Language of document : ECLI:EU:T:2013:145

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Quarta Secção)

20 de março de 2013 (*)

«Marca comunitária — Processo de oposição — Pedido de marca nominativa comunitária CLUB GOURMET — Marca figurativa nacional anterior CLUB DEL GOURMET, EN.... El Corte Inglés — Motivo relativo de recusa — Inexistência de semelhança dos produtos e dos serviços — Artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento (CE) n.° 207/2009 — Argumentos e provas apresentados pela primeira vez no Tribunal Geral»

No processo T‑571/11,

El Corte Inglés, SA, com sede em Madrid (Espanha), representada por E. Seijo Veiguela e J. L. Rivas Zurdo, advogados,

recorrente,

contra

Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), representado por Ó. Mondéjar Ortuño, na qualidade de agente,

recorrido,

sendo a outra parte no processo na Câmara de Recurso do IHMI:

Groupe Chez Gerard Restaurants Ltd, com sede em Londres (Reino Unido),

que tem por objeto um recurso da decisão da Primeira Câmara de Recurso do IHMI de 28 de julho de 2011 (processo R 1946/2010‑1), relativa a um processo de oposição entre a El Corte Inglés, SA e a Groupe Chez Gerard Restaurants Ltd,

O TRIBUNAL GERAL (Quarta Secção),

composto por: I. Pelikánová (relatora), presidente, K. Jürimäe e M. van der Woude, juízes,

secretário: C. Heeren, administradora,

vista a petição entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 7 de novembro de 2011,

vista a contestação apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 8 de março de 2012,

vistas as perguntas por escrito colocadas pelo Tribunal Geral às partes e as suas respostas apresentadas na Secretaria do Tribunal Geral em 5 e em 14 de novembro de 2012,

após a audiência de 11 de dezembro de 2012,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1        Em 24 de maio de 2004, a Groupe Chez Gerard Restaurants Ltd apresentou um pedido de registo de marca comunitária ao Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), ao abrigo do Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 20 de dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1), conforme alterado [substituído pelo Regulamento (CE) n.° 207/2009 do Conselho, de 26 de fevereiro de 2009, sobre a marca comunitária (JO L 78, p. 1)].

2        A marca cujo registo foi pedido é o sinal nominativo CLUB GOURMET.

3        Os produtos para os quais o registo foi pedido estão incluídos nas classes 16, 21, 29, 30, 32 e 33 na aceção do Acordo de Nice relativo à Classificação Internacional dos Produtos e dos Serviços para o Registo de Marcas, de 15 de junho de 1957, conforme revisto e alterado, e correspondem, para cada uma dessas classes, após limitação ocorrida no decurso do processo perante o IHMI, à seguinte descrição:

¾        classe 16: «Papelaria, bases em papel para copos e garrafas, toalhas de mesa, individuais e guardanapos em papel, sacos de papel para presentes»;

¾        classe 21: «Conchas de sopa, misturadores não elétricos, tira cápsulas, pincéis de cozinha, artigos em cerâmica para uso doméstico, moinhos de café, máquinas para fazer café, sacos de pasteleiro para decoração, formas de cozinha, espetos de cozinha, utensílios para cozinhar, saca‑rolhas, prensas para alimentos, funis, raladores, grelhas, baldes de gelo, cuvetes para gelo, recipientes para a cozinha, misturadoras de cozinha, utensílios de cozinha, moinhos para uso doméstico, misturadores, colheres de pastelaria, máquinas de fazer talharim, bicos, moinhos de sal e pimenta, pipetas, jarros, panelas, rolos de pastelaria, serviços de mesa, espátulas, aspersores, esferas para chá, caixas para chá, bules para chá, serviços de chá, tabuleiros, garrafas isolantes e prova‑vinho; recipientes para guardar alimentos, vidraria, porcelana e faiança»;

¾        classe 29: «Frutos e legumes em conserva, secos e cozidos; geleias, doces, carne, peixe, aves e caça, charcutaria, queijo, sopas, iogurte, azeite, patês»;

¾        classe 30: «Café, massas, chá, cacau, farinha, açúcar, pão, pastelaria, confeitaria, bolos, gelados e sorvetes, sanduíches, mel, xarope de melaço, mostarda, vinagre, molhos, condimentos e especiarias, compotas»;

¾        classe 32: «Cervejas; águas minerais e gasosas e outras bebidas não alcoólicas; bebidas de fruta e sumos de fruta; xaropes e outras preparações para bebidas»;

¾        classe 33: «Bebidas alcoólicas (com exceção das cervejas), vinhos; licores».

4        O pedido de marca comunitária foi publicado no Boletim de Marcas Comunitárias n.° 17/2005, de 25 de abril de 2005.

5        Em 22 de julho de 2005, a recorrente, El Corte Inglés, SA, deduziu oposição ao pedido de registo da marca para todos os produtos acima referidos no n.° 3, ao abrigo do artigo 42.° do Regulamento n.° 40/94 (atual artigo 41.° do Regulamento n.° 207/2009).

6        A oposição teve inicialmente como fundamento as quatro marcas anteriores seguintes:

¾        a marca figurativa espanhola n.° 1817328, registada para serviços da classe 35;

¾        o pedido de marca nominativa espanhola n.° 2229135, que indica produtos da classe 16;

¾        o pedido de marca nominativa espanhola n.° 2589335, que indica produtos das classes 29, 30, 31, 32, 33 e 34;

¾        o pedido de marca nominativa comunitária n.° 3789054, que indica produtos e serviços das classes 29, 30, 31, 32, 33 e 35.

7        Posteriormente, o pedido de marca comunitária n.° 3789054 foi indeferido por decisão da Segunda Câmara de Recurso do IHMI de 17 de julho de 2006 (processo R 343/2006‑2), que se tornou definitiva. Além disso, por cartas de 24 de novembro de 2009 e de 11 de agosto de 2010, no âmbito do processo na Divisão de Oposição, a recorrente renunciou fundamentar a sua oposição, respetivamente, nos pedidos de marcas espanholas n.os 2229135 e 2589335.

8        Por conseguinte, a oposição assenta apenas na marca figurativa espanhola anterior (a seguir «marca anterior»), abaixo reproduzida, registada com o número 1817328 para os serviços da classe 35 que correspondem à descrição seguinte: «Uma frase publicitária. Esta aplica‑se aos produtos abrangidos pelas marcas n.° 1013156 (classe 29), n.° 1013157 (classe 30), n.° 1815538 (classe 31), n.° 1815539 (classe 32), n.° 1013158 (classe 33), n.° 1815547 (classe 42) ‘El Corte Inglés’ (marca figurativa)»:

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9        Os motivos invocados em apoio da oposição eram os referidos no artigo 8.°, n.os 1, alínea b), e 5, do Regulamento n.° 40/94 [atual artigo 8.°, n.os 1, alínea b), e 5, do Regulamento n.° 207/2009].

10      Em 3 de setembro de 2010, a Divisão de Oposição indeferiu a oposição.

11      Em 6 de outubro de 2010, a recorrente interpôs recurso da decisão da Divisão de Oposição no IHMI, ao abrigo do disposto nos artigos 58.° a 64.° do Regulamento n.° 207/2009.

12      Por decisão de 28 de julho de 2011 (a seguir «decisão impugnada»), a Primeira Câmara de Recurso do IHMI negou provimento ao recurso. Em particular, considerou, a título principal, que a descrição dos serviços designados pela marca anterior era «uma frase publicitária» que não permite nenhuma comparação com os produtos designados pela marca pedida, na medida em que não designa nem um produto nem um serviço. A título subsidiário, ainda que se admita que a marca anterior designa «serviços publicitários» pertencentes à classe 35, os produtos e os serviços designados pelas marcas em conflito são diferentes. Com efeito, os produtos designados pela marca pedida dirigem‑se ao consumidor médio, ao passo que os serviços publicitários pretensamente designados pela marca anterior se dirigem a um público essencialmente composto por profissionais. Por fim, as marcas em conflito são, por um lado, globalmente diferentes no plano visual, e, por outro, não são semelhantes no plano fonético e, por último, têm uma fraca proximidade no plano conceitual.

 Pedidos das partes

13      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

¾        anular a decisão impugnada;

¾        condenar o IHMI nas despesas.

14      O IHMI conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

¾        negar provimento ao recurso;

¾        condenar a recorrente nas despesas.

 Questão de direito

15      A recorrente invoca um fundamento único, relativo à violação do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009.

16      Nos termos do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009, após oposição do titular de uma marca anterior, o pedido de registo de marca será recusado quando, devido à sua identidade ou semelhança com uma marca anterior e devido à identidade ou semelhança dos produtos ou serviços designados pelas duas marcas, exista risco de confusão no espírito do público do território onde a marca anterior está protegida. O risco de confusão compreende o risco de associação com a marca anterior. Por outro lado, nos termos do artigo 8.°, n.° 2, alínea a), do Regulamento n.° 207/2009, consideram‑se marcas anteriores as marcas registadas num Estado‑Membro cuja data de depósito seja anterior à do pedido de marca comunitária.

17      Segundo jurisprudência constante, constitui risco de confusão o risco de que o público possa crer que os produtos ou os serviços em causa provêm da mesma empresa ou de empresas ligadas economicamente. Resulta desta mesma jurisprudência que o risco de confusão deve ser apreciado globalmente, de acordo com a perceção que o público relevante tem dos sinais e dos produtos ou dos serviços em causa, tendo em conta todos os fatores relevantes do caso, entre os quais, nomeadamente, a interdependência entre a semelhança dos sinais e a semelhança dos produtos ou dos serviços designados [v. acórdão do Tribunal Geral de 9 de julho de 2003, Laboratorios RTB/IHMI — Giorgio Beverly Hills (GIORGIO BEVERLY HILLS), T‑162/01, Colet., p. II‑2821, n.os 30 a 33 e jurisprudência referida].

18      A título preliminar, na medida em que a recorrente põe em causa a apreciação feita pela Câmara de Recurso, há que analisar a questão de saber quais são os produtos designados pela marca anterior.

19      A Câmara de Recurso considerou, no n.° 17 da decisão impugnada, que a descrição dos produtos e/ou dos serviços para os quais a marca anterior foi registada não indicava claramente a natureza dos serviços abrangidos pela marca anterior e que a descrição não correspondia a nenhum dos produtos e serviços enumerados na Classificação de Nice. Além disso, referiu que uma «frase publicitária» não é nem um produto nem um serviço, na aceção do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009. Por conseguinte, esta descrição não permitia efetuar uma comparação dos produtos e dos serviços abrangidos pelas marcas em conflito, de modo que a oposição foi indeferida. Foi apenas a título subsidiário que a Câmara de Recurso analisou em seguida o recurso, baseando‑se na interpretação da Divisão de Oposição segundo a qual a expressão «uma frase publicitária» devia ser equiparada aos «serviços publicitários» da classe 35.

20      A este respeito, a recorrente alega, em substância, que, de acordo com a prática seguida pelo Instituto Espanhol das Patentes e das Marcas (OEPM) até 1997, uma «marca slogan» como a marca anterior não goza apenas de proteção para os serviços da classe 35, mas também para todos os produtos e serviços designados por uma ou várias «marcas de base». No presente processo, a marca anterior, cujo pedido foi apresentado em 26 de abril de 1994 e que foi registada em 5 de janeiro de 1996, goza assim também de proteção para os produtos e serviços das classes 29, 30, 31, 32, 33 e 42 e designados pelas marcas referidas na descrição dos serviços da marca anterior. Por conseguinte, devem também ser tomados em conta esses produtos e serviços para efetuar a comparação com aqueles designados pela marca pedida e não apenas os da classe 35.

21      O IHMI alega, a este respeito, em substância, que não é possível alargar a proteção da marca anterior aos produtos de outras classes ou a produtos e a serviços protegidos por outros direitos que não foram invocados como fundamento da oposição.

22      Nestas circunstâncias, antes de mais, há que proceder à determinação do alcance da descrição dos produtos e/ou dos serviços para os quais a marca anterior foi registada. A este respeito, em primeiro lugar, deve ter‑se em conta a redação da descrição dos produtos e/ou dos serviços visados, conforme figuram no n.° 8 supra. Em segundo lugar, há que apreciar as indicações suplementares fornecidas pela recorrente no IHMI e, em terceiro lugar, há que analisar a existência e o alcance de uma eventual obrigação do IHMI proceder oficiosamente a uma análise de certas circunstâncias.

 Quanto à redação da descrição dos produtos ou dos serviços designados pela marca anterior

23      Em primeiro lugar, há que recordar que a lista dos produtos ou serviços designados pela marca anterior tem a seguinte redação: «[classe] 35: Uma frase publicitária. Esta aplica‑se aos produtos abrangidos pelas marcas n.° 1013156 (classe 29), n.° 1013157 (classe 30), n.° 1815538 (classe 31), n.° 1815539 (classe 32), n.° 1013158 (classe 33), n.° 1815547 (classe 42) ‘El Corte Inglés’ (marca figurativa)».

24      Há que salientar, a este respeito, que esta lista identifica um único serviço, da classe 35, ou seja «uma frase publicitária», em relação à qual indica em seguida a utilização pretendida. Em contrapartida, da leitura da redação referida no número anterior não resulta que a marca anterior deva designar também os produtos abrangidos pelas marcas que se indicou constituírem o domínio de aplicação do serviço em causa. Por outro lado, ao contrário do que a recorrente sustentou na audiência, não é possível, simplesmente pela leitura desta lista, saber quais são os produtos designados pelas marcas que a recorrente enumera, uma vez que estes últimos não são identificados de forma concreta, mas apenas por referência às marcas pelas quais são designadas e às classes a que pertencem. Ora, na medida em que as classes da Classificação de Nice reúnem frequentemente um grande número de produtos muito variados, tais indicações não são suficientes para identificar os produtos concretamente visados (v., neste sentido e por analogia, acórdão do Tribunal de Justiça de 19 de junho de 2012, The Chartered Institute of Patent Attorneys, C‑307/10, n.os 49, 56, 61 e 62).

 Quanto às indicações fornecidas pela recorrente no IHMI

25      Em segundo lugar, segundo jurisprudência constante, um recurso interposto no Tribunal Geral tem por finalidade a fiscalização da legalidade das decisões das Câmaras de Recurso do IHMI na aceção do artigo 65.° do Regulamento n.° 207/2009. Decorre desta disposição que factos não invocados pelas partes nas instâncias do IHMI deixam de poder sê‑lo em sede de recurso para o Tribunal Geral e que este último não pode reexaminar a matéria de facto à luz de provas que sejam apresentadas pela primeira vez no Tribunal. Com efeito, a legalidade de uma decisão de uma Câmara de Recurso do IHMI deve ser apreciada em função dos elementos de informação de que esta dispunha no momento em que decidiu (acórdãos do Tribunal de Justiça de 18 de julho de 2006, Rossi/IHMI, C‑214/05 P, Colet., p. I‑7057, n.os 50 a 52, e de 18 de dezembro de 2008, Les Éditions Albert René/IHMI, C‑16/06 P, Colet., p. I‑10053, n.os 136 a 138).

26      Ora, há que constatar que foi no Tribunal Geral que a recorrente invocou pela primeira vez a prática específica do OEPM, no que respeita ao tratamento conferido às «marcas slogan» até 1997, e a jurisprudência dos órgãos jurisdicionais espanhóis referente ao âmbito da proteção conferida pelos registos anteriores a essa data. Com efeito, da leitura das suas alegações apresentadas no IHMI resulta que a recorrente não invocou em nenhum momento de forma expressa, nem na Divisão de Oposição nem na Câmara de Recurso, que a proteção conferida pela marca anterior se alargava para além dos serviços pertencentes à classe 35.

27      Em particular, em primeiro lugar, no requerimento de oposição apresentado ao IHMI em 22 de julho de 2005, a recorrente identificou através de uma cruz que a oposição tinha como fundamento «todos os produtos/serviços para os quais a marca anterior [estava] registada», sem que decorra do requerimento quais os produtos ou serviços em causa, nem mesmo a que classes pertencem.

28      Em segundo lugar, no anexo do referido requerimento que expõe de forma detalhada os fundamentos da oposição, a recorrente invocou os quatro direitos anteriores acima referidos no n.° 6, entre os quais a marca anterior, indicando, para cada um desses direitos, a que classes pertencem os produtos ou serviços que esses direitos designam. Ora, relativamente à marca anterior, mencionou apenas a classe 35 e não as classes 29 a 33 e 42 às quais, no seu entender, a proteção dessa marca se alarga.

29      Em terceiro lugar, por carta de 27 de outubro de 2005, o IHMI informou a recorrente de que a sua oposição não indicava os produtos e os serviços nos quais esta assentava e que a única indicação segundo a qual a oposição assentava em todos os produtos e serviços para os quais a marca anterior estava registada não era suficiente a este respeito. Ora, na sua resposta de 28 de outubro de 2005, a recorrente limitou‑se a fornecer, no que respeita à marca anterior, certidões da base de dados relativa à situação jurídica dos processos no OEPM (denominada «base de dados sitadex»), em línguas espanhola e inglesa, que continham, sob a rubrica «classe», apenas a menção «35».

30      Em quarto lugar, nas suas observações de 10 de julho de 2008 sobre a oposição, o outro interveniente no processo no IHMI indicou que a marca anterior estava registada para serviços pertencentes à classe 35, definidos como uma frase publicitária que se aplica a várias marcas, e que esses serviços não apresentavam nenhuma semelhança nem nenhuma relação com os produtos designados pela marca pedida. Acrescentou que a recorrente não baseou a sua oposição em nenhum registo para as classes 29, 30, 32 e 33. Ora, nas suas observações de 15 de dezembro de 2008, apresentadas na Divisão de Oposição em resposta às observações da outra interveniente no IHMI, a recorrente indicou apenas que os direitos anteriores designavam produtos e serviços das classes 16, 29 a 35 e 42. Uma vez que, nessa data, a oposição da recorrente assentava ainda, com exceção da marca anterior, em dois pedidos de marcas espanholas (v. n.os 6 e 7 supra), esta menção não permitiu que a Divisão de Oposição compreendesse que a marca anterior se destinava a designar produtos pertencentes a outras classes diferentes da classe 35.

31      Em quinto lugar, na sua decisão de 3 de setembro de 2010, a Divisão de Oposição indicou, em relação aos serviços designados pela marca anterior, que estes últimos eram «identificados, em substância, como uma frase publicitária da classe 35» e que interpretava esta «lista pouco habitual e pouco clara» como visando serviços publicitários relativos aos produtos pertencentes às classes 29, 30, 31, 32, 33 e 42. Acrescentou que, «uma vez que a [lista dos serviços] figur[ava] sob o único título da classe 35, a Divisão de Oposição interpret[ou]‑o como abrangendo apenas serviços da classe 35 e não produtos/serviços pertencentes às classes 29, 30, 31, 32, 33 e 42».

32      Ora, não obstante esta recusa explícita da Divisão de Oposição tomar em conta produtos pertencentes às referidas classes por terem sido designados pela marca anterior, a recorrente também não julgou ser necessário, na fundamentação do seu recurso na Câmara de Recurso, invocar claramente que, no seu entender, a referida marca também gozava de proteção para esses produtos. Pelo contrário, a recorrente indicou inicialmente, na secção intitulada «factos e processo» do referido recurso, que a sua oposição assentava no «registo da [marca anterior], para a classe 35». Em seguida, expôs, nos excertos destinados à comparação dos produtos, que «a marca anterior abrang[ia] serviços pertencentes à classe 35 ‘serviços publicitários referentes aos produtos pertencentes às classes 29, 30, 31, 32, 33 e 42’», para, por fim, se basear exclusivamente no argumento segundo o qual os «serviços publicitários» da classe 35 eram complementares dos produtos designados pela marca pedida e apresentavam uma conexão com alguns desses produtos. A este respeito, por um lado, há que sublinhar que a marca anterior designava «uma frase publicitária» e não «serviços publicitários» e que as indicações da recorrente na Câmara de Recurso não têm, por isso, suporte nos factos. Por outro lado, se a recorrente tivesse pretendido invocar que a proteção da marca anterior se alargava aos produtos e serviços das classes 29, 30, 31, 32, 33 e 42, bastar‑lhe‑ia ter invocado a semelhança ou a identidade, pelo menos parcial, dos produtos e dos serviços em causa, em vez de alegar a existência de uma pretensa relação de complementaridade entre os serviços da classe 35 e os produtos designados pela marca anterior, pertencentes às classes 16, 21, 29, 30, 32 e 33.

33      Daqui decorre que, ao contrário do que a recorrente alegou na audiência, os elementos que apresentou durante o procedimento administrativo, no seu conjunto, não continham nenhuma indicação explícita segundo a qual a proteção conferida pela marca anterior se devia, no seu espírito, alargar para além dos serviços da classe 35. Pelo contrário, os referidos elementos continham várias indicações, explícitas e implícitas, segundo as quais competia à marca anterior indicar exclusivamente serviços pertencentes à classe 35 — e isso sem efetuar um juízo prévio, nesta fase da fiscalização do Tribunal Geral, sobre a questão de saber em que sentido devia ser entendida a indicação «uma frase publicitária».

 Quanto à obrigação do IHMI tomar oficiosamente em conta o direito espanhol

34      Todavia, há que analisar se o IHMI, como a recorrente invocou na audiência, estava obrigado a tomar oficiosamente em conta o facto de que, nos termos do direito espanhol, a proteção conferida pela marca anterior se alargava aos produtos das classes 29, 30, 31, 32, 33 e 42 e designados pelas marcas referidas na descrição dos serviços.

35      A este respeito, há que salientar que, em princípio, para as instituições da União, a determinação e a interpretação das regras do direito nacional, na medida em que são indispensáveis para a sua atividade, cabem no âmbito da determinação dos factos e não no âmbito da aplicação do direito. Com efeito, esta última diz apenas respeito à aplicação do direito da União. Deste modo, embora seja verdade que o artigo 65.°, n.° 2, do Regulamento n.° 207/2009, invocado pela recorrente, deve ser entendido no sentido de que as regras de direito cuja violação pode dar origem a um recurso para o Tribunal Geral podem pertencer tanto ao direito nacional como ao direito comunitário, em contrapartida, apenas este último pertence ao domínio jurídico no qual o princípio iura novit curia se aplica, ao passo que o primeiro se situa ao nível do ónus da alegação e da prova específica à alegação dos factos, devendo o seu conteúdo ser demonstrado, se necessário for, através de produção de prova (conclusões da advogada‑geral J. Kokott no acórdão do Tribunal de Justiça de 5 de julho de 2011, Edwin/IHMI, C‑263/09 P, Colet., p. I‑5853, n.os 55, 56, 75 e 77; v., por analogia, acórdão Edwin/IHMI, já referido, n.os 47 a 50).

36      Tratando‑se, em particular, do alcance da proteção conferida por uma marca nacional anterior, tal interpretação pode aliás assentar também na redação da regra 19, n.° 2, do Regulamento (CE) n.° 2868/95 da Comissão, de 13 de dezembro de 1995, relativo à execução do Regulamento (CE) n.° 40/94 (JO L 303, p.1), conforme alterado, que estabelece que, «[n]o prazo [estabelecido pelo IHMI] no n.° 1, o oponente apresentará igualmente provas da existência, validade e âmbito de proteção da sua marca anterior ou direito anterior». De acordo com a regra 20, n.° 1, do referido regulamento, «[s]e, até ao termo do prazo […], o oponente não apresentar provas da existência, validade e âmbito de proteção da sua marca anterior ou direito anterior […], a oposição é rejeitada por falta de fundamento». De acordo com essas disposições cabe por isso ao oponente provar o alcance da proteção do direito anterior invocado e não ao IHMI proceder a pesquisas a este respeito.

37      Consequentemente, há que afastar a alegação da recorrente segundo a qual o direito nacional faz parte do quadro do direito da União relevante para efeitos da fiscalização pelo Tribunal Geral da legalidade das decisões do IHMI. Embora o Tribunal Geral também possa, no âmbito dessa fiscalização, punir os erros de apreciação dos factos cometidos pelo IHMI, a verdade é que, para poderem ser tomados em conta pelo IHMI, os factos em causa devem ter sido alegados e, se for caso disso, provados pela parte que os invoca.

38      Daqui decorre que, em princípio, no âmbito de um processo perante as instituições da União, cabe à parte que invoca em seu benefício o direito nacional provar que este último serve de suporte às suas pretensões.

39      É certamente verdade que o Tribunal Geral atenuou este princípio ao julgar que o IHMI deve informar‑se oficiosamente, através dos meios que entender serem úteis para esse efeito, sobre o direito nacional do Estado‑Membro em causa, se essas informações forem necessárias para apreciar as condições de aplicação do motivo de recusa de registo em causa, designadamente a materialidade dos factos apresentados ou a força probatória dos documentos produzidos (v. acórdão do Tribunal Geral de 20 de abril de 2005, Atomic Austria/IHMI — Fabricas Agrupadas de Muñecas de Onil (ATOMIC BLITZ), T‑318/03, Colet., p. II‑1319, n.° 35, e jurisprudência referida).

40      Este entendimento levou o Tribunal Geral a considerar que o IHMI estava obrigado a tomar em conta, na sua apreciação dos elementos de prova que lhe eram apresentados, o direito e a prática nacionais numa situação em que o oponente tinha apresentado certidões de registo que atestavam a inscrição das suas marcas nacionais, mas em que este se encontrava impossibilitado de provar a sua renovação porque o instituto das marcas nacional em causa, por princípio, não emitia documentos oficiais que atestem essa renovação (acórdão ATOMIC BLITZ, já referido, n.os 43 a 47).

41      No entanto, de acordo com o excerto acima referido no n.° 39, a obrigação de o IHMI se informar oficiosamente sobre o direito nacional foi subordinada à condição de que «essas informações [tenham sido] necessárias para apreciar as condições de aplicação do motivo de recusa de registo em causa, designadamente, a materialidade dos factos apresentados ou a força probatória dos documentos produzidos». Deste modo, só no caso de o IHMI já dispor de indicações relativas ao direito nacional, sob a forma de alegações quanto ao seu conteúdo ou sob a forma de elementos apresentados nos debates e cuja força probatória foi alegada, é que aquele está obrigado, sendo esse o caso, a informar‑se oficiosamente sobre o direito nacional.

42      Ora, no presente processo, como foi acima salientado nos n.os 27 a 33, a recorrente nunca invocou expressamente no IHMI que a marca anterior, em particular, gozava de proteção para outros produtos ou serviços para além dos da classe 35. Pelo contrário, a recorrente, diversas vezes, deu inclusivamente indicações que sugeriam que a referida marca só dizia respeito à classe 35.

43      Nestas circunstâncias, era impossível tanto para a Divisão de Oposição como para a Câmara de Recurso aperceberem‑se de que a marca anterior também designava os produtos e os serviços designados pelas «marcas de base» pertencentes às classes 16, 29, 30, 31, 32, 33 e 42. Deste modo, no presente processo, o IHMI não estava obrigado a informar‑se sobre o direito espanhol ou a proceder a pesquisas a esse respeito.

44      Por fim, há que rejeitar o argumento da recorrente segundo o qual o IHMI, na realidade, nem sequer tinha necessidade de se informar ou de proceder a pesquisas sobre o direito espanhol, uma vez que, segundo a recorrente, numa decisão da Segunda Câmara de Recurso de 17 de julho de 2006, no processo R 343/2006‑2, que envolvia também a recorrente, aquele tinha «reconhe[cido] a existência, o conteúdo e os efeitos […] das ‘marcas slogans’» e que a Divisão de Oposição teve em conta esta decisão na sua decisão de 3 de setembro de 2010 proferida no âmbito do presente processo.

45      Com efeito, em primeiro lugar, o primeiro excerto da decisão de 17 de julho de 2006, referido pela recorrente, figura na secção intitulada «argumentos da requerente», e a Segunda Câmara de Recurso apenas elencou os argumentos invocados pela recorrente. Há que sublinhar, a este respeito, que a recorrente não pode invocar em seu benefício, para contestar a legalidade da decisão impugnada neste processo, argumentos e factos que não invocou perante o IHMI no âmbito do presente processo inter partes, mas no âmbito de um processo ex parte relativo a outro pedido de marca.

46      Em segundo lugar, no segundo excerto referido pela recorrente, a Câmara de Recurso indicou claramente que a prática específica do OEPM relativa às «marcas slogan», invocada pela recorrente no âmbito de um argumento baseado na existência de registos nacionais anteriores, «não parec[ia] relevante à primeira vista». Na decisão invocada pela recorrente, o IHMI acabou por nem sequer analisar o mérito do argumento da recorrente que repousa nas especificidades do direito espanhol relativas às «marcas slogan». Por maioria de razão, não lhe pode ser imputado ter reconhecido a existência, o conteúdo e os efeitos dessas especificidades.

47      Em terceiro lugar, ao contrário do que a recorrente afirma, não está em questão que as referidas especificidades do direito espanhol sejam «conhecidas e referidas pelo próprio IHMI no processo de oposição [neste processo]». Com efeito, como resulta das observações preliminares da Divisão de Oposição na sua decisão de 3 de setembro de 2010 neste processo, esta apenas tomou em conta o dispositivo da decisão da Segunda Câmara de Recurso de 17 de julho de 2006, no processo R 343/2006‑2, que, ao negar provimento ao recurso interposto pela recorrente, recusou em definitivo o registo de uma das marcas anteriores que a recorrente tinha inicialmente invocado em apoio da sua oposição neste processo.

48      Resulta do que precede que o IHMI não podia saber, nem pela leitura da descrição dos serviços designados pela marca anterior, nem com base nas indicações fornecidas perante si pela recorrente, que a proteção conferida pela marca anterior se alargava aos produtos designados pelas «marcas de base» da recorrente nas classes 29, 30, 31, 32, 33 e 42. De igual modo, nas circunstâncias do caso concreto, o IHMI não estava obrigado a tomar em conta oficiosamente as especificidades do direito espanhol relativas às «marcas slogan», nem a proceder oficiosamente a pesquisas relativas a essas especificidades.

49      Daqui decorre que, de acordo com a jurisprudência acima referida no n.° 25, há que julgar inadmissível o conjunto das provas e dos argumentos da recorrente relativos ao direito espanhol.

50      Por conseguinte, para efeitos do presente processo, a descrição dos serviços designados pela marca anterior limita‑se aos serviços pertencentes à classe 35, conforme identificados na descrição acima retomada no n.° 8.

 Quanto à interpretação da descrição dos serviços designados pela marca anterior

51      A Câmara de Recurso considerou, a título principal, que a indicação «uma frase publicitária», enquanto descrição dos serviços designados pela marca anterior, não correspondia a nenhum dos produtos e serviços enumerados na Classificação de Nice, não constituía nem um produto nem um serviço, na aceção do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009, e não podia ser interpretada como visando «serviços publicitários», sob pena de um alargamento inadmissível do alcance dos serviços abrangidos pela marca anterior.

52      Convidada a tomar posição sobre essa apreciação no âmbito das perguntas do Tribunal Geral colocadas por escrito e durante a audiência, a recorrente indicou na audiência que não se opõe, por princípio, a que os termos «uma frase publicitária» sejam interpretados, tal como fez a Divisão de Oposição, como visando, de facto, serviços publicitários, mas sublinhou que contesta que a proteção da marca anterior seja limitada a esses serviços, excluindo os produtos designados pelas «marcas de base». Por outro lado, a recorrente considera que os serviços pertencentes à classe 35 designados pela marca anterior são semelhantes, complementares ou estão estritamente ligados aos produtos designados pela marca pedida. A este respeito, a recorrente invoca dois acórdãos nos quais o Tribunal Geral teria reconhecido a existência de uma semelhança entre serviços pertencentes, designadamente, à classe 35, por um lado, e produtos pertencentes às classes 5, 14, 18 e 25, por outro.

53      A este respeito, basta observar que estes argumentos da recorrente não se referem minimamente à apreciação da Câmara de Recurso, como acima enunciada no n.° 51 e que, por maioria de razão, não são suscetíveis de a colocar em causa.

54      Conforme foi acima observado, as circunstâncias deste processo são caracterizadas, por um lado, pelo facto que não decorria nem da redação da descrição dos serviços designados pela marca anterior nem das indicações e das alegações da recorrente durante o processo no IHMI que o alcance da proteção da referida marca se alargava para além dessa redação estrita. Por outro lado, as especificidades do direito espanhol, que permitem, segundo a recorrente, precisar utilmente o sentido da referida descrição dos serviços, não podem, por razões processuais, ser tidas em conta pelo Tribunal Geral. Nestas circunstâncias, há que observar, à semelhança da Câmara de Recurso, que a descrição dos serviços designados pela marca anterior, como acima reproduzida no n.° 8, não permite compará‑los com os produtos designados pela marca pedida.

55      Deste modo, a Câmara de Recurso não cometeu um erro ao concluir que a oposição devia ser indeferida por essa razão.

56      Vistas todas as considerações precedentes, há que rejeitar o fundamento único invocado pela recorrente e, por conseguinte, negar provimento ao recurso na sua totalidade.

 Quanto às despesas

57      Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

58      Tendo a recorrente sido vencida, há que, em conformidade com os pedidos do IHMI, condená‑la nas despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Quarta Secção)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      A El Corte Inglés, SA, é condenada nas despesas.

Pelikánová

Jürimäe

Van der Woude

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 20 de março de 2013.

Assinaturas


* Língua do processo: espanhol.