Language of document : ECLI:EU:C:2024:316

DESPACHO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sétima Secção)

10 de abril de 2024 (*)

«Reenvio prejudicial — Artigo 99.° do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça — Resposta que pode ser claramente deduzida da jurisprudência — Fiscalidade — Imposto sobre o valor acrescentado (IVA) — Diretiva 2006/112/CE — Artigo 183.° — Direito à dedução do IVA pago a montante — Modalidades de exercício — Reembolso tardio — Atraso devido à aplicação de uma disposição nacional — Efeitos de um acórdão proferido a título prejudicial pelo Tribunal de Justiça posteriormente a estes factos — Juros de mora — Prescrição — Princípios da equivalência, da efetividade e da neutralidade fiscal»

No processo C‑532/23,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.° TFUE, pelo Fővárosi Törvényszék (Tribunal de Budapeste‑Capital, Hungria), por Decisão de 10 de julho de 2023, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 18 de agosto de 2023, no processo

Lear Corporation Hungary Autóipari Gyártó Kft.

contra

Nemzeti Adó és Vámhivatal Fellebbviteli Igazgatósága,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sétima Secção),

composto por: F. Biltgen, presidente de secção, N. Wahl (relator) e J. Passer, juízes,

advogada‑geral: T. Ćapeta,

secretário: A. Calot Escobar,

vista a decisão tomada, ouvida a advogada‑geral, de decidir por despacho fundamentado, nos termos do artigo 99.° do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça,

profere o presente

Despacho

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 183.o da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (JO 2006, L 347, p. 1), e dos princípios da equivalência, da efetividade e da neutralidade fiscal.

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Lear Corporation Hungary Autóipari Gyártó Kft. (a seguir «Lear Corporation») à Nemzeti Adó‑ és Vámhivatal Fellebbviteli Igazgatósága (Direção de Recursos da Administração Nacional Tributária e Aduaneira, Hungria) (a seguir «Direção de Recursos») a respeito do direito da Lear Corporation ao pagamento de juros de mora relativos ao reembolso tardio de um excedente do imposto sobre o valor acrescentado (a seguir «IVA») devido a um requisito imposto por uma disposição nacional que foi posteriormente declarada incompatível com o direito da União pelo Tribunal de Justiça.

 Quadro jurídico

 Direito da União

3        O artigo 183.° da Diretiva 2006/112 prevê:

«Quando o montante das deduções exceder o montante do IVA devido relativamente a um período de tributação, os Estados‑Membros podem efetuar o reporte do excedente para o período seguinte, ou proceder ao respetivo reembolso nas condições por eles fixadas.

Todavia, os Estados‑Membros podem não autorizar o reporte ou o reembolso quando o excedente for insignificante.»

 Direito húngaro

 Lei que altera a Lei do IVA

4        A az általános forgalmi adóról szóló 2007. évi CXXVII. törvény jogharmonizációs célú módosításáról és az adó‑visszaigénylés különös eljárási szabályairól szóló 2011. évi CXXIII. törvény (Lei CXXIII de 2011 que altera, para efeitos de harmonização, a Lei CXXVII de 2007 do imposto sobre o valor acrescentado, e através da qual é regulado o procedimento especial de reembolso do IVA) (Magyar Közlöny 2011/110; a seguir «Lei que altera a Lei do IVA») revogou, com efeitos a partir de 27 de setembro de 2011, o artigo 186.°, n.os 2 a 4, da az általános forgalmi adóról szóló 2007. évi CXXVII. törvény (Lei CXXVII de 2007 relativa ao IVA) (Magyar Közlöny 2007/155), para permitir o reembolso do excedente de IVA dedutível sem que fosse necessário aguardar o pagamento da contrapartida da operação da qual resultava o IVA dedutível. Anteriormente, este artigo 186.° estipulava, no seu n.° 2, que o exercício do direito ao reembolso de um excedente de IVA dedutível estava sujeito a um requisito de pagamento do montante devido pela operação em causa.

5        Nos termos do artigo 1.°, n.° 1, da Lei que altera a Lei do IVA:

«Os montantes relativamente aos quais o sujeito passivo não teve oportunidade de exercer, na última declaração de IVA que estava obrigado a apresentar antes da entrada em vigor da presente lei (a seguir “declaração”), o seu direito ao reembolso ao abrigo do artigo 186.°, n.os 2 a 4, [...] revogado pela presente lei, apenas no que diz respeito ao montante que o sujeito passivo declarou a título de imposto sobre aquisições não pagas, podem ser objeto de um pedido de reembolso dirigido à Administração Tributária até 20 de outubro de 2011, através do formulário previsto para o efeito; independentemente deste prazo, o sujeito passivo pode, na declaração correspondente ao regime que lhe é aplicável, deduzir dos montantes anteriormente referidos o montante do imposto devido ou exercer nessa mesma declaração o seu direito ao reembolso. Este pedido é considerado uma declaração para efeitos da aplicação das disposições [do Código de Processo Tributário]. O prazo para apresentar o pedido é perentório e não pode ser objeto de prorrogação.»

 Código de Processo Tributário

6        A az adózás rendjéről szóló 2003. évi XCII. törvény (Lei XCII de 2003 que aprova o Código de Processo Tributário) (Magyar Közlöny 2003/131; a seguir «Código de Processo Tributário») dispõe, no seu artigo 37.°, n.os 4 e 6:

«(4)      O vencimento do pagamento de uma subvenção orçamental devida ao sujeito passivo está regulado nos anexos da presente lei ou em lei especial. A subvenção proveniente do orçamento ou o IVA cujo reembolso é pedido devem ser pagos no prazo de 30 dias a contar da data da receção do pedido (declaração), mas não antes da data de vencimento, cujo prazo é de 45 dias caso o valor do IVA reembolsável exceda 500 000 florins [húngaros (HUF) (cerca de 1 300 euros)].

[...]

(6) Se a Administração Tributária efetuar um pagamento extemporâneo, pagará juros a uma taxa equivalente à de uma sanção pecuniária compulsória por cada dia de atraso. [...]»

7        Nos termos do artigo 124.°/C do Código de Processo Tributário:

«(1) Nos casos em que o Alkotmánybíróság [Tribunal Constitucional, Hungria], a Kúria [Supremo Tribunal, Hungria] ou o Tribunal de Justiça da União Europeia declarem, com efeitos retroativos, que uma norma jurídica que impõe uma obrigação fiscal é contrária à Constituição ou a um ato obrigatório da União Europeia ou, caso se trate de um regulamento municipal, a qualquer outra norma jurídica, e essa decisão judicial conferir ao sujeito passivo o direito ao reembolso nos termos do presente artigo, a Administração Tributária de primeiro grau procede ao reembolso a pedido do sujeito passivo, em conformidade com os procedimentos especificados na decisão em causa.

(2) O sujeito passivo pode apresentar o seu pedido por escrito à Administração Tributária no prazo de 180 dias a contar da data da publicação ou da notificação da decisão do Alkotmánybíróság [Tribunal Constitucional], da Kúria [Supremo Tribunal] ou do Tribunal de Justiça da União Europeia; o referido prazo é perentório e não pode ser prorrogado. A Administração Tributária indefere o pedido em caso de prescrição, na data da publicação ou notificação da decisão, do direito à indemnização.

[...]

(6) Caso se conclua que o direito do sujeito passivo ao reembolso é fundado, a Administração Tributária pagará, quando do reembolso, juros de mora sobre o imposto a reembolsar, a uma taxa igual à taxa base do banco central, calculados a partir da data de pagamento do imposto até ao dia em que a decisão de concessão do reembolso se tenha tornado definitiva. O reembolso é devido na data em que a decisão que o concedeu se tornou definitiva e deve ser realizado no prazo de 30 dias a partir da data em que o mesmo se tornou exigível. As disposições relativas ao pagamento de subsídios orçamentais aplicam‑se, com as devidas adaptações, ao reembolso regulado pelo presente número, sem prejuízo do disposto no artigo 37.°, n.° 6.»

8        O artigo 124.°/D, n.os 1 a 3, do Código de Processo Tributário tem a seguinte redação:

«(1) Salvo disposição em contrário do presente artigo, as disposições do artigo 124.°/C são aplicáveis aos pedidos de reembolso com fundamento no direito à dedução do IVA.

(2) O sujeito passivo pode exercer o direito previsto no n.° 1 do presente artigo através de uma declaração de regularização apresentada no prazo de 180 dias a contar da data da publicação ou da notificação da decisão do Alkotmánybíróság [Tribunal Constitucional], da Kúria [Supremo Tribunal] ou do [Tribunal de Justiça], referente à declaração ou às declarações correspondentes ao exercício fiscal ou exercícios fiscais em que foi constituído o direito à dedução em causa. O referido prazo é perentório e não pode ser prorrogado.

(3) Caso a declaração retificada pela declaração de regularização demonstre que o sujeito passivo tem direito a um reembolso em virtude da redução do imposto de que é devedor ou do aumento do montante reembolsável [...], a Administração Tributária aplicará ao montante a reembolsar uma taxa de juros equivalente à taxa base do banco central, calculada para o período entre a data fixada para pagamento na declaração ou declarações abrangidas pela declaração de regularização ou a data de vencimento — ou a data de pagamento do imposto, se esta for posterior — e a data em que é apresentada a declaração de regularização. O reembolso, ao qual se aplicam as disposições relativas ao pagamento de subsídios orçamentais, deve ser efetuado no prazo de 30 dias a contar da data de apresentação da declaração de regularização.»

9        O artigo 164.°, n.° 1, do referido código prevê:

«O direito de liquidar o imposto prescreve no prazo de cinco anos a contar do último dia do ano civil em que a declaração ou a notificação relativa a esse imposto deveria ter sido feita, ou, na falta de declaração ou de notificação, do último dia do ano civil em que o imposto deveria ter sido pago. Salvo disposição em contrário da lei, o direito de requerer uma subvenção orçamental, bem como o direito ao reembolso dos montantes pagos em excesso, prescrevem no prazo de cinco anos a contar do último dia do ano civil em que foi adquirido o direito de requerer a subvenção ou o reembolso.»

 Litígio no processo principal e questões prejudiciais

10      A Lear Corporation produz equipamentos para veículos automóveis em vários locais na Hungria. Nos períodos de declaração do IVA de dezembro de 2005 a julho de 2011, não pôde exercer o seu direito ao reembolso do IVA devido ao requisito, então em vigor e recordado no n.° 4 do presente despacho, das «aquisições pagas», segundo o qual apenas as aquisições integralmente pagas permitiam deduzir o IVA pago a montante.

11      No Acórdão de 28 de julho de 2011, Comissão/Hungria (C‑274/10, EU:C:2011:530, n.° 54), o Tribunal de Justiça declarou que o artigo 183.° da Diretiva 2006/112 não permite aos Estados‑Membros fazerem depender o exercício do direito ao reembolso de um excedente de IVA dedutível de um requisito relativo ao pagamento do montante devido a título da operação em causa.

12      Na sequência daquele acórdão, o legislador húngaro adotou a Lei que altera a Lei do IVA. No entanto, esta nova lei não contém nenhuma disposição que preveja que os sujeitos passivos são indemnizados pelos prejuízos financeiros que decorrem da aplicação do requisito das «aquisições pagas», que foi declarado incompatível com o direito da União.

13      Em 30 de setembro de 2011, a Lear Corporation apresentou, ao abrigo da Lei que altera a Lei do IVA, um pedido de recuperação do IVA relativo ao período mencionado no n.° 10 do presente despacho. A Administração Tributária húngara reembolsou‑lhe o montante do IVA pedido, sem, contudo, pagar juros de mora.

14      No Despacho de 17 de julho de 2014, Delphi Hungary Autóalkatrész Gyártó (C‑654/13, EU:C:2014:2127, n.° 39), o Tribunal de Justiça declarou que o direito da União, designadamente o artigo 183.° da Diretiva IVA, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma regulamentação e a uma prática de um Estado‑Membro que excluem o pagamento de juros de mora sobre o montante do IVA não reembolsável num prazo razoável em virtude de uma disposição nacional que foi declarada contrária ao direito da União.

15      O Tribunal de Justiça esclareceu naquele acórdão que, na falta de legislação da União nesta matéria, compete a esse Estado‑Membro determinar, respeitando os princípios da equivalência e da efetividade, as condições de pagamento de tais juros, as quais não devem ser menos favoráveis do que as aplicáveis às ações baseadas na violação do direito interno que tenham um pedido e uma causa de pedir semelhantes às baseadas na violação do direito da União (princípio da equivalência), nem ser formuladas de maneira a tornar na prática impossível ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica da União (princípio da efetividade).

16      Em 23 de dezembro de 2014, com base no Despacho de 17 de julho de 2014, Delphi Hungary Autóalkatrész Gyártó (C‑654/13, EU:C:2014:2127), a Lear Corporation apresentou à Nemzeti Adó‑ és Vámhivatal Kiemelt Adózók Adóigazgatósága (Direção Tributária para os Grandes Contribuintes da Administração Nacional Tributária e Aduaneira, Hungria) (a seguir «Administração Tributária de primeiro grau») um pedido de pagamento de juros de mora no montante de 457 916 030 HUF (que, à data deste pedido, correspondia a cerca de 1 458 656 euros) a título do reembolso tardio do IVA (a seguir «juros de mora»). Solicitou também juros a título do pagamento tardio dos juros de mora (a seguir «juros compostos») no que respeita ao período de 1 de janeiro de 2008 a 31 de julho de 2011.

17      Tendo a Administração Tributária de primeiro grau indeferido o seu pedido, a Lear Corporation recorreu para a Direção de Recursos, que, por Decisão de 12 de outubro de 2015, anulou a decisão daquela autoridade e lhe ordenou que se pronunciasse novamente sobre o processo.

18      Por Decisão de 10 de novembro de 2015, proferida na sequência do processo de reapreciação, a Administração Tributária de primeiro grau deferiu parcialmente o pedido da Lear Corporation. Através de um pedido complementar apresentado em 2 de novembro de 2016, a Lear Corporation requereu a esta autoridade que completasse a sua decisão, concedendo‑lhe o montante de 122 108 685 HUF (que, à data deste pedido complementar, correspondia a cerca de 396 380 euros), a título de juros compostos, alegando que a referida autoridade o deveria ter feito oficiosamente.

19      Num Acórdão de 24 de novembro de 2016, a Kúria (Supremo Tribunal) pronunciou‑se sobre a prática adotada pela Administração Tributária húngara, a fim de retirar as consequências do Despacho de 17 de julho de 2014, Delphi Hungary Autóalkatrész Gyártó (C‑654/13, EU:C:2014:2127). Com base neste despacho, proferiu o Acórdão de Uniformização n.° 18/2017, no qual esclareceu as modalidades de cálculo dos juros de mora sobre os montantes de IVA que não puderam ser recuperados devido ao requisito das «aquisições pagas», revogado pela Lei que altera a Lei do IVA.

20      Com base naquele Acórdão de Uniformização, a Direção de Recursos anulou, por Decisão de 7 de março de 2017, a Decisão de 10 de novembro de 2015 e ordenou à Administração Tributária de primeiro grau que reapreciasse o pedido de pagamento dos juros de mora apresentado pela Lear Corporation. Por Decisão de 18 de abril de 2017, esta autoridade deferiu parcialmente o pedido, concedendo à Lear Corporation juros de mora no montante de 225 825 000 HUF (que, em 18 de abril de 2017, correspondia a cerca de 720 585 euros), calculados em função da taxa de base do Banco Central húngaro, para o período entre 1 de janeiro de 2008 e 31 de julho de 2011.

21      Inconformada com a decisão, a Lear Corporation recorreu para a Direção de Recursos, pedindo que lhe fossem concedidos igualmente juros de mora relativos ao período entre dezembro de 2005 e dezembro de 2007, no sentido de abranger a totalidade do período em que não pôde exercer o seu direito ao reembolso do IVA, à luz do Acórdão de Uniformização n.° 18/2017 da Kúria (Supremo Tribunal).

22      Após ter assinalado que a Lear Corporation tinha apresentado o seu pedido de pagamento de juros de mora em 23 de dezembro de 2014, ou seja, dentro do prazo fixado, sob pena de caducidade, no qual indicara expressamente o período entre 1 de janeiro de 2008 e 31 de julho de 2011 enquanto período a que se referia este pedido, a Direção de Recursos considerou que, à luz do princípio do dispositivo, segundo o qual são as partes que definem o objeto do litígio, a Administração Tributária de primeiro grau só tinha de se pronunciar sobre o referido pedido. Por conseguinte, aquela direção considerou que o pedido de pagamento de juros de mora relativo ao período entre 1 de dezembro de 2005 e 31 de dezembro de 2007 deveria ser examinado na qualidade de pedido novo. Consequentemente, remeteu o processo a essa autoridade para que se pronunciasse sobre o pagamento dos juros de mora referidos nesse pedido.

23      Por Decisão de 1 de setembro de 2017, a Administração Tributária de primeiro grau indeferiu o referido pedido por ser extemporâneo, uma vez que, por força do Acórdão de Uniformização n.° 18/2017, o pagamento de juros de mora estava claramente subordinado a um pedido apresentado pelo sujeito passivo que, atento o prazo de prescrição, só poderia ser apresentado até 31 de dezembro de 2016. Esta decisão foi confirmada pela Direção de Recursos em 1 de dezembro de 2017.

24      Por conseguinte, a Lear Corporation intentou uma ação no Fővárosi Törvényszék (Tribunal de Budapeste‑Capital, Hungria), alegando que também tinha direito aos juros de mora relativos ao período entre dezembro de 2005 e dezembro de 2007 inclusive, alegando, nomeadamente, que, quando apresentou o pedido mencionado no n.° 13 do presente despacho em 2011, tinha invocado o seu direito ao reembolso do IVA, o que constitui o requisito para pagamento dos juros. Recordou que tinha apresentado especificamente um pedido de pagamento de juros de mora em 23 de dezembro de 2014, ou seja, dentro do prazo de prescrição, e que, por força do Acórdão de Uniformização n.° 18/2017, a Administração Tributária de primeiro grau lhe deveria ter pago esses juros relativamente à totalidade do período em causa sem estar, a este título, vinculada pelo conteúdo do seu pedido, visto que o princípio da efetividade deve prevalecer sobre o princípio do dispositivo.

25      Nestas condições, o Fővárosi Törvényszék (Tribunal de Budapeste‑Capital) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)       Devem o artigo 183.° da Diretiva [2006/112] e os princípios da equivalência e da efetividade ser interpretados no sentido de que, quando um contribuinte pede um reembolso do [IVA] que anteriormente não podia pedir em razão da aplicação de um requisito jurídico declarado contrário ao direito da União por um acórdão do Tribunal de Justiça, cabe considerar que, nesse caso, o pedido de reembolso também constitui um pedido de juros de mora, tendo em conta a natureza acessória dos juros e o facto de o pedido de juros de mora ser regulado pela mesma disposição de direito nacional que rege o pedido de reembolso do IVA cuja devolução tardia provocou a mora?

2)       É compatível com os princípios da equivalência e da eficácia, bem como, em especial, com o princípio da neutralidade fiscal, uma prática de um Estado‑Membro ao abrigo da qual, no âmbito de um procedimento administrativo tributário, é indeferido, ao abrigo do princípio do dispositivo, um pedido subsequente de juros de mora apresentado pelo contribuinte com fundamento no facto de o seu primeiro pedido de juros de mora, que deu origem ao início do procedimento, não incluir o período adicional indicado no pedido subsequente, de modo que este último foi qualificado de pedido novo e declarado extemporâneo, apesar de a própria Autoridade Tributária não ter de modo nenhum considerado estar vinculada pelo primeiro pedido apresentado pelo contribuinte ao abrigo do princípio do dispositivo, tendo apenas, pelo contrário, invocado esse princípio em relação aos juros de mora reclamados relativamente a um período que ainda não era conhecido no momento em que o pedido que deu origem ao início do procedimento foi apresentado, uma vez que esse período foi definido pela jurisprudência na pendência desse procedimento?

3)       Tendo em conta os princípios da equivalência, da efetividade e da neutralidade fiscal, deve um pedido subsequente apresentado no âmbito de um procedimento administrativo tributário com base em jurisprudência assente ser considerado um complemento do primeiro pedido, que deu origem ao início do procedimento, ou deve, ao invés, ser considerado uma alteração desse primeiro pedido, atendendo à circunstância de que os dois pedidos apenas diferem entre si no que diz respeito ao período de pagamento de juros?

4)       É compatível com os princípios da equivalência, da efetividade e da neutralidade fiscal uma prática de um Estado‑Membro ao abrigo da qual, após o termo do prazo de prescrição, um pedido é declarado extemporâneo sem que se verifique se ocorreram circunstâncias admissíveis suscetíveis de suspender ou interromper o prazo de prescrição, tendo em conta, em especial, o primeiro pedido apresentado pela demandante em 2014, bem como o facto de, ainda que a legislação em vigor não tenha sido alterada enquanto corria o prazo de prescrição, e uma vez que a referida legislação só estabelecia os requisitos do pedido de reembolso do IVA, a Kúria (Supremo Tribunal, [...]) e o Tribunal de Justiça terem definido jurisprudencialmente, por não existir legislação a esse respeito, os requisitos de apresentação de um pedido de juros de mora, através de uma interpretação extensiva dessa legislação, de modo que, durante uma parte decisiva do prazo de prescrição de cinco anos, as regras que regulavam o pedido de juros de mora não só não eram conhecidas nem claras para os contribuintes, como não revestiam sequer a forma de uma disposição normativa?»

 Quanto às questões prejudiciais

26      De acordo com o artigo 99.o do seu Regulamento de Processo, o Tribunal de Justiça pode, a qualquer momento, mediante proposta do juiz‑relator, ouvido o advogado‑geral, decidir pronunciar‑se por meio de despacho fundamentado quando a resposta a uma questão submetida a título prejudicial pode ser claramente deduzida da jurisprudência.

27      Importa também recordar que a cooperação judiciária instituída pelo artigo 267.° TFUE se baseia numa nítida separação de funções entre os órgãos jurisdicionais nacionais e o Tribunal de Justiça. Por um lado, o Tribunal de Justiça não está habilitado a aplicar as regras do direito da União a uma situação determinada, mas apenas a pronunciar‑se sobre a interpretação dos Tratados e dos atos adotados pelas instituições, os órgãos ou organismos da União (v., neste sentido, Acórdão de 18 de maio de 2021, Asociaţia «Forumul Judecătorilor din România» e o., C‑83/19, C‑127/19, C‑195/19, C‑291/19, C‑355/19 e C‑397/19, EU:C:2021:393, n.° 201 e jurisprudência referida). Por outro, em conformidade com o n.° 11 das Recomendações do Tribunal de Justiça à atenção dos órgãos jurisdicionais nacionais, relativas à apresentação de processos prejudiciais (JO 2019, C 380, p. 1), é ao órgão jurisdicional nacional que interpelou o Tribunal de Justiça que cabe retirar as consequências concretas, no âmbito do litígio que lhe foi submetido, dos elementos de interpretação fornecidos pelo Tribunal de Justiça (v., neste sentido, Acórdão de 25 de outubro de 2018, Roche Lietuva, C‑413/17, EU:C:2018:865, n.° 43).

28      No caso em apreço, o Tribunal de Justiça considera que a interpretação do direito da União solicitada pelo órgão jurisdicional de reenvio pode ser claramente deduzida dos Acórdãos de 12 de fevereiro de 2008, Kempter (C‑2/06, EU:C:2008:78), de 23 de abril de 2020, Sole‑Mizo e Dalmandi Mezőgazdasági (C‑13/18 e C‑126/18, EU:C:2020:292), e do Despacho de 20 de junho de 2023, SOLE‑MiZo (C‑426/22, EU:C:2023:517). Por conseguinte, há que aplicar o artigo 99.o do Regulamento de Processo no presente processo.

29      Conforme resulta do n.o 27 do presente despacho, caberá ao órgão jurisdicional de reenvio retirar as consequências concretas, no âmbito do litígio no processo principal, dos elementos de interpretação que resultam desta jurisprudência do Tribunal de Justiça.

 Quanto à primeira questão

30      Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 183.° da Diretiva 2006/112 deve ser interpretado, à luz dos princípios da equivalência e da efetividade, no sentido de que, quando o sujeito passivo pede o reembolso do IVA que anteriormente não podia ser recuperado devido à aplicação de um requisito previsto na lei que o Tribunal de Justiça declarou violar aquele artigo, se opõe a que se possa considerar que este pedido de reembolso também abrange um pedido de pagamento de juros de mora, tendo em conta a natureza acessória destes últimos e a circunstância de o seu pagamento ser regulado pelas mesmas disposições nacionais que as que são aplicáveis ao reembolso do IVA no caso de o reembolso ter ocorrido tardiamente.

31      A este título, o Tribunal de Justiça declarou, nomeadamente, no Despacho de 20 de junho de 2023, SOLE‑MiZo (C‑426/22, EU:C:2023:517):

«40       [Q]uando um Estado‑Membro tenha cobrado impostos em violação das regras do direito da União, os contribuintes têm direito ao reembolso não apenas do imposto indevidamente cobrado, mas igualmente das quantias pagas a esse Estado ou por este retidas em relação direta com esse imposto. Isto inclui igualmente o prejuízo decorrente da indisponibilidade das quantias em dinheiro devido à exigibilidade antecipada do imposto. Assim, o princípio da obrigação de os Estados‑Membros restituírem com juros os montantes dos impostos cobrados em violação do direito da União decorre deste direito [...]

41       Na falta de legislação da União, cabe à ordem jurídica interna de cada Estado‑Membro prever as condições em que tais juros devem ser pagos, nomeadamente a respetiva taxa e o seu modo de cálculo (juros simples ou juros compostos). Essas condições devem respeitar os princípios da equivalência e da efetividade, ou seja, não devem ser menos favoráveis do que as que se referem a reclamações semelhantes baseadas em disposições de direito interno nem organizadas de forma a que tornem impossível na prática o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica da União. Essas condições devem, além disso, respeitar o princípio da neutralidade fiscal [...]

42       No que se refere […] ao princípio da equivalência, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que a observância deste princípio pressupõe que a regra nacional em causa seja aplicável indiferentemente aos recursos fundados nos direitos conferidos às pessoas pelo direito da União e aos fundados na violação do direito interno que tenham um pedido e uma causa de pedir semelhantes [...]

43      Quanto ao princípio da efetividade, [...] este exige que as normas nacionais relativas ao cálculo dos juros eventualmente devidos em caso de pedido de reembolso do excedente de IVA dedutível retido em violação do direito da União não privem o sujeito passivo de uma indemnização adequada pela perda gerada pela indisponibilidade dos montantes em causa [...]

44       Em relação ao princípio da neutralidade fiscal, importa recordar que, tendo em conta a finalidade do pagamento de juros sobre os excedentes de IVA retidos por um Estado‑Membro em violação das regras do direito da União, que é a de compensar as perdas financeiras do sujeito passivo, causadas pela indisponibilidade dos montantes em causa, este princípio exige que as modalidades de pagamento de juros sejam estabelecidas por forma a que o encargo económico dos montantes do imposto indevidamente retidos possa ser compensado [...]»

32      Nestas condições, há que responder à primeira questão que o artigo 183.° da Diretiva 2006/112 deve ser interpretado, à luz dos princípios da equivalência, da efetividade e da neutralidade fiscal, no sentido de que, quando o sujeito passivo pede o reembolso do IVA que anteriormente não podia ser recuperado devido à aplicação de um requisito previsto na lei que o Tribunal de Justiça declarou violar este artigo, este artigo não se opõe a que, desde que preenchidos os requisitos previstos no direito do Estado‑Membro em causa, se possa considerar que este pedido de reembolso também abrange um pedido de pagamento de juros de mora, tendo em conta a finalidade do pagamento de juros sobre os excedentes de IVA retidos por um Estado‑Membro em violação das normas do direito da União, que se destina a compensar as perdas financeiras, sofridas pelo sujeito passivo, decorrentes da indisponibilidade dos montantes em causa.

 Quanto à segunda questão

33      Com a sua segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se os princípios da equivalência, da efetividade e da neutralidade fiscal devem ser interpretados no sentido de que se opõem à prática de um Estado‑Membro que consiste em qualificar de pedido novo, com a consequente prescrição do mesmo, um pedido de pagamento de juros de mora que indica um período que não foi objeto de um primeiro pedido de pagamento destes juros e em isentar a Administração Tributária desse Estado da obrigação de conceder, devido ao princípio do dispositivo, na fase do primeiro pedido, juros não abrangidos por este pedido, quando o sujeito passivo estava impossibilitado, à data deste primeiro pedido, de saber que podia alargar o respetivo âmbito temporal.

34      Antes de mais, note‑se que esta questão significa forçosamente que a hipótese mencionada no n.° 32 do presente despacho não se verifica. Com efeito, a referida questão pressupõe, por definição, que o direito do Estado‑Membro em causa não contém nenhuma disposição por força da qual um pedido de reembolso do imposto retido ilegalmente pela Administração Tributária desse Estado implica, ipso jure, que esse pedido também abrange o pagamento de juros de mora.

35      Para responder a esta questão, cumpre, primeiro, recordar que o Tribunal de Justiça, no seu Acórdão de 12 de fevereiro de 2008, Kempter (C‑2/06, EU:C:2008:78), declarou que:

«35      [...] a interpretação que, no exercício da competência que lhe é conferida pelo [artigo 267.° TFUE], o Tribunal de Justiça dá de uma norma de direito [da União] esclarece e precisa, sempre que seja necessário, o significado e o alcance dessa norma, tal como deve ou deveria ter sido entendida e aplicada desde o momento da sua entrada em vigor [...]. Por outras palavras, um acórdão prejudicial não tem valor constitutivo, mas puramente declarativo, com a consequência de que os seus efeitos remontam, em princípio, à data da entrada em vigor da norma interpretada [...]

36      Daqui resulta que [...] uma norma de direito [da União] interpretada dessa forma deve ser aplicada por um órgão administrativo no âmbito das suas competências mesmo a relações jurídicas nascidas e constituídas antes de proferido o acórdão do Tribunal de Justiça que decidiu o pedido de interpretação [...]»

36      Posteriormente, o Tribunal de Justiça declarou, nomeadamente, no seu Acórdão de 23 de abril de 2020, Sole‑Mizo e Dalmandi Mezőgazdasági (C‑13/18 e C‑126/18, EU:C:2020:292), que:

«49       [...] uma prática nacional segundo a qual, em caso de reembolso a pedido do sujeito passivo de um excedente de IVA dedutível, retido em violação do direito da União, os juros aplicados a esse montante [...] correm durante um período de declaração determinado, sem aplicação de juros para compensar o sujeito passivo da depreciação monetária causada pelo decurso do tempo subsequente a esse período de declaração e até efetivo pagamento dos juros, pode privar o sujeito passivo de uma indemnização adequada pela perda resultante da indisponibilidade dos montantes em causa e, por conseguinte, não respeita o princípio da efetividade. Além disso, tal prática não permite compensar o encargo económico dos montantes do imposto indevidamente retidos, contrariamente ao princípio da neutralidade fiscal.

[...]

64      [...] quando [...] o crédito tem a sua causa na violação por um Estado‑Membro do direito da União, o princípio da efetividade exige o pagamento de juros de mora em caso de pagamento tardio desse crédito pela Administração; a não ser assim, os Estados‑Membros não seriam incentivados a compensar com a maior brevidade os efeitos decorrentes para os sujeitos passivos da aludida violação do direito da União.

65      No que se refere às condições em que esses juros são pagos, [...] na falta de legislação da União, cabe à ordem jurídica interna de cada Estado‑Membro prever essas condições, sob reserva, entre outros, dos princípios da equivalência e da efetividade.

[...]

67      Considerando a autonomia processual de que gozam os Estados‑Membros para preverem no direito nacional as condições processuais do pagamento dos juros vencidos sobre os montantes dos impostos cobrados em violação do direito da União, a exigência de apresentação de um pedido do sujeito passivo de pagamento de juros de mora por atraso de pagamento pela Administração de um crédito resultante da violação do direito da União pelo Estado não é contrário ao princípio da efetividade.»

37      No caso em apreço, resulta da decisão de reenvio que a Lear Corporation, por um lado, apresentou um pedido de pagamento de juros de mora em 23 de dezembro de 2014, e, por outro, que este pedido dizia respeito a um período de tempo específico, isto é, entre 1 de janeiro de 2008 e 31 de julho de 2011. Consequentemente, dado que a hipótese prevista na resposta à primeira questão não se verifica in casu, isto é, que o próprio pedido de reembolso do montante principal abrange, de acordo com o direito nacional, um pedido de juros de mora, a Administração Tributária do Estado‑Membro em causa pode, à luz do direito da União, cingir‑se ao objeto desse pedido, ou seja, no presente caso, aos juros relativos ao período de tempo delimitado pelo próprio sujeito passivo.

38      No entanto, conforme é clarificado na decisão de reenvio, só depois de ter tomado conhecimento do Acórdão de Uniformização n.° 18/2017 da Kúria (Supremo Tribunal) é que a Lear Corporation pediu, no contexto do processo que a opõe à Administração Tributária húngara, que este último acórdão fosse tido em conta para efeitos da totalidade do período fixado por aquele tribunal nesse acórdão no que se refere ao direito ao pagamento de juros de mora.

39      A este respeito, note‑se que uma prática como a da Administração Tributária do Estado‑Membro em causa, que consiste em qualificar esse pedido de pedido novo, o que implica que uma parte dos juros de mora não seja reembolsada devido à prescrição do pedido, é contrária aos princípios explicitamente consagrados tanto no Acórdão de 12 de fevereiro de 2008, Kempter (C‑2/06, EU:C:2008:78), como no Acórdão de 23 de abril de 2020, Sole‑Mizo e Dalmandi Mezőgazdasági (C‑13/18 e C‑126/18, EU:C:2020:292).

40      Com efeito, por um lado, no caso em apreço, a Lear Corporation apresentou, dentro do prazo de prescrição, um primeiro pedido de pagamento de juros de mora relativos ao montante do IVA que não era reembolsável devido ao requisito das «aquisições pagas», com base no Despacho de 17 de julho de 2014, Delphi Hungary Autóalkatrész Gyártó (C‑654/13, EU:C:2014:2127), devendo considerar‑se que o pedido subsequente apresentado pela Lear Corporation faz parte das consequências que os sujeitos passivos, no âmbito nacional, retiram deste despacho, o qual produz efeitos ex tunc.

41      Por outro lado, ao tornar impossível na prática o reembolso dos juros de mora relativos ao período a que se refere esse pedido subsequente, quando o sujeito passivo só ficou plenamente esclarecido quanto aos seus direitos com o acórdão do Supremo Tribunal do Estado‑Membro em causa, que é posterior ao pedido inicial de pagamento dos juros de mora, a Administração Tributária do Estado‑Membro em causa priva «o sujeito passivo de uma indemnização adequada pela perda resultante da indisponibilidade dos montantes em causa e, por conseguinte, não respeita o princípio da efetividade» (Acórdão de 23 de abril de 2020, Sole‑Mizo e Dalmandi Mezőgazdasági, C‑13/18 e C‑126/18, EU:C:2020:292, n.° 49).

42      Nestas condições, há que responder à segunda questão que os princípios da efetividade e da neutralidade fiscal devem ser interpretados no sentido de que não se opõem a uma prática de um Estado‑Membro que consiste em isentar a Administração Tributária desse Estado da obrigação de conceder, na fase de um pedido de pagamento de juros de mora, apresentado dentro do prazo de prescrição, relativo a montantes de IVA retidos pelo referido Estado em violação do direito da União, juros não abrangidos por este pedido, opondo‑se, em contrapartida, a que esta Administração qualifique de pedido novo, com a consequente prescrição do mesmo, um segundo pedido de pagamento de juros de mora que indique um período que não foi objeto desse primeiro pedido, nos casos em que o segundo pedido diga respeito a juros de mora relativos a montantes de IVA retidos devido à mesma violação do direito da União que serviu de fundamento ao primeiro pedido e em que o sujeito passivo só tomou conhecimento da possibilidade de alargar o respetivo âmbito temporal após a prolação de uma decisão judicial nacional que foi tomada na sequência de uma decisão do Tribunal de Justiça proferida no exercício da competência que lhe é conferida pelo artigo 267.° TFUE.

 Quanto à terceira questão

43      Com a sua terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se os princípios da equivalência, da efetividade e da neutralidade fiscal devem ser interpretados no sentido de que permitem que se considere que um segundo pedido de pagamento de juros de mora, apresentado devido a um desenvolvimento na jurisprudência, constitui um complemento de um primeiro pedido de pagamento desses juros, ou uma alteração deste, tendo em conta que a única diferença entre os dois pedidos diz respeito ao período a título do qual são pedidos juros de mora.

44      Atendendo à resposta dada à segunda questão no n.° 42 do presente despacho, de acordo com a qual aqueles princípios se opõem, nesse caso, a que a Administração Tributária do Estado‑Membro em causa qualifique de pedido novo o segundo pedido de pagamento de juros de mora, resulta logicamente dessa resposta que os referidos princípios implicam, pelo contrário, que este último pedido seja qualificado, segundo as modalidades que cabe a esse Estado determinar ao abrigo do seu direito nacional, de complemento do primeiro pedido de pagamento desses juros.

45      Nestas condições, há que responder à terceira questão que os princípios da efetividade e da neutralidade fiscal devem ser interpretados no sentido de que implicam que se considere, consoante as modalidades que cabe a cada Estado‑Membro determinar ao abrigo do seu direito nacional, que um segundo pedido de pagamento de juros de mora que indique um período que não foi objeto de um primeiro pedido de pagamento desses juros constitui um complemento desse primeiro pedido, quando este segundo pedido diga respeito a juros de mora relativos a montantes de IVA retidos devido à mesma violação do direito da União que serviu de fundamento ao primeiro pedido e quando o sujeito passivo só tenha tomado conhecimento da possibilidade de alargar o respetivo âmbito temporal após a prolação de uma decisão judicial nacional que foi tomada na sequência de uma decisão do Tribunal de Justiça proferida no exercício da competência que lhe é conferida pelo artigo 267.° TFUE.

 Quanto à quarta questão

46      A quarta questão submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio assenta na premissa de que o segundo pedido de pagamento de juros de mora prescreveu em circunstâncias como as do litígio no processo principal. No entanto, resulta da resposta à segunda questão, que figura no n.° 42 do presente despacho, que os princípios da equivalência, da efetividade e da neutralidade fiscal se opõem a que este pedido possa ser qualificado de pedido novo e, consequentemente, à sua prescrição. Pelo contrário, decorre da resposta dada à terceira questão no n.° 45 do presente despacho que o referido pedido deve ser considerado, segundo as modalidades que cabe a cada Estado‑Membro determinar ao abrigo do seu direito nacional, um complemento do primeiro pedido de pagamento de juros de mora.

47      Por conseguinte, não há que responder à quarta questão.

 Quanto às despesas

48      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Sétima Secção) declara:

1)      O artigo 183.° da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado,

deve ser interpretado, à luz dos princípios da equivalência, da efetividade e da neutralidade fiscal, no sentido de que:

quando o sujeito passivo pede o reembolso do imposto sobre o valor acrescentado (IVA) que anteriormente não podia ser recuperado devido à aplicação de um requisito previsto na lei que o Tribunal de Justiça declarou violar este artigo, este artigo não se opõe a que, desde que preenchidos os requisitos previstos no direito do EstadoMembro em causa, se possa considerar que este pedido de reembolso também abrange um pedido de pagamento de juros de mora, tendo em conta a finalidade do pagamento de juros sobre os excedentes de IVA retidos por um EstadoMembro em violação das normas do direito da União, que se destina a compensar as perdas financeiras, sofridas pelo sujeito passivo, decorrentes da indisponibilidade dos montantes em causa.

2)      Os princípios da efetividade e da neutralidade fiscal

devem ser interpretados no sentido de que:

não se opõem a uma prática de um EstadoMembro que consiste em isentar a Administração Tributária desse Estado da obrigação de conceder, na fase de um pedido de pagamento de juros de mora, apresentado dentro do prazo de prescrição, relativo a montantes de IVA retidos pelo referido Estado em violação do direito da União, juros não abrangidos por este pedido, opondose, em contrapartida, a que esta Administração qualifique de pedido novo, com a consequente prescrição do mesmo, um segundo pedido de pagamento de juros de mora que indique um período que não foi objeto desse primeiro pedido, nos casos em que o segundo pedido diga respeito a juros de mora relativos a montantes de IVA retidos devido à mesma violação do direito da União que serviu de fundamento ao primeiro pedido e em que o sujeito passivo só tomou conhecimento da possibilidade de alargar o respetivo âmbito temporal após a prolação de uma decisão judicial nacional que foi tomada na sequência de uma decisão do Tribunal de Justiça proferida no exercício da competência que lhe é conferida pelo artigo 267.° TFUE.

3)      Os princípios da efetividade e da neutralidade fiscal

devem ser interpretados no sentido de que:

implicam que se considere, consoante as modalidades que cabe a cada EstadoMembro determinar ao abrigo do seu direito nacional, que um segundo pedido de pagamento de juros de mora que indique um período que não foi objeto de um primeiro pedido de pagamento desses juros constitui um complemento desse primeiro pedido, quando este segundo pedido diga respeito a juros de mora relativos a montantes de IVA retidos devido à mesma violação do direito da União que serviu de fundamento ao primeiro pedido e quando o sujeito passivo só tenha tomado conhecimento da possibilidade de alargar o respetivo âmbito temporal após a prolação de uma decisão judicial nacional que foi tomada na sequência de uma decisão do Tribunal de Justiça proferida no exercício da competência que lhe é conferida pelo artigo 267.° TFUE.

Assinaturas


*      Língua do processo: húngaro.