Language of document : ECLI:EU:T:2007:334

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Terceira Secção)

8 de Novembro de 2007 (*)

«Acesso aos documentos – Regulamento (CE) n.° 1049/2001 – Documentos relativos a uma acção por incumprimento – Decisão que recusa o acesso – Protecção das pessoas singulares em relação ao tratamento de dados pessoais – Regulamento (CE) n.° 45/2001 – Conceito de vida privada»

No processo T‑194/04,

The Bavarian Lager Co. Ltd, com sede em Clitheroe (Reino Unido), representada, inicialmente, por J. Pearson e C. Bright e, em seguida, por J. Webber e M. Readings, solicitors,

recorrente,

apoiada por

Autoridade Europeia Para a Protecção de Dados (AEPD), representada por H. Hijmans, na qualidade de agente,

interveniente,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada por C. Docksey e P. Aalto, na qualidade de agentes,

recorrida,

que tem por objecto um pedido de anulação da decisão da Comissão, de 18 de Março de 2004, que indeferiu um pedido apresentado pela recorrente para obter acesso completo à acta de uma reunião realizada no âmbito de um procedimento por incumprimento e um pedido destinado a obter a declaração de que a Comissão cometeu um erro ao arquivar o procedimento instaurado contra o Governo do Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte com base no artigo 169.° do Tratado CE (actual artigo 226.° CE),

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Terceira Secção),

composto por: M. Jaeger, presidente, V. Tiili e O. Czúcz, juízes,

secretário: C. Kristensen, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 13 Setembro 2006,

profere o presente

Acórdão

 Quadro jurídico

1        Nos termos do artigo 6.° UE:

«1.      A União assenta nos princípios da liberdade, da democracia, do respeito pelos direitos do Homem e pelas liberdades fundamentais, bem como do Estado de direito, princípios que são comuns aos Estados‑Membros.

2.      A União respeita os direitos fundamentais tal como os garante a Convenção Europeia de Salvaguarda dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma em 4 de Novembro de 1950, e tal como resultam das tradições constitucionais comuns aos Estados‑Membros, enquanto princípios gerais do direito comunitário.

[…]»

2        De acordo com o disposto no artigo 255.° CE:

«1. Todos os cidadãos da União e todas as pessoas singulares ou colectivas que residam ou tenham a sua sede social num Estado‑Membro têm direito de acesso aos documentos do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão, sob reserva dos princípios e condições a definir nos termos dos n.os 2 e 3.

2.      Os princípios gerais e os limites que, por razões de interesse público ou privado, regem o exercício do direito de acesso aos documentos são definidos pelo Conselho, deliberando nos termos do artigo 251.° [CE], no prazo de dois anos a contar da data de entrada em vigor do Tratado de Amesterdão.

[…]»

3        O Regulamento (CE) n.° 1049/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de Maio de 2001, relativo ao acesso do público aos documentos do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão (JO L 145, p. 43), define os princípios, as condições e os limites que regem o direito de acesso aos documentos destas instituições, previsto no artigo 255.° CE. Este regulamento é aplicável desde 3 de Dezembro de 2001.

4        A Decisão 2001/937/CE, CECA, Euratom da Comissão, de 5 de Dezembro de 2001, que altera o seu regulamento interno (JO L 345, p. 94), revogou a Decisão 94/90/CECA, CE, Euratom da Comissão, de 8 de Fevereiro de 1994, relativa do acesso do público aos documentos da Comissão (JO L 46, p. 58), que assegurava a aplicação, no que respeita à Comissão, do Código de conduta em matéria de acesso do público aos documentos do Conselho e da Comissão (JO 1993, L 340, p. 41, a seguir «código de conduta»).

5        Os considerandos 4 e 11 do Regulamento n.° 1049/2001 indicam o seguinte:

«(4)      O presente regulamento destina‑se a permitir o mais amplo efeito possível do direito de acesso do público aos documentos e a estabelecer os respectivos princípios gerais e limites, em conformidade com o disposto no n.° 2 do artigo 255.°[...]CE.

[…]

(11)      Em princípio, todos os documentos das instituições deverão ser acessíveis ao público. No entanto, determinados interesses públicos e privados devem ser protegidos através de excepções. É igualmente necessário que as instituições possam proteger as suas consultas e deliberações internas, se tal for necessário para salvaguardar a sua capacidade de desempenharem as suas funções. Ao avaliar as excepções, as instituições deverão ter em conta os princípios estabelecidos na legislação comunitária relativos à protecção de dados pessoais em todos os domínios de actividade da União.»

6        Segundo o artigo 4.° do Regulamento n.° 1049/2001, relativo às excepções ao direito de acesso:

«1.      As instituições recusarão o acesso aos documentos cuja divulgação pudesse prejudicar a protecção:

[…]

b)      Da vida privada e da integridade do indivíduo, nomeadamente nos termos da legislação comunitária relativa à protecção dos dados pessoais.

2.      As instituições recusarão o acesso aos documentos cuja divulgação pudesse prejudicar a protecção de:

[…]

–      objectivos de actividades de inspecção, inquérito e auditoria,

excepto quando um interesse público superior imponha a divulgação.

3.      O acesso a documentos, elaborados por uma instituição para uso interno ou por ela recebidos, relacionados com uma matéria sobre a qual a instituição não tenha decidido, será recusado, caso a sua divulgação pudesse prejudicar gravemente o processo decisório da instituição, excepto quando um interesse público superior imponha a divulgação.

O acesso a documentos que contenham pareceres para uso interno, como parte de deliberações e de consultas preliminares na instituição em causa, será recusado mesmo após ter sido tomada a decisão, caso a sua divulgação pudesse prejudicar gravemente o processo decisório da instituição, excepto quando um interesse público superior imponha a divulgação.

[…]

6.      Quando só algumas partes do documento pedido forem abrangidas por qualquer das excepções, as restantes partes do documento serão divulgadas.

[…]»

7        O artigo 6.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1049/2001 prevê que «[o] requerente não é obrigado a declarar as razões do pedido».

8        A Directiva 95/46/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 24 de Outubro de 1995, relativa à protecção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados (JO L 281, p. 31), exige aos Estados‑Membros que assegurem a protecção das liberdades e dos direitos fundamentais das pessoas singulares, nomeadamente do direito à vida privada, no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais, a fim de assegurar a livre circulação dos dados pessoais na Comunidade.

9        O artigo 286.° CE dispõe que os actos comunitários relativos à protecção das pessoas singulares em matéria de tratamento de dados de carácter pessoal e de livre circulação desses dados serão aplicáveis às instituições e órgãos comunitários.

10      O Regulamento (CE) n.° 45/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de Dezembro de 2000, relativo à protecção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais pelas instituições e pelos órgãos comunitários e à livre circulação desses dados (JO 2001, L 8, p. 1), foi adoptado com base no artigo 286.° CE.

11      Segundo o considerando 15 do Regulamento n.° 45/2001:

«[…] O acesso aos documentos, incluindo as condições de acesso aos documentos que contêm dados de carácter pessoal, está previsto nas regulamentações adoptadas com base no artigo 255.°[…]CE cujo âmbito de aplicação se estende aos títulos V e VI do Tratado [UE].»

12      O Regulamento n.° 45/2001 dispõe:

«[...]

Artigo 1.°

Objecto do regulamento

1.      As instituições e os órgãos criados pelos Tratados que instituem as Comunidades Europeias, ou com base nesses Tratados, adiante designados ‘instituições e órgãos comunitários’, asseguram, nos termos do presente regulamento, a protecção das liberdades e dos direitos fundamentais das pessoas singulares, nomeadamente do direito à vida privada, no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais, e não limitam nem proíbem a livre circulação de dados pessoais entre eles ou entre eles e destinatários abrangidos pela legislação nacional dos Estados‑Membros que transponha a Directiva 95/46 […].

2.      A autoridade independente de controlo criada no presente regulamento, adiante designada Autoridade Europeia para a protecção de dados, controla a aplicação das disposições do presente regulamento a todas as operações de tratamento efectuadas pelas instituições e órgãos comunitários.

Artigo 2.°

Definições

Para efeitos do presente regulamento, entende‑se por:

a)      ‘Dados pessoais’, qualquer informação relativa a uma pessoa singular identificada ou identificável […]. É considerado identificável quem possa ser identificado, directa ou indirectamente, nomeadamente por referência a um número de identificação ou a um ou mais elementos específicos da sua identidade física, fisiológica, psíquica, económica, cultural ou social;

b)      ‘Tratamento de dados pessoais’ […], qualquer operação ou conjunto de operações efectuadas sobre dados pessoais, com ou sem meios automatizados, tais como a recolha, registo, organização, conservação, adaptação ou alteração, recuperação, consulta, utilização, comunicação por transmissão, divulgação ou qualquer outra forma de colocação à disposição, com comparação ou interconexão, bem como o bloqueio, apagamento ou destruição;

c)      ‘Ficheiro de dados pessoais’ […], qualquer conjunto estruturado de dados pessoais, acessível segundo critérios determinados, que seja centralizado, descentralizado ou repartido de modo funcional ou geográfico;

[…]

Artigo 3.°

Âmbito de aplicação

1.      O presente regulamento é aplicável ao tratamento de dados pessoais por todas as instituições e órgãos comunitários, na medida em que esse tratamento seja executado no exercício de actividades que dependam total ou parcialmente do âmbito de aplicação do direito comunitário.

2.      O presente regulamento é aplicável ao tratamento de dados pessoais por meios total ou parcialmente automatizados, bem como ao tratamento por meios não automatizados de dados pessoais contidos num ficheiro ou a ele destinados.

[...]

Artigo 4.°

Qualidade dos dados

1.      Os dados pessoais devem ser:

a)      Objecto de um tratamento leal e lícito;

b)      Recolhidos para finalidades determinadas, explícitas e legítimas e não ser posteriormente tratados de forma incompatível com essas finalidades […].

[…]

Artigo 5.°

Licitude do tratamento

O tratamento de dados pessoais só pode ser efectuado se:

a)      For necessário ao exercício de funções de interesse público com fundamento nos Tratados que instituem as Comunidades Europeias ou noutros actos legislativos aprovados com base nesses Tratados, ou no exercício da autoridade pública de que estão investidos a instituição ou o órgão comunitário ou um terceiro a quem os dados sejam comunicados; ou

b)      For necessário para o respeito de uma obrigação jurídica a que o responsável pelo tratamento esteja sujeito; ou

[…]

d)      A pessoa em causa tiver dado de forma inequívoca o seu consentimento […]

Artigo 8.°

Transferência de dados pessoais para destinatários, distintos das instituições e dos órgãos comunitários, abrangidos pela Directiva 95/46 […]

Sem prejuízo dos artigos 4.° 5.°, 6.° e 10.°, os dados pessoais só podem ser transferidos para destinatários abrangidos por legislação nacional aprovada por força da Directiva 95/46[…], se:

a)      O destinatário demonstrar que os dados são necessários no desempenho de funções de interesse público ou inerentes ao exercício da autoridade pública, ou

b)      O destinatário demonstrar a necessidade da sua transferência e não existirem motivos para supor que os interesses legítimos da pessoa em causa podem ser prejudicados

[…]

Artigo 18.°

Direito de oposição da pessoa em causa

A pessoa em causa tem o direito de:

a)      Se opor em qualquer momento, por razões imperiosas e legítimas relacionadas com a sua situação particular, a que os dados que lhe digam respeito sejam objecto de tratamento, excepto nos casos referidos nas alíneas b) [a] d) do artigo 5.° Em caso de oposição justificada, o referido tratamento deixa de poder incidir sobre esses dados;

[…]»

13      O artigo 8.° da Convenção para a protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma em 4 de Novembro de 1950 (CEDH) dispõe:

«1.      Qualquer pessoa tem direito ao respeito da sua vida privada e familiar, do seu domicílio e da sua correspondência.

2.      Não pode haver ingerência da autoridade pública no exercício deste direito senão quando esta ingerência estiver prevista na lei e constituir uma providência que, numa sociedade democrática, seja necessária para a segurança nacional, para a segurança pública, para o bem–estar económico do país, a defesa da ordem e a prevenção das infracções penais, a protecção da saúde ou da moral, ou a protecção dos direitos e das liberdades de terceiros.»

14      A Carta dos direitos fundamentais da União Europeia, proclamada em 7 de Dezembro de 2000 em Nice (JO C 364, p. 1, a seguir «carta») prevê:

«Artigo 7.°

Respeito pela vida privada e familiar

Todas as pessoas têm direito ao respeito pela sua vida privada e familiar, pelo seu domicílio e pelas suas comunicações.

Artigo 8.°

Protecção de dados pessoais

«1.      Todas as pessoas têm direito à protecção dos dados de carácter pessoal que lhes digam respeito.

2.      Esses dados devem ser objecto de um tratamento leal, para fins específicos e com o consentimento da pessoa interessada ou com outro fundamento legítimo previsto por lei. Todas as pessoas têm o direito de aceder aos dados coligidos que lhes digam respeito e de obter a respectiva rectificação.

3.      O cumprimento destas regras fica sujeito a fiscalização por parte de uma autoridade independente.

[…]

Artigo 42.°

Direito de acesso aos documentos

Qualquer cidadão da União, bem como qualquer pessoa singular ou colectiva com residência ou sede social num Estado‑Membro, tem direito de acesso aos documentos do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão.

[…]»

 Antecedentes do litígio

15      A sociedade recorrente foi fundada em 28 de Maio de 1992 para importar cerveja alemã para venda em estabelecimentos de bebidas no Reino Unido situados principalmente no Norte da Inglaterra.

16      No entanto, a recorrente não pôde vender o seu produto, uma vez que um grande número de empresários de estabelecimentos de venda de bebidas do Reino Unido estão vinculados por contratos de compra exclusiva, que os obrigam a abastecer‑se de cerveja junto de determinados fabricantes de cerveja.

17      Em virtude do Supply of Beer (Tied Estate) Order 1989 SI 1989/2390, (regulamento britânico relativo ao fornecimento de cerveja), as empresas cervejeiras britânicas que detenham direitos em mais de 2 000 pubs são obrigadas a conceder aos titulares desses estabelecimentos a possibilidade de comprarem cerveja proveniente de outras cervejeiras, na condição, segundo o artigo 7.°, n.° 2, alínea a), do referido regulamento, de que ela seja vendida em barril e tenha um teor alcoólico superior a 1,2% em volume. Esta disposição é comummente denominada «Guest Beer Provision» (a seguir «GBP»).

18      Ora, a maior parte das cervejas produzidas fora do Reino Unido não podem ser consideradas «cervejas vendidas em barril», na acepção da GBP, e, por conseguinte, não se incluem no seu âmbito de aplicação.

19      Considerando que a GBP constitui uma medida de efeito equivalente a uma restrição quantitativa às importações e é, portanto, incompatível com o artigo 30.° do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 28.° CE), a recorrente apresentou uma queixa à Comissão, por carta de 3 de Abril de 1993, registada sob a referência P/93/4490/UK.

20      Na sequência do seu inquérito, a Comissão decidiu, em 12 de Abril de 1995, iniciar, contra o Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte, um processo nos termos do artigo 169.° do Tratado CE (actual artigo 226.° CE). A Comissão informou a recorrente, em 28 de Setembro de 1995, da existência deste inquérito e do envio ao Reino Unido, em 15 de Setembro de 1995, de uma notificação para cumprir. Em 26 de Junho de 1996, a Comissão decidiu enviar um parecer fundamentado ao Reino Unido e, em 5 de Agosto de 1996, publicou um comunicado de imprensa anunciando essa decisão.

21      Em 11 de Outubro de 1996, realizou‑se uma reunião (a seguir «reunião de 11 de Outubro de 1996»), na qual participaram representantes da Direcção Geral (DG) «Mercado Interno e Serviços Financeiros» da Comissão, do Ministério do Comércio e da Indústria do Reino Unido e representantes da Conféderation des Brasseurs du Marché Commun (a seguir «CBMC»). A recorrente pediu para participar na reunião por carta de 27 de Agosto de 1996, mas a Comissão indeferiu o seu pedido.

22      Em 15 de Março de 1997, o Ministério do Comércio e da Indústria do Reino Unido anunciou um projecto de alteração da GBP, nos termos do qual uma cerveja engarrafada pode ser revendida como cerveja de proveniência diferente, tal como a cerveja em barril. Após a Comissão ter suspendido, por duas vezes, em 19 de Março de 1997 e em 26 de Julho de 1997, a sua decisão de dirigir um parecer fundamentado ao Reino Unido, o chefe da Unidade 2 «Aplicação dos artigos 30.° a 36.° do Tratado CE (notificações, queixas, infracções, etc.) e eliminação das restrições às trocas comerciais» da Direcção B «Livre Circulação de Mercadorias e Contratos Públicos» da DG «Mercado Interno e Serviços Financeiros» informou a recorrente, por carta de 21 de Abril de 1997, de que, em relação ao projecto de revisão da GBP, o processo nos termos do artigo 169.° do Tratado tinha sido suspenso e que o parecer fundamentado não tinha sido notificado ao Governo do Reino Unido. Indicou que este processo seria arquivado logo que a alteração à GBP entrasse em vigor. A nova versão da GBP entrou em vigor em 22 de Agosto de 1997. Por conseguinte, o parecer fundamentado nunca foi enviado ao Reino Unido e a Comissão decidiu, por fim, em 10 de Dezembro de 1997, arquivar o processo de infracção.

23      A recorrente pediu ao director‑geral da DG «Mercado Interno e Serviços Financeiros», por fax enviado em 21 de Março de 1997, uma cópia do parecer fundamentado, em conformidade com o Código de Conduta. Este pedido foi indeferido, tendo‑o sido também a sua reiteração.

24      Por carta de 18 de Setembro de 1997 (a seguir «decisão de 18 de Setembro de 1997»), o secretário‑geral da Comissão confirmou o indeferimento do pedido dirigido ao director‑geral da DG «Mercado Interno e Serviços Financeiros».

25      A recorrente interpôs recurso, registado com a referência T‑309/97, para o Tribunal de Primeira Instância da decisão de 18 de Setembro de 1997. Por acórdão de 14 de Outubro de 1999, Bavarian Lager/Comissão (T‑309/97, Colect., p. II‑3217), o Tribunal de Primeira Instância negou provimento a este recurso, considerando que a prossecução do objectivo em causa, designadamente, permitir ao Estado‑Membro cumprir voluntariamente as exigências do Tratado ou, eventualmente, permitir‑lhe justificar a sua posição, justifica, a título de protecção do interesse público, a recusa de acesso a um documento preparatório relativo à fase de inquérito do processo nos termos do artigo 169.° do Tratado CE.

26      Em 4 de Maio de 1998, a recorrente apresentou à Comissão um pedido de acesso a todos os documentos juntos ao processo P/93/4490/UK por onze sociedades e organizações identificadas e por três categorias definidas de pessoas ou de empresas, nos termos do Código de Conduta. A Comissão indeferiu o pedido inicial com base em que o Código de Conduta apenas se aplica aos documentos da autoria da Comissão. O pedido confirmativo foi indeferido por a Comissão não ser a autora dos documentos em questão e por todos os pedidos deverem ser dirigidos ao respectivo autor.

27      Em 8 de Julho de 1998, a recorrente apresentou uma queixa, registada sob a referência 713/98/IJH, ao Provedor de Justiça Europeu, precisando, por carta de 2 de Fevereiro de 1999, que pretendia obter o nome dos representantes da CBMC que tinham assistido à reunião de 11 de Outubro de 1996 e o das sociedades e das pessoas das catorze categorias identificadas pela recorrente no seu pedido inicial de acesso aos documentos dos quais constavam as observações transmitidas à Comissão no âmbito do processo P/93/4490/UK.

28      Na sequência de uma troca de correspondência entre o Provedor de Justiça e a Comissão, esta indicou‑lhe em Outubro e Novembro de 1999 que, relativamente às 45 cartas que tinha enviado às pessoas em causa pedindo‑lhes autorização para divulgar a sua identidade à recorrente, tinha recebido 20 respostas, das quais 14 eram positivas e 6 negativas. A Comissão transmitiu o nome e endereço das pessoas que aceitaram que o seu nome fosse comunicado. A recorrente indicou ao Provedor de Justiça que as informações comunicadas pela Comissão ainda estavam incompletas.

29      No seu projecto de recomendação dirigido à Comissão na queixa 713/98/IJH, de 7 de Maio de 2000, o Provedor de Justiça propôs que a Comissão comunicasse à recorrente o nome dos representantes da CBMC que tinham assistido à reunião de 11 de Outubro de 1996 e o das sociedades e das pessoas das catorze categorias identificadas pela recorrente no seu pedido inicial de acesso aos documentos dos quais constavam as observações transmitidas à Comissão no âmbito do processo P/93/4490/UK.

30      No seu parecer fundamentado dirigido ao Provedor de Justiça em 3 de Julho de 2000, a Comissão reiterou a necessidade do consentimento da pessoa em causa, embora indicasse que podia comunicar o nome das pessoas que não tinham respondido ao seu pedido de autorização, dado que, na ausência de resposta, o interesse e os direitos fundamentais das pessoas em causa não deviam prevalecer. Por conseguinte, acrescentou o nome de outras 25 pessoas.

31      Em 23 de Novembro de 2000, o Provedor de Justiça remeteu o seu relatório especial dando sequência ao projecto de recomendação dirigido à Comissão na queixa 713/98/IJH (a seguir «relatório especial»), no qual concluiu que não existia um direito fundamental que se opusesse à divulgação de informações comunicadas a uma autoridade administrativa sob sigilo e que a Directiva 95/46 não exige que a Comissão mantenha sob sigilo o nome das pessoas que lhe comunicam opiniões ou informações no âmbito do exercício das suas funções.

32      Em 30 de Setembro de 2002, o Provedor de Justiça enviou uma carta ao Presidente da Comissão, Romano Prodi, indicando:

«O Provedor de Justiça teme que as regras sobre a protecção de dados estejam a ser incorrectamente interpretadas no sentido de que implicam a existência de um direito geral de participar anonimamente em actividades públicas. Esta interpretação errada pode violar o princípio da transparência e o direito de acesso do público aos documentos, tanto a nível comunitário como nos Estados‑Membros em que o princípio da transparência e o acesso do público aos documentos estejam consagrados em normas constitucionais.»

33      Segundo o comunicado de imprensa do Provedor de Justiça n.° 23/2001, de 12 de Dezembro de 2001, o Parlamento aprovou uma resolução sobre o relatório especial solicitando à Comissão que fornecesse as informações requeridas pela recorrente.

34      Por correio electrónico de 5 de Dezembro de 2003, a recorrente solicitou à Comissão o acessos aos documentos mencionados no n.° 27 supra com base no Regulamento n.° 1049/2001.

35      A Comissão respondeu a este pedido por carta de 27 de Janeiro de 2004 em que afirmou que determinados documentos relativos à reunião podiam ser divulgados, embora chamasse a atenção da recorrente para o facto de cinco nomes terem sido truncados na acta da reunião de 11 de Outubro de 1996, uma vez que duas pessoas se opuseram expressamente à divulgação da sua identidade e a Comissão não conseguiu contactar as outras três.

36      Por correio electrónico de 9 de Fevereiro de 2004, a recorrente apresentou um pedido confirmativo na acepção do artigo 7.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1049/2001, para obter a acta completa da reunião de 11 de Outubro de 1996, em que constava o nome de todos os participantes.

37      Por carta de 18 de Março de 2004 (a seguir «decisão recorrida»), a Comissão indeferiu o pedido confirmativo da recorrente. A Comissão confirmou que o Regulamento n.° 45/2001 se aplicava ao pedido de divulgação da identidade dos outros participantes. Não tendo a recorrente demonstrado nenhum objectivo expresso e legítimo nem a necessidade desta divulgação, os requisitos previstos no artigo 8.° do referido regulamento não estavam preenchidos e a excepção prevista no artigo 4.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 1049/2001 era aplicável. A Comissão acrescenta que, mesmo que as regras em matéria de protecção de dados pessoais não se aplicassem, seria possível recusar a divulgação dos outros nomes ao abrigo do artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001, para não comprometer a sua capacidade de realizar inquéritos.

 Processo e pedidos das partes

38      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 27 de Maio de 2004, a recorrente interpôs o presente recurso.

39      Por despacho de 6 de Dezembro de 2004, o presidente da Terceira Secção do Tribunal de Primeira Instância admitiu a intervenção da República da Finlândia em apoio dos pedidos da recorrente. Na sequência da desistência por parte da República da Finlândia da sua intervenção, o presidente da Terceira Secção do Tribunal de Primeira Instância, por despacho de 27 de Abril de 2005, anulou esta intervenção.

40      Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 28 de Fevereiro de 2006, a Autoridade Europeia para a Protecção de Dados (AEPD) requereu a admissão da sua intervenção no presente processo em apoio da recorrente. Por despacho de 6 de Junho de 2006, o presidente da Terceira Secção do Tribunal de Primeira Instância admitiu a sua intervenção.

41       No âmbito das medidas de organização do processo, a recorrente e a Comissão foram convidadas a apresentar determinados documentos. Estas cumpriram este pedido nos prazos fixados.

42      Por despacho de 16 de Maio de 2006, em conformidade com o artigo 65.°, alínea b), com o artigo 66.°, n.° 1, e com o artigo 67.°, n.° 3, terceiro parágrafo, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, o Tribunal de Primeira Instância ordenou à Comissão que apresentasse a acta integral da reunião de 11 de Outubro de 1996, em que constavam os nomes de todos os participantes, esclarecendo embora que este documento não seria entregue à recorrente no âmbito do presente processo. A referida ordem foi cumprida.

43      As partes apresentaram alegações orais e responderam às questões orais colocadas pelo Tribunal de Primeira Instância na audiência de 13 de Setembro de 2006.

44      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        Declarar que a aceitação por parte da Comissão da alteração efectuada pelo Governo britânico à GBP é contrária ao artigo 30.° do Tratado CE (actual artigo 28.° CE);

–        Declarar que a Comissão não devia ter aceite a alteração anteriormente referida e que, ao fazê‑lo violou o artigo 30.° do Tratado CE;

–        Anular a decisão recorrida;

–        Ordenar à Comissão que indique o nome de todas as pessoas que assistiram à reunião;

–        Condenar a Comissão nas despesas.

45      Na audiência, a CEPD, em apoio do pedido de acesso aos documentos apresentado pela recorrente, concluiu pedindo que o Tribunal se digne anular a decisão recorrida.

46      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        Declarar inadmissíveis os pedidos relativos ao procedimento por incumprimento;

–        Julgar improcedente o pedido de anulação da decisão recorrida;

–        Declarar inadmissível o pedido relativo à divulgação do nome de todas as pessoas que participaram na reunião;

–        Condenar a recorrente nas despesas.

 Quanto à admissibilidade do pedido de que o Tribunal de Primeira Instância ordene à Comissão a indicação do nome de todas as pessoas que assistiram à reunião

47      Resulta de jurisprudência constante que o Tribunal de Primeira Instância, no quadro dos seus poderes de fiscalização da legalidade, não pode dirigir uma intimação às instituições nem substituir‑se‑lhes. Esta limitação da fiscalização da legalidade aplica‑se em todos os domínios contenciosos que o Tribunal de Primeira Instância pode decidir, incluindo o do acesso aos documentos (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 12 de Julho de 2001, Mattila/Conselho e Comissão, T‑204/99, Colect., p. II‑2265, n.° 26, confirmado pelo acórdão do Tribunal de Justiça de 22 de Janeiro de 2004, Mattila/Conselho e Comissão, C‑353/01 P, Colect., p. I‑1073, n.° 15).

48      Por conseguinte, a recorrente não pode pedir ao Tribunal de Primeira Instância que ordene à Comissão que lhe comunique o nome de todas as pessoas que assistiram à reunião de 11 de Outubro de 1996.

 Quanto ao arquivamento ilegal do procedimento por incumprimento nos termos do artigo 169.° do Tratado CE

 Argumentos das partes

49      A recorrente alega que a Comissão aceitou arquivar um procedimento por incumprimento, em violação do artigo 30.° do Tratado CE ou, a título subsidiário, do artigo 6.° do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 12.° CE), do qual a reunião de 11 de Outubro de 1996 constituía um elemento fundamental.

50      Com efeito, uma vez que a Comissão indeferiu o pedido da recorrente de assistir à reunião e arquivou incorrectamente o procedimento por incumprimento, que a GBP alterada continuou a discriminar as cervejas provenientes de outros Estados‑Membros além do Reino Unido e que a Comissão se mostrou extremamente reticente em divulgar o nome dos participantes na reunião, esta reunião foi utilizada como um meio para o Governo do Reino Unido e as grandes sociedades produtoras de cerveja do Reino Unido persuadirem a Comissão a aceitar uma alteração destinada a impedir os importadores de cerveja como a recorrente de vender os seus produtos numa parte importante do mercado britânico. Segundo a recorrente, esta concertação, para conseguir um arquivamento ilegal do procedimento por incumprimento, levou a que perdesse uma oportunidade e, consequentemente, causou‑lhe prejuízos financeiros significativos. Por conseguinte, o artigo 30.° do Tratado CE foi violado.

51      A recorrente alega que a GBP alterada também é contrária ao artigo 6.° do Tratado CE, na medida em que tem por efeito criar uma discriminação baseada na nacionalidade em desfavor das cervejas produzidas noutros Estados‑Membros que não o Reino Unido.

52      A Comissão considera, no essencial, que os pedidos da recorrente de que seja declarado que a sua aceitação da alteração efectuada pelo Governo do Reino Unido à GBP é contrária ao artigo 30.° do Tratado CE, que não a devia ter aceitado e que, ao fazê‑lo, violou o artigo 30.° do Tratado CE são manifestamente inadmissíveis.

 Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

53      A recorrente pede ao Tribunal de Primeira Instância que declare que a aceitação pela Comissão da alteração efectuada pelo Governo britânico à GBP é contrária aos artigos 30.° e 6.° do Tratado CE. Este pedido deve ser entendido no sentido de que a recorrente invoca, na realidade, que a Comissão arquivou incorrectamente a sua denúncia das medidas do Reino Unido alegadamente contrárias ao direito comunitário.

54      A este respeito, importa recordar que um particular não pode pedir a anulação de uma decisão negativa da Comissão de dar início a uma acção por incumprimento contra um Estado‑Membro (despacho do Tribunal de Justiça de 12 de Junho de 1992, Asia Motor France/Comissão, C‑29/92, Colect., p. I‑3935, n.° 21, e despachos do Tribunal de Primeira Instância de 15 de Março de 2004, Institouto N. Avgerinopoulou e o./Comissão, T‑139/02, Colect., p. II‑875, n.° 76, e de 19 de Setembro de 2005, Aseprofar e Edifa/Comissão, T‑247/04, Colect., p. II‑3449, n.° 40).

55      Com efeito, resulta do artigo 169.° do Tratado CE que a Comissão não é obrigada a propor uma acção por incumprimento, mas dispõe, a esse respeito, de um poder de apreciação discricionário que exclui o direito de os particulares exigirem à instituição que tome posição num determinado sentido e de interporem um recurso de anulação contra a sua recusa de agir (despachos do Tribunal de Primeira Instância de 16 de Fevereiro de 1998, Smanor e o./Comissão, T‑182/97, Colect., p. II‑271, n.° 27, e Institouto N. Avgerinopoulou e o./Comissão, já referido, n.° 77).

56      No caso em apreço, a recorrente não pode, portanto, pedir a anulação de uma decisão negativa da Comissão de dar início a um procedimento por incumprimento contra o Reino Unido pelo facto de a GBP alterada violar os artigos 6.° e 30.° do Tratado CE. Nestas circunstâncias, não se pode acusar a própria Comissão de ter violado estes artigos ao arquivar o processo em questão.

57      Em qualquer caso, na hipótese de o pedido da recorrente não visar a anulação da referida recusa mas a da decisão relativa ao arquivamento da sua denúncia de 10 de Dezembro de 1997, há que recordar que a decisão pela qual a Comissão arquiva uma denúncia que a informa de uma actuação de um Estado susceptível de dar início a um processo por incumprimento não tem força vinculativa e não constitui, portanto, um acto recorrível (despacho Aseprofar et Edifa/Comissão, já referido, n.° 48). De resto, o recurso é manifestamente extemporâneo tendo em conta a data desta decisão.

58      Nestas circunstâncias, os fundamentos da recorrente relativos ao arquivamento da sua denúncia são inadmissíveis.

59      Por outro lado, relativamente ao fundamento da recorrente segundo o qual o arquivamento ilegal do procedimento por incumprimento da sua denúncia acarretou a perda de uma oportunidade e prejuízos financeiros significativos, basta declarar que a recorrente não formulou nenhum pedido de indemnização no âmbito do seu recurso. Por conseguinte, não há que decidir a este respeito.

 Quanto ao acesso aos documentos

 Argumentos das partes

60      A recorrente alega que, em conformidade com as conclusões do relatório especial do Provedor de Justiça, a excepção prevista no artigo 4.°, n.° 1, alínea b, do Regulamento n.° 1049/2001 não é aplicável ao caso em apreço, dado que a Directiva 95/46 não obriga a Comissão a manter sob sigilo o nome das pessoas que lhe comunicam opiniões ou informações. A recorrente refere‑se, a este respeito, à carta do Provedor de Justiça enviada ao presidente da Comissão em 30 de Setembro de 2002, referida no n.° 32 supra, na qual acusa a Comissão de aplicar erradamente a Directiva 95/46.

61      Além disso, o artigo 4.°, n.° 3, do Regulamento n.° 1049/2001 também não se aplica. Com efeito, tendo‑se a reunião realizado em 1996, o processo decisório da Comissão não podia ser eventualmente afectado pela divulgação a não ser numa medida muito limitada, uma vez que decorreram sete anos entre a realização dessa reunião e a data de interposição do recurso. No entanto, mesmo que esta disposição se aplicasse, a Comissão não a pode invocar em apoio da sua recusa de divulgar as informações solicitadas, dado que, no caso em apreço, existe um interesse público superior nessa divulgação. Com efeito, o Provedor de Justiça e o Parlamento estão particularmente interessados, no presente processo, no facto de terceiros influentes poderem ter comunicado a sua opinião à Comissão no mais absoluto segredo, o que é contrário ao princípio da transparência.

62      Na sua réplica, a recorrente alega que há um elemento novo na contestação, ou seja, que as pessoas cuja identidade a recorrente solicitou fosse divulgada eram representantes da CBMC e que estas agiram em conformidade com as instruções da entidade que representavam. A recorrente defende, por conseguinte, que uma vez que a Comissão revelou que estas pessoas eram representantes da CBMC, esta afirmação é actualmente pública e a reputação da Comissão em matéria de respeito da confidencialidade não seria comprometida pela divulgação do nome destas pessoas.

63      A recorrente recorda que as associações profissionais, como a CBMC, representam habitualmente todos os operadores de um mercado determinado ou a maioria dentre eles, pelo que tendem a expor um ponto de vista em nome da totalidade dos operadores de um sector. A reputação da Comissão apenas poderia ser comprometida se se demonstrasse que, na reunião de 11 de Outubro de 1996, os representantes da CBMC tinham representado um grupo de empresas cervejeiras determinado com o objectivo de manter o encerramento do mercado da cerveja vendida nos estabelecimentos de bebidas no Reino Unido. Segundo a recorrente, esta perda da confidencialidade não apresenta nenhum risco quando as informações tenham sido comunicadas por empregados desta associação profissional, a menos que esta não exponha correctamente o ponto de vista de todos os seus membros.

64      A recorrente concluiu que o artigo 2.° do Regulamento n.° 1049/2001 impõe à Comissão a divulgação completa do nome dos participantes na reunião e das observações transmitidas no âmbito do procedimento por incumprimento e que nenhuma das excepções enunciadas no artigo 4.° do Regulamento n.° 1049/2001 é aplicável no caso vertente.

65      A CEPD alega, como um dos argumentos apresentados na audiência, que a Comissão violou o artigo 4.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 1049/2001. A este respeito, faz referência a um documento intitulado «acesso do público aos documentos e protecção de dados» (Documentos de referência, de Julho de 2005 n.° 1, CEPD – Autoridade Europeia para a Protecção de Dados), que se encontra no seu sítio Internet.

66      A CEPD sublinha a necessidade de alcançar o melhor equilíbrio entre a protecção de dados pessoais e o direito fundamental do cidadão europeu de ter acesso aos documentos das instituições. Ora, a argumentação da Comissão não tem em conta este equilíbrio que é explicitamente prescrito pelo artigo 4.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 1049/2001. Com efeito, um pedido de acesso a documentos assenta em princípios democráticos, não sendo necessário mencionar as razões pelas quais os documentos foram pedidos, e, portanto, a aplicação do artigo 8.° do Regulamento n.° 45/2001 não é pertinente no caso em apreço. Do mesmo modo, a CEPD considera que as regras de protecção de dados não permitem que se retire delas um direito geral de participar, de forma anónima, em actividades públicas.

67      Segundo a CEPD, o interesse protegido no artigo 4.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 1049/2001 é a vida privada e não protecção de dados pessoais que é um conceito muito mais amplo do que o de vida privada. Embora o nome de um participante, mencionado numa acta de uma reunião, entre no âmbito dos dados pessoais, uma vez que a identidade dessa pessoa é revelada e o conceito de protecção de dados pessoais seja aplicável a esses dados, independentemente de fazerem parte ou não da vida privada, a CEPD recorda que, no âmbito das actividades profissionais, a divulgação de um nome não tem geralmente relação com a vida privada. Daqui deduz que a Comissão não pode invocar o artigo 4.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 1049/2001 para recusar a divulgação do nome das pessoas em causa.

68      A CEPD conclui que, em qualquer caso, o artigo 4.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 1049/2001, deve ser interpretado no sentido de que o direito de recusar a divulgação não é um direito absoluto mas pressupõe que a vida privada seja devassada de forma grave ou considerável, o que deve ser apreciado à luz das regras e dos princípios da protecção de dados pessoais. Não existe um direito geral atribuído à pessoa em causa de se opor à divulgação. A pessoa em causa que se oponha à divulgação deve apresentar uma razão plausível, explicando o motivo pelo qual a divulgação é susceptível de lhe causar um prejuízo.

69      A Comissão alega que o pedido de anulação da decisão recorrida é desprovido de fundamento. Assinala que, no caso em apreço, está em causa a interacção de dois direitos, designadamente o direito de acesso do público aos documentos e o direito à protecção da vida privada e de dados.

70      Por um lado, o direito de acesso do público aos documentos, em conformidade com o Regulamento n.° 1049/2001, não está sujeito a restrições, é automático e não depende do interesse particular de uma pessoa que pede o acesso a um documento. A pessoa que apresenta este pedido não é normalmente obrigada a fornecer razões para tal.

71      Por outro lado, os dados pessoais apenas podem ser divulgados de forma leal e legítima com base nos princípios fundamentais que regem o direito à vida privada e nas disposições específicas aplicáveis em matéria de tratamento de dados pessoais. A Comissão invoca o artigo 8.° da CEDH, o artigo 286.° CE e os artigos 7.° e 8.° da Carta. As disposições do Regulamento n.° 45/2001 dispõem que a pessoa que solicita acesso a dados pessoais deve provar que a divulgação destes dados é necessária e assegurar à Comissão que esse facto não prejudicará os interesses legítimos da pessoa em causa.

72      A Comissão assinala que a recorrente não apresenta argumentos jurídicos para sustentar a tese segundo a qual a excepção prevista no artigo 4.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 1049/2001 e posteriormente pelo Regulamento n.° 45/2001, não é aplicável, limitando‑se, pelo contrário, a invocar o projecto de recomendações do Provedor de Justiça e a resolução do Parlamento Europeu que o apoia. Ora, a conclusão do Provedor de Justiça baseia‑se numa interpretação da Directiva 95/46 e do Código de Conduta que o Tribunal de Justiça, posteriormente, desaprovou (acórdão do Tribunal de Justiça de 6 de Março de 2003, Interporc/Comissão, C‑41/00 P, Colect., p. I‑2125; acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 7 de Dezembro de 1999, Interporc/Comissão, T‑92/98, Colect., p. II‑3521, n.° 70, e de 16 de Outubro de 2003, Co‑Frutta/Comissão, T‑47/01, Colect., p. II‑4441, n.os 63 e 64). Além disso, dado que o último pedido de acesso foi apresentado pela recorrente após a entrada em vigor dos Regulamentos n.° 1049/2001 e n.° 45/2001, importa examinar a recusa da Comissão de divulgar as informações solicitadas à luz destas regras. De qualquer modo, não compete ao Provedor de Justiça nem ao Parlamento darem uma interpretação definitiva da lei.

73      A Comissão alega que o Tribunal de Justiça confirmou a sua posição no que respeita ao âmbito das regras de protecção de dados pessoais. O Tribunal de Justiça declarou que as regras de protecção de dados pessoais e, designadamente o princípio da proporcionalidade, se aplicam em matéria de publicação do nome de pessoas singulares mesmo quando se trate de empregados do sector público e que o tratamento seja feito no interesse geral (acórdão do Tribunal de Justiça de 20 de Maio de 2003, Österreichischer Rundfunk e o., C‑465/00, C‑138/01 e C‑139/01, Colect., p. I‑4989, n.° 64). Este entendimento, em relação à Directiva 95/46, foi ulteriormente confirmado pelo Tribunal de Justiça no acórdão de 6 de Novembro de 2003, Lindqvist (C‑101/01, Colect., p. I‑12971, n.° 24), segundo o qual o conceito de «dados pessoais» abrange, seguramente, o nome de uma pessoa a par do seu contacto telefónico ou de informações relativas às suas condições de trabalho ou aos seus passatempos.

74      A Comissão sublinha que o método específico que permite conciliar o direito de acesso do público aos documentos e o direito à vida privada e à protecção de dados está previsto no artigo 4.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 1049/2001 que deve ser lido em conjugação com o décimo primeiro considerando do referido regulamento, segundo o qual «[a]o avaliar as excepções, as instituições deverão ter em conta os princípios estabelecidos na legislação comunitária relativos à protecção de dados pessoais em todos os domínios de actividade da União». Esta excepção não deve ser ponderada com um interesse público superior que justifica a divulgação do documento em causa, por força do Regulamento n.° 1049/2001, mas exige especificamente às instituições comunitárias que recusem o acesso a um documento se a sua comunicação comprometer a protecção da vida privada e a dos dados pessoais.

75      O Regulamento n.° 1049/2001 não impede a divulgação ou qualquer outro tratamento de dados pessoais pela Comissão, mas fornece o meio de decidir caso a caso se uma instituição pode proceder de forma lícita e leal ao tratamento de dados pessoais, e se este tratamento não compromete a protecção de dados.

76      A Comissão assinala que se, num caso específico e em conformidade com o Regulamento n.° 45/2001, o tratamento for efectuado de forma leal e lícita, não se pode invocar a excepção ao direito de acesso do público prevista no artigo 4.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 1049/2001, e o documento que contém os dados pessoais deve ser divulgado. Em contrapartida, se o tratamento for ilícito e desleal e se o requerente não puder justificar a necessidade da divulgação, a Comissão não é obrigada a divulgar esses dados.

77      A Comissão sustenta que, uma vez que os dois direitos em questão têm a mesma natureza, a mesma importância e o mesmo grau, devem ser aplicados conjuntamente e deve ser encontrado um equilíbrio em cada caso particular relativo a um pedido de acesso a um documento público que contenha dados pessoais.

78      A Comissão refere um relatório sobre a situação dos direitos fundamentais na União Europeia e nos seus Estados‑Membros, redigido em 2002 pela rede UE de peritos em direitos fundamentais CFR‑CDF, segundo o qual «tendo em conta a possibilidade de apenas ser concedido um acesso parcial a certos documentos, a instituição comunitária não pode conceder um direito de acesso aos documentos quando o interesse do requerente não apresentar nenhuma relação razoável de proporcionalidade com o prejuízo causado ao direito da pessoa em causa à preservação da sua vida privada perante o tratamento de dados pessoais.»

79      A necessidade deste entendimento equilibrado foi posta em evidência pelo grupo de trabalho sobre protecção de dados instituído pelo artigo 29.° da Directiva 95/46, no seu parecer 5/2001, de 17 de Maio de 2001, sobre o relatório especial do Provedor de Justiça. Segundo este parecer:

«[…], devemos salientar que a obrigação de comunicação ao público imposta pela legislação sobre o acesso do público aos documentos administrativos não institui uma obrigação absoluta de transparência. Antes faz obedecer essa obrigação de conceder o acesso aos documentos à protecção da vida privada. Assim, não justifica de forma ilimitada ou incondicional a comunicação dos dados pessoais. Pelo contrário, a leitura conjunta da legislação sobre acesso do público a documentos e protecção de dados normalmente impõe que seja feita uma análise casuística das circunstâncias, para se obter um equilíbrio entre esses dois direitos. Em particular, como resultado de tal avaliação, a legislação sobre o acesso do público pode instituir diferentes medidas para diferentes categorias de dados ou diferentes tipos de titulares.»

80      A Comissão recorda que o Regulamento n.° 1049/2001 não prevê a obrigação automática e ilimitada de divulgar documentos ou partes de documentos relativos a dados pessoais, pelo contrário, esta obrigação apenas existe na medida em que não infrinja as regras aplicáveis em matéria de protecção de dados.

81      No caso em apreço, a Comissão teve em conta todas as circunstâncias do processo. Quanto aos representantes das autoridades britânicas e da CBMC, a recorrente foi amplamente informada dos interesses e das entidades representadas na reunião. Na qualidade de representantes, as pessoas presentes agiram em conformidade com as instruções das entidades que representavam, como representantes destas e não a título pessoal. A Comissão assinala que os resultados das decisões tomadas na reunião diziam respeito às entidades representadas e não aos seus representantes a título pessoal. Portanto, é a informação relativa às entidades representadas que constitui a informação pertinente a sujeitar a exame do público em aplicação do princípio da transparência e a recusa por parte da Comissão em divulgar a identidade das pessoas que representavam esses interesses não deve ser considerada prejudicial para os direitos da recorrente. A Comissão também teve em conta a necessidade de não comprometer a sua capacidade de realizar inquéritos e as suas fontes de informação.

82      Além disso, a Comissão alega que a recorrente nunca cumpriu a sua obrigação de demonstrar a necessidade da transferência prevista no artigo 8.°, alínea b), do Regulamento n.° 45/2001. Com efeito, a comunicação da identidade dos participantes não permite fornecer esclarecimentos suplementares sobre a decisão da Comissão de arquivar o procedimento por incumprimento. Uma vez que a acta foi divulgada, o público foi amplamente informado dos factos e dos argumentos com base nos quais a Comissão tomou a sua decisão. Por conseguinte, na medida em que não foi apresentada qualquer razão específica e válida para provar a necessidade de divulgar dados pessoais a terceiros, a Comissão foi obrigada a recusar essa divulgação.

83      Segundo a Comissão, contrariamente ao afirmado pela recorrente na réplica, o facto de os nomes do pessoal da CBMC serem públicos não significa que o mesmo deva acontecer em relação à identidade das pessoas que participaram na reunião. A Comissão assinala que daí não decorre que o nome de determinados representantes de uma associação profissional que a tenham representado numa reunião possa necessariamente ser inferido da publicitação da identidade de todo o seu pessoal. Com efeito, se fosse esse o caso, a recorrente não teria qualquer razão para pedir que lhe comunicassem esses nomes. Acresce que a recorrente não sugeriu que os representantes da CBMC não tivessem defendido os pontos de vista da associação na reunião. A recorrente não demonstrou de que forma a divulgação da identidade das pessoas em causa forneceria informações mais pertinentes do que as incluídas na acta da reunião e nos outros documentos distribuídos.

84      No que respeita aos argumentos da recorrente relativos à alegada aplicação do artigo 4.°, n.° 3, do Regulamento n.° 1049/2001, a Comissão sublinha que não baseou a sua recusa de divulgar os nomes nessa excepção, mas na prevista no artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do referido regulamento.

85      A recorrente foi informada de que, mesmo que as regras em matéria de protecção de dados não se aplicassem ao seu pedido, a Comissão tinha o direito de se recusar a divulgar o nome de cinco pessoas contra a vontade destas a fim de não comprometer a sua capacidade de realizar inquéritos sobre alegadas infracções à legislação comunitária. A reunião de 11 de Outubro de 1996 teve lugar no âmbito de um tal inquérito. Se o nome de pessoas que forneceram informações à Comissão pudesse ser divulgado contra a sua vontade, a Comissão poderia ser privada de uma fonte preciosa de informação, o que poderia comprometer a sua capacidade de realizar estes inquéritos.

86      Por outro lado, a Comissão recorda que, no âmbito das denúncias e dos processos por incumprimento, os denunciantes têm a possibilidade de escolher um tratamento «confidencial» ou «não confidencial». Nenhuma razão válida permite recusar às outras partes em causa no procedimento por incumprimento a possibilidade de beneficiar do mesmo direito.

87      Consequentemente, a excepção prevista no artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001 impôs que não fossem transmitidos à recorrente os cinco nomes que permaneceram anónimos.

88      Por último, a Comissão observa que a recorrente não apresentou a prova de um «interesse público superior na divulgação» desses nomes, que lhe permitiria opor‑se à aplicação dessa excepção.

89      No caso em apreço, a divulgação do nome de outras pessoas, contra a sua vontade e contrariamente à sua expectativa em relação à confidencialidade quando colaboraram no inquérito sobre a resumida infracção, comprometeria a protecção de todos os inquéritos. Portanto, o interesse público manifesto exige que a confidencialidade dos inquéritos seja preservada e não comprometida.

 Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

 Observações preliminares

90      Importa referir, a título liminar, que o pedido de acesso da recorrente ao documento completo, e a sua petição, se baseiam no Regulamento n.° 1049/2001.

91      Em seguida, há que recordar que, na decisão recorrida, a Comissão considerou que o Regulamento n.° 45/2001 se aplicava ao pedido de divulgação do nome dos participantes na reunião de 11 de Outubro de 1996. A Comissão considerou que, uma vez que a recorrente não demonstrou nenhum objectivo expresso e legítimo nem a necessidade desta divulgação, os requisitos previstos no artigo 8.° do referido regulamento não estavam preenchidos e a excepção prevista no artigo 4.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 1049/2001 era aplicável. A Comissão acrescentou que, mesmo que as regras em matéria de protecção de dados pessoais não se aplicassem, estaria igualmente obrigada a recusar a divulgação dos outros nomes ao abrigo do artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001, para não comprometer a sua capacidade de realizar inquéritos.

92      A este respeito, importa recordar que, nos termos do artigo 6.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1049/2001, o requerente do acesso não é obrigado a justificar o seu pedido e, portanto, não tem que demonstrar qualquer interesse para ter acesso aos documentos pedidos (v., acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 6 de Julho de 2006, Franchet e Byk/Comissão, T‑391/03 e T‑70/04, Colect., p. I‑2023, n.° 82, e a jurisprudência referida).

93      Há que recordar igualmente que o acesso aos documentos das instituições representa o princípio e que uma decisão de recusa só é válida se tiver por base uma das excepções previstas no artigo 4.° do Regulamento n.° 1049/2001.

94      Em conformidade com jurisprudência constante, estas excepções devem ser interpretadas e aplicadas de forma restritiva, a fim de não porem em causa a aplicação do princípio geral consagrado nesse regulamento (v. acórdão do Tribunal de Justiça de 11 de Janeiro de 2000, Países Baixos e van der Wal/Comissão, C‑174/98 P e C‑189/98 P, Colect., p. I‑1, n.° 27; e acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 7 de Fevereiro de 2002, Kuijer/Conselho, T‑211/00, Colect., p. II‑485, n.° 55, e Franchet e Byk/Comissão, já referido, n.° 84).

95      É à luz desta jurisprudência que se deve examinar a aplicação que a Comissão fez das excepções previstas no artigo 4.°, n.° 1, alínea b), e no artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001.

 Quanto à excepção relativa à protecção da vida privada e da integridade do indivíduo, prevista no artigo 4.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 1049/2001

–       Observações preliminares relativas à articulação entre os regulamentos n.° 1049/2001 e n.° 45/2001

96      Importa recordar que, por força do artigo 4.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 1049/2001, as instituições recusarão o acesso aos documentos cuja divulgação possa prejudicar a protecção da vida privada e da integridade do indivíduo, nomeadamente nos termos da legislação comunitária relativa à protecção dos dados pessoais.

97      A este respeito, deve referir‑se que embora a recorrente apenas invoque na sua petição a Directiva 95/46 e não o Regulamento n.° 45/2001, deve ser entender‑se que o recurso também visa o referido regulamento, dado que a decisão recorrida se baseia parcialmente nesse regulamento. Além disso, na audiência, a recorrente invocou correctamente o dito regulamento.

98      A título liminar, importa examinar a relação existente entre os regulamentos n.° 1049/2001 e n.° 45/2001 com vista à aplicação da excepção prevista no artigo 4.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 1049/2001 ao caso em apreço. Para este efeito, importa ter em atenção que eles têm objectivos diferentes. O primeiro visa assegurar a maior transparência possível do processo decisório das autoridades públicas e das informações em que estas baseiam as suas decisões. Destina‑se, portanto, a facilitar ao máximo o exercício do direito de acesso aos documentos e a promover boas práticas administrativas. O segundo tem por objectivo garantir a protecção das liberdades e dos direitos fundamentais das pessoas singulares, designadamente da sua vida privada relativamente ao tratamento de dados pessoais.

99      O décimo quinto considerando do Regulamento n.° 45/2001 indica que o acesso aos documentos, incluindo as condições de acesso aos documentos que contêm dados de carácter pessoal, está previsto nas regulamentações adoptadas com base no artigo 255.° CE.

100    Por conseguinte, o acesso aos documentos que contêm dados pessoais é abrangido pelo âmbito de aplicação do Regulamento n.° 1049/2001, segundo o qual, em princípio, todos os documentos das instituições deverão ser acessíveis ao público. Este prevê igualmente que determinados interesses públicos e privados devem ser protegidos através de excepções.

101    Consequentemente, este regulamento prevê uma excepção, acima recordada, respeitante ao caso em que a divulgação possa prejudicar a protecção da vida privada e da integridade do indivíduo, nomeadamente nos termos da legislação comunitária relativa à protecção dos dados pessoais, como o Regulamento n.° 45/2001.

102    Acresce que, segundo o décimo primeiro considerando do Regulamento n.° 1049/2001, ao avaliar a necessidade de uma excepção, as instituições deverão ter em conta os princípios estabelecidos na legislação comunitária relativos à protecção de dados pessoais em todos os domínios de actividade da União, portanto, também os princípios consagrados no Regulamento n.° 45/2001.

103    A este respeito, há que recordar as disposições mais relevantes do Regulamento n.° 45/2001.

104    Nos termos do artigo 2.°, alínea a), do Regulamento n.° 45/2001, os «dados pessoais» contêm qualquer informação relativa a uma pessoa singular identificada ou identificável. É considerado identificável quem possa ser identificado, directa ou indirectamente, nomeadamente por referência a um número de identificação ou a um ou mais elementos específicos da sua identidade física, fisiológica, psíquica, económica, cultural ou social. Por conseguinte, podem ser considerados dados pessoais, por exemplo, o apelido e os nomes próprios, o endereço postal, o endereço de correio electrónico, o número de conta bancária, os números de cartões de crédito, o número da segurança social, o número de telefone ou ainda o número da carta de condução.

105    Além disso, em conformidade com o artigo 2.°, alínea b), do Regulamento n.° 45/2001, o «tratamento de dados pessoais» compreende qualquer operação ou conjunto de operações efectuadas sobre dados pessoais, com ou sem meios automatizados, tais como a recolha, registo, organização, conservação, adaptação ou alteração, recuperação, consulta, utilização, comunicação por transmissão, divulgação ou qualquer outra forma de colocação à disposição, com comparação ou interconexão, bem como o bloqueio, apagamento ou destruição. Portanto, a comunicação de dados, por transmissão, divulgação ou qualquer outra forma de colocação à disposição, entra da definição do «tratamento» e, assim, o próprio regulamento prevê, independentemente do Regulamento n.° 1049/2001, a possibilidade de tornar públicos determinados dados pessoais.

106    Por outro lado, o tratamento deve ser lícito por força do artigo 5.°, alíneas a) ou b), do Regulamento n.° 45/2001, segundo o qual o tratamento deve ser necessário ao exercício de funções de interesse público ou ao cumprimento de uma obrigação jurídica a que o responsável pelo tratamento esteja vinculado. Importa assinalar que o direito de acesso aos documentos das instituições reconhecido aos cidadãos da União Europeia e a todas as pessoas singulares ou colectivas que residam ou tenham a sua sede social num Estado‑Membro, previsto no artigo 2.° do Regulamento n.° 1049/2001, constitui uma obrigação jurídica na acepção do artigo 5.°, alínea b), do Regulamento n.° 45/2001. Assim, embora o Regulamento n.° 1049/2001 imponha a comunicação de dados, que constitui um «tratamento» na acepção do artigo 2.°, alínea b), do Regulamento n.° 45/2001, o artigo 5.° desse mesmo regulamento confere licitude a essa comunicação para esse efeito.

107    Quanto à obrigação de demonstrar a necessidade da transferência, prevista no artigo 8.°, alínea b), do Regulamento n.° 45/2001, deve recordar‑se que o acesso aos documentos que contêm dados pessoais é abrangido pelo âmbito de aplicação do Regulamento n.° 1049/2001 e que, segundo o seu artigo 6.°, n.° 1, quem requer o acesso não é obrigado a justificar o seu pedido e, portanto, não tem que demonstrar qualquer interesse para ter acesso aos documentos pedidos (v. n.° 92 supra). Consequentemente, no caso de os dados pessoais serem transferidos para cumprimento do artigo 2.° do Regulamento n.° 1049/2001, que prevê o direito de acesso aos documentos de todos os cidadãos da União, a situação cai no âmbito de aplicação deste regulamento e, por isso, o requerente não é obrigado a demonstrar o carácter necessário da divulgação na acepção do artigo 8.°, alínea b), do Regulamento n.° 45/2001. Com efeito, caso se exigisse ao requerente a demonstração do carácter necessário da transferência, como condição suplementar imposta pelo Regulamento n.° 45/2001, esta exigência seria contrária à finalidade do Regulamento n.° 1049/2001, ou seja, o acesso mais amplo possível do público aos documentos na posse das instituições.

108    Além disso, uma vez que, por força do artigo 4.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 1049/2001, o acesso a um documento deve ser recusado se a sua divulgação puder prejudicar a protecção da vida privada e da integridade do indivíduo, uma transferência que não seja abrangida por esta excepção não pode, em princípio, prejudicar os interesses legítimos da pessoa em causa, na acepção do artigo 8.°, alínea b), do Regulamento n.° 45/2001.

109    No que respeita ao direito de oposição da pessoa em causa, o artigo 18.° do Regulamento n.° 45/2001 prevê que esta tem o direito de se opor em qualquer momento, por razões imperiosas e legítimas relacionadas com a sua situação particular, a que os dados que lhe digam respeito sejam objecto de tratamento, excepto nos casos abrangidos, designadamente, pela alínea b), do artigo 5.°, do referido regulamento. Por conseguinte, dado que o tratamento referido no Regulamento n.° 1049/2001 constitui uma obrigação jurídica na acepção do artigo 5.°, alínea b), do Regulamento n.° 45/2001, a pessoa em causa não goza, em princípio, de um direito de oposição. Contudo, uma vez que o artigo 4.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 1049/2001 prevê uma excepção a esta obrigação jurídica, deve ter‑se em conta, sobre esta base, a incidência da divulgação de dados relativos à pessoa em causa.

110    A este respeito, importa assinalar que se a comunicação destes dados não prejudicar a protecção da vida privada e da integridade do indivíduo, como é exigido pelo artigo 4.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 1049/2001, a recusa da pessoa em causa não pode impedir esta comunicação.

111    Por outro lado, há que recordar que as disposições do Regulamento n.° 45/2001, na medida em que regulam o tratamento de dados pessoais susceptíveis de pôr em causa as liberdades fundamentais e, em especial, o direito à vida privada, devem necessariamente ser interpretadas à luz dos direitos fundamentais que, segundo jurisprudência constante, são parte integrante dos princípios gerais de direito cujo respeito é assegurado pelo Tribunal de Justiça e pelo Tribunal de Primeira Instância (v., por analogia, no que respeita à Directiva 95/46, acórdão Österreichischer Rundfunk e o., já referido, n.° 68).

112    Estes princípios foram expressamente reproduzidos no artigo 6.°, n.° 2, EU, nos termos do qual a União respeita os direitos fundamentais tal como garantidos na CEDH e tal como resultam das tradições constitucionais comuns aos Estados‑Membros, enquanto princípios gerais do direito comunitário.

113    A este respeito, cumpre sublinhar que o artigo 8.° da CEDH, enunciando no seu n.° 1 o princípio da não ingerência das autoridades públicas no exercício do direito à vida privada, admite, no n.° 2, que tal ingerência é possível quando «estiver prevista na lei e constituir uma providência que, numa sociedade democrática, seja necessária para a segurança nacional, para a segurança pública, para o bem–estar económico do país, a defesa da ordem e a prevenção das infracções penais, a protecção da saúde ou da moral, ou a protecção dos direitos e das liberdades de terceiros».

114    Deve também observar‑se que, segundo a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, a «vida privada» é um conceito amplo que não se presta a uma definição exaustiva. O artigo 8.° da CEDH protege igualmente o direito à identidade e ao desenvolvimento pessoal bem como o direito de todo o indivíduo a estabelecer e desenvolver relações com os seus semelhantes e com o mundo exterior. Nenhuma razão de princípio permite excluir as actividades profissionais ou comerciais do conceito de «vida privada» (v. TEDH, acórdãos Niemitz c. Alemanha de 16 de Dezembro de 1992, série A n.° 251‑B, § 29; Amann c. Suíça de 16 de Fevereiro de 2000, Recueil des arrêts et décisions, 2000‑II, § 65, e Rotaru c. Roménia de 4 de Maio de 2000, Recueil des arrêts et décisions, 2000‑V, § 43). Existe, portanto, uma zona de interacção entre o indivíduo e outras pessoas que, mesmo num contexto público, pode incluir‑se na «vida privada» (v. TEDH, acórdão Peck c. Reino Unido de 28 de Janeiro de 2003, Recueil des arrêts et décisions, 2003‑I, § 57, e a jurisprudência referida).

115    Para caracterizar a existência de uma violação do artigo 8.° da CEDH, deve determinar‑se, em primeiro lugar, se se verifica uma ingerência na vida privada da pessoa em causa e, em segundo lugar, sendo esse o caso, se essa ingerência se justifica. Para ser justificada, deve estar prevista na lei, prosseguir um fim legítimo e ter um carácter de necessidade numa sociedade democrática. Em relação a esta última condição, a fim de determinar se uma divulgação é «necessária numa sociedade democrática», importa examinar se os motivos invocados para a justificar são «pertinentes e suficientes», e se as medidas adoptadas são proporcionais aos fins legítimos prosseguidos. Nos processos relativos à divulgação de dados pessoais, o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem reconheceu que deve conceder‑se às autoridades competentes uma certa latitude para estabelecer um justo equilíbrio entre os interesses públicos e privados que se encontram em concorrência. No entanto, esta margem de apreciação coexiste com uma fiscalização jurisdicional e a sua extensão depende de factores como a natureza e a importância dos interesses em jogo bem como da gravidade da ingerência (v. acórdão Peck c. Reino Unido, já referido, designadamente § 76 e 77; v. também, conclusões do advogado‑geral P. Léger no acórdão do Tribunal de Justiça de 30 de Maio de 2006, Parlamento/Conselho e Comissão, C‑317/04 e C‑318/04, Colect., p. I‑4721, I‑4724, n.os 226 a 228).

116    Cumpre declarar que qualquer decisão adoptada em aplicação do Regulamento n.° 1049/2001 deve respeitar o artigo 8.° da CEDH, em conformidade com o artigo 6.°, n.° 2, UE. A este respeito, deve recordar‑se que o Regulamento n.° 1049/2001 fixa os princípios e os limites que, por razões de interesse público ou privado, regem o exercício do direito de acesso aos documentos, nos termos do artigo 255.°, n.° 2, CE. Portanto, o artigo 4.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 1049/2001 prevê uma excepção destinada a garantir a protecção da vida privada e da integridade do indivíduo.

117    Por outro lado, deve recordar‑se que as excepções ao princípio do acesso aos documentos devem ser interpretadas de forma restritiva. A excepção prevista no artigo 4.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 1049/2001 apenas diz respeito aos dados pessoais susceptíveis de causar concreta e efectivamente um prejuízo à protecção da vida privada e à integridade do indivíduo.

118    Importa igualmente sublinhar que o facto de o conceito de «vida privada» ser amplo, em conformidade com a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, e de o direito à protecção dos dados pessoais poder constituir um dos aspectos do direito ao respeito da vida privada (v., neste sentido, conclusões do advogado‑geral P. Léger no acórdão Parlamento/Conselho e Comissão, já referidas, n.° 209), não significa que todos os dados pessoais entrem necessariamente no conceito de «vida privada».

119    A fortiori, nem todos os dados pessoais são susceptíveis, pela sua natureza, de causar prejuízo à vida privada da pessoa em causa. Com efeito, no trigésimo terceiro considerando da Directiva 95/46, é feita referência aos dados susceptíveis, pela sua natureza, de pôr em causa as liberdades fundamentais ou o direito à vida privada e que só deverão ser tratados com o consentimento explícito da pessoa em causa, o que indica que nem todos estes dados são da mesma natureza. Estes dados sensíveis podem ser incluídos naqueles a que se refere o artigo 10.° do Regulamento n.° 45/2001, relativo ao tratamento de categorias específicas de dados, como os dados que revelem a origem racial ou étnica, as convicções religiosas ou filosóficas, bem como os dados relativos à saúde e à vida sexual.

120    Resulta de todas as considerações precedentes que, no caso em apreço, para se poder determinar se a excepção prevista no artigo 4.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 1049/2001 é aplicável, deve examinar‑se se o acesso do público à identidade dos participantes na reunião de 11 de Outubro de 1996 é susceptível de causar concreta e efectivamente prejuízos para a protecção da vida privada e à integridade das pessoas em causa.

–       Aplicação ao caso em apreço da excepção relativa ao prejuízo para a protecção da vida privada e à integridade das pessoas em causa, prevista no artigo 4.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 1049/2001

121    No caso em apreço, o pedido de acesso em causa diz respeito à acta de uma reunião da Comissão, na qual participaram representantes da DG «Mercado Interno e Serviços Financeiros» da Comissão, do Ministério do Comércio e da Indústria do Reino Unido e representantes da CBMC. Esta acta contém uma lista dos participantes na reunião, registados em função das entidades em nome e por conta das quais participaram na referida reunião, descritos pelo respectivo título, inicial do nome próprio, apelido e, sendo caso disso, serviço, organismo ou associação de que dependem no âmbito dessas entidades. O texto da acta não se refere às pessoas singulares mas às entidades em questão, como a CBMC, a DG «Mercado Interno e Serviços Financeiros» ou o Ministério do Comércio e da Indústria do Reino Unido.

122    Deve assinalar‑se que a lista dos participantes na reunião que figura na acta em questão contém assim dados pessoais, na acepção do artigo 2.°, alínea a), do Regulamento n.° 45/2001, pois as pessoas que participaram nesta reunião podem ser identificadas.

123    No entanto, importa constatar que o simples facto de um documento conter dados pessoais não significa necessariamente que a vida privada ou a integridade das pessoas interessadas seja posta em causa, embora as actividades profissionais não estejam, em princípio, excluídas do conceito de «vida privada» na acepção do artigo 8.° da CEDH (v. n.° 114 supra e a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem aí citada).

124    Com efeito, como a própria Comissão refere, as pessoas presentes na reunião de 11 de Outubro de 1996, cujos nomes não foram divulgados, agiram na qualidade de representantes da CBMC e não a título pessoal. A Comissão assinalou que as consequências das decisões tomadas na reunião diziam respeito às entidades representadas e não aos seus representantes a título pessoal.

125    Nestas circunstâncias, há que constatar que o facto de a acta indicar o nome destes representantes não põe em causa a vida privada das pessoas em questão, dado que elas participaram na reunião enquanto representantes das suas entidades. Acresce que, como já se declarou acima, a acta não contém opiniões individuais susceptíveis de serem atribuídas a estas pessoas, mas tomadas de posição imputáveis às entidades que estas representam.

126    De qualquer modo, deve assinalar‑se que a divulgação do nome dos representantes da CBMC não é susceptível de causar concreta e efectivamente prejuízo à protecção da vida privada e da integridade das pessoas em causa. O simples facto de o nome da pessoa em causa figurar na lista dos participantes numa reunião, em nome da entidade que essa pessoa representava, não constitui um prejuízo e a protecção da vida privada e da integridade das pessoas em causa não está comprometida.

127    Este entendimento não é contrariado pelo acórdão Österreichischer Rundfunk e o., já referido, invocado pela Comissão. Neste acórdão, o Tribunal de Justiça considerou que a recolha de dados nominativos relativos aos rendimentos profissionais de um indivíduo, com vista à sua comunicação a terceiros, se enquadra no âmbito de aplicação do artigo 8.° da CEDH. O Tribunal de Justiça declarou que, se a simples memorização pela entidade patronal de dados nominativos relativos às retribuições pagas ao seu pessoal não pode, enquanto tal, constituir uma ingerência na vida privada, a comunicação desses dados a um terceiro, neste caso, a uma autoridade pública, viola o direito ao respeito da vida privada dos interessados, seja qual for a utilização posterior das informações assim comunicadas, e apresenta a natureza de uma ingerência na acepção do artigo 8.° da CEDH (acórdão Österreichischer Rundfunk e o., já referido, n.° 74). O Tribunal de Justiça acrescentou que, para demonstrar a existência de tal ingerência, pouco importa que as informações comunicadas apresentem ou não carácter sensível ou que os interessados tenham ou não sofrido eventuais inconvenientes em razão dessa ingerência. Basta que se determine que dados relativos aos rendimentos auferidos por um trabalhador ou um pensionista foram comunicados pela entidade patronal a um terceiro (acórdão Österreichischer Rundfunk e o., já referido, n.° 75).

128    Convém assinalar que as circunstâncias deste processo são diferentes das do caso em apreço. Com efeito, o caso vertente cabe no âmbito de aplicação do Regulamento n.° 1049/2001, e a excepção prevista no seu artigo 4.°, n.° 1, alínea b) apenas diz respeito aos dados pessoais susceptíveis de causar concreta e efectivamente prejuízo à protecção da vida privada e da integridade do indivíduo. Ora, como se declarou no n.° 119 supra, nem todos os dados pessoais são susceptíveis pela sua natureza de causar prejuízo à vida privada da pessoa em causa. Nas circunstâncias do caso em pareço, o simples facto de se divulgar a participação de uma pessoa singular, agindo no exercício das suas funções profissionais, enquanto representante de uma entidade colectiva, numa reunião realizada com uma instituição comunitária, ainda que a opinião pessoal expressada por essa pessoa nessa ocasião possa ser identificada, não pode ser considerada uma ingerência na vida privada. Deve, portanto, distinguir‑se esta situação da situação subjacente ao processo em que foi proferido o acórdão Österreichischer Rundfunk e o., já referido, em que estavam em causa a recolha e a comunicação específica por um empregador a uma autoridade pública de uma combinação específica de dados pessoais, designadamente o nome dos empregados associado ao rendimento por eles auferido.

129    No acórdão Lindqvist, já referido, invocado igualmente pela Comissão, o Tribunal de Justiça considerou que a operação que consiste na referência, feita numa página da Internet, a várias pessoas e a sua identificação pelo nome ou por outros meios, por exemplo, o número de telefone ou informações relativas às suas condições de trabalho e aos seus passatempos, constitui um «tratamento de dados pessoais por meios total ou parcialmente automatizados» na acepção da Directiva 95/46 (acórdão Lindqvist, já referido, n.° 27). Este acórdão não é determinante para o caso em apreço. Com efeito, como se recordou no número precedente, o caso em apreço cabe no âmbito do Regulamento n.° 1049/2001 e está, portanto, em causa, além da questão de saber se diz respeito a uma tratamento de dados pessoais, determinar se a divulgação dos dados em causa prejudica a protecção da vida privada e da integridade do indivíduo.

130    A tese do Tribunal de Primeira Instância também não contraria a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, segundo a qual o respeito pela vida privada engloba o direito de todos os indivíduos a estabelecerem e desenvolverem relações com os seus semelhantes e se pode estender às actividades profissionais ou comerciais (v. acórdãos Niemitz c. Alemanha, já referido, § 29; Amann c. Suisse, já referido, § 65, Rotaru c. Roménia, já referido, § 43, e Peck c. Reino Unido, já referido, § 57).

131    Com efeito, embora não se possa excluir a priori que o conceito de vida privada abrange certos aspectos da actividade profissional do indivíduo, tal não pode, contudo, significar que toda a actividade profissional esteja global e necessariamente coberta pelo direito ao respeito pela vida privada. Ora, o Tribunal de Primeira Instância considera que, nas circunstâncias do caso em apreço, a mera participação de um representante de uma entidade colectiva numa reunião realizada com uma instituição comunitária não cabe na esfera da sua vida privada, pelo que a divulgação de uma acta que regista a sua presença na referida reunião não pode constituir uma ingerência na sua vida privada.

132    Por conseguinte, a divulgação dos nomes em questão não origina uma ingerência na vida privada das pessoas que participaram na reunião e não prejudica a protecção da sua vida privada e da sua integridade pessoal.

133    Consequentemente, a Comissão considerou erradamente que a excepção prevista no artigo 4.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 1049/2001 se devia aplicar ao caso em apreço.

134    Além disso, a Comissão não afirma que, no caso em apreço, aquando da recolha de dados, designadamente na reunião de 11 de Outubro de 1996, se comprometeu a guardar sigilo sobre a identidade dos participantes ou que estes lhe tenham solicitado, na reunião, para não revelar a sua identidade. Só em 1999, quando a Comissão pediu autorização para revelar a identidade de alguns participantes, estes recusaram que o seu nome fosse divulgado.

135    Ora, dado que a condição relativa à existência de um prejuízo da protecção da vida privada e da integridade da pessoa em causa exigida pelo artigo 4.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 1049/2001 não está preenchida no caso em apreço, a recusa da pessoa em causa não pode impedir a divulgação. Além disso, a Comissão nem sequer tentou provar que as pessoas que recusaram, após a reunião, a divulgação do seu nome, demonstraram que a protecção da sua vida privada e da sua integridade fosse prejudicada por esta divulgação.

136    A este respeito, deve igualmente assinalar‑se que, em definitivo, a Comissão apenas recebeu a recusa de duas das pessoas em questão, e que não conseguiu contactar as outras três pessoas cujo nome também não tinha divulgado (v. n.° 35 supra).

137    As pessoas que participaram nesta reunião não podiam considerar que as opiniões expressadas em nome e por conta das entidades que representavam beneficiavam de um tratamento confidencial. Importa recordar que, no caso em apreço, se tratava de uma reunião realizada no âmbito de uma acção por incumprimento. Ainda que o denunciante possa, neste procedimento, ao abrigo das regras internas da Comissão, escolher um tratamento confidencial, este tratamento não está previsto para as outras pessoas que participaram nos inquéritos. Além disso, uma vez que a Comissão divulgou a acta, embora lhe retirasse determinados nomes, está claro que considerou não estarem em causa informações cobertas pelo segredo profissional. O Regulamento n.° 45/2001 não exige que a Comissão mantenha sob sigilo o nome das pessoas que lhe comunicaram opiniões ou informações respeitantes ao exercício das suas funções.

138    Quanto ao argumento da Comissão, segundo o qual a recorrente nunca cumpriu a sua obrigação de demonstrar a necessidade da transferência, prevista no artigo 8.°, alínea b), do Regulamento n.° 45/2001, basta recordar, como se declarou nos n.os 107 e 108 supra, que, na medida em que a divulgação conduz à aplicação do artigo 2.° do Regulamento n.° 1049/2001 e não é abrangida pela excepção prevista no artigo 4.°, n.° 1, alínea b), do referido regulamento, o requerente não é obrigado a demonstrar a necessidade na acepção do artigo 8.°, alínea b), do Regulamento n.° 45/2001. Por conseguinte, o argumento da Comissão segundo o qual a comunicação da identidade dos participantes não permitiria fornecer esclarecimentos suplementares sobre a sua decisão de arquivar o procedimento por incumprimento, não pode proceder.

139    Consequentemente, a Comissão cometeu um erro de direito ao declarar, na decisão recorrida, que a recorrente não demonstrou nenhum objectivo expresso e legítimo nem a necessidade de obter o nome das cinco pessoas que participaram na reunião e que se opuseram, após esta reunião, à comunicação da sua identidade à recorrente.

140    Deve‑se ainda examinar a aplicação da excepção do artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001.

 Quanto à excepção relativa à protecção dos objectivos de actividades de inspecção, inquérito e auditoria

141    Importa recordar que, nos termos do artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001, as instituições recusarão o acesso aos documentos cuja divulgação possa prejudicar a protecção dos objectivos de actividades de inspecção, inquérito e auditoria, excepto quando um interesse público superior imponha a divulgação do documento em causa.

142    Ainda que a recorrente cite na sua petição, por confusão, o artigo 4.°, n.° 3, do Regulamento n.° 1049/2001, esta peça processual deve ser interpretada no sentido de que invoca o artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do mesmo regulamento dado que é nesta disposição que a Comissão baseia, subsidiariamente, a sua recusa de conceder acesso à acta completa. Em qualquer caso, na audiência, a recorrente invocou o artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001.

143    Importa recordar que a instituição deve apreciar, em cada caso, se os documentos cuja divulgação é solicitada estão efectivamente abrangidos pelas excepções enumeradas no regulamento relativo ao acesso aos documentos.

144    No caso em apreço, está em causa uma acta de uma reunião realizada no âmbito de um procedimento por incumprimento.

145    Todavia, a circunstância de o documento em causa estar associado a um procedimento por incumprimento e, portanto, dizer respeito a uma actividade de inquérito, não basta, por si só, para justificar a aplicação da excepção invocada (v., neste sentido, acórdão Bavarian Lager/Comissão, já referido, n.° 41). Com efeito, como acima se recordou, qualquer excepção ao direito de acesso aos documentos das instituições prevista no Regulamento n.° 1049/2001 deve ser interpretada e aplicada em termos estritos (v. acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 13 de Setembro de 2000, Denkavit Nederland/Comissão, T‑20/99, Colect., p. II‑3011, n.° 45).

146    A este respeito, há que recordar que as actividades de inquérito da Comissão já estavam terminadas no momento da tomada da decisão recorrida, em 18 de Março de 2004. Com efeito, a Comissão já tinha arquivado o procedimento de infracção contra o Reino Unido em 10 de Dezembro de 1997.

147    Assim, no caso em apreço, importa verificar se o documento relacionado com actividades de inquérito era abrangido pela excepção prevista no artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001, quando o inquérito já tinha terminado e o procedimento de infracção estava arquivado há mais de seis anos.

148    O Tribunal de Primeira Instância já declarou que o artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001, que visa proteger os «objectivos de actividades de inspecção, inquérito e auditoria», só é aplicável se a divulgação dos documentos em questão puder pôr em perigo a conclusão das actividades de inspecção, inquérito ou auditoria (acórdão Franchet e Byk/Comissão, já referido, n.° 109).

149    A este respeito, deve assinalar‑se que esta excepção, como resulta da sua formulação, não se destina a proteger as actividades de inquérito enquanto tais, mas sim o objectivo dessas actividades que, como resulta do acórdão Bavarian Lager/Comissão, já referido (n.° 46), consiste, no caso das acções por incumprimento, em levar o Estado‑Membro em causa a dar cumprimento ao direito comunitário. Ora, no caso vertente, a Comissão já tinha arquivado o procedimento de infracção contra o Reino Unido em 10 de Dezembro de 1997, uma vez que este já tinha alterado a legislação em causa e, portanto, o objectivo das actividades de inquérito já tinha sido alcançado. Assim, no momento em que foi tomada a decisão recorrida, nenhuma actividade de inquérito, cujo objectivo pudesse ser posto em risco pela divulgação da acta de que constava o nome de determinados representantes de entidades que participaram na reunião de 11 de Outubro de 1996, estava em curso e, portanto, a excepção do artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001 não pode ser aplicada no caso em apreço.

150    A fim de justificar a sua recusa de divulgar a totalidade da acta em causa, a Comissão alega ainda que se a identidade das pessoas que forneceram informações à Comissão pudesse ser divulgado contra a sua vontade, a Comissão poderia ser privada de uma fonte preciosa de informação, o que poderia comprometer a sua capacidade de realizar inquéritos sobre alegadas infracções à legislação comunitária.

151    A este respeito, importa recordar que, segundo jurisprudência constante, a análise exigida para o tratamento de um pedido de acesso a documentos deve ter carácter concreto. Com efeito, por um lado, a simples circunstância de um documento dizer respeito a um interesse protegido por uma excepção não basta para justificar a aplicação dessa excepção (v., neste sentido, acórdão Denkavit Nederland/Comissão, já referido, n.° 46). Por outro lado, o risco de se prejudicar um interesse protegido deve ser razoavelmente previsível e não puramente hipotético. Por conseguinte, a análise que a instituição deve fazer a fim de aplicar uma excepção deve ser efectuado de forma concreta e deve resultar dos fundamentos da decisão (acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 6 de Abril de 2000, Kuijer/Conselho, T‑188/98, Colect., p. II‑1959, n.° 38, e de 13 de Abril de 2005, Verein für Konsumenteninformation/Comissão, T‑2/03, Colect., p. II‑1121, n.os 69 e 72, e Franchet e Byk/Comissão, já referido, n.° 115).

152    Assim, embora se deva admitir que a necessidade de preservar o anonimato das pessoas que fornecem à Comissão informações relativas a eventuais violações do direito comunitário constitui um objectivo legítimo susceptível de justificar que a Comissão não conceda o acesso total ou mesmo parcial a determinados documentos, não é menos verdade que, no caso em apreço, a Comissão se pronunciou de modo abstracto sobre o prejuízo que a divulgação do documento em que constam os nomes podia causar à sua actividade de inquérito sem demonstrar suficientemente que a divulgação deste documento prejudicaria de forma concreta e efectiva a protecção dos objectivos das actividades de inquérito. Por conseguinte, não está demonstrado, no caso vertente, que o objectivo das actividades de inquérito foi colocado em risco de forma concreta e efectiva pela divulgação de dados solicitados seis anos após o termo das referidas actividades.

153    Por outro lado, como acima se afirmou, o procedimento por incumprimento não prevê um tratamento confidencial das pessoas que participem nos inquéritos, à excepção do denunciante. Se a Comissão divulgou a acta em questão sem o nome das pessoas que não tinham dado autorização para o divulgar foi porque considerou que, em princípio, a divulgação deste documento não estava abrangida pela excepção prevista no artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001.

154    A este respeito, a referência da Comissão, na audiência, ao acórdão do Tribunal de Justiça de 7 de Novembro de 1985, Adams/Comissão (145/83, Recueil, p. 3539), relativo à confidencialidade das informações abrangidas pelo segredo profissional, não é pertinente. Estava em causa um informador que tinha denunciado as práticas anticoncorrenciais do seu empregador e cuja identidade a Comissão devia manter em sigilo. Ora, este informador tinha‑lhe solicitado especificamente para não revelar a sua identidade desde o princípio do procedimento. No entanto, no caso em apreço, como acima se assinalou, a Comissão não demonstrou que, na sua participação na reunião em questão, as pessoas em causa pudessem considerar que beneficiavam de um qualquer tratamento confidencial ou que tenham solicitado à Comissão para não revelar a sua identidade. Além disso, como se declarou no n.° 137 supra, uma vez que a Comissão divulgou a acta, embora lhe retirasse determinados nomes, deve concluir‑se que considerou não estarem em causa informações cobertas pelo segredo profissional. Por último, deve recordar‑se que a Comissão não apresentou nenhum argumento para demonstrar de que forma a divulgação do nome das pessoas que manifestaram a sua recusa poderia prejudicar eventuais actividades de inquérito no caso em apreço.

155    Nestas circunstâncias, deve concluir‑se que os argumentos relativos à protecção dos objectivos das actividades de inspecção e de inquérito não podem ser aceites.

156    Consequentemente, não é necessário examinar a eventual existência de um interesse público superior que justifique a divulgação do documento em causa.

157    Resulta de todas as considerações precedentes que a acta completa da reunião de 11 de Outubro de 1996, em que constam todos os nomes, não é abrangida pelas excepções previstas no artigo 4.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 1049/2001 ou no artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001.

158    Consequentemente, a decisão recorrida deve ser anulada.

 Quanto às despesas

159    Por força do disposto no n.° 2 do artigo 87.° do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a Comissão sido vencida, há que condená‑la nas despesas suportadas pela recorrente, em conformidade com o pedido desta.

160    Nos termos do artigo 87.°, n.° 4, terceiro parágrafo, do Regulamento de Processo, o Tribunal de Primeira Instância pode determinar que um interveniente suporte as respectivas despesas. No caso em apreço, o interveniente em apoio da recorrente suportará as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Terceira Secção)

decide:

1)      É anulada a decisão da Comissão, de 18 de Março de 2004, que indeferiu um pedido de acesso à acta completa da reunião de 11 de Outubro de 1996, de que constam todos os nomes.

2)      A Comissão é condenada nas despesas suportadas pela The Bavarian Lager Co. Ltd.

3)      A Autoridade Europeia para a Protecção de Dados (AEPD), suportará as suas despesas.

Jaeger

Tiili

Czúcz

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 8 de Novembro de 2007.

O secretário

 

      O presidente

E. Coulon

 

      M. Jaeger


* Língua do processo: inglês.