Language of document : ECLI:EU:T:2020:435

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção alargada)

23 de setembro de 2020 (*)

«União Económica e Monetária — União bancária — Mecanismo Único de Resolução de instituições de crédito e de certas empresas de investimento (MUR) — Fundo Único de Resolução (FUR) — Decisão do CUR relativa ao cálculo das contribuições ex ante para 2017 — Recurso de anulação — Afetação direta e individual — Admissibilidade — Formalidades essenciais — Autenticação da decisão — Dever de fundamentação — Direito a uma proteção jurisdicional efetiva — Exceção de ilegalidade — Limitação dos efeitos do acórdão no tempo»

No processo T‑411/17,

Landesbank BadenWürttemberg, estabelecida em Estugarda (Alemanha), representada por H. Berger e K. Rübsamen, advogados,

recorrente,

contra

Conselho Único de Resolução (CUR), representado por A. Martin‑Ehlers, S. Raes, T. Van Dyck e A. Kopp, advogados,

recorrido,

apoiado por

Comissão Europeia, representada por A. Steiblytė e K.‑P. Wojcik, na qualidade de agentes,

interveniente,

que tem por objeto um pedido, baseado no artigo 263.o TFUE, de anulação da Decisão do CUR na sua sessão executiva de 11 de abril de 2017 relativa ao cálculo das contribuições ex ante para 2017 para o Fundo Único de Resolução (SRB/ES/SRF/2017/05), na parte em que diz respeito à recorrente,

O TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção alargada),

composto por: A. M. Collins, presidente, M. Kancheva, R. Barents, J. Passer (relator) e G. De Baere, juízes,

secretário: S. Bukšek Tomac, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 12 de dezembro de 2019,

profere o presente

Acórdão

 Quadro jurídico

1        O presente processo insere‑se no segundo pilar da união bancária, relativo ao Mecanismo Único de Resolução (MUR), instituído pelo Regulamento (UE) n.o 806/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de julho de 2014, que estabelece regras e um procedimento uniformes para a resolução de instituições de crédito e de certas empresas de investimento no quadro de um Mecanismo Único de Resolução e de um Fundo Único de Resolução bancária e que altera o Regulamento (UE) n.o 1093/2010 (JO 2014, L 225, p. 1). A criação do MUR tem por objetivo o reforço da integração do quadro de resolução nos Estados‑Membros da zona euro e nos Estados‑Membros que não fazem parte da zona euro e optam por participar no Mecanismo Único de Supervisão (MUS) (a seguir «Estados‑Membros participantes»).

2        Mais especificamente, este processo diz respeito ao Fundo Único de Resolução (FUR) instituído pelo artigo 67.o, n.o 1, do Regulamento n.o 806/2014. O FUR é financiado pelas contribuições das instituições, cobradas a nível nacional, nomeadamente sob a forma de contribuições ex ante, em aplicação do artigo 67.o, n.o 4, do mesmo regulamento. Nos termos do artigo 3.o, n.o 1, ponto 13, do referido regulamento, o conceito de instituição refere‑se a uma instituição de crédito ou uma empresa de investimento abrangida pela supervisão em base consolidada nos termos do artigo 2.o, alínea c), do mesmo regulamento. As contribuições são transferidas para a União Europeia em conformidade com o acordo intergovernamental sobre a transferência e mutualização das contribuições para o FUR, assinado em Bruxelas (Bélgica) em 21 de maio de 2014.

3        O artigo 70.o do Regulamento n.o 806/2014, sob a epígrafe «Contribuições ex ante», dispõe:

«1.      A contribuição de cada instituição é cobrada pelo menos uma vez por ano e é calculada proporcionalmente ao montante do seu passivo (excluindo os fundos próprios) menos os depósitos cobertos, em relação ao passivo agregado (excluindo os fundos próprios) menos os depósitos cobertos, de todas as instituições autorizadas no território de todos os Estados‑Membros participantes.

2.      Todos os anos, o CUR, após consulta do BCE ou da autoridade nacional competente, e em estreita cooperação com as autoridades nacionais de resolução, calcula as contribuições individuais para garantir que as contribuições devidas por todas as instituições autorizadas no território de todos os Estados‑Membros participantes não excedem 12,5 % do nível‑alvo.

Cada ano, o cálculo das contribuições de instituições individuais deve ter por base:

a)      Uma contribuição fixa, calculada proporcionalmente com base no montante do passivo, excluindo os fundos próprios e os depósitos cobertos, em relação ao passivo total, excluindo os fundos próprios e os depósitos cobertos, das instituições autorizadas no território dos Estados‑Membros participantes; e

b)      Uma contribuição adaptada ao risco, que deve ser feita com base nos critérios estabelecidos no artigo 103.o, n.o 7, da Diretiva 2014/59/UE, tendo em conta o princípio da proporcionalidade, sem criar distorções entre estruturas do setor bancário dos Estados‑Membros.

A relação entre a contribuição fixa e as contribuições adaptadas ao risco deve ter em conta uma distribuição equilibrada das contribuições entre os diferentes tipos de bancos.

Em qualquer caso, o montante agregado das contribuições individuais de todas as instituições autorizadas no territórios de todos os Estados‑Membros participantes, calculadas nos termos das alíneas a) e b), não pode exceder, anualmente, 12,5 % do nível‑alvo.

[…]

6.      São aplicados os atos delegados que especificam a noção de ajustamento das contribuições em proporção ao perfil de risco das instituições, adotados pela Comissão nos termos do artigo 103.o, n.o 7, da Diretiva 2014/59/UE.

7.      O Conselho, deliberando sob proposta da Comissão, adota, no âmbito dos atos delegados referidos no n.o 6, atos de execução para determinar as condições de aplicação dos n.os 1, 2 e 3 e, em especial, no que diz respeito:

a)      À aplicação do método de cálculo das contribuições individuais;

b)      Às modalidades práticas de atribuição às instituições dos fatores de risco especificados no ato delegado.»

4        O Regulamento n.o 806/2014 foi completado, no que se refere a estas contribuições ex ante, pelo Regulamento de Execução (UE) 2015/81 do Conselho, de 19 de dezembro de 2014, que especifica condições de aplicação uniformes do Regulamento n.o 806/2014 no que se refere às contribuições ex ante para o FUR (JO 2015, L 15, p. 1).

5        Por outro lado, o Regulamento n.o 806/2014 e o Regulamento de Execução 2015/81 fazem referência a certas disposições contidas em dois outros atos:

–        por um lado, a Diretiva 2014/59/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014, que estabelece um enquadramento para a recuperação e a resolução de instituições de crédito e de empresas de investimento e que altera a Diretiva 82/891/CEE do Conselho, e as Diretivas 2001/24/CE, 2002/47/CE, 2004/25/CE, 2005/56/CE, 2007/36/CE, 2011/35/UE, 2012/30/UE e 2013/36/UE e os Regulamentos (UE) n.o 1093/2010 e (UE) n.o 648/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho (JO 2014, L 173, p. 190);

–        por outro lado, o Regulamento Delegado (UE) 2015/63 da Comissão, de 21 de outubro de 2014, que complementa a Diretiva 2014/59 no que se refere às contribuições ex ante para os mecanismos de financiamento da resolução (JO 2015, L 11, p. 44).

6        O Conselho Único de Resolução (CUR) foi criado como agência da União (artigo 42.o do Regulamento n.o 806/2014). Inclui, nomeadamente, uma sessão plenária e uma sessão executiva (artigo 43.o, n.o 5, do Regulamento n.o 806/2014). O CUR em sessão executiva toma todas as decisões para efeitos da aplicação do Regulamento n.o 806/2014, salvo disposto em contrário nesse regulamento [artigo 54.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 806/2014].

 Antecedentes do litígio

7        A recorrente, Landesbank Baden‑Württemberg, é uma instituição de crédito estabelecida na Alemanha. Está integrada no sistema de proteção institucional (a seguir «SPI») da Sparkassen‑Finanzgruppe (grupo financeiro das instituições de poupança, Alemanha).

8        Em 26 de janeiro de 2017, a recorrente transmitiu à autoridade de resolução alemã, a Bundesanstalt für Finanzmarktstabilisierung (Serviço Federal de Estabilização dos Mercados Financeiros, Alemanha; a seguir «FMSA»), a sua declaração para efeitos da contribuição ex ante para 2017.

9        Por Decisão de 11 de abril de 2017 relativa ao cálculo das contribuições ex ante para 2017 para o FUR (SRB/ES/SRF/2017/05; a seguir «decisão recorrida»), o CUR, na sua sessão executiva, decidiu, ao abrigo dos artigos 54.o, n.o 1, alínea b), e 70.o, n.o 2, do Regulamento n.o 806/2014, o montante da contribuição ex ante de cada instituição, incluindo da recorrente, para 2017.

10      Por aviso de cobrança de 21 de abril de 2017, recebido em 24 de abril de 2017, a FMSA informou a recorrente de que o CUR tinha fixado a sua contribuição ex ante para 2017 para o FUR e indicou‑lhe o montante a pagar ao Restrukturierungsfonds (Fundo de Reestruturação, Alemanha) (a seguir «aviso de cobrança»). A FMSA juntou dois documentos ao aviso de cobrança, a saber, uma versão alemã do texto da decisão recorrida, sem o anexo que esse texto menciona, e um documento intitulado «Detalhes do cálculo (ajustado ao risco): Contribuições ex ante para o [FUR] para 2017» (a seguir «documento intitulado “Detalhes do cálculo”»).

 Tramitação do processo e pedidos das partes

11      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 30 de junho de 2017, a recorrente interpôs o presente recurso.

12      Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 29 de setembro de 2017, a Comissão Europeia pediu para intervir em apoio dos pedidos do CUR.

13      Por Decisão de 13 de novembro de 2017, o presidente da Oitava Secção do Tribunal Geral (antiga composição) deferiu o pedido de intervenção da Comissão.

14      Sob proposta da Oitava Secção do Tribunal Geral (antiga composição), este decidiu, em aplicação do artigo 28.o do seu Regulamento de Processo, remeter o processo a uma formação de julgamento alargada.

15      Como medida de organização do processo, adotada em 12 de fevereiro de 2019 ao abrigo do artigo 89.o do Regulamento de Processo, em primeiro lugar, o Tribunal Geral convidou o CUR a apresentar, por um lado, a cópia integral do original da decisão recorrida, incluindo o seu anexo, e, por outro, todas as decisões intermédias por ele tomadas e que estão na base do cálculo da contribuição ex ante para 2017. Em segundo lugar, o Tribunal Geral convidou o CUR a descrever o processo de adoção da decisão recorrida, fornecendo os documentos justificativos. Em terceiro lugar, o CUR foi convidado a precisar, a respeito dos dados do quadro relativo aos intervalos para o multiplicador de ajustamento em função do perfil de risco e publicado no seu sítio Internet, mencionados no n.o 154 da contestação e no n.o 102 da tréplica, a data da primeira publicação desses dados. Em quarto lugar, o CUR foi convidado a indicar os valores do multiplicador para o indicador SPI e os do multiplicador de ajustamento em função do perfil de risco aplicados, no âmbito da decisão recorrida, no caso das outras instituições mencionadas no anexo A.12 da petição.

16      Por requerimento de 20 de março de 2019, o CUR respondeu a essa medida de organização do processo. No que diz respeito ao pedido de apresentação de documentos, indicou, em substância, não poder apresentar os documentos por razões de confidencialidade. Por este motivo, pediu ao Tribunal Geral que adotasse uma diligência de instrução.

17      Por Despacho de 10 de abril de 2019, o Tribunal Geral ordenou ao CUR, com base, por um lado, no artigo 24.o, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia e, por outro, no artigo 91.o, alínea b), no artigo 92.o, n.o 3, e no artigo 103.o do Regulamento de Processo, que apresentasse, em versões não confidencial e confidencial, as cópias integrais do original da decisão recorrida, incluindo o seu anexo, de todas as decisões intermédias por ele tomadas e que estão na base do cálculo da contribuição ex ante para 2017, de todos os documentos justificativos relativos ao procedimento de adoção da decisão recorrida, e os valores dos multiplicadores acima referidos no n.o 15.

18      Por peça de 3 de maio de 2019, o CUR respondeu ao Despacho de 10 de abril de 2019. Quanto à decisão recorrida, o CUR explicou que o seu anexo tinha sido adotado em formato XLSX. No entanto, o documento apresentado ao Tribunal Geral estava em formato PDF. Quanto às decisões intermédias, o CUR apresentou, por um lado, decisões relativas ao cálculo das contribuições ex ante para 2016 e, por outro, projetos de decisões e notas de síntese (cover notes). Por último, o CUR deu algumas indicações sobre os valores dos multiplicadores acima referidos no n.o 15.

19      Com vista a permitir que o CUR completasse a resposta acima referida no n.o 18, o Tribunal Geral adotou, em 9 de setembro de 2019, um segundo despacho relativo a diligências de instrução.

20      Por peça de 26 de setembro de 2019, o CUR respondeu ao Despacho de 9 de setembro de 2019 e apresentou, por um lado, uma cópia, em formato PDF, do texto da decisão recorrida e, quanto ao anexo desta, um dispositivo de memória USB contendo, em versões não confidencial e confidencial, um ficheiro em formato XLSX. Por outro lado, o CUR apresentou, em versões não confidencial e confidencial, onze documentos que descrevem o procedimento de aprovação na sua sessão executiva dos projetos de decisões contidos nas notas de síntese acima referidas no n.o 18 ou anexos a estas. Por último, apresentou um quadro anonimizado dos valores dos multiplicadores acima referidos no n.o 15.

21      Por Despacho de 10 de outubro de 2019, na sequência do exame previsto no artigo 103.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, o Tribunal Geral desentranhou dos autos todos os documentos apresentados pelo CUR em versão confidencial em resposta aos Despachos relativos às diligências de instrução de 10 de abril e 9 de setembro de 2019 e considerou que as versões não confidenciais das notas de síntese acima referidas no n.o 18 continham passagens ocultadas que eram simultaneamente relevantes para o litígio e não confidenciais. Por conseguinte, ordenou ao CUR que apresentasse novas versões não confidenciais das referidas notas.

22      Por peça de 18 de outubro de 2019, o CUR deu cumprimento a esse despacho.

23      Por cartas de 6 de novembro de 2019, a recorrente e a Comissão apresentaram as suas observações relativamente às respostas do CUR à medida de organização do processo de 12 de fevereiro de 2019, aos Despachos relativos às diligências de instrução de 10 de abril e 9 de setembro de 2019 e ao Despacho de 10 de outubro de 2019.

24      A recorrente conclui pedindo, em substância, que o Tribunal Geral se digne:

–        anular a decisão recorrida na parte em que lhe diz respeito;

–        condenar o CUR nas despesas.

25      O CUR conclui pedindo, em substância, que o Tribunal Geral se digne:

–        julgar o recurso inadmissível ou improcedente;

–        a título subsidiário, no caso de o Tribunal Geral decidir anular a decisão recorrida, diferir os efeitos da anulação por seis meses após o acórdão se ter tornado definitivo;

–        condenar a recorrente nas despesas.

26      A Comissão não apresentou articulado de intervenção no prazo concedido.

 Questão de direito

 Quanto à admissibilidade

27      Nos seus articulados, o CUR contestou, em substância, a legitimidade da recorrente para pedir a anulação da decisão recorrida, alegando que esta não lhe dizia direta e individualmente respeito e que só o aviso de cobrança podia ter efeitos na sua situação.

28      Há que observar que, no seu Acórdão de 3 de dezembro de 2019, Iccrea Banca (C‑414/18, EU:C:2019:1036, n.o 65), o Tribunal de Justiça declarou, em substância, que, embora os destinatários das decisões do CUR sobre o cálculo das contribuições ex ante para o FUR sejam, em conformidade com o artigo 5.o, n.o 1, do Regulamento de Execução 2015/81, as autoridades nacionais de resolução (a seguir «ANR»), essas decisões dizem, sem dúvida, individual e diretamente respeito às instituições responsáveis pelo pagamento dessas contribuições.

29      Daqui resulta que a recorrente tem legitimidade para pedir a anulação da decisão recorrida, o que o CUR reconheceu na audiência e ficou registado na ata da audiência.

30      Quanto ao argumento do CUR de que o recurso é «diretamente dirigido […] contra os regulamentos e diretivas que dizem respeito ao sistema de cálculo das contribuições ex ante» e deve, por este motivo, ser julgado inadmissível, há que salientar que o presente recurso visa unicamente a anulação da decisão recorrida. O Regulamento Delegado 2015/63 não é objeto de um pedido de anulação, mas constitui o ato de alcance geral contra o qual o recorrente dirige uma exceção de ilegalidade.

31      A este respeito, importa acrescentar que, em conformidade com o artigo 277.o TFUE, mesmo depois de decorrido o prazo previsto no artigo 263.o, sexto parágrafo, TFUE, qualquer parte pode, em caso de litígio que ponha em causa um ato de alcance geral adotado por uma instituição, um órgão ou um organismo da União, recorrer aos meios previstos no artigo 263.o, segundo parágrafo, TFUE, para arguir, perante os órgãos jurisdicionais da União, a inaplicabilidade desse ato.

32      Por conseguinte, na medida em que o presente recurso é dirigido contra uma decisão do CUR, adotada com base num ato de alcance geral adotado por uma instituição da União, esse recurso não pode ser considerado inadmissível, no todo ou em parte, pelo simples facto de, no âmbito desse recurso, a recorrente invocar a inaplicabilidade desse ato ao abrigo do artigo 277.o TFUE.

33      Por outro lado, na medida em que, segundo jurisprudência constante, o ato geral cuja ilegalidade é arguida tem de ser aplicável, direta ou indiretamente, ao caso objeto do recurso e tem de existir uma ligação jurídica direta entre a decisão individual impugnada e o ato geral em causa (v. Acórdão de 17 de fevereiro de 2017, Islamic Republic of Iran Shipping Lines e o./Conselho, T‑14/14 e T‑87/14, EU:T:2017:102, n.o 55 e jurisprudência aí referida), basta salientar que a decisão recorrida cita o Regulamento Delegado 2015/63 — cuja ilegalidade a recorrente alega no que respeita aos seus artigos 4.o a 7.o e 9.o, bem como ao seu anexo I (v. n.o 35, infra) — como uma das suas bases jurídicas. Além disso, resulta dos autos que a contribuição ex ante da recorrente para 2017 foi calculada segundo o método denominado «ajustado ao risco», portanto, precisamente em aplicação, nomeadamente, das referidas disposições do Regulamento Delegado 2015/63.

34      Resulta destas considerações que o presente recurso é admissível tanto no que respeita ao pedido de anulação da decisão recorrida como no que respeita à exceção de ilegalidade invocada pela recorrente.

 Quanto ao mérito

35      A recorrente invoca seis fundamentos de recurso, relativos:

–        o primeiro, à violação do artigo 296.o, n.o 2, TFUE e do artigo 41.o, n.os 1 e 2, alínea c), da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta») por falta de fundamentação da decisão recorrida;

–        o segundo, à violação do artigo 41.o, n.os 1 e 2, alínea a), da Carta por não ter sido ouvida;

–        o terceiro, à violação do artigo 47.o, n.o 1, da Carta devido ao caráter inverificável da decisão recorrida;

–        o quarto, à violação do artigo 103.o, n.o 7, alínea h), da Diretiva 2014/59, do artigo 113.o, n.o 7, do Regulamento (UE) n.o 575/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativo aos requisitos prudenciais para as instituições de crédito e para as empresas de investimento e que altera o Regulamento (UE) n.o 648/2012 (JO 2013, L 176, p. 1), do artigo 6.o, n.o 5, primeiro período, do Regulamento Delegado 2015/63, dos artigos 16.o e 20.o da Carta e do princípio da proporcionalidade devido à aplicação do multiplicador para o indicador SPI;

–        o quinto, à violação do artigo 16.o da Carta e do princípio da proporcionalidade, devido à aplicação do multiplicador de ajustamento em função do perfil de risco;

–        o sexto, à ilegalidade dos artigos 4.o a 7.o e 9.o do Regulamento Delegado 2015/63 e do anexo I desse regulamento.

36      Antes de mais, há que analisar o fundamento de ordem pública de preterição de formalidades essenciais que é de conhecimento oficioso do juiz da União (v., neste sentido, Acórdãos de 2 de abril de 1998, Commission/Sytraval e Brink’s France, C‑367/95 P, EU:C:1998:154, n.o 67; de 30 de março de 2000, VBA/Florimex e o., C‑265/97 P, EU:C:2000:170, n.o 114; de 6 de março de 2003, Westdeutsche Landesbank Girozentrale e Land Nordrhein‑Westfalen/Comissão, T‑228/99 e T‑233/99, EU:T:2003:57, n.o 143; e de 28 de novembro de 2019, Banco Cooperativo Español/CUR, T‑323/16, EU:T:2019:822, n.o 70 e jurisprudência aí referida).

37      A preterição de formalidades essenciais abrange, nomeadamente, a falta de autenticação de um ato (v., neste sentido, Acórdãos de 15 de junho de 1994, Comissão/BASF e o., C‑137/92 P, EU:C:1994:247, n.os 75 e 76, e de 6 de abril de 2000, Comissão/ICI, C‑286/95 P, EU:C:2000:188, n.os 40 e 41) e a falta ou a insuficiência da fundamentação (v. Acórdão de 15 de junho de 2017, Espanha/Comissão, C‑279/16 P, não publicado, EU:C:2017:461, n.o 22 e jurisprudência aí referida), sendo esta última questão o objeto do primeiro fundamento de anulação, que deve ser analisado em conjunto com os terceiro e sexto fundamentos.

 Quanto à autenticação da decisão recorrida

38      Há que lembrar que o Tribunal de Justiça já declarou que, uma vez que o elemento intelectual e o elemento formal constituem um todo indissociável, a forma escrita do ato é a expressão necessária da vontade da autoridade que o pratica (Acórdãos de 15 de junho de 1994, Comissão/BASF e o., C‑137/92 P, EU:C:1994:247, n.o 70; de 6 de abril de 2000, Comissão/ICI, C‑286/95 P, EU:C:2000:188, n.o 38; e de 28 de novembro de 2019, Banco Cooperativo Español/CUR, T‑323/16, EU:T:2019:822, n.o 74).

39      A autenticação do ato tem por objetivo garantir a segurança jurídica através da fixação definitiva do texto adotado pelo autor do ato e constitui uma formalidade essencial (Acórdãos de 15 de junho de 1994, Comissão/BASF e o., C‑137/92 P, EU:C:1994:247, n.os 75 e 76; de 6 de abril de 2000, Comissão/ICI, C‑286/95 P, EU:C:2000:188, n.os 40 e 41; e de 28 de novembro de 2019, Banco Cooperativo Español/CUR, T‑323/16, EU:T:2019:822, n.o 75).

40      Já se considerou igualmente que a preterição de uma formalidade essencial se constitui pela simples falta do ato, sem que seja necessário demonstrar também que o ato está ferido de outro vício ou que a falta de autenticação causou danos a quem a invoca (Acórdãos de 6 de abril de 2000, Comissão/ICI, C‑286/95 P, EU:C:2000:188, n.o 42, e de 28 de novembro de 2019, Banco Cooperativo Español/CUR, T‑323/16, EU:T:2019:822, n.o 76).

41      A fiscalização do respeito da formalidade da autenticação e, assim, do caráter certo do ato é prévia a qualquer outra fiscalização como a da competência do autor do ato, do respeito do princípio da colegialidade ou ainda do respeito do dever de fundamentação dos atos (Acórdãos de 6 de abril de 2000, Comissão/ICI, C‑286/95 P, EU:C:2000:188, n.o 46, e de 28 de novembro de 2019, Banco Cooperativo Español/CUR, T‑323/16, EU:T:2019:822, n.o 77).

42      Se, do exame do ato que lhe é apresentado, o juiz da União verificar que este não foi regularmente autenticado, deve conhecer oficiosamente do fundamento de preterição de uma formalidade essencial de falta de autenticação regular e, consequentemente, anular o ato ferido desse vício (Acórdãos de 6 de abril de 2000, Comissão/ICI, C‑286/95 P, EU:C:2000:188, n.o 51, e de 28 de novembro de 2019, Banco Cooperativo Español/CUR, T‑323/16, EU:T:2019:822, n.o 78).

43      Pouco importa, a esse respeito, que a falta de autenticação não tenha causado qualquer dano a uma das partes no litígio. Com efeito, a autenticação de documentos é uma formalidade essencial na aceção do artigo 263.o TFUE, essencial para a segurança jurídica, cuja violação leva à anulação do ato viciado, sem que seja necessário demonstrar a existência desse dano (Acórdãos de 6 de abril de 2000, Comissão/ICI, C‑286/95 P, EU:C:2000:188, n.o 52, e de 28 de novembro de 2019, Banco Cooperativo Español/CUR, T‑323/16, EU:T:2019:822, n.o 79; v. também, neste sentido, Acórdão de 8 de setembro de 2016, Goldfish e o./Comissão, T‑54/14, EU:T:2016:455, n.o 47).

44      No caso, na sua resposta à medida de organização do processo adotada em 12 de fevereiro de 2019, o CUR indica que a decisão recorrida foi adotada por procedimento escrito, em conformidade com o artigo 7.o, n.o 5, e com o artigo 9.o das regras de processo do CUR em sessão executiva, conforme adotadas pela Decisão do CUR em sessão plenária, de 29 de abril de 2015 (SRB/PS/2015/8), iniciada pelo envio aos membros da sessão executiva do CUR, por correio eletrónico, de documentos contendo, nomeadamente, um documento em formato DOC correspondente ao projeto de texto da decisão recorrida e um documento em formato XLSX correspondente ao projeto do anexo ao qual se refere o texto da decisão recorrida.

45      A este respeito, decorre da resposta do CUR ao Despacho de 10 de abril de 2019 que, em 11 de abril de 2017, na sequência da aprovação, igualmente através de correios eletrónicos, dos dois documentos acima mencionados no n.o 44, conforme alterados durante o procedimento, por todos os membros da sessão executiva, o Secretariado do CUR imprimiu o documento em formato DOC (texto da decisão recorrida, sem o seu anexo) e a presidente do CUR assinou esse documento, bem como a ficha de encaminhamento relativa ao processo. A versão assinada do referido documento é conservada nas instalações do CUR.

46      Na sua resposta ao Despacho de 10 de abril de 2019, o CUR apresentou uma cópia desta versão assinada do texto da decisão recorrida, bem como uma cópia da referida ficha de encaminhamento.

47      Todavia, não se pode deixar de observar que o CUR não apresentou qualquer prova da autenticação do anexo da decisão recorrida, anexo esse que é um documento eletrónico em formato XLSX que inclui os montantes das contribuições ex ante e constitui, portanto, um elemento essencial dessa decisão.

48      Com efeito, o CUR não apresentou nenhuma versão do anexo da decisão recorrida com assinatura eletrónica, apesar de o referido anexo não estar de modo algum ligado de forma indissociável ao texto da decisão recorrida.

49      Quanto à ficha de encaminhamento acima evocada no n.o 45, cuja menção «Anexo(s): 2» [Documento(s) junto(s): 2] deveria, em teoria, significar que, no momento da sua assinatura manuscrita pela presidente do CUR, essa ficha era acompanhada de dois documentos juntos, a saber, do texto da decisão recorrida e de uma versão impressa do anexo, não se pode deixar de observar que, na realidade, não demonstra a presença de dois documentos juntos, que, de resto, nem sequer identifica.

50      Aliás, o CUR indicou, na audiência, não ter imprimido o anexo que, como já indicado, é um documento em formato XLSX, a saber, um documento eletrónico. Por conseguinte, a sua assinatura só podia ser eletrónica e esse documento não podia, portanto, ser junto fisicamente a uma ficha de encaminhamento elaborada em papel.

51      Ora, o CUR só menciona uma assinatura no que respeita ao texto da decisão recorrida. O CUR não demonstra a existência da assinatura eletrónica da presidente do CUR nesse anexo.

52      Quanto ao argumento apresentado pelo CUR na audiência, segundo o qual o anexo tinha estado disponível num sistema documental denominado ARES (Advanced Records System) no momento da assinatura da ficha de encaminhamento, não se pode deixar de observar que o argumento é novo e, a esse título, inadmissível, bem como, em todo o caso, não fundamentado.

53      A este respeito, há que observar que a ficha de encaminhamento não contém nenhum elemento que prove esta alegação e ainda menos um elemento que permita demonstrar uma ligação indissociável entre a referida ficha, assinada à mão pela presidente do CUR, e um documento alegadamente presente na ARES, que corresponderia ao anexo da decisão recorrida, conforme apresentada no Tribunal Geral.

54      Em definitivo, a assinatura manuscrita de uma ficha de encaminhamento que mencione dois documentos juntos sem os identificar, nem ser posteriormente a eles ligada de forma indissociável, e isto apesar de, na realidade, apenas existir um documento junto a essa ficha, não pode levar à autenticação de outro documento — o anexo em formato XLSX — alegadamente presente na ARES.

55      Resulta destas considerações que o requisito de autenticação da decisão recorrida não está preenchido.

56      O Tribunal Geral considera oportuno, no interesse de uma boa administração da justiça, pronunciar‑se igualmente sobre o primeiro fundamento, relativo à violação do dever de fundamentação, sobre o terceiro fundamento, relativo à violação do direito da recorrente a uma proteção jurisdicional efetiva, e sobre o sexto fundamento, relativo à exceção de ilegalidade de determinadas disposições do Regulamento Delegado 2015/63, sendo estes diferentes fundamentos considerados em conjunto.

 Quanto aos primeiro, terceiro e sexto fundamentos, considerados em conjunto, relativos, respetivamente, à violação do dever de fundamentação, à violação do direito a uma proteção jurisdicional efetiva e à exceção de ilegalidade do Regulamento Delegado 2015/63

–       Argumentos das partes

57      A recorrente alega que o CUR violou o dever de fundamentação e o seu direito a uma proteção jurisdicional efetiva devido a uma fundamentação insuficiente da decisão recorrida.

58      Sustenta que, segundo a jurisprudência, uma decisão que exija o pagamento de uma taxa só é fundamentada com a intensidade exigida com vista à fiscalização jurisdicional quando contenha uma conta exata e detalhada dos elementos do crédito em relação ao qual constitui o título executivo.

59      No caso em apreço, as exigências de fundamentação são, aliás, elevadas devido à complexidade do ajustamento em função do perfil de risco, da importância do encargo financeiro imposto e da margem de apreciação de que dispõe o CUR.

60      Ora, nenhum dos documentos fornecidos à recorrente em anexo ao aviso de cobrança contém as indicações de que esta necessita para apreciar a exatidão do cálculo da sua contribuição, tanto em relação ao cálculo da contribuição anual de base como em relação ao ajustamento dessa contribuição adaptada ao risco.

61      A mera reprodução dos dados relativos exclusivamente à recorrente é manifestamente insuficiente.

62      A recorrente acrescenta que o CUR não pode justificar o incumprimento do dever de fundamentação com requisitos de confidencialidade dos dados relativos às outras instituições, que são indispensáveis para o controlo do cálculo. Remete para o artigo 84.o, n.o 3, da Diretiva 2014/59 e para os requisitos de divulgação das instituições de crédito previstos nos artigos 431.o e seguintes do Regulamento n.o 575/2013.

63      O CUR violou, portanto, o dever de fundamentação de forma substancial e em diversos aspetos, o que deve levar à anulação da decisão recorrida. A fundamentação fornecida não permite às instituições nem à FMSA verificar e controlar o cálculo da contribuição. Até o Tribunal Geral está impossibilitado de fiscalizar a decisão recorrida e, por conseguinte, de cumprir ele próprio o dever de fundamentação. O acórdão que viesse a proferir só poderia violar a garantia do direito a um processo equitativo consagrado no artigo 47.o, segundo parágrafo, da Carta.

64      Segundo a recorrente, as violações do dever de fundamentação evidenciam a possibilidade de lacunas quanto ao mérito não verificáveis, precisamente por falta de fundamentação completa.

65      Pelas mesmas razões, o CUR violou igualmente o direito da recorrente a uma proteção jurisdicional efetiva. Com efeito, na falta de fundamentação suficiente da decisão recorrida, o Tribunal Geral não se pode assegurar de que esta assenta numa base factual suficientemente sólida, nem mesmo apreciar a verosimilhança em abstrato dos dados e dos valores, bem como das etapas na base do cálculo da contribuição controvertida.

66      Por último, a recorrente, invocando o artigo 277.o TFUE, sustenta que a decisão recorrida deve ser anulada igualmente com o fundamento de que os artigos 4.o a 7.o e 9.o do Regulamento Delegado 2015/63, bem como o seu anexo I, violam eles próprios o princípio da proteção jurisdicional efetiva, na medida em que criam um sistema complexo de determinação das contribuições, que se caracteriza por numerosas margens de apreciação e uma total opacidade, em cujo âmbito de aplicação o CUR não está em condições de fornecer uma fundamentação verificável e controlável do encargo individual imposto às instituições.

67      O CUR, apoiado, em substância, pela Comissão, contesta estes argumentos.

68      Antes de mais, o CUR afirma que a fundamentação da decisão recorrida é suficiente, não apenas em relação às ANR para compreender as razões do cálculo, mas também de forma geral.

69      Em seguida, o CUR invoca vários elementos do contexto, suscetíveis, em seu entender, de ter impacto no alcance do dever da fundamentação.

70      Em primeiro lugar, tanto a FMSA como as instituições estiveram envolvidas no processo de cálculo das contribuições ex ante.

71      Em segundo lugar, a metodologia a aplicar para o cálculo das contribuições ex ante está claramente exposta na regulamentação aplicável, nomeadamente no artigo 70.o, n.os 1 e 2, do Regulamento n.o 806/2014, bem como na secção 2 e no anexo I do Regulamento Delegado 2015/63.

72      Em terceiro lugar, resulta da jurisprudência que uma decisão que se situe na linha de uma prática decisória constante pode ser fundamentada de forma sucinta, nomeadamente fazendo referência a essa prática.

73      Além disso, o CUR alega que o dever de fundamentação em relação à recorrente — contrariamente ao que esta alega — não tem um alcance tal que deva permitir que esta avalie com precisão se os cálculos estão ou não corretos. Isso deduz‑se da jurisprudência relativa a outros domínios do direito da União, nomeadamente o do direito da concorrência.

74      Neste contexto, o CUR destaca o facto de as contribuições ex ante das (cerca de) 3 500 instituições estarem ligadas entre si, na medida em que a soma de todas as contribuições deve corresponder ao nível‑alvo anual e que, por conseguinte, o cálculo da contribuição da recorrente não se baseia apenas nas informações transmitidas por esta última, mas também nas transmitidas pelas outras 3 500 instituições e ligadas às especificidades da atividade dessas instituições, às suas responsabilidades e aos seus riscos, que o CUR avalia, no contexto da decisão recorrida, na forma de classificação relativa das instituições. Estas informações são confidenciais. O dever de fundamentação deve, portanto, ser ponderado com o dever de proteger o segredo profissional de todas as instituições em causa, imposto ao CUR.

75      Além disso, resulta da jurisprudência que o alcance do dever de fundamentação pode ser igualmente limitado devido a considerações imperativas relativas à segurança da União ou dos seus Estados‑Membros ou à condução das suas relações internacionais.

76      Por último, partilhar todas as informações confidenciais de todas as instituições dos Estados‑Membros participantes com cada ANR vai além do que é exigido pelo artigo 5.o, n.o 1, do Regulamento de Execução 2015/81.

77      Consequentemente, o nível de pormenor escolhido para a fundamentação da decisão recorrida é suficiente.

78      Na medida em que a recorrente sugere que o direito à proteção jurisdicional efetiva exige que o Tribunal Geral esteja em condições de recalcular a contribuição, o CUR alega que essa interpretação da fiscalização da legalidade é demasiado extensiva e não corresponde à jurisprudência existente na matéria. Com efeito, o direito a uma proteção jurisdicional efetiva deve ser avaliado no contexto do equilíbrio institucional estabelecido pelo Regulamento n.o 806/2014 e pelo Regulamento de Execução 2015/81. O CUR está encarregue do cálculo das contribuições ex ante. Por conseguinte, o papel do Tribunal Geral não deve ser o de substituir a decisão do CUR pela sua, recalculando a contribuição. No presente processo, o Tribunal Geral pode fiscalizar a legalidade da decisão recorrida, tendo em conta o quadro jurídico relevante. Entende, por conseguinte, que o direito da recorrente a uma proteção jurisdicional efetiva não é violado.

79      Seja como for, o Tribunal Geral pode, no âmbito da sua fiscalização, pedir que sejam apresentadas informações ou provas relevantes para essa fiscalização, ponderando o respeito da confidencialidade com a necessidade de garantir suficientemente o direito a uma proteção jurisdicional efetiva, e sanar assim qualquer eventual falta de informações que ponha em perigo esse direito.

80      Pelas mesmas razões, entende que a exceção de ilegalidade invocada pela recorrente relativamente às disposições do Regulamento Delegado 2015/63 é improcedente.

81      Em todo o caso, dado que a recorrente não fornece nenhuma prova relativa à alegada prática de um erro no cálculo das contribuições ex ante 2017, este cálculo permanece, em princípio, válido. Por conseguinte, a recorrente não tem qualquer interesse legítimo na anulação da decisão recorrida.

82      Na sua resposta a uma questão colocada pelo Tribunal Geral na audiência, o CUR precisou que a possibilidade prevista no artigo 84.o, n.o 3, da Diretiva 2014/59, evocada pela recorrente (v. n.o 62, supra), e no artigo 88.o, n.o 1, do Regulamento n.o 806/2014 de divulgar informações confidenciais recebidas de forma resumida ou agregada de modo a que as instituições não possam ser identificadas não podia ser considerada no caso em apreço. Forneceu à recorrente o máximo dos dados permitidos pelo sistema existente.

–       Apreciação do Tribunal Geral

83      Segundo jurisprudência constante, a fundamentação exigida no artigo 296.o TFUE deve ser adaptada à natureza do ato em causa e revelar de forma clara e inequívoca o raciocínio da instituição autora do ato, de modo a permitir aos interessados conhecerem as justificações da medida tomada e ao Tribunal competente exercer a sua fiscalização (v. Acórdão de 20 de dezembro de 2017, Comunidad Autónoma de Galicia e Retegal/Comissão, C‑70/16 P, EU:C:2017:1002, n.o 59 e jurisprudência aí referida).

84      A exigência de fundamentação deve ser apreciada em função das circunstâncias do caso concreto, designadamente do conteúdo do ato, da natureza dos fundamentos invocados e do interesse que os destinatários do ato ou outras pessoas direta e individualmente interessadas no mesmo podem ter em obter explicações. Não se exige que a fundamentação especifique todos os elementos de facto e de direito pertinentes, na medida em que a questão de saber se a fundamentação de um ato satisfaz as exigências do artigo 296.o TFUE deve ser apreciada tendo em conta não só o seu teor mas também o seu contexto e o conjunto das regras jurídicas que regulam a matéria em causa (v. Acórdão de 7 de março de 2013, Acino/Comissão, T‑539/10, não publicado, EU:T:2013:110, n.o 124 e jurisprudência aí referida).

85      Por outro lado, a fundamentação de um ato deve ser lógica, não apresentando, nomeadamente, contradições internas que entravem a compreensão dos motivos que subjazem a esse ato (v. Acórdão de 15 de julho de 2015, Pilkington Group/Comissão, T‑462/12, EU:T:2015:508, n.o 21 e jurisprudência aí referida).

86      Além disso, existe uma relação estreita entre o dever de fundamentação e o direito fundamental a uma proteção jurisdicional efetiva (Conclusões da advogada‑geral J. Kokott no processo Housieaux, C‑186/04, EU:C:2005:70, n.o 32).

87      Com efeito, segundo jurisprudência constante, a efetividade da fiscalização jurisdicional garantida pelo artigo 47.o da Carta exige que o interessado possa conhecer os fundamentos nos quais a decisão controvertida se baseia, tanto para lhe permitir defender os seus direitos nas melhores condições possíveis e decidir com pleno conhecimento de causa se é útil recorrer ao juiz competente, como para permitir plenamente a este último exercer a fiscalização da legalidade da referida decisão que lhe incumbe por força do Tratado FUE (v., neste sentido, Acórdãos de 9 de novembro de 2017, LS Customs Services, C‑46/16, EU:C:2017:839, n.o 40 e jurisprudência aí referida, e de 13 de março de 2019, AlzChem/Comissão, C‑666/17 P, não publicado, EU:C:2019:196, n.o 54 e jurisprudência aí referida).

88      A título preliminar, há que lembrar que, embora, no sistema instituído pelo Regulamento n.o 806/2014 e pelo Regulamento de Execução 2015/81, as decisões que fixam as contribuições ex ante sejam notificadas às ANR, essas decisões dizem individual e diretamente respeito às instituições responsáveis pelo pagamento dessas contribuições, incluindo a recorrente (v. n.o 28, supra).

89      Por conseguinte, o interesse que essas instituições podem ter em receber explicações deve também ser tido em conta ao avaliar a extensão do dever de fundamentar essas decisões (Acórdãos de 28 de novembro de 2019, Hypo Vorarlberg Bank/CUR, T‑377/16, T‑645/16 e T‑809/16, EU:T:2019:823, n.o 176, e de 28 de novembro de 2019, Portigon/CUR, T‑365/16, EU:T:2019:824, n.o 164).

90      Por outro lado, é o CUR que calcula e fixa as contribuições ex ante. As suas decisões sobre o cálculo dessas contribuições são dirigidas apenas às ANR (artigo 5.o, n.o 1, do Regulamento de Execução 2015/81) e compete às ANR comunicá‑las às instituições (artigo 5.o, n.o 2, do Regulamento de Execução 2015/81) e cobrar as contribuições das instituições com base nessas decisões (artigo 67.o, n.o 4, do Regulamento n.o 806/2014) (Acórdãos de 28 de novembro de 2019, Hypo Vorarlberg Bank/CUR, T‑377/16, T‑645/16 e T‑809/16, EU:T:2019:823, n.o 204, e de 28 de novembro de 2019, Portigon/CUR, T‑365/16, EU:T:2019:824, n.o 179).

91      Assim, quando o CUR atua ao abrigo do artigo 70.o, n.o 2, do Regulamento n.o 806/2014, adota decisões com caráter definitivo e que dizem direta e individualmente respeito às instituições (Acórdãos de 28 de novembro de 2019, Hypo Vorarlberg Bank/CUR, T‑377/16, T‑645/16 e T‑809/16, EU:T:2019:823, n.o 205, e de 28 de novembro de 2019, Portigon/CUR, T‑365/16, EU:T:2019:824, n.o 180).

92      Consequentemente, enquanto autor dessas decisões, cabe ao CUR fundamentá‑las. Essa obrigação não pode ser delegada nas ANR, nem a sua violação sanada pelas mesmas, salvo ignorando a qualidade do CUR de autor dessas decisões e a sua responsabilidade a esse respeito, e, dada a diversidade das ANR, dando origem a um risco de desigualdade de tratamento das instituições no que respeita à fundamentação das decisões do CUR (Acórdãos de 28 de novembro de 2019, Hypo Vorarlberg Bank/CUR, T‑377/16, T‑645/16 e T‑809/16, EU:T:2019:823, n.o 206, e de 28 de novembro de 2019, Portigon/CUR, T‑365/16, EU:T:2019:824, n.o 181).

93      No caso em apreço, no que respeita ao texto da decisão recorrida, as considerações citam o Regulamento n.o 806/2014, a Diretiva 2014/59, o Regulamento de Execução 2015/81, o Regulamento Delegado 2015/63 e o acordo intergovernamental acima mencionado no n.o 2 como bases jurídicas e contêm várias indicações relativas à tomada em conta das contribuições ex ante cobradas relativamente aos anos de 2015 e 2016. Seguem‑se o dispositivo principal da decisão recorrida («[O CUR na sua sessão executiva] aprova os montantes das contribuições ex ante para o [FUR] para 2017, como figuram em anexo») e onze números que expõem, em termos gerais, o procedimento de cálculo das contribuições ex ante. Por último, o n.o 12 precisa que «[a decisão recorrida] entra em vigor no dia da sua adoção».

94      Quanto ao anexo da decisão recorrida, conforme apresentado pelo CUR na sua resposta ao Despacho de 9 de setembro de 2019, contém um quadro que indica, para cada instituição em causa, o Estado‑Membro participante onde está autorizado, o tipo de método utilizado para calcular a parte «europeia» da contribuição ex ante para 2017, o montante dessa contribuição e, na coluna intitulada «Fator de ajustamento ao risco (EA)», o montante do multiplicador «europeu» de ajustamento em função do perfil de risco [v. artigo 9.o do Regulamento Delegado 2015/63 e artigo 8.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento de Execução 2015/81], aplicado ao seu caso.

95      É pacífico que a decisão recorrida não contém, para além das explicações gerais que figuram no seu texto, quase nenhum elemento do cálculo da contribuição da recorrente. Com efeito, esta decisão apenas fornece o tipo de método e o montante do multiplicador de ajustamento em função do perfil de risco aplicados à recorrente para calcular a parte «europeia» da sua contribuição.

96      Há que acrescentar que resulta do artigo 8.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento de Execução 2015/81 que a parte do cálculo da contribuição efetuada pelo CUR por referência ao contexto europeu, em 2017, entra apenas em 60 % no cálculo dessa contribuição, enquanto a parte nacional entra em 40 %.

97      Quanto ao documento intitulado «Detalhes do cálculo» (v. n.o 10, supra), admitindo que emana efetivamente do CUR, como este afirmou na audiência, não se pode deixar de observar que, ainda que indique, além dos elementos acima mencionados no n.o 94 o tipo de método para calcular a parte «nacional» da contribuição e o montante do multiplicador «nacional» de ajustamento em função do perfil de risco, bem como outros elementos de cálculo, todavia, não contém nenhum elemento suficiente para verificar a exatidão da contribuição.

98      Em especial, esse documento não contém nenhum elemento de cálculo específico das (cerca de) 3 500 outras instituições, quando, em aplicação, nomeadamente, dos artigos 4.o a 7.o e 9.o do Regulamento Delegado 2015/63, o cálculo da contribuição da recorrente implica, por um lado, estabelecer uma relação proporcional entre o montante do seu passivo (excluindo fundos próprios e depósitos cobertos) e o total do passivo (excluindo fundos próprios e depósitos cobertos) de todas as outras instituições e, por outro, uma avaliação do seu perfil de risco em relação com os perfis de risco dessas outras instituições segundo os indicadores previstos.

99      Para justificar a falta destes elementos, o CUR alega, em substância, que os elementos relativos às outras instituições são confidenciais.

100    O Tribunal Geral não contesta a natureza confidencial dos dados das (cerca de) 3 500 outras instituições, mas salienta que, na medida em que assenta de forma interdependente nesses dados, o cálculo da contribuição da recorrente revela‑se intrinsecamente opaco.

101    É certo que a recorrente pode examinar o método de cálculo da contribuição ex ante tal como definido na regulamentação e exposto no texto da decisão recorrida. Pode, sendo caso disso, contestar determinados aspetos e a sua aplicação a seu respeito, como, por exemplo, a apreciação, pelo CUR, dos seus dados ao abrigo do artigo 5.o, n.o 1, do Regulamento Delegado 2015/63.

102    Não obstante, além dessas contestações específicas, uma vez que a contribuição da recorrente é calculada de forma interdependente e em bases não comunicáveis, o método de cálculo prejudica a sua possibilidade de contestar utilmente a decisão recorrida.

103    Estas considerações são corroboradas de modo incidental pelo CUR no âmbito da sua resposta aos quarto e quinto fundamentos. Nestes fundamentos, a recorrente contesta elementos precisos do cálculo da sua contribuição, invocando, nomeadamente, o seu alegadamente bom perfil de risco que resulta de uma comparação, por si efetuada, dos seus dados financeiros com dados de outras instituições. O CUR afasta esta comparação pelo facto de não equivaler à análise exaustiva por si realizada em conformidade com a regulamentação. Ora, o Tribunal só pode constatar, no que respeita a esta resposta do CUR, precisamente, que a recorrente está impossibilitada de aceder aos dados precisos e exaustivos que lhe permitam proceder a essa análise.

104    Além disso, na medida em que, no âmbito da sua resposta ao quinto fundamento, o CUR insiste no facto de que os montantes do multiplicador de ajustamento em função do perfil de risco, aplicados no caso da recorrente, «permanece[m] dentro dos limites prescritos pelo artigo 9.o, n.o 3, do Regulamento Delegado [2015/63], a saber, entre 0,8 e 1,5», há que salientar que esta insistência não responde às preocupações da recorrente. Essas preocupações não consistem em saber se o multiplicador permanece dentro dos limites acima referidos, o que a fundamentação fornecida permite constatar, mas se esse multiplicador não contém um erro dentro desses limites, tendo em conta que, segundo o que é indicado no documento intitulado «Detalhes do cálculo», o intervalo previsto na referida disposição representa, no que respeita ao montante da contribuição da recorrente, uma diferença de [confidencial] (1).

105    Quanto ao quadro publicado pelo CUR no seu sítio Internet e por ele igualmente mencionado na sua resposta ao quinto fundamento, em nada contribui a este respeito. Esse quadro indica o número de instituições às quais foram aplicados os montantes do multiplicador de ajustamento em função do perfil de risco no contexto da zona euro nos intervalos entre 0,8 e 0,9, entre 0,9 e 1, etc., até entre 1,4 e 1,5. Da mesma forma que o anexo da decisão recorrida, esse quadro apenas fornece uma informação parcial sobre o cálculo da contribuição ex ante, uma vez que apenas diz respeito ao multiplicador de ajustamento em função do perfil de risco no contexto europeu. Esse quadro — publicado, aliás, após a interposição do presente recurso — não permite verificar a exatidão do cálculo do referido multiplicador no caso da recorrente e, consequentemente, da sua contribuição.

106    Além disso, não o CUR não impugna o facto de uma instituição como a recorrente não poder saber exatamente porque é que a sua contribuição aumenta, baixa ou estagna de um ano para o outro, uma vez que essas variações ou essa estagnação resultam de uma posição relativa cujos termos ignora por definição. Uma instituição poderá, assim, ver a sua contribuição aumentar quando o seu próprio perfil de risco baixou, e vice‑versa, sem dispor de elementos justificativos, tratando‑se de elementos confidenciais.

107    Ora, resulta do artigo 296.o TFUE que os atos jurídicos devem ser fundamentados, e a jurisprudência recorda que o dever de fundamentação se aplica a todos os atos suscetíveis de ser objeto de recurso de anulação (Acórdão de 1 de outubro de 2009, Comissão/Conselho, C‑370/07, EU:C:2009:590, n.o 42).

108    Por outro lado, resulta da jurisprudência que uma falta de fundamentação não pode ser justificada pela obrigação de respeitar o segredo profissional. A obrigação de respeitar o segredo comercial não pode ser interpretada de forma tão extensiva que esvazie a exigência de fundamentação do seu conteúdo essencial (v., neste sentido, Acórdão de 21 de dezembro de 2016, Club Hotel Loutraki e o./Comissão, C‑131/15 P, EU:C:2016:989, n.o 48 e jurisprudência aí referida).

109    No caso, a fundamentação fornecida à recorrente não lhe permite verificar o montante da sua contribuição, o qual constitui, no entanto, o elemento essencial da decisão recorrida na parte em que lhe diz respeito. Coloca a recorrente numa posição em que não está em condições de saber se esse montante foi calculado corretamente ou se deve contestá‑lo no Tribunal Geral, sem, todavia, poder, como lhe incumbe, no entanto, num recurso jurisdicional, identificar, no que respeita ao referido montante, os elementos contestados da decisão recorrida, formular alegações a esse respeito e apresentar provas, que podem ser constituídas por indícios sérios, destinadas a demonstrar que as suas alegações são procedentes (v., neste sentido, Acórdão de 8 de dezembro de 2011, KME Germany e o./Comissão, C‑389/10 P, EU:C:2011:816, n.o 132).

110    Daqui resulta que o CUR violou o dever de fundamentação.

111    Esta conclusão não é posta em causa pelos restantes argumentos apresentados pelo CUR.

112    No que diz respeito à referência ao envolvimento da recorrente no processo decisório, refira‑se que esse envolvimento se limita ao fornecimento de informações pela instituição ao CUR, em conformidade com o artigo 14.o do Regulamento Delegado 2015/63 e segundo os formatos e representações definidos pelo CUR, em aplicação do artigo 6.o do Regulamento de Execução 2015/81. Não dá à instituição nenhum meio de verificar a exatidão da sua contribuição.

113    O mesmo se diga, pelas razões acima indicadas nos n.os 101 e 102, da referência pelo CUR ao facto de o método de cálculo estar exposto na regulamentação aplicável.

114    No que diz respeito ao argumento do CUR baseado na jurisprudência relativa às decisões que se inserem na linha de uma prática decisória constante e podem ser fundamentadas de forma sucinta, importa salientar o seguinte.

115    Esta jurisprudência é desprovida de relevância na medida em que não diz respeito à questão, aqui em causa, da ocultação de dados devido ao seu caráter confidencial.

116    Aliás, na medida em que resulta dos autos que o CUR utiliza as tecnologias da informação (ficheiros XLSX, correios eletrónicos) para efeitos do cálculo das contribuições ex ante e da adoção das decisões sobre essas contribuições, o que permite uma elaboração e uma difusão fáceis e rápidas de um grande número de informações, não se pode alegar que considerações materiais, técnicas ou de prazo, por vezes invocadas para justificar uma fundamentação sucinta, podem aplicar‑se no caso em apreço.

117    Por último e em todo o caso, não está em causa, no caso presente, uma prática decisória constante. Como observa a recorrente, foi apenas a segunda vez que, em 2017, o CUR fixou as contribuições ex ante para o FUR. Além disso, a decisão do CUR que fixa as contribuições ex ante para o FUR para 2016 foi anulada (Acórdãos de 28 de novembro de 2019, Banco Cooperativo Español/CUR, T‑323/16, EU:T:2019:822; de 28 de novembro de 2019, Hypo Vorarlberg Bank/CUR, T‑377/16, T‑645/16 e T‑809/16, EU:T:2019:823; e de 28 de novembro de 2019, Portigon/CUR, T‑365/16, EU:T:2019:824).

118    No que diz respeito ao argumento baseado na jurisprudência relativa à fundamentação no domínio do direito da concorrência, é verdade que é jurisprudência assente, neste domínio, que as exigências do dever de fundamentação não impõem à Comissão que indique na sua decisão os elementos numéricos relativos ao modo de cálculo das coimas (v. Acórdão de 5 de junho de 2012, Imperial Chemical Industries/Comissão, T‑214/06, EU:T:2012:275, n.o 100 e jurisprudência aí referida).

119    No entanto, há que sublinhar que resulta dessa jurisprudência que as coimas constituem um instrumento da política de concorrência da Comissão e que esta deve poder dispor de uma margem de apreciação na fixação do seu montante a fim de orientar o comportamento das empresas no sentido do cumprimento das regras de concorrência. Deste modo, a Comissão não pode, através do recurso exclusivo e mecânico a fórmulas aritméticas, ficar privada do seu poder de apreciação. Se a Comissão tivesse que indicar na sua decisão os elementos quantificados relativos ao modo de cálculo do montante das coimas, o efeito dissuasivo destas ficaria posto em causa (v., neste sentido, Acórdãos de 2 de outubro de 2003, Salzgitter/Comissão, C‑182/99 P, EU:C:2003:526, n.o 75; de 8 de julho de 2008, BPB/Comissão, T‑53/03, EU:T:2008:254, n.os 335 e 336; e de 28 de novembro de 2019, Hypo Vorarlberg Bank/CUR, T‑377/16, T‑645/16 e T‑809/16, EU:T:2019:823, n.o 198 e jurisprudência aí referida).

120    Ora, tais considerações não são transponíveis para o caso em apreço.

121    Por um lado, o caso presente não se insere no âmbito de uma regulamentação que admita a existência de uma margem de apreciação para orientar o comportamento das empresas, mas no âmbito de um cálculo objetivo que não deixa, em princípio, nenhuma margem de apreciação dessa natureza ao autor do referido cálculo.

122    Por outro lado, o caso em apreço não faz parte de um processo sancionatório que justifique a preservação de um caráter dissuasivo, antes resultando de um processo comparável ao de uma tributação. Não há, neste contexto, qualquer motivo para privar o devedor da possibilidade de verificar a exatidão da sua contribuição. A este respeito, e contrariamente ao que alega o CUR, é com razão que a recorrente invoca o Acórdão de 13 de junho de 1958, Meroni/Alta Autoridade (9/56, EU:C:1958:7, pp. 30 e 31), no qual o Tribunal de Justiça declarou que a justificação legal da decisão recorrida nesse processo, que procedia a uma liquidação tributária oficiosa, exigia a conta exata e detalhada dos elementos do crédito em relação ao qual constituía título executivo, que só semelhante conta podia permitir a fiscalização jurisdicional e que, na falta desses elementos, essa decisão não estava suficientemente fundamentada (v. igualmente Acórdão de 16 de dezembro de 1963, Macchiorlati Dalmas/Alta Autoridade, 1/63, EU:C:1963:58, p. 636).

123    No que diz respeito à referência feita pelo CUR ao Despacho de 22 de fevereiro de 2005, Hynix Semiconductor/Conselho (T‑383/03, EU:T:2005:57, n.o 35), este é manifestamente desprovido de relevância para o caso presente. Com efeito, esse despacho não dizia respeito ao dever de fundamentação de um ato, mas unicamente ao dever de uma parte, que apresenta um pedido de confidencialidade num processo no Tribunal Geral, de fundamentar o seu pedido.

124    Quanto às referências efetuadas pelo CUR a processos respeitantes à adjudicação de contratos públicos e aos auxílios de Estado, o Tribunal Geral considerou, nos processos em causa, que a ocultação dos dados económicos na versão não confidencial da decisão controvertida não tinha impedido os recorrentes de compreenderem o raciocínio seguido pela Comissão, nem entravado a sua possibilidade de impugnarem essa decisão no Tribunal Geral, nem impedido este de exercer a sua fiscalização jurisdicional no âmbito do recurso em causa (Acórdão de 8 de janeiro de 2015, Club Hotel Loutraki e o./Comissão, T‑58/13, não publicado, EU:T:2015:1, n.os 73 a 77), e que os recorrentes tinham um conhecimento suficiente das vantagens relativas das propostas dos outros proponentes selecionados (Acórdão de 8 de julho de 2015, European Dynamics Luxembourg e o./Comissão, T‑536/11, EU:T:2015:476, n.o 47 e n.o 50 in fine).

125    No caso em apreço, em contrapartida, e como já foi acima referido nos n.os 93 a 106 e 109, a fundamentação fornecida à recorrente, mesmo tendo em conta o documento intitulado «Detalhes do cálculo (v. n.o 10, supra), não lhe permite verificar se o montante da sua contribuição está em conformidade com a regulamentação aplicável e, portanto, decidir com pleno conhecimento de causa se é útil recorrer ao juiz competente e em que termos.

126    Quanto à referência feita pelo CUR à jurisprudência no domínio da luta contra o terrorismo, que admite que considerações imperativas relativas à segurança da União ou dos seus Estados‑Membros ou à condução das suas relações internacionais se oponham à comunicação de certos elementos de fundamentação (v., neste sentido, Acórdão de 14 de outubro de 2009, Bank Melli Iran/Conselho, T‑390/08, EU:T:2009:401, n.o 81), basta salientar que a matéria da união bancária de forma nenhuma diz respeito a temáticas semelhantes à luta contra o terrorismo.

127    Por último, e contrariamente ao que alega o CUR, não se pode deixar de observar que a possibilidade de o Tribunal Geral lhe pedir que apresente informações para efeitos de exame da legalidade da decisão recorrida não pode alterar, no caso, a declaração de uma violação do dever de fundamentação nem garantir o respeito do direito da recorrente à proteção jurisdicional efetiva.

128    Com efeito, a decisão recorrida devia estar suficientemente fundamentada à data da sua adoção e, em todo o caso, antes da interposição do recurso de anulação. A falta de fundamentação não pode ser sanada após a interposição do recurso no Tribunal Geral, nomeadamente na sequência de medidas de organização do processo ou de instrução tomadas por este último.

129    No que diz respeito à exceção de ilegalidade invocada pela recorrente, há que rejeitar o argumento invocado pela Comissão na audiência, segundo o qual aquela não pode contestar a legalidade da decisão recorrida, uma vez que o método de cálculo da sua contribuição, baseado na interdependência das contribuições e no recurso a dados confidenciais, decorre não tanto do Regulamento Delegado 2015/63 como do Regulamento n.o 806/2014 e da Diretiva 2014/59, contra os quais não suscitou uma exceção de ilegalidade. Com efeito, como resulta das considerações que se seguem, o facto de o cálculo da contribuição ex ante da recorrente ser opaco e, portanto, de esta última não estar em condições de verificar a sua exatidão resulta, pelo menos em parte, do método de cálculo definido pela própria Comissão, a saber, sem que tal lhe tenha sido imposto pelo Regulamento n.o 806/2014 ou pela Diretiva 2014/59, no Regulamento Delegado 2015/63.

130    Em aplicação do artigo 70.o, n.o 2, do Regulamento n.o 806/2014 e do artigo 103.o, n.o 2, da Diretiva 2014/59, uma contribuição ex ante de uma instituição é calculada, em substância, em duas etapas.

131    Antes de mais, é calculada uma «contribuição fixa» (na realidade, para as instituições mais importantes, entre as quais a recorrente, uma «contribuição anual de base» na aceção do Regulamento Delegado 2015/63, v. o seu considerando 5), que é proporcional ao montante do passivo da instituição, excluindo os fundos próprios e os depósitos cobertos, em relação ao passivo total, excluindo os fundos próprios e os depósitos cobertos, de todas as instituições autorizadas no território de todos os Estados‑Membros participantes.

132    A «contribuição anual de base» é, de seguida, ajustada em função do perfil de risco da instituição.

133    Os critérios desse ajustamento estão estabelecidos no Regulamento Delegado 2015/63, adotado pela Comissão com base no artigo 103.o, n.o 2, segundo parágrafo, e n.o 7, da Diretiva 2014/59 e aplicável no contexto do Regulamento n.o 806/2014 por força do seu artigo 70.o, n.o 6.

134    Todavia, não resulta do artigo 103.o, n.o 7, da Diretiva 2014/59, base jurídica do Regulamento Delegado 2015/63, que o ajustamento em função do perfil de risco tenha necessariamente que utilizar um método de cálculo interdependente e baseado em dados confidenciais de terceiros.

135    Com efeito, os elementos a ter em conta para o ajustamento em função do perfil de risco, segundo a lista prevista no artigo 103.o, n.o 7, dizem todos exclusivamente respeito à instituição em causa, a saber, em primeiro lugar, a exposição da instituição ao risco, nomeadamente a importância das suas atividades de negociação, das suas exposições extrapatrimoniais e do seu nível de endividamento, em segundo lugar, a estabilidade e a diversidade das fontes de financiamento da instituição e os ativos com elevada liquidez e não onerados, em terceiro lugar, a situação financeira da instituição, em quarto lugar, a probabilidade de a instituição entrar em resolução, em quinto lugar, a dimensão dos auxílios financeiros públicos extraordinários anteriormente recebidos pela instituição, em sexto lugar, a complexidade estrutural e a resolubilidade da instituição, em sétimo lugar, a importância da instituição para a estabilidade do sistema financeiro ou da economia de um ou mais Estados‑Membros ou da União e, em oitavo lugar, a pertença a um sistema de proteção institucional.

136    Quanto a sustentar que a interdependência e o recurso aos dados confidenciais dos outros estabelecimentos decorrem do artigo 69.o, n.o 1, do Regulamento n.o 806/2014 que fixa, através do nível‑alvo, um nível de financiamento do FUR a atingir no termo do período inicial, e do artigo 70.o, n.o 2, do mesmo regulamento, que prevê que o montante agregado das contribuições não deve exceder anualmente 12,5 % do referido nível‑alvo, não se pode deixar de observar que estas duas disposições não impõem, através dos limiares que fixam, um sistema de ajustamento em função do perfil de risco opaco para as instituições em causa, incluindo a recorrente.

137    Em primeiro lugar, o artigo 69.o, n.o 1, do Regulamento n.o 806/2014 não define o nível‑alvo como um limite máximo exato de financiamento que deve ser preenchido ao cêntimo de euro, mas apenas como um mínimo («pelo menos 1 %»).

138    Em segundo lugar, esse nível‑alvo é definido por referência ao montante dos depósitos cobertos de todas as instituições de crédito em causa no termo do período dito inicial, portanto, a um montante que só pode ser quantificado no final de 2023.

139    Em terceiro lugar, embora o artigo 70.o, n.o 2, do Regulamento n.o 806/2014 exija que as contribuições ex ante cobradas para o ano em causa não excedam 12,5 % do referido nível‑alvo, isso não tem por resultado uma necessidade absoluta de fixar, para cada ano, um montante preciso que deve, de seguida, ser repartido, no âmbito do cálculo das contribuições ex ante, entre todas as instituições em causa. Com efeito, além do facto de a própria taxa de 12,5 % se referir ao nível‑alvo definido como um mínimo e por referência a um montante que só poderá ser quantificado no final de 2023, essa disposição não proíbe um montante agregado das contribuições ex ante que, para o ano em causa, ascenda eventualmente a menos de 12,5 % do referido nível‑alvo.

140    Daqui decorre que, uma vez que, por um lado, a Diretiva 2014/59 e o Regulamento n.o 806/2014 não impõem à Comissão a adoção, através do Regulamento Delegado 2015/63, de um método de ajustamento ao perfil de risco opaco para a recorrente e, por outro, a Comissão admitiu que, do ponto de vista económico, fosse possível avaliar o perfil de risco de uma instituição apenas com base nos seus próprios dados (v., neste sentido, Acórdão de 28 de novembro de 2019, Portigon/CUR, T‑365/16, EU:T:2019:824, n.o 156), o facto de a recorrente ter limitado a sua exceção de ilegalidade unicamente ao Regulamento Delegado 2015/63 de forma nenhuma obsta a que o Tribunal Geral declare a ilegalidade do método de cálculo das contribuições ex ante à luz das exigências do artigo 296.o TFUE, pelo menos no que diz respeito à parte desse método relativa ao ajustamento em função do perfil de risco, determinada nesse regulamento delegado.

141    Por conseguinte, há que concluir que, no caso, a violação do dever de fundamentação acima declarada no n.o 110 tem a sua causa, em relação à parte do cálculo da contribuição ex ante relativa ao ajustamento em função do perfil de risco, na ilegalidade, invocada por via de exceção, dos artigos 4.o a 7.o e 9.o e do anexo I do Regulamento Delegado 2015/63.

142    De resto, e em todo o caso, uma vez que a exigência de uma fundamentação suficientemente precisa dos atos, consagrada no artigo 296.o TFUE, constitui um dos princípios fundamentais do direito da União, cujo respeito compete ao juiz assegurar, se necessário conhecendo oficiosamente da questão da violação desse dever (v. n.os 36 e 37, supra) e que, em violação desse dever, a recorrente não dispõe de elementos suficientes para verificar a exatidão da sua contribuição, o CUR não pode sanar essa violação através da invocação de uma regulamentação de direito derivado.

143    Tendo em conta todas estas considerações, há que concluir, após ter julgado procedente o fundamento relativo à violação da exigência de autenticação, que a decisão recorrida deve igualmente ser anulada com base na violação do dever de fundamentação e do direito a uma proteção jurisdicional efetiva, sem que seja necessário examinar os outros fundamentos invocados pela recorrente.

 Quanto à limitação no tempo dos efeitos do acórdão

144    O CUR conclui, em substância, que, se o Tribunal Geral anular a decisão recorrida, há que diferir os efeitos da anulação por seis meses após o acórdão se ter tornado definitivo.

145    A recorrente não se pronunciou sobre esta questão.

146    Os acórdãos pelos quais o Tribunal Geral anula uma decisão adotada por uma instituição ou um órgão da União têm, em princípio, efeito imediato, no sentido de que o ato anulado é eliminado retroativamente da ordem jurídica e se considera nunca ter existido. Não é menos verdade que, com base no artigo 264.o, segundo parágrafo, TFUE o Tribunal Geral pode manter provisoriamente os efeitos de uma decisão anulada (v. Acórdão de 2 de abril de 2014, Ben Ali/Conselho, T‑133/12, não publicado, EU:T:2014:176, n.o 83 e jurisprudência aí referida).

147    No caso, decorre do exposto que o CUR não poderá substituir a decisão recorrida sem violar, de novo, o dever de fundamentação e o direito da recorrente a uma proteção jurisdicional efetiva, antes de o quadro jurídico, e concretamente o Regulamento Delegado 2015/63, ser alterado.

148    Nestas condições, em conformidade com as conclusões do CUR, há que manter os efeitos da decisão recorrida durante seis meses a contar do dia em que o presente acórdão se torna definitivo.

 Quanto às despesas

149    Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo o CUR sido vencido, há que condená‑lo nas suas próprias despesas e nas despesas da recorrente, em conformidade com o pedido por esta deduzido.

150    Em conformidade com o artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a Comissão suportará as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção alargada)

decide:

1)      A Decisão do Conselho Único de Resolução (CUR) da sua sessão executiva de 11 de abril de 2017 relativa ao cálculo das contribuições ex ante para 2017 para o Fundo Único de Resolução (SRB/ES/SRF/2017/05) é anulada na parte em que diz respeito à Landesbank BadenWürttemberg.

2)      Os efeitos da Decisão SRB/ES/SRF/2017/05 são mantidos, na parte em que diz respeito à Landesbank BadenWürttemberg, durante seis meses a contar do dia em que o presente acórdão se torna definitivo.

3)      O CUR suportará, para além das suas próprias despesas, as despesas da Landesbank BadenWürttemberg.

4)      A Comissão Europeia suportará as suas próprias despesas.

Collins

Kancheva

Barents

Passer

 

      De Baere

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 23 de setembro de 2020.

Assinaturas


*      Língua do processo: alemão.


1      Dados confidenciais ocultados.