Language of document : ECLI:EU:C:2009:691

TOMADA DE POSIÇÃO DO ADVOGADO‑GERAL

JÁN MAZÁK

apresentada em 10 de Novembro de 2009 1(1)

Processo C‑357/09 PPU

Kadzoev

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Administrativen sad Sofia‑grad (Bulgária)]

«Processo prejudicial com tramitação urgente – Vistos, asilo, imigração e outras políticas relativas à livre circulação de pessoas – Título IV do Tratado CE – Directiva 2008/115/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de Dezembro de 2008, relativa a normas e procedimentos comuns nos Estados‑Membros para o regresso de nacionais de países terceiros em situação irregular – Prazo de transposição – Efeitos – Interpretação do artigo 15.°, n.os 4 a 6, da directiva – Duração da detenção – Tomada em consideração do período durante o qual a execução da decisão de afastamento esteve suspensa – Inexistência de perspectiva razoável de afastamento e esgotamento da possibilidade de prolongar o período de duração da detenção»





I –    Introdução

1.        Com o presente pedido prejudicial, que, a solicitação do órgão jurisdicional de reenvio, o Tribunal decidiu submeter a tramitação urgente prevista no artigo 23.°‑A do Estatuto do Tribunal de Justiça, o Administrativen sad Sofia‑grad (Tribunal Administrativo Supremo de Sófia, Bulgária) submeteu, ao abrigo das disposições conjugadas do artigo 68.°, n.° 1, CE e do artigo 234.° CE, quatro questões relativas à interpretação do artigo 15.°, n.os 4 a 6, da Directiva 2008/115/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de Dezembro de 2008, relativa a normas e procedimentos comuns nos Estados‑Membros para o regresso de nacionais de países terceiros em situação irregular (a seguir «directiva ‘regresso’») (2).

2.        Com essas questões e respectivas alíneas, o órgão jurisdicional de reenvio interroga o Tribunal de Justiça, essencialmente, sobre a aplicabilidade, ao caso em apreço, das disposições do artigo 15.° da directiva «regresso», relativas à duração máxima da detenção para efeitos de afastamento, bem como sobre o modo de cálculo dos prazos previstos para esse efeito, tendo em conta as circunstâncias do processo principal. Interroga também o Tribunal relativamente à questão de saber em que condições se pode considerar que o afastamento não é razoavelmente possível e se, ou em que circunstâncias, a detenção pode ser mantida quando não há uma perspectiva razoável de afastamento e depois de se terem esgotado as possibilidades de prolongamento do período de duração da detenção.

3.        Estas questões foram suscitadas no quadro de um processo no qual o órgão jurisdicional de reenvio foi chamado a pronunciar‑se oficiosamente, em última instância, sobre a legalidade e, portanto, sobre a manutenção da detenção de Said Shamilovich Kadzoev no centro especial de instalação temporária de estrangeiros próximo da cidade de Sófia.

4.        Importa sublinhar que a introdução das regras sobre a duração máxima de detenção foi um dos aspectos mais discutidos na altura da adopção da directiva «regresso», devido às diferenças consideráveis existentes nesta matéria – e que, em certa medida, ainda hoje subsistem – entre as legislações e práticas dos Estados‑Membros.

5.        Por conseguinte, sendo a primeira vez em que o Tribunal de Justiça é solicitado a clarificar certos aspectos relativos à aplicação do artigo 15.° desta directiva, o presente processo prejudicial assume uma importância que ultrapassa a do caso em apreço. Essa importância inscreve‑se no processo sensível e contínuo tendente a conciliar o direito inegável do Estado, reconhecido pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, de controlar a entrada e a permanência dos estrangeiros no seu território (3) e o seu interesse legítimo em prevenir eficazmente abusos de direito em matéria de imigração e de asilo, por um lado, com, por outro, as exigências de um Estado de direito e o grau de protecção concedido aos migrantes ao abrigo do direito internacional, do direito comunitário e, em particular, dos direitos humanos e liberdades fundamentais.

II – Quadro jurídico

A –    Directiva «regresso»

6.        O artigo 15.° da directiva «regresso», integrado no capítulo relativo à detenção para efeitos de afastamento, dispõe o seguinte:

«1.      A menos que no caso concreto possam ser aplicadas com eficácia outras medidas suficientes mas menos coercivas, os Estados‑Membros só podem manter detidos nacionais de países terceiros objecto de procedimento de regresso, a fim de preparar o regresso e/ou efectuar o processo de afastamento, nomeadamente quando:

a)      Houver risco de fuga; ou

b)      O nacional de país terceiro em causa evitar ou entravar a preparação do regresso ou o procedimento de afastamento.

A detenção tem a menor duração que for possível, sendo apenas mantida enquanto o procedimento de afastamento estiver pendente e for executado com a devida diligência.

[…]

3.      Em todo o caso, a detenção é objecto de reapreciação a intervalos razoáveis, quer a pedido do nacional de país terceiro em causa, quer oficiosamente. No caso de períodos de detenção prolongados, as reapreciações são objecto de fiscalização pelas autoridades judiciais.

4.      Quando, por razões de natureza jurídica ou outra ou por terem deixado de se verificar as condições enunciadas no n.° 1, se afigure já não existir uma perspectiva razoável de afastamento, a detenção deixa de se justificar e a pessoa em causa é libertada imediatamente.

5.      A detenção mantém‑se enquanto se verificarem as condições enunciadas no n.° 1 e na medida do necessário para garantir a execução da operação de afastamento. Cada Estado‑Membro fixa um prazo limitado de detenção, que não pode exceder os seis meses.

6.      Os Estados‑Membros não podem prorrogar o prazo a que se refere o n.° 5, excepto por um prazo limitado que não exceda os doze meses seguintes, de acordo com a lei nacional, nos casos em que, independentemente de todos os esforços razoáveis que tenham envidado, se preveja que a operação de afastamento dure mais tempo, por força de:

a)      Falta de cooperação do nacional de país terceiro em causa, ou

b)      Atrasos na obtenção da documentação necessária junto de países terceiros».

7.        Nos termos do artigo 20.° da directiva «regresso», os Estados‑Membros devem pôr em vigor as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para lhe dar cumprimento até 24 de Dezembro de 2010.

B –    Direito nacional pertinente

8.        Em 15 de Maio de 2009, a Bulgária transpôs para o seu direito interno o artigo 15.°, n.os 5 e 6, da directiva «regresso», mediante uma alteração (4) da Lei sobre os estrangeiros na República da Bulgária (a seguir «Lei sobre os estrangeiros»). Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, o n.° 4 do artigo 15.° da directiva «regresso» ainda não foi, porém, transposto para o direito búlgaro.

9.        Nos termos do artigo 44.°, n.° 6, da Lei sobre os estrangeiros, quando uma medida administrativa de coacção não possa ser aplicada a um estrangeiro porque a sua identidade não está determinada, ou porque há um risco evidente de que o estrangeiro se possa esconder, o órgão que tomou a medida pode ordenar a colocação desse estrangeiro num centro de instalação temporária de estrangeiros, a fim de organizar a sua condução à fronteira da República da Bulgária ou a sua expulsão.

10.      Antes da transposição da directiva «regresso» pelas alterações à Lei sobre os estrangeiros adoptadas em 15 de Maio de 2009, a duração da colocação num centro de instalação não tinha nenhum limite.

11.      Actualmente, nos termos do artigo 44.°, n.° 8, da Lei sobre os estrangeiros, «[a] colocação nos centros de instalação temporária dura enquanto as circunstâncias referidas no n.° 6 existirem, mas não pode ir além dos seis meses. Excepcionalmente, quando a pessoa recuse cooperar com as autoridades competentes, quando haja um atraso na obtenção dos documentos indispensáveis à condução à fronteira ou à expulsão ou quando a pessoa constitua uma ameaça para a segurança nacional ou a ordem pública, o período da colocação pode ser alargado até doze meses».

12.      O artigo 46.°a, n.os 3 a 5, da Lei sobre os estrangeiros dispõe:

«3)      Todos os seis meses, o chefe do centro de instalação temporária de estrangeiros apresenta uma lista dos estrangeiros que aí permaneceram mais de seis meses em virtude de obstáculos colocados ao seu afastamento do território. A lista é enviada ao tribunal administrativo do lugar do centro de detenção.

4)      No final de cada período de seis meses de colocação num centro de instalação temporária, o tribunal decide oficiosamente, à porta fechada, sobre o prolongamento, a substituição ou o fim da detenção. A decisão do tribunal não é susceptível de recurso.

5)      Sempre que o tribunal anule a ordem de colocação impugnada ou ordene a libertação do estrangeiro, este último é imediatamente libertado do centro de instalação temporária.»

III – Contexto factual do processo e questões prejudiciais

13.      Na parte pertinente para os efeitos do presente processo, os principais factos do litígio podem ser resumidos da seguinte forma:

14.      Em 21 de Outubro de 2006, S. Kadzoev foi detido pelas forças da ordem búlgaras, próximo da fronteira com a Turquia. Nesse momento, não possuía documentos de identificação e apresentou‑se sob o nome de Said Shamilovich Hubcharov, nascido em 11 de Fevereiro de 1979, em Grozni, República da Chechénia. Declarou, então, que não pretendia que o consulado da Rússia fosse informado da sua detenção. Posteriormente, admitiu ter usado uma identidade falsa, declarando que o seu verdadeiro apelido era Kadzoev e apresentou uma certidão de nascimento segundo a qual nasceu em 11 de Fevereiro de 1979, em Moscovo, na ex‑União Soviética, de pai de nacionalidade chechena, Shamil Kadzoev, e mãe georgiana, Loli Elihvari.

15.      Em 22 de Outubro de 2006, foi emitido contra si um despacho de «instalação coerciva», n.° 3469. Com base nesse despacho, S. Kadzoev foi colocado no centro de instalação temporária de Liubimets, na região de Elhovo, onde permaneceu em situação de detenção até 3 de Novembro de 2006. Por despachos da mesma data, foram também ordenadas contra ele medidas administrativas de «condução coerciva à fronteira» e de «proibição de entrada no território».

16.      Com base no despacho de instalação coerciva n.° 3583, de 1 de Novembro de 2006, S. Kadzoev foi colocado no centro especial de instalação temporária de estrangeiros de Busmantsi, próximo de Sófia enquanto aguardava a execução da medida administrativa de condução coerciva à fronteira. Esta colocação foi ordenada até estarem eliminados os obstáculos à execução da medida de condução coerciva à fronteira, ou seja, até à obtenção de documentos que lhe permitissem viajar para o estrangeiro e a garantia de meios financeiros suficientes para a aquisição de um título de transporte com destino à Chechénia.

17.      S. Kadzoev interpôs recursos judiciais dos despachos de condução à fronteira, de proibição de entrar no território da República da Bulgária e de instalação coerciva num centro de instalação de estrangeiros; todos estes recursos foram julgados improcedentes. Consequentemente, todas as medidas decretadas tornaram‑se executórias, incluindo a medida de colocação no centro de instalação temporária.

18.      Todavia, apesar dos esforços desenvolvidos pelas autoridades búlgaras, por certas organizações não governamentais e pelo próprio S. Kadzoev no sentido de se encontrar um país terceiro que o pudesse acolher em segurança, não foi obtido qualquer acordo específico e, até agora, o interessado ainda não recebeu documentos de viagem.

19.      Saliente‑se que, em 31 de Maio de 2007, durante a sua permanência no centro especial de instalação temporária de estrangeiros, S. Kadzoev apresentou um pedido de obtenção do estatuto de refugiado. Este pedido foi indeferido por decisão do Administrativen sad Sofia‑grad de 9 de Outubro de 2007. Em 21 de Março de 2008, o interessado apresentou um segundo pedido de asilo, que no entanto retirou em 2 de Abril do mesmo ano. Em 24 de Março de 2009, S. Kadzoev apresentou um terceiro pedido de asilo com vista ao reconhecimento do estatuto de refugiado. Por decisão de 10 de Julho de 2009, o Administrativen sad Sofia‑grad indeferiu tal pedido. Esta decisão não é recorrível.

20.      Do pedido prejudicial decorre também que S. Kadzoev solicitou por duas vezes a substituição da medida de instalação coerciva pela obrigação de apresentação regular para assinatura de um registo da polícia do local da sua residência, pedidos esses que foram indeferidos pelas autoridades competentes, por não terem podido verificar o endereço indicado.

21.      Saliente‑se que S. Kadzoev continua detido no centro especial de instalação temporária de estrangeiros, em Busmantsi.

22.      O processo principal foi desencadeado no Administrativen sad Sofia‑grad com a apresentação de um acto administrativo do director da Direcção da Migração do Ministério da Administração Interna, pedindo ao órgão jurisdicional de reenvio que se pronunciasse oficiosamente, com fundamento no artigo 46.°a, n.° 3, da Lei sobre os estrangeiros, relativamente à manutenção da detenção de S. Kadzoev no centro especial de instalação temporária de estrangeiros de Busmantsi.

23.      Foi neste contexto que o órgão jurisdicional de reenvio decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões, com o pedido de tramitação urgente:

«1)      O artigo 15.°, n.os 5 e 6, da Directiva 2008/115[…] deve ser interpretado no sentido de que:

a)      quando, até à transposição das exigências da referida directiva, o direito nacional de um Estado‑Membro não prescrevia a duração máxima da detenção nem os fundamentos [de prorrogação] da detenção e quando, ao proceder‑se à [sua] transposição […], não foi atribuído efeito retroactivo às novas disposições, as referidas [exigências] da [mesma] directiva só se aplicam a partir da data da sua transposição para o direito nacional do Estado‑Membro e só abrangem o período subsequente a essa data?

b)      os períodos d[e] detenção em centro especial para efeitos do afastamento, [na acepção da referida] directiva, não abrangem o período durante o qual a execução de uma decisão de afastamento [do território] do Estado‑Membro esteve [suspensa] por força de uma disposição expressa, dado ter sido aberto, a pedido de um nacional de um Estado terceiro, um procedimento de concessão do direito de asilo ainda que durante esse procedimento o estrangeiro tenha permanecido nesse mesmo centro especial de detenção, se a legislação nacional do Estado‑Membro o permiti[r]?

2)      O artigo 15.°, n.os 5 e 6, da Directiva 2008/115[…] deve ser interpretado no sentido de que os períodos de detenção em centro especial para efeitos do afastamento, [na acepção da referida] directiva, não abrangem o período durante o qual a execução de uma decisão de afastamento [do território] d[o] Estado‑Membro esteve [suspensa] por força de uma disposição expressa pelo facto de estar pendente um recurso judicial contra essa decisão, ainda que, na pendência desse [recurso], […] o estrangeiro tenha permanecido nesse mesmo centro especial de detenção, quando esse estrangeiro não possui documentos de identidade válidos, havendo, pois, dúvidas sobre a sua identidade, não possui meios de subsistência e tem um comportamento agressivo?

3)      O artigo 15.°, n.° 4, da Directiva 2008/115[…] deve ser interpretado no sentido de que não há uma perspectiva razoável de afastamento quando:

a)      à data da fiscalização da detenção pelo tribunal, o Estado de que o interessado é nacional […] recusou […] emitir‑lhe um documento de viagem para o seu regresso e, nessa data, não há um acordo com um país terceiro para que o interessado aí seja acolhido, apesar de os órgãos administrativos do Estado[‑Membro] continuarem a envidar esforços nesse sentido?

b)      à data da fiscalização da detenção pelo tribunal, existia um acordo de readmissão concluído entre a União Europeia e o Estado de que o interessado é nacional, mas, em razão da existência de provas novas – a saber, uma certidão de nascimento do interessado –, o Estado‑Membro não se referiu às disposições do referido acordo pelo facto de o interessado não desejar o seu regresso?

c)      as possibilidades de [prorrogação] dos períodos de detenção previstas no artigo 15.°, n.° 6, da Directiva [2008/115] estão esgotadas e, à data da fiscalização pelo tribunal, à luz do artigo 15.°, n.° 6, alínea b), da directiva, da detenção do interessado, não foi concluído, com nenhum país terceiro, um acordo para a sua readmissão?

4)      O artigo 15.°, [n.os 4 e 6], da Directiva 2008/115[…] deve ser interpretado no sentido de que, se se verificar, quando da fiscalização da detenção de um nacional de país terceiro, para efeitos do seu afastamento, que não existe uma perspectiva razoável de afastamento e que estão esgotados os fundamentos [de prorrogação] da sua detenção:

a)      não pode ser ordenada a sua libertação imediata, quando se verifiquem cumulativamente as condições seguintes: o interessado não dispõe de documentos válidos de identidade, qualquer que seja a duração da validade, pelo que existem dúvidas quanto à sua identidade, tem um comportamento agressivo, não dispõe de nenhum meio de subsistência e não há nenhum terceiro que se comprometa a assegurar a sua subsistência?

b)      para decidir da sua libertação, é necessário verificar se o nacional de país terceiro dispõe, em conformidade com as disposições do direito nacional do Estado‑Membro, dos meios necessários para a sua [permanência] no território do Estado‑Membro e um endereço no qual possa residir?»

IV – Tomada de posição

24.      A título preliminar, uma vez que, nas suas observações, S. Kadzoev contestou a veracidade de várias circunstâncias de facto descritas na decisão de reenvio, designadamente no que se refere ao seu alegado comportamento agressivo durante a detenção, chamando a atenção para irregularidades que afectam, de um modo geral, o direito de imigração e de asilo vigente na Bulgária e, em particular, as condições da sua colocação, recorde‑se que, de acordo com a repartição de funções entre o Tribunal de Justiça e os órgãos jurisdicionais nacionais nos pedidos de decisão a título prejudicial a que se refere o artigo 234.° CE, incumbe exclusivamente ao órgão jurisdicional nacional definir o quadro regulamentar e factual no qual se insere uma questão prejudicial e determinar, à luz dos factos e das disposições nacionais pertinentes, o objecto do processo prejudicial e, por último, aplicar as normas de direito comunitário, no presente caso, conforme interpretadas pelo Tribunal de Justiça (5).

25.      Por conseguinte, não compete ao Tribunal de Justiça apreciar os factos da causa ou pronunciar‑se sobre a legalidade da detenção de S. Kadzoev e os processos com ela relacionados, que são, de resto, igualmente objecto de um recurso interposto no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (6). Em contrapartida, o Tribunal de Justiça só deve pronunciar‑se, de forma que seja útil em relação ao litígio no processo principal, sobre as questões que lhe forem submetidas, relativas à interpretação do direito comunitário.

26.      Nestes termos, passo seguidamente a analisar as questões prejudiciais, respeitando, em princípio, a ordem em que foram formuladas. Não obstante, parece conveniente analisar conjuntamente a alínea b) da primeira questão e a segunda questão, pois ambas dizem respeito a situações de suspensão da execução de uma decisão de afastamento.

27.      Importa, porém, abordar preliminarmente a questão da admissibilidade das questões prejudiciais, tendo em conta especialmente o facto de se referirem a uma directiva cujo prazo de transposição ainda não expirou.

A –    Quanto à admissibilidade

28.      Recorde‑se desde já que, segundo uma jurisprudência constante, compete aos órgãos jurisdicionais nacionais a quem são submetidos os litígios apreciar tanto a necessidade de uma decisão prejudicial para estarem em condições de proferir a sua decisão como a pertinência das questões que colocam ao Tribunal de Justiça. Consequentemente, as questões colocadas, desde que relativas à interpretação do direito comunitário, gozam de uma presunção de pertinência, pelo que o Tribunal de Justiça não pode, em princípio, recusar‑se a responder (7).

29.      Ainda segundo uma jurisprudência constante, o Tribunal de Justiça só pode recusar‑se a responder a uma questão submetida à sua apreciação por um órgão jurisdicional nacional quando for manifesto que a interpretação do direito comunitário solicitada não tem qualquer relação com a realidade ou com o objecto do litígio no processo principal, quando o problema for hipotético ou ainda quando o Tribunal de Justiça não disponha dos elementos de facto e de direito necessários para dar uma resposta útil às questões que lhe foram submetidas (8).

30.      Ora, em minha opinião, não é isso o que acontece no caso em apreço. Em particular, não é manifesto que as questões submetidas sejam desprovidas de pertinência em relação à decisão que o órgão jurisdicional de reenvio tem de tomar, mesmo que o prazo de transposição da directiva «regresso» não tivesse ainda expirado no momento em que o órgão jurisdicional de reenvio foi chamado a apreciar a legalidade da detenção de S. Kadzoev.

31.      Antes de mais, é pacífico que, nos termos do seu artigo 22.°, esta directiva entrou em vigor no vigésimo dia seguinte ao da sua publicação no Jornal Oficial, que teve lugar em 24 de Dezembro de 2008, ou seja, em 13 de Janeiro de 2009.

32.      A este respeito, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que, embora os Estados‑Membros destinatários de uma directiva não possam ser censurados por não terem transposto essa directiva para o seu direito interno antes de expirar o prazo de transposição, devem abster‑se, durante esse prazo, de adoptar disposições susceptíveis de comprometer seriamente o resultado prescrito por essa directiva (9).

33.      O Tribunal de Justiça também já teve ocasião de precisar que tal obrigação de abstenção se impõe a todas as autoridades dos Estados‑Membros em causa, incluindo os órgãos jurisdicionais nacionais. Por conseguinte, a partir da data em que uma directiva entra em vigor, os tribunais dos Estados‑Membros devem abster‑se, na medida do possível, de interpretar o direito interno de um modo susceptível de comprometer seriamente, após o termo do prazo de transposição, o objectivo prosseguido por essa directiva (10).

34.      A este propósito, no caso em apreço, impõe‑se constatar que, segundo o órgão jurisdicional de reenvio, as disposições legislativas destinadas a alterar a Lei sobre os estrangeiros devem ser consideradas como transposição formal da directiva «regresso» para o direito interno búlgaro.

35.      Com efeito, se o tribunal nacional interpretasse e aplicasse esta lei de transposição em sentido contrário ao da referida directiva e, em particular, às suas disposições relativas ao período de detenção admissível, criando assim precedentes, correr‑se‑ia o risco de, uma vez expirado o prazo de transposição, ver seriamente comprometido o objectivo desta directiva.

36.      Por conseguinte, como o órgão jurisdicional de reenvio submeteu questões prejudiciais com vista a assegurar uma interpretação e uma aplicação da Lei sobre os estrangeiros em conformidade com a directiva «regresso», cumprindo assim a obrigação de abstenção no sentido da jurisprudência Inter‑Environnement Wallonie acima referida, a interpretação que foi solicitada da referida directiva deve ser considerada útil ao órgão jurisdicional de reenvio para lhe permitir pronunciar‑se no processo de que foi chamado a conhecer (11).

37.      É certo que ainda se pode colocar a questão de saber se há que concluir igualmente pela admissibilidade da terceira questão prejudicial, pois esta diz respeito ao n.° 4 do artigo 15.° da directiva «regresso» que, segundo o órgão jurisdicional de reenvio, não foi transposto para o direito nacional.

38.      A meu ver, convém dissipar esta dúvida, respondendo pela afirmativa.

39.      Em primeiro lugar, duvido de que seja possível analisar o referido n.° 4 de modo isolado, independentemente das outras disposições do artigo 15.° que regulam a detenção para efeitos de afastamento.

40.      Com efeito, como dispõe que a detenção deixa de se justificar e que a pessoa em causa é libertada imediatamente quando se afigure já não existir uma perspectiva razoável de afastamento ou por terem deixado de se verificar as condições enunciadas no seu n.° 1, o n.° 4 do artigo 15.° é um mero reflexo da regra já enunciada nos outros números do mesmo artigo – em particular, os n.os 1 e 5 – por força da qual todas as detenções devem ter a menor duração que for possível, só podendo ser mantidas enquanto se verificarem as condições da detenção, regra esta que, de resto, é expressão do princípio da proporcionalidade especificamente invocado no décimo sexto considerando da directiva «regresso» (12).

41.      Admitindo que as outras disposições do artigo 15.° da directiva «regresso» foram efectivamente transpostas para o direito búlgaro, parece difícil sustentar que o n.° 4 do mesmo artigo não foi transposto. Na realidade, o próprio órgão jurisdicional de reenvio indicou que deduziria o âmbito normativo desta disposição do artigo 44.°, n.° 8, da Lei sobre os estrangeiros.

42.      Em todo o caso e em segundo lugar, é preciso não esquecer que as obrigações que incumbem aos Estados‑Membros durante o prazo de transposição de uma directiva por força da jurisprudência Inter‑Environnement Wallonie acima referida, incluindo a obrigação imposta a qualquer órgão jurisdicional nacional de ter em conta essa directiva na interpretação do direito interno, decorrem da obrigação de garantir que o resultado imposto pela directiva seja atingido mesmo depois de expirar o prazo de transposição (13).

43.      Por conseguinte, ainda que se admita que a lei que transpõe a directiva «regresso» para o direito interno búlgaro tem efectivamente uma lacuna no que se refere à transposição do n.° 4 do artigo 15.° da referida directiva, saber se essa não transposição e uma consequente decisão do tribunal nacional contrária à directiva comprometeriam o resultado por esta prescrito depende, em última análise, das circunstâncias do caso em apreço. Se, apesar da lacuna, as disposições em causa forem consideradas pelas autoridades nacionais como transposição definitiva da directiva, pode haver uma presunção da existência desse risco. Ao invés, se o n.° 4 do artigo 15.° da directiva «regresso» ainda não tivesse sido transposto para o direito interno na data em que teve início o processo principal, pelo facto de o legislador búlgaro ter decidido aplicar a directiva faseadamente, prevendo transpor esta disposição específica em data posterior antes de expirar o prazo de transposição, não é de admitir que a não transposição desta disposição ou uma interpretação da lei aplicável contrária à mesma disposição comprometa necessariamente o resultado prescrito pela directiva (14).

44.      É certo que competiria ao órgão jurisdicional nacional pronunciar‑se com carácter definitivo sobre este ponto, mas da decisão de reenvio não decorre, seja como for, que esteja ainda prevista uma transposição específica do n.° 4 do artigo 15.° da directiva «regresso». Acresce que, na audiência, o Governo búlgaro declarou considerar que a referida disposição foi transposta para o direito búlgaro, o que não permite presumir que venham a ser adoptadas medidas específicas de transposição ainda antes de expirar o prazo de transposição.

45.      Daqui resulta que não parece, pelo menos de forma manifesta, que a interpretação desta disposição, solicitada no quadro da terceira questão prejudicial, seja desprovida de pertinência em relação ao processo principal (15).

46.      Nestas circunstâncias, em minha opinião, há que dar resposta a todas as questões submetidas pelo Administrativen sad Sofia‑grad.

47.      Por último, acrescente‑se que na apreciação do presente pedido prejudicial é preciso não confundir as diferentes questões de aplicação no tempo, suscitadas no caso. Assim, a meu ver, há que distinguir claramente entre, por um lado, a questão que acabei de analisar, de saber em que medida o tribunal nacional, para proferir uma decisão no processo principal, pode ser obrigado a ter em conta a directiva «regresso» mesmo antes de terminar o respectivo prazo de transposição, e, por outro, a questão de fundo, que é objecto da primeira questão prejudicial, de saber se o artigo 15.°, n.os 5 e 6, da directiva «regresso» impõe que, no cálculo da duração da detenção, se tenham igualmente em conta períodos de detenção anteriores à entrada em vigor da legislação de transposição da referida directiva. Esta última questão colocar‑se‑á igualmente no quadro dos processos judiciais relativos à legalidade de uma detenção, instaurados posteriormente à data em que expirar o prazo de transposição da directiva «regresso».

B –    Quanto ao mérito

1.      Quanto à primeira questão, alínea a)

48.      Antes de mais, convém traçar um breve esboço das exigências da directiva «regresso» relativamente à duração da detenção para efeitos do afastamento.

49.      No artigo 15.°, n.° 5, da directiva «regresso», o legislador comunitário previu um prazo limitado de detenção para efeitos de afastamento, que não pode exceder seis meses. Nos termos do n.° 6 do artigo 15.° da mesma directiva, os Estados‑Membros podem prorrogar este período por um prazo limitado que não exceda os doze meses seguintes, por força de falta de cooperação do nacional de país terceiro em causa ou de atrasos na obtenção da documentação necessária junto de países terceiros. Daqui resulta que, de acordo com esta directiva, o período máximo de detenção não pode exceder um total de 18 meses.

50.      Note‑se, contudo, que os prazos assim previstos se limitam a definir os limites absolutos e exteriores da duração de detenção. Assim, como decorre, em particular, do teor do artigo 15.°, n.os 1 e 5, da directiva «regresso», qualquer detenção antes do afastamento deve ter a menor duração que for possível, sendo apenas mantida enquanto o procedimento de afastamento estiver pendente e for executado com a devida diligência. Além disso, a detenção deve cessar quando deixarem de estar reunidas as condições de detenção ou quando já não existir uma perspectiva razoável de afastamento.

51.      Como salientei, estas exigências são também expressão do princípio da proporcionalidade que, como refere o décimo sexto considerando da mencionada directiva, é aplicável à detenção e limita a sua duração.

52.      Por último, ao abrigo dos direitos fundamentais, que são parte integrante dos princípios gerais de direito cujo respeito é assegurado pelo Tribunal de Justiça (16), nomeadamente do direito à liberdade garantido pelo artigo 5.° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, a duração da detenção para efeitos de expulsão não pode exceder o prazo razoável para atingir o objectivo prosseguido. Mais especificamente, como S. Kadzoev salientou, com razão, neste contexto, a instalação coerciva de que foi objecto na pendência do seu afastamento – que, correctamente, deve ser qualificada de «detenção» na acepção da directiva «regresso» – constitui uma privação da liberdade na acepção do referido artigo, à qual se aplica, portanto, o requisito de uma justificação baseada no artigo 5.°, n.° 1, alínea f), da mencionada Convenção, relativo à detenção de uma pessoa contra a qual está pendente um processo de expulsão ou de extradição. Nesta matéria, mesmo que esta Convenção não subordine a qualquer limite absoluto o prazo de detenção para efeitos de expulsão/afastamento, é jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem que as autoridades nacionais devem agir com a diligência necessária para garantir que o período dessa detenção tenha a menor duração possível. Se o processo não decorrer com a devida diligência, a detenção deixa de ser justificada à luz do artigo 5.°, n.° 1, alínea f), da referida Convenção (17).

53.      Daqui resulta que, por força das exigências do artigo 15.° da directiva «regresso», a detenção de uma pessoa para efeitos do seu afastamento deve cessar logo que possível e torna‑se ilegal quando deixam de estar reunidas as condições «materiais» da detenção definidas por este artigo – designadamente, quando o procedimento de afastamento estiver pendente e for executado com a devida diligência e existir uma perspectiva razoável de afastamento – ou, em todo o caso, depois de esgotado o período máximo de detenção calculado segundo o disposto nos n.os 5 e 6 do artigo 15.° desta directiva.

54.      Dito isto, o órgão jurisdicional de reenvio é chamado a decidir, no processo principal, sobre a legalidade e sobre a manutenção da detenção de S. Kadzoev, para efeitos de afastamento, com base, entre outros, no artigo 44.°, n.° 8, da Lei sobre os estrangeiros, com as alterações que lhe foram introduzidas, garantindo a transposição do artigo 15.°, n.os 5 e 6, da directiva «regresso», para o direito interno búlgaro, com efeito a partir de 18 de Maio de 2009.

55.      Uma vez que a lei de transposição não contém disposições transitórias relativas às condições de aplicação no tempo e que, por conseguinte, não está previsto que esta lei tenha efeito retroactivo, com a sua primeira questão, alínea a), o órgão jurisdicional de reenvio procura essencialmente saber se, para decidir sobre o período legal de detenção, tem de ter em conta os factos jurídicos, como os períodos de detenção anteriores à entrada em vigor da transposição do artigo 15.°, n.os 5 e 6, da directiva «regresso», ou se, pelo contrário, tem de apreciar a duração legal de detenção unicamente com referência aos factos e períodos de detenção posteriores a essa data.

56.      Nesta matéria, importa antes de mais recordar os princípios que o Tribunal de Justiça consagrou no que respeita aos efeitos das normas jurídicas no tempo.

57.      Embora o princípio da segurança jurídica se oponha, em geral, a que uma norma seja aplicada retroactivamente (18), segundo uma jurisprudência assente, este princípio não pode ser alargado a ponto de impedir, de uma forma genérica, a aplicação da nova regulamentação aos efeitos futuros de situações nascidas na vigência da regulamentação anterior (19).

58.      Assim, o Tribunal de Justiça consagrou, em jurisprudência constante, o princípio de que uma norma nova é imediatamente aplicável aos efeitos futuros de uma situação nascida na vigência da norma anterior (20).

59.      Em contrapartida, se se tratar de situações ou de direitos adquiridos antes da entrada em vigor de regras de direito material, estas devem ser interpretadas, tendo em vista garantir o respeito dos princípios da segurança jurídica e da confiança legítima, como apenas se referindo a essas situações adquiridas, desde que resulte claramente dos próprios termos, das suas finalidades ou da sua economia, que um tal efeito lhes deve ser atribuído (21). Em contrapartida, as regras processuais são habitualmente interpretadas no sentido de que se aplicam a todos os litígios pendentes no momento da sua entrada em vigor (22).

60.      Em seguida, importa analisar mais minuciosamente o caso em apreço, à luz destes princípios.

61.      Antes de mais, há que constatar que, apesar de a situação factual na origem do processo principal, a saber, a detenção de S. Kadzoev, ser anterior à entrada em vigor da lei de transposição da directiva «regresso» para o direito interno búlgaro, não pode obviamente ser vista como uma situação consumada ou adquirida antes da entrada em vigor da referida lei, à qual esta última se aplicaria «retroactivamente». Trata‑se, sim, de uma situação em curso, que teve início no passado, mas que subsiste na data em que teve início o processo principal. A aplicação da directiva «regresso» ao caso em apreço, através da lei de transposição, para decidir da legalidade e do possível prolongamento da detenção de S. Kadzoev é abrangida pelo princípio bem conhecido estabelecido pelo Tribunal e acima invocado, segundo o qual uma nova regulamentação se aplica imediatamente às situações em curso (23).

62.      Dito isto, resta saber se é possível examinar a legalidade da detenção quando esta for posterior à entrada em vigor da lei de transposição.

63.      Não se me afigura possível proceder a uma partição da duração da detenção, para efeitos da aplicação das regras relativas à duração de detenção previstas na directiva «regresso».

64.      Recorde‑se, a este propósito, que os prazos máximos de detenção consagrados no artigo 15.°, n.os 5 e 6, da directiva «regresso» fazem parte de um conjunto de regras destinadas a garantir a proporcionalidade da detenção, ou seja, que esta tenha a menor duração possível e, em qualquer caso, nunca exceda os 6 meses ou, eventualmente, os 18 meses previstos (24). Por conseguinte, se, num caso como o presente, se trata, essencialmente, de apreciar se a duração da detenção é razoável e se a sua manutenção ainda se justifica, não vejo como tal seja possível sem relação com a totalidade da duração efectiva da detenção. Na apreciação da duração de detenção, parece demasiadamente arbitrário ignorar certos períodos pelo facto de serem anteriores à entrada em vigor da lei de transposição. Uma tal leitura das exigências da directiva «regresso» teria evidentemente como consequência que, com fundamento na lei de transposição, um tribunal nacional poderia concluir pela proporcionalidade, ou seja, pela justificação da manutenção em detenção para fins de afastamento da pessoa em questão, não obstante o período prolongado de detenção, o que não me parece de modo algum aceitável.

65.      Com efeito, temos de nos perguntar, em segundo lugar, qual é efectivamente o objectivo visado com os prazos máximos de detenção previstos no artigo 15.°, n.os 5 e 6, da directiva «regresso». Por outras palavras, estas disposições visam, no essencial, impor que, a partir da sua transposição para o direito nacional, no caso de uma detenção existente, esta última só possa ser prolongada até uma duração máxima de 18 meses suplementares independentemente do tempo já decorrido em detenção ou, pelo contrário, devem ser entendidas como exprimindo a duração máxima de detenção aceitável no sentido de que «ninguém pode ser objecto de detenção para fins de afastamento que exceda 18 meses», com a consequência de que uma pessoa que, no momento da entrada em vigor da transposição desta regra para o direito nacional, se encontre detida há mais de 3 meses, por exemplo, só possa ter a sua detenção prolongada por mais 15 meses, no máximo, e de que uma pessoa que esteja detida há mais de 18 meses, isto é, para além do período máximo de duração, deve ser imediatamente libertada?

66.      Em minha opinião, é manifestamente esta última interpretação que deve prevalecer, à luz do objectivo das disposições relativas à fixação dos prazos máximos de detenção para efeitos de afastamento, designadamente o facto de garantir o direito fundamental à liberdade da pessoa em causa, já que todas as excepções estão sujeitas a condições estritas.

67.      Atendendo às considerações precedentes, proponho que a resposta à primeira questão, alínea a), seja no sentido de que, para efeitos de apreciação da duração legal de uma detenção e da sua manutenção à luz de uma lei através da qual o artigo 15.°, n.os 5 e 6, da directiva «regresso» foi transposto para o direito nacional, há que ter em conta a duração efectiva dessa detenção, incluindo, por conseguinte, períodos de detenção anteriores à data de entrada em vigor da lei de transposição.

2.      Quanto à primeira questão, alínea b), e quanto à segunda questão

68.      Estas questões dizem respeito à tomada em conta, no cálculo dos prazos de detenção previstos no artigo 15.°, n.os 5 e 6, da directiva «regresso», dos períodos de detenção durante os quais a decisão de afastamento esteve suspensa.

69.      Abordarei, em primeiro lugar, a segunda questão, que diz respeito à suspensão de uma decisão de afastamento pelo facto de estar pendente um recurso judicial contra essa decisão e, em segundo lugar, o caso, um pouco mais específico, de uma suspensão motivada por um processo de concessão de asilo a que se refere a primeira questão, alínea b). Acrescente‑se desde já que, nos dois casos, como resulta da decisão de reenvio, há que partir da hipótese de que o nacional de país terceiro interessado, a saber S. Kadzoev, parece não só ter permanecido no mesmo centro de instalação durante os períodos de suspensão da decisão de afastamento em causa mas também ainda aí continuar, com base num despacho de instalação coerciva (detenção).

70.      Antes de mais, importa reiterar que, como a detenção coerciva é uma privação da liberdade, as circunstâncias em que é permitida impõem uma interpretação estrita, uma vez que se trata de excepção a uma garantia fundamental da liberdade individual (25).

71.      Assinale‑se, seguidamente, que o teor do artigo 15.°, n.os 5 e 6, da directiva «regresso» não contém nenhum elemento que autorize pensar que não há que ter em conta certos períodos de detenção para efeitos de afastamento no cálculo da duração máxima de detenção prevista nas referidas disposições, em razão, nomeadamente, da suspensão da execução da decisão de afastamento.

72.      Com efeito, o artigo 15.°, n.° 5, da directiva «regresso» prevê, em termos inequívocos, que cada Estado‑Membro fixa um prazo limitado de detenção, «que não pode exceder os seis meses». Do n.° 6 do mesmo artigo 15.° desta directiva resulta também claramente que este prazo só pode ser prorrogado a título excepcional e, em qualquer caso, unicamente por um período determinado que não exceda os doze meses seguintes.

73.      Além disso, as circunstâncias em que essa prorrogação do prazo de detenção pode ser prevista estão clara e exaustivamente definidas nessa disposição, que refere os casos em que, independentemente de todos os esforços razoáveis que tenham sido envidados, se prevê que a operação de afastamento dure mais tempo, por força da falta de cooperação do nacional de país terceiro em causa ou de atrasos na obtenção da documentação necessária junto de países terceiros. Ao introduzir estes fundamentos de prorrogação, o legislador comunitário decidiu ter em conta as dificuldades práticas que os Estados‑Membros podem encontrar no afastamento de nacionais de países terceiros que se encontrem em situação irregular.

74.      Ora, a suspensão da decisão de afastamento pelo facto de estar pendente um recurso judicial contra essa decisão não figura entre os motivos de prorrogação e, em todo o caso, o artigo 15.°, n.os 5 e 6, da directiva «regresso» não prevê qualquer prorrogação do prazo de retenção para além dos doze meses seguintes.

75.      Por conseguinte, na falta de disposições expressas nesse sentido, o artigo 15.°, n.os 5 e 6, da directiva «regresso» não pode ser interpretado no sentido de permitir que não sejam tidos em conta períodos de detenção durante os quais a decisão de afastamento esteve suspensa pelo facto de estar pendente um recurso judicial contra essa decisão, para efeitos do cálculo da duração da detenção segundo este artigo, o que levaria a permitir a detenção para efeitos de afastamento para além da duração máxima de 18 meses.

76.      Em meu entender, esta conclusão não é posta em causa pelo acórdão do Tribunal de Justiça, invocado pelo Governo búlgaro, proferido no processo Petrosian (26), relativo à interpretação do Regulamento (CE) n.° 343/2003 (27). Neste processo, o Tribunal decidiu, no essencial, que, quando o direito nacional prevê um recurso susceptível de efeito suspensivo, o prazo de execução da transferência do requerente de asilo previsto pelo artigo 20.°, n.° 1, alínea d), deste regulamento começa a correr, não já a contar da decisão judicial provisória que suspende a execução do procedimento de transferência, mas apenas a contar da decisão judicial que se pronuncia sobre o mérito desse procedimento (28).

77.      Esta decisão, bem como o raciocínio em que assenta, não pode contudo ser transposta directamente para o caso presente, visto que os prazos em causa são de natureza diferente. Enquanto o prazo em questão no processo que deu origem ao acórdão Petrosian, já referido, fixa o tempo de que o Estado‑Membro requerente dispõe para efectuar a transferência de um requerente de asilo para o Estado‑Membro obrigado a reaceitá‑lo, a finalidade dos prazos máximos previstos no artigo 15.°, n.os 5 e 6, da directiva «regresso» é limitar a uma duração razoável o período de privação de liberdade de uma pessoa que, de resto, apenas se encontra em situação irregular. Do mesmo modo, os prazos em causa no presente caso vêm limitar a duração da detenção para efeitos de afastamento e não, ou pelo menos não directamente, a tramitação do procedimento de afastamento em si, incluindo, se houver, os recursos judiciais interpostos contra a decisão de afastamento.

78.      Por último, no que se refere aos elementos aos quais o órgão jurisdicional de reenvio fez referência no quadro da segunda questão, a saber, as dúvidas sobre a identidade do nacional, a sua falta de meios de subsistência ou o seu comportamento agressivo, são circunstâncias obviamente desprovidas de pertinência no que diz respeito à questão de princípio de saber se, no cálculo dos prazos de detenção previstos no artigo 15.°, n.os 5 e 6, da directiva «regresso», deve ser tido em conta um período de detenção durante o qual a execução da decisão de afastamento estava suspensa pelo facto de estar pendente um recurso judicial contra essa decisão (29). Neste contexto, pouco importa também saber se, durante o período em causa, o nacional permaneceu no mesmo centro especial de instalação; a única questão decisiva, para efeitos do cálculo da duração máxima de detenção, é saber se, durante esse período, o nacional foi efectivamente objecto de uma detenção para efeitos de afastamento.

79.      Atendendo ao que precede, deve responder‑se à segunda questão prejudicial no sentido de que, no cálculo da duração de detenção nos termos do disposto no artigo 15.°, n.os 5 e 6, da directiva «regresso», cumpre ter em conta o período de detenção durante o qual a execução de uma decisão de afastamento esteve suspensa, por força de uma disposição nacional expressa, devido ao facto de estar pendente um recurso judicial contra a referida decisão.

80.      Em segundo lugar, relativamente à questão de saber se os prazos de detenção para efeitos de afastamento previstos no artigo 15.°, n.os 5 e 6, da directiva «regresso» deveriam igualmente abranger um período durante o qual a execução de uma decisão de afastamento estava suspensa devido à existência de um pedido de asilo apresentado pelo nacional de país terceiro em questão, há que salientar, antes de mais, que, nos termos do artigo 2.°, n.° 1, da mencionada directiva, esta só é aplicável aos nacionais de países terceiros em situação irregular no território de um Estado‑Membro.

81.      Ora, como refere o nono considerando da directiva «regresso», nos termos da Directiva 2005/85/CE do Conselho, de 1 de Dezembro de 2005, relativa a normas mínimas aplicáveis ao procedimento de concessão e retirada do estatuto de refugiado nos Estados‑Membros (30), um nacional de um país terceiro que tenha requerido asilo num Estado‑Membro não deverá considerar‑se em situação irregular no território desse Estado‑Membro enquanto não entrar em vigor a decisão de indeferimento do pedido ou a decisão que ponha termo ao seu direito de permanência enquanto requerente de asilo.

82.      Daqui resulta que o nacional de um país terceiro que tenha pedido asilo não é abrangido – ou, consoante o caso, deixa de ser abrangido – pelo âmbito de aplicação da directiva «regresso» enquanto é analisado o seu pedido de asilo.

83.      Como o requerente de asilo não pode ser considerado em situação irregular no território do Estado‑Membro e não é abrangido pelo âmbito de aplicação da directiva «regresso», a sua detenção com vista a garantir a execução da medida de afastamento não pode ser justificada com fundamento nesta directiva.

84.      O seu estatuto e os seus direitos na qualidade de requerente de asilo regem‑se pelos regimes de asilo internacionais e comunitários aplicáveis, designadamente pela Convenção de Genebra de 28 de Julho de 1951 relativa ao estatuto dos refugiados, bem como pela Directiva 2005/85 e pela Directiva 2003/9/CE do Conselho, de 27 de Janeiro de 2003, que estabelece normas mínimas em matéria de acolhimento dos requerentes de asilo nos Estados‑Membros (31).

85.      A este respeito, note‑se porém que, apesar de uma pessoa não poder ser mantida em detenção pelo simples facto de ser requerente de asilo (32), a colocação em detenção de um requerente de asilo não é, só por si, excluída por força do direito internacional e comunitário sobre o asilo (33).

86.      Assim, o artigo 7.° da Directiva 2003/9 prevê que a detenção pode ser ordenada quando necessário, por exemplo, por razões de direito ou de ordem pública. De qualquer modo, essa detenção de um requerente de asilo deve, naturalmente, ser fundamentada e justificada à luz das condições previstas pelas disposições pertinentes que regulam o asilo e não pode ter o seu fundamento jurídico no direito que rege o estatuto das pessoas em situação irregular.

87.      Em minha opinião, desta análise resulta, no caso em apreço, um quadro contrastado.

88.      Se a detenção durante o período de apreciação do pedido de asilo de S. Kadzoev se baseasse num despacho de instalação coerciva proferido em aplicação das regras pertinentes que regulam o asilo, essa detenção não poderia ser considerada como detenção para efeitos de afastamento, na acepção da directiva «regresso». A sua duração não poderia, pois, reger‑se pelo artigo 15.° desta directiva nem, por conseguinte, ser tida em conta no cálculo dos prazos de detenção previstos neste artigo (34).

89.      Se, pelo contrário, S. Kadzoev continuasse simplesmente detido depois de ter requerido asilo e sem as autoridades terem tomado uma decisão distinta de colocação em detenção, com base no despacho original de instalação coerciva, estaria efectivamente, durante esse período, em detenção para efeitos de afastamento, mesmo que essa detenção devesse ser considerada irregular à luz das considerações que precedem. Nesse caso, o período abrangido pelo processo de concessão de asilo deveria ser tomado em conta no cálculo dos prazos máximos previstos pelo artigo 15.°, n.os 5 e 6, da directiva «regresso», pelas mesmas razões que no caso da suspensão da execução de uma decisão de afastamento pelo facto de estar pendente um recurso judicial contra esta decisão.

90.      Devo acrescentar que o nacional de um país terceiro não pode ver prorrogada por um período de detenção irregular a duração máxima da sua detenção efectiva para efeitos de afastamento.

91.      Mesmo que, com base nas informações ao dispor do Tribunal de Justiça, pareça que é esta segunda hipótese que se verifica no processo principal, compete ao juiz nacional determinar se a instalação coerciva do nacional de país terceiro em situação irregular, durante o período em que era requerente de asilo, se baseava nas regras pertinentes relativas aos processos de concessão de asilo ou se continuava a ter como fundamento a colocação em detenção com vista a garantir o seu afastamento.

92.      Em face do que antecede, proponho que a resposta à primeira questão prejudicial, alínea b), seja que as disposições do artigo 15.°, n.os 5 e 6, da directiva «regresso», relativamente à duração máxima de detenção para efeitos de afastamento, não se aplicam, em princípio, a períodos de detenção impostos a um requerente de asilo no quadro de um processo de concessão de asilo. Se, ainda assim, um nacional de um país terceiro continuar detido para efeitos de afastamento na acepção da directiva «regresso», depois de ter pedido asilo e durante a apreciação do seu pedido, este período de detenção deve ser tido em conta no cálculo dos prazos de detenção previstos no artigo 15.°, n.os 5 e 6, da directiva «regresso».

3.      Quanto à terceira questão prejudicial

93.      Com a sua terceira questão prejudicial, perante as circunstâncias do caso em apreço, o órgão jurisdicional de reenvio procura obter uma clarificação do conceito de «perspectiva razoável de afastamento», na acepção do n.° 4 do artigo 15.° da directiva «regresso».

94.      Nos termos desta disposição, «[q]uando, por razões de natureza jurídica ou outra[, se afigure] já não existir uma perspectiva razoável de afastamento», a detenção deixa de se justificar e a pessoa em causa é libertada imediatamente.

95.      Esta disposição reflecte o facto de a detenção de um nacional de país terceiro em situação irregular só se justificar com vista ao seu afastamento e em conexão com procedimentos de afastamento em curso, executados com a devida diligência, o que implica a existência de uma possibilidade de afastamento. Ora, como decorre do teor do artigo 15.°, n.° 4, da directiva «regresso», a existência de uma possibilidade abstracta ou teórica de afastamento, sem especificar o seu calendário ou a sua probabilidade, não é suficiente para este efeito. Tem de haver uma perspectiva «razoável», isto é, que pareça realista, de se poder proceder ao afastamento da pessoa detida, num prazo razoável (35).

96.      Dito isto, compete obviamente ao órgão jurisdicional nacional apreciar, à luz de todas as circunstâncias do caso em apreço, se existe ou não essa perspectiva razoável.

97.      Note‑se que, em face das circunstâncias descritas pelo órgão jurisdicional de reenvio no quadro da terceira questão, parece já não existir uma perspectiva razoável de afastamento quando se afigura pouco provável que o país terceiro em causa venha ainda, num futuro razoavelmente próximo, a dar o seu acordo para acolher o interessado ou quando o afastamento com base num determinado acordo de readmissão já não parece possível num prazo razoável, independentemente das razões em causa.

98.      Por último, é evidente que, se estiverem esgotados os prazos máximos de detenção calculados de acordo com o artigo 15.°, n.os 5 e 6, da directiva «regresso», a pessoa em causa deve ser imediatamente libertada, independentemente da existência de uma perspectiva razoável de afastamento (36).

99.      Nestes termos, proponho que se responda à terceira questão prejudicial no sentido de que uma pessoa detida para efeitos do seu afastamento deve ser imediatamente libertada quando deixe de parecer realista que se possa proceder ao seu afastamento num prazo razoável. Parece já não existir uma perspectiva razoável de afastamento quando se afigure pouco provável que o país terceiro em causa venha ainda, num futuro razoavelmente próximo, a dar o seu acordo para acolher o interessado ou quando o afastamento com base num determinado acordo de readmissão já não pareça possível num prazo razoável, independentemente das razões em causa.

4.      Quanto à quarta questão prejudicial

100. Com a sua quarta questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, no essencial, se o artigo 15.°, n.os 4 e 6, da directiva «regresso» permite não libertar imediatamente o interessado, apesar de ter expirado o prazo máximo de detenção previsto por esta directiva, pelo facto de aquele não dispor de documentos válidos de identidade, ter um comportamento agressivo e não possuir meios de subsistência nem existir um terceiro que se comprometa a assegurar a sua subsistência.

101. A este respeito, assinale‑se que o prolongamento da detenção com base nas circunstâncias mencionadas seria directamente contrário às disposições da directiva «regresso» relativas à detenção de um nacional de país terceiro em situação irregular, que prevêem, como decorre das minhas considerações precedentes (37), que a detenção só é permitida como medida de último recurso, subsidiária em relação a qualquer outra medida administrativa menos coerciva, sujeita a uma justificação estrita e apenas para efeitos de afastamento e em conexão com o respectivo procedimento – tudo isto sem exceder a duração máxima de 18 meses (38).

102. Por conseguinte, há que responder à quarta questão no sentido de que a detenção para efeitos de afastamento não pode ser prolongada para além da duração máxima prevista no artigo 15.°, n.os 4 e 6, da directiva «regresso», por razões como a falta de documentos de identidade válidos, a existência de um comportamento agressivo do interessado ou a falta de meios de subsistência ou de outros meios materiais que permitam a permanência no território do Estado‑Membro em causa.

V –    Conclusão

103. À luz das considerações que precedem, proponho que o Tribunal de Justiça declare admissíveis as questões prejudiciais e responda ao Administrativen sad Sofia‑grad que:

«–      para efeitos de apreciação da duração legal de uma detenção e da sua manutenção a fim de, com base numa lei pela qual o artigo 15.°, n.os 5 e 6, da Directiva 2008/115/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de Dezembro de 2008, relativa a normas e procedimentos comuns nos Estados‑Membros para o regresso de nacionais de países terceiros em situação irregular, foi transposto para o direito nacional, decidir sobre a duração máxima e sobre a manutenção de uma detenção deve ter‑se em conta a duração efectiva desta detenção, incluindo, por conseguinte, períodos de detenção anteriores à data de entrada em vigor da lei de transposição;

–      as disposições do artigo 15.°, n.os 5 e 6, da Directiva 2008/115, relativas à duração máxima da detenção para efeitos de afastamento, não são aplicáveis, em princípio, a períodos de detenção impostos a um requerente de asilo no quadro de um processo de concessão de asilo. Se, não obstante, o nacional de um país terceiro continuar detido para efeitos do seu afastamento na acepção da referida directiva, depois de ter requerido o asilo e enquanto o seu pedido estiver a ser analisado, este período de detenção deve ser tido em conta no cálculo dos prazos de detenção previstos pelo artigo 15.°, n.os 5 e 6, desta directiva;

–      no cálculo da duração da detenção, fixada em conformidade com as disposições do artigo 15.°, n.os 5 e 6, da Directiva 2008/115, cumpre ter em conta o período de detenção durante o qual a execução de uma decisão de afastamento esteve suspensa, por força de uma disposição nacional expressa, devido ao facto de estar pendente um recurso judicial contra a referida decisão;

–      uma pessoa detida para efeitos do seu afastamento deve ser imediatamente libertada quando deixe de parecer realista que se possa proceder ao seu afastamento num prazo razoável. Parece já não existir uma perspectiva razoável de afastamento quando se afigure pouco provável que o país terceiro em causa venha ainda, num futuro razoavelmente próximo, a dar o seu acordo para acolher o interessado ou quando o afastamento com base num determinado acordo de readmissão já não pareça possível num prazo razoável, independentemente das razões em causa;

–      a detenção para efeitos de afastamento não pode ser prolongada para além da duração máxima prevista no artigo 15.°, n.os 4 e 6, da Directiva 2008/115, por razões como a falta de documentos de identidade válidos, um comportamento agressivo do interessado ou a falta de meios de subsistência próprios ou de outros meios materiais que permitam a permanência no território do Estado‑Membro em causa.»


1 – Língua original: francês.


2 – JO L 348, p. 98.


3 – V., por exemplo, TEDH, acórdão Amuur c. França de 25 de Junho de 1996, Colectânea dos acórdãos e decisões 1996‑III, § 41.


4 – «Disposições complementares que alteram e completam a Lei sobre os estrangeiros na República da Bulgária» (DV n.° 36 de 2009), cujo n.° 16 dispõe que a referida lei constitui a transposição da directiva «regresso».


5 – V., neste sentido, por exemplo, acórdãos de 18 de Novembro de 1999, Teckal (C‑107/98, Colect., p. I‑8121, n.os 31, 34 e 39); de 7 de Junho de 2007, van der Weerd e o. (C‑222/05 a C‑225/05, Colect., p. I‑4233, n.os 22 e 23); e de 15 de Novembro de 2007, International Mail Spain (C‑162/06, Colect., p. I‑9911, n.° 24).


6 – Said Shamilovich Kadzoev c. Bulgária, queixa apresentada em 20 de Dezembro de 2007.


7 – V., neste sentido, acórdãos de 24 de Junho de 2008, Commune de Mesquer (C‑188/07, Colect., p. I‑4501, n.° 30); de 1 de Abril de 2004, Bellio F.lli Srl (C‑286/02, Colect., p. I‑3465, n.° 27); e de 15 de Junho de 2006, Air Liquide Industries Belgium (C‑393/04 e C‑41/05, Colect., p. I‑5293, n.° 24 e jurisprudência aí referida).


8 – V., neste sentido, acórdãos van de Weerd e o., já referido, n.° 22 e jurisprudência aí referida, e de 13 de Março de 2001, PreussenElektra (C‑379/98, Colect., p. I‑2099, n.° 39).


9 – V. acórdãos de 18 de Dezembro de 1997, Inter‑Environnement Wallonie (C‑129/96, Colect., p. I‑7411, n.° 45); de 8 de Maio de 2003, ATRAL (C‑14/02, Colect., p. I‑4431, n.° 58); e de 22 de Novembro de 2005, Mangold (C‑144/04, Colect., p. I‑9981, n.° 67).


10 – V., em particular, acórdãos de 4 de Julho de 2006, Adeneler e o. (C‑212/04, Colect., p. I‑6057, n.os 122 e 123), e de 23 de Abril de 2009, VTB‑VAB e o. (C‑261/07 e C‑299/07, Colect., p. I‑0000, n.° 39).


11 – V., neste contexto, acórdão VTB‑VAB e o., já referido, n.° 40.


12 – V., também, n.os 50 a 52.


13 – V., neste sentido, n.os 40 e 44 do acórdão Inter‑Environnement Wallonie, já referido. Parte da doutrina defende a tese de que um órgão jurisdicional nacional é sempre obrigado a interpretar disposições nacionais, na medida do possível, em conformidade com uma directiva cujo prazo de transposição, na altura do processo principal, ainda não tenha expirado, desde que se trate de disposições nacionais especialmente adoptadas com vista à transposição dessa directiva. Ora, mesmo admitindo que existem indicações neste sentido na jurisprudência do Tribunal de Justiça (v., por exemplo, acórdãos de 15 de Março de 2001, Mazzoleni, C‑165/98, Colect., p. I‑2189, n.° 17, e de 8 de Outubro de 1987, Kolpinghuis Nijmegen, 80/86, Colect., p. 3969, numa leitura conjugada dos n.os 12, 15 e 16), tanto quanto eu saiba até hoje o Tribunal de Justiça ainda não se pronunciou explicitamente no sentido de uma tal obrigação geral de interpretação em conformidade, durante o prazo de transposição de uma directiva. Resta‑nos, pois, apreciar os efeitos possíveis de uma directiva antes de expirar o seu prazo de transposição, no caso concreto em função da obrigação de abstenção imposta aos órgãos jurisdicionais nacionais por força da jurisprudência Inter‑Environnement Wallonie.


14 – V., neste sentido, acórdão Inter‑Environnement Wallonie, já referido, n.os 46 a 49.


15 – V. n.° 30 supra.


16 – V., neste sentido, por exemplo, acórdãos de 18 de Junho de 1991, ERT (C‑260/89, Colect., p. I‑2925, n.° 41), e de 18 de Dezembro de 1997, Annibaldi (C‑309/96, Colect., p. I‑7493, n.° 12). Além disso, nos termos do artigo 1.° da directiva «regresso», esta directiva estabelece as normas e procedimentos comuns a aplicar «no respeito dos direitos fundamentais enquanto princípios gerais do direito comunitário e do direito internacional, nomeadamente os deveres em matéria de protecção dos refugiados e de direitos do Homem».


17 – V., neste sentido, em particular, TEDH, acórdãos Chahal c. Reino Unido de 15 de Novembro de 1996, Colectânea dos acórdãos e decisões 1996‑V, § 113, e Mikolenko c. Estónia de 8 de Outubro de 2009, ainda não publicado na Colectânea dos acórdãos e decisões, §§ 59 a 61; v., também, princípio n.° 7 dos «Vinte princípios directores relativos ao regresso forçado» adoptados pelo Comité de Ministros do Conselho da Europa em 4 de Maio de 2005 e os comentários a estes princípios do Comité Ad Hoc de Peritos sobre os Aspectos Jurídicos do Asilo Territorial, Refugiados e Apátridas (CAHAR), publicados em Setembro de 2005, comentário ao princípio director n.° 7.


18 – V., neste sentido, por exemplo, acórdão de 6 de Julho de 2006, Kersbergen‑Lap e Dams‑Schipper (C‑154/05, Colect., p. I‑6249, n.° 42).


19 – V., entre outros, acórdão de 11 de Dezembro de 2008, Comissão/Freistaat Sachsen (C‑334/07 P, Colect., p. I‑9465, n.° 43).


20 – V., neste sentido, acórdãos de 10 de Julho de 1986, Licata/CES (270/84, Colect., p. 2305, n.° 31); de 29 de Junho de 1999, Butterfly Music (C‑60/98, Colect., p. I‑3939, n.° 24); e de 29 de Janeiro de 2002, Pokrzeptowicz‑Meyer (C‑162/00, Colect., p. I‑1049, n.° 50).


21 – V., neste sentido, acórdão Pokrzeptowicz‑Meyer, já referido, n.° 49.


22 – V., por exemplo, acórdão de 6 de Julho de 1993, CT Control (Rotterdam) BV (C‑121/91 e C‑122/91, Colect., p. I‑3873, n.° 22).


23 – V. acórdão Pokrzeptowicz‑Meyer, já referido, n.° 52.


24 – V., a este respeito, n.os 49 a 53 supra.


25 – V. n.° 52 supra; v. também, a este respeito, TEDH, acórdão Mohd c. Grécia de 27 de Abril de 2006, § 18.


26 – Acórdão de 29 de Janeiro de 2009 (C‑19/08, Colect., p. I‑495).


27 – Regulamento do Conselho, de 18 de Fevereiro de 2003, que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de asilo apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro (JO L 50, p. 1).


28 – A este respeito, o Tribunal de Justiça salientou, em particular, que, segundo o objectivo prosseguido pela fixação do prazo em causa, os Estados‑Membros deviam dispor de um prazo de seis meses que devem aproveitar plenamente para regulamentar as modalidades técnicas de realização da transferência. Caso contrário, os Estados‑Membros poderiam ser levados a desconhecer/abolir o efeito suspensivo da decisão provisória, a fim de disporem do tempo necessário para organizar a transferência do requerente de asilo.


29 – V., neste sentido, n.° 101 infra.


30 – JO L 326, p. 13.


31 – JO L 31, p. 18.


32 – A este respeito, v., por exemplo, artigo 18.°, n.° 1, da Directiva 2005/85.


33 – V., neste contexto, por exemplo, TEDH, acórdãos Saadi c. Reino Unido de 29 de Janeiro de 2008, n.° 65, e Riad e Idiab c. Bélgica de 24 de Janeiro de 2008, § 70; v., também, Comité dos Direitos do Homem, comunicação n.° 560/1993: Austrália. 30/04/97. CCPR/C/59/D/560/1993, ponto 9.3.


34 – Nem de possíveis períodos de privação da liberdade com outros fundamentos jurídicos como, por exemplo, com base no direito penal interno.


35 – V., a este propósito, os comentários, e jurisprudência referida, do CAHAR sobre o princípio director n.° 7 relativo ao regresso forçado.


36 – Com efeito, atendendo aos factos do caso em apreço, em particular à duração da detenção de S. Kadzoev, e às respostas propostas à primeira e segunda questões prejudiciais, pode colocar‑se a questão da pertinência desta questão para efeitos do processo principal.


37 – V., em particular, n.os 48 a 53 e 70 a 73 supra.


38 – Acrescente‑se que é sempre possível prever a colocação em detenção, motivada por um comportamento agressivo, com outro fundamento jurídico de direito nacional, como, por exemplo, uma legislação destinada a preservar a ordem pública ou o direito penal.