Language of document : ECLI:EU:T:2012:459

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção)

21 de setembro de 2012 (*)

«Marca comunitária ― Processo de oposição ― Pedido de marca nominativa comunitária WESTERN GOLD ― Marcas nominativas nacionais, internacional e comunitária anteriores WESERGOLD, Wesergold e WeserGold ― Motivos relativos de recusa ― Inexistência de risco de confusão ― Artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento (CE) n.° 207/2009 ― Caráter distintivo das marcas anteriores»

No processo T‑278/10,

Wesergold Getränkeindustrie GmbH & Co. KG, com sede em Rinteln (Alemanha), representada por P. Goldenbaum, T. Melchert e I. Rohr, advogados,

recorrente,

contra

Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), representado por R. Pethke, na qualidade de agente,

recorrido,

sendo a outra parte no processo na Câmara de Recurso do IHMI, interveniente no Tribunal Geral,

Lidl Stiftung & Co. KG, com sede em Neckarsulm (Alemanha), representada por A. Marx e M. Schaeffer, advogados,

que tem por objeto um recurso da decisão da Primeira Câmara de Recurso do IHMI, de 24 de março de 2010 (processo R 770/2009‑1), relativa a um processo de oposição entre a Wesergold Getränkeindustrie GmbH & Co. KG e a Lidl Stiftung & Co. KG,

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção),

composto por: J. Azizi (relator), presidente, S. Frimodt Nielsen e M. Kancheva, juízes,

secretário: C. Heeren, administradora,

vista a petição entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 21 de junho de 2010,

vista a contestação do IHMI, apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 12 de novembro de 2010,

vistas as observações da interveniente apresentadas na Secretaria do Tribunal Geral em 30 de setembro de 2010,

após a audiência de 27 de junho de 2012,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1        Em 23 de agosto de 2006, a interveniente, Lidl Stiftung & Co. KG, apresentou um pedido de registo de marca comunitária no Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), nos termos do Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 20 de dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1), conforme alterado [substituído pelo Regulamento (CE) n.° 207/2009 do Conselho, de 26 de fevereiro de 2009, sobre a marca comunitária (JO L 78, p. 1)].

2        A marca cujo registo foi pedido é o sinal nominativo WESTERN GOLD.

3        Os produtos para os quais o registo foi pedido integram a classe 33 na aceção do Acordo de Nice relativo à Classificação Internacional dos Produtos e dos Serviços para o registo de marcas, de 15 de junho de 1957, conforme revisto e alterado, e correspondem à descrição seguinte: «Bebidas espirituosas, em especial whisky».

4        O pedido de marca comunitária foi publicado no Boletim de Marcas Comunitárias n.° 3/2007, de 22 de janeiro de 2007.

5        Em 14 de março de 2007, a recorrente, Wesergold Getränkeindustrie GmbH & Co. KG, deduziu oposição, ao abrigo do disposto no artigo 42.° do Regulamento n.° 40/94 (atual artigo 41.° do Regulamento n.° 207/2009), ao registo da marca solicitada para os produtos referidos no n.° 3, supra.

6        A oposição baseava‑se em diversas marcas anteriores.

7        A primeira marca anterior invocada foi a marca nominativa comunitária WeserGold, solicitada em 3 de janeiro de 2003 e registada em 2 de março de 2005 sob o número 2994739, que designa produtos das classes 29, 31 e 32, correspondendo a cada uma dessas classes a descrição seguinte:

¾        Classe 29: «Frutos e legumes em conserva, secos e cozidos; geleias, doces, compotas; laticínios, nomeadamente bebidas à base de iogurte, constituídas essencialmente por iogurte e sumos de fruta ou sumos de legumes»;

¾        Classe 31: «Frutos frescos»;

¾        Classe 32: «Águas minerais e gasosas; outras bebidas não alcoólicas, nomeadamente limonadas, bebidas efervescentes e bebidas à base de coca‑cola; sumos e bebidas de fruta, sumos e bebidas de legumes; xaropes e outras preparações para fazer bebidas».

8        A segunda marca anterior invocada foi a marca nominativa alemã WeserGold, solicitada em 26 de novembro de 2002 e registada em 27 de fevereiro de 2003 sob o número 30257995, que designa produtos das classes 29, 31 e 32, correspondendo a cada uma dessas classes a descrição seguinte:

¾        Classe 29: «Frutos e legumes em conserva, secos e cozidos; geleias, doces, compotas; laticínios, nomeadamente bebidas à base de iogurte, constituídas essencialmente por iogurte e sumos de fruta ou sumos de legumes»;

¾        Classe 31: «Frutos frescos»;

¾        Classe 32: «Águas minerais e gasosas; outras bebidas não alcoólicas, nomeadamente limonadas, bebidas efervescentes e bebidas à base de coca‑cola; sumos e bebidas de fruta, sumos e bebidas de legumes; xaropes e outras preparações para fazer bebidas».

9        A terceira marca anterior invocada foi a marca nominativa internacional n.° 801149, Wesergold, solicitada a 13 de março de 2003, e que produz efeitos na República Checa, na Dinamarca, em Espanha, em França, na Itália, na Hungria, na Áustria, na Polónia, em Portugal, na Eslovénia, na Suécia, no Reino Unido e nos países do Benelux, que designa produtos das classes 29, 31 e 32, correspondendo a cada uma dessas classes a descrição seguinte:

¾        Classe 29: «Frutos e legumes em conserva, secos e cozidos; geleias, doces, compotas; laticínios, nomeadamente bebidas à base de iogurte, constituídas essencialmente por iogurte e sumos de fruta ou sumos de legumes»;

¾        Classe 31: «Frutos frescos»;

¾        Classe 32: «Águas minerais e gasosas; outras bebidas não alcoólicas, nomeadamente limonadas, bebidas efervescentes e bebidas à base de coca‑cola; sumos e bebidas de fruta, sumos e bebidas de legumes; xaropes e outras preparações para fazer bebidas».

10      A quarta marca anterior invocada foi a marca nominativa alemã WESERGOLD, solicitada em 12 de junho de 1970 e registada em 16 de fevereiro de 1973 sob o número 902472, renovada em 13 de junho de 2000, que designa produtos da classe 32 correspondendo à descrição seguinte: «Cidras, limonadas, águas minerais, bebidas à base de sumo de legumes, sumos de frutas».

11      A quinta marca anterior invocada foi a marca nominativa polaca WESERGOLD, solicitada em 26 de junho de 1996 e registada em 11 de maio de 1999 sob o número 161413, que designa produtos da classe 32 correspondendo à descrição seguinte: «Águas minerais e águas de nascente; águas de mesa, bebidas não alcoólicas; sumos de frutas, néctares de frutas, xaropes de frutas, sumos de legumes, néctares de legumes, bebidas refrescantes, bebidas à base de sumos de frutas, limonadas, bebidas gasosas, bebidas minerais, chás gelados, águas minerais aromatizadas, águas minerais com adição de sumo de fruta ― todas as bebidas mencionadas igualmente como preparações dietéticas para fins não medicinais».

12      O fundamento invocado em apoio da oposição era o previsto no artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 [atual artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009].

13      Em 11 de junho de 2009, a Divisão de Oposição deferiu a oposição e rejeitou o pedido de registo da marca comunitária. Por razões de economia processual, a Divisão de Oposição limitou a sua análise da oposição à marca nominativa comunitária anterior, para a qual não era necessária prova da sua utilização séria.

14      Em 13 de julho de 2009, a interveniente interpôs recurso da decisão da Divisão de Oposição para o IHMI, nos termos dos artigos 58.° a 64.° do Regulamento n.° 207/2009.

15      Por decisão de 24 de março de 2010 (a seguir «decisão recorrida»), a Primeira Câmara de Recurso do IHMI julgou procedente o recurso e anulou a decisão da Divisão de Oposição. Considerou que o público relevante era o grande público da União Europeia. Os produtos abrangidos pela marca solicitada, pertencentes à classe 33, isto é, «Bebidas espirituosas, em especial whisky», não são semelhantes aos produtos abrangidos pelas marcas anteriores, pertencentes às classe 29 e 31 (v. n.os 20 e 21 da decisão recorrida). Existe um grau fraco de semelhança entre os produtos abrangidos pela marca solicitada da classe 33 e os abrangidos pelas marcas anteriores pertencentes à classe 32 (v. n.os 22 a 28 da decisão recorrida). Os sinais em conflito apresentam um grau médio de semelhança nos planos visual (v. n.° 33 da decisão recorrida) e fonético (v. n.° 34 da decisão recorrida), mas são conceptualmente diferentes (v. n.os 35 a 37 da decisão recorrida). No que respeita ao caráter distintivo das marcas anteriores, a Câmara de Recurso considerou, no essencial, que era ligeiramente inferior à média, devido à presença do termo «gold», que tem um caráter distintivo fraco (v. n.os 38 a 40 da decisão recorrida). Por último, indicou que a ponderação de todas as circunstâncias do caso em apreço, no âmbito da apreciação do risco de confusão, conduzia à inexistência de risco de confusão entre os sinais em conflito (v. n.os 41 a 47 da decisão recorrida).

 Pedidos das partes

16      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

¾        anular a decisão recorrida;

¾        condenar o IHMI nas despesas.

17      O IHMI e a interveniente concluem pedindo que o Tribunal Geral se digne:

¾        negar provimento ao recurso;

¾        condenar a recorrente nas despesas.

 Questão de direito

18      Em apoio do seu recurso, a recorrente invoca quatro fundamentos, baseados na violação, respetivamente, do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do artigo 64.°, do artigo 75.°, segundo período, e, a título subsidiário, do artigo 75.°, primeiro período, do Regulamento n.° 207/2009. Defende, no essencial, que os sinais em conflito são semelhantes visual, fonética e conceptualmente, que as marcas anteriores têm um caráter distintivo intrínseco, acrescido pela utilização, e que os produtos designados pelos sinais em conflito são semelhantes. Considera, portanto, que existe, por parte do público relevante, um risco de confusão entre os sinais em conflito.

19      O IHMI e a interveniente contestam a justeza dos fundamentos invocados pela recorrente. Consideram que não existe risco de confusão entre os sinais em conflito.

 Observações preliminares

20      A título preliminar, importa recordar que, nos termos do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009, após oposição do titular de uma marca anterior, o pedido de registo de marca será recusado quando, devido à sua identidade ou semelhança com uma marca anterior e devido à identidade ou semelhança dos produtos ou dos serviços designados pelas duas marcas, exista risco de confusão no espírito do público do território onde a marca anterior está protegida. O risco de confusão compreende o risco de associação com a marca anterior.

21      Como foi reconhecido por jurisprudência constante, constitui risco de confusão o risco de que o público possa crer que os produtos ou os serviços em causa provêm da mesma empresa ou de empresas ligadas economicamente. Segundo esta mesma jurisprudência, o risco de confusão deve ser apreciado globalmente, segundo a perceção que o público relevante tem dos sinais e dos produtos ou dos serviços em causa, e tendo em conta todos os fatores pertinentes no caso em apreço, nomeadamente a interdependência da semelhança dos sinais e dos produtos ou dos serviços designados [v. acórdão do Tribunal Geral de 9 de julho de 2003, Laboratorios RTB/IHMI − Giorgio Beverly Hills (GIORGIO BEVERLY HILLS), T‑162/01, Colet., p. II‑2821, n.os 30 a 33 e jurisprudência aí referida].

22      Para efeitos da aplicação do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009, o risco de confusão pressupõe uma identidade ou semelhança entre as marcas em conflito e uma identidade ou semelhança entre os produtos ou os serviços que designam. Trata‑se de condições cumulativas [v. acórdão do Tribunal Geral de 22 de janeiro de 2009, Commercy/IHMI ― easyGroup IP Licensing (easyHotel), T‑316/07, Colet., p. II‑43, n.° 42 e jurisprudência aí referida].

 Quanto ao público relevante

23      A jurisprudência constatou que, no âmbito da apreciação global do risco de confusão, deve ter‑se em conta o consumidor médio da categoria de produtos em causa, normalmente informado e razoavelmente atento e avisado. Deve igualmente tomar‑se em consideração o facto de que o nível de atenção do consumidor médio é suscetível de variar em função da categoria de produtos ou de serviços em causa [v. acórdão do Tribunal Geral de 13 de fevereiro de 2007, Mundipharma/IHMI ― Altana Pharma (RESPICUR), T‑256/04, Colet., p. II‑449, n.° 42 e jurisprudência aí referida].

24      No caso em apreço, atendendo aos produtos em causa, deve‑se confirmar a definição de público relevante dada pela Câmara de Recurso ―, que, de resto, não foi contestada pelas partes ―, segundo a qual o público relevante é o grande público.

25      Baseando‑se a decisão recorrida, nomeadamente, na existência de uma marca comunitária anterior, o público relevante é constituído pelo consumidor médio da União.

 Quanto à comparação dos produtos

26      Conforme foi reconhecido por jurisprudência constante, para apreciar a semelhança entre os produtos ou serviços em causa, importa tomar em conta todos os fatores pertinentes que caracterizam a relação entre eles. Esses fatores incluem, em especial, a sua natureza, destino, utilização, bem como o seu caráter concorrente ou complementar. Também podem ser levados em conta outros fatores, como, por exemplo, os canais de distribuição dos produtos em causa [v. acórdão do Tribunal Geral de 11 de julho de 2007, El Corte Inglés/IHMI ― Bolaños Sabri (PiraÑAM diseño original Juan Bolaños), T‑443/05, Colet., p. II‑2579, n.° 37 e jurisprudência aí referida].

27      Na decisão recorrida, a Câmara de Recurso considerou que os produtos abrangidos pela marca solicitada, pertencentes à classe 33, eram diferentes dos protegidos pelas marcas anteriores, pertencentes às classes 29 e 31 (v. n.os 20 e 21 da decisão recorrida). Considerou, além disso, que os produtos designados pela marca solicitada, pertencentes à classe 33, e os abrangidos pelas marcas anteriores, pertencentes à classe 32, apresentavam apenas um grau de semelhança muito fraco (v. n.° 28 da decisão recorrida).

28      A recorrente contesta a apreciação da Câmara de Recurso segundo a qual há apenas uma fraca semelhança entre os produtos designados pela marca solicitada, pertencentes à classe 33, e os abrangidos pelas marcas anteriores, pertencentes à classe 32. Entende que existe uma semelhança normal entre os referidos produtos.

29      Assim, a recorrente não contesta a apreciação da Câmara de Recurso segundo a qual os produtos abrangidos pela marca solicitada, pertencentes à classe 33, são diferentes dos compreendidos nas marcas anteriores, pertencentes às classes 29 e 31, mas limita a sua crítica à apreciação da Câmara no que respeita à semelhança entre os produtos pertencentes à classe 33, compreendidos na marca solicitada, e os pertencentes à classe 32, abrangidos pelas marcas anteriores.

30      Relativamente a esta última comparação, a recorrente considera, em primeiro lugar, que a circunstância de alguns consumidores estarem atentos à distinção entre bebidas alcoólicas e bebidas não alcoólicas não permite afastar a semelhança que existe, além disso, entre os produtos em questão. Na sua opinião, a grande maioria dos consumidores não repara se as bebidas contêm álcool ou não, escolhendo espontaneamente em função da sua vontade do momento, a partir de uma seleção de bebidas que lhe é proposta, designadamente, na ementa de um bar ou de um restaurante. A recorrente opõe‑se à invocação, neste contexto, do acórdão do Tribunal Geral de 18 de junho de 2008, Coca‑Cola/IHMI ― San Polo (MEZZOPANE) (T‑175/06, Colet., p. II‑1055), dado que esta decisão não dizia respeito às bebidas espirituosas, mas sim ao vinho.

31      A este respeito, importa observar que foi com razão que a Câmara de Recurso considerou que a própria natureza dos produtos difere tendo em conta a presença ou não de álcool na sua composição. O público relevante apercebe‑se da presença ou não de álcool numa bebida como uma diferença significativa no que respeita à natureza das bebidas em causa. Contrariamente ao que alega a recorrente, o grande público da União está atento e distingue entre bebidas que contêm álcool e bebidas sem álcool, mesmo quando escolhe uma bebida em função da vontade do momento. Assim, foi a justo título que a Câmara de Recurso indicou na decisão recorrida, fazendo referência ao acórdão MEZZOPANE (referido no n.° 30, supra, n.os 80 a 82), que os consumidores médios distinguem entre as bebidas espirituosas da marca solicitada e as bebidas não alcoólicas das marcas anteriores.

32      Em segundo lugar, a recorrente alega que houve uma coincidência considerável entre o destino e a utilização dos produtos abrangidos pelos sinais em conflito, dado que as bebidas espirituosas são amiúde misturadas com bebidas não alcoólicas. Assim, essas bebidas são, por vezes, pré‑acondicionadas sob a forma de mistura, como no caso dos «alcopops» (refrigerantes com álcool), ou ainda ingeridas, misturadas, sob a forma de cocktails e de long drinks.

33      Cabe, a este respeito, observar que a Câmara de Recurso podia considerar, sem cometer um erro, que os produtos em causa coincidem parcialmente quanto ao seu destino e à sua utilização. Com efeito, a circunstância de as bebidas espirituosas serem amiúde misturadas com bebidas não alcoólicas, seja em pré‑embalagem ou sob a forma de cocktails e de long drinks, não pode pôr em causa o facto de as bebidas espirituosas, em especial o whisky, serem muitas vezes também acondicionadas e consumidas enquanto tal.

34      Em terceiro lugar, a recorrente contesta a apreciação da Câmara de Recurso segundo a qual, devido ao processo de fabricação especial das bebidas espirituosas, que difere totalmente do das bebidas não alcoólicas, o público relevante não parte do princípio de que as bebidas espirituosas e as bebidas não alcoólicas são fabricadas pela mesma empresa. A recorrente considera que esta apreciação não corresponde à realidade e invoca em apoio do seu argumento exemplos de produtores de sumos de frutas e de aguardentes de frutos e sítios Internet.

35      A este respeito, cabe observar, em primeiro lugar, que a recorrente apresentou pela primeira vez ao Tribunal Geral as provas acima referidas. Ora, o recurso para o Tribunal Geral visa a fiscalização da legalidade das decisões das Câmaras de Recurso do IHMI, nos termos do artigo 63.° do Regulamento n.° 207/2009, pelo que a função do Tribunal Geral não consiste em reexaminar as circunstâncias de facto à luz de documentos que lhe são apresentados pela primeira vez. Há que afastar esses documentos, sem que seja necessário examinar a sua força probatória (v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 24 de novembro de 2005, Sadas/IHMI ― LTJ Diffusion (ARTHUR ET FELICIE), T‑346/04, Colet., p. II‑4891, n.° 19 e jurisprudência aí referida). Além disso, a circunstância de, em alguns casos, os produtores de aguardente ou de outras bebidas espirituosas também produzirem bebidas não alcoólicas não põe em causa a apreciação segundo a qual o consumidor médio não parte do princípio de que as bebidas espirituosas e as bebidas não alcoólicas vêm da mesma empresa. Com efeito, tendo em conta modos de produção completamente diferentes, a Câmara de Recurso podia considerar que o público relevante não considera, na generalidade, que as bebidas alcoólicas e não alcoólicas provêm da mesma empresa.

36      A recorrente considera também que a semelhança dos produtos não depende da questão de saber se os produtos em causa foram fabricados nos mesmos locais de produção, mas da questão de saber se o público relevante pode crer que provêm da mesma empresa ou de empresas ligadas. Ora, no caso em apreço, pode deduzir‑se da diferença entre o processo de fabricação das bebidas espirituosas e o das bebidas não alcoólicas, invocada pela Câmara de Recurso, que o público relevante não acredita que os dois tipos de produto provêm de uma mesma empresa ou de uma empresa ligada.

37      Em quarto lugar, a recorrente contesta a apreciação da Câmara de Recurso segundo a qual as bebidas espirituosas são bebidas consumidas por prazer, ao passo que as bebidas não alcoólicas são bebidas consumidas para saciar a sede. Segundo a recorrente, muitas bebidas não alcoólicas não são consumidas para saciar a sede, dado o seu elevado teor de açúcar, mas são deliberadamente consumidas devido ao sabor e por prazer.

38      A este respeito, importa observar que o público relevante não vê as bebidas espirituosas como bebidas com vocação para matar a sede. Além disso, mesmo que seja exato que muitas bebidas não alcoólicas com elevado teor de açúcar não matam a sede, o público relevante apreende‑as como tendo esse efeito, em especial quando são servidas frescas. Tendo em conta os efeitos do consumo de álcool na saúde e nos desempenhos intelectual e físico, o consumidor médio apenas consumirá bebidas espirituosas, ocasionalmente, por prazer e por causa do sabor. Pelo contrário, as bebidas não alcoólicas são geralmente consumidas para saciar a sede, apesar do facto de o consumidor médio as poder escolher pelo sabor. Em qualquer caso, foi com razão que a Câmara de Recurso considerou que, para o público relevante, a presença ou a ausência de álcool e a diferença de sabor das bebidas espirituosas e das bebidas não alcoólicas designadas pelas marcas anteriores prevaleciam sobre o destino e a utilização comuns.

39      Em quinto lugar, a recorrente considera que os produtos em causa são complementares na medida em que as bebidas espirituosas são consumidas sob múltiplas formas e essencialmente sob uma forma mista.

40      A este respeito, importa lembrar que os produtos são considerados complementares quando existe uma ligação estreita entre eles, no sentido de que a aquisição de um torna indispensável ou importante a utilização do outro (v., neste sentido, acórdão MEZZOPANE, referido no n.° 30, supra, n.° 67). Ora, não se pode considerar que a aquisição de uma bebida não alcoólica seja indispensável à aquisição de uma bebida espirituosa e vice‑versa. Há, certamente, uma ligação entre os dois tipos de produto, mas limita‑se ao caso das bebidas mistas. Só nestas circunstâncias é que o comprador de um destes produtos será levado a comprar o outro e vice‑versa. Contudo, como exposto no n.° 33, supra, as bebidas espirituosas e as bebidas não alcoólicas são amiúde consumidas como tal, sem terem sido previamente misturadas.

41      Face ao conjunto dos argumentos precedentes, a Câmara de Recurso podia considerar, sem cometer um erro de apreciação, que as bebidas espirituosas visadas pela marca solicitada e as bebidas não alcoólicas protegidas pelas marcas anteriores apenas apresentavam um fraco grau de semelhança.

42      Esta conclusão não pode ser posta em causa pela invocação, pela recorrente, da decisão da Quarta Câmara de Recurso do IHMI (processo R 83/2003‑4). Com efeito, tal como reconhecido por jurisprudência constante, as decisões que as Câmaras de Recurso são levadas a adotar, por força do Regulamento n.° 207/2009, relativamente ao registo de um sinal como marca comunitária, fazem parte do exercício de uma competência vinculada e não de um poder discricionário. Por isso, a legalidade das decisões das Câmaras de Recurso deve ser apreciada unicamente com base neste regulamento, e não com base numa prática decisória anterior dessas Câmaras (acórdão do Tribunal de Justiça de 26 de abril de 2007, Alcon/IHMI, C‑412/05 P, Colet., p. I‑3569, n.° 65, e acórdão ARTHUR ET FELICIE, referido no n.° 35, supra, n.° 71).

 Quanto à comparação dos sinais em conflito

 Observações preliminares

43      A apreciação global do risco de confusão deve, no que respeita à semelhança visual, fonética ou conceptual dos sinais em conflito, basear‑se na impressão de conjunto produzida por estes, atendendo, nomeadamente, aos seus elementos distintivos e dominantes. A perceção que o consumidor médio dos produtos ou dos serviços em causa tem das marcas desempenha um papel determinante na apreciação global do referido risco. A esse propósito, o consumidor médio apreende normalmente uma marca como um todo e não procede a uma análise das suas particularidades (v. acórdão do Tribunal de Justiça de 12 de junho de 2007, IHMI/Shaker, C‑334/05 P, Colet., p. I‑4529, n.° 35 e jurisprudência aí referida).

44      A título preliminar, há que salientar que a circunstância de as marcas anteriores, constituídas pelo mesmo termo «wesergold», serem escritas tanto em maiúsculas como em minúsculas, às vezes com uma maiúscula no início e no meio do referido termo, não influencia a comparação dos sinais em causa. Com efeito, como já foi declarado pela jurisprudência, uma marca nominativa é uma marca constituída exclusivamente por letras, por palavras ou associações de palavras, escritas em carateres de tipografia de tipo normal, sem um elemento gráfico específico. Por conseguinte, a proteção que decorre do registo de uma marca nominativa refere‑se à palavra indicada no pedido de registo e não aos aspetos gráficos ou estilísticos particulares que essa marca possa eventualmente revestir [v., neste sentido, acórdãos do Tribunal Geral de 22 de maio de 2008, Radio Regenbogen Hörfunk in Baden/IHMI (RadioCom), T‑254/06, não publicado na Coletânea, n.° 43 e jurisprudência aí referida].

 Quanto à comparação visual

45      A recorrente contesta a apreciação da Câmara de Recurso segundo a qual os sinais em causa apresentam um grau de semelhança visual médio. Alega que o grau de semelhança visual entre os sinais em conflito é elevado, dado que a utilização de uma maiúscula não constitui um elemento gráfico, mas conduz a uma divisão da marca nominativa em dois termos. Se assim não fosse, o espaço entre as duas palavras dentro de uma marca nominativa não teria sentido e as marcas constituídas por duas palavras ou mais deveriam ser consideradas como marcas de um termo único. A título subsidiário, alega que tanto a marca solicitada como as marcas anteriores deveriam, segundo a abordagem indicada, ser consideradas como compostas por um termo único. Por outro lado, considera que as marcas anteriores são manifestamente compostas por dois elementos e que a escrita separada ou conjunta não implica uma pronúncia diferente. Os sinais em conflito permitem diferentes maneiras de serem pronunciados, não sendo nenhuma delas mais verosímil do que a outra, e não podem deduzir‑se diferenças visuais da sua forma escrita.

46      A este respeito, atendendo à jurisprudência referida no n.° 44, supra, deve‑se confirmar a apreciação da Câmara de Recurso segundo a qual a utilização alternada de minúsculas e de maiúsculas nas marcas anteriores não tem influência na comparação dos sinais, dado que as marcas anteriores são marcas nominativas. Assim, no plano visual, não se pode referir uma divisão das marcas anteriores em dois termos, como afirma a recorrente, e há que considerar que as marcas anteriores são compostas por um termo único.

47      A circunstância de o termo único das marcas anteriores poder ser compreendido como a contração dos termos «weser» e «gold» não afeta a apreciação da Câmara de Recurso segundo a qual a marca solicitada será apreendida visualmente como sendo composta por duas palavras, ao passo que a marca anterior é composta apenas por uma. Além disso, como indica a Câmara de Recurso, mesmo que a ordem das outras letras seja idêntica, a marca solicitada distingue‑se das marcas anteriores pelas letras «t» e «n». Atendendo a estes elementos e ao facto de os sinais em conflito conterem a sequência de letras «w», «e» e «s», bem como «e» e «r», e ainda o elemento «gold», a Câmara de Recurso considerou, sem cometer um erro, que, no plano visual, os sinais em conflito apresentavam um grau de semelhança médio.

 Quanto à comparação fonética

48      A recorrente contesta a apreciação da Câmara de Recurso segundo a qual os sinais em conflito apresentam um grau médio de semelhança fonética (v. n.° 34 da decisão recorrida). Alega que a marca solicitada e as marcas anteriores apresentam uma forte semelhança fonética devido à identidade do número de sílabas, à identidade das últimas sílabas, à identidade das três primeiras letras e à identidade dos nove sons consecutivos que determinam a pronúncia. Na marca solicitada, a letra «t» confunde‑se com a letra precedente, isto é, com a letra «s», para formar o único som [s], e a letra «n» mal se ouve.

49      A este respeito, importa observar que os sinais em conflito contêm ambos a sequência de letras «w», «e» e «s», bem como «e» e «r», e ainda o termo «gold», pela mesma ordem. No entanto, dada a presença das letras «t» e «n» na marca solicitada WESTERN GOLD, esta será pronunciada pelo público relevante de maneira diferente das marcas anteriores. Contrariamente ao alegado pela recorrente, as letras «n» e «t» são audíveis e comportam diferenças de ritmo e de som na pronúncia da referida marca, pelo menos para uma parte do público relevante, designadamente para o grande público inglês, espanhol, francês e alemão. Assim, a última sílaba da primeira palavra da marca solicitada, isto é, a sílaba «stern», é pronunciada e percebida foneticamente como sendo mais longa do que a sílaba «ser» das marcas anteriores. Além disso, dependendo da língua do consumidor pertinente, a letra «s» que figura na marca solicitada é ou não pronunciada da mesma maneira que a letra «s» que figura nas marcas anteriores, e pronuncia‑se como [s] ou [z].

50      Por conseguinte, foi sem errar que a Câmara de Recurso considerou que os sinais em causa apresentavam um grau médio de semelhança fonética.

 Quanto à comparação conceptual

51      Na decisão recorrida, a Câmara de Recurso considerou que os sinais em conflito eram diferentes no plano conceptual (v. n.° 37 da decisão recorrida).

52      A recorrente contesta esta apreciação, alegando que os sinais em conflito são conceptualmente semelhantes. Segundo a recorrente, a expressão «western gold» tem um conteúdo incerto e impercetível, que dá lugar a associações, múltiplas mas abstratas, que não são suscetíveis de reforçar a sua diferença. O elemento «gold», que figura nas duas marcas, provoca uma associação positiva, suscetível de estabelecer uma ligação inconsciente entre as marcas, e ocasiona assim uma aproximação do seu sentido.

53      A este respeito, há que considerar que o termo «western» será compreendido no sentido de que designa o ponto cardeal «oeste» ou um género cinematográfico, uma vez que os filmes western são amplamente conhecidos do público relevante. Os dois significados do termo «western» estão, também, fortemente ligados, dado que o nome do género cinematográfico resulta do local onde decorre a ação, situado no oeste dos Estados Unidos. Além disso, a Câmara de Recurso salientou, corretamente, que muitos dos consumidores fariam a associação entre o whisky e os filmes referidos, visto ser frequente alguns protagonistas desses filmes consumirem whisky. Portanto, o público relevante atribuirá um ou vários significados precisos ao termo «western».

54      O termo «weser», como indica com razão a Câmara de Recurso, será compreendido por uma parte do público alemão como uma referência ao nome do rio que atravessa a cidade de Bremen (Alemanha). Para o resto do público europeu relevante, esse termo será compreendido como denominação de fantasia.

55      O termo «gold» das marcas em causa será compreendido como uma referência ao metal precioso que é o ouro, cuja cor é próxima da cor do whisky. Além disso, o termo «gold» pode ser associado pelo público relevante a qualidade superior e, por essa razão, ser compreendido como um elemento promocional. Para a parte anglófona do público relevante, portanto, os consumidores ingleses e irlandeses, a marca solicitada será compreendida como tendo o significado de «ouro do oeste». Contudo, a presença comum do termo «gold» nos sinais em conflito não é suficiente para neutralizar as diferenças de significado entre os sinais em causa, tendo em conta a diferença de significado entre os termos «western» e «weser».

56      Por conseguinte, a Câmara de Recurso considerou sem cometer um erro que os sinais em causa eram conceptualmente diferentes.

 Avaliação provisória

57      Quanto à comparação dos sinais, resulta do que precede que a Câmara de Recurso teve razão em estabelecer que os sinais em conflito são visual e foneticamente semelhantes e conceptualmente diferentes.

58      A este respeito, importa lembrar que quando as marcas são fonética e visualmente semelhantes, são globalmente semelhantes, exceto se houver diferenças conceptuais importantes. Essas diferenças são suscetíveis de neutralizar as semelhanças auditivas e visuais, desde que, pelo menos, um desses sinais tenha, na perspetiva do público relevante, um significado claro e preciso, para que esse público o consiga apreender diretamente (acórdão do Tribunal de Justiça de 13 de setembro de 2007, Il Ponte Finanziaria/IHMI, C‑234/06 P, Colet., p. I‑7333, n.° 34). Isto é aplicável ao caso em apreço, tendo em conta a diferença conceptual entre os sinais em conflito. Daqui resulta que os sinais são globalmente diferentes, apesar das suas semelhanças no plano visual e fonético.

59      Há, portanto, que examinar a apreciação da Câmara de Recurso relativa ao caráter distintivo das marcas anteriores, contestada pela recorrente.

 Quanto ao caráter distintivo das marcas anteriores

 Quanto ao caráter distintivo intrínseco das marcas anteriores

60      Na decisão recorrida, a Câmara de Recurso considerou que o caráter distintivo das marcas anteriores era ligeiramente reduzido relativamente ao caráter distintivo médio que lhes tinha sido reconhecido pela Divisão de Oposição, dado que o elemento «gold» era entendido pelo público relevante como um conceito promocional ou como uma referência à cor dourada de algumas bebidas (v. n.° 39 da decisão recorrida).

61      A recorrente contesta esta apreciação da Câmara de Recurso, alegando que nem todas as bebidas abrangidas pelas marcas anteriores têm a cor dourada e que as marcas anteriores, consideradas no seu conjunto, tinham pelo menos um caráter distintivo médio, independentemente do caráter distintivo mais fraco do termo «gold».

62      A este respeito, importa salientar que, independentemente do facto de algumas bebidas abrangidas pelas marcas anteriores não terem a cor dourada, o termo «gold» é um termo promocional comummente utilizado para designar a qualidade superior dos produtos e, portanto, este termo tem um caráter distintivo fraco. Assim, esta parte das marcas anteriores enfraquece o caráter distintivo intrínseco das mesmas. Resulta de uma apreciação de conjunto de cada uma das marcas anteriores que a Câmara de Recurso podia considerar, sem cometer um erro, que as marcas anteriores gozavam de um caráter distintivo intrínseco ligeiramente inferior à média.

 Quanto ao caráter distintivo acrescido pela utilização

63      No que respeita ao caráter distintivo acrescido pela utilização das marcas anteriores, a recorrente contesta a apreciação da Câmara de Recurso segundo a qual a recorrente não tinha invocado este argumento. Remete, a este propósito, para o articulado apresentado à Divisão de Oposição em 10 de março de 2008 e para o articulado apresentado à Câmara de Recurso em 22 de dezembro de 2009, no qual fazia referência ao articulado de 10 de março de 2008. Considera que podia proceder a essa remissão para a Câmara de Recurso, porque, como a Divisão de Oposição tinha reconhecido força distintiva intrínseca normal às marcas anteriores, ela não era obrigada a repetir os seus articulados de forma explícita. Defende que não viu necessidade de enviar documentos relativos à utilização da sua marca, dado que podia supor que o objeto do processo de recurso era constituído pela decisão da Divisão de Oposição relativa unicamente à marca comunitária anterior e à marca solicitada.

64      A este respeito, importa recordar vários elementos.

65      Na sequência de um pedido do requerente da marca no procedimento na Divisão de Oposição, foi pedido à recorrente que, nos termos do artigo 42.°, n.° 2, do Regulamento n.° 207/2009, apresentasse prova da utilização séria das suas marcas anteriores, registadas há mais de cinco anos à data da oposição.

66      Em resposta a este pedido, a recorrente juntou ao seu articulado de 10 de março de 2008 provas destinadas a demonstrar a utilização séria das suas marcas anteriores. Nesse articulado, indicou também que «[a] comercialização desses produtos, vendidos praticamente em toda a União Europeia e na Suíça, [fazia] prova não só da utilização séria da marca que fundamentava a sua oposição mas também do seu caráter distintivo acrescido pela utilização». Além disso, especificou que «os produtos [eram] parcialmente idênticos e que os termos das marcas [eram] semelhantes e que, além disso, as marcas anteriores WESERGOLD que fundamentavam a oposição [tinham] um caráter distintivo intrínseco normal, consideravelmente acrescido pela utilização, pelo que [existia] um risco de confusão entre as marcas».

67      Na sua decisão de 11 de junho de 2009, a Divisão de Oposição deferiu os pedidos da recorrente, indicando que existia risco de confusão entre os sinais em conflito. A requerente da marca, interveniente no presente processo, interpôs na Câmara de Recurso um recurso da referida decisão da Divisão de Oposição. A recorrente no presente processo interveio no processo que decorreu na Câmara de Recurso, para defender a sua oposição e a decisão da Divisão de Oposição.

68      Na sua contestação de 22 de dezembro de 2009 na Câmara de Recurso, a recorrente remeteu para os documentos apresentados no processo de oposição, nomeadamente o articulado de 10 de março de 2008.

69      Por último, na decisão recorrida, a Câmara de Recurso considerou que «a oponente não [tinha] invocado um aumento do caráter distintivo das marcas anteriores, resultante da sua utilização» (v. n.° 40 da decisão recorrida).

70      Como resulta do que precede, a recorrente, na sua defesa perante a Câmara de Recurso, não avançou expressamente argumentos quanto ao caráter distintivo acrescido pela utilização das marcas anteriores. A recorrente limitou‑se a remeter para os seus articulados no processo na Divisão de Oposição. Contudo, os referidos articulados continham uma alegação sustentada em provas de que as marcas anteriores gozavam de um caráter distintivo acrescido pela utilização.

71      Ora, nos termos do artigo 64.°, n.° 1, do Regulamento n.° 207/2009, após analisar o mérito do recurso, a Câmara de Recurso delibera sobre o mesmo e, ao fazê‑lo, pode «exercer as competências da instância que tomou a decisão contestada», isto é, no caso vertente, pronunciar‑se ela própria sobre a oposição, indeferindo‑a ou julgando‑a procedente, confirmando ou infirmando nessa medida a decisão impugnada. Resulta, assim, do artigo 64.°, n.° 1, do Regulamento n.° 207/2009 que, por força do recurso nela interposto, a Câmara de Recurso é chamada a proceder a uma nova apreciação integral do mérito da oposição, tanto quanto à matéria de direito como à matéria de facto [acórdão do Tribunal de Justiça de 13 de março de 2007, IHMI/Kaul, C‑29/05 P, Colet., p. I‑2213, n.° 57; acórdãos do Tribunal Geral de 23 de setembro de 2003, Henkel/IHMI ― LHS (UK) (KLEENCARE), T‑308/01, Colet., p. II‑3253, n.° 29, e de 14 de dezembro de 2011, Völkl/IHMI ― Marker Völkl (VÖLKL), T‑504/09, Colet., p. I‑8179, n.° 53].

72      Independentemente do facto de a recorrente se ter referido expressamente, na Câmara de Recurso, aos seus articulados apresentados à Divisão de Oposição, a Câmara de Recurso estava obrigada a examinar o conjunto dos argumentos apresentados à Divisão de Oposição. Assim, na medida em que a recorrente, no processo na Divisão de Oposição, alegou o caráter distintivo acrescido pela utilização das marcas anteriores, a Câmara de Recurso não podia considerar que a recorrente não tinha invocado um aumento do caráter distintivo das marcas anteriores, resultante da sua utilização.

73      Daí resulta que a Câmara de Recurso cometeu, no caso em apreço, um erro na aplicação do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009.

74      Esta conclusão não é posta em causa pelos diferentes argumentos do IMHI e da interveniente.

75      Assim, no que diz respeito ao argumento do IHMI segundo o qual a recorrente mencionou o caráter distintivo acrescido pela utilização, unicamente numa proposta subordinada no âmbito do debate sobre a questão da prova da utilização séria das marcas anteriores e, portanto, fora de prazo, há que observar o seguinte.

76      Resulta do processo do IHMI que, num ofício de 8 de janeiro de 2008, a Divisão de Oposição convidou a recorrente a tomar posição sobre a questão da utilização séria tanto da marca polaca anterior registada sob o número 161413 como da marca alemã anterior registada sob o número 902472. Em particular, foi‑lhe pedido que tomasse posição e apresentasse prova das referidas utilizações, num prazo de dois meses a contar da data do referido ofício, isto é, até 9 de março de 2008. Foi, além disso, indicado que o prazo que lhe tinha sido concedido para apresentar factos, provas ou observações em apoio da sua oposição era igualmente prorrogado até 9 de março de 2008.

77      A recorrente respondeu a este ofício através do seu articulado de 10 de março de 2008, enviado por telecópia no mesmo dia ao IHMI. Conforme indicado no n.° 66, supra, nesse articulado, a recorrente forneceu elementos de prova em apoio da utilização séria das suas marcas anteriores e alegou o caráter distintivo acrescido pela utilização dessas marcas.

78      Contrariamente ao que alega o IHMI no Tribunal Geral, a circunstância de a recorrente alegar o caráter distintivo acrescido pela utilização das marcas anteriores, na sua resposta ao pedido de prova da utilização séria das suas marcas anteriores, não torna tardia a sua argumentação sobre o caráter distintivo acrescido pela utilização das marcas anteriores. Com efeito, no seu ofício de 8 de janeiro de 2008, a Divisão de Oposição autorizou expressamente a recorrente a apresentar factos, provas ou observações em apoio da sua oposição, até 9 de março de 2008.

79      Além disso, não se pode considerar que o articulado da recorrente de 10 de março de 2008 foi enviado ao IHMI fora de prazo. Com efeito, em aplicação da regra 72 do Regulamento (CE) n.° 2868/95 da Comissão, de 13 de dezembro de 1995, relativo à execução do Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, sobre a marca comunitária (JO L 203, p. 1), se um prazo termina num dia em que não podem ser entregues documentos no IHMI, o prazo é prorrogado até ao primeiro dia em que os documentos podem ser entregues e o correio ordinário distribuído. Esta regra prevê que os dias em que os documentos podem ser entregues no IHMI são fixados pelo presidente do IHMI antes do início de cada ano civil. Ora, para o ano de 2008, o presidente do IHMI adotou, em 17 de dezembro de 2007, a Decisão EX‑07‑05, relativa aos dias de encerramento do IHMI para a entrega de documentos e aos dias em que o correio ordinário não é distribuído. Nessa decisão, é mencionada a Decisão ADM‑95‑23 do presidente do IHMI, de 22 de dezembro de 1995 (JO IHMI, 1995, p. 487), na qual se dispôs que o IHMI não estava aberto ao público, aos sábados e aos domingos. Sendo o dia 9 de março de 2008 um domingo, a apresentação do articulado da recorrente, em 10 de março de 2008, não foi feita fora de prazo. Isto foi reconhecido pelo IHMI na audiência.

80      Além disso, dado que o IHMI refere a não invocação precisa, na contestação apresentada à Câmara de Recurso, do caráter distintivo acrescido pela utilização, há que observar que esta circunstância não afeta a obrigação da Câmara de Recurso, quando se pronuncia sobre a oposição, de proceder a um exame integral do mérito da oposição, tanto quanto à matéria de direito como à matéria de facto. Com efeito, a extensão do exame que a Câmara de Recurso está obrigada a efetuar no que toca à decisão objeto de recurso não é, em princípio, determinada pelos fundamentos invocados pela parte que interpôs o recurso (acórdão KLEENCARE, referido no n.° 71, supra, n.° 29). Por maioria de razão, a extensão do exame da Câmara de Recurso não está limitada pela falta de precisão de certos fundamentos de defesa invocados na Câmara de Recurso. Ora, pelos motivos expostos nos n.os 76 e seguintes, supra, o exame completo do mérito da oposição implicava a análise do caráter distintivo acrescido pela utilização das marcas anteriores.

81      Uma vez que a interveniente e o IHMI consideram que o argumento da recorrente baseado no caráter distintivo acrescido pela utilização é infundado e não está alicerçado em provas adequadas, cabe observar que não é essa a fundamentação exposta pela Câmara de Recurso na decisão recorrida. Dado que a Câmara de Recurso não apreciou, como devia, os argumentos e provas relativos ao caráter distintivo acrescido pela utilização, não compete ao Tribunal Geral proceder à apreciação desses mesmos argumentos e provas no âmbito do pedido de anulação da decisão recorrida. Com efeito, no contexto de um pedido desta natureza, o Tribunal Geral não pode, no exercício da sua fiscalização da legalidade, substituir‑se à Câmara de Recurso, efetuando uma apreciação factual que esta não realizou. Ora, no âmbito de um recurso de anulação como o presente, se o Tribunal Geral concluir que a decisão da Câmara de Recurso, posta em causa num recurso que lhe foi submetido, está ferida de ilegalidade, deve anulá‑la. Não pode negar provimento ao recurso, substituindo a fundamentação da instância competente do IHMI, autora do ato impugnado, pela sua fundamentação [acórdão do Tribunal Geral de 9 de setembro de 2010, Axis/IHMI ― Etra Investigación y Desarrollo (ETRAX), T‑70/08, Colet., p. II‑4645, n.° 29].

82      Face ao exposto, há que concluir que a Câmara de Recurso declarou erradamente que a recorrente não tinha reivindicado o caráter distintivo acrescido das marcas anteriores, devido à sua utilização. Este erro implica que a Câmara de Recurso não examinou um fator potencialmente pertinente na apreciação global da existência de risco de confusão entre a marca contestada e as marcas anteriores (v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 7 de fevereiro de 2012, Dosenbach Ochsner/IHMI ― Sisma (Representação de elefantes num retângulo), T‑424/10, ainda não publicado na Coletânea, n.os 55 e segs. e jurisprudência aí referida).

83      Importa lembrar que, nos termos do artigo 62.°, n.° 1, primeiro período, do Regulamento n.° 40/94 [atual artigo 64.°, n.° 1, primeiro período, do Regulamento n.° 207/2009], depois de analisar o mérito do recurso, a Câmara de Recurso delibera sobre ele. Esta obrigação de análise do recurso inclui ter em conta o caráter distintivo adquirido pela utilização, quando este argumento é alegado. Não se exclui que a apreciação do fundamento dos argumentos e dos elementos de prova apresentados pela recorrente no processo no IHMI, quanto ao caráter distintivo adquirido pela utilização, tivesse levado a Câmara de Recurso a adotar uma decisão de conteúdo diferente do da decisão recorrida. Por conseguinte, não tendo procedido a essa análise, a Câmara de Recurso cometeu uma violação de formalidades essenciais que deve implicar a anulação do ato recorrido [v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 10 de junho de 2008, Gabel Industria Tessile/IHMI ― Creaciones Garel (GABEL), T‑85/07, Colet., p. II‑823, n.° 20].

84      Por conseguinte, há que acolher o primeiro fundamento da recorrente e, portanto, anular a decisão recorrida, sem que seja necessário pronunciar‑se sobre os outros fundamentos invocados pela recorrente.

 Quanto às despesas

85      Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

86      No caso em apreço, o IHMI e a interveniente foram vencidos. Portanto, por um lado, há que condenar o IHMI a suportar, além das suas próprias despesas, as despesas efetuadas pela recorrente, em conformidade com o pedido desta. Por outro lado, há que decidir que a interveniente suportará as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção)

decide:

1)      É anulada a decisão da Primeira Câmara de Recurso do Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), de 24 de março de 2010 (processo R 770/2009‑1).

2)      O IHMI suportará, além das suas próprias despesas, as despesas efetuadas pela Wesergold Getränkeindustrie GmbH & Co. KG.

3)      A Lidl Stiftung & Co. KG suportará as suas próprias despesas.

Azizi

Frimodt Nielsen

Kancheva

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 21 de setembro de 2012.

Assinaturas

Índice


Antecedentes do litígio

Pedidos das partes

Questão de direito

Observações preliminares

Quanto ao público relevante

Quanto à comparação dos produtos

Quanto à comparação dos sinais em conflito

Observações preliminares

Quanto à comparação visual

Quanto à comparação fonética

Quanto à comparação conceptual

Avaliação provisória

Quanto ao caráter distintivo das marcas anteriores

Quanto ao caráter distintivo intrínseco das marcas anteriores

Quanto ao caráter distintivo acrescido pela utilização

Quanto às despesas


* Língua do processo: alemão.