponha de recursos suficientes, na medida em que essa assistência seja necessária para assegurar a efetividade do acesso à justiça, resulta dos próprios termos desta disposição que esta se aplica unicamente no âmbito dos processos jurisdicionais.

30.      O Governo francês propõe, a título subsidiário, que se responda à segunda e terceira questões que a Diretiva 2008/115 deve ser interpretada no sentido de que o conteúdo do direito de ser ouvido pode ser limitado a fim de tomar em consideração o objetivo desta diretiva, que é o de assegurar eficazmente o regresso dos nacionais de países terceiros em situação irregular. Segundo este Governo, estas limitações devem estar previstas na lei, ser necessárias e proporcionadas e respeitar o conteúdo essencial do referido direito.

31.      O Governo neerlandês considera que estrangeiros como K. Boudjlida não beneficiam de nenhum direito previsto no artigo 41.° nas suas relações com um Estado‑Membro. Segundo este Governo, resulta da redação do artigo 41.° da carta que esta disposição garante o direito a uma boa administração por parte das instituições, órgãos e organismos da União. Esta disposição não se refere portanto aos Estados‑Membros (10). No entanto, o Governo neerlandês considera que o fundamento do artigo 41.° da Carta é um princípio fundamental do direito da União e considera que quando a Administração nacional se propõe adotar em relação a uma pessoa um ato que lhe causa prejuízo, é aplicável o respeito pelos direitos de defesa (11).

32.      Segundo o Governo neerlandês, os direitos de defesa incluem nomeadamente o direito de ser ouvido antes da adoção de um ato que cause prejuízo. O conteúdo destes direitos depende do contexto concreto de um processo e do quadro jurídico aplicável. Sublinha que um controlo de estrangeiros em situação irregular está sempre abrangido pelos serviços de polícia e/ou de imigração. Para estas autoridades, importa, à luz dos objetivos da Diretiva 2008/115, que haja uma clarificação rápida quanto ao caráter regular ou não da permanência de um estrangeiro e, caso se trate de uma permanência irregular, que se lhe seja posto termo o mais rapidamente possível. A preparação de uma decisão para este efeito não deve ser automaticamente objeto de um procedimento escrito detalhado. A decisão de regresso em si deve evidentemente ser emitida por escrito, em conformidade com o artigo 12.°, n.° 1, da Diretiva 2008/115.

33.      O Governo neerlandês salienta que uma decisão de regresso constitui a etapa inicial do procedimento de regresso (12). Uma decisão de regresso determina que um nacional de um país terceiro se encontra em situação irregular e impõe uma obrigação de regresso. No que diz respeito à determinação do caráter irregular da situação de um nacional de um país terceiro, o Governo neerlandês observa que os efeitos jurídicos desta constatação não são (particularmente) onerosos para o estrangeiro em causa, uma vez que a ilegalidade da permanência do interessado já está estabelecida pela falta de título de residência válido e não resulta, portanto, da decisão de regresso.

34.      Segundo o Governo neerlandês, as autoridades competentes do Estado‑Membro devem, em conformidade com o acórdão M. (EU:C:2012:744), dar ao estrangeiro, no âmbito de um procedimento relativo ao caráter regular ou não da sua situação nesse Estado, a possibilidade de dar a conhecer, de maneira útil e efetiva, o seu ponto de vista e prestar toda a atenção necessária às observações assim submetidas pelo interessado a esse respeito. O Governo neerlandês considera que, embora as autoridades em causa devam determinar se um estrangeiro detém um título de residência válido ou não, estas não devem ter em conta todos os direitos de permanência a que o estrangeiro pode (potencialmente) aspirar.

35.      O Governo neerlandês salienta que o artigo 6.°, n.° 1, da Diretiva 2008/115 impõe que seja adotada uma decisão de regresso em relação a um estrangeiro em situação irregular no território de um Estado‑Membro. No que diz respeito ao processo principal, o Governo neerlandês refere que K. Boudjlida está em situação irregular em França, uma vez que não apresentou um pedido de renovação da sua autorização de residência. Com base nas informações constantes da decisão de reenvio, está demonstrado que, no momento da adoção da decisão de regresso, K. Boudjlida não possuía um título de residência. Neste contexto, o Governo neerlandês considera que, neste caso específico, os direitos de defesa não foram violados. Tendo em conta o caráter específico da decisão de regresso, o estrangeiro deve dispor de apenas um período limitado para reagir e segundo o Governo neerlandês, não existe nenhuma razão para supor que o período de reflexão foi demasiado curto no processo principal. Acrescenta que continua pendente um recurso da decisão de regresso. O Governo neerlandês acrescenta que o direito de ser ouvido quando da adoção de uma decisão de regresso não abrange o direito de beneficiar de assistência jurídica gratuita.

36.      A Comissão observa que o direito de ser ouvido em qualquer processo está previsto no artigo 41.° da Carta. Segundo a Comissão, ainda que se especifique que este artigo da Carta só se aplica às instituições e órgãos da União, o Tribunal de Justiça declarou, no acórdão M. (EU:C:2012:744) que «há que referir que, como resulta da sua própria letra, esta disposição é de aplicação geral» (13). A Comissão considera que, ao adotarem decisões de regresso, os Estados‑Membros estão dão execução ao direito da União e estão por isso vinculados às obrigações que resultam da Carta (14).

37.      A Comissão considera que uma vez que os Estados‑Membros estão obrigados por força do artigo 6.°, n.° 1, da Diretiva 2008/115 a tomar uma decisão de regresso em relação a qualquer estrangeiro em situação irregular, o objeto principal do seu direito de ser ouvido antes da adoção de uma decisão de regresso é o de fazer valer as suas observações quanto às modalidades de regresso e quanto à aplicabilidade das exceções previstas no artigo 6.°, n.os 2 a 5, da Diretiva 2008/115. Antes de mais, o estrangeiro pode assim fazer observações quanto ao caráter irregular ou não da sua situação para determinar se entra ou não no âmbito de aplicação do procedimento de regresso.

38.      Segundo a Comissão, uma vez que a Diretiva 2008/115 não fixa praticamente nenhuma regra quanto à adoção da decisão de regresso, não se pode concluir que o direito de ser ouvido impõe a realização de um procedimento contraditório como os previstos para a execução dos artigos 101.° TFUE e 102.° TFUE. Recorda que a finalidade da referida diretiva é implementar um procedimento eficaz que assegure o mais rapidamente possível o regresso ao seu país de origem de nacionais de países terceiros em situação irregular. Em matéria de regresso, o juiz nacional deve encontrar o justo equilíbrio entre a necessidade de implementar uma «política de regresso eficaz, enquanto elemento necessário de uma política de migração bem gerida (15) e o dever dos Estados‑Membros de «assegurar a cessação das situações irregulares de nacionais de países terceiros através de um procedimento justo e transparente» (16). Segundo a Comissão, o alcance do direito de ser ouvido em certas circunstâncias especiais, pode ser limitado quando comporte o risco de prejudicar um interesse público superior (17).

39.      A Comissão considera que, por analogia com a posição adotada pelo Tribunal de Justiça no acórdão M. (EU:C:2012:744, n.° 95), o direito de exprimir o seu ponto de vista, por escrito ou oralmente, antes da adoção de uma decisão de regresso não significa que a autoridade nacional deva informar o destinatário acerca da decisão que tenciona adotar nem comunicar‑lhe os argumentos nos quais pretende baseá‑la nem dar‑lhe um prazo de reflexão antes de adotar essa decisão. O estrangeiro terá ocasião de contestar a apreciação da Administração no âmbito de um recurso contencioso.

40.      Segundo a Comissão, o direito de ser ouvido antes da adoção de uma decisão de regresso deve permitir à administração instruir o processo de maneira a tomar uma decisão com conhecimento de causa e a fundamentá‑la, de modo a que, sendo o caso, o interessado possa validamente exercer o seu direito de recurso. No que diz respeito à questão de saber se o direito de ser ouvido compreende o de beneficiar da assistência de um advogado à sua escolha, a Comissão sublinha que o artigo 13.°, n.° 3, da Diretiva 2008/115 prevê a obrigação de os Estados‑Membros concederem assistência jurídica aos estrangeiros em situação irregular apenas a partir do momento em que estes queiram utilizar uma via de recurso efetiva na aceção do artigo 13.°, n.° 1, da referida diretiva, ou seja, numa «autoridade judicial ou administrativa competente ou um órgão competente composto por membros imparciais que ofereçam garantias de independência».

41.      A Comissão salienta ainda que resulta da decisão de reenvio que K. Boudjlida se encontra numa situação de permanência irregular cuja consequência é a adoção de uma decisão de regresso e que, antes da adoção dessa decisão, este pode exprimir oralmente as suas observações quanto ao caráter irregular ou não da sua permanência, aos seus vínculos familiares em França, ao seu percurso académico e à sua integração no país bem como quanto a um eventual afastamento. À luz destes princípios, a Comissão considera que o direito de ser ouvido parece ter sido respeitado. Segundo a Comissão, compete todavia ao juiz nacional apreciar se a duração da audição foi suficiente para permitir a K. Boudjlida formular observações quanto à totalidade dos assuntos que foram abordados de modo a que a autoridade competente tenha tido as informações necessárias antes de lhe ordenar que abandonasse o território segundo as modalidades que foram fixadas na decisão de regresso.

B –    Apreciação

1.      Observações preliminares

42.      O âmbito de aplicação da Carta, no que diz respeito à ação dos Estados‑Membros, está definido no seu artigo 51.°, n.° 1, nos termos do qual as disposições da Carta se dirigem Estados‑Membros apenas quando apliquem o direito da União.

43.      Como declarou o Tribunal de Justiça, o artigo 51.° «da Carta confirma, assim, a jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa à medida em que a ação dos Estados‑Membros deve conformar‑se com as exigências decorrentes dos direitos fundamentais garantidos na ordem jurídica da União (18).

44.      Com efeito, acrescenta o Tribunal de Justiça, no n.° 19 do acórdão Åkerberg Fransson (EU:C:2013:105) e no n.° 33 do acórdão Pfleger e o. (EU:C:2014:281), «resulta, no essencial, da jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que os direitos fundamentais garantidos pela ordem jurídica da União são aplicáveis em todas as situações reguladas pelo direito da União, mas não fora dessas situações. É nesta medida que o Tribunal de Justiça já recordou que não pode apreciar, à luz da Carta, uma legislação nacional que não se enquadra no âmbito do direito da União. Em contrapartida, quando uma legislação nacional se enquadra no âmbito de aplicação desse direito, o Tribunal de Justiça, chamado a pronunciar‑se sobre uma questão prejudicial, deve fornecer todos os elementos de interpretação necessários à apreciação, pelo órgão jurisdicional nacional, da conformidade desta legislação com os direitos fundamentais cujo respeito assegura».

45.      O Tribunal de Justiça também declarou, no n.° 21 do acórdão Åkerberg Fransson (EU:C:2013:105) e no n.° 34 do acórdão Pfleger e o. (EU:C:2014:281) que, «os direitos fundamentais garantidos pela Carta devem, por conseguinte, ser respeitados quando uma legislação nacional se enquadra no âmbito de aplicação do direito da União, não podem existir situações que estejam abrangidas pelo direito da União sem que os referidos direitos fundamentais não sejam aplicados. A aplicabilidade do direito da União implica a aplicabilidade dos direitos fundamentais garantidos pela Carta.»

46.      É verdade que, não obstante o artigo 51.° da Carta definir tanto em relação à União como aos Estados‑Membros, o âmbito de aplicação da mesma sob a epígrafe «Disposições gerais que regem a interpretação e a aplicação da Carta», o artigo 41.° da Carta prevê o direito de ser ouvido apenas em relação às instituições, órgãos e organismos da União» (19), como salientou o Tribunal de Justiça no seu acórdão Cicala (EU:C:2011:868, n.° 28), referido pelo Governo francês nas suas observações escritas (20), sem que contudo o Tribunal de Justiça o considere um argumento determinante da solução que encontrou nesse acórdão.

47.      Não nos parece coerente nem conforme à jurisprudência do Tribunal de Justiça (21) que a redação do artigo 41.° possa assim introduzir uma exceção à regra prevista pelo artigo 51.°, o que permitiria aos Estados‑Membros não aplicar um artigo da Carta, mesmo quando estes aplicam o direito da União. Igualmente, é clara a nossa preferência pela aplicabilidade do artigo 41.° da Carta aos Estados‑Membros quando estes aplicam o direito da União, mas de qualquer forma, como salienta o Governo francês, o direito de ser ouvido constitui, conforme jurisprudência constante, um princípio geral do direito da União que «resulta não apenas do direito a uma boa administração, consagrado no artigo 41.° da Carta mas também do respeito dos direitos de defesa e do direito a um processo equitativo, garantidos nos artigos 47.° e 48.° da Carta» (22). O respeito deste direito impõe‑se portanto a esse título pelo menos às autoridades «de cada um dos Estados‑Membros quando adotam decisões abrangidas pelo âmbito de aplicação do direito da União» (23).

48.      Como indicámos, no n.° 49 da nossa tomada de posição no processo G. e R. (C‑383/13 PPU, EU:C:2013:553), se «[a] obrigação das autoridades nacionais de respeitarem o direito de ser ouvido antes da adoção de uma decisão suscetível de afetar desfavoravelmente os interesses de uma pessoa é amplamente consagrada por jurisprudência constante do Tribunal de Justiça […] e o artigo 41.°, n.° 2, alínea a), da Carta confirma esta obrigação, conferindo‑lhe valor constitucional».

49.      No caso em apreço, a adoção de uma decisão de regresso por parte de um Estado‑Membro constitui uma execução do artigo 6.°, n.° 1, da Diretiva 2008/115 e, portanto, do direito da União, na aceção da jurisprudência do Tribunal de Justiça e do artigo 51.°, n.° 1, da Carta. De onde resulta que numa situação deste tipo, regida pelo direito da União, os Estados‑Membros devem aplicar os direitos fundamentais garantidos pelo ordenamento jurídico da União e, entre estes, o direito de ser ouvido quando a autoridade nacional se propõe adotar em relação a uma pessoa uma decisão que lhe causa prejuízo (24).

50.      Uma decisão de regresso desta natureza, conforme definida no artigo 3.°, n.° 4, e referida no artigo 6.°, n.° 1, da Diretiva 2008/115, constitui uma decisão que causa prejuízo ao seu destinatário. Com esta decisão, um Estado‑Membro declara ilegal a permanência de um nacional de um país terceiro e impõe ou enuncia uma obrigação de regresso (25).

51.      O considerando 6 da Diretiva 2008/115 precisa que quando os Estados‑Membros adotam decisões de regresso, devem observar um processo equitativo e transparente.

52.      Todavia, a Diretiva 2008/115 não institui um procedimento específico de audição de um nacional de um país terceiro antes da adoção de uma decisão de regresso (26). As garantias processuais previstas no capítulo III da Diretiva 2008/115 apenas dizem respeito à forma da decisão de regresso (artigo 12.°) (27), às vias de recurso (artigo 13.°) e às garantias enquanto se aguarda o regresso (artigo 14.°).

53.      Assim sendo, em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, o respeito pelo referido direito impõe‑se igualmente quando a regulamentação aplicável não prevê expressamente essa formalidade (28).

54.      De onde resulta que as condições nas quais deve ser assegurado o respeito pelos direitos da defesa dos nacionais de países terceiros em situação irregular e as consequências das violações destes direitos derivam do direito nacional desde que as medidas decretadas neste sentido não sejam mais desfavoráveis do que aquelas de que beneficiam os particulares em situações de direito nacional comparáveis (princípio da equivalência) e não tornem na prática impossível ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pelo ordenamento jurídico da União (princípio da efetividade) (29).

55.      Ora, como o Tribunal de Justiça declarou no acórdão M. (EU:C:2012:744, n.° 87 e jurisprudência referida), «o direito de ser ouvido garante que qualquer pessoa tenha a possibilidade de dar a conhecer, de maneira útil e efetiva, o seu ponto de vista no decurso do procedimento administrativo e antes da adoção de qualquer decisão suscetível de afetar desfavoravelmente os seus interesses». O Tribunal de Justiça acrescenta neste acórdão que «[o] referido direito implica igualmente que a Administração preste toda a atenção necessária às observações assim submetidas pelo interessado, examinando, com cuidado e imparcialidade, todos os elementos pertinentes do caso concreto e fundamentando a sua decisão de forma circunstanciada» (30).

56.      Consequentemente, a autonomia processual dos Estados‑Membros ligada à inexistência de um procedimento específico na Diretiva 2008/115, apenas pode ter como efeito que um nacional de um país terceiro seja privado do direito de ser ouvido pela autoridade nacional competente para a adoção de uma decisão de regresso.

57.      Todavia, o artigo 52.°, n.° 1, da Carta admite limitações ao exercício dos direitos por ela consagrados, desde que a limitação em questão diga respeito ao conteúdo essencial do direito fundamental em causa e que, no respeito do princípio da proporcionalidade, essa limitação seja necessária e responda efetivamente a objetivos de interesse geral reconhecidos pela União (31). De onde resulta que os direitos de defesa não apareçam como prerrogativas absolutas mas podem incluir restrições em certas circunstâncias (32).

58.      Antes de examinar mais concretamente a aplicação destes princípios às circunstâncias do processo principal, consideramos que é útil recordar que o objetivo do direito de ser ouvido previsto no artigo 41.°, n.° 2, alínea a), da Carta é, por um lado, permitir a instrução do processo e um apuramento dos factos tão precisos quanto possível e, por outro, assegurar uma proteção efetiva do interessado (33). Esta disposição visa designadamente assegurar que qualquer decisão que afete desfavoravelmente uma pessoa seja adotada com pleno conhecimento de causa.

2.      Quanto à primeira questão prejudicial

59.      A presente questão diz respeito aos elementos que devem fazer parte do direito de ser ouvido conforme imposto pela jurisprudência do Tribunal de Justiça e previsto no artigo 41.°, n.° 2, alínea a), da Carta, no âmbito da adoção de uma decisão de regresso e, mais especificamente, o caráter conforme ou não com essas exigências da audição de K. Boudjlida por parte dos serviços de polícia de fronteiras, em 15 de janeiro de 2013.

a)      Considerações gerais

60.      A audição do interessado visa não só assegurar que uma decisão que causa prejuízo seja adotada com pleno conhecimento de causa (34) mas permitir igualmente à administração respeitar o seu dever de fundamentar adequadamente as suas decisões (35). Uma fundamentação adequada permite, por um lado, ao interessado conhecer as justificações da decisão de regresso tomada a fim de defender os seus direitos em caso de recurso da referida decisão e, por outro, à autoridade ou à instância referida no artigo 13.°, n.° 1, da Diretiva 2008/115 exercer a sua fiscalização da legalidade da decisão.

61.      Dito isto, o direito de qualquer pessoa ser ouvida antes de uma medida individual que a afete desfavoravelmente, que contra ela seja tomada deve ser distinguida da questão da proporcionalidade ou da legalidade desta medida, uma vez que o direito de ser ouvido não dá origem ao direito de obter uma decisão favorável. Com efeito, a verificação do respeito do direito de ser ouvido não diz respeito à justeza da decisão de regresso. Trata‑se de dois fundamentos distintos suscetíveis de serem invocados no âmbito de um recurso conforme previsto no artigo 13.° da Diretiva 2008/115 (36).

62.      Além disso, as modalidades do direito de ser ouvido no âmbito da adoção de uma decisão de regresso não podem ser descontextualizadas do objetivo da Diretiva 2008/115 que visa «estabelecer normas claras, transparentes e justas para uma política de regresso eficaz, enquanto elemento necessário de uma política de migração bem gerida» (37).

63.      A este respeito, importa recordar que, segundo jurisprudência constante, uma vez declarada a irregularidade da permanência, as autoridades nacionais competentes devem, por força do artigo 6.°, n.° 1, da referida diretiva e sem prejuízo das exceções previstas no artigo 6.°, n.os 2 a 5, adotar uma decisão de regresso (38).

64.      Tendo em conta esta obrigação dos Estados‑Membros consideramos, como a Comissão, que a finalidade do direito de ser ouvido antes da adoção de uma decisão de regresso é a de ouvir o interessado sobre a legalidade da sua permanência, sobre a eventual aplicação das exceções previstas no artigo 6.°, n.os 2 a 5 da diretiva e sobre as modalidades do seu regresso. Além disso, consideramos que, em conformidade com o artigo 5.° da Diretiva 2008/115 com a epígrafe «[n]ão‑repulsão, interesse superior da criança, vida familiar e estado de saúde», na execução da referida diretiva os Estados‑Membros devem, por um lado, ter em conta devidamente o interesse superior da criança, da vida familiar, do estado de saúde do nacional em causa de um país terceiro e, por outro, respeitar o princípio da não‑repulsão. De onde resulta que, quando a autoridade nacional competente tencione adotar uma decisão de regresso, esta autoridade deve necessariamente respeitar as obrigações impostas pelo artigo 5.° da Diretiva 2008/115 e ouvir o interessado a esse respeito.

65.      Além disso, cabe ao interessado cooperar com a autoridade nacional competente quando da sua audição a fim de lhe fornecer todas as informações pertinentes quanto à sua situação pessoal e familiar e, designadamente, as que militam contra a adoção de uma decisão de regresso, entendendo‑se que, nesta fase, o caráter regular ou não da permanência nem se chega a colocar se este não tiver sequer iniciado as diligências adequadas para obter o direito de permanência no Estado em causa.

b)      Modalidades direito de ser ouvido

66.      O juiz de evoca em particular, nas suas questões e na sua decisão de reenvio, a possibilidade para o estrangeiro de analisar a todos os elementos que lhe são imputados, o que pressupõe que a Administração nacional lhos comunique antecipadamente e lhe conceda um tempo de reflexão suficiente antes de uma audição (1), o direito de o estrangeiro beneficiar da assistência de um advogado à sua escolha (2) e a duração da referida audição (3). Foi também evocado o prazo de 30 dias concedido a K. Boudjlida para abandonar a França (4).

i)      Comunicação prévia dos argumentos da administração e tempo de reflexão

67.      Na falta de disposições de direito da União que estabeleçam um procedimento específico para garantir aos nacionais de países terceiros em situação irregular o direito de serem ouvidos antes da adoção de uma decisão de regresso (39), consideramos que o artigo 41.°, n.° 2, alínea a), da Carta não pode ser interpretado no sentido de que a autoridade nacional competente está obrigada, antes da adoção de uma decisão de regresso, a comunicar os elementos sobre os quais pretende basear essa decisão e a recolher quanto aos referidos elementos as observações do interessado após um período de reflexão (40).

68.      Nenhum procedimento contraditório dessa natureza é instaurado pela Diretiva 2008/115.

69.      Todavia, deve ser admitida uma exceção prévia quando o nacional do país terceiro não podia razoavelmente duvidar dos elementos que lhe poderiam ser imputados ou só poderia razoavelmente responder aos mesmos após certas verificações ou iniciativas com vista nomeadamente à obtenção de documentos justificativos.

70.      No que diz respeito ao processo principal, resulta da ata da sua audição com os serviços de polícia de fronteiras que K. Boudjlida foi convocado em 15 de janeiro de 2013 a apresentar‑se nas instalações da polícia, quer no próprio dia 15 de janeiro de 2013, quer na manhã de 16 de janeiro de 2013, para «analisar o [seu] direito de permanência». Decidiu, por sua vontade, apresentar‑se em 15 de janeiro de 2013. De onde resulta que decidiu igualmente não beneficiar do período de reflexão de um dia que lhe foi concedido pela polícia nem procurar assistência jurídica.

71.      Resulta da mesmo ata de audição de K. Boudjlida, que este sabia que o seu «título de residência estava caducado» e que este não podia ignorar que estava em situação irregular em França em razão da falta de pedido de renovação do seu título de residência, que tinha expirado em 31 de outubro de 2012. Por outro lado, a polícia informou‑o, de maneira explícita, que podia ser objeto de uma decisão de regresso e interrogou‑o quanto à questão de saber se aceitaria abandonar França, caso fosse tomada uma decisão nesse sentido a seu respeito. K. Boudjlida respondeu a esta questão «evidentemente» acrescentando: «[que] aceita aguardar [nos] locais de acolhimento a resposta da prefeitura de Pau que possa inst[á‑lo] a abandonar o território, coloc[á‑lo] num centro de detenção ou inst[á‑lo] a regularizar a [sua] situação».

72.      Consequentemente, sob reserva de verificação por parte do órgão jurisdicional de reenvio, K. Boudjlida foi informado da razão da audição em causa e tinha conhecimento do assunto sobre o qual seria ouvido e as consequências eventuais dessa audição. Além disso, sob a mesma reserva, esta audição dizia claramente respeito a informações pertinentes e necessárias para efeitos da execução da Diretiva 2008/115, no respeito pelo direito de ser ouvido do interessado.

73.      Com efeito, quando da sua audição com a polícia, K. Boudjlida foi ouvido, designadamente, quanto à sua identidade, nacionalidade, estado civil, irregularidade da sua situação em França, as diligências administrativas que tinha desencadeado para tentar regularizar a sua situação, a duração total da sua permanência em França, os seus anteriores títulos de residência, o seu percurso escolar e profissional, recursos, situação familiar em França e na Argélia. Por fim, os serviços de polícia perguntaram‑lhe se aceitaria «abandonar o território francês se fosse essa a decisão da prefeitura de Pau» (41).

ii)    Direito à assistência jurídica

74.      O direito à assistência jurídica está previsto, em conformidade com o artigo 13.° da Diretiva 2008/115, apenas após a adoção de uma decisão de regresso (42) e no âmbito de um recurso dessa decisão (43). Em determinadas circunstâncias, deve ser concedida assistência jurídica caso seja solicitada (44).

75.      Assim sendo, ninguém pode ser impedido de recorrer, a suas expensas próprias, a um consultor jurídico, quando da sua audição por parte das autoridades nacionais competentes, desde que o exercício desse direito não afete o bom andamento do procedimento e não comprometa a execução eficaz da Diretiva 2008/115. Na sua audição, K. Boudjlida não pediu para ter assistência jurídica.

iii) Duração da audição

76.      K. Boudjlida e a Comissão reconhecem a duração curta, ou seja, de 30 minutos, da audição em causa no processo principal. Não consideramos que a duração da audição seja determinante. O importante é saber se K. Boudjlida foi ouvido suficientemente quanto à legalidade da sua situação e quanto à sua situação pessoal (45), o que nos parece decorrer dos n.os 70 a 73 das presentes conclusões.

iv)    Prazo concedido para abandonar o território francês

77.      A este respeito, salientamos que o artigo 7.°, n.° 1, da Diretiva 2008/115 prevê, designadamente, «um prazo adequado para a partida voluntária, entre sete e trinta dias». Além disso, em conformidade com o artigo 7.°, n.° 2, da Diretiva 2008/115, os Estados‑Membros deve prolongar, «se necessário», «prazo previsto para a partida voluntária por um período adequado, tendo em conta as especificidades do caso concreto, tais como a duração da permanência, a existência de filhos que frequentem a escola e a existência de outros membros da família e de laços sociais».

78.      Resulta da ata de audição de K. Boudjlida que este foi ouvido, designadamente, quanto à duração da sua permanência em França, aos seus estudos em França e vínculos familiares em França. Parece‑nos, sob reserva de verificação por parte do órgão jurisdicional de reenvio, que foi ouvido quando à eventual aplicação dos critérios que permitem prolongar o prazo de partida fixado no artigo 7.°, n.° 2, da Diretiva 2008/115. Quanto à natureza adequada do prazo de partida concedido a K. Boudjlida tendo em conta, em especial, as suas observações quando da sua audição pela polícia, há que reconhecer que esta apreciação diz respeito à legalidade da justeza da medida (46).

79.      Tendo em conta o conjunto destes elementos, propomos ao Tribunal de Justiça que responda à primeira questão prejudicial da seguinte maneira:

–        o direito de um nacional de um país terceiro em situação irregular de ser ouvido antes da adoção de uma decisão de regresso a seu respeito impõe à autoridade nacional competente que oiça o interessado quanto à legalidade da sua permanência, quanto à eventual aplicação do artigo 5.° da Diretiva 2008/115 bem como das exceções previstas no artigo 6.°, n.os 2 a 5, da referida diretiva e quanto às modalidades do seu regresso;

–        em contrapartida, a menos que o nacional de um país terceiro pudesse razoavelmente suspeitar da eventual adoção de uma decisão de regresso ou duvidar dos elementos que lhe poderiam ser imputados, o que o obrigaria a realizar certas diligências de verificação ou a obter documentos justificativos, o direito da União Europeia não obriga a autoridade nacional competente a prevenir essa pessoa antes da audição organizada com vista à adoção dessa decisão de que tenciona adotar uma decisão de regresso, nem a comunicar‑lhe os elementos com base nos quais pretende fundamentar a mesma, nem a conceder‑lhe um prazo de reflexão antes de recolher as suas observações;

–        embora, antes da adoção por parte da autoridade administrativa nacional competente de uma decisão de regresso, o nacional de um país terceiro possa recorrer um consultor jurídico quando da sua audição por parte das autoridades nacionais competentes, desde que o exercício desse direito não afete o bom desenrolar do procedimento e não comprometa a aplicação eficaz da Diretiva 2008/115, o direito da União não obriga os Estados‑Membros a assegurar essa assistência no âmbito da assistência judiciária gratuita.

3.      Quanto à segunda e terceira questões prejudiciais

80.      Com estas questões, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta ao Tribunal de Justiça se, e em caso afirmativo segundo que critérios, é necessário modular ou limitar o direito de um nacional de um país terceiro em situação irregular a ser ouvido em conformidade com o artigo 41.°, n.° 2, alínea a), da Carta antes da adoção de uma decisão de regresso a seu respeito, tendo em conta o objetivo de interesse geral da política de regresso constante da Diretiva 2008/115.

81.      Tendo em conta a minha resposta à primeira questão, respondemos negativamente à segunda e terceira questões prejudicais.

VI – Conclusão

82.      À luz das considerações precedentes, propomos que o Tribunal de Justiça responda às questões prejudiciais apresentadas pelo tribunal administratif de Pau:

«1)      O direito de um nacional de um país terceiro em situação irregular de ser ouvido antes da adoção de uma decisão de regresso a seu respeito impõe à autoridade nacional competente que oiça o interessado quanto à legalidade da sua permanência, quanto à eventual aplicação do artigo 5.° da Diretiva 2008/115/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de dezembro de 2008, relativa a normas e procedimentos comuns nos Estados‑Membros para o regresso de nacionais de países terceiros em situação irregular, bem como das exceções previstas no artigo 6.°, n.os 2 a 5, da referida diretiva e quanto às modalidades do seu regresso.

Em contrapartida, a menos que o nacional de um país terceiro pudesse razoavelmente suspeitar da eventual adoção de uma decisão de regresso ou duvidar dos elementos que lhe poderiam ser imputados, o que o obrigaria a realizar certas diligências de verificação ou a obter documentos justificativos, o direito da União Europeia não obriga a autoridade nacional competente a prevenir essa pessoa antes da audição organizada com vista à adoção dessa decisão de que tenciona adotar uma decisão de regresso, nem a comunicar‑lhe os elementos com base nos quais pretende fundamentar a mesma, nem a conceder‑lhe um prazo de reflexão antes de recolher as suas observações.

Embora, antes da adoção por parte da autoridade administrativa nacional competente de uma decisão de regresso, o nacional de um país terceiro possa recorrer um consultor jurídico quando da sua audição por parte das autoridades nacionais competentes, desde que o exercício desse direito não afete o bom desenrolar do procedimento e não comprometa a aplicação eficaz da Diretiva 2008/115, o direito da União não obriga os Estados‑Membros a assegurar essa assistência no âmbito da assistência judiciária gratuita.

2)      Não há que modular ou limitar de outra forma o conteúdo do direito de ser ouvido tendo em conta o objetivo de interesse geral da política de regresso constante da Diretiva 2008/115.»


1 —      Língua original: francês.


2 —      JO L 348, p. 98.


3 —      Acórdão Musique Diffusion française e o./Comissão (100/80 a 103/80, EU:C:1983:158, n.os 14 a 23)


4 —      Acórdão Hoechst/Comissão (46/87 e 227/88, EU:C:1989:337, n.os 52 a 56).


5 —      Acórdão Dokter e o. (C‑28/05, EU:C:2006:408, n.os 73 a 79).


6 —      Acórdão Hoechst/Comissão (EU:C:1989:337, n.os 14 a 16) relativo ao direito beneficiar da assistência de um advogado que possa intervir na fase de instrução prévia à notificação da acusação no domínio do direito da concorrência.


7 —      Acórdão Cicala (C‑482/10, EU:C:2011:868, n.° 28).


8 —      Acórdão M. (C‑277/11, EU:C:2012:744, n.os 82 a 86).


9 —      Acórdão Achughbabian (C‑329/11, EU:C:2011:807, n.° 28).


10 —      Acórdão Cicala (EU:C:2011:868, n.° 28).


11 —      Acórdãos Comissão/Lisrestal e o. (C‑32/95 P, EU:C:1996:402, n.° 30) e Sopropé (C‑349/07, EU:C:2008:746, n.° 26).


12 —      Acórdão El Dridi (C‑61/11 PPU, EU:C:2011:268, n.os 35 e 36).


13 —      N.° 84.


14 —      Acórdão Åkerberg Fransson (C‑617/10, EU:C:2013:105, n.° 21).


15 —      Considerando 4 da Diretiva 2008/115.


16 —      Considerando 6 da Diretiva 2008/115.


17 —      Conclusões do advogado‑geral Y. Bot, no processo M. (C‑277/11, EU:C:2012:253, n.° 41).


18 —      Acórdãos Åkerberg Fransson (EU:C:2013:105, n.° 18) e Pfleger e o. (C‑390/12, EU:C:2014:281, n.° 32).


19 —      O alcance atual do artigo 41.° da Carta foi debatido no praesidium da convenção que elaborou a Carta. Foram propostas, sem que tenha sido aceites, alterações com vista, por um lado, a alargar e, por outro, a clarificar o seu âmbito de aplicação. V. projeto de Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia — Síntese das alterações apresentadas pelo praesidium (Carta 4284/00 CONVENT 37).


20 —      V. n.° 26 das presentes conclusões.


21 —      V. acórdão N. (C‑604/12, EU:C:2014:302, n.os 49 e 50).


22 —      V. observações do Governo francês no n.° 33 das presentes conclusões.


23 —      Idem.


24 —      Acórdão Sopropé (EU:C:2008:746, n.° 36).


25 —      V. artigos 3.°, n.os 4 e 6, n.° 1, da Diretiva 2008/115.


26 —      Não podemos deixar de ficar surpreendidos pela inexistência deste procedimento específico na Diretiva 2008/115, tendo em conta o impacto importante que uma decisão de regresso pode ter na vida de um ser humano, ao mesmo tempo que tal processo foi instituído para assegurar o respeito pelo direito de ser ouvido em matéria de direito alfandegário e da concorrência! V., em relação aos direitos alfandegários, o artigo 22.°, n.° 6, do Regulamento (UE) n.° 952/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de outubro de 2013, que estabelece o Código Aduaneiro da União (reformulação) (JO L 269 p. 1, e retificações JO 2013, L 287, p. 90) e as nossas conclusões no processo Kamino International Logistics e Datema Hellman Worldwide Logistics (C‑129/13 e C‑130/13, EU:C:2014:94, n.os 51 a 57). A respeito do direito da concorrência, o artigo 27.°, n.° 1, do Regulamento (CE) n.° 1/2003 do Conselho de 16 de dezembro de 2002 relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigos [81.° CE] e [82.° CE] (JO 2003, L 1, p. 1) que dispõe «[a]ntes de tomar as decisões previstas nos artigos 7.°, 8.° e 23.° e no n.° 2 do artigo 24.°, a Comissão dá às empresas ou associações de empresas sujeitas ao processo instruído pela Comissão oportunidade de se pronunciarem sobre as acusações por ela formuladas. A Comissão deve basear as suas decisões apenas em acusações sobre as quais as partes tenham tido oportunidade de apresentar as suas observações. Os autores das denúncias são estreitamente associados ao processo». Sublinhado nosso.


27 —      O artigo 12.°, n.° 1, primeiro parágrafo, da Diretiva 2008/115 prevê que «[a]s decisões de regresso […] são emitidas por escrito e contêm as razões de facto e de direito que as fundamentam, bem como informações acerca das vias jurídicas de recurso disponíveis».


28 —      V. acórdão M. (EU:C:2012:744, n.° 86).


29 —      V. acórdão G. e R. (C‑383/13 PPU, EU:C:2013:533, n.° 35). A obrigação dos Estados‑Membros respeitarem o princípio da efetividade é reafirmado pelo artigo 19.°, n.° 1, segundo parágrafo, TFUE segundo o qual estes «estabelecem as vias de recurso necessárias para assegurar uma tutela jurisdicional efetiva nos domínios abrangidos pelo direito da União».


30 —      Acórdão M. (EU:C:2012:744, n.° 88 e jurisprudência referida).


31 —      V. neste sentido, acórdãos Comissão/Kadi e o. (C‑584/10 P, C‑593/10 P e C‑595/10 P, EU:C:2013:518, n.° 101) e Schwarz (C‑291/12, EU:C:2013:670, n.° 34).


32 —      V. acórdão Dokter e o. (EU:C:2006:408, n.°75). V., igualmente, acórdão G. e R. (EU:C:2013:533, n.° 36), em que o Tribunal de Justiça declarou que se for lícito aos Estados‑Membros permitir o exercício dos direitos de defesa dos nacionais de países terceiros em situação irregular segundo as mesmas modalidades que as utilizadas para reagir às situações internas, estas modalidades devem ser conformes ao direito da União e, nomeadamente, não por em causa o efeito útil da Diretiva 2008/115.


33 —      V. neste sentido, conclusões do advogado‑geral Y. Bot no processo M. (EU:C:2012:253, n.os 35 e 36).


34 —      V. n.° 58 das presentes conclusões.


35 —      V. artigos 12.°, n.° 1, da Diretiva 2008/115 e 41.° n.° 2, alínea c), da Carta.


36 —      V., por analogia, acórdão Solvay/Comissão (C‑455/11 P, EU:C:2013:796, n.° 89 e jurisprudência referida).


37 —      Considerando 4 da Diretiva 2008/115. (Sublinhado nosso).


38 —      V., neste sentido, acórdãos El Dridi (EU:C:2011:268, n.° 35) e Achughbabian (EU:C:2011:807, n.° 31). Com efeito, a Diretiva 2008/115 apenas se aplica ao regresso de nacionais de países terceiros que se encontrem em situação irregular, não tendo, portanto, por objeto harmonizar completamente as regras dos Estados‑Membros relativas à permanência de estrangeiros. Acórdãos Achughbabian (EU:C:2011:807, n.° 28) e Sagor (C‑430/11, EU:C:2012:777, n.° 31).


39 —      V. n.° 52 das presentes conclusões.


40 —      V., por analogia, acórdão M. (EU:C:2012:744, n.os 60 e 61).


41 —      V. n.° 71 das presentes conclusões.


42 —      E, se for o caso, as decisões ligadas ao regresso referidas no artigo 12.°, n.° 1, da Diretiva 2008/115, ou seja, as decisões de proibição de entrada e as decisões de afastamento.


43 —      Importa sublinhar que K. Boudjlida não era alvo de um processo penal no processo principal e não se encontrava sob custódia policial nem privado da sua liberdade quando da sua audição pela polícia. Importa notar que, em conformidade com o artigo 3.°, n.° 2, alínea a), da Diretiva 2013/48/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de outubro de 2013, relativa ao direito de acesso a um advogado em processo penal e nos processos de execução de mandados de detenção europeus, e ao direito de informar um terceiro aquando da privação de liberdade e de comunicar, numa situação de privação de liberdade, com terceiros e com as autoridades consulares (JO L 294, p. 1), «os suspeitos e acusados devem ter acesso a um advogado» «antes de serem interrogados pela polícia». Em conformidade com o artigo 15.°, n.°1, da Diretiva 2013/48/UE, os Estados‑Membros devem pôr em vigor as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento à referida diretiva até 27 de novembro de 2016.


44 —      V. artigo 13.°, n.° 4, da Diretiva 2008/115. Em conformidade com o artigo 4.°, n.° 3, da Diretiva 2008/115, os Estados‑Membros podem aprovar ou manter disposições mais favoráveis relativamente às pessoas abrangidas pelo seu âmbito de aplicação, desde que essas disposições sejam compatíveis com o disposto na Diretiva 2008/115.


45 —      V. n.° 64 das presentes conclusões.


46 —      V. n.° 61 das presentes conclusões.