ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Primeira Secção
Alargada)
9 de Dezembro de 1997(1)
[234s«Acção de indemnização Responsabilidade extracontratual Leite
Imposição suplementar Quantidade de referência Regulamento (CEE)
n.° 2055/93 Indemnização dos produtores Prescrição»[s
Nos processos apensos T-195/94 e T-202/94,
Friedhelm Quiller, residentes em Lienen (Alemanha),
Johann Heusmann, residente em Loxstedt (Alemanha),representado por Bernd Meisterernst, Mechtild Düsing, Dietrich Manstetten, Frank
Schulze e Winfried Haneklaus, advogados em Münster, com domicílio escolhido no
Luxemburgo no escritório dos advogados Lambert Dupong e Guy Konsbrück, 14 A,
rue des Bains,
demandantes,
contra
Conselho da União Europeia, representado por Arthur Brautigam, consultor
jurídico, na qualidade de agente, assistido por Hans-Jürgen Rabe e Georg M.
Berrisch, advogados em Hamburgo e Bruxelas, com domicílio escolhido no
Luxemburgo no gabinete de Alessandro Morbilli, director-geral da Direcção dos
Assuntos Jurídicos do Banco Europeu de Investimento, 100, boulevard Konrad
Adenauer,
e
Comissão das Comunidades Europeias, representada por Dierk Booß, consultor
jurídico, na qualidade de agente, assistido por Hans-Jürgen Rabe e Georg M.
Berrisch, advogados em Hamburgo e Bruxelas, com domicílio escolhido no
Luxemburgo no gabinete de Carlos Gómez de la Cruz, membro do Serviço
Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,
demandados,
que tem por objecto um pedido de indemnização, baseado nos artigos 178.° e 215.°,
segundo parágrafo, do Tratado CE, dos prejuízos sofridos pelos demandantes pelo
facto de terem sido impedidos de comercializar leite em aplicação do Regulamento
(CEE) n.° 857/84 do Conselho, de 31 de Março de 1984, que estabelece as regras
gerais para a aplicação da imposição suplementar referida no artigo 5.°-C do
Regulamento (CEE) n.° 804/68 no sector do leite e produtos lácteos (JO L 90,
p. 13; EE 03 F30 p. 64), tal como completado pelo Regulamento (CEE)
n.° 1371/84 da Comissão, de 16 de Maio de 1984 (JO L 132, p. 11;
EE 03 F30 p. 208), depois alterado pelo Regulamento (CEE) n.° 764/89 do
Conselho, de 20 de Março de 1989 (JO L 84, p. 2),
O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Primeira Secção Alargada),
composto por: A. Saggio, presidente, C. P. Briët, A. Kalogeropoulos, V. Tiili e
R. M. Moura Ramos, juízes,
secretário: A. Mair, administrador,
vistos os autos e após a audiência de 13 de Março de 1997,
profere o presente
Acórdão
Enquadramento jurídico
- Em 1977, a fim de reduzir os excedentes da produção de leite na Comunidade, o
Conselho adoptou o Regulamento (CEE) n.° 1078/77, de 17 de Maio de 1977, que
institui um regime de prémios de não comercialização do leite e dos produtos
lácteos e de reconversão dos efectivos bovinos de orientação leiteira (JO L 131,
p. 1; EE 03 F12 p. 143). Este regulamento oferecia aos produtores um prémio em
contrapartida da subscrição de um compromisso de não comercialização de leite
ou de reconversão dos efectivos bovinos durante um período de cinco anos.
- Em 1984, para fazer face a uma situação persistente de excesso de produção, o
Conselho adoptou o Regulamento (CEE) n.° 856/84, de 31 de Março de 1984 (JO
L 90, p. 10; EE 03 F30 p. 61), que altera o Regulamento (CEE) n.° 804/68 do
Conselho, de 27 de Junho de 1968, que estabelece a organização comum de
mercado no sector do leite e dos produtos lácteos (JO L 148, p. 13;
EE 03 F2 p. 146 a seguir «Regulamento n.° 804/68»). O novo artigo 5.°-C deste
último texto legislativo institui uma «imposição suplementar» sobre as quantidades
de leite entregues pelos produtores que ultrapassem uma «quantidade de
referência».
- O Regulamento (CEE) n.° 857/84 do Conselho, de 31 de Março de 1984, que
estabelece as regras gerais para a aplicação da imposição suplementar referida no
artigo 5.°-C do Regulamento n.° 804/68 no sector do leite e produtos lácteos (JO
L 90, p. 13; EE 03 F30 p. 64, a seguir «Regulamento n.° 857/84»), fixou a
quantidade de referência para cada produtor, com base na produção
comercializada no decurso de um ano de referência.
- Por acórdãos de 28 de Abril de 1988, Mulder (120/86, Colect., p. 2321, a seguir
«acórdão Mulder I»), e Von Deetzen (170/86, Colect., p. 2355), o Tribunal de
Justiça declarou inválido o Regulamento n.° 857/84, tal como completado pelo
Regulamento (CEE) n.° 1371/84 da Comissão de 16 de Maio de 1984, que fixa as
regras de aplicação da imposição suplementar referida no artigo 5.°-C do
Regulamento n.° 804/68 (JO L 132, p. 11; EE 03 F30 p. 208, a seguir
«Regulamento n.° 1371/84»), por violação do princípio da confiança legítima.
- Em execução destes acórdãos, o Conselho adoptou o Regulamento (CEE)
n.° 764/89, de 20 de Março de 1989, que altera o Regulamento n.° 857/84 que
estabelece as regras gerais para aplicação da imposição suplementar referida no
artigo 5.°-C do Regulamento (CEE) n.° 804/68 no sector do leite e dos produtos
lácteos (JO L 84, p. 2, a seguir «Regulamento n.° 764/89»). Em aplicação deste
regulamento modificativo, os produtores que tinham subscrito compromissos de não
comercialização ou de reconversão obtiveram uma quantidade de referência
designada «específica» (também chamada «quota»). Estes produtores são
designados «produtores SLOM I».
- A atribuição de uma quantidade de referência específica estava sujeita a várias
condições; além disso, a quantidade de referência era limitada a 60% da
quantidade de leite ou de equivalente de leite vendida pelo produtor nos doze
meses que precediam o mês da apresentação do pedido de prémio de não
comercialização ou de reconversão.
- Algumas dessas condições e a limitação da quantidade de referência específica a
60% foram declaradas inválidas pelo Tribunal de Justiça, por acórdãos de 11 de
Dezembro de 1990, Spagl (C-189/89, Colect., p. I-4539), e Pastätter (C-217/89,
Colect., p. I-4585).
- Na sequência destes acórdãos, o Conselho adoptou o Regulamento (CEE)
n.° 1639/91, de 13 de Junho de 1991, que altera o Regulamento n.° 857/84 (JO
L 150, p. 35, a seguir «Regulamento n.° 1639/91»), que atribuiu uma quantidade
de referência específica aos produtores em causa. Estes são designados
«produtores SLOM II».
- O artigo 3.°-A do Regulamento n.° 857/84, introduzido pelo Regulamento
n.° 764/89, enunciava além disso, no seu n.° 1, segundo travessão, uma regra dita
«anticumulação». Por virtude desta, os cessionários de um prémio de não
comercialização apenas podiam beneficiar de uma quantidade de referência
específica se não tivessem recebido precedentemente, em relação a um outro
terreno não sujeito a um compromisso de não comercialização ou de reconversão,
uma quantidade de referência em aplicação do artigo 2.° do Regulamento
n.° 857/84. Os produtores privados de uma quantidade de referência em virtude de
tal quantidade lhes ter sido já atribuída em relação a um outro terreno são
designados «produtores SLOM III».
- A regra anticumulação do artigo 3.°-A, n.° 1, segundo travessão, do Regulamento
n.° 857/84 foi igualmente declarada inválida pelo acórdão do Tribunal de Justiça
de 3 de Dezembro de 1992, Wehrs (C-264/90, Colect., p. I-6285), por violação do
princípio da protecção da confiança legítima.
- Em execução deste acórdão, o Conselho adoptou o Regulamento (CEE)
n.° 2055/93, de 19 de Junho de 1993, que atribui uma quantidade de referência
específica suplementar a determinados produtores de leite ou de produtos lácteos
(JO L 187, p. 8, a seguir «Regulamento n.° 2055/93»). Este regulamento atribuiu
uma quantidade de referência específica aos produtores que, cessionários do
prémio de não comercialização, tivessem sido excluídos do benefício previsto no
artigo 3.°-A do Regulamento n.° 857/84 pelo facto de terem recebido uma
quantidade de referência por força dos artigos 2.° ou 6.° deste último regulamento.
- Um dos produtores que esteve na origem do recurso que conduziu à declaração
de invalidade, pelo acórdão Mulder I, do Regulamento n.° 857/84 tinha entretanto,
juntamente com outros produtores, intentado contra o Conselho e a Comissão uma
acção de indemnização dos prejuízos sofridos pela não atribuição de uma
quantidade de referência no âmbito de aplicação deste regulamento.
- Por acórdão de 19 de Maio de 1992, Mulder e o./Conselho e Comissão (C-104/89
e C-37/90, Colect., p. I-3061, a seguir «acórdão Mulder II» ou «processo
Mulder II»), o Tribunal de Justiça declarou a Comunidade responsável por esses
prejuízos, convidando as partes a chegarem a acordo quanto ao montante das
indemnizações, sem prejuízo de uma decisão posterior do Tribunal de Justiça.
- Resulta desse acórdão que todo o produtor impedido de comercializar leite apenas
devido ao seu compromisso de não comercialização ou de reconversão tem, em
princípio, direito a obter uma indemnização pelos seus prejuízos. No entanto, neste
acórdão, o Tribunal de Justiça afastou a responsabilidade da Comunidade derivada
da limitação da quantidade de referência específica a 60% da quantidade de leite
vendida pelo produtor nos doze meses anteriores ao pedido de prémio, que tinha
sido declarada inválida nos acórdãos Spagl e Pastätter, já referidos. O Tribunal de
Justiça decidiu que essa limitação não constituía uma violação suficientemente
caracterizada de uma regra superior de direito, na acepção da jurisprudência,
susceptível de servir de base à responsabilidade da Comunidade em relação aos
produtores.
- Confrontados com o grande número de produtores afectados e face à dificuldade
de negociar soluções individuais, o Conselho e a Comissão publicaram, em 5 de
Agosto de 1992, a Comunicação 92/C 198/04 (JO C 198, p. 4, a seguir
«Comunicação de 5 de Agosto»). Após terem aí recordado as implicações do
acórdão Mulder II, e com o objectivo de lhe darem pleno efeito, as instituições
exprimiram a sua intenção de adoptar as modalidades práticas de indemnização
dos produtores afectados. Até à adopção dessas modalidades, as instituições
comprometeram-se a renunciar, em relação a todos os produtores com direito a
indemnização, a invocar a prescrição resultante do artigo 43.° do Estatuto (CEE)
do Tribunal de Justiça (a seguir «Estatuto»). Todavia, o compromisso estava
sujeito à condição de o direito à indemnização não ter ainda prescrito à data da
publicação da comunicação ou à data em que o produtor se tinha dirigido a uma
das instituições.
- Na sequência da Comunicação de 5 de Agosto, o Conselho adoptou o
Regulamento (CEE) n.° 2187/93, de 22 de Julho de 1993, que prevê uma
indemnização a favor de determinados produtores de leite ou de produtos lácteos
que foram temporariamente impedidos de exercer a sua actividade (JO L 196, p. 6,
a seguir «Regulamento n.° 2187/93»).
Factos que deram origem ao litígio
- F. Quiller e J. Heusmann, produtores de leite na Alemanha, receberam em 2 de
Abril de 1984, em conformidade com o disposto no artigo 2.° do Regulamento
n.° 857/84, quantidades de referência originais, isto é, quantidades de leite isentas
da imposição referida no artigo 5.°-C do Regulamento n.° 804/68, relativas às
explorações agrícolas de que são proprietários respectivamente em Lienen e em
Loxstedt (Alemanha). Essas quantidades ascendiam respectivamente a 142 000 e
a 536 700 kg.
- Em 1978, F. Quiller tinha tomado de arrendamento uma outra exploração que
pertencia a Friedrich Beckmann. Este tinha, no quadro do Regulamento
n.° 1078/77, subscrito um compromisso de não comercialização para o período de
1 de Junho de 1978 a 31 de Maio de 1983 e tinha recebido o prémio
correspondente a esse compromisso, com base numa quantidade de 32 642 kg de
leite. Por declaração de 26 de Outubro de 1978, feita em conformidade com o
disposto no artigo 6.° do Regulamento n.° 1078/77, o recorrente, na sua qualidade
de arrendatário da exploração de F. Beckmann (a seguir «exploração Beckmann»)
comprometeu-se a prosseguir a execução das obrigações subscritas por este.
- Em 1988, a esposa de F. Quiller herdou a exploração Beckmann. Desde então,
F. Quiller gere esta com base num «direito de exploração».
- F. Quiller não obteve, em 1984, uma quantidade de referência em relação àexploração Beckmann, na medida em que as obrigações que ele tinha assumido
cobriam o ano de referência considerado em aplicação do Regulamento n.° 857/84.
Foi portanto impedido de retomar a comercialização do leite produzido nessa
exploração.
- A esposa de J. Heusmann é proprietária de uma exploração leiteira situada em
Bramel (Alemanha) (a seguir «exploração de Bramel») que, em 1980, era
explorada pelo seu pai, o Sr. Kriegs. Este, no decurso desse ano, no quadro do
Regulamento n.° 1078/77, subscreveu um compromisso de não comercialização que
expirava em 9 de Outubro de 1985. Em contrapartida do seu compromisso, foi-lhe
atribuído em 8 de Julho de 1980 um prémio de não comercialização, com base
numa quantidade de referência de 263 104 kg de leite.
- Em 1 de Agosto de 1980, J. Heusmann retomou os terrenos explorados pelo Sr.
Kriegs e ficou sub-rogado no compromisso de não comercialização deste.
- No termo desse compromisso, em 9 de Outubro de 1985, não obteve uma
quantidade de referência em relação à exploração de Bramel, na medida em que
o compromisso cobria o ano de referência considerado em aplicação do
Regulamento n.° 857/84. Foi por isso impedido de retomar a comercialização do
leite produzido nessa exploração.
- Na sequência do acórdão Wehrs, já referido, os demandantes receberam
quantidades de referência específicas das autoridades alemãs. F. Quiller recebeu,
em 2 de Dezembro de 1993, uma quantidade de 27 746 kg de leite. J. Heusmann
recebeu, em 1 de Fevereiro de 1993, uma quantidade de 223 638 kg.
Tramitação do processo
- Por carta dirigida à Comissão em 12 de Janeiro de 1994, F. Quiller pediu para ser
indemnizado pelos prejuízos sofridos pelo facto de não ter podido entregar leite
durante o período compreendido entre 1 de Abril de 1984 e 29 de Julho de 1993,
data da publicação do Regulamento n.° 2055/93. Em 29 de Março de 1994, a
Comissão respondeu que não podia propor-lhe uma indemnização.
- Em 24 de Maio de 1994, propôs a primeira das presentes acções, registada sob a
referência T-195/94.
- Por cartas dirigidas à Comissão e ao Conselho, em 11 de Abril de 1991,
J. Heusmann e a esposa pediram para ser indemnizados pelos prejuízos sofridos
pelo facto de terem sido impedidos de entregar leite durante o período
compreendido entre 9 de Outubro de 1985 e o mês de Abril de 1991, em virtude
de uma recusa de atribuição de uma quantidade de referência em relação à
exploração de Bramel. Por cartas de 2 e 15 de Maio de 1991, recebidas em 7 e 17
de Maio, as instituições responderam que as condições da responsabilidade da
Comunidade não estavam reunidas.
- Por carta dirigida à Comissão em 13 de Janeiro de 1994, J. Heusmann pediu a esta
instituição que esclarecesse se renunciava à invocação da prescrição até à
publicação do acórdão definitivo do Tribunal de Justiça a proferir quanto ao
montante das indemnizações. Em 29 de Março de 1994, a Comissão respondeu que
não podia propor-lhe uma indemnização.
- Em 1 de Junho de 1994, propôs a segunda das presentes acções, registada sobre
a referência T-202/94.
- Por despacho de 31 de Agosto de 1994, o Tribunal de Primeira Instância apensou
os processos T-195/94 e T-202/94 para efeitos da fase escrita, da audiência e do
acórdão.
- A fase escrita terminou em ambos os processos em 10 de Maio de 1995 com a
apresentação da tréplica.
- Por carta de 22 de Janeiro de 1996, J. Heusmann informou o Tribunal de Primeira
Instância que, por acto notarial de 6 de Junho de 1995, ele próprio e a sua esposa
tinham cedido a sua exploração agrícola ao seu filho, Jan Heusmann, com efeitos
a partir de 1 de Junho de 1995. Em cumprimento desse contrato, a propriedade
de uma parte dos terrenos compreendendo a exploração de Bramel foi transmitida
a Jan Heusmann, enquanto que, em relação à outra parte, foi-lhe conferido um
direito de exploração com duração de 10 anos. Por meio do contrato, J. Heusmann
e esposa cederam igualmente ao seu filho os seus direitos contra a Comunidade.
- Em consequência, o demandante pediu que as conclusões da sua petição sejam
alteradas no sentido de que o pagamento da indemnização pedida deve ser
efectuado a favor de Jan Heusmann.
- Por carta de 29 de Fevereiro de 1996, os demandados declararam não se opor à
alteração pedida pelo demandante.
Pedidos das partes
- No processo T-195/94, o demandante conclui pedindo que o Tribunal se digne:
- condenar solidariamente os demandados a pagar-lhe uma indemnização de
61 573,60 DM, acrescidos de juros à taxa de 8% a contar de 19 de Maio de
1992, pelos prejuízos sofridos entre 2 de Abril de 1984 e 29 de Julho de
1993;
- condenar solidariamente os demandados nas despesas.
- Na sua réplica, conclui igualmente pedindo o pagamento, pelos demandados, das
despesas de uma peritagem efectuada em 6 de Março de 1995 e junta aos autos.
- No processo T-202/94, o demandante conclui pedindo que o Tribunal se digne:
- condenar solidariamente os demandados a pagar-lhe uma indemnização de
600 924 DM, acrescidos de juros à taxa de 8% a contar de 19 de Maio de
1992, pelos prejuízos sofridos entre 9 de Outubro de 1985 e 1 de Fevereiro
de 1993;
- condenar solidariamente os demandados nas despesas.
- Na sua réplica, o demandante conclui igualmente pedindo o pagamento, pelos
demandados, das despesas de uma peritagem efectuada em Fevereiro de 1995 e
junta à réplica.
- Na sua carta de 22 de Janeiro de 1996, altera, além disso, as suas conclusões no
sentido de que o pagamento da indemnização pedida deve ser efectuado a favor
de Jan Heusmann.
- Os demandados concluem pedindo que o Tribunal se digne:
- julgar as acções inadmissíveis ou, subsidiariamente, improcedentes,
- condenar os demandantes nas despesas.
Quanto à admissibilidade da acção no processo T-195/94
Argumentação das partes
- Os demandados alegam que, na medida em que se limita a remeter para o
Regulamento n.° 2187/93 e não contém fundamentos concludentes, a petição é
inadmissível por violação do artigo 44.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento de
Processo. A petição não contem, nomeadamente, um cálculo do lucro cessante
estabelecido segundo os princípios do acórdão Mulder II.
- O demandante contesta que a petição seja inadmissível por violação do artigo 44.°
do Regulamento de Processo. Afirma que, ao contrário, a petição expunha de
forma circunstanciada o prejuízo sofrido. Além disso, junta um relatório de perito,
cartas e um atestado da Câmara Agrícola de Vestefália-Lippe com vista a provar
a veracidade das suas afirmações respeitantes à exploração Beckmann.
Apreciação do Tribunal
- Em conformidade com o disposto no artigo 44.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento
de Processo, a petição deve conter a indicação do objecto do litígio e a exposição
sumária dos fundamentos invocados.
- No caso em apreço, essas exigências foram respeitadas. Os fundamentos invocados
resultam claramente da petição e as instituições demandadas puderam, aliás,
contestá-los de forma efectiva. No que toca mais particularmente ao facto de o
cálculo do prejuízo alegado se fundar exclusivamente no Regulamento n.° 2187/93,
que não seria aplicável no caso em apreço, há que declarar que a petição continha
indicações sobre o carácter e a extensão do prejuízo alegado e sobre a sua relação
com um acto comunitário (acórdão do Tribunal de Justiça de 2 de Dezembro de
1971, Zuckerfabrik Schöppenstedt/Conselho, 5/71, Colect., pp. 375, 378, e do
Tribunal de Primeira Instância de 18 de Setembro de 1996, Asia Motor France e
o./Comissão, T-387/94, Colect., p. II-961, n.° 107) e que essas indicações foram
justificadamente completadas na réplica.
- A excepção de inadmissibilidade deve portanto ser rejeitada e a acção julgada
admissível.
Quanto à existência e à extensão de um direito à reparação baseado no artigo 215.°
do Tratado CE
- Em apoio dos seus pedidos, os demandantes sustentam que as condições da
responsabilidade extracontratual da Comunidade estão reunidas. No processo
T-195/94, essa responsabilidade cobre os danos sofridos durante o período que vai
de 2 de Abril de 1984, data da entrada em vigor do Regulamento n.° 857/84, a 29
de Julho de 1993, data da publicação do Regulamento n.° 2055/93. No processo
T-202/94, cobre os danos sofridos durante o período que vai de 9 de Outubro de
1985, data do termo do compromisso de não comercialização da sua exploração de
Bramel, a 1 de Fevereiro de 1993, data em que o demandante recebeu uma
quantidade de referência em relação a esta exploração. Os demandantes alegam
além disso que o seu direito a uma indemnização não está atingido pela prescrição.
- Os demandados contestam a existência de responsabilidade da Comunidade face
aos demandantes. Sustentam que, de qualquer forma, o direito a uma
indemnização está prescrito.
Quanto à existência da responsabilidade da Comunidade
- Só há lugar à responsabilidade extracontratual da Comunidade decorrente de danos
causados pelas instituições, prevista no artigo 215.°, segundo parágrafo, do Tratado
CE, se estiver reunido um conjunto de condições, relativamente à ilegalidade do
comportamento censurado, à realidade do dano e à existência de um nexo de
causalidade entre o comportamento ilegal e o prejuízo invocado (acórdãos do
Tribunal de Justiça de 17 de Dezembro de 1981, Ludwigshafener Walzmühle e
o./Conselho e Comissão, 197/80, 198/80, 199/80, 200/80, 243/80, 245/80 e 247/80,
Recueil, p. 3211, n.° 18, e do Tribunal de Primeira Instância de 13 de Dezembro
de 1995, Exporteurs in Levende Varkens e o./Comissão, T-481/93 e T-484/93,
Colect., p. II-2941, n.° 80).
- Em matéria de responsabilidade decorrente de actos de natureza normativa, o
comportamento censurado à Comunidade deve, segundo jurisprudência constante
(acórdãos do Tribunal de Justiça Zuckerfabrik Schöppenstedt e o./Conselho, já
referido, n.° 11, de 25 de Maio de 1978, Bayerische HNL e o./Conselho e
Comissão, 83/76 e 94/76, 4/77, 15/77 e 40/77, Recueil, p. 1209, n.° 4, Colect. 1978,
p. 421; acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 15 de Abril de 1997, Schröder
e o./Comissão, T-390/94, Colect., p. II-501, n.° 52), constituir uma violação de uma
regra superior de direito que proteja os particulares. Se a instituição adoptou o
acto no exercício dum amplo poder de apreciação, como é o caso em matéria de
política agrícola comum, essa violação deve, além disso, ser suficientemente
caracterizada, isto é, manifesta e grave (acórdãos do Tribunal de Justiça Bayerische
HNL e o./Conselho e Comissão, já referido, n.° 6, de 8 de Dezembro de 1987,
Grands moulins de Paris/CEE, 50/86, Colect., p. 4833, n.° 8, e Mulder II, n.° 12;
acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 14 de Setembro de 1995 Antillean
Rice Mills e o./Comissão, T-480/93 e 483/93, Colect., p. II-2305, n.° 194).
- Importa verificar se, no caso vertente, essas condições estão reunidas.
1. Quanto à violação de uma regra superior de direito
Argumentação das partes
- Os demandantes sustentam que o Tribunal de Justiça decidiu no acórdão Wehrs,
já citado (n.os 13 a 15), no sentido de que a confiança legítima dos produtores
SLOM III tinha sido violada. O produtor que retoma um compromisso de não
comercialização e aquele que o subscreveu não poderiam ser tratados de forma
diferente. Se os demandantes tivessem podido prever que seriam impedidos de
produzir leite, não teriam assumido os compromissos de não comercialização
subscritos respectivamente por Beckmann e Kriegs. O preço reduzido pelo qual
teriam assumido as explorações em litígio teria em conta apenas o período coberto
pelo compromisso de não comercialização ou de reconversão.
- Os demandados afirmam que os demandantes assumiram livremente explorações
que estavam sujeitas a compromissos de não comercialização. Não podem portanto
alegar, apesar do acórdão Wehrs, que a recusa de atribuição de uma quantidade
de referência em relação às referidas explorações tenha violado a sua confiança
legítima. É jurisprudência constante que os operadores económicos que, na
sequência de um incentivo da Comunidade, interromperam a sua produção durante
um dado período, não podem, no termo desse período, estar sujeitos a restrições
que os afectem de maneira específica em virtude do facto de terem aproveitado as
possibilidades oferecidas pela regulamentação comunitária. Ora, diferentemente dos
primeiros produtores que subscreveram um compromisso de não comercialização,
os produtores SLOM III não foram incentivados por um acto comunitário a
subscrever tal obrigação. De qualquer forma, o preço reduzido pelo qual esses
produtores assumiram as suas explorações será o reflexo do risco económico ligadoà recusa eventual de atribuição de uma quantidade de referência.
Apreciação do Tribunal
- O Tribunal de Justiça declarou, nos n.os 13 e 14 do acórdão Wehrs, já referido, que
os produtores SLOM III podiam legitimamente esperar não ficar sujeitos a um
regime como o resultante da regra anticumulação do Regulamento n.° 857/84. No
n.° 15 do acórdão, declarou essa norma inválida por violação da confiança legítima.
Antes, no acórdão Mulder II (n.° 15) tinha recordado que esse princípio constitui
uma norma superior de direito que protege os particulares.
- Tendo a disposição anticumulação sido aplicada aos demandantes, o que, aliás, não
é de forma alguma contestado, o argumento dos demandados visa, na realidade,
reabrir uma questão já decidida pelo acórdão Wehrs. Deve portanto ser rejeitado.
- No tocante, em particular, ao argumento que os demandados tiram do facto de os
produtores SLOM III não terem sido incentivados por um acto comunitário a
subscrever o compromisso de não comercialização, deve sublinhar-se, tal como o
Tribunal de Justiça o fez no acórdão Wehrs, n.os 13 a 15), que a confiança legítima
dos produtores em questão é violada se estiverem sujeitos, no fim de um
compromisso de não comercialização que eles retomaram, a restrições que os
afectam de forma específica em razão desse mesmo compromisso.
- Deve igualmente afastar-se o argumento tirado pelos demandados do preço
pretensamente reduzido pelo qual as explorações oneradas por compromissos
SLOM foram retomadas. Como afirmam os demandantes, em condições normais
de mercado, essa redução de preço é apenas a consequência da tomada em conta
da redução de valor dos terrenos correspondente ao período coberto pelo
compromisso de não comercialização ou de reconversão.
- No caso em apreço, há portanto que declarar que foi violada uma norma superior
de direito.
Quanto à existência de uma violação suficientemente caracterizada do princípio de
protecção da confiança legítima
- Há violação suficientemente caracterizada de uma norma superior de direito
quando as instituições excedam de forma manifesta e grave os limites do seu poder
de apreciação sem demonstrar um interesse público superior. Resulta de
jurisprudência constante que tal violação existe quando o legislador comunitário
omite tomar em consideração uma categoria claramente distinta de operadores
económicos, particularmente se a medida tomada é imprevisível e ultrapassa os
limites dos riscos económicos normais (acórdão Mulder II, n.os 16 e 17; v.
igualmente acórdão do Tribunal de Justiça de 4 de Outubro de 1979,
Ireks-Arkady/Conselho e Comissão, 238/78, Colect., p. 2955, n.° 11).
- Importa verificar se estes elementos estão presentes no caso vertente.
- Quanto à ausência de tomada em consideração de uma categoria claramente
distinta de operadores económicos
Argumentação das partes
- Os demandantes alegam que os produtores SLOM III estão exactamente na mesma
situação que os grupos SLOM I e SLOM II. Como estes últimos, foram excluídos
por regulamentos ilegais de qualquer reatribuição da quantidade sobre a qual tinha
incidido o seu compromisso de não comercialização. Além disso, constituem uma
categoria claramente definida, cujos nomes resultam dos actos das autoridades
competentes.
- Ao não atribuir aos produtores SLOM III uma quantidade de referência, o
legislador comunitário terá, sem invocar um interesse público superior, ignorado
completamente a situação de uma categoria claramente delimitada de operadores
económicos. No Regulamento n.° 764/89, não tomou qualquer decisão de política
económica, na acepção do n.° 21 do acórdão Mulder II, em relação aos produtores
SLOM III. Nesse regulamento, o Conselho não tomou de forma alguma em conta
os interesses desses produtores, os quais foram portanto tratados da mesma
maneira que os produtores SLOM I e SLOM II o tinham sido pelo Regulamento
n.° 857/84 na sua redacção inicial.
- O facto de não atribuir uma quantidade de referência aos produtores SLOM III
não é de forma alguma justificado. Contrariamente ao que afirmam os
demandados, o interesse geral de uma estabilidade do mercado leiteiro não é de
natureza a justificar esta opção, uma vez que as quantidades de leite necessárias
para os produtores interessados não põem em causa o equilíbrio do mercado. O
facto de os demandantes terem beneficiado de uma quantidade de referência
atribuída por força do artigo 2.° do Regulamento 857/84 em relação a uma
exploração não sujeita a um compromisso de não comercialização e, por
conseguinte, de não estarem completamente afastados da produção do leite não
tem qualquer importância. Quanto a esse aspecto não será necessário tomar em
conta apenas a exploração SLOM e aplicar-lhe os critérios do acórdão Mulder II.
O facto de os demandantes terem produzido leite numa outra exploração
demonstra que pretendiam retomar a produção de leite na exploração SLOM após
o termo do compromisso de não comercialização.
- Os demandados afirmam que, diferentemente dos produtores SLOM I, os
produtores SLOM III não constituem uma categoria distinta de operadores
económicos. Os produtores SLOM I foram identificados pelo facto de não terem
entregue leite devido a um compromisso anterior ao regulamento que lhes causou
prejuízo. Os produtores SLOM III são identificados pelo facto de terem retomado
uma exploração sujeita a um compromisso. Ora, essa retoma podia ser anterior ou
posterior ao Regulamento n.° 857/84. Assim, à data da adopção deste, os
demandantes não passaram a fazer parte de uma categoria distinta de operadores
económicos. Em resposta à alegação segundo a qual os produtores SLOM III terão
sido identificados através dos processos das autoridades que concedem os prémios
de não comercialização, os demandados afirmam que a existência desses registos
não modifica o facto de a retoma de obrigações de não comercialização ter podido,
de jure ou de facto, ter lugar após a entrada em vigor do Regulamento n.° 857/84
e de, nessa data, os produtores não constituirem um grupo delimitado.
- Os demandados alegam que as disposições do Regulamento n.° 764/89 não
omitiram tomar em consideração a situação dos produtores SLOM III. Com efeito,
na medida em que tinham recebido uma quantidade de referência a título do artigo
2.° do Regulamento n.° 857/84, esses produtores não tinham sido excluídos de uma
forma total e permanente do mercado e podiam prosseguir a sua produção apesar
do facto de não terem quantidade de referência em relação à exploração SLOM.
Não há portanto responsabilidade da Comunidade pela não atribuição aos
produtores SLOM III de uma quantidade de referência pelos Regulamentos
n.os 857/84 e 764/89. Contrariamente ao que afirmam os demandantes nas suas
réplicas, as condições da responsabilidade enunciadas no acórdão Mulder II (n.° 17)
só dizem respeito ao caso de uma exclusão total dos produtores em causa da
comercialização de leite. Aliás, a introdução da regra anticumulação não conduziu
à discriminação dos produtores SLOM III em relação aos produtores SLOM I e
SLOM II mas, muito simplesmente, não terá melhorado a sua situação.
- Tendo em conta a situação frágil no mercado dos produtos lácteos e o facto de os
produtores SLOM III na situação dos demandantes terem podido continuar a
produzir na sua exploração não SLOM, os demandados, ao operar uma distinção
entre os dois grupos, tendo em conta o seu poder de apreciação, não tomaram uma
decisão manifestamente ilegal. As instituições tomaram em conta um interesse
público superior ao recusar conceder quantidades de referência aos produtores
SLOM III. Quando da adopção do Regulamento n.° 764/89 exerceram uma opção
de política económica que consistiu em não atribuir tais quantidades aos produtores
SLOM III a fim de não comprometer a estabilidade do mercado leiteiro. Essa
opção não excedeu os limites do poder de apreciação que tinham nessa matéria.
Os produtores em causa, tendo já recebido uma quantidade de referência original,
encontravam-se numa situação particular, o que justificou um outro tratamento.
Essas razões resultam claramente dos segundo, terceiro e quinto considerandos do
Regulamento n.° 764/89. O legislador procedeu à apreciação de interesses
contraditórios, reservando a atribuição da quantidade de referência àqueles de
entre os produtores que não a tivessem ainda recebido.
Apreciação do Tribunal
- Os produtores SLOM III eram produtores que não tinham subscrito directamente
o regime previsto pelo Regulamento n.° 1078/77, mas tinham retomado uma
exploração cujo antigo explorador tinha subscrito esse regime. Mesmo que, à luz
do Regulamento n.° 857/84, o seu regime fosse comum a todos os outros
produtores SLOM, a sua situação tinha esta particularidade, que os distinguia.
Devido a esta característica, eles eram produtores SLOM que, na sequência do
Regulamento n.° 764/89, permaneciam privados de qualquer quantidade de
referência específica. Foi só a partir da entrada em vigor desse texto que o
fundamento do regime que lhes era aplicado se tornou diferente, mas a sua
situação enquanto produtores era distinta desde o momento em que tinham
retomado as explorações oneradas com compromissos subscritos no quadro do
Regulamento n.° 1078/77.
- O argumento dos demandados segundo o qual a identificação formal da categoria
deve ser anterior à regulamentação declarada ilegal é desprovido de fundamento.
Com efeito, se é certo que tal era a situação dos produtores SLOM I que tinham
subscrito um compromisso de não comercialização antes da adopção do
Regulamento n.° 857/84, que contemplava a sua situação, o facto de, após as
modificações sucessivas deste regulamento, uma única categoria residual ter sido
mantida, no sentido de que é a essa única categoria que o antigo regime comum
continua aplicável, não exclui que lhe seja reconhecido um carácter distinto.
- Além disso, tal como resulta dos acórdãos Mulder I e Mulder II, o conjunto dos
produtores SLOM I e SLOM II formava uma categoria distinta de produtores.
Sendo os produtores SLOM III caracterizados pelo facto de se terem mantido na
mesma situação que os outros grupos até 1993, constituem, tal como estes últimos,
uma categoria distinta à qual, em violação de uma norma superior de direito, não
foi concedida uma quantidade de referência (v. supra n.° 53).
- Em último lugar, deve rejeitar-se o argumento que os demandados retiram do facto
de não ter havido, no caso vertente, uma exclusão total, na medida em que os
produtores SLOM III podiam produzir na sua exploração original. Com efeito,
sendo o raciocínio correspondente baseado no facto de esses produtores não terem
sido impedidos totalmente de comercializar leite, as instituições deveriam então,
necessariamente, ter tomado em conta a relação existente entre as quantidades de
referência atinentes à exploração original e as atinentes à exploração SLOM.
Omitindo tomar em consideração essa relação na esfera de cada um desses
produtores, os demandados partilharam arbitrariamente de uma forma diferenciada
em relação a cada um dos produtores SLOM III os encargos decorrentes da
«necessidade imperiosa de não comprometer a frágil estabilidade de que se reveste
actualmente o mercado dos produtos lácteos» (quinto considerando do
Regulamento n.° 764/89). Nestas condições, o sacrifício económico pretensamente
necessário para atingir este interesse público foi partilhado de uma forma
objectivamente desigual. Assim, as instituições ultrapassaram o poder de apreciação
de que dispunham nessa matéria.
b) Quanto ao carácter imprevisível da medida tomada e à ultrapassagem dos
limites dos riscos económicos normais
Argumentação das partes
- Os demandantes alegam que os sacrifícios económicos que lhes foram impostos
pela privação de uma quantidade de referência ultrapassaram os limites
reconhecidos pela jurisprudência, nomeadamente pelo acórdão Mulder II. Afirmam
eles que, tendo em conta as quantidades de referência que receberam na sequência
do acórdão Wehrs, já referido (v. supra n.° 11), o prejuízo que sofreram entre os
anos de 1984 e 1993 foi considerável. As razões que conduziram o Tribunal de
Justiça, no acórdão Mulder II, a negar a obrigação de indemnização no caso das
quantidades de referência específicas limitadas a 60% pelo Regulamento n.° 764/89,
não se aplicam portanto no caso em apreço.
- O demandante no processo T-195/94 alega que a quantidade de referência
específica que lhe foi atribuída em 1993 a título do regime SLOM III representava
23,94% da quantidade de referência original (v. supra n.° 18). Sublinha que se a
indemnização pedida no quadro do presente processo for calculada segundo oacórdão Mulder II, essa percentagem eleva-se a 26,3%.
- No processo T-202/94, o demandante sustenta que a quantidade de referência
específica que deveria ter-lhe sido atribuída a título do regime SLOM III, calculada
segundo os critérios do acórdão Mulder II representava 31,4% da quantidade de
referência original (v. supra, n.° 21). Na sua réplica, afirma que a quantidade de
referência específica efectivamente atribuída representava 41,67%, mas que, se se
tomarem em conta as diminuições às quais esteve sujeita pelo efeito da
regulamentação aplicável, essa percentagem eleva-se a 45,55% ou 49% da
quantidade de referência original.
- Para os demandados, o facto de os demandantes terem sido impedidos de retomar
a produção não era imprevisível, em particular no processo T-195/94, em que o
demandante tinha adquirido o seu direito de exploração após a adopção do
Regulamento n.° 857/84. Por outro lado, a impossibilidade de retomar a produção
não terá ultrapassado os limites dos riscos económicos normais. A esse propósito,
a quantidade de referência de que os demandantes foram privados é inferior a
40% da soma das quantidades de referência original e específica em causa. Ora,
o Tribunal de Justiça admitiu no acórdão Mulder II que não há lugar a
responsabilidade da Comunidade em razão de um abatimento inferior a 40% da
quantidade de referência SLOM. Com efeito, a situação desses produtores
corresponde àquela em relação à qual o acórdão Mulder II excluiu a
responsabilidade da Comunidade no que toca à regra dos 60% estabelecida pelo
artigo 3.°-A, n.° 2, do Regulamento n.° 857/84, tal como alterado pelo Regulamento
n.° 764/89.
Apreciação do Tribunal
- Os demandantes, tal como todos os produtores SLOM III, foram, nas suas
explorações SLOM, totalmente impedidos de comercializar leite durante o período
compreendido entre o termo do compromisso subscrito no quadro do Regulamento
n.° 1078/77 e o momento em que, na sequência do acórdão Wehrs, já referido,
receberam uma quantidade de referência específica. Tendo a recusa de uma
quantidade de referência ocorrido em relação a eles respectivamente em Abril de
1984 e Outubro de 1985 e tendo-lhes sido finalmente atribuída essa quantidade
apenas em Dezembro e em Fevereiro de 1993, é certo que foi imposto aos
demandantes um sacrifício de importância considerável.
- Contrariamente ao que afirmam os demandados, esse sacrifício não era de forma
nenhuma previsível nem estava compreendido nos limites dos riscos normais
inerentes à actividade económica em questão.
- No que toca ao carácter imprevisível do dano, há que observar que os
demandantes, produtores SLOM III, estavam na mesma situação que os produtores
SLOM I, na medida em que, relativamente à exploração que constituía objecto do
compromisso de não comercialização, tinha havido exclusão total e permanente da
atribuição de uma quantidade de referência em virtude da aplicação do
Regulamento n.° 857/84 (acórdão Mulder II, n.° 17). Conforme decidiu o Tribunal
de Justiça, os produtores SLOM I e III foram vítimas de uma restrição que os
afectava de maneira específica em virtude desse compromisso (v. acórdãos
Mulder I, n.° 24 e Wehrs, n.° 13).)
- Idêntica constatação deve ser feita mesmo que o título jurídico por virtude do qual
os demandantes exerciam a sua actividade na exploração SLOM tenha mudado
após a entrada em vigor do Regulamento n.° 764/89. Uma vez que a sub-rogação
nos compromissos de não comercialização ocorreu antes dessa data, os produtores
puderam, com efeito, depositar uma confiança legítima na retoma da
comercialização no termo desses compromissos (v. acórdão Wehrs, n.° 13).
- No que toca à ultrapassagem dos riscos económicos normais, deve recordar-se que,
no acórdão Mulder II (n.° 17), o Tribunal de Justiça decidiu que havia
responsabilidade da Comunidade pelo facto de não ter sido prevista uma
quantidade de referência para os produtores SLOM I, o que tivera por
consequência impedi-los totalmente de produzir. Em contrapartida, o facto de se
ter previsto para os produtores SLOM II uma quantidade de referência reduzida
a 60% da que devia normalmente caber-lhes não foi julgada susceptível de implicar
responsabilidade.
- Tal como foi salientado anteriormente (v. supra n.° 76), a situação dos demandantes
é semelhante à dos produtores SLOM I, na medida em que foram totalmente
impedidos de produzir no terreno onerado com o compromisso que tinham
retomado.
- Além disso, contrariamente ao que afirmam os demandados, vários elementos
distinguem a situação dos demandantes da dos produtores SLOM II.
- O Tribunal observa, a esse propósito, que os danos em causa no acórdão Mulder II
estavam já inteiramente concretizados no momento em que o Tribunal de Justiça
se pronunciou sobre o direito a uma reparação. Com efeito, em todas as
explorações SLOM, a comercialização do leite tinha sido impossível durante um
período compreendido entre a aplicação do Regulamento n.° 857/84, na sua
redacção inicial, e a data da entrada em vigor do Regulamento n.° 764/89 (v. supra
n.° 5). Entre esta última data e a entrada em vigor do Regulamento n.° 1639/91, os
produtores SLOM I e II viram a comercialização dos seus produtos limitada a 60%
da quantidade de referência original (v. supra n.° 6). Receberam, finalmente, uma
quantidade de referência integral apenas por força do Regulamento n.° 1639/91 (v.
supra n.° 8).
- Daí resulta que, no acórdão Mulder II, o Tribunal de Justiça só afastou a
responsabilidade da Comunidade em relação a uma limitação (a 60%), circunscrita
no tempo (a cerca de dois anos), da quantidade de leite entregue ou vendida
durante os doze meses que precederam o compromisso de não comercialização ou
de reconversão. A situação de privação total ou parcial pôde, portanto, durar no
máximo sete anos, entre o fim dos primeiros compromissos assumidos no quadro
do Regulamento n.° 1078/77 ou a adopção do Regulamento n.° 857/84 e a entrada
em vigor do Regulamento n.° 1639/91. Os produtores SLOM I e SLOM II sofreram
assim uma exclusão total durante um período máximo de cinco anos, exclusão pela
qual a responsabilidade da Comunidade foi reconhecida.
- No caso em apreço, os demandantes, como todos os produtores SLOM III,
sofreram uma privação total de uma quantidade de referência que lhes cabia (v.
acórdão Wehrs). Essa privação surgiu entre a aplicação em relação a eles do
Regulamento n.° 857/84 e a atribuição de uma quantidade de referência que teve
lugar apenas na sequência do acórdão Wehrs, proferido em 3 de Dezembro de 1992.
- Nestas condições, a natureza e a duração da privação da quantidade de referência
imposta aos demandantes são elementos que diferenciam claramente a sua situação
da dos produtores em relação aos quais o acórdão Mulder II entendeu que não
havia responsabilidade da Comunidade.
- Essa privação ultrapassa os limites dos riscos normais inerentes à actividade
económica em causa e é de natureza a fundar a responsabilidade extracontratual
da Comunidade.
3. Quanto à existência do dano e do nexo de causalidade
- Os demandantes sustentam que, sendo produtores aos quais foi recusada uma
quantidade de referência, sofreram danos. Os demandados contestam a existência
de tais danos na medida em que, não sendo os demandantes produtores, não
podiam pretender a atribuição de uma quantidade de referência.
Argumentação das partes
- Segundo os demandantes, resulta de documentos da Câmara Agrícola de
Vestefália-Lippe de 19 de Julho de 1991 e da de Hanôver de 21 de Fevereiro de
1995 que sofreram danos, na medida em que continuaram a gerir as explorações
SLOM após ter retomado os compromissos de não comercialização a elas
atinentes. Só em virtude da incerteza jurídica que envolvia a situação é que o
demandante no processo T-202/94 apresentou com a sua esposa o pedido de uma
quantidade de referência.
- Contrariamente ao que alegam os demandados, é indiferente que a quantidade de
referência específica tenha sido pedida em relação à exploração que não tinha sido
onerada pelo compromisso de não comercialização. Segundo a jurisprudência do
Tribunal de Justiça, para que uma quantidade de referência seja reatribuída ou
definitivamente atribuída, basta que o requerente produza essa quantidade na sua
exploração e continue a gerir no seio desta, pelo menos parcialmente, a exploração
que foi onerada com o compromisso de não comercialização (acórdão de 3 de
Dezembro de 1992, O'Brien, C-86/90, Colect., p. I-6251). Aliás, segundo o artigo
9.°, alínea d), do Regulamento (CEE) n.° 3950/92 do Conselho, de 28 de Dezembro
de 1992, que institui uma imposição suplementar no sector do leite e dos produtos
lácteos (JO L 405, p. 1, a seguir «Regulamento n.° 3950/92»), uma exploração pode
comportar várias unidades agrícolas separadas. O demandante no processo
T-202/94 teve a intenção de utilizar a antiga exploração SLOM para produzir leite
no termo do período de não comercialização. Resulta do relatório do perito junto
à réplica que o fez efectivamente após a quantidade de referência lhe ter sido
atribuída.
- As instituições demandadas afirmam que, independentemente da regra
anticumulação introduzida pelo Regulamento n.° 764/89, os demandantes não
sofreram danos. Eles não teriam tido direito à atribuição de uma quantidade de
referência, pois não eram produtores na acepção do artigo 3.°-A, n.° 1, do
Regulamento n.° 857/84 e não apresentaram qualquer prova dessa qualidade.
- No processo T-195/94, a esposa do demandante, herdeira da exploração SLOM,
é que terá tido tal qualidade. O demandante não pode basear-se no parecer da
Câmara Agrícola de Vestefália-Lippe de 19 de Julho de 1991, visto que a Câmara
terá simplesmente reproduzido as suas declarações. A remissão para o conceito de
exploração definido no Regulamento n.° 3950/92 também não é concludente. Esse
conceito baseia-se na ideia de gestão de um conjunto de unidades de produção.
Ora, no caso em apreço, o problema é saber se o demandante geriu efectivamente
a exploração SLOM.
- No processo T-202/94, ressalta do parecer da Câmara de Agricultura de Hanôver
de 25 de Janeiro de 1990 que foi a esposa do demandante quem apresentou o
pedido de atribuição de uma quantidade de referência. A qualidade de produtor
na acepção do artigo 3.°-A, n.° 1, do Regulamento n.° 857/84 pertence portanto a
esta. O atestado da Câmara de Agricultura de Hanôver de 21 de Fevereiro de 1995
que demonstra a qualidade de produtor do demandante não afasta todas as dúvidas
a este propósito.
- De qualquer forma, independentemente da regra anticumulação do artigo 3.°-A,
n.° 1, do Regulamento n.° 857/84, os demandantes não teriam tido direito às
quantidades de referência específicas requeridas às autoridades alemãs, na medida
em que decorre dos seus requerimentos que pretendiam produzir essas quantidades
nas suas explorações originárias e não nas que tinham retomado. Com efeito, a
regulamentação em causa [artigo 3.°-A, n.° 1, primeiro travessão, alínea b) do
Regulamento] prevê o direito a uma quantidade de referência específica para os
produtores que provem estar em condições de a produzir na sua exploração. Isto
é confirmado pelo acórdão de 22 de Outubro de 1991, Von Deetzen (C-44/89,
Colect., p. I-5119, n.° 21), em que o Tribunal de Justiça decidiu no sentido de que
a impossibilidade de comercializar as quantidades de referência não era lesiva da
confiança legítima dos produtores. Ora, ao reproduzir a quantidade em causa numa
outra exploração que não aquela que tinha sido objecto de um compromisso de
não comercialização, terão tentado transmitir essa quantidade.
- A remissão feita pelos demandantes para o acórdão O'Brien, já referido, não é
concludente. Esse acórdão faz referência ao artigo 3.°-A, n.° 3, do Regulamento
n.° 857/84 e não ao seu n.° 1. Decidiu no sentido de que um produtor só pode
prevalecer-se de uma quantidade de referência específica se continuar a gerir a
exploração que constitui objecto do seu compromisso de não comercialização. Ora,
no caso em apreço, a questão é saber se os demandantes geriram verdadeiramente
a exploração SLOM e se tal gestão, na acepção do Regulamento n.° 857/84, se
manteve quando essa exploração deixou de ser utilizada para a exploração leiteira.
- Contestando a existência de um nexo de causalidade, os demandados sustentam,
na fase da tréplica, que o demandante no processo T-195/94 poderia ter recebido
uma quantidade de referência original se tivesse retomado as entregas de leite em
1983, após o termo do compromisso de não comercialização. Com efeito, o artigo
6.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1371/84 e a legislação alemã na matéria teriam
permitido a concessão de uma quantidade de referência a esses produtores,calculada em função das suas entregas efectivas. A não obtenção dessa quantidade
é portanto devida a facto do demandante e não existe nexo de causalidade entre
os danos sofridos e o Regulamento n.° 857/84.
Apreciação do Tribunal
- F. Quiller e J. Heusmann receberam das autoridades nacionais competentes,
respectivamente em 23 de Dezembro e 1 de Fevereiro de 1993, uma quantidade
de referência específica dita «SLOM III». Segundo o artigo 1.° do Regulamento
n.° 2055/93, tal quantidade devia ser concedida aos produtores de leite aos quais
tivesse sido anteriormente recusada uma quantidade de referência. Daí decorre
que, para as autoridades nacionais competentes, os demandantes eram nessa altura
produtores nas explorações agrícolas em questão, na acepção da regulamentação
comunitária e, portanto, tinham sido impedidos de comercializar leite em aplicação
do Regulamento n.° 857/84. Isto é confirmado pelos atestados das Câmaras
Agrícolas de Hanôver e de Vestefália-Lippe, de 25 de Janeiro de 1990 e 19 de
Julho de 1991.
- Relativamente ao argumento dos demandados segundo o qual os demandantes
seriam responsáveis pelos seus danos, na medida em que tinham pedido
quantidades de referência em relação às suas explorações originárias e não em
relação às explorações SLOM, deve observar-se que decorre do artigo 3.°-A, n.° 1,
do Regulamento n.° 857/84, tal como alterado pelo Regulamento n.° 764/89, que
as condições relativas às modalidades concretas de produção da quantidade de
referência específica, e nomeadamente a prevista na alínea b), pressupõem a
atribuição de tal quantidade. Essas condições aplicam-se, portanto, apenas no caso
de o produtor poder pretender uma quantidade de referência específica, cuja
atribuição é regulada pelo n.° 1, primeiro e segundo travessões. Ora, de qualquer
forma, os demandantes estavam excluídos dessa atribuição pela aplicação da regra
anticumulação do segundo travessão desse n.° 1, pelo facto de terem já recebido
uma quantidade de referência a título das suas explorações originárias.
- Quanto ao argumento dos demandados baseado, no processo T-195/94, na
inexistência de um nexo de causalidade entre os prejuízos e o comportamento da
Comunidade, há que salientar que o Regulamento n.° 1371/84 só entrou em vigor
em 18 de Maio de 1984. Tendo o compromisso que onerava o terreno do
demandante expirado em 31 de Maio de 1983, este não podia portanto saber
naquele momento que a retoma da produção lhe permitiria receber uma
quantidade de referência. Foi só no momento da entrada em vigor do Regulamento
n.° 1371/84 que pôde tomar consciência dessa consequência. A interpretação das
instituições equivale portanto a ligar à decisão do demandante de não retomar a
produção em 1983 certas consequências que eram, nesse momento, imprevisíveis.
Portanto, o argumento deve ser por isso rejeitado e a existência de um nexo de
causalidade não poderá ser posta em dúvida no caso em apreço.
- Resulta do conjunto das considerações precedentes que a Comunidade deve ser
declarada responsável pelos danos sofridos pelos demandantes.
2. Quanto à prescrição
- Nestas condições, deve examinar-se e em que medida os pedidos dos demandantes
foram atingidos pela prescrição.
Argumentação das partes
- Os demandantes afirmam que o prazo de prescrição não pode começar a correr
nem a partir da data do termo do compromisso de não comercialização nem a
partir de 2 de Abril de 1984, data da entrada em vigor do Regulamento n.° 857/84,
cuja aplicação está na origem dos seus danos.
- Se bem que admitam que o Regulamento n.° 857/84 causou prejuízos a todos os
produtores SLOM e que o Regulamento n.° 754/89 lesou novamente a situação dos
produtores SLOM III, os demandantes alegam que foi só na data do acórdão
Wehrs, já referido, que declarou inválido o Regulamento n.° 764/89, que as
condições do artigo 43.° do Estatuto ficaram reunidas em relação a eles. Na
verdade, no elenco dessas condições figura o conhecimento da ilicitude do acto que
está na origem dos prejuízos, dado que esse acto é uma norma de direito. Com
efeito, não pode exigir-se de um cidadão que proponha uma acção de
indemnização imediatamente após a adopção de um regulamento ilegal. A
incerteza jurídica da situação, a presunção de validade do Regulamento n.° 857/84
e sobretudo a necessidade de obter uma quantidade de referência específica
explicam a não propositura de uma acção de indemnização. Todavia, o
demandante no processo T-202/94 admite que poderia ter proposto a acção a
partir do termo do compromisso que onerava a sua exploração SLOM.
- Quanto à interrupção do prazo de prescrição, os demandantes afirmam que os
produtores SLOM III não poderão receber um tratamento diferente daquele de
que beneficiavam os produtores SLOM I e SLOM II. Por conseguinte, o regime do
artigo 8.° do Regulamento n.° 2187/93 deverá ser-lhes aplicável, tal como aos outros
produtores. Por outro lado, a comunicação de 5 de Agosto de 1992, pela qual as
instituições interromperam a prescrição, deverá também ser-lhes aplicada, de forma
que impeça os demandados de suscitar uma excepção peremptória da prescrição.
À data dessa comunicação, os seus direitos ainda não estavam prescritos, pois o
acto gerador dos danos era o Regulamento n.° 764/89. Mesmo na hipótese de o
prazo da prescrição ter começado a correr no termo do período de não
comercialização, os períodos não prescritos tiveram início em 5 de Agosto de 1987,
ou seja cinco anos antes de 5 de Agosto de 1992, data da interrupção da
prescrição.
- O demandante no processo T-195/94 sustenta que, de qualquer forma, interrompeu
a prescrição pela carta que dirigiu às instituições em 12 de Janeiro de 1994, à qual
a Comissão respondeu em 29 de Março de 1994 recusando indemnizar os prejuízos
sofridos. Em conformidade com o artigo 43.° do Estatuto, a acção foi proposta
dentro de dois meses a contar da recepção da carta de recusa. Naquele momento,
os direitos à indemnização em cuja origem estava o Regulamento n.° 764/89 não
tinham ainda prescrito.
- O demandante no processo T-202/94 afirma igualmente que o prazo de prescrição
foi interrompido em relação a si pela sua carta às instituições de 11 de Abril de
1991. O artigo 43.° do Estatuto impõe apenas que a acção seja proposta
imediatamente após tal carta. De qualquer forma, nas suas respostas de 2 e de 15
de Maio de 1991 a Comissão e o Conselho renunciaram expressamente a invocar
a prescrição e o demandante confiou nessas declarações. Os efeitos dessa renúncia
não foram afastados pelo Regulamento n.° 2187/93, que não era um acto dirigido
directa e individualmente ao demandante e do qual, portanto, não era possível
recorrer. Aliás, por carta de 13 de Janeiro de 1994, o demandante perguntou às
instituições se mantinham a sua renúncia. Só a Comissão respondeu por carta de
29 de Março de 1994, recusando indemnizar os produtores SLOM III. Na medida
em que esta última carta implicava um indeferimento, a acção foi proposta no
prazo de dois meses previsto no artigo 43.° do Estatuto.
- O demandados consideram que os pedidos apresentados pelos demandantes
prescreveram e que, em consequência, as acções são inadmissíveis. Recordam que,
em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça e com o artigo 43.°
do Estatuto, o prazo de prescrição começa a correr quando todas as condições a
que se encontra subordinada a obrigação de reparação estiverem reunidas e,
nomeadamente, quando a responsabilidade emerge dum acto normativo, a partir
do momento em que as consequência desse acto se produziram (acórdãos de 27
de Janeiro de 1982, Birra Wührer e o./Conselho e Comissão, 256/80, 257/80, 265/80,
267/80 e 5/81, Recueil, p. 85, n.° 10, a seguir «acórdão Birra Wührer», e De
Franceschi/Conselho e Comissão, 51/81, Recueil, p. 117, n.° 10, a seguir «acórdão
De Franceschi»).
- No caso em apreço, o prazo de prescrição começou a correr, no processo T-195/94,
em 2 Abril de 1984, dia da entrada em vigor do Regulamento n.° 857/84 e, no
processo T-202/94, em 9 de Outubro de 1985, data do termo do período de não
comercialização. Nessas datas, estavam reunidas as condições do artigo 215.°: a
responsabilidade da Comunidade resultava dum texto legal, isto é, o Regulamento
n.° 857/84 na sua primeira versão, a seguir declarado inválido pelo acórdão
Mulder I, na medida em que atentava de forma caracterizada contra o princípio
superior da protecção da confiança legítima.
- O prejuízo invocado pelos demandantes deriva do facto de não terem podido obter
quantidades de referência para as explorações SLOM que tinham retomado. Ora,
quanto a esse aspecto, nem a retoma dessas explorações pelos demandantes nem
o Regulamento n.° 764/89, que aditou o artigo 3.°-A ao Regulamento n.° 857/84,
alteraram a situação jurídica em detrimento dos demandantes. Desde a entrada em
vigor do Regulamento n.° 857/84, os demandantes teriam, portanto, podido obter
a declaração da sua ilegalidade. A presunção de legalidade inerente a qualquer
regulamento não impede os operadores económicos de obter a declaração da sua
ilegalidade (acórdão de 3 de Fevereiro de 1979, Granaria, 101/78, Recueil, p. 623,
n.° 5). Foi o que fizeram os demandantes nos processos que deram lugar aos
acórdãos Mulder I e Wehrs, que, diferentemente dos demandantes neste processo,
não pretenderam evitar os riscos ligados à propositura de uma acção.
- Os demandados contestam em seguida a alegação dos demandantes de que o prazo
de prescrição começou a correr após, respectivamente, 2 de Abril de 1984 e 9 de
Outubro de 1985 (v. supra n.° 106). Em primeiro lugar, não pode considerar-se
como data do início deste prazo 28 de Abril de 1988, data em que o Tribunal de
Justiça, no seu acórdão Mulder I, declarou parcialmente inválido o Regulamento
n.° 857/84. Segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, para que um prazo de
prescrição comece a correr, é necessário que a vítima de um dano tenha tomado
ou tenha podido tomar conhecimento do facto gerador desse dano (acórdão de 7
de Novembro de 1985, Adams/Comissão, 145/83, Recueil, p. 3539, n.° 50) e não da
sua ilicitude. Em segundo lugar, o período de prescrição não poderia depender do
Regulamento n.° 764/89, que introduziu a regra anticumulação e autonomizou a
situação dos produtores SLOM III. Esse regulamento não agravou a situação dos
demandantes em relação à que existia desde a adopção do Regulamento n.° 857/84,
na sua versão inicial, na medida em que este excluía já, desde a sua entrada em
vigor, a atribuição de quantidades de referência às explorações SLOM dos
demandantes. Em terceiro lugar, a prescrição também não começou a correr em
3 de Dezembro de 1992, data do acórdão Wehrs, pois o facto gerador do dano
sofrido pelos demandantes era o regime instituído pelos Regulamentos n.os 857/84
e 764/89 e não a declaração da sua ilegalidade.
- Os demandados contestam igualmente que o prazo de prescrição no que toca aos
demandantes, se renove diariamente. Mesmo que o artigo 8.° do Regulamento
n.° 2187/93 disponha nesse sentido, tal solução não deverá necessariamente servir
de base à interpretação do artigo 43.° do Estatuto.
- Os demandados afirmam ainda que a comunicação de 5 de Agosto de 1992 não se
opõe a que suscitem uma excepção de inadmissibilidade com base na prescrição.
O ponto 2 dessa comunicação especifica que o compromisso de não invocar a
prescrição só se aplica na medida em que o direito à indemnização em questão não
tenha prescrito à data da comunicação. De qualquer forma, esta só diz respeito aos
produtores SLOM I e SLOM II, como o prova, por um lado, a referência feita ao
processo Mulder II, que diz respeito apenas a esses grupos de produtores e, por
outro, à redacção do ponto 1 da comunicação, que visa os produtores que não
obtiveram uma quantidade de referência na sequência da sua participação no
regime previsto pelo Regulamento n.° 1078/77.
- No que respeita à interrupção da prescrição, os demandados sustentam, no
processo T-195/94, que a carta dirigida pelo demandante à Comissão em 12 de
Janeiro de 1994 não interrompeu a prescrição, pois a acção não foi proposta no
prazo de dois meses previsto no artigo 43.°, terceiro período, do Estatuto. Este
prazo não começou a correr a partir da resposta da Comissão à carta em que o
demandante tinha feito valer o seu direito, mas sim desde a data de recepção desta
última carta. No caso em apreço, tendo a acção sido proposta após o termo desse
prazo, a carta de 12 de Janeiro de 1994 não interrompeu portanto a prescrição.
- No processo T-202/94, os demandados sustentam igualmente que a carta dodemandante de 11 de Abril de 1991 não interrompeu a prescrição, pois a acção
não foi proposta no prazo fixado no artigo 43.° do Estatuto. Nas suas respostas de
2 e 15 de Maio de 1991, a Comissão e o Conselho só renunciaram a invocar a
prescrição na medida em que os direitos em questão não tivessem ainda prescrito.
Tendo o prazo começado a correr em 9 de Outubro de 1985 (v. supra n.° 106), a
prescrição ocorreu em 9 de Outubro de 1990, ou seja, antes da carta enviada pelo
demandante. Além disso, a renúncia a invocar a prescrição terminou três meses
após o acórdão Mulder II, proferido em 19 de Maio de 1992, e o demandante não
propôs a acção durante esse período. Quanto a esse ponto, é absurdo o argumento
do demandante segundo o qual a renúncia valia até à publicação do acórdão a
proferir sobre o montante das indemnizações, na sequência do acórdão Mulder II.
Este último acórdão regulou todas as questões importantes sobre a
responsabilidade, o único ponto que interessa a todas as partes em causa.
- Em conclusão, os demandantes entendem que, tendo a prescrição começado a
correr em 2 de Abril de 1984 e em 9 de Outubro de 1985, os direitos dos
demandantes estão prescritos desde, respectivamente, 2 de Abril de 1989 e 9 de
Outubro de 1990. No mínimo, a prescrição afecta, no processo T-195/94, todos os
direitos constituídos antes de 24 de Maio de 1989, data cinco anos anterior a 24 de
Maio de 1994, que é a data da propositura da acção. Quanto ao processo T-202/94,
estão prescritos os direitos do demandante constituídos anteriormente a 1 de Junho
de 1989, ou seja, mais de cinco anos antes da propositura da acção.
Apreciação do Tribunal
- O prazo de prescrição previsto no artigo 43.° do Estatuto não pode começar a
correr antes de estarem reunidas todas as condições a que está subordinada a
obrigação de reparação e, nomeadamente, quando a responsabilidade resulta de
um acto normativo, antes de se produzirem os efeitos danosos desse acto (acórdãos
Birra Wührer e De Franceschi, n.os 10; acórdão do Tribunal de Primeira Instância
de 16 de Abril de 1997, Hartmann/Conselho e Comissão, T-20/94, Colect., p. II-595,
n.° 107).
- Para determinar em que medida os direitos dos demandantes prescreveram, deve
fixar-se, em primeiro lugar, a data em que surgiram os prejuízos, antes de
determinar a data em que ocorreu um acto interruptivo.
- No caso em apreço, os demandantes sofreram prejuízos a partir do dia em que,
após o termo dos compromissos de não comercialização em que ficaram
sub-rogados, poderiam ter entregue leite produzido nas suas explorações SLOM
caso não lhes tivesse sido recusada uma quantidade de referência em aplicação do
Regulamento n.° 857/84.
- Quanto a esta questão, deve rejeitar-se o argumento dos demandantes extraído do
facto de o prazo de prescrição só poder ter começado a correr após a entrada em
vigor do Regulamento n.° 764/89 que, alterando o Regulamento n.° 857/84,
introduziu a regra anticumulação. Com efeito, ainda que a situação do grupo de
produtores em causa só tenha sido autonomizada a partir da adopção dessa regra
(v. supra n.° 66), este último resultado foi apenas a consequência da introdução de
um novo regime para aqueles dos produtores SLOM a quem, a partir desse
momento, pôde ser atribuída uma quantidade de referência específica. Em
contrapartida, a situação dos produtores SLOM III manteve-se, no sentido em que,
mesmo que fossem referidos pelo artigo 3.°-A aditado ao Regulamento n.° 857/84,
a nova regra estabelecida tinha como único efeito manter, em relação a esses
produtores, o regime precedente de exclusão total da comercialização.
- No caso em apreço, não é contestado que os demandantes sofreram danos
resultantes da aplicação do Regulamento n.° 857/84, na sua redacção inicial, e que
estes danos prosseguiram após a introdução, nesse regulamento, do artigo 3.°-A
pelo Regulamento n.° 764/89. Daí resulta que o acto na origem dos danos dos
demandantes era o Regulamento n.° 857/84. Sendo o Regulamento n.° 764/89
estranho à ocorrência dos danos sofridos, não é de forma alguma pertinente no que
toca ao prazo de prescrição.
- Portanto, os demandantes sofreram prejuízos na data em que lhes foi aplicado o
Regulamento n.° 857/84, o que é confirmado, aliás, pela data a partir da qual
pedem para ser indemnizados (v. supra n.os 35 e 37). No processo T-195/94, essa
data é a da entrada em vigor do regulamento, em 2 de Abril de 1984, dado que,
mesmo que o compromisso de não comercialização tenha expirado numa data
anterior, a recusa de atribuição de uma quantidade de referência só foi oposta ao
demandante nessa data. No processo T-202/94, essa data é a de 9 de Outubro de
1985, o dia seguinte ao termo do compromisso de não comercialização no qual o
demandante ficou sub-rogado.
- Deve, em seguida, examinar-se a questão de saber se a reunião das condições de
que depende a obrigação de reparação da Comunidade, que determina o ponto de
partida do prazo de prescrição, teve lugar à data em que surgiu o prejuízo, tal
como fixada supra, em conformidade com os acórdãos Birra Wührer e De
Franceschi e a afirmação dos demandados, ou antes se teve lugar apenas nas datas
dos acórdãos Mulder I ou Wehrs, que declararam a invalidade do Regulamento
n.° 857/84 respectivamente na sua redacção original, e na alterada pelo
Regulamento n.° 764/89, como o sustentam os demandantes.
- O argumento dos demandantes consiste, em substância, em fazer do conhecimento
da ilegalidade do acto na origem dos danos uma das condições de que depende a
responsabilidade da Comunidade e cuja reunião, em virtude dos acórdãos Birra
Wührer e De Franceschi, constitui o ponto de partida do prazo de prescrição. Em
consequência, o prazo do artigo 43.° do Estatuto não pode começar a correr antes
da declaração de ilegalidade.
- A esse propósito, há que recordar que, por força da autonomia da acção de
indemnização em relação ao recurso de anulação (acórdão Zuckerfabrik
Schöppenstedt/Conselho, já referido, e despacho do Tribunal de Justiça de 21 de
Junho de 1993, Van Parijs e o./Conselho e Comissão, C-257/93, Colect., p. I-3335,
n.os 14 e 15), uma acção baseada no artigo 215.° do Tratado não tem
necessariamente que ser acompanhada nem precedida de um recurso com vista à
anulação ou à declaração de invalidade, o que assegura, em consequência, uma
protecção acrescida dos particulares (acórdão Hartmann/Conselho e Comissão, já
referido, n.° 128). Daqui decorre que a anulação do Regulamento n.° 857/84 ou a
declaração da sua invalidade não constituía um ponto prévio necessário à
indemnização dos demandantes e que estes podiam portanto propor a sua acção
contra a Comunidade a partir do momento em que tivessem começado a sofrer
danos em aplicação do Regulamento n.° 857/84, considerando na sua redacção
inicial (v. igualmente acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 16 de Abril de
1997, Saint e Murray/Conselho e Comissão, T-554/93, Colect., p. II-563, n.° 81).
- Nestas circunstâncias, a reunião das condições de que dependia a responsabilidade
da Comunidade ocorreu à data em que o Regulamento n.° 857/84 foi aplicado aos
demandantes (v. supra n.° 119). Portanto, o prazo de prescrição começou a correr
nessa data.
- Os demandados não podem sustentar que os pedidos dos demandantes
prescreveram na sua totalidade cinco anos após o início do prazo de prescrição.
- Com efeito, os danos de que a Comunidade deve reparação não são danos
causados instantaneamente. Esses danos prosseguiram quotidianamente durante um
certo período, pelo facto da manutenção em vigor de um acto ilegal, na medida em
que os demandantes se viram na impossibilidade de obter uma quantidade de
referência e portanto de entregar leite. Em consequência, em função da data do
acto interruptivo, a prescrição do artigo 43.° do Estatuto aplica-se ao período
anterior em mais de cinco anos a esta data, sem afectar os direitos constituídos no
decurso dos períodos posteriores (acórdão Hartmann/Conselho e Comissão, já
referido, n.° 132).
- Relativamente à interrupção do prazo de prescrição, deve em primeiro lugar
tomar-se posição sobre os argumentos, comuns a ambos as acções, extraídos da
aplicação, no caso em apreço, da Comunicação de 5 de Agosto de 1992 e do
Regulamento n.° 2187/93, para em seguida analisar os efeitos dos actos
interruptivos invocados em cada uma das acções.
- O argumento segundo o qual os demandantes terão beneficiado da Comunicação
de 5 de Agosto de 1992 deve ser rejeitado. Com efeito, através dessa comunicação
as instituições comprometiam-se a não invocar a prescrição em relação a
produtores aos quais o acórdão Mulder II tinha reconhecido um direito à
indemnização. O âmbito de aplicação pessoal desse acto era assim limitado aos
produtores que não tinham recebido uma quantidade de referência em aplicação
do Regulamento n.° 857/84 na sua redacção original mas que tinham obtido tal
quantidade na sequência do Regulamento n.° 764/89. Dirigia-se portanto apenas
aos produtores SLOM I e SLOM II. Não tendo a situação específica dos
produtores SLOM III sido analisada no acórdão Mulder II, os interessados não
podiam portanto beneficiar da decisão proferida contra as instituições. Em
consequência, a comunicação de 5 de Agosto de 1992 não lhes dizia respeito e não
teve por efeito impedir as instituições de invocar a prescrição em relação aos
demandantes.
- Os produtores SLOM III não podem também beneficiar do Regulamento
n.° 2187/93 e, nomeadamente, das disposições do seu artigo 8.° relativas à
interrupção da prescrição. Quanto a este ponto, basta recordar que, nos termos do
seu artigo 2.°, esse regulamento é apenas aplicável aos produtores que receberam
quantidades de referência específicas em aplicação dos Regulamentos n.os 764/89
e 1639/91. Não se encontrando os demandantes nessa situação não podem portanto
invocar o Regulamento n.° 2187/93.
- O facto de este texto não lhes ser aplicável não implica qualquer violação do
princípio de igualdade. A violação desse princípio pressupõe que um tratamento
diferente tenha sido aplicado a situações comparáveis (v. acórdão do Tribunal de
Primeira Instância de 6 de Abril de 1995, Ferriere Nord/Comissão, T-143/89,
Colect., p. II-917, n.° 55). Ora, tal como acaba de ser recordado (n.os 127 a 128),
a situação dos produtores SLOM III era diferente da dos beneficiários do
Regulamento n.° 2187/93. Como quer que seja, esse regulamento, como foi
decidido pelo Tribunal de Primeira Instância (acórdãos de 16 de Abril de 1997,
Connaughton e o./Conselho, T-541/93, Colect., p. II-549, n.° 35, e Saint e
Murray/Conselho e Comissão, já referido, n.° 41), tem a natureza de uma proposta
de transacção que se limita a abrir uma via suplementar para obter uma
indemnização para os produtores aos quais esse direito foi reconhecido.
- No que toca aos actos interruptivos da prescrição, importa constatar que, no
processo T-195/94, o demandante dirigiu apenas à Comissão, em 12 de Janeiro de
1994, uma carta exigindo a reparação dos prejuízos sofridos entre 2 de Abril de
1984 e a data de atribuição de uma quantidade de referência definitiva. Por carta
de 29 de Março de 1994, a Comissão indeferiu esse pedido. O Conselho, por seu
lado, apenas alegou que a interrupção não lhe era oponível.
- Tendo a acção sido proposta em 20 de Maio de 1994, dentro do prazo de dois
meses subsequente à carta de 29 de Março, o prazo de prescrição foi interrompido
em 12 de Janeiro de 1994, em conformidade com o disposto no artigo 43.° do
Estatuto.
- O argumento apresentado pelas instituições que visa demonstrar que a acção
deveria ter sido proposta num prazo de dois meses após a carta de 12 de Janeiro
de 1994 é desprovido qualquer fundamento. A referência, no último período do
artigo 43.° do Estatuto, aos artigos 173.° e 175.° do Tratado, tem por efeito fazer
aplicar, no domínio da interrupção da prescrição, as regras de cômputo dos prazos
previstas por essas disposições. Tendo a resposta da Comissão ocorrido mais de
dois meses após a carta do demandante, mas dentro do prazo de impugnação de
um indeferimento tácito, essa resposta abriu um novo prazo de recurso (v. acórdão
do Tribunal de Justiça de 1 de Abril de 1993, Pesqueras Echebastar/Comissão,
C-25/91, Colect., p. I-1719). Tendo a petição sido apresentada antes do termo desse
segundo prazo, a interrupção da prescrição teve portanto lugar em 12 de Janeiro
de 1994.
- Em conformidade com a jurisprudência (acórdãos Birra Wührer e De Franceschi,
n.os 10, Hartmann/Conselho e Comissão, n.° 140, e Saint e Murray/Conselho e
Comissão, n.° 93), o período a indemnizar corresponde aos cinco anos queprecedem a data da interrupção da prescrição. Está portanto compreendido entre
12 de Janeiro de 1989 e 28 de Julho de 1993, data da atribuição de uma
quantidade de referência ao demandante.
- No que toca ao processo T-202/94, em primeiro lugar, deve salientar-se que, em
11 de Abril de 1991, o demandante se dirigiu ao Conselho e à Comissão para pedir
a reparação dos prejuízos sofridos até essa data. Nas suas respostas de 2 e 15 de
Maio de 1991, as instituições, negando embora a sua responsabilidade,
comprometeram-se a não invocar a prescrição até ao termo de um prazo de três
meses a seguir à publicação do acórdão Mulder II. Todavia, esse compromisso
cobria apenas os direitos que não tivessem prescrito à data das cartas em questão.
- Contrariamente ao que pretende o demandante, essa correspondência não pode
ser interpretada como fazendo referência ao acórdão do Tribunal de Justiça a
proferir na sequência do acórdão Mulder II. Este último acórdão resolveu as
questões relativas à existência de uma responsabilidade comunitária. Tal como
resulta da sua parte decisória, só resta fixar o quantum da indemnização. As cartas
das instituições de 2 e 15 de Maio de 1991 diziam respeito, portanto, ao acórdão
Mulder II.
- Além disso, através dessas cartas, as instituições renunciaram a invocar a prescrição
relativamente ao período nelas mencionado. Tendo em conta as cartas em causa,
o seu objectivo era evitar a propositura imediata de uma acção («No interesse da
economia processual o Conselho/Comissão [...] está todavia disposto(a) a não
invocar a prescrição [...]»). Isto era conforme à prática das instituições nessa altura,
que consistia em enviar cartas no mesmo sentido aos produtores que lhes dirigiam
pedidos de reparação dos seus prejuízos.
- Importa portanto determinar os efeitos do compromisso assumido pelas
instituições, que incitou os produtores a não proporem uma acção, em
contrapartida da não invocação da prescrição.
- Não poderá admitir-se, como pretendem as instituições, que, pelo simples facto de
não ter proposto uma acção no prazo previsto no artigo 43.° do Estatuto, após a
extinção de um prazo de três meses a contar da publicação do acórdão Mulder II,
possa ser oposta ao demandante a renovação da prescrição à data das cartas de
2 e 15 de Maio de 1991, como se o compromisso das instituições não tivesse sido
tomado. Com efeito, esse compromisso era um acto unilateral das instituições que
visava a incitar o demandante a não propor uma acção. Os demandados não
poderão portanto prevalecer-se do facto de o demandante ter adoptado uma
conduta de que eram os únicos beneficiários.
- Nestas condições, o prazo de prescrição continuou suspenso durante o período
compreendido entre 7 de Maio de 1991, data da recepção da carta dirigida pela
Comissão ao demandante, e 17 de Setembro de 1992, ou seja, no termo de um
prazo de três meses a contar da publicação no Jornal Oficial das Comunidades
Europeias, em 17 de Junho de 1992, da parte decisória do acórdão Mulder II.
- Em segundo lugar, deve fixar-se a data da interrupção do prazo de prescrição.
Quanto a isto, importa constatar que o demandante dirigiu à Comissão, em 13 de
Janeiro de 1994, uma carta em que pedia que essa instituição confirmasse que
mantinha a sua renúncia a invocar a prescrição até à publicação do acórdão do
Tribunal de Justiça a proferir quanto ao montante das indemnizações na sequência
do acórdão Mulder II. Por carta de 29 de Março de 1994, recebida em 5 de Abril
seguinte, a Comissão respondeu que a Comunidade não era responsável pelas
perdas do demandante.
- Tendo a petição sido apresentada dentro do prazo de dois meses a partir da
recepção dessa resposta e devendo a carta de 13 de Janeiro de 1994 ser
considerada como contendo um pedido dirigido às instituições na acepção do artigo
43.° do Estatuto, a prescrição interrompeu-se nessa última data.
- Nessas condições, em conformidade com a jurisprudência (v. supra n.° 133), o
período a indemnizar no processo T-202/94 deveria começar em princípio cinco
anos antes da data do acto interruptivo para terminar em 1 de Fevereiro de 1993,
data de atribuição de uma quantidade de referência específica. No entanto, tendo
o prazo de prescrição continuado suspenso entre 7 de Maio de 1991 e 17 de
Setembro de 1992 (v. supra n.° 139), ou seja, durante dezasseis meses e dez dias,
o período a indemnizar é o compreendido entre 3 de Setembro de 1987 e 31 de
Janeiro de 1993.
3. Quanto ao montante das reparações
- Quando da apensação dos processos as partes foram convidadas a concentrar-se
no problema da existência de um direito à reparação.
- Em consequência, embora os demandantes tenham calculado, nas suas petições,
o montante da indemnização exigida (v. supra n.os 35 e 37), as partes não puderam
pronunciar-se especificamente sobre o montante de uma indemnização referente
ao período considerado pelo Tribunal de Primeira Instância.
- Nestas condições, o Tribunal convida as partes a procurarem um acordo quanto a
este ponto num prazo de doze meses, à luz do presente acórdão e das
especificações contidas no acórdão Mulder II no que toca ao modo de cálculo do
dano. Na falta de acordo, as partes apresentarão ao Tribunal, dentro do prazo
estabelecido, os seus pedidos quantificados.
Quanto às despesas
- Face ao que foi exposto supra no n.° 145, a decisão sobre as despesas deve ser
reservada para final.
Pelos fundamentos expostos,O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Primeira Secção Alargada),
decide:
- Os demandados são obrigados a reparar os prejuízos sofridos pelos
demandantes, por um lado, devido à aplicação do Regulamento (CEE)
n.° 857/84, de 31 de Março de 1984, relativo às regras gerais para a
aplicação da imposição suplementar referida no artigo 5.°-C do
Regulamento (CEE) n.° 804/68 no sector do leite e produtos lácteos, tal
como completado pelo Regulamento (CEE) n.° 1371/84 da Comissão, de 16
de Maio de 1984, que fixa as regras de aplicação da imposição suplementar
referida no artigo 5.°-C do Regulamento (CEE) n.° 804/68, na medida em
que estes regulamentos não previram a atribuição de uma quantidade de
referência relativamente às explorações oneradas com um compromisso
tomado a título do Regulamento (CEE) n.° 1078/77 do Conselho, de 17 de
Maio de 1977, que institui um regime de prémios de não comercialização
do leite e dos produtos lácteos e de reconversão dos efectivos bovinos de
orientação leiteira, quando os produtores não tenham entregue leite durante
o ano de referência considerado pelo Estado-Membro em causa e, por
outro, devido à aplicação do mesmo Regulamento n.° 857/84, tal como
alterado pelo Regulamento (CEE) n.° 764/89 do Conselho, de 20 de Março
de 1989, na medida em que o seu artigo 3.°-C, n.° 1, segundo travessão,
excluiu a atribuição de uma quantidade de referência específica aos
cessionários de um prémio concedido por força do Regulamento n.° 1078/77.
- O período em relação ao qual os demandantes devem ser indemnizados dos
prejuízos sofridos devido à aplicação do Regulamento n.° 857/84 é, no
processo T-195/94, o que começa em 12 de Janeiro de 1989 e termina em
28 de Julho de 1993 e, no processo T-202/94, o que começa em 3 de
Setembro de 1997 e termina em 31 de Janeiro de 1993.
- As partes comunicarão ao Tribunal, num prazo de doze meses a partir do
presente acórdão, os montantes a pagar, estabelecidos de comum acordo.
- Na ausência de acordo, farão chegar ao Tribunal, no mesmo prazo, os seus
pedidos quantificados.
- A decisão quanto às despesas é reservada para final.
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Tiili Moura Ramos
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Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 4 de Dezembro de 1997.
O secretário
O presidente
H. Jung
A. Saggio
1: Língua do processo: alemão.