Language of document : ECLI:EU:C:2021:759

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

MICHAL BOBEK

apresentadas em 23 de setembro de 2021(1)

Processo C205/20

NE

contra

Bezirkshauptmannschaft HartbergFürstenfeld,

sendo interveniente:

Finanzpolizei Team 91

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Landesverwaltungsgericht Steiermark (Tribunal Administrativo Regional da Estíria, Áustria)]

«Reenvio prejudicial — Livre circulação de serviços — Destacamento de trabalhadores — Artigo 20.o da Diretiva 2014/67/UE — Sanções — Princípio da proporcionalidade — Efeito direto — Poderes dos órgãos jurisdicionais nacionais — Legislação de um Estado‑Membro que prevê o cúmulo de sanções administrativas para cada infração cometida e que estabelece montantes mínimos sem fixar montantes globais máximos»






I.      Introdução

1.        O requisito da proporcionalidade das sanções tem efeito direto? Se assim for, mas igualmente se assim não for, o que se exige exatamente a um tribunal nacional chamado a pronunciar‑se sobre um litígio ao qual deva aplicar normas sancionatórias nacionais que já foram declaradas desproporcionadas pelo Tribunal de Justiça?

2.        Numa série de decisões anteriores, com início no Acórdão Maksimovic (2), o Tribunal de Justiça declarou como sendo desproporcionados vários elementos do regime de sanções austríaco aplicável à violação das obrigações, essencialmente administrativas, de conservação dos documentos relativos ao destacamento de trabalhadores. Porém, após as decisões do Tribunal de Justiça, o legislador nacional manteve‑se inativo. O órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se sobre o que deve fazer perante tal cenário. Remete para a jurisprudência recente do Tribunal de Justiça no Acórdão Link Logistik (3), que declarou que uma disposição do direito da União praticamente idêntica não tinha efeito direto, e em que se considerava excluída a possibilidade de interpretar o direito nacional com o direito da União. No entanto, o Tribunal de Justiça recordou a obrigação de inaplicabilidade das disposições de direito nacional incompatíveis que impende sobre os órgãos jurisdicionais dos Estados‑Membros.

3.        Na minha opinião, a verdadeira questão no presente processo não é tanto o que o órgão jurisdicional de reenvio deve fazer, mas o que o Tribunal de Justiça tem obrigação de fazer. Esta afirmação em nada diminui a importância do processo principal e a responsabilidade última que recai sobre sempre o juiz nacional ao decidir um caso concreto. É antes de reconhecer que os problemas que a decisão de reenvio suscita no presente processo resultam, em larga medida, das orientações pouco claras do próprio Tribunal de Justiça.

II.    Quadro jurídico

A.      Direito da União

4.        O considerando 44 da Diretiva 2014/67/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014, respeitante à execução da Diretiva 96/71/CE relativa ao destacamento de trabalhadores no âmbito de uma prestação de serviços e que altera o Regulamento (UE) n.o 1024/2012 relativo à cooperação administrativa através do Sistema de Informação do Mercado Interno (4), tem a seguinte redação: «Sem prejuízo da definição de regras mais uniformes no que respeita à execução transfronteiriça de sanções administrativas e/ou coimas, bem como da necessidade de instaurar mais critérios comuns para conferir maior eficácia aos procedimentos de acompanhamento em caso de não pagamento, as competências dos Estados‑Membros para determinarem os seus próprios sistemas de sanções e coimas ou as medidas de cobrança previstas pela legislação nacional não deverão ser afetadas. Por conseguinte, o instrumento que permite a execução dessas sanções e/ou coimas pode, se apropriado, e tendo em conta a legislação nacional e/ou as práticas no Estado‑Membro requerido, ser completado ou acompanhado ou substituído por um título que permita a aplicação ou execução destas no Estado‑Membro requerido.»

5.        O artigo 20.o da Diretiva 2014/67, sob a epígrafe «Sanções», dispõe:

«Os Estados‑Membros definem regras relativas às sanções aplicáveis em caso de violação das disposições nacionais adotadas nos termos da presente diretiva e tomam as medidas necessárias para garantir a sua aplicação e cumprimento efetivos. As sanções impostas devem ser efetivas, proporcionadas e dissuasivas. Os Estados‑Membros notificam as referidas disposições à Comissão até 18 de junho de 2016. Os Estados‑Membros notificam sem demora quaisquer alterações que lhes sejam feitas subsequentemente.»

B.      Direito nacional

6.        O § 16, n.os 1 e 2 da Verwaltungsstrafgesetz (Lei das Sanções Administrativas) (5) prevê a possibilidade de adotar penas privativas de liberdade em caso de não pagamento das sanções aplicadas.

7.        O § 52, n.os 1 e 2, da Verwaltungsgerichtsverfahrensgesetz (Lei de Processo nos Tribunais Administrativos) (6), na sua versão aplicável ao litígio no processo principal, tem a seguinte redação:

«1.      Em qualquer sentença de confirmação de uma sanção (Straferkenntnis) administrativa, o tribunal administrativo fixará uma contribuição nas despesas processuais que deverá ser paga pelo autor da infração.

2.      Em caso de recurso, esta contribuição é calculada em 20 % da sanção aplicada, e tem o valor mínimo de dez euros; no caso das penas privativas de liberdade, ao cálculo das despesas será adicionado um dia de pena privativa da liberdade, que é igual a 100 euros. […]»

8.        O § 26, n.o 1, da Lohn‑und Sozialdumping‑Bekämpfungsgesetz (Lei de Combate ao Dumping Salarial e Social, a seguir «LSD‑BG») (7), na sua versão aplicável ao litígio no processo principal, estabelece:

«Quem, na qualidade de empregador ou de empresa, contratar trabalhadores para efeitos do § 19, n.o 1:

1.      não apresente a declaração, incluindo a alteração de dados posterior (declaração de alteração) em violação do § 19, ou que não o faça em tempo útil ou de forma completa, ou

[…]

3.      não disponha dos documentos exigidos, em violação do § 21, n.o 1 ou n.o 2, ou não os ponha à disposição das autoridades fiscais no local […] em formato eletrónico,

comete uma infração administrativa e é punido, por cada respetivo trabalhador, com uma coima aplicada pela autoridade administrativa distrital de 1 000 a 10 000 euros e, em caso de reincidência, de 2 000 a 20 000 euros.»

9.        O § 27, n.o 1, da LSD‑BG dispõe:

«Quem não transmita os documentos exigidos, em violação do § 12, n.os 1 e 3, comete uma infração administrativa e é punido, por cada respetivo trabalhador, com uma coima aplicada pela autoridade administrativa distrital de 500 euros a 5 000 euros e, em caso de reincidência, de 1 000 a 10 000 euros. […]»

10.      O § 28 da LSD‑BG tem a seguinte redação:

«Quem, na qualidade de

1.      empregador, não mantiver à disposição os documentos salariais, em violação do § 22, n.o 1 ou n.o 1, alínea a), […]

comete uma infração administrativa e é punido, por cada respetivo trabalhador, com uma coima aplicada pela autoridade administrativa distrital de 1 000 euros a 10 000 euros e, em caso de reincidência, de 2 000 a 20 000 euros; se estiverem em causa mais de três trabalhadores, com uma coima de 2 000 a 20 000 euros por cada trabalhador, ou de 4 000 a 50 000 euros em caso de reincidência.»

III. Matéria de facto, tramitação e questões prejudiciais

11.      A CONVOI s.r.o. é uma sociedade com sede na Eslováquia. Destacou os seus trabalhadores para a sociedade Niedec Global Appliance Austria GmbH (a seguir «Niedec»), com sede em Fürstenfeld (Áustria). Em 24 de janeiro de 2018, a autoridade administrativa do distrito de Hartberg‑Fürstenfeld (Áustria) procedeu a uma inspeção na Niedec. Por Decisão de 14 de junho de 2018, esta autoridade administrativa condenou a recorrente no processo principal, na sua qualidade de representante da CONVOI, no pagamento de uma sanção no montante total de 54 000 euros pelo não cumprimento de um certo número de obrigações previstas pela LSD‑BG, relativas, nomeadamente, à disponibilização de documentos salariais e de segurança social (8).

12.      Por Decisão de 9 de outubro de 2018, o órgão jurisdicional de reenvio submeteu ao Tribunal de Justiça um pedido de decisão prejudicial sobre a conformidade com o direito da União das sanções previstas pela legislação nacional em causa, em especial com o princípio da proporcionalidade.

13.      O Tribunal de Justiça respondeu a esta questão por despacho fundamentado nos termos do artigo 99.o do Regulamento de Processo no processo Bezirkshauptmannschaft Hartberg‑Fürstenfeld (n.o I) (9). Ao fazê‑lo, invocou o seu recente Acórdão proferido no processo Maksimovic (10), no qual o Tribunal de Justiça foi chamado a pronunciar‑se sobre questões muito semelhantes com fundamento no artigo 56.o, TFUE.

14.      Através do despacho proferido anteriormente no (mesmo) processo principal, o Tribunal de Justiça declarou que o artigo 20.o da Diretiva 2014/67 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma regulamentação nacional que prevê, em caso de não cumprimento das obrigações em matéria de direito do trabalho relativas à declaração dos trabalhadores e à conservação de documentos salariais, a aplicação de coimas que não podem ser inferiores a um montante predefinido, que são aplicadas cumulativamente por cada trabalhador em causa e sem limite máximo, e às quais acresce uma contribuição para as custas judiciais de 20 % do montante das coimas se for negado provimento ao recurso interposto da decisão que impõe essas coimas (11).

15.      O Tribunal de Justiça chegou à mesma conclusão (também ao abrigo do artigo 99.o do Regulamento de Processo), no despacho nos processos apensos C‑140/19, C‑141/19 e C‑492/19 a C‑494/19 (12), com origem no mesmo órgão jurisdicional de reenvio, no âmbito de processos diferentes mas em circunstâncias factuais semelhantes. Nesses processos, o Tribunal de Justiça baseou‑se também no que já tinha declarado no Acórdão Maksimovic.

16.      No presente processo, tendo em conta a jurisprudência do Tribunal de Justiça no processo Bezirkshauptmannschaft Hartberg‑Fürstenfeld (n.o I), o órgão jurisdicional de reenvio salienta, no entanto, que o legislador nacional ainda não procedeu à alteração da regulamentação nacional em causa no processo principal. Por conseguinte, o órgão jurisdicional de reenvio tem dúvidas sobre em que medida essa regulamentação pode ser aplicada. O órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se, mais precisamente, sobre se as disposições penais em causa que se mantêm em vigor podem ainda ser aplicadas e, em caso afirmativo, em que medida.

17.      O órgão jurisdicional de reenvio refere que tem emanado dos tribunais superiores austríacos jurisprudência divergente nesta matéria. Por um lado, o Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo, Áustria) decidiu que, para dar cumprimento ao direito da União, está obrigado a afastar a expressão «por cada respetivo trabalhador» (13). Ao fazê‑lo, esse tribunal reduziu e limitou efetivamente os montantes totais das sanções a aplicar, ao mesmo tempo que ainda permite que sejam aplicadas coimas(14).

18.      Por outro lado, em vários acórdãos, o Verfassungsgerichtshof (Tribunal Constitucional, Áustria) anulou (na sua totalidade) as sanções aplicadas com base nas disposições nacionais controvertidas (15). O órgão jurisdicional de reenvio esclarece que os acórdãos do Verfassungsgerichtshof (Tribunal Constitucional) foram interpretados por alguns tribunais nacionais de modo a não ser de todo admissível continuar a aplicar as sanções em causa. Isto significa então que nenhuma sanção pode ser aplicada com base nas disposições declaradas desproporcionadas pelo Tribunal de Justiça até que nova legislação seja adotada.

19.      No entanto, afigura‑se que a maioria dos tribunais administrativos seguiu a posição do Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo). Porém, parecem, ainda assim, chegara conclusões bastante diferentes: alguns tribunais fixam o montante da sanção ao nível da pena mínima. Noutros casos, o montante total da sanção é fixado de forma a corresponder praticamente à soma das penas individuais que, até então, deveriam ser aplicadas por cada infração. Além disso, vários juízes administrativos adotaram a sua própria interpretação do Acórdão Maksimovic e continuam a aplicar cumulativamente as sanções.

20.      Foi nestas circunstâncias que o Landesverwaltungsgericht Steiermark (Tribunal Administrativo Regional da Estíria, Áustria) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      O requisito da proporcionalidade das sanções, previsto no artigo 20.o da Diretiva 2014/67/UE e interpretado pelos Despachos do Tribunal de Justiça da União Europeia [de 19 de dezembro de 2019,] Bezirkshauptmannschaft Hartberg‑Fürstenfeld (C‑645/18, [não publicado,] EU:C:2019:1108) [, e de 19 de dezembro de 2019, EX e o.] (C‑140/19, C‑141/19, C‑492/19, C‑493/19 e C‑494/19, [não publicados,] EU:[C]2019:1103), é uma disposição diretamente aplicável de uma diretiva?

2)      Em caso de resposta negativa à primeira questão:

A interpretação do direito nacional em conformidade com o direito da União permite e exige que, não tendo sido adotada nova legislação nacional, os tribunais e as autoridades administrativas do Estado‑Membro completem as disposições penais nacionais aplicáveis no presente caso com os critérios de proporcionalidade, definidos nos Despachos do Tribunal de Justiça da União Europeia nos processos Bezirkshauptmannschaft Hartberg‑Fürstenfeld (C‑645/18, [não publicado,]EU:C:2019:1108) [, e de 19 de dezembro de 2019], Ex e o. e (C‑140/19 [a] C‑494/19, [não publicado,]EU:2019:1103)?»

21.      Foram apresentadas observações escritas pelos Governos checo, austríaco e polaco, bem como pela Comissão Europeia.

IV.    Análise

22.      As presentes conclusões estão estruturadas do seguinte modo. Antes de mais, analisarei a primeira questão prejudicial: o artigo 20.o da Diretiva 2014/67 e, mais precisamente, o requisito da proporcionalidade das sanções no mesmo previstas, tem efeito direto (A)? Debruçar‑me‑ei em seguida sobre as consequências para o caso em apreço do efeito direto (ou da sua falta) deste requisito (B). Na minha opinião, o requisito da proporcionalidade constante da disposição que impõe aos Estados‑Membros a adoção de um regime de sanções «efetivas, proporcionadas e dissuasivas» tem efeito direto. Todavia, na medida em que existe, no mínimo, uma tensão entre esta tese e as Conclusões do Tribunal de Justiça no processo Link Logistik, concluirei com uma sugestão sobre a forma de proceder (C).

A.      O requisito da proporcionalidade das sanções tem efeito direto?

23.      O artigo 20.o da Diretiva 2014/67 estabelece que os Estados‑Membros «definem regras relativas às sanções aplicáveis em caso de violação das disposições nacionais adotadas nos termos da [referida] diretiva» e que «tomam as medidas necessárias para garantir a sua aplicação e cumprimento efetivos». Exige que essas sanções sejam «efetivas, proporcionadas e dissuasivas».

24.      No seu Despacho Bezirkshauptmannschaft Hartberg‑Fürstenfeld (n.o I), o Tribunal de Justiça declarou no que respeita ao litígio no processo principal no presente processo (16), que o artigo 20.o da Diretiva 2014/67 é violado pelas disposições austríacas em causa, nomeadamente no que respeita ao requisito da proporcionalidade (17).

25.      O órgão jurisdicional de reenvio pede agora esclarecimentos sobre as consequências práticas dessa primeira decisão. Pretende saber, em especial, quais são exatamente as suas obrigações no processo principal, tendo em conta que as disposições nacionais em causa se mantêm em vigor. O órgão jurisdicional de reenvio está bem ciente da jurisprudência do Tribunal de Justiça no Acórdão Link Logistik e do facto de o Tribunal de Justiça ter respondido negativamente quando foi chamado a pronunciar‑se sobre uma questão relativa ao efeito direto do requisito da proporcionalidade enunciado no artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62/CE (18), disposição quase idêntica à do artigo 20.o da Diretiva 2014/67. Todavia, para poder decidir no litígio que lhe foi submetido, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se sobre se a mesma conclusão se impõe igualmente no que respeita ao efeito direto do artigo 20.o da Diretiva 2014/67.

26.      Nesta secção recordarei as principais linhas da decisão do Tribunal de Justiça no Acórdão Link Logistik (1). Em seguida, explicarei por que razão (ainda) considero o requisito da proporcionalidade previsto no artigo 20.o da Diretiva 2014/67 como tendo efeito direto, reiterando não só os argumentos já expostos nas minhas Conclusões no processo Link Logistik (19) (2), mas acrescentando ainda algumas considerações, em especial de natureza sistémica (3).

1.      Posição do Tribunal de Justiça no processo Link Logistik

27.      A semelhança entre o processo Link Logistik e o presente processo é peculiar. Em primeiro lugar, no Acórdão Euro‑Team e Spirál‑Gép, o Tribunal de Justiça declarou que a legislação húngara que prevê a aplicação de uma coima de montante fixo pela falta de pagamento de portagens, independentemente da natureza e da gravidade da infração, viola o requisito da proporcionalidade previsto no artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62 (20).

28.      Em seguida, face a essa declaração de incompatibilidade no Acórdão Link Logistik, outro tribunal húngaro submeteu ao Tribunal de Justiça questões específicas sobre os efeitos práticos da sua jurisprudência no Acórdão Euro‑Team e Spirál‑Gép. Como deveria essa declaração de incompatibilidade ser tida em conta por um juiz nacional e aplicada a casos concretos? Em especial, colocava‑se a questão de saber se o artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62 (21), cuja redação é muito semelhante à do artigo 20.o da Diretiva 2014/67, tinha efeito direto e o que poderiam fazer ou, que obrigações teriam, as autoridades judiciárias e administrativas nesse caso.

29.      O Tribunal de Justiça declarou, no Acórdão Link Logistik, em primeiro lugar, que o artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62 não tinha efeito direto. O Tribunal de Justiça declarou, desde logo, que «para que o princípio da proporcionalidade seja aplicado no âmbito da Diretiva 1999/62, os Estados‑Membros devem adotar os atos jurídicos necessários segundo o seu direito interno, enunciando o artigo 9.o‑A desta diretiva uma obrigação que, por natureza, necessita a intervenção de um ato dos Estados‑Membros, os quais dispõem de uma grande margem de apreciação na transposição desta obrigação» (22). O Tribunal de Justiça decidiu então que «esta diretiva não contém regras mais precisas no que diz respeito à previsão das referidas sanções nacionais e não estabelece, nomeadamente, nenhum critério expresso para apreciar o caráter proporcionado dessas sanções» (23). Por conseguinte, o Tribunal de Justiça concluiu que «uma vez que necessita da intervenção dos Estados‑Membros e lhes confere uma margem de apreciação significativa, o artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62 não pode ser considerado, do ponto de vista do seu conteúdo, incondicional e suficientemente preciso, o que exclui o seu efeito direto» (24).

30.      O Tribunal de Justiça acrescentou que «[u]ma interpretação contrária conduziria, na prática, a uma supressão do poder de apreciação conferido exclusivamente aos legisladores nacionais, aos quais cabe conceber um regime de sanções adequado, no quadro definido no artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62» (25). O Tribunal de Justiça concluiu em seguida, no que respeita à questão do efeito direto, que, «em circunstâncias como as do processo principal, o requisito da proporcionalidade das sanções previsto no artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62 não deve ser interpretado no sentido de que impõe ao juiz nacional que se substitua ao legislador nacional» (26).

2.      Razões pelas quais o requisito da proporcionalidade tem efeito direto

31.      No que respeita ao teste do efeito direto, e tendo em conta a aplicação da jurisprudência constante do Tribunal de Justiça nesses processos, não posso deixar de resumir os argumentos já expostos nas minhas Conclusões em Link Logistik (27). Aproveitarei também esta oportunidade para esclarecer alguns desses argumentos e para acrescentar várias outras considerações de natureza mais sistémica na secção seguinte das presentes conclusões.

32.      O efeito direto é a suscetibilidade de uma norma de direito da União ser judicialmente invocada, diretamente a nível nacional, perante o juiz nacional, sem necessidade de «intermediação» do direito nacional. Consiste na fusão efetiva de dois conjuntos de normas que devem ser aplicadas a um processo: o direito nacional e o direito da União. É apreciada à luz de uma disposição legal concreta ou de uma parte desta, aplicável perante a autoridade nacional. É determinada por referência à natureza, à sistemática geral e à redação da disposição em questão. É a disposição suficientemente clara, precisa e incondicional para poder ser invocada perante juízos tribunais (28)?

33.      Segundo a Comissão, o requisito da proporcionalidade consagrado no artigo 20.o da Diretiva 2014/67 tem efeito direto. É suficientemente claro, preciso e incondicional. Inversamente, e com base na posição adotada pelo Tribunal de Justiça no Acórdão Link Logistik, os Governos austríaco e polaco sustentam que o artigo 20.o da Diretiva 2014/67 não cumpre suficientemente os requisitos de clareza e precisão, uma vez que exige a intervenção dos Estados‑Membros e lhes concede uma ampla margem de apreciação. O Governo checo considera que não é necessário analisar o caráter incondicional e suficientemente preciso do artigo 20.o da Diretiva 2014/67, uma vez que, em qualquer caso, o direito da União se opõe de forma absoluta a que as disposições de uma diretiva que foram transpostas incorretamente sejam aplicadas contra particulares. Parece ser esse o caso no processo principal, uma vez que as disposições do direito austríaco em questão foram declaradas incompatíveis com o direito da União pelo Tribunal de Justiça.

34.      Subscrevo a opinião da Comissão. Na minha opinião, o requisito da proporcionalidade das sanções consagrado no artigo 20.o da Diretiva 2014/67 é suficientemente claro, preciso e incondicional. Quanto a esta imposição específica, os requisitos do efeito direto estão preenchidos.

35.      Em primeiro lugar, estão preenchidos os critérios de clareza e precisão.

36.      É verdade que, à primeira vista, o requisito da proporcionalidade pode parecer vago. Porém, a jurisprudência do Tribunal de Justiça confirma que o caráter «claro e preciso» de uma disposição é um conceito bastante flexível: uma disposição pode preencher esses requisitos, apesar de conter expressões indefinidas ou mesmo vagas ou conceitos jurídicos indeterminados (29).

37.      No caso em apreço, o significado e as consequências exatas do requisito da proporcionalidade no contexto das sanções podem compreender‑se facilmente: as sanções aplicadas não devem exceder o estritamente necessário para atingir o objetivo legitimamente visado. É também bastante claro a que devem as sanções ser proporcionadas: as sanções devem ser adequadas à gravidade da infração cometida (30). Em suma, no domínio das sanções, o princípio da proporcionalidade «exige, por um lado, que a sanção aplicada corresponda à gravidade da infração e, por outro, que, quando da determinação da sanção e da fixação do montante da coima, sejam tidas em conta as circunstâncias individuais do caso em apreço» (31). Mais concretamente no caso em apreço, isto significa que a avaliação deve ocorrer no contexto específico da Diretiva 2014/67 que prevê os objetivos e o quadro normativo de aplicabilidade do requisito da proporcionalidade das sanções.

38.      A jurisprudência do Tribunal de Justiça fornece indicações amplas sobre o teor do teste da proporcionalidade. Com efeito, a aplicação deste teste pressupõe um grau de avaliação jurisdicional/administrativa e, portanto, uma certa margem de apreciação. Todavia, importa sublinhar, neste contexto, que a clareza de uma norma não se confunde com a clareza do resultado da aplicação dessa norma a cada caso concreto (32). A proporcionalidade das sanções constitui um exemplo por excelência a este propósito. Independentemente do número de orientações ou decisões que possa haver sobre a interpretação deste conceito, um certo grau de incerteza em termos da sua aplicação subsistirá em consequência das circunstâncias específicas de cada caso concreto (33). Haverá sempre algum grau de incerteza quanto ao resultado, mas isso não significa que haverá incerteza a nível geral sobre o que a regra exige. (34).

39.      Além disso, o requisito da proporcionalidade também ser‑se afigura claro e preciso se tomarmos em consideração o ponto de vista das autoridades que são chamadas a aplicá‑lo regularmente — os tribunais e os órgãos administrativos nacionais — que estão (ou devem estar), de facto, familiarizados e bem preparados para aplicar o critério da proporcionalidade, em especial no contexto das sanções. Independentemente das suas atribuições para efetuar esse tipo de apreciação ao abrigo do direito nacional, é também habitual que o Tribunal de Justiça remeta para os tribunais nacionais a missão de apreciar a proporcionalidade de uma medida nacional, incluindo a proporcionalidade das sanções (35).

40.      Em segundo lugar, o requisito da proporcionalidade consagrado no artigo 20.o da Diretiva 2014/67 preenche igualmente o critério de incondicionalidade.

41.      Este critério implica que a disposição do direito da União não exige a adoção de qualquer outra medida para ser aplicada. Os Estados‑Membros não devem beneficiar de qualquer poder discricionário quanto à aplicação dessa disposição. Todavia, resulta da jurisprudência que, não obstante a existência de poder discricionário por parte do Estado‑Membro, os requisitos do efeito direto ainda podem ser satisfeitos se a questão de saber se as autoridades nacionais excederam o seu poder discricionário puder ser objeto de fiscalização jurisdicional (36). Será igualmente assim se se puder determinar um mínimo de garantia ou proteção (37) e a fiscalização jurisdicional puder verificar se esse nível mínimo foi respeitado (38).

42.      Tendo estas considerações em mente, há que salientar, quanto ao caráter incondicional do requisito da proporcionalidade das sanções, que a aplicação desse princípio não está sujeita a condições prévias. O papel do requisito da proporcionalidade no domínio das sanções, enquanto manifestação específica do princípio da proporcionalidade como limite da ação das autoridades administrativas, aponta claramente para um conteúdo ou uma proteção «mínimos». Como a Comissão corretamente sustenta, mesmo que o requisito da proporcionalidade do artigo 20.o da Diretiva 2014/67 confira aos Estados‑Membros uma margem de apreciação, impõe‑lhes um limite suficientemente claro: as sanções aplicadas não devem exceder o estritamente necessário.

43.      O Acórdão Link Logistik excluiu o efeito direto do requisito da proporcionalidade previsto no artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62 com base num conceito muito estrito de clareza, precisão e incondicionalidade. A circunstância referida no n.o 51 do Acórdão Link Logistik, de que uma disposição de uma diretiva requer uma transposição através da adoção de normas nacionais (39) não pode, por si só, excluir o efeito direto de uma disposição incluída nessa diretiva. Se assim fosse, as diretivas estariam sempre impedidas de produzir efeito direto em caso de transposição tardia, inexistente ou mesmo incorreta pelo legislador nacional.

44.      É certo que as disposições relativas às sanções previstas no artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62 e no artigo 20.o da Diretiva 2014/67, em causa no presente processo, não contêm regras precisas no que diz respeito à previsão das sanções, como foi recordado no n.o 52 do Acórdão Link Logistik. No entanto, isso não exclui a clareza, a precisão e o caráter incondicional do requisito da proporcionalidade, nem a correspondente proibição de adotar sanções desproporcionadas. Por outras palavras, a necessidade de uma intervenção dos Estados‑Membros e da sua margem de apreciação afetam, em geral, a adoção de um regime completo de sanções (40), mas não o conteúdo material do requisito da proporcionalidade e das obrigações que dele decorrem.

45.      Em suma, concordo naturalmente com o Tribunal de Justiça no sentido de que a escolha inicial da natureza, tipo e grau das sanções é e deve ser feita pelo legislador nacional quando da devida transposição do direito da União em causa, como o artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62, ou o artigo 20.o da Diretiva 2014/67. Contudo, por todas as razões expostas na presente secção, isso certamente não obsta a que, no grande volume das disposições do direito da União que o legislador nacional deve transpor algumas delas, como o requisito de proporcionalidade das sanções, já tenham, por si só, direto efeito, e possam, assim, judicialmente invocadas, se for caso disso e houver necessidade, perante os tribunais nacionais.

3.      Outros elementos que justificam o efeito direto do requisito da proporcionalidade

46.      Várias considerações adicionais devem ser tidas em conta para uma tomada de posição sobre o requisito da proporcionalidade consagrado no artigo 20.o da Diretiva 2014/67. Com efeito, de um ponto de vista mais vasto e sistemático, é um truísmo sugerir que esta disposição específica, ao consubstanciar o requisito da proporcionalidade, está longe de uma disposição solitária e isolada, tanto na sua dimensão vertical [a sua relação com a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta»), Tratados e princípios gerais do direito] como na horizontal (com inúmeras disposições quase idênticas repartidas por outros tantos instrumentos do direito derivado). Como o presente processo e as questões nele suscitadas demonstram claramente, a opção exercida no Acórdão Link Logistik tem repercussões e causa um efeito de cadeia na superfície das águas do direito da União.

47.      Em primeiro lugar, negar, o efeito direto da disposição em causa no presente processo, que contém o requisito da proporcionalidade das sanções num domínio específico pode também significar a rejeição do efeito direto do artigo 49.o, n.o 3, da Carta e a proibição de sanções desproporcionadas.

48.      Reconhece‑se que o Tribunal de Justiça ainda não se pronunciou expressamente a respeito deste direito específico da Carta. Contudo, tendo em conta a orientação geral da jurisprudência mais recente no que diz respeito ao efeito direto das disposições da Carta, seria uma constatação bastante surpreendente negar o efeito direto do seu artigo 49.o, n.o 3. De facto, o efeito direto de disposições ou princípios igualmente (ou mesmo mais) vagos, como os direitos a uma proteção jurisdicional efetiva (41), o princípio da não discriminação em razão da religião ou das convicções (42), o princípio ne bis in idem (43), ou ainda o direito a férias remuneradas (44) tem sido declarado nos últimos anos (45). Tendo devidamente em vista a precisão, a clareza e o caráter incondicional da disposição em causa, a proibição de sanções desproporcionadas surge, na minha opinião, como um candidato claramente mais qualificado para a atribuição de efeito direto.

49.      Em segundo lugar, um elemento de proporcionalidade está incorporado no conteúdo de todas as liberdades fundamentais. Mesmo que talvez nem sempre seja expressamente mencionado numa disposição do Tratado relativa a uma liberdade fundamental enquanto tal, esse elemento tende a ser introduzido por via da jurisprudência e aplicado no âmbito do critério de análise das justificações de restrições ou a normas ou práticas indiretamente discriminatórias (46).

50.      Isto é particularmente visível no que respeita ao quadro jurídico aplicável ao presente processo. No Acórdão Maksimovic, o Tribunal de Justiça apreciou disposições nacionais de teor quase idêntico pelo prisma das regras aplicáveis à livre circulação. O Tribunal de Justiça declarou que as disposições nacionais em causa eram contrárias ao artigo 56.o, TFUE, devido ao seu caráter desproporcionado (47). No entanto, não há dúvidas de que o artigo 56.o TFUE tem efeito direto (48).

51.      Nestas circunstâncias, seria, no mínimo, paradoxal considerar que as disposições nacionais em matéria de sanções não devem ser aplicadas porque se opõem à proibição geral de introduzir entraves desproporcionados à livre circulação por força do artigo 56.o TFUE, para depois concluir que a disposição mais específica relativa à proporcionalidade das sanções no âmbito da diretiva mais específica sobre a questão do destacamento de trabalhadores não tem efeito direto.

52.      Além disso, o conteúdo do requisito da proporcionalidade parece manter‑se o mesmo independentemente de ser apreciado como parte do artigo 20.o da Diretiva 2014/67 ou da disposição mais geral do artigo 56.o, TFUE. Os dois despachos posteriores relativos à interpretação da Diretiva 2014/67 (49) repetem quase literalmente, quando interpretam o requisito da proporcionalidade do seu artigo 20.o, a fundamentação desenvolvida pelo Tribunal de Justiça no Acórdão Maksimovic no que respeita ao requisito da proporcionalidade consagrado no artigo 56.o, TFUE. Foi a semelhança de Maksimovic que contribuiu para a adoção de decisões fundamentadas com base no artigo 99.o do Regulamento de Processo.

53.      Em terceiro lugar, o Tribunal de Justiça declarou implicitamente que a disposição do TFUE que segundo a qual os Estados‑Membros adotarão sanções efetivas para proteger os interesses financeiros da União, designadamente, o artigo 325.o, TFUE, é de efeito direto. O Tribunal de Justiça também reconheceu expressamente a obrigação de os Estados‑Membros não aplicarem as disposições do direito nacional que se opõem a este requisito (50). No âmbito da jurisprudência decorrente desta disposição, o enfoque tem sido, porém, não na proporcionalidade, mas no requisito de efetividade.

54.      Contudo, é difícil admitir que o requisito da efetividade contido nessa disposição é, de facto, suficientemente claro, preciso e incondicional, mas que o requisito da proporcionalidade não o é. Para além de uma tese deste tipo ser de uma incoerência pouco justificável, está igualmente em causa o resultado moralmente questionável dessa potencial distinção. Apenas o requisito da efetividade, que conduz ao afastamento da aplicação das normas nacionais que retiram efetividade às sanções produz efeito direto, o que acaba por ser uma situação mais onerosa para os particulares. A não aplicação das normas nacionais contrárias ao requisito da proporcionalidade, que resultaria em benefício dos interesses dos particulares sujeitos a sanções, não pode ter efeito direto.

55.      Em quarto e último lugar, como demonstra o presente processo, uma decisão do Tribunal de Justiça sobre a questão do efeito direto do requisito da proporcionalidade das sanções pode ter repercussões a nível horizontal numa série de outros regimes de direito derivado para além da Diretiva 2014/67 ou da Diretiva 1999/62. Muitas diretivas em diferentes domínios do direito da União contêm uma disposição quase idêntica e uniforme em matéria de sanções, estabelecendo que as sanções a prever pelo Estado‑Membro devem ser «efetivas, proporcionadas e dissuasivas».

56.      É certo que cada diretiva regula diferentes elementos, questões ou domínios jurídicos. Contudo, não sei até que ponto essa circunstância pode contribuir para distinguir a precisão, a clareza ou a condicionalidade do requisito da proporcionalidade das sanções, que são redigidos de forma praticamente idêntica em todos estes instrumentos. É certo que o leque específico das sanções proporcionadas é suscetível de variar, tendo em conta o objeto da regulamentação e o tipo de infrações que devem ser punidas. Logicamente, a falta de pagamento de uma portagem rodoviária pode, por exemplo, ser diferente, no que diz respeito à sua natureza, gravidade e, por conseguinte, das sanções que podem razoavelmente ser aplicadas, do incumprimento do dever de apresentar uma oferta pública de aquisição obrigatória após aquisição de uma participação qualificada numa sociedade, por um lado, ou de despejar toneladas de resíduos tóxicos num rio, por outro.

57.      Todavia, na minha opinião, mantêm‑se em todas estas hipóteses a natureza e o conteúdo do requisito da proporcionalidade das sanções (diretamente aplicável), independentemente do quadro regulamentar. O domínio do direito e o tipo de infrações que devem ser punidas são apenas elementos factuais a ter em conta e são identificados na equação da proporcionalidade, aliás idêntica, entre os meios e os fins (51).

58.      Todas estas considerações apontam, a meu ver, para a conclusão de que, contrariamente ao que foi declarado em Link Logistik, o requisito da proporcionalidade das sanções consagrado no artigo 20.o da Diretiva 2014/67 tem efeito direto.

B.      Implicações específicas do efeito direto do requisito da proporcionalidade

59.      Com a sua segunda questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se, na inércia do legislador, o princípio da interpretação em conformidade com o direito da União permite (ou impõe mesmo) aos tribunais nacionais de completarem a legislação húngara antes que esta tenha sido alterada pelo legislador de modo a manter o requisito da proporcionalidade estabelecido no artigo 20.o da Diretiva 2014/67.

60.      Impõem‑se dois esclarecimentos em relação aos pressupostos em que esta questão aparentemente se baseia. Estes esclarecimentos conduzem, em definitivo, à sua reformulação.

61.      Em primeiro lugar, a fundamentação da segunda questão prejudicial pelo órgão jurisdicional de reenvio e, em particular, as dúvidas que suscita relativamente ao acórdão do Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo), tornam evidente a confusão que resultou do Acórdão Link Logistik do Tribunal de Justiça. Com efeito, ao invocar esta decisão, o órgão jurisdicional de reenvio fundamenta a sua segunda questão prejudicial na hipótese de não aplicação das disposições nacionais caso uma delas tenha sido declarada desprovida de efeito direto.

62.      Todavia, considerando o que será exposto na presente secção destas conclusões, o Tribunal de Justiça confirmou recentemente que a inaplicabilidade das disposições nacionais só é possível nos casos em que a disposição do direito da União invocada tenha efeito direto. Assim, a segunda questão prejudicial do órgão jurisdicional de reenvio refere‑se, na realidade, à possibilidade de uma não aplicação parcial ou mesmo de «complementar» estas e não a uma interpretação em conformidade com o direito da União. Não posso deixar de entender o termo «completar» (52) no sentido de significar a aplicação direta do requisito da proporcionalidade para completar as disposições nacionais e, em especial, preencher as lacunas dos elementos de direito nacional que foram afastados.

63.      Em segundo lugar, o órgão jurisdicional de reenvio suscitou a sua segunda questão prejudicial apenas no caso de a resposta à primeira questão ser negativa, ou seja, se o Tribunal de Justiça declarasse sem efeito direto o artigo 20.o da Diretiva 2014/67. Contudo, a minha proposta foi no sentido de uma resposta afirmativa à primeira questão, ou seja, que seja reconhecido o efeito direto do artigo 20.o da Diretiva 2014/67. Assim sendo, a segunda questão prejudicial do órgão jurisdicional de reenvio continua a ser muito pertinente, ou ainda mais nas circunstâncias em que a disposição em causa do direito da União tem efeito direto. Com efeito, seria precisamente nas circunstâncias inversas, em que o requisito da proporcionalidade das sanções não fosse diretamente aplicável, que a segunda questão se tornaria irrelevante (53).

64.      A segunda questão prejudicial deve, pois, ser reformulada da seguinte forma: o requisito da proporcionalidade das sanções consagrado no artigo 20.o da Diretiva 2014/67 permite e/ou exige aos tribunais e às autoridades administrativas do Estado‑Membro que — na falta de nova legislação nacional — completem as disposições penais nacionais aplicáveis no presente processo?

65.      Para responder a esta questão, analisarei, antes de mais, a posição adotada pelo Tribunal de Justiça no Acórdão Link Logistik no que diz respeito à inaplicabilidade da legislação nacional incompatível com as disposições do direito da União sem efeito direto (1), bem como os esclarecimentos subsequentes a este respeito da Grande Secção do Tribunal de Justiça no Acórdão Popławski II (2) (54). Em seguida, exporei brevemente as diferentes posições adotadas pelos tribunais superiores austríacos [o Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo) e o Verfassungsgerichtshof (Tribunal Constitucional)] em resultado do Acórdão Maksimovic (3). Abordarei depois as implicações do efeito direto do requisito da proporcionalidade das sanções e as potenciais limitações que existem no domínio específico das sanções (4). Concluirei com uma observação final, mais geral, sobre a terminologia e a necessidade bastante intuitiva de proporcionalidade quando se trate de afastar uma disposição em nome do princípio da proporcionalidade (5).

1.      Posição do Tribunal de Justiça no Acórdão Link Logistik

66.      Como já se expôs supra, no Acórdão Link Logistik, o Tribunal de Justiça concluiu que o artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62 não tem efeito direto (55).

67.      Em seguida, o Tribunal de Justiça recordou a obrigação que impende sobre os Estados‑Membros de respeitarem o resultado visado pela diretiva, bem como o princípio da interpretação em conformidade com o direito da União os seus limites. No entanto, o Tribunal de Justiça reconheceu que não era possível uma interpretação conforme no caso em questão (56).

68.      Contudo, mesmo depois de ter excluído tanto o efeito direto como uma interpretação do direito nacional em conformidade com o direito da União, o Tribunal de Justiça concluiu que «o órgão jurisdicional nacional tem o dever de aplicar integralmente o direito da União e de proteger os direitos que este confere aos particulares, deixando, se necessário, de aplicar qualquer disposição, na medida em que a sua aplicação, nas circunstâncias do caso, conduza a um resultado contrário ao direito da União» (57).

69.      Esta afirmação é reiterada no dispositivo do acórdão, precisando que «não se pode considerar que o requisito da proporcionalidade, previsto no artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62 […] tenha efeito direto» e que «o juiz nacional deve, por força da sua obrigação de tomar todas as medidas gerais ou especiais adequadas a assegurar a execução dessa disposição, interpretar o direito nacional de modo conforme com esta última ou, se essa interpretação conforme não for possível, deixar de aplicar qualquer disposição nacional, na medida em que a sua aplicação, nas circunstâncias do caso concreto, conduza a um resultado contrário ao direito da União» (58).

2.      Esclarecimentos posteriores no Acórdão Popławski II

70.      Pouco depois do Acórdão Link Logistik, o Tribunal de Justiça, em formação de Grande Secção, proferiu o seu Acórdão Popławski II. Este processo dizia respeito à possibilidade de não aplicação das normas nacionais contrárias a uma disposição da Decisão‑Quadro 2008/909/JAI (59), instrumento que, por mandato do Tratado, é desprovido de efeito direto (60). Como tal, a questão específica que se suscitou era se, com base apenas no princípio do primado, um tribunal nacional podia não aplicar as normas nacionais contrárias a disposições do direito da União sem efeito direto.

71.      O Tribunal de Justiça declarou que «uma disposição do direito da União que não tenha efeito direto não pode ser invocada, enquanto tal, no âmbito de um litígio abrangido pelo direito da União, a fim de afastar a aplicação de uma disposição de direito nacional que lhe seja contrária» (61). O Tribunal de Justiça esclareceu ainda que «a obrigação que incumbe a um órgão jurisdicional nacional de deixar de aplicar uma disposição do seu direito interno contrária a uma disposição do direito da União, embora decorra do primado reconhecido a esta última disposição, está, no entanto, condicionada pelo efeito direto da referida disposição no litígio sobre o qual esse órgão jurisdicional é chamado a pronunciar‑se. Por conseguinte, um juiz nacional não está obrigado, com fundamento unicamente no direito da União, a deixar de aplicar uma disposição do seu direito nacional contrária a uma disposição do direito da União, se esta última disposição não tiver efeito direto» (62).

72.      O elemento central desta jurisprudência foi confirmado várias vezes em relação a uma série de outras disposições do direito da União não contidas em decisões‑quadro (63).

73.      Assim, o Acórdão Popławski II e a jurisprudência posterior, com vários acórdãos também proferidos em Grande Secção do Tribunal de Justiça, decidiram sob autoridade a questão de saber se a inaplicabilidade do direito nacional pode ser apenas consequência do primado, ou do primado do direito da União em conjugação com o efeito direto da disposição do direito da União que deve ser aplicada.

74.      É certo que não é possível esconder o facto de que esta mesma questão já tinha sido debatida há algum tempo (64), com opções e visões diversas em cima da mesa (65). Porém, tendo em conta as sucessivas declarações de autoridade proferidas pela formação alargada do Tribunal de Justiça chamada a resolver esta questão, considero que a discussão está agora terminada, certamente no foro judicial.

3.      Implicações para o presente processo: as visões concorrentes a nível nacional

75.      A nível nacional, diferentes órgãos jurisdicionais têm visões divergentes sobre o significado prático para os processos em curso das decisões de incompatibilidade proferidas pelo Tribunal de Justiça no que respeita a vários elementos do regime de sanções em causa. A segunda questão suscitada pelo órgão jurisdicional de reenvio insere‑se no quadro dessas visões concorrentes.

76.      Por um lado, existe a abordagem adotada no acórdão do Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo) (66). No quadro de um processo semelhante e depois de ter sido proferido o Acórdão Maksimovic, aquele tribunal considerou que, a fim dar cumprimento ao direito da União, apenas alguns elementos da disposição nacional em causa deviam ser afastados. Na sequência do referido acórdão ainda é possível aplicar sanções que estão, segundo aquele tribunal, em conformidade com os requisitos da proporcionalidade.

77.      Em primeiro lugar, o Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo) declarou que, para dar cumprimento ao direito da União, a expressão «por cada respetivo trabalhador» não deveria ser aplicada. Estes termos constavam do § 7i n.o 4, da AVRAG, mas correspondem essencialmente aos termos dos §§ 26, n.o 1 e 28 da LSD‑BG, que são pertinentes para o presente processo (67).

78.      Se bem entendo, ao não aplicar a expressão «por cada respetivo trabalhador», os limites impostos pelas disposições nacionais relativamente a cada trabalhador tornam‑se aplicáveis em geral, no que respeita a todos os trabalhadores em causa. Excluir a expressão «por cada respetivo trabalhador» equivale, não só a reduzir consideravelmente o montante potencial das coimas, e a introduzir de um leque claro de montantes admissíveis, mas também a incluir um limite máximo global que era omisso na legislação, o que constituiu um dos fatores que levou este Tribunal a concluir que as disposições pertinentes do direito austríaco eram desproporcionadas (68).

79.      Em segundo lugar, o Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo) declarou igualmente que as sanções mínimas previstas na lei deviam deixar de ser aplicadas. Em terceiro lugar, declarou que as penas privativas de liberdade subsidiárias em caso de não pagamento já não podem ser aplicadas nos termos do § 16 da Lei Relativa às Infrações Administrativas. A existência de sanções mínimas e a possibilidade de aplicação de penas privativas de liberdade subsidiárias foram também elementos que levaram o Tribunal de Justiça a concluir que as sanções em causa foram desproporcionadas no Acórdão Maksimovic (69). Em quarto lugar, o Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo) considerou que não era necessário afastar a disposição relativa à contribuição para as custas judiciais(70).

80.      Assim, em resultado da abordagem adotada pelo Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo), as autoridades administrativas continuam a poder aplicar sanções, ainda que consideravelmente reduzidas, desde que estejam em conformidade com o direito da União.

81.      Tomando como ponto de partida a resposta do Tribunal de Justiça no Acórdão Link Logistik, o órgão jurisdicional de reenvio considera o acórdão do Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo) como sendo um exemplo de interpretação em conformidade com o direito da União, e observou corretamente que, se for esse o caso, a solução que propõe constitui uma interpretação contra legem (71). Nestas condições, pretende saber se a solução proposta pelo Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo) é conforme com direito da União. Mais concretamente, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se tem o direito de aplicar a solução adotada pelo Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo) ou se, visto o dispositivo do Acórdão Link Logistik, a única possibilidade de que dispõe é afastar por completo a aplicação das disposições nacionais contrárias.

82.      Por outro lado, o órgão jurisdicional de reenvio salientou também que o Verfassungsgerichtshof (Tribunal Constitucional) parece ter uma posição diferente. Pronunciando‑se num recurso constitucional de uma decisão de um tribunal administrativo de grau inferior no que respeita às sanções aplicadas com base nas disposições nacionais em causa, o Verfassungsgerichtshof (Tribunal Constitucional) teve em conta as observações feitas pelo Tribunal de Justiça no Acórdão Maksimovic para declarar que o direito de propriedade tinha sido violado (72). Após ter evocado a jurisprudência do Tribunal de Justiça segundo a qual os tribunais nacionais têm o dever de aplicar integralmente o direito da União e, se necessário, não aplicar qualquer disposição contrária do direito nacional, o tribunal constitucional anulou as sanções impostas. Chegando a esta conclusão, o Verfassungsgerichtshof (Tribunal Constitucional) declarou que a aplicação de sanções nacionais que são incompatíveis com as normas da UE que são de efeito direto leva a impor sanções sem uma base jurídica adequada (73).

83.      O órgão jurisdicional de reenvio esclarece que estes acórdãos constitucionais foram interpretados por alguns tribunais nacionais no sentido de que não lhe é permitido continuar a aplicar todas as sanções em causa. Nenhuma sanção pode ser imposta até que seja aprovada nova legislação. Assim, o órgão jurisdicional de reenvio considera opostas as posições do Verfassungsgerichtshof (Tribunal Constitucional) e do Verwaltungsgerichthof (Supremo Tribunal Administrativo).

84.      O Governo austríaco salientou que não existe qualquer contradição entre a jurisprudência do Verfassungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo) e a do Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo).

85.      Certamente que não compete ao Tribunal de Justiça tomar posição sobre o direito nacional e, a fortiori, dirimir conflitos entre os tribunais nacionais sobre as questões de direito nacional. Contudo, na medida em que diz respeito às consequências decorrentes do direito da União, as dúvidas do órgão jurisdicional de reenvio ilustram um dilema bem conhecido: face a uma disposição nacional contrária a uma disposição do direito da União com efeito direto, a não aplicação da totalidade da disposição do direito nacional é a única solução disponível, ou é possível proceder a uma não aplicação parcial ou seletiva do direito nacional ou mesmo completar esse direito? Enquanto a solução adotada pelo Verfassungsgerichtshof (Tribunal Constitucional) parece ter seguido o primeiro modelo, a jurisprudência do Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo) fornece um exemplo do segundo. Em termos simples, o que significa exatamente «não aplicar»?

4.      Implicações específicas do efeito direto do requisito da proporcionalidade

86.      As partes interessadas que apresentaram observações adotaram posições divergentes quanto às consequências do efeito direto do requisito da proporcionalidade consagrado no artigo 20.o da Diretiva 2014/67.

87.      A Comissão sustenta que esta disposição pode servir de base ao juiz para tornar as sanções conformes com o princípio da proporcionalidade. Isto porque, em primeiro lugar, o artigo 20.o desta diretiva exige que os Estados‑Membros imponham sanções às obrigações nela estabelecidas: a não previsão de quaisquer sanções seria igualmente contrária à diretiva. Em segundo lugar, como o Tribunal de Justiça declarou nos seus despachos, normas nacionais que prevejam sanções no caso de violação das obrigações em matéria do direito do trabalho em causa é adequada à realização dos objetivos legitimamente prosseguidos pela diretiva (74). Em terceiro lugar, o conflito entre o direito da União e a legislação nacional não implica necessariamente que este último seja completamente afastado: o direito da União só completa o direito nacional na medida em que seja suficiente para permitir a adoção de uma sanção que esteja em conformidade com o requisito da proporcionalidade. A este respeito, a Comissão considera que os tribunais austríacos devem, até, continuar a aplicar sanções cumulativamente na medida em que estas não sejam, em si mesmas, desproporcionadas por força da jurisprudência do Tribunal de Justiça (75).

88.      Do mesmo modo, o Governo austríaco defende que a não aplicação por completo das disposições nacionais levaria a uma situação de violação do direito da União. A não aplicação parcial das disposições nacionais em causa poderia, por si só, assegurar que as sanções previstas pela legislação nacional fossem aplicadas pelas autoridades e pelos órgãos jurisdicionais nacionais por força dos requisitos do direito da União (76).

89.      Inversamente, o Governo polaco considera que a determinação de sanções penais independentemente da redação das disposições legais nacionais poderia violar o princípio da legalidade; isto significa que a única solução possível afastar completamente a aplicação das disposições nacionais. Na mesma ordem de ideias, o Governo checo sustenta que uma abordagem no sentido da fixação do montante de uma sanção baseada, não em critérios estabelecidos por lei, que podem ser previamente conhecidos pelos destinatários da mesma, mas em critérios estabelecidos ex post por órgãos jurisdicionais ou autoridades administrativas, violaria o princípio da segurança jurídica.

90.      Concordo com a Comissão no sentido de que o efeito direto do princípio da proporcionalidade não implica necessariamente deixar de aplicar na sua totalidade as disposições nacionais em matéria de sanções. Na minha opinião, o foco desta questão reside no facto de o Tribunal de Justiça ter declarado certos elementos excessivos do regime nacional em matéria de sanções como sendo incompatíveis com o direito da União. O Tribunal de Justiça não declarou a incompatibilidade das sanções em si mesma nem afirmou, a fortiori, que o comportamento ilícito que está na base da aplicação dessas sanções não pode ser punido. Por outras palavras, o requisito da proporcionalidade das sanções não pode, de modo algum, ser equiparado à inexistência de sanções. Com efeito, esta tese afigura‑se ser, certamente em abstrato, algo desproporcionada.

91.      Porém, reconheço as dúvidas suscitadas pelo órgão jurisdicional de reenvio no contexto particular das sanções de natureza criminal, que conduzem a preocupações em termos de princípios da legalidade, da segurança jurídica e da igualdade perante a lei, que irei analisar agora.

a)      Legalidade, segurança jurídica e igualdade perante a lei na aplicação de sanções

92.      O órgão jurisdicional de reenvio reconhece que a solução que decorreu do acórdão do Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo) pode ser problemática por razões relativas ao princípio da legalidade. Este princípio é interpretado de forma muito estrita pelo Verfassungsgerichtshof (Tribunal Constitucional), nomeadamente no domínio do direito penal. Além disso, como o órgão jurisdicional de reenvio salientou, alguns tribunais austríacos interpretaram de forma diferente os acórdãos proferidos pelos tribunais superiores austríacos. Face às posições divergentes adotadas por tribunais administrativos, o órgão jurisdicional de reenvio resume a situação atual como sendo qualificada por uma jurisprudência divergente e por insegurança jurídica. Além disso, considera que as divergências que caracterizam a atual prática judicial são questionáveis à luz do princípio da igualdade. A aplicação de sanções num sistema caso a caso é desconhecida à ordem jurídica austríaca em geral e ao sistema judicial penal em particular.

93.      O Governo checo salientou que, de qualquer modo, não se pode considerar o artigo 20.o da Diretiva 2014/67 como tendo efeito direto, de forma a poder ser invocado contra um particular. A jurisprudência do Tribunal de Justiça exclui a possibilidade de um Estado‑Membro invocar o efeito direto de uma diretiva para aplicar sanções com base nas suas disposições. Esse Governo também considera que, se cada tribunal ou autoridade administrativa pudesse modelar as normas nacionais de forma criativa, isso levaria inevitavelmente a diferenças nos montantes das sanções aplicadas, sem fundamentação objetiva.

94.      Na mesma linha, o Governo polaco entende que dar a possibilidade a cada tribunal ou autoridade de graduar as sanções que divergem das normas legais constitui uma violação dos requisitos do princípio da legalidade. O Governo polaco sustentou mesmo que as interpretações diferentes a que chegaram os vários tribunais prova que o artigo 20.o não tem efeito direto.

95.      Estes argumentos não me convencem pelas razões que se seguem.

96.      O princípio da legalidade exige que a lei defina claramente as infrações e as penas aplicáveis no momento em que o ato ou a omissão puníveis foram praticados. Este requisito está preenchido quando o litigante conhece, a partir da redação da disposição pertinente e, se necessário, recorrendo à interpretação que lhe é dada pelos tribunais, os atos e omissões pelos quais responde penalmente (77). Porém, esses requisitos não proscrevem a clarificação gradual das regras da responsabilidade penal através da interpretação jurisprudencial, contanto que estas sejam razoavelmente previsíveis (78). Além disso, o elemento lex mitior do artigo 49.o da Carta opõe‑se a que seja imposta uma pena mais grave do que a aplicável no momento em que a infração foi cometida.

97.      Na minha opinião, a possibilidade de não aplicar em parte as disposições nacionais que sejam contrárias ao direito da União, bem como de as completar ou aditar através da aplicação direta do princípio da proporcionalidade não constitui violação do princípio da legalidade consagrado no artigo 49.o da Carta.

98.      Em primeiro lugar, as infrações e as penas aplicáveis foram definidas no momento em que o ato punível foi cometido. Como tal, os indivíduos pudessem conhecer as consequências do seu comportamento. O efeito direto do princípio da proporcionalidade não conduz à aplicação de sanções com base numa diretiva transposta incorretamente. As sanções baseiam‑se, não na diretiva, mas no direito nacional, tal como foi validamente promulgado e posto à disposição dos seus destinatários. Por esta razão, a jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa à impossibilidade de aplicar diretamente diretivas que determinam ou agravem a responsabilidade penal dos particulares (79) não é simplesmente relevante no caso em apreço.

99.      Em segundo lugar, o requisito da proporcionalidade consagrado no artigo 20.o da Diretiva 2014/67 é a base para mitigar e corrigir as disposições nacionais através do seu efeito direto. Por outras palavras, o requisito da proporcionalidade não é a base para aplicar ou agravar sanções, mas a base que justifica sanções legalmente aplicadas sejam reduzidas de modo a torná‑las conformes com o direito da União.

100. Em terceiro lugar, e uma vez mais, o acórdão, que declara o caráter desproporcionado das sanções no Acórdão Maksimovic e nos dois despachos posteriores do Tribunal de Justiça não afeta a validade das disposições nacionais aplicáveis que definem as infrações. Assim, a criminalização e a punição destas infrações mantêm claramente a sua legalidade. As decisões do Tribunal de Justiça apenas afetam determinados elementos específicos do regime nacional em matéria de sanções declarados incompatíveis devido ao seu caráter desproporcionado.

101. Seguem‑se as preocupações manifestadas pelo órgão jurisdicional de reenvio quanto à existência de jurisprudência divergente nos tribunais administrativos e às consequências negativas que isso pode implicar do ponto de vista do princípio da igualdade e da segurança jurídica. Embora partilhe inteiramente dessas preocupações, é difícil sugerir que o efeito direto do requisito da proporcionalidade das sanções seja a sua única ou, mesmo, a principal causa.

102. Um certo grau de incerteza temporal quanto à aplicação correta das disposições nacionais na sequência da declaração da sua incompatibilidade com o direito da União é, de facto, inerente ao funcionamento do sistema judicial difuso e descentralizado da União. Contrariamente, por exemplo, a várias ordens jurídicas nacionais, em que uma declaração de inconstitucionalidade proferida por (um) tribunal constitucional nacional implica a anulação das disposições nacionais com efeitos erga omnes, a não aplicação por (qualquer) tribunal nacional devido a incompatibilidade com o direito da União pode, por um certo período de tempo, estar sujeita às normas processuais gerais e aos meios disponíveis no direito nacional. Por conseguinte, desde que a questão não seja definitivamente decidida por este Tribunal, na sua qualidade de intérprete máximo do direito da União, poderiam existir, antes de serem unificadas a nível nacional pelo tribunal superior respetivo, visões concorrentes sobre a mesma questão, mesmo por parte dos vários tribunais nacionais.

103. Todavia, não se pode ignorar que a insegurança jurídica e a diversidade na aplicação a nível nacional no caso em apreço se devem, em grande parte, a dois fatores com origem no contexto nacional. Em primeiro lugar, como o órgão jurisdicional de reenvio salientou reiteradamente, o legislador nacional manteve‑se inativo. No entanto, seria naturalmente de presumir, caso deva ser clarificada alguma incerteza no que respeita ao âmbito da aplicação de sanções, que caberia ao legislador nacional proceder a esse exercício a fim de minimizar a incerteza temporal que decorre de uma declaração de incompatibilidade.

104. Em segundo lugar, mesmo que o legislador nacional não tenha intervindo, a aplicação uniforme do direito nacional deveria ser assegurada, em definitivo, num sistema judicial nacional tipicamente organizado de forma hierárquica, claramente numa tradição jurídica civilista. Compete geralmente aos tribunais de superiores unificar a jurisprudência nas suas respetivas áreas de competência. Todavia, nessa dimensão, afigura‑se que as disposições nacionais em matéria de competência permitem, no essencial, a opção de interpor recurso de uma decisão de um tribunal administrativo inferior tanto para o Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo) como para o Verfassungsgerichtshof (Tribunal Constitucional) (80).

105. Gostaria de realçar claramente que tudo isto, enquanto questão de direito da União, é possível. Com efeito, o modo como instituições e processos judiciais nacionais são estruturados continua a ser da escolha inicial do Estado‑Membro (81). Todavia, afigura‑se mais problemático o facto de se retirarem as consequências de tais escolhas nacionais (inércia do legislador e inexistência de autoridade judicial para uniformizar a jurisprudência) e apresentá‑las como consequências do efeito direto potencial do requisito da proporcionalidade das sanções baseado no direito da União.

106. Por último, para além do nível estrutural, subsiste ainda a questão da potencial incerteza no que respeita ao montante exato da sanção em cada caso concreto. Em matéria de aplicação de sanções, mesmo que se adote como ponto de partida a abordagem adotada pelo Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo), subsiste ainda a questão de o montante da sanção ser fixado, por exemplo, entre 1 000 e 10 000 euros, ou, caso o mínimo seja suprimido, de 0 a 10 000 euros. Assim, é admissível que seja aplicada a um infrator uma sanção no montante de 100 euros e a outro uma sanção no montante de 5 000 euros. Isso poderia, por sua vez, levantar efetivamente a questão da igualdade perante a lei.

107. Porém, um problema de igualdade poderia, então, colocar‑se apenas se os dois infratores se encontrassem numa situação idêntica. Não existiriam, assim, elementos distintivos. Dito isto, a vida tende a ser infinitamente diversificada. É por esta razão que, tanto o direito administrativo como o direito penal, ao definirem sanções ou penas em geral, pelo menos no direito moderno (82), normalmente não procedem a uma abordagem de tipo «tamanho único que serve a todos», mas fixam um leque admissível, no interior do qual deve ser exercido o poder discricionário administrativo ou judicial.

108. Reitera‑se que, como já foi salientado no que respeita ao conteúdo incondicional do requisito da proporcionalidade das sanções, a expressão «clara, precisa e incondicional» não implica que todos os aspetos do direito estejam de antemão expressamente estabelecidos na legislação. Tal cenário é simplesmente irreal. Contudo, o que é deixado por decidir deve, no mínimo, poder ser judicialmente invocado (83).

109. Em suma, não vejo quaisquer questões suscitadas no caso em apreço quer pelo princípio da legalidade das sanções ao abrigo do artigo 49.o da Carta quer pelo imperativo de segurança jurídica e de igualdade perante a lei, como questão de direito da União.

110. Dito isto, é, no entanto, verdade que a adoção de sanções no domínio abrangido pela Diretiva 2014/67 não foi objeto de uma harmonização completa pelo direito da União. Assim, as sanções aplicáveis neste domínio continuam a ser da discricionariedade dos Estados‑Membros. É certo que a sua existência é, em geral, mandatada pelo direito da União (deve haver algumas sanções), mas os elementos problemáticos particulares relativos ao seu âmbito e aplicação (desproporcionados) devem ser fixados pelos Estados‑Membros.

111. Por conseguinte, recordando a abordagem adotada pelo Tribunal de Justiça nos Acórdãos M.A.S. e M.B. (84), nesta situação, as autoridades e os tribunais nacionais deveriam, em princípio, poder aplicar livremente os diferentes (mais elevados) padrões nacionais de proteção dos direitos fundamentais. Isso poderia incluir visões mais estritas do princípio da legalidade das sanções, se esse requisito existir realmente no direito nacional e for aplicado a sanções estabelecidas pelo direito nacional que não são inteiramente definidas pelo direito da União (85).

b)      Proporcionalidade mediante o afastamento da aplicação de disposições nacionais desproporcionadas?

112. As Conclusões do Tribunal de Justiça no Acórdão Maksimovic e nos despachos subsequentes que declaram o caráter desproporcionado das sanções previstas pela legislação austríaca basearam‑se numa combinação de fatores: i) o montante elevado das coimas; ii) a acumulação sem limites dessas coimas; iii) o facto de as coimas não poderem ser inferiores a um montante mínimo predefinido, mesmo quando não esteja demonstrado que os factos censurados são de especial gravidade; iv) o facto de, em caso de improcedência do recurso, ser imposto ao recorrente uma contribuição para as despesas processuais equivalente a 20 % da coima aplicada; e v) o facto de o não pagamento de uma coima poder levar a uma pena de prisão (86).

113. Neste contexto, em meu entender, a solução encontrada pelo Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo) é pragmática e, ao mesmo tempo, refinada. De uma só penada, esse tribunal afastou a aplicação de vários elementos contidos nas disposições nacionais aplicáveis. Introduziu um limite máximo, ao mesmo tempo que permitiu um leque admissível de sanções. Além disso, suprimiu o limite inferior e eliminou a possibilidade de aplicar a pena de prisão substitutiva em caso de não pagamento. Ao fazê‑lo, o Verwaltungsgerichthof (Supremo Tribunal Administrativo) afastou a aplicação de diferentes elementos do regime austríaco de sanções, mantendo simultaneamente a possibilidade de continuar a aplicar as sanções até que o legislador proceda à alteração da legislação pertinente.

114. Não posso, uma vez mais, deixar de salientar que o direito da União não exclui a aplicação de sanções aplicáveis às infrações em causa, antes pelo contrário. O artigo 20.o da Diretiva 2014/67 impõe a obrigação de adotar essas sanções, que devem ser proporcionadas, mas igualmente dissuasivas e efetivas. Além disso, do ponto de vista do artigo 20.o desta diretiva, a possibilidade de completar o direito nacional está em conformidade com os objetivos da diretiva, uma vez que permite estabelecer um equilíbrio razoável entre o requisito da proporcionalidade e o da efetividade e dissuasão das sanções.

115. A este respeito, o requisito da proporcionalidade das sanções, igualmente consagrado no artigo 49.o, n.o 3, da Carta, dificilmente pode ser equiparado à impunidade quando exista uma forma razoável de adaptar a ordem jurídica nacional de acordo com o princípio da proporcionalidade. Basear‑se exclusivamente no princípio da proporcionalidade para afastar a possibilidade de aplicar qualquer tipo de sanções seria ignorar completamente a necessidade de salvaguardar o objetivo, declarado no artigo 1.o, n.o 1, da Diretiva 2014/67, de assegurar o respeito de um nível adequado de proteção dos direitos dos trabalhadores destacados.

116. Em resumo, seria, por conseguinte, algo paradoxal, pelo menos do ponto de vista do direito da União, excluir de forma desproporcionada e em nome do princípio da proporcionalidade todas as disposições em causa relativas a sanções do direito nacional, incluindo aquelas que, de facto, nunca foram postas em causa. Esta afirmação, mais uma vez, não impede que essas outras disposições do direito nacional se possam tornar um dano colateral de visões nacionais mais estritas do princípio da legalidade, ou que, noutros casos, simplesmente cairão por associação, uma vez que já não poderiam ser aplicadas de forma autónoma.

117. O que simplesmente se sugere é que o efeito direto do requisito da proporcionalidade não exige a não aplicação desproporcionada de quaisquer disposições nacionais. Em termos metafóricos, a operação realizada em nome do direito da União deveria assemelhar‑se mais a uma incisão cirúrgica do que a um bombardeamento.

5.      Observações finais sobre as dicotomias do efeito direto: exclusão, substituição... ou simples inserção?

118. Ao longo dos anos, muito já foi escrito a nível doutrinário sobre as distinções subis e taxonomias dos vários tipos de efeito direto que o Tribunal de Justiça introduziu num determinado processo ou quis introduzir noutro. A distinção, em especial, entre os efeitos de exclusão e de substituição das disposições do direito da União (87) relativamente às disposições nacionais que lhes são contrárias continua a ser objeto de acesa discussão (88). Além disso, ainda que em Poplawski II se tenha resolvido a questão a montante (afastamento da aplicação atendendo ao primado, por si só, ou apenas ao primado e ao efeito direto), a questão a jusante quanto ao tipo exato e ao número de configurações que podem resultar do efeito direto, em larga medida, continua ainda em aberto.

119. Não pretendo dar aqui um contributo para esta discussão. Limitar‑me‑ei, no entanto, a utilizar este processo como uma oportunidade para sublinhar a relevância prática limitada de tais classificações taxonómicas. Como demonstra o presente processo, a linha de divisão entre, por exemplo, as verdadeiras consequências da exclusão e da substituição do efeito direto continua a ser bastante imprecisa em alguns casos. Dependerá fortemente do caso concreto e será mais uma questão de «autodeclaração» pelo tribunal que se pronuncia do que uma divisão clara.

120. A linha de orientação escolhida pelo Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo), como resumido na secção anterior, é particularmente reveladora a este respeito. O facto de a técnica jurídica utilizada ser a «não aplicação» depende da redação e da estrutura das disposições legais nacionais e não de uma consequência inevitável resultante da «essência» da disposição do direito da União que contém o próprio requisito da proporcionalidade.

121. Com efeito, poderia chegar‑se a resultados semelhantes «inserindo» o conteúdo positivo do princípio da proporcionalidade, a fim de alcançar uma solução legal através da substituição em vez da exclusão. Esta foi, de facto, a minha proposta em Link Logistik, em que a conceção da norma nacional (montante fixo da coima, independentemente de qualquer circunstância individual do caso concreto) não teria permitido ao juiz nacional chegar a uma solução compatível com o princípio da proporcionalidade deixando simplesmente de aplicar os elementos da regulamentação nacional. Assim, era necessário introduzir elementos normativos decorrentes do critério do princípio da proporcionalidade e a este intrínsecos (89).

122. Este contraste demonstra que o tipo de efeito direto da mesma disposição do direito da União dependerá, logicamente, por conseguinte, do panorama legal nacional. Ao passo que, em certos casos, uma disposição com efeito direto substitui integralmente a disposição nacional «deslocada» contrária, noutros apenas a não aplicação na sua totalidade será possível. Num grande número de casos que se encontram entre as duas situações, o respeito pelo direito da União pode implicar a não aplicação parcial ou a não aplicação dos elementos da norma nacional apenas na medida em que se opõem às disposições do direito da União. Por último, a não aplicação total ou parcial deve igualmente ser conjugada com a interpretação das «restantes» disposições aplicáveis ou dos seus elementos compatíveis com o direito da União.

123. Em suma, a classificação taxonómica do efeito direto num determinado caso será definida pela legislação nacional, pela estrutura do caso concreto e pelo nível de abstração escolhido. Frequentemente, o mesmo resultado poderia ser alcançado quer pela exclusão de uma regra superior mais geral quer pela substituição ou inserção de uma regra mais específica na ordem jurídica nacional.

124. É por esta razão que, em meu entender, a questão de saber o que deve ser exatamente feito com base numa disposição com potencial efeito direto do direito da União que conduz a uma exclusão ou a uma substituição ou a qualquer outra coisa, poderia ser de interesse pedagógico ou académico. Dito isto, estas taxonomias não devem controlar a decisão sobre se o efeito direto de uma disposição específica do direito da União é possível ou não. Em vez disso, após ter determinado se a disposição do direito da União em causa pode ser judicialmente invocada, o enfoque deve incidir sobre as potenciais consequências do efeito direto no caso individual e a proteção dos direitos individuais nela estabelecidas.

C.      Revogação do Acórdão Link Logistik

125. Se o Tribunal de Justiça concordar com as considerações feitas nas secções A e B das presentes conclusões, deverá então voltar a debruçar‑se sobre as suas Conclusões no Acórdão Link Logistik.

126. Como explicado na secção B das presentes conclusões, o Acórdão Popławski II rejeitou implicitamente e parcialmente a posição do Tribunal de Justiça no Acórdão Link Logistik. Apenas as disposições nacionais contrárias às disposições do direito da União com efeito direto podem deixar de ser aplicadas pelos tribunais nacionais e outros órgãos.

127. E quanto à posição do Tribunal de Justiça no Acórdão Link Logistik no que diz respeito ao efeito direto do requisito da proporcionalidade? Como explicado detalhadamente na secção A das presentes conclusões, várias razões militam no sentido de que o requisito da proporcionalidade previsto no artigo 20.o da Diretiva 2014/67 é de efeito direito.

128. Além disso, a correção muito importante introduzida pelo Acórdão Popławski II quanto à não aplicação do direito nacional contrário ao direito da União também afeta o equilíbrio subjacente à totalidade do raciocínio do Tribunal de Justiça no Acórdão Link Logistik. Essa correção põe em causa igualmente as conclusões do Tribunal de Justiça no que se refere ao efeito direto do requisito da proporcionalidade. No Acórdão Link Logistik, o Tribunal de Justiça rejeitou o efeito direto do requisito da proporcionalidade a que se refere o artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62. Todavia, parte da fundamentação que conduziu a esse resultado pode ter sido baseada na premissa incorreta de que a não aplicação da legislação nacional contrária ao direito da União dizia respeito a normas sem efeito direto. O Tribunal de Justiça, de facto, pediu ao órgão jurisdicional de reenvio que procedesse exatamente nesse sentido (90).

129. Face a tal contexto, como proceder no presente processo? Na minha opinião, o Acórdão Link Logistik deveria ser expressamente e abertamente revogado pela Grande Secção do Tribunal de Justiça.

130. O Tribunal de Justiça nunca afirmou estar formalmente vinculado pela doutrina de stare decisis. No entanto, adere, na prática, a essa doutrina (91). A necessidade de invocar de forma coerente o seu próprio precedente e de assegurar o caráter firme da sua jurisprudência significa que o Tribunal de Justiça só raramente procede a uma revogação expressa. Mais frequentemente, o Tribunal de Justiça opera procedendo a uma distinção do caso ou a uma explicação retrospetiva da sua própria jurisprudência para que as diferentes peças do puzzle «encaixem» e sejam «clarificadas» (92).

131. A prática do Tribunal de Justiça no passado, no que diz respeito à revogação das suas decisões anteriores, é variada (93). Os casos de revogação expressa continuam a ser raros. Mesmo nessas ocasiões excecionais, as explicações do Tribunal de Justiça quanto às razões subjacentes à adoção de uma posição diferente são relativamente escassas. Em alguns casos, o Tribunal de Justiça limita‑se a reconhecer o precedente divergente e a declarar que adota uma interpretação diferente (94). Noutros casos, verifica‑se que, num processo posterior, o Tribunal de Justiça mudou de opinião a respeito das circunstâncias e dos argumentos apresentados (95) ou precisa a sua posição anterior à luz destas novas considerações (96).

132. O Tribunal de Justiça afasta‑se mais abertamente da sua jurisprudência anterior tendo em conta os desenvolvimentos constitucionais ou as alterações do Tratado (97). No entanto, num certo número de processos, o Tribunal de Justiça continua a considerar «juridicamente pertinentes» acórdãos anteriores, mesmo que do novo acórdão seja retirada uma conclusão diferente (98). Só em raras ocasiões é que o Tribunal de Justiça reconsidera expressamente a sua interpretação anterior, assume o seu precedente e explica as razões de uma solução diferente (99).

133. Na minha opinião, o presente processo deveria ser uma dessas raras ocasiões. O Tribunal de Justiça deveria aproveitar a oportunidade que lhe é proporcionada pelo presente processo para reconsiderar expressamente o valor da sua conclusão no Acórdão Link Logistik, nomeadamente pelas seguintes razões.

134. Em primeiro lugar, não é simplesmente possível distinguir, pelo menos do meu ponto de vista, o presente processo do processo Link Logistik apara efeitos da interpretação coerente do requisito da proporcionalidade, tanto no artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62 como no artigo 20.o da Diretiva 2014/67.

135. O órgão jurisdicional de reenvio tentou sublinhar as diferenças entre o presente processo e o processo Link Logistik. Contudo, a redação, a finalidade e o contexto tanto do artigo 9.o‑A da Diretiva 1999/62 como do artigo 20.o da Diretiva 2014/67 impedem, na minha opinião, que se estabeleçam diferenças significativas que permitiriam ao Tribunal de Justiça chegar a uma conclusão distinta no que respeita a esta última disposição e deixar intacta a solução adotada no Acórdão Link Logistik (100). Do mesmo modo, uma «clarificação» retrospetiva das declarações do Tribunal de Justiça no Acórdão Link Logistik poderia gerar confusão, dado o afastamento significativo desse precedente que já fora introduzido pelo Acórdão Popławski II.

136. Em segundo lugar, qualquer «clarificação» suplementar da posição adotada no Acórdão Link Logistik pode gerar confusão num domínio do direito particularmente sensível e complexo que afeta alguns dos elementos mais fundamentais da ordem jurídica da União, como os princípios do efeito direto e do primado, o recurso à não aplicação e os efeitos jurídicos específicos do princípio da proporcionalidade. A contradição entre o Acórdão Link Logistik e o Acórdão Poplawski II proferido pela Grande Secção torna ainda mais premente uma inversão expressa no presente processo, tanto mais que a divergência das decisões diz respeito à interpretação dos princípios essenciais que regem a relação entre as ordens jurídicas nacionais e a ordem jurídica da União. Nesta situação em que se verifica uma clara contradição com uma jurisprudência anterior, o Tribunal de Justiça deveria exprimir‑se abertamente sobre a sua própria jurisprudência e indicar com precisão se e em que medida se propõe reapreciar a sua posição jurídica anterior.

137. Em terceiro lugar, por mais lamentável que possa ser o facto de o precedente a revogar ser relativamente recente, não deve ter qualquer peso. A interpretação correta do direito da União sobrepõe‑se a tais preocupações. Com efeito, alguns dos exemplos mais proeminentes em que o Tribunal de Justiça procedeu a uma revogação verificaram‑se relativamente pouco tempo depois de ter sido proferido o precedente revogado (101). Isto é compreensível, tendo em conta que um acórdão do Tribunal de Justiça frequentemente suscita um debate que leva os órgãos jurisdicionais nacionais a formular perguntas complementares, fornecendo informações ou argumentos adicionais ao Tribunal de Justiça. Em algumas destas situações mais recentes, o Tribunal de Justiça atribuiu os processos à Grande Secção quando foi expressamente convidado a reconsiderar a sua posição (102). Evidentemente, quando se trata da revogação de um precedente com muitos anos ou mesmo décadas, um afastamento a nível judicial não é tão problemático. Pode ser explicado com base na evolução da ordem jurídica da União (103).

138. Em quarto e último lugar, na atual estrutura do Tribunal de Justiça, quem deve ser chamado a proferir a revogação? Mais uma vez, é certo que não existe uma regra formal de stare decisis. Assim, as diferentes Secções do Tribunal de Justiça continuam a poder reconsiderar livremente o precedente. Além disso, a linha ténue que existe entre a reconsideração construtiva de acórdãos anteriores, a evolução da jurisprudência e um afastamento silencioso dificulta mais a elaboração e a aplicação de qualquer regra formal relativa à atribuição à Grande Secção de processos que impliquem a revisão da jurisprudência.

139. No entanto, na atual estrutura institucional do Tribunal de Justiça, no qual a Grande Secção goza de um estatuto constitucional especial e dos correspondentes poderes alargados dentro e fora do âmbito do Tribunal de Justiça, a revogação intencional de precedentes deveria inserir‑se nas suas prerrogativas e funções. Tal deveria acontecer, em especial em situações como a do presente processo, em que não há simplesmente margem racional para «distinguir» ou «clarificar» o processo.

140. Com efeito, tendo em conta a necessidade de manter a autoridade da jurisprudência do Tribunal de Justiça, seria aconselhável que, uma vez identificada uma decisão problemática cujo afastamento deve ser considerado, o processo fosse, de preferência, atribuído Grande Secção do Tribunal de Justiça (104). Naturalmente, isso não impede uma experimentação intelectual contínua e paralela a nível de outras composições do Tribunal de Justiça. Com efeito, formações de julgamento alargadas e solenes raramente constituem a sede adequada para encontrar novas orientações. No entanto, tendem a ser bastante bons a escolher com caráter de autoridade de entre uma variedade de opções.

141. Por último, deveria uma revogação intencional  ser feita de forma expressa? Na minha opinião, certamente que sim. Não abordarei em detalhe os argumentos possíveis sobre as virtudes do debate jurídico aberto e o imperativo de uma fundamentação adequada de uma decisão judicial. Pelo contrário, limitar‑me‑ei a terminar salientando que, de facto, qualquer tribunal superior se preocupa com a sua reputação e seriedade. Estes elementos são vitais para o seu papel e a sua posição geral. É, pois, por definição, pouco provável que um tribunal supremo se regozije por ter incorrido em erro, se, de facto, essa situação puder, alguma vez verificar‑se (105). Todavia, encontrar, num sistema que se define baseado no diálogo judicial, um interlocutor que nunca está errado pode talvez ser algo surpreendente e ocasionalmente frustrante. De qualquer modo, a esse respeito, a incapacidade de admitir que se estava errado não é um sinal de diálogo nem de verdadeira autoconfiança e autoridade.

V.      Conclusão

142. Proponho ao Tribunal de Justiça que responda às questões prejudiciais submetidas pelo Landesverwaltungsgericht Steiermark (Tribunal Administrativo Regional da Estíria, Áustria) da seguinte forma:

1)      O requisito da proporcionalidade das sanções consagrado no artigo 20.o da Diretiva 2014/67 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014, respeitante à execução da Diretiva 96/71/CE relativa ao destacamento de trabalhadores no âmbito de uma prestação de serviços e que altera o Regulamento (UE) n.o 1024/2012 relativo à cooperação administrativa através do Sistema de Informação do Mercado Interno tem efeito direto.

2)      Com base no requisito da proporcionalidade das sanções consagrado no artigo 20.o da Diretiva 2014/67/UE, os tribunais e as autoridades administrativas nacionais devem, por força da sua obrigação de tomar todas as medidas gerais ou especiais adequadas para assegurar a execução dessa disposição, afastar a aplicação de qualquer disposição nacional, na medida em que essa aplicação conduza a um resultado contrário ao direito da União e, se for caso disso, completar as disposições nacionais aplicáveis através do critério do requisito da proporcionalidade definido pela jurisprudência do Tribunal de Justiça.


1      Língua original: inglês.


2      Acórdão de 12 de setembro de 2019, Maksimovic e o. (C‑64/18, C‑140/18, C‑146/18 e C‑148/18, EU:C:2019:723, a seguir «Acórdão Maksimovic»); Despachos de 19 de dezembro de 2019, EX e o. (C‑140/19, C‑141/19 e C‑492/19 a C‑494/19, não publicados, EU:C:2019:1103).


3      Acórdão de 4 de outubro de 2018, Link Logistik N&N (C‑384/17, EU:C:2018:810, a seguir «Link Logistic»).


4      JO 2014, L 159, p. 11.


5      BGBI. 52/1991.


6      BGB1. I, 33/2013.


7      BGBl. I, 44/2016.


8      Nos termos do Despacho do Tribunal de Justiça de 19 de dezembro de 2019, Bezirkshauptmannschaft Hartberg‑Fürstenfeld (C‑645/18, não publicado, EU:C:2019:1108, n.os 10 e 11).


9      Despacho de 19 de dezembro de 2019, Bezirkshauptmannschaft Hartberg‑Fürstenfeld (C‑645/18, não publicado, EU:C:2019:1108).


10      Esse processo dizia respeito a diferentes disposições nacionais [Arbeitsvertragsrechts‑Anpassungsgesetz (Lei de Adaptação da Lei do Contrato de Trabalho, BGBl. 459/1993, a seguir «AVRAG»)]. Estas estabeleciam, no entanto, um sistema e a fixação de montantes de sanções muito semelhantes aos que estão em causa no presente processo.


11      Despacho de 19 de dezembro de 2019, Bezirkshauptmannschaft Hartberg‑Fürstenfeld (C‑645/18, não publicado, EU:C:2019:1108, n.o 43).


12      Despacho de 19 de dezembro de 2019, EX e o. (C‑140/19, C‑141/19 e C‑492/19 a C‑494/19, não publicado, EU:C:2019:1103).


13      Esta expressão constava do § 7.o i, n.o 4, da AVRAG, mas corresponde, no essencial, à constante dos §§ 26, n.o 1, 27, n.o 1 e 28 da LSD‑BG.


14      Acórdão Ra 2019/11/0033, de 15 de outubro de 2019.


15      E 3530/2019 e o., E 2893/2019 e o., E 2047/2019 e o., E 3530/2019 e o., E 2893/2019 e o., de 27 de novembro de 2019.


16      Despacho de 19 de dezembro de 2019, Bezirkshauptmannschaft Hartberg‑Fürstenfeld (C‑645/18, não publicado, EU:C:2019:1108).


17      O Tribunal de Justiça chegou à mesma conclusão no seu Despacho de 19 de dezembro de 2019, EX e o. (C‑140/19, C‑141/19 e C‑492/19 a C‑494/19, EU:C:2019:1103), com origem no mesmo órgão jurisdicional de reenvio no âmbito de um processo diferente, mas num contexto factual bastante semelhante.


18      Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de junho de 1999, relativa à aplicação de imposições aos veículos pesados de mercadorias pela utilização de certas infraestruturas (JO 1999, L 187, p. 42), alterada pela Diretiva 2011/76/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de setembro de 2011 (JO 2011, L 269, p. 1).


19      Conclusões no processo Link Logistik N&N (C‑384/17, EU:C:2018:494).


20      Acórdão de 22 de março de 2017, Euro‑Team e Spirál‑Gép (C‑497/15 e C‑498/15, EU:C:2017:229).


21      Esta disposição tem a seguinte redação: «Os Estados‑Membros instauram os controlos adequados e determinam o regime de sanções aplicável às infrações às disposições nacionais adotadas nos termos da presente Diretiva. Tomam todas as medidas necessárias para assegurar a respetiva aplicação. As sanções previstas devem ser efetivas, proporcionadas e dissuasivas». O sublinhado é meu.


22      Link Logistik n.o 51).


23      Ibidem, n.o 52, por referência ao Acórdão de 22 de março de 2017, Euro‑Team e Spirál‑Gép (C‑497/15 e C‑498/15, EU:C:2017:229, n.o 38).


24      Ibidem, n.o 53.


25      Ibidem, n.o 54.


26      Ibidem, n.o 55.


27      Conclusões no processo Link Logistik N&N (C‑384/17, EU:C:2018:494, n.os 63 a 69), e as minhas Conclusões em Klohn (C‑167/17, EU:C:2018:387, n.os 38 a 46).


28      Nas palavras do advogado‑geral W. Van Gerven quanto ao caráter eminentemente prático do critério do efeito direto: «[…] a partir do momento e na medida em que uma disposição de direito comunitário seja, por si própria, suficientemente operacional para ser aplicada pelo juiz, tem efeito direto. A clareza, a precisão, o caráter incondicional, completo ou perfeito da norma e o facto de ela não se destinar a ser aplicada através de disposições de execução que revistam um caráter discricionário constituem apenas, desse ponto de vista, as facetas de uma única e mesma característica que a referida norma deve possuir, ou seja, a faculdade de ser aplicada pelo juiz aos dados do litígio que lhe incumbe julgar». Conclusões do advogado‑geral W. Van Gerven no processo Banks (C‑128/92, EU:C:1993:860, n.o 27).


29      Apenas para citar um exemplo evidente, o Tribunal de Justiça declarou nos seus Acórdãos de 5 de fevereiro de 1963, van Gend routière Loos (26/62, EU:C:1963:1), e de 19 de dezembro de 1968, Salgoil (13/68, EU:C:1968:54) que a disposição relativa a direitos aduaneiros, bem como a restrições e medidas quantitativas de efeito equivalente era suficientemente clara e precisa para ter efeito direto e, todavia, o Tribunal de Justiça tem consagrado o último meio século à interpretação do conceito de «medidas de efeito equivalente».


30      Acórdão Maksimovic n.o 39). V., igualmente, neste sentido, Acórdãos de 26 de setembro de 2018, Van Gennip e o. (C‑137/17, EU:C:2018:771, n.o 99), e de 9 de fevereiro de 2012, Urbán (C‑210/10, EU:C:2012:64, n.os 41 e 44).


31      Acórdão Link Logistik, n.o 45.


32      Para um exemplo prático desta situação, v. Acórdão de 19 de junho de 2014, Specht e o. (C‑501/12 a C‑506/12, C‑540/12 e C‑541/12, EU:C:2014:2005, n.os 88 a 97), em que se constatou que a proibição de discriminação imposta era suficientemente precisa e incondicional, mesmo que a sua aplicabilidade perante o juiz nacional não permitisse atingir um resultado específico.


33      Por exemplo, poderia afigurar‑se claro que, para um determinado tipo de infrações, é completamente desproporcionado aplicar sanções na escala das dezenas ou centenas de milhares de euros. Assim, a este respeito e nesta medida, não há dúvida quanto ao grau de clareza e precisão da proporcionalidade das sanções. Contudo, tal não exclui a incerteza natural ex ante quanto a saber de modo exato, e tendo em conta as circunstâncias do caso concreto, a que montante a sanção específica será definitivamente aplicada no âmbito da escala proporcional (num determinado caso, a 1 000 euros ou a 5 000?).


34      V. as minhas Conclusões no processo Klohn (C‑167/17, EU:C:2018:387, n.o 49), no que respeita efetivamente a uma outra concretização da regra da proporcionalidade que exige que os custos de um litígio em matéria ambiental não sejam exageradamente dispendiosos.


35      Para um exemplo recente, Acórdão de 14 de maio de 2020, T‑Systems Magyarország (C‑263/19, EU:C:2020:373, n.os 71 e 72).


36      Acórdão de 4 de dezembro de 1974, Van Duyn (41/74, EU:C:1974:133, n.os 7 e 13). V., igualmente, Acórdãos de 24 de outubro de 1996, Kraaijeveld e o. (C‑72/95, EU:C:1996:404, n.o 59); de 15 de abril de 2008, Impact (C‑268/06, EU:C:2008:223, n.o 64); e de 21 de março de 2013, Salzburger Flughafen (C‑244/12, EU:C:2013:203, n.os 29 e 31). Para uma aplicação mais recente, v. Acórdão de 5 de setembro de 2012, Rahman e o. (C‑83/11, EU:C:2012:519, n.o 25 e jurisprudência referida), no qual o Tribunal de Justiça declarou que, mesmo que os termos de uma disposição do direito da União «não sejam suficientemente precisos para permitir que um requerente […] se socorra diretamente desta disposição para invocar critérios de apreciação que, em seu entender, deviam ser aplicados ao seu pedido, não deixa de ser verdade que esse requerente tem direito a que um órgão jurisdicional verifique se a legislação nacional, e a sua aplicação, se mantiveram dentro dos limites da margem de apreciação traçada pela referida diretiva».


37      V., por exemplo, Acórdãos de 19 de novembro de 1991, Francovich e o. (C‑6/90 e C‑9/90, EU:C:1991:428, n.o 19); de 14 de julho de 1994, Faccini Dori (C‑91/92, EU:C:1994:292, n.o 17); e de 24 de janeiro de 2012, Dominguez (C‑282/10, EU:C:2012:33, n.o 35).


38      V., a este respeito, Acórdão de 19 de setembro de 2000, Linster (C‑287/98, EU:C:2000:468, n.o 37): «Esta margem de apreciação, de que o Estado‑Membro se pode socorrer quando procede à transposição dessa disposição para a sua ordem jurídica nacional, não exclui, no entanto, que possa ser efetuada uma fiscalização jurisdicional a fim de verificar se as autoridades nacionais não excederam a referida margem de apreciação» (o sublinhado é meu).


39      Poderia acrescentar‑se, como nota lateral, que esta afirmação nem sequer parece ser materialmente exata quer numa situação como a que estava em causa no processo Link Logistik quer no presente processo em concreto. Nestes dois casos, o legislador nacional já exerceu a sua opção de transposição. No entanto, fê‑lo de forma manifestamente excessiva e, portanto, errada, que levou a uma aplicação incorreta do direito da União a nível nacional. Curiosamente, o que o requisito da proporcionalidade das sanções exigia era suficientemente claro e incondicional para que o Tribunal de Justiça, com base no exemplo individual, declarasse a legislação nacional incompatível com esta disposição, mas não é suficientemente claro e incondicional para ser diretamente aplicado pelo juiz nacional no âmbito desse mesmo processo em concreto?


40      V. n.o 54 de Link Logistik, sublinhando que cabe exclusivamente ao legislador nacional conceber um regime de sanções adequado.


41      V., por exemplo, Acórdãos de 17 de abril de 2018, Egenberger (C‑414/16, EU:C:2018:257, n.o 78); de 29 de julho de 2019, Torubarov (C‑556/17, EU:C:2019:626, n.o 56); de 19 de novembro de 2019, A. K. e o. (Independência da Secção Disciplinar do Supremo Tribunal) (C‑585/18, C‑624/18 e C‑625/18, EU:C:2019:982, n.o 162); de 2 de março de 2021, A. B. e o. (Nomeação de juízes para o Supremo Tribunal — Recurso) (C‑824/18, EU:C:2021:153, n.o 145); ou o de 15 de abril de 2021, Braathens Regional Aviation (C‑30/19, EU:C:2021:269, n.o 57).


42      V. Acórdãos de 17 de abril de 2018, Egenberger (C‑414/16, EU:C:2018:257, n.o 76); de 11 de setembro de 2018, IR (C‑68/17, EU:C:2018:696, n.o 69); e de 22 de janeiro de 2019, Cresco Investigation (C‑193/17, EU:C:2019:43, n.o 76).


43      V., por exemplo, Acórdão de 20 de março de 2018, Garlsson Real Estate e o. (C‑537/16, EU:C:2018:193, n.o 66).


44      Acórdãos de 6 de novembro de 2018, Bauer e Willmeroth (C‑569/16 e C‑570/16, EU:C:2018:871, n.o 85); e Max‑Planck‑Gesellschaft zur Förderung der Wissenschaften (C‑684/16, EU:C:2018:874, n.o 74).


45      O mesmo sucede com o Artigo 19.o, TUE — v. Acórdão de 18 de maio de 2021, Asociaţia «Forumul Judecătorilor din România» e o. (C‑83/19, C‑127/19, C‑195/19, C‑291/19, C‑355/19 e C‑397/19, EU:C:2021:393, n.os 250 a 252).


46      Por exemplo, Acórdãos de 19 de abril de 2007, Stamatelaki (C‑444/05, EU:C:2007:231); de 13 de novembro de 2018, Čepelnik (C‑33/17, EU:C:2018:896, n.os 46 a 50); ou de 3 de março de 2020, Google Ireland (C‑482/18, EU:C:2020:141, n.os 44 a 54).


47      Maksimovic n.os 46 a 50. Este processo foi decidido exclusivamente com base no artigo 56.o, TFUE. A Diretiva 2014/67 não era temporariamente aplicável aos factos do processo principal.


48      V., por exemplo, Acórdãos de 3 de dezembro de 1974, van Binsbergen (33/74, EU:C:1974:131, n.o 26); de 17 de dezembro de 1981, Webb (279/80, EU:C:1981:314, n.os 13 e 14); de 29 de abril de 1999, Ciola (C‑224/97, EU:C:1999:212, n.o 27); de 18 de dezembro de 2007, Laval un Partneri (C‑341/05, EU:C:2007:809, n.o 97); ou de 13 de abril de 2010, Wall (C‑91/08, EU:C:2010:182, n.o 68).


49      V. Despachos de 19 de dezembro de 2019, Bezirkshauptmannschaft Hartberg‑Fürstenfeld (C‑645/18, não publicado, EU:C:2019:1108, n.os 32 a 41); e EX e o. (C‑140/19, C‑141/19 e C‑492/19 a C‑494/19, não publicados, EU:C:2019:1103, n.os 34 a 43).


50      Acórdão de 8 de setembro de 2015, Taricco e o. (C‑105/14, EU:C:2015:555, n.o 52), que declara que «[a]s disposições do artigo 325.o, n.o 1, e 2, TFUE têm […] o efeito de, por força do princípio do primado do direito da União, nas suas relações com o direito interno dos Estados‑Membros, tornar inaplicável de pleno direito, pelo próprio facto da sua entrada em vigor, qualquer disposição contrária da legislação nacional existente». V., igualmente, Acórdão de 5 de dezembro de 2017, M.A.S. e M.B. (C‑42/17, EU:C:2017:936, n.o 39).


51      Como já foi exposto acima, no n.o 37 das presentes conclusões. Para uma lógica idêntica aplicada à natureza e ao alcance das vias de recurso em geral, v. as minhas Conclusões no processo An tAire Talmhaíochta Bia agus Mara, Éire agus an tArd‑Aighne (C‑64/20, EU:C:2021:14, em particular n.os 54 a 62).


52      De «ergänzen» no original alemão.


53      A título subsidiário, a segunda questão deve, então, ser reformulada no sentido de se averiguarem os limites da interpretação conforme em tais casos e ser respondida pela negativa. Suprimir elementos das disposições nacionais incompatíveis com o direito da União e, depois (ou simultaneamente), completar o direito nacional com uma disposição do direito da União não previamente aprovada pelo legislador nacional, alterando, assim, expressamente o teor das normas nacionais só dificilmente pode ser considerado um exemplo de interpretação conforme, pelo menos na minha opinião. V., por exemplo, Acórdãos de 15 de janeiro de 2014, Association de médiation sociale (C‑176/12, EU:C:2014:2, n.o 39); de 7 de agosto de 2018, Smith (C‑122/17, EU:C:2018:631, n.o 40); ou de 24 de junho de 2019, Popławski (C‑573/17, EU:C:2019:530, n.os 76 e segs.).


54      Acórdão de 24 de junho de 2019, Popławski (C‑573/17, EU:C:2019:530).


55      Acórdão de 4 de outubro de 2018, Link Logistik N&N (C‑384/17, EU:C:2018:810, n.o 56). V., igualmente, n.os 28 a 30, supra, das presentes conclusões.


56      Ibidem, n.o 60.


57      Ibidem, n.o 61.


58      Ibidem, n.o 62 e dispositivo desse acórdão. O sublinhado é meu.


59      Artigo 28.o, n.o 2, da Decisão‑Quadro de 27 de novembro de 2008, relativa à aplicação do princípio do reconhecimento mútuo às sentenças em matéria penal que imponham penas ou outras medidas privativas de liberdade para efeitos da execução dessas sentenças na União Europeia (JO 2008, L 327, p. 27).


60      (Antigo) artigo 34.o, n.o 2, alínea b), TUE. Popławski, n.os 69 a 71).


61      Popławski II, n.o 62.


62      Ibidem, n.o 68.


63      V., por exemplo, Acórdãos de 19 de novembro de 2019, A. K. e o. (Independência da Secção Disciplinar do Supremo Tribunal) (C‑585/18, C‑624/18 e C‑625/18, EU:C:2019:982, n.o 161); de 19 de dezembro de 2019, Deutsche Umwelthilfe (C‑752/18, EU:C:2019:1114, n.o 42); de 14 de maio de 2020, Staatsanwaltschaft Offenburg (C‑615/18, EU:C:2020:376, n.o 69); de 30 de setembro de 2020, CPAS Liège (C‑233/19, EU:C:2020:757, n.o 54); de 15 de abril de 2021, Braathens Regional Aviation (C‑30/19, EU:C:2021:269, n.o 58); de 18 de maio de 2021, Asociaţia «Forumul Judecătorilor din România» e o. (C‑83/19, C‑127/19, C‑195/19, C‑291/19, C‑355/19 e C‑397/19, EU:C:2021:393, n.o 248).


64      No domínio da doutrina, v., por exemplo, para diferentes posições no âmbito deste debate: Lenaerts, K. e Corthaut, T., «Of Birds and Hedges: The Role of Primacy in Invoking Norms of EU Law», European Law Review, Vol. 31, 2006, pp. 287‑315, pp. 301‑311 Prechal, S., «Direct Effect, Indirect Effect, Supremacy and the Evolving Constitution of the European Union», em Barnard. C. (ed.), «The Fundamentals of EU Law Revisited: Assessing the Impact of the Constitutional Debate» Oxford University Press, 2007, pp. 35‑69; Muir, E., «Of ages in — and Edges of — EU Law», Common Market Law Review, vol. 48, 2011, pp. 39‑62; ou Dougan M., «Primacy and the Remedy of Disapplication», Common Market Law Review, vol. 56, 2019, pp. 1459‑1508.


65      Com efeito, as Conclusões do advogado‑geral M. Campos Sánchez‑Bordona, que defendiam a conclusão contrária, eram favoráveis à possibilidade de invocar o recurso à inaplicabilidade de disposições que não tinham efeito direto com base no Acórdão Link Logistik: v. as suas Conclusões no processo Popławski (C‑573/17, EU:C:2018:957, n.o 117). V., igualmente, as minhas Conclusões no processo Cresco Investigation (C‑193/17, EU:C:2018:614, n.os 114 a 149), nas quais sugeri, no essencial, uma abordagem semelhante no que respeita à não aplicação do direito nacional incompatível (unicamente) com as disposições da Carta.


66      Acórdão Ra 2019/11/0033, de 15 de outubro de 2019.


67      Como salientou o Governo austríaco nas suas observações, o Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo) aplicou a sua fundamentação relativa ao § 7‑i, da AVRAG aos artigos 26.o e 28.o da LSD‑BG (Acórdãos de 25 de fevereiro de 2020, 2018/11/0110; de 26 de fevereiro de 2020, 2020/11/0004; e de 27 de abril de 2020, 2019/11/0171).


68      Maksimovic, n.o 42); Despachos de 19 de dezembro de 2019, Bezirkshauptmannschaft Hartberg‑Fürstenfeld (C‑645/18, não publicado, EU:C:2019:1108, n.o 36); e EX e o. (C‑140/19, C‑141/19 e C‑492/19 a C‑494/19, não publicado, EU:C:2019:1103, n.o 38).


69      Maksimovic, n.os 43 e 45; Despachos de 19 de dezembro de 2019, Bezirkshauptmannschaft Hartberg‑Fürstenfeld (C‑645/18, não publicado, EU:C:2019:1108, n.o 37); e EX e o. (C‑140/19, C‑141/19 e C‑492/19 a C‑494/19, não publicado, EU:C:2019:1103, n.o 39). No entanto, o elemento das penas privativas de liberdade subsidiárias não foi considerado nos dois despachos.


70      O Tribunal de Justiça já tinha declarado que este elemento, em conjugação com os restantes, constituía uma das razões que contribuem para tornar o sistema desproporcionado. Maksimovic, n.o 44); Despachos de 19 de dezembro de 2019, Bezirkshauptmannschaft Hartberg‑Fürstenfeld (C‑645/18, não publicado, EU:C:2019:1108, n.o 38); e EX e o. (C‑140/19, C‑141/19 e C‑492/19 a C‑494/19, EU:C:2019:1103, n.o 40).


71      V., supra, nota 53 das presentes conclusões.


72      Acórdão do Verfassungsgerichtshof (Tribunal Constitucional) de 27 de novembro de 2019, E 2047‑2049/2019.


73      Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, o Verfassungsgerichtshof (Tribunal Constitucional) anulou as sanções aplicadas noutros processos, nomeadamente E 3530/2019 e o., E 2893/2019 e o., E 3530/2019 e o., e E 2893/2019 e o.


74      Despachos de 19 de dezembro de 2019, Bezirkshauptmannschaft Hartberg‑Fürstenfeld (C‑645/18, não publicado, EU:C:2019:1108, n.o 32), e EX e o. (C‑140/19, C‑141/19 e C‑492/19 a C‑494/19, não publicado, EU:C:2019:1103, n.o 34).


75      Maksimovic n.o 41) e Despachos de 19 de dezembro de 2019, Bezirkshauptmannschaft Hartberg‑Fürstenfeld (C‑645/18, EU:C:2019:1108, n.o 35), e EX e o. (C‑140/19, C‑141/19 e C‑492/19 a C‑494/19, não publicado, EU:C:2019:1103, n.o 37).


76      A posição do Governo austríaco neste ponto é algo desconcertante, tanto mais que propôs uma resposta à primeira questão prejudicial que rejeitaria o efeito direto do requisito da proporcionalidade e, quanto à segunda questão prejudicial, não se limitou a dar uma resposta afirmativa, tendo antes enquadrado a não aplicação parcial no âmbito da interpretação conforme. Contudo, à semelhança do órgão jurisdicional de reenvio, pode presumir‑se a esse respeito que o Governo austríaco assume como ponto de partida a argumentação problemática do Tribunal de Justiça no Acórdão Link Logistik.


77      V., por exemplo, Acórdãos de 3 de maio de 2007, Advocaten voor de Wereld (C‑303/05, EU:C:2007:261, n.o 50); de 31 de março de 2011, Aurubis Balgaria (C‑546/09, EU:C:2011:199, n.o 42); e de 28 de março de 2017, Rosneft (C‑72/15, EU:C:2017:236, n.o 162).


78      V. Acórdão de 28 de março de 2017, Rosneft (C‑72/15, EU:C:2017:236, n.o 167 e jurisprudência referida).


79      Por exemplo, Acórdãos de 11 de junho de 1987, Pretore di Salò (14/86, EU:C:1987:275, n.o 20); de 8 de outubro de 1987, Kolpinghuis Nijmegen (80/86, EU:C:1987:431, n.o 13); Acórdão de 3 de maio de 2005, Berlusconi e o. (C‑387/02, C‑391/02 e C‑403/02, EU:C:2005:270, n.o 74), ou de 20 de dezembro de 2017, Vaditrans (C‑102/16, EU:C:2017:1012, n.o 56).


80      A experiência de alguns sistemas europeus que procuram distinguir entre questões de constitucionalidade, por um lado, e a (mera ou simples) legalidade por outro, para efeitos da atribuição de competência, revela que essa fronteira é muito ténue e impossível de traçar na prática. O presente processo é um exemplo vivo a este respeito. Uma mesma questão jurídica pode mover‑se livremente entre as duas e pode ser formulado como uma questão de constitucionalidade (sanção aplicada à violação do direito de propriedade) ou de legalidade (compatibilidade da decisão nacional que aplica a sanção com o direito interno e o direito da União). Para uma discussão comparativa com exemplos provenientes da Alemanha, Espanha, República Checa, Eslováquia ou Eslovénia, v. volume editado pelo Ústavní soud (Tribunal Constitucional, República Checa) intitulado «The Limits of the Constitutional Review of the Ordinary Courts' Decisions in the Proceedings on the Constitutional Complaint», Linde, Praga, 2005. V. igualmente, por exemplo, Bundesministerium der Justiz, Entlastung des Bundesverfassungsgerichts: Bericht der Kommission, Moser, Bona, 1998, pp. 62 a 66.


81      V., neste sentido, Acórdãos de 24 de junho de 2019, Comissão/Polónia (Independência do Supremo Tribunal) (C‑619/18, EU:C:2019:531, n.o 52), e de 19 de novembro de 2019, A. K. e o. (Independência da Secção Disciplinar do Supremo Tribunal) (C‑585/18, C‑624/18 e C‑625/18, EU:C:2019:982, n.o 115).


82      Por oposição aos casos que, no passado, foram objeto de uma «forma de julgar rígida», conhecida pelo absoluto caráter desproporcionado entre o ato e a sanção, em que estavam em causa infrações específicas punidas com uma única sanção possível, sem que existisse possibilidade de a adaptar às circunstâncias individuais — v., por exemplo, as minhas Conclusões no processo An tAire Talmhaíochta Bia agus Mara, Éire agus an tArd‑Aighne (C‑64/20, EU:C:2021:14, n.o 56).


83      V. n.os 41 a 42, supra, das presentes conclusões.


84      V. Acórdão de 5 de dezembro de 2017, M.A.S. e M.B. (C‑42/17, EU:C:2017:936, n.os 47 a 62).


85      Ainda sobre os limites desta possibilidade, bem como sobre a interpretação da ressalva estabelecida pela jurisprudência relativa ao «primado, a unidade e efetividade do direito da União», v. as minhas recentes Conclusões nos processos apensos Ministerul Public — Parchetul de pe lângă Înalta Curte de Casaţie şi Justiţie — Direcţia Naţională Anticorupţie e o. (C‑357/19 e C‑547/19, EU:C:2021:170, n.os 145 a 156).


86      Acórdão de 12 de setembro de 2019, Maksimovic e o. (C‑64/18, C‑140/18, C‑146/18 e C‑148/18, EU:C:2019:723, n.os 42 a 45).


87      V., na origem desta distinção, Galmot, Y., e Bonichot, J‑C., «La Cour de justice des Communautés européennes et la transposition des directives en droit national» 4(1), Revue française de droit administratif, 1988, pp. 1 a 23.


88      V., por exemplo, Conclusões do advogado‑geral A. Saggio nos processos apensos Océano Grupo Editorial e Salvat Editores (C‑240/98 a C‑244/98, EU:C:1999:620), e as Conclusões do advogado‑geral P. Léger no processo Linster (C‑287/98, EU:C:2000:3). V., igualmente, por exemplo, Dougan, M., «When Worlds Collide! Competing Visions of the Relationship between Direct Effect and Supremacy», Common Market Law Review, 2007, vol. 44, pp. 931 a 963; Wathelet, M. «Du concept de l'effet direct à celui de l'invocabilité au regard de la jurisprudence récente de la Cour de Justice» em Hoskins, M. e Robinson, W. (ed.), A True European: Essays for Judge David Edward, Hart Publishing, Oxford, 2004, pp. 367 a 389.


89      V. as minhas Conclusões em Link Logistik, n.os 84 e segs.


90      Acórdão de 4 de outubro de 2018, Link Logistik N&N (C‑384/17, EU:C:2018:810, n.o 62 e dispositivo desse acórdão).


91      V. Slynn, G., «The Court of Justice of the European Communities», International and Comparative Law Quarterly, 1984, vol. 33, pp. 409, p. 423.


92      Para citar um exemplo proeminente, Acórdão de 8 de outubro de 1996, Dillenkofer e o. (C‑178/94, C‑179/94 e C‑188/94 a C‑190/94, EU:C:1996:375, n.os 20 e segs.), que fundamenta a jurisprudência anterior em matéria de responsabilidade do Estado pelos danos causados aos particulares por violações do direito da União.


93      Sobre os debates iniciais, v., nomeadamente, Conclusões do advogado‑geral K. Roemer no processo Países Baixos/Alta Autoridade (9/61, EU:C:1962:20, p. 242); Conclusões do advogado‑geral M. Lagrange nos processos apensos Da Costa e o. (28/62 a 30/62, não publicadas, EU:C:1963:2); ou Conclusões do advogado‑geral A. La Pergola no processo Sürül (C‑262/96, EU:C:1998:610).


94      V., por exemplo, Acórdãos de 3 de abril de 1968, Molkerei‑Zentrale Westfalen c. Lippe (28/67, EU:C:1968:17), no que respeita ao Acórdão de 16 de junho de 1966, Lütticke (57/65, EU:C:1966:34); de 25 de julho de 2008, Metock e o. (C‑127/08, EU:C:2008:449), no que respeita ao Acórdão de 23 de setembro de 2003, Akrich (C‑109/01, EU:C:2003:491).


95      V., por exemplo, Acórdão de 22 de maio de 1990, Parlamento/Conselho — Chernobyl (C‑70/88, EU:C:1990:217, n.o 16), no que respeita ao Acórdão de 27 de setembro de 1988, Parlamento/Conselho — Comitologia (302/87, EU:C:1988:461), ou Acórdão de 24 de novembro de 1993, Keck e Mithouard (C‑267/91 e C‑268/91, EU:C:1993:905), no que respeita ao Acórdão de 20 de fevereiro de 1979, Rewe‑Zentral (Cassis de Dijon) (120/78, EU:C:1979:42).


96      V., por exemplo, Acórdão de 5 de dezembro de 2017, M.A.S. e M.B. (C‑42/17, EU:C:2017:936, n.o 28), no que respeita ao Acórdão de 8 de setembro de 2015, Taricco e o. (C‑105/14, EU:C:2015:555).


97      V., por exemplo, Acórdão de 15 de março de 2005, Bidar (C‑209/03, EU:C:2005:169), no que respeita aos Acórdãos de 21 de junho de 1988, Lair (39/86, EU:C:1988:322), e de 21 de junho de 1988, Brown (197/86, EU:C:1988:323).


98      V., por exemplo, Acórdãos de 5 de junho de 2018, Grupo Norte Facility (C‑574/16, EU:C:2018:390), e Montero Mateos (C‑677/16, EU:C:2018:393), no que respeita ao Acórdão de 14 de setembro de 2016, de Diego Porras (C‑596/14, EU:C:2016:683).


99      V. Acórdão de 17 de outubro de 1990, HAG GF (C‑10/89, EU:C:1990:359, n.os 10 e segs.), e, em particular, Conclusões do advogado‑geral F. G. Jacobs nesse processo (EU:C:1990:112), no que respeita ao Acórdão de 3 de julho de 1974, Van Zuylen (HAG I) (192/73, EU:C:1974:72).


100      V., igualmente, supra, n.os 55 a 57 das presentes conclusões.


101      V., por exemplo, Acórdão de 22 de maio de 1990, Parlamento/Conselho — Chernobyl (C‑70/88, EU:C:1990:217, n.o 16), no que respeita ao Acórdão de 27 de setembro de 1988, Parlamento/Conselho — Comitologia (302/87, EU:C:1988:461), com um intervalo de 20 meses.


102      V., por exemplo, Acórdãos de 5 de junho de 2018, Grupo Norte Facility (C‑574/16, EU:C:2018:390) e Montero Mateos (C‑677/16, EU:C:2018:393), no que respeita ao Acórdão de 14 de setembro de 2016, de Diego Porras (C‑596/14, EU:C:2016:683).


103      Por exemplo, recentemente, Acórdão de 18 de novembro de 2020, Syndicat CFTC (C‑463/19, EU:C:2020:932), no que respeita ao Acórdão (pleno) de 12 de julho de 1984, Hofmann (184/83, EU:C:1984:273).


104      Indicando a necessidade de submeter um processo à Grande Secção em caso de alteração, Conclusões da advogada‑geral E. Sharpston no processo Puffer (C‑460/07, EU:C:2008:714, n.o 56). Para um exemplo prático recente, v. Acórdão de 9 de julho de 2020, Santen (C‑673/18, EU:C:2020:531), no que respeita ao Acórdão de 19 de julho de 2012, Neurim Pharmaceuticals (1991) (C‑130/11, EU:C:2012:489).


105      Uma vez que, como ironicamente afirmado há algum tempo por Justice Jackson nas suas Conclusões no processo Brown c. Allen, 344 U.S. 443 (1953), p. 540: «Não somos definitivos porque somos infalíveis, mas somos infalíveis porque somos definitivos».