Language of document : ECLI:EU:C:2021:724

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

PRIIT PIKAMÄE

apresentadas em 9 de setembro de 2021 (1)

Processo C213/19

Comissão Europeia

contra

Reino Unido da GrãBretanha e da Irlanda do Norte

«Incumprimento de Estado — Artigo 4.o, n.o 3, TUE — Artigos 310.o, n.o 6, e 325.o TFUE — Luta contra a fraude — Exigência de efetividade — Obrigação de colocação à disposição do orçamento da União dos recursos próprios — Responsabilidade financeira dos Estados‑Membros — União Aduaneira — Regulamento (CEE) n.o 2913/92 — Código Aduaneiro Comunitário — Regulamento (UE) n.o 952/2013 — Código Aduaneiro da União — Direitos aduaneiros — Importações de produtos têxteis e de calçado provenientes da China — Fraude vasta e sistémica — Criminalidade organizada — Importadores inadimplentes — Valor aduaneiro — Subavaliação — Controlos aduaneiros baseados na análise de risco — Controlos prévios à autorização de saída — Constituição de garantias — Inexistência de controlos — Artigos 16.o e 17.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia — Recursos próprios da União Europeia — Decisões 2007/436/CE e 2014/335/UE — Regulamentos (CE, Euratom) n.os 1150/2000 e 609/2014 — Apuramento de uma dívida aduaneira — Obrigação de colocação à disposição da União Europeia — Avaliação da perda dos recursos próprios tradicionais — Metodologia estatística baseada no preço médio corrigido e no preço mínimo aceitável — Imposto sobre o valor acrescentado (IVA) — Diretiva 2006/112/CE — Valor tributável do IVA — Recursos próprios provenientes do IVA»






Índice


I. Introdução

II. Quadro jurídico

A. Direito em matéria de recursos próprios tradicionais

1. Decisões relativas ao sistema dos recursos próprios

2. Regulamentos relativos às modalidades e ao procedimento de disponibilização dos recursos próprios

3. Regulamento (UE, Euratom) n.o 608/2014

4. Regulamento n.o 1553/89

B. Direito aduaneiro

1. Código Aduaneiro Comunitário

2. Código Aduaneiro da União

3. Regulamento de aplicação

4. Regulamento de execução

C. Direito em matéria de IVA

III. Matéria de facto e procedimento précontencioso

A. Factos na origem do litígio

B. Procedimento précontencioso

IV. Tramitação do processo no Tribunal de Justiça

V. Pedidos das partes

VI. Quanto à ação

A. Quanto à admissibilidade

1. Quanto à exceção de inadmissibilidade relativa à alegada violação dos direitos de defesa do Reino Unido durante o procedimento précontencioso e o processo no Tribunal de Justiça

a) Quanto à comunicação dos dados relativos aos cálculos respeitantes ao preço médio corrigido, ao preço mínimo aceitável e às perdas estimadas de recursos próprios

b) Quanto às informações relativas aos cálculos efetuados para os anos de 2011 a 2014 com base nos avisos de pagamento C18 Snake

c) Quanto à tomada de conhecimento das práticas dos outros EstadosMembros no que respeita à utilização da metodologia OLAF

d) Quanto ao pedido de provas relativas à natureza das mercadorias subavaliadas e ao seu EstadoMembro de destino

2. Quanto à exceção de inadmissibilidade relativa à irregularidade do procedimento précontencioso e à petição inicial no que respeita, nomeadamente, ao regime aduaneiro 42

3. Quanto à exceção de inadmissibilidade relativa à violação pela Comissão dos princípios da confiança legítima, da segurança jurídica, do estoppel e da cooperação leal

4. Quanto à exceção de inadmissibilidade relativa à impossibilidade de ordenar a disponibilização dos montantes ao abrigo do artigo 258.o TFUE

B. Quanto ao incumprimento das obrigações em matéria de proteção dos interesses financeiros da União e de luta contra a fraude, e das obrigações decorrentes da regulamentação aduaneira da União

1. Quanto às obrigações dos EstadosMembros de lutarem contra as atividades ilegais lesivas dos interesses financeiros da União

2. Quanto às medidas a tomar por força da regulamentação aduaneira para proteger os interesses financeiros da União na situação de fraude em causa

a) Quanto às características da fraude cometida pelos importadores em causa e ao conhecimento dessa fraude pelas autoridades do Reino Unido

b) Quanto à obrigação de instituir uma análise de risco, de efetuar controlos prévios à autorização de saída e quanto à necessidade de constituir garantias

1) Observações preliminares

2) Quanto à obrigação de recorrer à análise de risco

3) Quanto à obrigação de efetuar controlos prévios à autorização de saída

4) Quanto à obrigação de constituir garantias

3. Resumo dos elementos considerados contra o Reino Unido

4. Quanto à obrigação de os EstadosMembros determinarem os montantes dos direitos aduaneiros e procederem ao registo de liquidação dos montantes correspondentes

C. Quanto ao incumprimento da legislação da União relativa aos recursos próprios e à estimativa de perdas de recursos próprios tradicionais constituídos pelos direitos aduaneiros

1. Quanto ao regime jurídico do registo de liquidação dos montantes devidos e da disponibilização dos recursos próprios tradicionais

2. Quanto à violação da obrigação do Reino Unido de colocar à disposição da Comissão os montantes correspondentes aos direitos aduaneiros apurados no âmbito da operação Snake

3. Quanto à avaliação das perdas dos recursos próprios tradicionais

a) Observações preliminares

1) Quanto à competência da Comissão para proceder à avaliação das perdas de recursos próprios tradicionais e à competência do Tribunal de Justiça para decidir esta questão

2) Quanto à alegada obrigação de demonstrar o dano e o nexo de causalidade, bem como o cenário contrafactual

b) Quanto ao mérito

1) Quanto à síntese da metodologia OLAF e à sua aplicação enquanto instrumento de cálculo das perdas de recursos próprios tradicionais

2) Quanto à aplicação do Acórdão Comissão/Portugal

3) Quanto à admissão de princípio da abordagem proposta pela Comissão para avaliar as perdas de recursos próprios tradicionais

4) Quanto à utilização da metodologia baseada em dados estatísticos no caso em apreço

i) Quanto à determinação do volume das importações subavaliadas

– Quanto ao período compreendido entre novembro de 2011 e novembro de 2014

– Quanto ao período entre 1 de janeiro de 2015 e 11 de outubro de 2017

ii) Quanto ao valor de referência para determinar os montantes das perdas dos recursos próprios

5) Resumo relativo à avaliação dos recursos próprios tradicionais

4. Quanto aos juros de mora

D. Quanto à violação do princípio da cooperação leal previsto no artigo 4.o, n.o 3, TUE

E. Quanto ao incumprimento das obrigações decorrentes da regulamentação relativa ao IVA e aos recursos próprios provenientes do IVA

1. Quanto ao regime jurídico da colocação à disposição do orçamento da União dos recursos provenientes do IVA

2. Quanto à acusação relativa à perda de recursos próprios provenientes do IVA a título do regime aduaneiro 40

3. Quanto à acusação relativa à perda dos recursos próprios provenientes do IVA a título do regime aduaneiro 42

VII. Quanto às despesas

VIII. Conclusão



I.      Introdução

1.        No presente processo, a Comissão Europeia intentou uma ação por incumprimento ao abrigo do artigo 258.o TFUE contra o Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte com o fundamento de que, durante o período compreendido entre novembro de 2011 e 11 de outubro de 2017 inclusive (a seguir «período de infração»), este, por um lado, não teve em conta os montantes corretos dos direitos aduaneiros nem colocou à disposição o montante correto dos recursos próprios tradicionais e os baseados no imposto sobre o valor acrescentado (IVA) relativos a certas importações de produtos têxteis e de calçado originários da China e, por outro, não comunicou todas as informações exigidas pela Comissão para efeitos da determinação do montante das perdas de recursos próprios tradicionais (2).

2.        Segundo a Comissão, este Estado não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 4.o, n.o 3, TUE, que prevê o princípio da cooperação leal, do artigo 310.o, n.o 6, TFUE e do artigo 325.o TFUE, bem como por força de toda uma série de disposições de direito derivado relativas à legislação aduaneira da União, aos recursos próprios tradicionais e ao IVA.

3.        Assim, o presente processo convida o Tribunal de Justiça a desenvolver a sua jurisprudência relativa ao alcance das obrigações em matéria de luta contra a fraude e de proteção dos interesses financeiros da União impostas pelas disposições referidas no número anterior, num contexto em que a Comissão alega que o Estado‑Membro em causa não determinou corretamente o valor aduaneiro das mercadorias importadas, tendo estas últimas sido subavaliadas quando da sua importação devido à inexistência de medidas de controlo efetivas. Este processo suscita questões fundamentais, como a possibilidade de a Comissão apreciar o montante do seu pedido relativo às perdas de recursos próprios, numa situação em que, na falta de avaliação correta do valor das mercadorias pelo Estado‑Membro em causa, aquela se baseia num método estatístico, a saber, os preços médios corrigidos relativos às mercadorias importadas à escala da União. Por último, o Tribunal de Justiça é chamado a dirimir a questão de saber se o Estado‑Membro de importação das mercadorias é devedor das perdas de recursos próprios provenientes do IVA no âmbito de um regime aduaneiro em que os direitos aduaneiros são pagos no momento da importação, mas em que o IVA deve ser pago posteriormente no Estado‑Membro de destino.

II.    Quadro jurídico

A.      Direito em matéria de recursos próprios tradicionais

1.      Decisões relativas ao sistema dos recursos próprios

4.        Em conformidade com o artigo 2.o, n.o 1, alíneas a) e b), da Decisão 2014/335/UE, Euratom (3), aplicável a partir de 1 de janeiro de 2014, cuja redação é, em substância, idêntica à do artigo 2.o, n.o 1, da Decisão 2007/436/CE, Euratom, do Conselho, de 7 de junho de 2007, relativa ao sistema de recursos próprios das Comunidades Europeias (4), constituem recursos próprios inscritos no orçamento da União as receitas provenientes, respetivamente, «[d]os recursos próprios tradicionais que consistem em […] direitos da Pauta Aduaneira Comum e outros direitos estabelecidos ou a estabelecer pelas instituições da União sobre as trocas comerciais com países terceiros» e «da aplicação de uma taxa uniforme, válida para todos os Estados‑Membros, à base tributável do IVA, determinada de maneira harmonizada segundo as regras da União».

5.        O artigo 8.o, n.o 1, das referidas decisões enuncia, no seu primeiro parágrafo, que os direitos da pauta aduaneira comum, enquanto recursos próprios da União, são cobrados pelos Estados‑Membros nos termos das disposições legislativas, regulamentares e administrativas nacionais que, se necessário, são adaptadas às exigências da regulamentação da União. O artigo 8.o, n.o 1, terceiro parágrafo da Decisão 2007/436 e o artigo 8.o, n.o 2, da Decisão 2014/335 preveem que os Estados‑Membros devem colocar à disposição da Comissão os recursos previstos nas alíneas a) a c) do n.o 1 do artigo 2.o dessas mesmas decisões.

2.      Regulamentos relativos às modalidades e ao procedimento de disponibilização dos recursos próprios

6.        O Regulamento (CE, Euratom) n.o 1150/2000 do Conselho, de 22 de maio de 2000, relativ[o] à aplicação da Decisão 94/728 (5), aplicável à primeira parte do período de infração, foi substituído, em 1 de janeiro de 2014, pelo Regulamento (UE, Euratom) n.o 609/2014 do Conselho, de 26 de maio de 2014, relativo aos métodos e ao procedimento para a colocação à disposição dos recursos próprios tradicionais e dos recursos próprios baseados no IVA e no RNB [(6)] e às medidas destinadas a satisfazer as necessidades da tesouraria (7). O artigo 2.o, n.o 1, do Regulamento n.o 609/2014, cujo conteúdo corresponde, em substância, ao do artigo 2.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1150/2000, enuncia:

«Para efeitos da aplicação do presente regulamento, um direito da União sobre os recursos próprios tradicionais a que se refere o artigo 2.o, n.o 1, alínea a), da Decisão 2014/335 […] considera‑se apurado assim que se encontrem preenchidas as condições previstas na regulamentação aduaneira no que se refere ao registo de liquidação do montante do direito e à sua comunicação ao devedor.»

7.        O artigo 6.o, n.os 1 e 3, primeiro e segundo parágrafos, do Regulamento n.o 609/2014, que reproduz, em substância, o artigo 6.o, n.os 1 e 3, alíneas a) e b), do Regulamento n.o 1150/2000, tem a seguinte redação:

«1.      É mantida pelo Tesouro de cada Estado‑Membro ou pelo organismo designado por cada Estado‑Membro uma contabilidade dos recursos próprios, discriminada segundo a natureza desses recursos.

[…]

3.      Sem prejuízo do disposto no segundo parágrafo, os direitos apurados nos termos do artigo 2.o são lançados na contabilidade [correntemente designada “contabilidade A”] o mais tardar no primeiro dia útil seguinte ao dia 19 do segundo mês após aquele em que o direito tiver sido apurado.

Os direitos apurados e não inscritos na contabilidade referida no primeiro parágrafo, por ainda não terem sido cobrados nem ter sido fornecida qualquer caução, são lançados numa contabilidade separada, no prazo previsto no primeiro parágrafo [correntemente designada “contabilidade B”]. Os Estados‑Membros podem proceder do mesmo modo nos casos em que os direitos apurados e cobertos por garantias sejam objeto de contestação e possam vir a sofrer variações na sequência de eventuais diferendos.

[…]»

8.        Em conformidade com o artigo 9.o, n.o 1, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 609/2014, cuja redação corresponde à do artigo 9.o, n.o 1, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1150/2000:

«Segundo as regras definidas no artigo 10.o, cada Estado‑Membro inscreve os recursos próprios a crédito da conta aberta para o efeito em nome da Comissão junto do Tesouro ou do organismo por ele designado.»

9.        A partir de 1 de outubro de 2016, esta disposição foi alterada pelo artigo 9.o, n.o 1, do Regulamento (UE, Euratom) 2016/804 do Conselho (8), que está redigido da seguinte forma:

«Segundo as regras definidas nos artigos 10.o, 10.o‑A e 10.o‑B, cada Estado‑Membro inscreve os recursos próprios a crédito da conta aberta para o efeito em nome da Comissão junto do tesouro ou do banco central nacional. Sob reserva da aplicação de juros negativos a que se refere o terceiro parágrafo, esta conta só pode ser debitada mediante instruções da Comissão.»

10.      O artigo 10.o, n.o 1, do Regulamento n.o 609/2014, cujo conteúdo corresponde, em substância, ao do artigo 10.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1150/2000, tem a seguinte redação:

«Após dedução das despesas de cobrança nos termos do artigo 2.o, n.o 3, e do artigo 10.o, n.o 3, da Decisão 2014/335 […], o lançamento dos recursos próprios tradicionais a que se refere o artigo 2.o, n.o 1, alínea a), dessa decisão é efetuado o mais tardar no primeiro dia útil seguinte ao dia 19 do segundo mês após aquele em que o direito tiver sido apurado nos termos do artigo 2.o do presente regulamento.

Todavia, em relação aos direitos lançados na contabilidade separada, nos termos do artigo 6.o, n.o 3, segundo parágrafo, do presente regulamento, o lançamento deve ser efetuado o mais tardar no primeiro dia útil seguinte ao dia 19 do segundo mês seguinte ao da cobrança dos direitos.»

11.      Na sua redação inicial, o artigo 12.o, n.os 1 e 3, do Regulamento n.o 609/2014, cujo conteúdo era, em substância, idêntico ao do artigo 11.o, n.os 1 e 3, do Regulamento n.o 1150/2000, dispunha o seguinte:

«1.      Qualquer atraso nos lançamentos na conta referida no artigo 9.o, n.o 1, implica o pagamento, pelo Estado‑Membro em causa, de juros de mora.

[…]

3.      Relativamente aos Estados‑Membros que não participam da União Económica e Monetária, a taxa é igual à taxa aplicada no primeiro dia do mês do vencimento em questão pelos Bancos Centrais respetivos às suas operações principais de refinanciamento, acrescida de dois pontos percentuais, ou, relativamente aos Estados‑Membros para os quais não se dispõe de taxa do Banco Central, é igual à taxa mais equivalente aplicada no primeiro dia do mês em questão no mercado monetário desses Estados‑Membros, acrescida de dois pontos percentuais.

Essa taxa é majorada de 0,25 pontos percentuais por cada mês de atraso. A taxa aumentada aplica‑se durante todo o período do atraso.»

12.      A partir de 1 de outubro de 2016, na sequência da entrada em vigor do Regulamento 2016/804, o artigo 12.o, n.o 3, do Regulamento n.o 609/2014 foi substituído pelo artigo 12.o, n.o 5, que tem a seguinte redação:

«Relativamente aos Estados‑Membros que não participem na União Económica e Monetária, a taxa de juro é igual à taxa aplicada no primeiro dia do mês em questão pelos bancos centrais às suas principais operações de refinanciamento, ou a 0 %, consoante a que for mais elevada, acrescida de 2,5 pontos percentuais. Relativamente aos Estados‑Membros para os quais não está disponível a taxa do banco central, a taxa de juro é igual à taxa mais equivalente aplicada no primeiro dia do mês em questão no mercado monetário desses Estados‑Membros, ou a 0 %, consoante a que for mais elevada, acrescida de 2,5 pontos percentuais.

Essa taxa é majorada de 0,25 pontos percentuais por cada mês de atraso.

A majoração total a título do primeiro e do segundo parágrafos não pode exceder 16 pontos percentuais. A taxa majorada é aplicada ao período total do atraso.»

13.      O artigo 13.o, n.os 1 e 2, do Regulamento n.o 609/2014, que reproduz, em substância, o artigo 17.o, n.os 1 e 2, do Regulamento n.o 1150/2000, prevê:

«1.      Os Estados‑Membros tomam todas as medidas necessárias para que os montantes correspondentes aos direitos apurados nos termos do artigo 2.o sejam colocados à disposição da Comissão nas condições fixadas pelo presente regulamento.

2.      Os Estados‑Membros são dispensados de pôr à disposição da Comissão os montantes correspondentes aos direitos apurados em conformidade com o artigo 2.o que se verifique serem incobráveis por uma das seguintes razões:

a)      Por razões de força maior;

b)      Por outras razões que não lhes sejam imputáveis.

Os montantes de direitos apurados são declarados incobráveis por decisão da autoridade administrativa competente que verifica a impossibilidade de cobrança.

Os montantes de direitos apurados são considerados incobráveis o mais tardar após um período de cinco anos a contar da data em que o montante foi apurado nos termos do artigo 2.o ou, em caso de recurso administrativo ou judicial, da data da decisão definitiva, da sua notificação ou da sua publicação.

[…]»

3.      Regulamento (UE, Euratom) n.o 608/2014

14.      No que se refere ao período posterior a 1 de janeiro de 2014, o artigo 2.o do Regulamento (UE, Euratom) n.o 608/2014 do Conselho, de 26 de maio de 2014, que estabelece as medidas de execução do sistema de recursos próprios da União Europeia (9), sob a epígrafe «Medidas de controlo e supervisão», dispõe:

«1.      Os recursos próprios referidos no artigo 2.o, n.o 1, da Decisão 2014/335 […] são controlados nas condições previstas no presente regulamento, sem prejuízo do Regulamento [n.o 1553/89 (10)] […]

2.      Os Estados‑Membros tomam todas as medidas necessárias para que os recursos próprios referidos no artigo 2.o, n.o 1, da Decisão 2014/335[…] sejam colocados à disposição da Comissão.

3.      Caso as medidas de controlo e supervisão digam respeito aos recursos próprios tradicionais referidos no artigo 2.o, n.o 1, alínea a), da Decisão 2014/335 […]:

a)      Os Estados‑Membros procedem às verificações e inquéritos relativos ao apuramento e à colocação à disposição desses recursos próprios;

[…]

c)      Os Estados‑Membros associam a Comissão, a pedido desta, aos controlos que efetuarem. Caso seja associada a um controlo, a Comissão tem acesso, na medida em que a aplicação do presente regulamento o exija, aos documentos comprovativos relativos ao apuramento e à colocação à disposição dos recursos próprios, bem como a quaisquer outros documentos apropriados relacionados com esses mesmos documentos comprovativos;

d)      A Comissão pode proceder ela própria a verificações in loco. Os agentes mandatados pela Comissão para efetuar essas verificações têm acesso aos documentos tal como previsto para os controlos referidos na alínea c). Os Estados‑Membros devem facilitar essas verificações;

[…]»

15.      O artigo 5.o do Regulamento n.o 608/2014, sob a epígrafe «Comunicação de fraudes e irregularidades que afetam os direitos aos recursos próprios tradicionais», prevê, no seu n.o 1:

«Nos dois meses seguintes ao final de cada trimestre, os Estados‑Membros comunicam à Comissão uma descrição das fraudes e irregularidades já detetadas, correspondentes a um montante de direitos superior a 10 000 [euros], relativamente aos recursos próprios tradicionais referidos no artigo 2.o, n.o 1, alínea a), da Decisão 2014/335[…].

No prazo referido no primeiro parágrafo, todos os Estados‑Membros enviam informações sobre a situação dos casos de fraude e irregularidades já comunicados à Comissão, cuja cobrança, anulação ou renúncia à cobrança não tenha sido indicada anteriormente.»

4.      Regulamento n.o 1553/89

16.      O artigo 2.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1553/89 prevê:

«A base dos recursos IVA será determinada a partir das operações tributáveis referidas no artigo 2.o da [Sexta Diretiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios — sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria coletável uniforme (JO 1977, L 145, p. 1) […]»

17.      Nos termos do artigo 3.o, n.o 1, do referido regulamento:

«Para um ano civil determinado, e sem prejuízo do disposto nos artigos 5.o e 6.o, a base dos recursos IVA é calculada dividindo o total das receitas líquidas do IVA cobradas pelo Estado‑Membro nesse ano pela taxa à qual o imposto tenha sido cobrado durante o mesmo ano.»

B.      Direito aduaneiro

1.      Código Aduaneiro Comunitário

18.      O artigo 13.o do Regulamento (CEE) n.o 2913/92 do Conselho, de 12 de outubro de 1992, que estabelece o Código Aduaneiro Comunitário (11), conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 648/2005 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de abril de 2005 (12) (a seguir Código Aduaneiro Comunitário) dispunha:

«1.      As autoridades aduaneiras podem, de acordo com as condições previstas nas disposições em vigor, realizar todos os controlos que considerem necessários para garantir a correta aplicação da legislação aduaneira e outra legislação que regule a introdução, saída, trânsito, transferência e utilização final de mercadorias que circulem entre o território aduaneiro da Comunidade e países terceiros, bem como a presença de mercadorias que não tenham estatuto comunitário. Para efeitos da correta aplicação da legislação comunitária, podem ser realizados controlos aduaneiros num país terceiro, quando tal estiver previsto num acordo internacional.

2.      Os controlos aduaneiros que não sejam controlos por amostragem devem basear‑se na análise de risco utilizando técnicas automatizadas de processamento de dados, com o objetivo de identificar e quantificar os riscos e criar as medidas necessárias para a sua avaliação com base em critérios definidos a nível nacional, comunitário e, sempre que possível, internacional.

O procedimento de comité será aplicado para determinar um quadro comum de gestão de risco e estabelecer critérios comuns e áreas de controlo prioritárias.

Os Estados‑Membros, em cooperação com a Comissão, devem instituir um sistema eletrónico para a implementação da gestão de risco.

3.      Sempre que forem efetuados controlos por autoridades que não sejam as autoridades aduaneiras […], esses controlos devem ser efetuados em estreita coordenação com as autoridades aduaneiras, sempre que possível, ao mesmo tempo e no mesmo local.

[…]»

19.      O título II do Código Aduaneiro Comunitário continha um capítulo 3 intitulado «Valor aduaneiro das mercadorias», composto pelos artigos 28.o a 36.o

20.      O artigo 29.o deste código previa:

«1.      O valor aduaneiro das mercadorias importadas é o valor transacional, isto é, o preço efetivamente pago ou a pagar pelas mercadorias quando são vendidas para exportação com destino ao território aduaneiro da Comunidade, eventualmente, após ajustamento efetuado nos termos dos artigos 32.o e 33.o […]:

[…]

2.      a)      Para determinar se o valor transacional é aceitável para efeitos de aplicação do n.o 1, o facto de o comprador e o vendedor estarem coligados não constitui, em si mesmo, motivo suficiente para considerar o valor transacional como inaceitável. Se necessário, serão examinadas as circunstâncias próprias da venda e o valor transacional será admitido, desde que a relação de coligação não tenha influenciado o preço. […]

[…]

3.      a)      O preço efetivamente pago ou a pagar é o pagamento total efetuado ou a efetuar pelo comprador ao vendedor, ou em benefício deste, pelas mercadorias importadas e compreende todos os pagamentos efetuados ou a efetuar, como condição da venda das mercadorias importadas, pelo comprador ao vendedor, ou pelo comprador a uma terceira pessoa para satisfazer uma obrigação do vendedor. […]

[…]»

21.      Nos termos do artigo 30.o do referido código:

«1.      Quando o valor aduaneiro não puder ser determinado por aplicação do artigo 29.o, há que passar sucessivamente às alíneas a), b), c) e d) do n.o 2 até à primeira destas alíneas que o permita determinar […]

2.      Os valores aduaneiros determinados por aplicação do presente artigo são os seguintes:

a)      Valor transacional de mercadorias idênticas vendidas para exportação com destino à Comunidade e exportadas no mesmo momento que as mercadorias a avaliar ou em momento muito próximo;

b)      Valor transacional de mercadorias similares, vendidas para exportação com destino à Comunidade exportadas no mesmo momento que as mercadorias a avaliar ou em momento muito próximo;

c)      Valor baseado no preço unitário correspondente às vendas na Comunidade das mercadorias importadas ou de mercadorias idênticas ou similares importadas totalizando a quantidade mais elevada, feitas a pessoas não coligadas com os vendedores[;]

d)      Valor calculado […]

[…]»

22.      O artigo 31.o do Código Aduaneiro Comunitário tinha a seguinte redação:

«1.      Se o valor aduaneiro das mercadorias não puder ser determinado por aplicação dos artigos 29.o e 30.o, será determinado, com base nos dados disponíveis na Comunidade, por meios razoáveis compatíveis com os princípios e as disposições gerais:

—        do acordo relativo à aplicação do artigo VII do Acordo Geral sobre Pautas Aduaneiras e Comércio de 1994,

—        do artigo VII do Acordo Geral sobre Pautas Aduaneiras e Comércio de 1994,

—        das disposições do presente capítulo.

2.      O valor aduaneiro determinado por aplicação do n.o 1 não se baseará:

a)      No preço de venda, na Comunidade, de mercadorias produzidas na Comunidade;

b)      Num sistema que preveja a aceitação, para fins aduaneiros, do mais elevado de dois valores possíveis;

c)      No preço de mercadorias no mercado interno do país de exportação;

d)      No custo de produção, distinto dos valores calculados que foram determinados para mercadorias idênticas ou similares em conformidade com o n.o 2, alínea d), do artigo 30.o;

e)      Nos preços para exportação com destino a um país não compreendido no território aduaneiro da Comunidade;

f)      Em valores aduaneiros mínimos[;] ou

g)      Em valores arbitrários ou fictícios.»

23.      O artigo 68.o desse código dispunha:

«Para a conferência das declarações por elas aceites, as autoridades aduaneiras podem proceder:

a)      A um controlo documental que incida sobre a declaração e os documentos que se lhe encontram juntos. As autoridades podem exigir do declarante a apresentação de qualquer outro documento com vista à conferência da exatidão dos elementos da declaração.

b)      A verificação das mercadorias, acompanhada de uma eventual extração de amostras com vista à sua análise ou a um controlo mais aprofundado.»

24.      O artigo 71.o do referido código tinha a seguinte redação:

«1.      Os resultados da conferência da declaração servem de base à aplicação das disposições que regem o regime aduaneiro a que as mercadorias se encontram sujeitas.

2.      Caso não se proceda à conferência da declaração, a aplicação das disposições previstas no n.o 1 efetua‑se com base nos elementos da declaração.»

25.      O artigo 217.o do Código Aduaneiro Comunitário previa:

«1.      O montante de direitos de importação ou de direitos de exportação resultante de uma dívida aduaneira […] deverá ser calculado pelas autoridades aduaneiras logo que estas disponham dos elementos necessários e deverá ser objeto de uma inscrição efetuada por essas autoridades nos registos contabilísticos ou em qualquer outro suporte equivalente (registo de liquidação).

[…]

2.      Os Estados‑Membros determinarão as modalidades práticas do registo de liquidação. Essas modalidades podem diferir consoante as autoridades aduaneiras, tendo em conta as condições em que a dívida aduaneira se constituir, tenham ou não a garantia do pagamento dos montantes em causa.»

26.      Nos termos do artigo 218.o, n.o 1, deste código:

«Sempre que uma dívida aduaneira se constitui pela aceitação da declaração de uma mercadoria para um regime aduaneiro distinto da importação temporária com isenção parcial dos direitos de importação, ou de qualquer outro ato com os mesmos efeitos jurídicos dessa aceitação, o registo de liquidação do montante correspondente a essa dívida deve ser efetuado logo que o referido montante tenha sido calculado e, o mais tardar, no segundo dia seguinte àquele em que tiver sido dada a autorização de saída da mercadoria.»

27.      O artigo 220.o, n.o 1, do referido código dispunha:

«Sempre que o registo de liquidação do montante de direitos resultante de uma dívida aduaneira não tenha sido efetuado em conformidade com o disposto nos artigos 218.o e 219.o ou tenha sido efetuado num nível inferior ao montante legalme[n]te devido, o registo de liquidação do montante de direitos a cobrar ou da parte por cobrar deverá efetuar‑se no prazo de dois dias a contar da data em que as autoridades financeiras se tenham apercebido dessa situação e em que possam calcular o montante legalmente devido e determinar o devedor (registo de liquidação a posteriori). Este prazo pode ser prorrogado nos termos do artigo 219.o»

28.      O artigo 221.o do mesmo código enunciava:

«1.      O montante dos direitos deve ser comunicado ao devedor, de acordo com modalidades adequadas, logo que o respetivo registo de liquidação seja efetuado.

[…]

3.      A comunicação ao devedor não se pode efetuar após o termo de um prazo de três anos a contar da data de constituição da dívida aduaneira. Este prazo é suspenso a partir do momento em que for interposto um recurso na aceção do artigo 243.o, até ao termo do processo de recurso.

4.      Sempre que a dívida aduaneira resulte de um ato que era, no momento em que foi cometido, passível de procedimento judicial repressivo, a comunicação ao devedor pode ser efetuada, nas condições previstas nas disposições em vigor, após o termo do prazo de três anos previsto no n.o 3.»

2.      Código Aduaneiro da União

29.      O artigo 3.o do Regulamento (UE) n.o 952/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de outubro de 2013, que estabelece o Código Aduaneiro da União (13) (a seguir «Código Aduaneiro da União») dispõe:

«As autoridades aduaneiras são antes de mais responsáveis pela supervisão do comércio internacional da União, contribuindo deste modo para um comércio justo e aberto, para a aplicação da vertente externa do mercado interno, da política comercial comum e das outras políticas comuns da União relacionadas com o comércio, bem como para a segurança do circuito de abastecimento global. As autoridades aduaneiras devem instituir medidas que visem, especialmente:

a)      Proteger os interesses financeiros da União e dos seus Estados‑Membros;

b)      Proteger a União contra o comércio desleal e ilegal, apoiando simultaneamente as atividades económicas legítimas;

c)      Garantir a proteção e a segurança da União e dos seus residentes, bem como a proteção do ambiente, se for caso disso, em estreita cooperação com outras autoridades; e

d)      Manter um equilíbrio adequado entre controlos aduaneiros e facilitação do comércio legítimo.»

30.      Nos termos do artigo 46.o do Código Aduaneiro da União, sob a epígrafe «Gestão do risco e controlos aduaneiros»:

«1.      As autoridades aduaneiras podem realizar os controlos aduaneiros que considerem necessários.

Os controlos aduaneiros podem, designadamente, consistir na verificação das mercadorias, na recolha de amostras, no controlo da exatidão e do caráter exaustivo das informações constantes de uma declaração ou notificação, e da existência, autenticidade, exatidão e validade dos documentos, na verificação da contabilidade dos operadores económicos e de outros registos, na inspeção dos meios de transporte, das bagagens e de outras mercadorias transportadas por pessoas ou em pessoas e na realização de inquéritos oficiais e outros atos similares.

2.      Os controlos aduaneiros que não sejam aleatórios devem basear‑se essencialmente na análise de risco utilizando técnicas de processamento eletrónico de dados, com o objetivo de identificar e avaliar os riscos e elaborar as contramedidas necessárias com base em critérios definidos a nível nacional ou da União e, se disponíveis, internacional.

3.      Os controlos aduaneiros devem ser realizados dentro de um quadro comum de gestão do risco, baseado no intercâmbio de informações sobre riscos e resultados de análises de risco entre administrações aduaneiras e que defina […] critérios e normas comuns de riscos, medidas de controlo e áreas de controlo prioritárias.

Os controlos baseados em tais informações e critérios são efetuados sem prejuízo de outros controlos efetuados nos termos do n.o 1 ou de outras disposições em vigor.

4.      As autoridades aduaneiras aplicam métodos de gestão de riscos com vista a diferenciar os níveis de risco associados às mercadorias sujeitas a controlos aduaneiros ou à fiscalização aduaneira e a determinar se as mercadorias serão objeto de controlos aduaneiros específicos, indicando, se for o caso, o local onde serão efetuados esses controlos.

A gestão de riscos inclui atividades como a recolha de dados e de informações, a análise e avaliação do risco, a recomendação e realização de ações e a monitorização e revisão regulares desse processo e dos seus resultados, com base em fontes e estratégias internacionais, da União e nacionais.

5.      As autoridades aduaneiras devem trocar informações sobre riscos e resultados de análises de risco caso:

a)      Os riscos sejam avaliados por uma autoridade aduaneira como significativos e exigindo um controlo aduaneiro, e os resultados desse controlo indi[que]m que o incidente que desencadeou os riscos se verificou; ou

b)      Os resultados do controlo não estabeleçam a ocorrência do incidente que desencadeou os riscos, mas a autoridade aduaneira em causa considere que a ameaça representa um risco elevado noutro local da União.

6.      Para efeitos do estabelecimento de critérios e normas comuns de risco, bem como das medidas de controlo e das áreas de controlo prioritárias referidas no n.o 3, deve ser considerado o seguinte:

a)      A proporcionalidade em relação ao risco;

b)      A urgência da aplicação necessária dos controlos;

c)      Os prováveis efeitos nos fluxos comerciais, nos diferentes Estados‑Membros e nos recursos afetados aos controlos.

7.      As normas e critérios comuns em matéria de risco referidos no n.o 3 incluem o seguinte:

a)      Uma descrição dos riscos;

b)      Os fatores ou indicadores de risco a utilizar para selecionar as mercadorias ou os operadores económicos sujeitos aos controlos aduaneiros;

c)      A natureza dos controlos aduaneiros a efetuar pelas autoridades aduaneiras;

d)      A duração de aplicação dos controlos aduaneiros referidos na alínea c).

8.      As áreas de controlo prioritárias devem abranger determinados regimes aduaneiros, tipos de mercadorias, itinerários, modos de transporte ou operadores económicos que, durante um certo período, devem ser sujeitos a análises de risco e controlos aduaneiros reforçados, sem prejuízo de outros controlos normalmente efetuados pelas autoridades aduaneiras.»

31.      O artigo 53.o do Código Aduaneiro da União, sob a epígrafe «Conversão monetária», dispõe, no seu n.o 1:

«As autoridades competentes publicam e/ou divulgam na Internet a taxa de câmbio aplicável se for necessário proceder a uma conversão monetária por uma das seguintes razões:

a)      Caso os elementos que servem para determinar o valor aduaneiro de uma mercadoria estejam expressos em moeda diferente da do Estado‑Membro onde é efetuada essa determinação;

b)      Caso o contravalor do euro em moeda nacional seja necessário para determinar a classificação pautal das mercadorias e o montante do direito de importação e de exportação, incluindo os valores máximos na Pauta Aduaneira Comum.»

32.      Os artigos 70.o e 74.o deste código contêm regras relativas ao valor aduaneiro das mercadorias que correspondem, em substância, às constantes dos artigos 29.o a 31.o do Código Aduaneiro Comunitário.

33.      Em conformidade com o artigo 101.o, n.o 1, do Código Aduaneiro da União, o montante dos direitos de importação ou de exportação devidos é determinado pelas autoridades aduaneiras responsáveis pelo local em que a dívida aduaneira é constituída, ou em que se considera ter sido constituída nos termos do artigo 87.o desse código, logo que essas autoridades disponham das informações necessárias para o efeito.

34.      O artigo 103.o do referido código, sob a epígrafe «Caducidade da dívida aduaneira», dispõe, nos seus n.os 1 e 2:

«1.      As dívidas aduaneiras não podem ser notificadas ao devedor após o termo de um prazo de três anos a contar da data de constituição da dívida aduaneira.

2.      Caso a dívida aduaneira seja constituída em resultado de um ato que, no momento em que foi praticado, era passível de procedimento judicial repressivo, o prazo de três anos fixado no n.o 1 é alargado para um prazo mínimo de cinco anos e máximo de 10 anos, de acordo com a legislação nacional.»

35.      O artigo 105.o do Código Aduaneiro da União, sob a epígrafe «Prazo do registo de liquidação», enuncia no seu n.o 3:

«No caso de constituição de uma dívida aduaneira em circunstâncias não abrangidas pelo n.o 1, o registo de liquidação do montante dos direitos de importação ou de exportação devidos deve ser efetuado no prazo de 14 dias a contar da data em que as autoridades aduaneiras possam determinar o montante dos direitos de importação ou de exportação em questão e tomar uma decisão.»

36.      Em conformidade com o artigo 188.o deste código, sob a epígrafe «Conferência de uma declaração aduaneira»:

«Para a conferência da exatidão dos elementos de uma declaração aduaneira que tenha sido aceite, as autoridades aduaneiras podem:

a)      Verificar a declaração, bem como os documentos de suporte;

b)      Exigir ao declarante a apresentação de outros documentos;

c)      Verificar as mercadorias;

d)      Extrair amostras com vista à sua análise ou a uma verificação mais aprofundada das mercadorias.»

37.      O artigo 191.o do referido código, sob a epígrafe «Resultados da conferência da declaração», dispõe:

«1.      Os resultados da conferência da declaração aduaneira servem de base à aplicação das disposições que regem o regime aduaneiro a que as mercadorias se encontram sujeitas.

2.      Caso não se proceda à conferência da declaração aduaneira, o n.o 1 é aplicável com base nos elementos constantes da declaração.

3.      Os resultados da conferência efetuada pelas autoridades aduaneiras têm a mesma força probatória em todo o território aduaneiro da União.»

3.      Regulamento de aplicação

38.      Nos termos do artigo 181.o‑A do Regulamento (CEE) n.o 2454/93 da Comissão, de 2 de julho de 1993, que fixa determinadas disposições de aplicação do Regulamento n.o 2913/92 (14), conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 1335/2003 da Comissão, de 25 de julho de 2003 (15) (a seguir «regulamento de aplicação»):

«1.      As autoridades aduaneiras não deverão determinar necessariamente o valor aduaneiro das mercadorias importadas, baseando‑se no método do valor transacional, quando, de acordo com o procedimento descrito no n.o 2, baseadas em dúvidas fundadas, não estejam convencidas de que o valor declarado é o preço efetivamente pago ou a pagar definido no artigo 29.o do Código Aduaneiro.

2.      Sempre que as autoridades aduaneiras tenham dúvidas tal como referido no n.o 1, poderão solicitar informações complementares de acordo com o n.o 4 do artigo 178.o Se essas dúvidas persistirem, antes de tomarem uma decisão definitiva e se tal lhes for solicitado, as autoridades aduaneiras deverão informar o interessado por escrito dos motivos sobre os quais essas dúvidas são fundadas e darem‑lhe uma oportunidade razoável para responder. A decisão final bem como os respetivos motivos serão comunicados ao interessado por escrito.»

39.      O artigo 248.o, n.o 1, do regulamento de aplicação dispõe:

«A concessão da autorização de saída implica a imediata liquidação dos direitos de importação calculados de acordo com os elementos constantes da declaração. Quando as autoridades aduaneiras considerarem que os controlos efetuados podem conduzir à determinação de um montante de direitos superior ao resultante dos elementos constantes da declaração, exigirão, além disso, a prestação de uma garantia suficiente para cobrir a diferença entre o montante resultante dos elementos da declaração e aquele em que as mercadorias podem em definitivo ficar sujeitas. Todavia, o declarante tem a faculdade de, em substituição da garantia, pedir a liquidação imediata do montante dos direitos a que as mercadorias podem em definitivo ficar sujeitas.»

4.      Regulamento de execução

40.      O artigo 48.o do Regulamento de Execução (UE) 2015/2447 da Comissão, de 24 de novembro de 2015, que estabelece as regras de execução de determinadas disposições do Regulamento (UE) n.o 952/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece o Código Aduaneiro da União (16) (a seguir «regulamento de execução») sob a epígrafe «Disposições relativas à taxa de câmbio dos direitos pautais», prevê no seu n.o 1:

«O contravalor do euro, se necessário em conformidade com o disposto no artigo 53.o, n.o 1, alínea b), do Código, é fixado uma vez por mês.

A taxa de câmbio a utilizar é a taxa mais recente fixada pelo Banco Central Europeu antes do penúltimo dia do mês e aplica‑se ao longo de todo o mês seguinte.

No entanto, caso a taxa aplicável no início do mês difira em mais de 5 % da taxa fixada pelo Banco Central Europeu antes do dia 15 do mesmo mês, esta última taxa é aplicável a partir do dia 15 e até ao final do mês em questão.»

41.      O artigo 140.o do regulamento de execução, sob a epígrafe «Não aceitação de valores transacionais declarados», que visa dar execução ao artigo 70.o, n.o 1, do Código Aduaneiro da União, dispõe:

«1.      Sempre que as autoridades aduaneiras tenham dúvidas fundadas de que o valor transacional declarado representa o montante total efetivamente pago ou a pagar, referido no artigo 70.o, n.o 1, do Código, podem solicitar ao declarante que faculte informações adicionais.

2.      Se as suas dúvidas não forem dissipadas, as autoridades aduaneiras podem decidir que o valor das mercadorias não pode ser determinado em conformidade com o artigo 70.o, n.o 1, do Código.»

42.      Nos termos do artigo 144.o do regulamento de execução, sob a epígrafe «Método “fall back”», que visa dar execução ao artigo 74.o, n.o 3, do Código Aduaneiro da União:

«1.      Para a determinação do valor aduaneiro nos termos do artigo 74.o, n.o 3, do Código, pode utilizar‑se uma razoável flexibilidade na aplicação dos métodos previstos nos artigos 70.o e 74.o, n.o 2, do Código. O valor assim determinado deve, em toda a medida do possível, basear‑se em valores aduaneiros determinados anteriormente.

2.      Quando o valor aduaneiro não puder ser determinado nos termos do n.o 1, devem ser utilizados outros métodos adequados. Nesse caso, o valor aduaneiro não pode ser determinado com base:

a)      No preço de venda, no território aduaneiro da União, de mercadorias produzidas no território aduaneiro da União;

b)      Num sistema em que seja utilizado o mais elevado de dois valores possíveis para determinar o valor aduaneiro;

c)      No preço de mercadorias no mercado interno do país de exportação;

d)      No custo de produção, distinto dos valores calculados que foram determinados para mercadorias idênticas ou similares nos termos do artigo 74.o, n.o 2, alínea d), do Código;

e)      Nos preços de exportação para países terceiros;

f)      Em valores aduaneiros mínimos;

g)      Em valores arbitrários ou fictícios.»

43.      O artigo 244.o do regulamento de execução, sob a epígrafe «Prestação de uma garantia», disposição que visa dar execução ao artigo 191.o do Código Aduaneiro da União, prevê:

«Quando as autoridades aduaneiras considerem que a conferência da declaração aduaneira pode dar azo a que fique em dívida um montante de direitos de importação ou de exportação ou de outras imposições mais elevado do que o resultante dos elementos da declaração aduaneira, a autorização de saída das mercadorias fica subordinada à prestação de uma garantia suficiente para cobrir a diferença entre o montante constante dos elementos da declaração aduaneira e o montante que pode, por fim, ficar em dívida.

Todavia, em vez de apresentar a garantia, o declarante pode pedir a notificação imediata da dívida aduaneira à qual as mercadorias podem, em última instância, ficar sujeitas.»

C.      Direito em matéria de IVA

44.      Nos termos do artigo 2.o, n.o 1, da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (17), conforme alterada pela Diretiva 2009/69/CE do Conselho, de 25 de junho de 2009 (18) (a seguir «Diretiva 2006/112»):

«Estão sujeitas ao IVA as seguintes operações:

[…]

b)      As aquisições intracomunitárias de bens efetuadas a título oneroso no território de um Estado‑Membro:

i)      Por um sujeito passivo agindo nessa qualidade ou por uma pessoa coletiva que não seja sujeito passivo, quando o vendedor seja um sujeito passivo agindo nessa qualidade […]

[…]

d)      As importações de bens.»

45.      Em conformidade com o artigo 73.o desta diretiva, «o valor tributável compreende tudo o que constitui a contraprestação que o fornecedor ou o prestador tenha recebido ou deva receber em relação a essas operações, do adquirente, do destinatário ou de um terceiro».

46.      Segundo o artigo 83.o da referida diretiva:

«Nas aquisições intracomunitárias de bens, o valor tributável é constituído pelos mesmos elementos que os utilizados para determinar, em conformidade com o capítulo 2, o valor tributável da entrega desses mesmos bens no território do Estado‑Membro. Nomeadamente, nas operações assimiladas a aquisições intracomunitárias de bens referidas nos artigos 21.o e 22.o, o valor tributável é constituído pelo preço de compra dos bens ou de bens similares ou, na falta de preço de compra, pelo preço de custo, determinados no momento em que tais operações se realizam.»

47.      O artigo 85.o da Diretiva 2006/112 tem a seguinte redação:

«Nas importações de bens, o valor tributável é constituído pelo valor definido para efeitos aduaneiros pelas disposições comunitárias em vigor.»

48.      O artigo 86.o, n.o 1, desta diretiva tem a seguinte redação:

«O valor tributável inclui os seguintes elementos, caso não estejam já incluídos:

a)      Os impostos, direitos aduaneiros, taxas e demais encargos devidos fora do Estado‑Membro de importação, e bem assim os que são devidos em virtude da importação, com exceção do IVA a cobrar;

b)      As despesas acessórias, tais como despesas de comissão, de embalagem, de transporte e de seguro, verificadas até ao primeiro lugar de destino dos bens no território do Estado‑Membro de importação, bem como as despesas decorrentes do transporte para outro lugar de destino no território da Comunidade, se este lugar for conhecido no momento em que ocorre o facto gerador do imposto.»

49.      O artigo 87.o da Diretiva 2006/112 dispõe:

«O valor tributável não inclui os seguintes elementos:

a)      As reduções de preço resultantes de desconto por pagamento antecipado;

b)      Os abatimentos e bónus concedidos ao adquirente e obtidos no momento em que se efetua a importação.»

50.      Em conformidade com o artigo 138.o desta diretiva:

«1.      Os Estados‑Membros isentam as entregas de bens expedidos ou transportados, para fora do respetivo território mas na Comunidade, pelo vendedor, pelo adquirente ou por conta destes, efetuadas a outro sujeito passivo ou a uma pessoa coletiva que não seja sujeito passivo agindo como tal num Estado‑Membro diferente do Estado de partida da expedição ou do transporte dos bens.

2.      Para além das entregas referidas no n.o 1, os Estados‑Membros isentam as seguintes operações:

[…]

c)      As entregas de bens que consistam em transferências com destino a outro Estado‑Membro e que beneficiariam das isenções previstas no n.o 1 e nas alíneas a) e b) se fossem efetuadas para outro sujeito passivo.»

51.      O artigo 143.o da referida diretiva enuncia:

«1.      Os Estados‑Membros isentam as seguintes operações:

[…]

d)      As importações de bens expedidos ou transportados a partir de um território terceiro ou de um país terceiro para um Estado‑Membro que não seja o de chegada da expedição ou do transporte, no caso de a entrega desses bens, efetuada pelo importador designado ou reconhecido como devedor do imposto por força do disposto no artigo 201.o, estar isenta em conformidade com o artigo 138.o;

[…]

2.      A isenção prevista na alínea d) do n.o 1 só se aplica nos casos em que a importação de bens é seguida da entrega de bens isenta ao abrigo do n.o 1 e da alínea c) do n.o 2 do artigo 138.o se, no momento da importação, o importador tiver prestado às autoridades competentes do Estado‑Membro de importação pelo menos as seguintes informações:

a)      O seu número de identificação para efeitos de IVA emitido no Estado‑Membro de importação ou o número de identificação para efeitos de IVA do seu representante fiscal, devedor do imposto, emitido no Estado‑Membro de importação;

b)      O número de identificação para efeitos de IVA do adquirente, a quem os bens são entregues nos termos do n.o 1 do artigo 138.o, emitido noutro Estado‑Membro, ou o seu próprio número de identificação para efeitos de IVA emitido no Estado‑Membro de chegada da expedição ou do transporte dos bens quando os mesmos são objeto de transferência nos termos da alínea c) do n.o 2 do artigo 138.o;

c)      A prova de que os bens importados se destinam a ser transportados ou expedidos do Estado‑Membro de importação para outro Estado‑Membro.

Todavia, os Estados‑Membros podem prever que a prova a que se refere a alínea c) seja apresentada às autoridades competentes apenas mediante pedido.»

III. Matéria de facto e procedimento précontencioso

A.      Factos na origem do litígio

52.      A partir de 1 de janeiro de 2005, a União Europeia suprimiu todos os contingentes aplicáveis às importações de produtos têxteis e de vestuário originários de países membros da Organização Mundial do Comércio, incluindo da China.

53.      Em 20 de abril de 2007, o Organismo Europeu de Luta Antifraude (OLAF) enviou aos Estados‑Membros a mensagem de assistência mútua 2007/015 a fim de informar estes últimos do risco de subavaliação de produtos têxteis e de calçado importados da China.

54.      Através desta mensagem, o OLAF convidava todos os Estados‑Membros, por um lado, a analisarem as importações de produtos têxteis e de calçado provenientes, nomeadamente, da China para detetar eventuais indícios de importações subavaliadas e, por outro, a procederem a controlos adequados aquando dos desalfandegamentos efetuados para tais importações.

55.      Em seguida, a fim de ajudar os Estados‑Membros a detetar os envios subavaliados de produtos têxteis e de calçado, o OLAF, em cooperação com o Centro Comum de Investigação da Comissão (a seguir «JRC»), desenvolveu um instrumento de avaliação dos riscos assente em dados à escala da União (a seguir «metodologia OLAF»). Essa ferramenta consiste, desde logo, em calcular um preço médio corrigido para qualquer produto têxtil e de calçado importado da China e abrangido pelos capítulos 61 a 64 da Nomenclatura Combinada da pauta aduaneira (19). Os preços médios corrigidos são calculados com base nos preços mensais de importação dos produtos em causa provenientes da China extraídos da base de dados estatística Comext, uma base de dados de referência para o comércio internacional gerida pelo Eurostat, por um período de 48 meses. Estes preços exprimem um valor por quilograma para cada um dos 495 códigos de produtos de oito algarismos da Nomenclatura Combinada em causa, precisando o país de origem e o país de destino na União. Em seguida, é calculada uma média para toda a União (os preços médios corrigidos para a União‑28) com base na média aritmética (média não ponderada) dos preços médios corrigidos dos 28 Estados‑Membros (20). Para calcular essas médias, os valores extremos, isto é, os valores anormalmente elevados ou baixos, são excluídos, razão pela qual o preço médio é designado por «corrigido». Por último, é calculado um valor correspondente a 50 % do preço médio corrigido, que constitui o «preço mínimo aceitável», igualmente expresso em preço por quilograma, que é utilizado como limiar que permite às autoridades aduaneiras dos Estados‑Membros detetar valores particularmente baixos declarados na importação e, portanto, as importações de alto risco.

56.      A mensagem de assistência mútua AM/2009/001, enviada pelo OLAF em 23 de janeiro de 2009, referia‑se à operação «Argus», uma operação com uma duração de seis meses no âmbito da qual o OLAF tinha vigiado o tráfico de produtos têxteis e de calçado proveniente de diferentes países terceiros mas principalmente da Ásia, e transmitido mensalmente aos Estados‑Membros uma lista das importações do mês precedente identificadas como estando em risco em termos de valor aduaneiro. Através desta mensagem, o OLAF pedia aos Estados‑Membros que lhe comunicassem, no prazo de quatro meses, a criação de filtros de risco, que identificassem as remessas de alto risco e efetuassem verificações após o desalfandegamento com base nas suas comunicações.

57.      Em 2011, no decurso da ação de controlo prioritário designada «Discount» (a seguir «ACP Discount»), coordenada pela Direção‑Geral da Fiscalidade e da União Aduaneira da Comissão e na qual participaram todos os Estados‑Membros, entre os quais o Reino Unido, os preços mínimos aceitáveis foram aplicados a fim de detetar e controlar as importações de produtos têxteis e de calçado provenientes da China que apresentavam um valor aduaneiro baixo ao ponto de as tornar suspeitas.

58.      Em 2014, o OLAF coordenou a operação aduaneira conjunta designada «Snake», cuja fase operacional teve lugar de 17 de fevereiro a 17 de março de 2014 e na qual participaram todos os Estados‑Membros e as autoridades aduaneiras chinesas. A implicação destas últimas visava obter declarações de exportação que permitissem verificar o valor declarado na importação para a União dos produtos em causa. No relatório final da operação Snake, os Estados‑Membros eram convidados a prosseguir a utilização dos perfis de risco baseados nos preços mínimos aceitáveis tal como aplicados no decurso dessa operação.

59.      Na sequência dos controlos efetuados pelas autoridades do Reino Unido no âmbito desta operação com base nos referidos perfis de risco, estas declararam a existência de direitos aduaneiros adicionais relativamente a 24 operadores a título das suas importações durante um período de três anos compreendido entre novembro de 2011 e novembro de 2014.

60.      Durante a missão de inspeção 14‑11‑1, efetuada no Reino Unido de 27 a 31 de outubro de 2014, a Comissão examinou formulários de informação sobre o risco, notificações de assistência mútua e 24 operações de importações selecionadas ao acaso, das quais 23 estavam inscritas na contabilidade B.

61.      Entre novembro de 2014 e fevereiro de 2015, as autoridades do Reino Unido comunicaram os avisos de pagamento dos referidos montantes aos operadores em causa através da emissão de 24 ordens de cobrança a posteriori, denominadas «avisos de pagamento C18» (a seguir «avisos de pagamento C18 Snake»), que foram posteriormente anuladas.

62.      Em 16 de janeiro de 2015, o OLAF instaurou um inquérito dirigido especificamente a certos Estados‑Membros, entre os quais o Reino Unido, e que cobria um período com início em 2013.

63.      Entre 2013 e 2016, a operação «Badminton» foi levada a cabo pela Her Majesty’s Revenue and Customs (Administração Fiscal e Aduaneira do Reino Unido, a seguir «HMRC») e pela polícia de fronteiras do Reino Unido. Esta operação, que incidia principalmente sobre a fraude ao IVA, foi o quadro de um inquérito penal inicial que visava quatro grandes operadores que importavam os produtos em causa originários da China a título do «regime aduaneiro 42», ou seja, o regime no âmbito do qual os direitos aduaneiros são pagos aquando da importação, mas em que o IVA deve ser pago posteriormente no Estado‑Membro de destino (a seguir «regime aduaneiro 42») (21).

64.      Entre fevereiro de 2015 e julho de 2016, o Reino Unido participou em dez reuniões organizadas pelo OLAF, consagradas à subavaliação de produtos têxteis e de calçado provenientes da China.

65.      Em 19 e 20 de fevereiro de 2015, o OLAF organizou uma primeira reunião bilateral com a HMRC para discutir o acompanhamento da operação Snake e a utilização dos preços médios corrigidos como indicadores de risco de subavaliação aduaneira. Nessa reunião, o OLAF salientou que o volume das importações suscetíveis de serem fraudulentamente subavaliadas não tinha diminuído e que resultava das estatísticas que o Reino Unido atraía mais tráfego fraudulento devido às medidas adotadas por outros Estados‑Membros. Por seu turno, a HMRC indicou que tencionava enviar ordens de cobrança do IVA e dos direitos aduaneiros eludidos às empresas que tinham sido identificadas na operação Snake e na sequência das suas próprias análises, num montante total de mais de 800 milhões de libras esterlinas (GBP).

66.      O Reino Unido repetiu a sua intenção de proceder à referida cobrança na reunião ad hoc de 25 e 26 de fevereiro de 2015 sobre a «fraude por subavaliação», reunião organizada pelo OLAF e na qual participaram as autoridades dos Estados‑Membros. Nessa reunião, o OLAF «recomendou fortemente», nomeadamente, que os Estados‑Membros utilizassem filtros de risco adequados para identificar as remessas potencialmente subavaliadas, que exigissem garantias para as remessas identificadas como suspeitas e que conduzissem inquéritos a fim de determinar o valor aduaneiro. O OLAF descreveu igualmente as potenciais perdas de recursos próprios tradicionais à escala da União devido às importações suscetíveis de serem subavaliadas, nomeadamente no que respeita às importações para o Reino Unido (22).

67.      Em 16 de junho de 2015, o OLAF transmitiu a mensagem de assistência mútua 2015/013, na qual pedia aos Estados‑Membros que tomassem todas as medidas de precaução necessárias para proteger os interesses financeiros da União face ao risco de importações subavaliadas de produtos têxteis e de calçado provenientes da China.

68.      Em maio de 2015, o Reino Unido lançou a operação dita «Breach» para combater a fraude por subavaliação. Um dos objetivos desta operação foi, segundo o Reino Unido, determinar, na sequência da anulação dos 24 avisos de pagamento C18 Snake, o valor aduaneiro das mercadorias subavaliadas detetadas durante a operação Snake e reclamar os montantes dos recursos próprios tradicionais eludidos. Esta operação implicava, nomeadamente, controlos prévios e visitas a posteriori relacionados com as expedições suspeitas, análises documentais, auditorias e inspeções, o exame do caráter comercial das vendas em causa e o exame das ligações entre o importador, os transitários e outras empresas, bem como atividades de sensibilização dos importadores, destinadas a identificar as atividades fraudulentas. Foram igualmente realizadas cerca de trinta inspeções prévias e recolhidas amostras. Foram emitidos vários avisos de pagamento C18. Na audiência, o Reino Unido afirmou que as medidas adotadas no âmbito desta operação ainda estavam em curso.

69.      Em 28 de julho de 2015, o OLAF organizou uma segunda reunião bilateral com a HMRC. Esta última indicou, nomeadamente, que estava a dar continuidade ao procedimento de cobrança de mais de 800 milhões de GBP, sendo caso disso por via judicial, e que tinha constituído um grupo de ação pluridisciplinar no âmbito da operação Breach que tinha por objetivo examinar a situação dos importadores envolvidos no tráfego fraudulento. Todavia, segundo a HMRC, a utilização de indicadores de risco baseados em preços médios seria contraproducente e desproporcionada tendo em conta o volume das importações com destino ao Reino Unido.

70.      Em 3 de fevereiro de 2016, o OLAF organizou uma terceira reunião bilateral com a HMRC, que declarou que o Reino Unido tinha controlado as dezasseis empresas em causa no âmbito da operação Snake. O OLAF recomendou novamente que a HMRC recorresse aos indicadores de risco à escala da União baseados no preço mínimo aceitável. Sublinhou a elevada percentagem de importações com destino ao Reino Unido consideradas subavaliadas e na origem de perdas importantes em matéria de direitos aduaneiros.

71.      Em 22 e 23 de março de 2016, o OLAF organizou uma quarta reunião bilateral com a HMRC. Reafirmou a utilidade de aplicar os indicadores de risco a nível da União enquanto medida preventiva à importação e propôs meios práticos para a sua implementação progressiva pelas autoridades do Reino Unido. O OLAF fez novamente o ponto da situação da altura, mostrando assim que as perdas de recursos próprios tradicionais no Reino Unido se intensificavam, principalmente devido ao recurso abusivo ao regime aduaneiro 42.

72.      Em julho de 2016, numa reunião bilateral, o OLAF apresentou um relatório que demonstrava que as perdas de recursos próprios tradicionais se acentuavam no Reino Unido.

73.      Em 18 e 19 de setembro de 2016, numa reunião multilateral, as autoridades francesas apresentaram os resultados da operação designada «Octopus», uma operação conduzida por estas autoridades com a participação de dez Estados‑Membros (entre os quais o Reino Unido) e com o apoio do OLAF. Resulta do relatório final sobre esta operação que as redes criminosas organizadas estavam na origem das fraudes por subavaliação. O destinatário inscrito nas declarações aduaneiras de importação era quase sempre um operador desaparecido ou uma empresa «fénix». Concluíram igualmente que a grande maioria das mercadorias transportadas, controladas em França com base em critérios predefinidos, apresentava montantes subestimados, declarados de forma fraudulenta no Reino Unido no âmbito do regime aduaneiro 42.

74.      Em outubro de 2016 as autoridades do Reino Unido levaram a cabo uma operação experimental, batizada «Samurai», que visava as importações de dois operadores, os quais cessaram as suas atividades imediatamente após a HMRC ter contestado as suas declarações aduaneiras.

75.      Em 1 de março de 2017, o OLAF encerrou o seu inquérito relativo à subavaliação das importações no Reino Unido e apresentou o seu relatório (a seguir «Relatório OLAF») nos termos do qual os importadores no Reino Unido eludiram montantes elevados de direitos aduaneiros apresentando na importação faturas falsas, faturas fictícias e declarações de valor aduaneiro incorretas. O OLAF revelou um aumento sério da amplitude do mecanismo de fraude por subavaliação que transitou pelo Reino Unido entre 2013 e 2016. Este período coincidia com a aplicação por outros Estados‑Membros de perfis de risco assentes no instrumento de avaliação dos riscos baseado nos preços médios corrigidos, como recomendava o OLAF.

76.      Segundo este relatório, durante o referido período, as importações fraudulentas que transitaram pelo Reino Unido aumentaram de forma significativa, devido à inadequação dos controlos. Em 2016, mais de 50 % dos produtos têxteis e do calçado provenientes da China importados no Reino Unido foram declarados abaixo dos preços mínimos aceitáveis, ao passo que cerca de 80 % das perdas totais dos recursos próprios tradicionais eram imputáveis à subavaliação de produtos têxteis e de calçado importados para o Reino Unido.

77.      O Relatório OLAF precisava, além disso, que grupos criminosos organizados que operam em toda a União estiveram na origem dessa fraude. A maior parte das importações para o Reino Unido dizia respeito a fornecimentos destinados ao mercado negro de têxteis e de calçado noutros Estados‑Membros. A maior parte dessas importações foi efetuada recorrendo abusivamente ao regime aduaneiro 42 (23). Assim, o OLAF considerou que a evasão ao IVA devido nos Estados‑Membros de destino final das mercadorias, nomeadamente a Alemanha, a Espanha, a França e a Itália, era igualmente substancial. O OLAF sublinhou que o Reino Unido não tinha aplicado perfis de risco baseados nos preços mínimos aceitáveis, como o OLAF lhe tinha recomendado, e não tinha efetuado controlos aduaneiros adequados à importação, exceto no decurso de um mês aquando da operação Snake (24).

78.      Por conseguinte, segundo esse relatório, o Reino Unido introduziu em livre prática, sem proceder a controlos aduaneiros, produtos têxteis e calçado provenientes da China subavaliados, pelo que uma parte substancial dos direitos aduaneiros não foi cobrada nem colocada à disposição do orçamento da União. Assim, o OLAF calculou, no seu relatório, as perdas de recursos próprios tradicionais para o período entre 2013 e 2016 que daí resultaram (25). Em especial, determinou, para o código da Nomenclatura Combinada de cada produto em causa, a quantidade (em kg) de mercadorias subavaliadas (consideradas como as mercadorias declaradas a um valor inferior ao preço mínimo aceitável em causa), e a diferença entre o valor declarado e o preço médio corrigido em causa (preço médio corrigido para a União‑28) do produto em questão, aplicando depois a essa diferença a taxa do direito aduaneiro em vigor. Neste contexto, o OLAF recomendou à HMRC que adotasse todas as medidas adequadas para recuperar o referido montante e aplicasse indicadores de risco.

79.      Entre novembro de 2016 e outubro de 2018, por força das disposições do Regulamento n.o 608/2014 relativas ao controlo e à vigilância dos recursos próprios tradicionais, os agentes mandatados da Comissão efetuaram cinco inspeções relativas, nomeadamente, à subavaliação.

80.      Durante a missão de inspeção 16‑11‑1, que teve lugar entre 14 e 18 de novembro de 2016, a Comissão, após ter verificado que os montantes dos direitos aduaneiros que tinham sido anulados na contabilidade B correspondiam às dívidas suplementares inicialmente reclamadas através da emissão dos 24 avisos de pagamento C18 Snake relativos às importações subavaliadas detetadas no âmbito da operação Snake mas posteriormente retirados, convidou as autoridades do Reino Unido a determinar o valor aduaneiro de todas as declarações de importação em causa, a recalcular os direitos adicionais devidos sobre esses montantes, a lançar as dívidas correspondentes na contabilidade B e a cobrar os montantes em causa o mais rapidamente possível.

81.      Perguntou igualmente às referidas autoridades se aplicavam o instrumento dos preços médios corrigidos desenvolvido pelo OLAF para detetar as importações subavaliadas, se efetuavam controlos físicos no momento do desalfandegamento e se pediam sistematicamente o pagamento de uma garantia que cobrisse os direitos suscetíveis de serem exigíveis em conformidade com o artigo 248.o, n.o 1, do regulamento de aplicação.

82.      Durante a missão de inspeção 17‑11‑1, efetuada de 8 a 12 de maio de 2017, a Comissão selecionou doze declarações de importação apresentadas no decurso do primeiro trimestre de 2017 e contendo valores particularmente baixos, para efeitos de uma verificação no local. O exame confirmou que os doze lotes abrangidos por essas declarações tinham sido introduzidos em livre prática na União sem controlo e sem constituição de garantia. As autoridades do Reino Unido confirmaram que não tinham implementado as medidas pedidas pelo OLAF no seguimento da operação Snake em 2014, e posteriormente no Relatório de Inspeção 16‑11‑1. Explicaram que tal se devia principalmente à avaliação dos seus conselheiros jurídicos segundo a qual não estava disponível nenhum método de avaliação aceitável. Todavia, as importações em causa eram examinadas pelo grupo de ação estabelecido no âmbito da operação Breach.

83.      Durante a missão de inspeção 17‑11‑2, que decorreu entre 13 e 17 de novembro de 2017, cinco declarações de importação de valores particularmente baixos e relativas a importadores já identificados no âmbito da operação Snake como potenciais autores de fraudes foram examinadas pelos agentes da Comissão com base num dos 24 avisos de pagamento C18 Snake provenientes dessa operação, num montante total de 62 003 024,23 GBP. Todavia, revelou‑se impossível recuperar as dívidas correspondentes às diferentes declarações de importação, o que, segundo a HMRC, justificava a anulação dessas dívidas.

84.      Nessa missão, as autoridades do Reino Unido informaram os agentes da Comissão do lançamento, pela HMRC, em 12 de outubro de 2017, da operação denominada «Swift Arrow». O Reino Unido explicou que os perfis de risco utilizados no âmbito dessa operação se baseavam, não nos limiares estabelecidos pelo OLAF, mas em limiares ou perfis de risco nacionais fixados pela HMRC apenas com base nas importações para o Reino Unido. Contudo, estes perfis só eram aplicados a certos operadores previamente identificados como ativos no comércio fraudulento. Os contentores detetados por esses perfis de risco são objeto de controlos físicos por parte das autoridades do Reino Unido durante o desalfandegamento. Se estas considerarem que o valor declarado não é justificado, exigem um pagamento a título de garantia antes da saída das mercadorias.

85.      Durante a missão de inspeção 18‑11‑1, efetuada entre 16 e 20 de abril de 2018, 25 declarações de importação relativas ao período compreendido entre 12 de outubro de 2017, início da denominada operação «Swift Arrow», e 31 de dezembro de 2017, foram inspecionadas pelos agentes da Comissão. Verificou‑se que apenas sete dos 25 registos que apresentavam um valor extremamente baixo foram detetados pelo perfil de risco criado pela HMRC e que os outros 18 contentores foram introduzidos em livre circulação sem que o valor aduaneiro tivesse sido contestado. As autoridades do Reino Unido indicaram que, desde o lançamento da operação Swift Arrow, o perfil de risco tinha sido ajustado para incluir mais operadores, códigos da Nomenclatura Combinada (NC) e pontos de entrada, pelo que, se as importações em causa tivessem ocorrido em abril de 2018, o perfil teria detetado onze registos suplementares.

86.      Além disso, segundo estas autoridades, vários operadores selecionados interromperam as suas importações desde que foram incluídos nos perfis de risco, foram objeto de controlos antes da autorização de saída e lhes foi pedido para prestarem garantias antes de lhes ser concedida a autorização de saída das mercadorias.

87.      Todavia, estas autoridades recusaram divulgar os pormenores do método de cálculo utilizado pela HMRC para determinar as garantias exigidas no âmbito da operação Swift Arrow e para emitir as ordens de cobrança a posteriori, a saber, os avisos de pagamento C18 Snake.

88.      Em maio de 2018, no âmbito da operação Breach, o Reino Unido emitiu avisos de pagamento C18 (a seguir «avisos de pagamento C18 Breach»), no montante total de 25 milhões de GBP relativamente a um período que remontava a 2015.

89.      Durante a missão de inspeção 18‑11‑2, que decorreu entre 8 e 12 de outubro de 2018, as autoridades do Reino Unido mantiveram essa recusa. Em contrapartida, confirmaram que tinham apurado, em abril de 2018, direitos adicionais relativamente a sete operadores, vários dos quais já investigados durante a operação Snake, num montante total de 19 434 197,73 de GBP.

B.      Procedimento précontencioso

90.      Por cartas de 24 de março de 2017 e de 28 de julho de 2017, a Comissão informou‑se junto do Reino Unido do seguimento dado ao Relatório OLAF. Indicou que não tinha recebido informações adicionais concretas por parte do Reino Unido e que nada levava a pensar que este Estado tinha adotado as medidas adequadas para prevenir a fraude por subavaliação verificada nesse relatório. Na falta de informações em contrário, a Comissão indicou que se via obrigada a pedir ao Reino Unido que disponibilizasse um montante de recursos próprios tradicionais correspondente às perdas determinadas pelo OLAF (deduzidas as despesas de cobrança).

91.      Numa das três cartas de 28 de julho de 2017, pediu igualmente para ser informada do seguimento dado pelas autoridades do Reino Unido ao Relatório da missão de inspeção 16‑11‑1, reiterando a este respeito o seu pedido de poder dispor da avaliação jurídica que conduziu à anulação dos 24 avisos de pagamento C18 Snake, bem como da lista dos registos relativos a cada um dos 24 processos, incluindo os cálculos efetuados para apurar as dívidas aduaneiras.

92.      Por cartas de 8 de agosto de 2017 e de 12 de outubro de 2017, o Reino Unido respondeu a esses pedidos. No que respeita, antes de mais, ao Relatório OLAF, o Reino Unido salientou que foram tomadas medidas para combater o problema da subavaliação, tal como o lançamento da operação Breach. O direito da União não impõe, aliás, um modelo específico de controlo, pelo que compete a cada Estado‑Membro decidir a melhor forma de fazer aplicar a lei. Além disso, medidas de controlo prévias à autorização de saída, incluindo a imposição de garantias, não são, por natureza, mais eficazes do que medidas a posteriori como as desenvolvidas pelo Reino Unido. A metodologia OLAF, na medida em que se baseia na aplicação de dados estabelecidos à escala da União, não é sólida nem adequada para o Reino Unido. Este modelo é criticável, razão pela qual o Reino Unido desenvolveu a sua própria abordagem que não contém as falhas da metodologia OLAF. Em seguida, quanto ao seguimento do Relatório da missão de inspeção 16‑11‑1, o Reino Unido indicou que a razão da anulação dos 24 avisos de pagamento C18 Snake e da correspondente retirada dos montantes da contabilidade B era a sua incapacidade de provar o montante dos valores reais das mercadorias importadas, mas que um grupo de peritos resolveria este problema no âmbito da operação Breach. Por último, o Reino Unido repetiu não poder dar seguimento ao pedido de disponibilização da avaliação jurídica da HMRC que conduziu à anulação dos avisos de pagamento C18 Snake, invocando, a este respeito, motivos de confidencialidade e de proteção do segredo profissional entre um advogado e o seu cliente.

93.      Em 9 de março de 2018, a Comissão enviou ao Reino Unido uma notificação para cumprir.

94.      O Reino Unido respondeu em 22 de junho de 2018. Em anexo a esta resposta, este Estado pedia que lhe fosse transmitida uma versão completa do Relatório OLAF, uma vez que apenas dispunha de uma versão incompleta desse relatório, e que a Comissão lhe fornecesse respostas a perguntas detalhadas sobre o método utilizado para calcular os montantes de recursos próprios tradicionais exigidos.

95.      Em 24 de setembro de 2018, a Comissão enviou ao Reino Unido um parecer fundamentado, no qual respondeu, nomeadamente, aos pedidos formulados por este Estado em anexo à sua carta de 22 de junho de 2018 e fixou o prazo de resposta em dois meses.

96.      Em 19 de dezembro de 2018 a Comissão, não tendo recebido do Reino Unido resposta ao parecer fundamentado no prazo fixado, decidiu intentar a presente ação por incumprimento no Tribunal de Justiça, após ter informado o Reino Unido, em 18 de dezembro de 2018, que tomaria essa decisão no dia seguinte.

97.      Em 9 de janeiro de 2019 realizou‑se uma reunião técnica entre as autoridades do Reino Unido e a Comissão, na qual uma empresa de consultadoria apresentou as suas conclusões, que figuravam num relatório encomendado pelo Reino Unido.

98.      Em 11 de fevereiro de 2019, o Reino Unido transmitiu à Comissão a sua resposta ao parecer fundamentado, que consistia numa nota de cobertura e num anexo com um relatório de uma empresa de consultadoria.

IV.    Tramitação do processo no Tribunal de Justiça

99.      Em 7 de março de 2019, considerando que os argumentos apresentados pelo Reino Unido não permitiam refutar as acusações formuladas no parecer fundamentado, a Comissão intentou a presente ação.

100. O Reino da Bélgica, a República da Estónia, a República Helénica, a República da Letónia, a República Portuguesa e a República Eslovaca (a seguir, considerados em conjunto, «intervenientes») apresentaram articulados de intervenção em apoio do Reino Unido no presente processo.

101. Por carta de 6 de junho de 2020, o Reino Unido apresentou um pedido de diligências de instrução ou de organização do processo com vista a que o Tribunal de Justiça ordenasse à Comissão que respondesse a uma série de questões, algumas das quais já tinham sido colocadas nos pedidos de informação que o Reino Unido enviou à Comissão em 22 de junho de 2018 e 22 de março de 2019. Por carta de 11 de abril de 2019, o Reino Unido pediu ao Tribunal de Justiça que impusesse à Comissão que respondesse às questões colocadas no pedido de 22 de março de 2019 (a seguir «pedido de informações redefinido») (26).

102. Por carta de 14 de outubro de 2020, o Tribunal de Justiça enviou à Comissão e ao Reino Unido perguntas com pedido de resposta escrita. Por documentos escritos de 16 de novembro de 2020, estas partes responderam a essas perguntas.

103. Em 8 de dezembro de 2020 realizou‑se uma audiência no decurso da qual foram apresentadas observações orais, por um lado, pelo Reino Unido, em apoio do qual intervieram a República da Estónia, a República da Letónia e a República Portuguesa, e, por outro, pela Comissão. Foi pedido a estas partes que concentrassem as suas alegações no conteúdo das respostas mencionadas no número anterior das presentes conclusões.

V.      Pedidos das partes

104. Na sua petição, a Comissão pede ao Tribunal de Justiça que declare que,

—        ao não ter tido em conta os montantes corretos dos direitos aduaneiros e ao não ter disponibilizado o montante correto dos recursos próprios tradicionais e dos recursos próprios [baseados no IVA] relativos a certas importações de produtos têxteis e de calçado provenientes da China, o Reino Unido não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força dos artigos 2.o e 8.o da Decisão 2014/335, dos artigos 2.o e 8.o da Decisão 2007/436, dos artigos 2.o, 6.o, 9.o, 10.o, 12.o e 13.o do Regulamento n.o 609/2014, dos artigos 2.o, 6.o, 9.o, 10.o, 11.o e 17.o do Regulamento n.o 1150/2000, do artigo 2.o do Regulamento n.o 1553/89, do artigo 105.o, n.o 3, do Código Aduaneiro da União e do artigo 220.o, n.o 1, do Código Aduaneiro Comunitário;

—        como consequência do incumprimento das obrigações que lhe incumbem por força do artigo 4.o, n.o 3, TUE, do artigo 325.o e do artigo 310.o, n.o 6, TFUE, dos artigos 3.o e 46.o do Código Aduaneiro da União, do artigo 13.o do Código Aduaneiro Comunitário, do artigo 248.o, n.o 1, do regulamento de aplicação, do artigo 244.o do regulamento de execução e dos artigos 2.o, n.o 1, alíneas b) e d), 83.o, 85.o, 86.o, 87.o e 143.o, n.os 1, alínea d), e 2, da Diretiva 2006/112;

—        [As perdas de recursos próprios tradicionais correspondentes (que devem ser colocadas) à disposição do orçamento da União (deduzidas as despesas de cobrança), ascendem a:

—        496 025 324,30 euros em 2017 (até 11 de outubro de 2017 inclusive);

—        646 809 443,80 euros em 2016;

—        535 290 329,16 euros em 2015;

—        480 098 912,45 euros em 2014;

—        325 230 822,55 euros em 2013;

—        173 404 943,81 euros em 2012;

—        22 777 312,79 euros em 2011.] (27)

—        ao não ter comunicado à Comissão todas as informações necessárias para determinar o montante das perdas de recursos próprios tradicionais e ao não ter fornecido, como solicitado, o conteúdo da avaliação jurídica do serviço jurídico da HMRC ou os fundamentos da decisão que levou à anulação das dívidas aduaneiras declaradas, o Reino Unido não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 4.o, n.o 3, TUE e do artigo 2.o, n.os 2 e 3, alínea d), do Regulamento n.o 608/2014; e

—        [que] conden[e] o Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte nas despesas.

105. O Reino Unido pede que o Tribunal de Justiça se digne:

—        declarar a ação total ou parcialmente inadmissível;

—        a título subsidiário, declarar que

—        o Reino Unido não incumpriu a sua obrigação de combater a fraude, quer a título dos recursos próprios tradicionais quer da cooperação leal;

—        as medidas adotadas pelo Reino Unido não tiveram consequências para o orçamento da União, razão pela qual não pode ser obrigado a indemnizar a União seja por que montante for;

—        a título subsidiário, se o Tribunal de Justiça declarar que um incumprimento específico acarretou uma perda para a União, permitir ao Reino Unido avaliar e declarar os recursos próprios tradicionais suplementares decorrentes da declaração de responsabilidade, sem determinar ele próprio o montante das perdas desses recursos;

—        a título ainda mais subsidiário, na hipótese de o Tribunal de Justiça decidir pronunciar‑se sobre o pedido relativo às perdas de recursos próprios tradicionais, examinar a avaliação destes efetuada pelo Reino Unido;

—        a título ainda mais subsidiário, na hipótese de o Tribunal de Justiça não aprovar as opções metodológicas do Reino Unido, «reconhecer que a Comissão deve, na sua avaliação das perdas de recursos próprios tradicionais, satisfazer os requisitos de prova aplicáveis nas ações de indemnização contra um Estado‑Membro, o que não fez»;

—        indeferir a reclamação relativa aos recursos próprios provenientes do IVA, por falta de base jurídica e de quantificação; e

—        condenar a Comissão nas despesas.

106. Todos os Estados‑Membros intervenientes concluem pedindo, em substância, que a ação seja julgada improcedente. A República Eslovaca e a República Portuguesa pedem, além disso, a condenação da Comissão na totalidade das despesas.

VI.    Quanto à ação

107. Antes de examinar os fundamentos invocados pela Comissão em apoio da sua ação, há que analisar as exceções de inadmissibilidade suscitadas pelo Reino Unido na sua contestação (secção A). Quanto ao mérito, esta ação articula‑se, em substância, em torno de quatro fundamentos. Em primeiro lugar, a Comissão alega que, durante o período de infração, o Reino Unido não tomou medidas destinadas a proteger os interesses financeiros da União, constituindo esta omissão um incumprimento tanto das obrigações gerais em matéria de proteção dos interesses financeiros da União e de luta contra a fraude como da obrigação de as autoridades aduaneiras tomarem medidas destinadas a proteger os interesses financeiros da União, de efetuarem controlos com base numa análise de risco e de exigirem o pagamento de garantias (secção B). Em segundo lugar, a Comissão sustenta que o Reino Unido violou as disposições da regulamentação em matéria de recursos próprios, uma vez que os direitos aduaneiros das mercadorias importadas não foram calculados corretamente e que os montantes dos recursos próprios correspondentes a esses direitos não foram apurados nem colocados à disposição do orçamento da União no momento em que o deviam ter sido (secção C). Em terceiro lugar, há que examinar o argumento relativo à violação do dever de cooperação leal conforme consagrado no artigo 4.o, n.o 3, TUE (secção D). Em quarto lugar, a Comissão alega, em substância, que, uma vez que não determinou corretamente o valor aduaneiro das mercadorias subavaliadas aquando da sua importação devido à inexistência de medidas de controlo efetivas, o Reino Unido violou a legislação em matéria de IVA e não colocou à disposição do orçamento da União a totalidade dos recursos próprios provenientes do IVA (secção E).

A.      Quanto à admissibilidade

108. Na sua contestação, o Reino Unido suscita cinco categorias de exceções de inadmissibilidade relativas, em primeiro lugar, à violação dos direitos de defesa no âmbito do procedimento pré‑contencioso e do processo no Tribunal de Justiça, em segundo lugar, à irregularidade do procedimento pré‑contencioso e da petição no que respeita à tomada em consideração do IVA ao abrigo do regime aduaneiro 42 (28), em terceiro lugar, à violação, pela Comissão, dos princípios da confiança legítima, da segurança jurídica, do estoppel e da cooperação leal, em quarto lugar, à impossibilidade de ordenar a disponibilização dos montantes nos termos do artigo 258.o TFUE, e, em quinto lugar, ao caráter prematuro da ação no que respeita ao período de 1 de maio de 2015 a 11 de outubro de 2017.

109. A quinta exceção de inadmissibilidade está intrinsecamente relacionada com a análise dos argumentos de mérito do segundo fundamento relativos ao não apuramento e colocação à disposição do orçamento da União no prazo fixado dos montantes de recursos próprios correspondentes aos direitos aduaneiros. Assim, a argumentação do Reino Unido relativa ao caráter prematuro da ação no que respeita ao período entre 1 de maio de 2015 e 11 de outubro de 2017, apresentada no âmbito desta exceção de inadmissibilidade, visa, na realidade, pôr em causa o incumprimento imputado no âmbito do segundo fundamento e reduzir a dimensão das perdas dos recursos próprios tradicionais cujo apuramento é pedido pela Comissão. Proponho, portanto, que a quinta categoria de exceção de inadmissibilidade seja analisada no âmbito do exame do mérito deste fundamento.

110. Assim, importa examinar, a título prévio, as quatro primeiras categorias de exceções de inadmissibilidade para determinar se a presente ação por incumprimento intentada pela Comissão é admissível.

1.      Quanto à exceção de inadmissibilidade relativa à alegada violação dos direitos de defesa do Reino Unido durante o procedimento précontencioso e o processo no Tribunal de Justiça

111. O Reino Unido sustenta, em substância, que a presente ação é inadmissível, uma vez que os seus direitos de defesa não foram respeitados no âmbito do procedimento pré‑contencioso nem no âmbito do processo no Tribunal de Justiça.

112. A título preliminar, por um lado, importa recordar que, no que se refere ao procedimento pré‑contencioso, resulta de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que este tem por finalidade dar ao Estado‑Membro em causa a oportunidade de, simultaneamente, cumprir as suas obrigações decorrentes do direito da União e apresentar utilmente os seus meios de defesa face às acusações formuladas pela Comissão (29). A regularidade desse procedimento constitui uma garantia essencial pretendida pelo Tratado FUE não só para a proteção dos direitos do Estado‑Membro em causa, mas igualmente para assegurar que o processo contencioso eventual terá por objeto um litígio claramente definido (30).

113. Ademais, embora o parecer fundamentado deva conter uma exposição coerente e detalhada das razões que levaram a Comissão à convicção de que o Estado‑Membro interessado não cumpriu uma das obrigações que lhe incumbem por força do Tratado, a notificação para cumprir não pode estar sujeita a exigências de precisão tão estritas como as que o parecer fundamentado deve satisfazer, uma vez que esta só pode necessariamente consistir num primeiro resumo sucinto das acusações. Nada impede, portanto, a Comissão de detalhar, no parecer fundamentado, as acusações que já alegou de forma mais global na notificação para cumprir (31).

114. Por outro lado, no que respeita ao procedimento contencioso, é jurisprudência constante que, no âmbito de uma ação intentada nos termos do artigo 258.o TFUE, esta deve apresentar as acusações de forma coerente e precisa, para permitir ao Estado‑Membro e ao Tribunal de Justiça apreenderem exatamente o alcance da violação do direito da União imputada, condição necessária para que esse Estado possa apresentar utilmente os seus meios de defesa e para que o Tribunal de Justiça possa verificar a existência do incumprimento alegado (32). Em particular, a petição da Comissão deve conter uma exposição coerente e pormenorizada das razões que a conduziram à convicção de que o Estado‑Membro interessado não cumpriu uma das obrigações que lhe incumbem por força dos Tratados (33).

115. É à luz desta jurisprudência que há que determinar se a Comissão assegurou o respeito dos direitos de defesa do Reino Unido durante o procedimento pré‑contencioso e no âmbito do presente processo.

116. Em primeiro lugar, o Reino Unido sustenta que os seus direitos de defesa foram violados, uma vez que a Comissão não deu seguimento suficiente nem ao seu primeiro pedido de informações (34), nem ao pedido de informações redefinido, no que respeita sobretudo a informações necessárias para que este Estado pudesse reconstituir o montante dos recursos próprios tradicionais reclamados pela Comissão na sua petição.

117. Na sua tréplica, o Reino Unido sustenta que as informações técnicas detalhadas fornecidas pela Comissão na réplica ainda não lhe permitem reconstituir esse montante. Subsistem incertezas significativas, nomeadamente quanto ao método utilizado pela Comissão para corrigir os dados ou no que respeita à questão de saber se os dados não agregados de que o Reino Unido dispõe correspondem aos dados agregados diários utilizados pela Comissão nos seus cálculos das perdas de recursos próprios tradicionais, ou seja, os dados Surveillance 2.

118. O Reino Unido considera que a Comissão violou os seus direitos de defesa e o princípio da cooperação leal ao comunicar‑lhe tardiamente, isto é, na fase da réplica, uma parte das informações exigidas. Contesta igualmente a recusa da Comissão em fornecer‑lhe informações sobre as medidas tomadas pelos outros Estados‑Membros para combater a fraude por subavaliação em causa. Ora, essas informações eram‑lhe necessárias para se defender das alegações da Comissão segundo as quais teriam sido tomadas medidas adequadas noutros Estados‑Membros, que produziram resultados na luta contra as importações subavaliadas. São igualmente pertinentes para determinar se as medidas tomadas pelo Reino Unido estão abrangidas pela sua margem de apreciação e constituem uma abordagem razoável para combater a fraude em causa e para formular argumentos sobre o nexo de causalidade entre o comportamento errado das autoridades do Reino Unido e a não tomada em consideração dos recursos próprios tradicionais.

119. Em segundo lugar, o Reino Unido acusa a Comissão de ter comprometido a sua capacidade de aceder a todos os dados necessários para a sua defesa, uma vez que não forneceu a este Estado as informações pedidas no que respeita aos cálculos relativos aos recursos próprios tradicionais para o período compreendido entre 2011 e 2014.

120. Em meu entender, estes argumentos devem ser rejeitados.

121. A este respeito, no que se refere à exceção de inadmissibilidade relativa à ausência de resposta ao pedido de informações, que estava junta à resposta à notificação para cumprir de 22 de junho de 2018, há que declarar que, no seu parecer fundamentado de 23 de setembro de 2018 (35), a Comissão respondeu expressamente a esse pedido.

122. Mais especificamente, na sua resposta à notificação para cumprir, este Estado‑Membro censurou a Comissão pelo facto de o anexo 2 do Relatório OLAF de 1 de março de 2017 não estar completo e de faltarem várias páginas. A este propósito, nesse parecer fundamentado, a Comissão explicou que este anexo tinha sido substituído pelo anexo 7 do Relatório OLAF de 1 de março de 2017, que continha todas as informações quanto à metodologia utilizada pelo OLAF. Acrescentou que o anexo 2 tinha por base os documentos distribuídos a esse Estado na reunião de 28 de julho de 2015 entre o OLAF e o Reino Unido. Assim, a metodologia OLAF foi exposta pela Comissão no seu parecer fundamentado sob a forma de dois documentos juntos como anexo 7 do Relatório OLAF (36), tendo estes documentos sido, aliás, juntos à petição inicial no Tribunal de Justiça.

123. Daqui resulta que o parecer fundamentado contém explicações completas quanto a essa substituição, que não é, em meu entender, suscetível de tornar incompreensíveis as alegações formuladas contra o Reino Unido no parecer fundamentado. Por conseguinte, não se pode considerar que o exercício, por esse Estado, dos seus direitos de defesa tenha sido prejudicado.

124. Além disso, o Reino Unido sustenta que os seus direitos de defesa foram violados na medida em que a Comissão não respondeu ao seu pedido de informações redefinido, dirigido à Comissão após a propositura da presente ação, isto é, em 7 de março de 2019. Esta alegação divide‑se, em substância, em quatro acusações.

a)      Quanto à comunicação dos dados relativos aos cálculos respeitantes ao preço médio corrigido, ao preço mínimo aceitável e às perdas estimadas de recursos próprios

125. Com a primeira acusação, o Reino Unido censura a Comissão por não lhe ter fornecido os dados utilizados para os cálculos relativos ao preço médio corrigido, ao preço mínimo aceitável e às perdas estimadas de recursos próprios, nem os meios para compreender como utilizou esses dados.

126. A este respeito, há que observar que, na sua réplica, a Comissão dá uma resposta às questões que figuram no pedido de informações redefinido relativas ao cálculo do preço médio corrigido e aos preços mínimos aceitáveis, bem como estimativas de perdas de recursos próprios tradicionais. Aí explica, nomeadamente, que o Reino Unido sempre teve um acesso integral aos dados utilizados, nomeadamente o telecarregamento «DL 53», para constituir o preço médio corrigido para a União‑28 e as estimativas de perdas de recursos próprios tradicionais através do sítio internet Theseus do JRC (37), dispondo este Estado‑Membro de acesso integral a esse sítio desde 2010 e tendo feito simulações com base no mesmo (38). Mais especificamente, os relatórios que figuram no anexo 7 do Relatório OLAF (39), em primeiro lugar, explicavam a metodologia do cálculo do preço médio corrigido e do preço mínimo aceitável, e, nomeadamente, da «limpeza» dos dados, bem como a estimativa de perdas (a saber, a diferença de preço entre o preço declarado e o preço médio corrigido), em segundo lugar, forneciam a lista de preços médios corrigidos utilizados para cada categoria de produtos, em terceiro lugar, davam uma visão geral de como aceder ao preço médio corrigido para a União‑28 no sítio internet Theseus, e em quarto lugar, expunham as razões subjacentes à escolha de fixar o preço mínimo aceitável em 50 % do preço médio corrigido. O anexo 7 do Relatório OLAF foi, além disso, junto ao anexo 35 da petição (40), e a Comissão referiu‑o no parecer fundamentado. Por conseguinte, afigura‑se que esses dados e esses documentos eram do conhecimento do Reino Unido e podiam permitir‑lhe, se necessário, reproduzir os cálculos efetuados pela Comissão. Por outro lado, no que se refere aos volumes de mercadorias para estimar as perdas de recursos próprios tradicionais, o Reino Unido pediu uma cópia da totalidade da base de dados Surveillance 2 utilizada de forma a poder calcular por si mesmo essas perdas. A este respeito, como foi explicado pela Comissão, trata‑se de uma base de dados que esta instituição elaborou, que agrupa os dados relativos, nomeadamente, ao volume fornecido pelos próprios Estados‑Membros. Assim, na sua réplica, a Comissão explicou que esses dados se baseavam exclusivamente nos dados de importação transmitidos pelo Reino Unido aos serviços da Comissão e simplesmente registados nessa base de dados (41).

127. Na sua tréplica, o Reino Unido admite que as informações fornecidas pela Comissão na réplica permitiram satisfazer os dois pedidos de informação. Todavia, critica a comunicação tardia dessas informações. A este respeito, atendendo às explicações expostas no número anterior, importa constatar que a forma como a Comissão procedeu aos cálculos do preço médio corrigido e do preço mínimo aceitável, bem como a utilizada para estimar as perdas de recursos próprios tradicionais, foram transmitidas ao Reino Unido (e, portanto, eram do seu conhecimento), como resulta das explicações que figuram no anexo 7 do Relatório OLAF. Assim sendo, não se pode considerar que as informações relativas à réplica constituem novas informações.

128. Por conseguinte, na medida em que os dados utilizados pela Comissão eram documentos a que o Reino Unido podia aceder, tendo esta explicado, antes e durante o presente processo, a forma como este Estado‑Membro podia ter acesso a esses dados e reconstituir os cálculos que efetuara, há que considerar que o Reino Unido já podia aceder a todas as informações por si solicitadas no seu pedido de informações redefinido a respeito dos preços médios corrigidos para a União‑28, dos preços mínimos aceitáveis e das perdas de recursos próprios.

b)      Quanto às informações relativas aos cálculos efetuados para os anos de 2011 a 2014 com base nos avisos de pagamento C18 Snake

129. Com esta segunda acusação, o Reino Unido censura, na sua contestação, a Comissão por não ter podido aceder a todos os dados necessários à sua defesa, na medida em que as declarações aduaneiras anteriores a 2014 foram destruídas, uma vez que estas apenas são conservadas durante quatro anos. Além disso, com o seu pedido de informação redefinido, o Reino Unido solicitou informações relativas aos cálculos efetuados pela Comissão para os anos de 2011 a 2014.

130. Ora, importa salientar que, em anexo à sua tréplica (42), o Reino Unido apresentou ao Tribunal de Justiça um quadro dos 23 avisos de pagamento C18 Snake que emitiu, cópias desses avisos e folhas de cálculo contendo os cálculos que utilizou. Por conseguinte, a exceção de inadmissibilidade suscitada quanto às informações relativas aos cálculos efetuados para os anos de 2011 a 2014 com base nos avisos de pagamento C18 Snake não pode ser acolhida. Além disso, na medida em que o Reino Unido pretende contestar a justeza dos cálculos efetuados pela Comissão com base nesses avisos de cobrança, pretende, na realidade, pôr em causa a apreciação da Comissão quanto às perdas de recursos próprios tradicionais relativas a esse período. Todavia, essa contestação será examinada no âmbito do segundo fundamento da presente ação, relativo ao incumprimento das disposições relativas aos recursos próprios tradicionais e à sua estimativa.

c)      Quanto à tomada de conhecimento das práticas dos outros EstadosMembros no que respeita à utilização da metodologia OLAF

131. Com esta terceira acusação, o Reino Unido pretende conhecer as práticas dos outros Estados‑Membros no que respeita à utilização da metodologia OLAF como instrumento de análise de risco, com vista à realização (ou não) de controlos prévios ao desalfandegamento.

132. A este respeito, embora uma análise comparativa do comportamento dos outros Estados‑Membros possa revelar‑se interessante para demonstrar o caráter alegadamente razoável das escolhas efetuadas pelo Reino Unido, uma análise das práticas dos outros Estados‑Membros na matéria não pode ter incidência sobre o exercício pelo Reino Unido dos seus direitos de defesa nem sobre o resultado da presente ação por incumprimento. Com efeito, resulta de jurisprudência constante que um Estado‑Membro não pode justificar o incumprimento das obrigações que lhe incumbem por força do Tratado FUE com a circunstância de outros Estados‑Membros também não terem cumprido e não cumprirem as suas obrigações (43). A admissibilidade da presente ação intentada contra o Reino Unido não pode ser posta em causa mesmo que as práticas dos outros Estados‑Membros no que respeita à utilização da metodologia OLAF, como instrumento de análise de risco, com vista à realização [ou não] de controlos prévios ao desalfandegamento, se revelem diferentes.

d)      Quanto ao pedido de provas relativas à natureza das mercadorias subavaliadas e ao seu EstadoMembro de destino

133. Com esta quarta acusação, o Reino Unido pede provas sobre a natureza das mercadorias subavaliadas e o seu Estado‑Membro de destino.

134. A este respeito, parece que, com esta acusação, o Reino Unido pretende contestar, na realidade, a procedência do segundo e terceiro fundamentos relativos, respetivamente, à estimativa dos recursos próprios e à violação das disposições em matéria de recursos próprios provenientes do IVA. Com efeito, esta acusação consiste, na realidade, em pôr em causa a apreciação da Comissão quanto à natureza das mercadorias tidas em conta para essas estimativas e ao seu eventual destino. Além disso, na minha opinião há que aprovar a argumentação da Comissão na qual, para rejeitar a acusação relativa à falta de dados no que respeita à natureza e ao volume das mercadorias tomadas em conta para efeitos do presente processo, alega que o próprio Reino Unido introduziu as informações na base de dados Surveillance 2, nas quais a Comissão se baseou no seu parecer fundamentado e na sua petição (44). Por conseguinte, não se verifica nenhuma violação dos direitos de defesa relativa à falta de informação quanto à natureza das mercadorias e ao seu Estado‑Membro de destino.

135. Em face do exposto, a primeira exceção de inadmissibilidade suscitada pelo Reino Unido, relativa à violação dos direitos de defesa no decurso do procedimento pré‑contencioso e do processo no Tribunal de Justiça, deve ser julgada improcedente.

2.      Quanto à exceção de inadmissibilidade relativa à irregularidade do procedimento précontencioso e à petição inicial no que respeita, nomeadamente, ao regime aduaneiro 42

136. O Reino Unido sustenta que, ao abster‑se de lhe comunicar, durante a fase pré‑contenciosa e posteriormente na petição, informações detalhadas sobre a base factual dos alegados incumprimentos, nomeadamente ao abrigo do regime aduaneiro 42, a Comissão não lhe permitiu compreender essas acusações e impediu‑o, assim, de cumprir as suas obrigações ou de elaborar a sua defesa. Sublinha que não foi dada nenhuma informação sobre o montante das perdas de recursos próprios provenientes do IVA, sobre a identidade dos operadores em causa e dos Estados‑Membros de destino, nem sobre as medidas tomadas por estes últimos para recuperar o IVA devido por esses operadores. Daí deduz que a reclamação apresentada a este respeito é inadmissível.

137. No entanto, observo, desde logo, que esta exceção de inadmissibilidade tem por objeto a consistência e a suficiência dos elementos de facto e de prova apresentados pela Comissão em apoio do seu pedido. Ora, parece‑me que tais elementos dizem mais respeito ao exame do mérito do incumprimento invocado do que à regularidade do procedimento pré‑contencioso e da petição subsequente (45). Além disso, afigura‑se‑me que a argumentação relativa à insuficiência das informações comunicadas pela Comissão deve ser examinada durante a análise pelo Tribunal de Justiça dos elementos de prova apresentados pela Comissão.

138. Em seguida, mesmo admitindo que o Tribunal de Justiça aceite a qualificação de exceção de inadmissibilidade, resulta dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça que os elementos comunicados aquando das trocas pré‑contenciosas e retomados na petição eram suficientes para que o Reino Unido se pudesse defender. Com efeito, resulta do Relatório OLAF, no qual se baseou a Comissão, que o destino final da maioria das importações subavaliadas, na medida em que estavam sujeitas ao regime 42 e que o seu destino podia ser determinado, não era o Reino Unido mas sim outros Estados‑Membros, o que resultou em perdas substanciais relativas ao IVA nos Estados‑Membros de destino dos bens (46). O OLAF salientou igualmente que, no esquema de fraude em causa, uma grande parte dos bens era desviada para o mercado negro, pelo que o IVA não era de todo pago. Estas alegações foram em seguida expostas no parecer fundamentado e retomadas na petição. À luz destes elementos, considero, como alega a Comissão na réplica, que os elementos comunicados na fase pré‑contenciosa e depois desenvolvidos na petição não impediam o Reino Unido de se defender das alegações relativas a essas perdas.

139. Por conseguinte, proponho que a segunda exceção de inadmissibilidade suscitada pelo Reino Unido seja julgada improcedente.

3.      Quanto à exceção de inadmissibilidade relativa à violação pela Comissão dos princípios da confiança legítima, da segurança jurídica, do estoppel e da cooperação leal

140. O Reino Unido considera que a presente ação, na medida em que abrange o período até ao fim de fevereiro de 2015, deve ser julgada improcedente por violar os princípios da confiança legítima, da segurança jurídica, do estoppel e da cooperação leal. Alega que as várias declarações feitas pelo OLAF em 2014 e 2015, e no seu Relatório de 2017 deram origem a uma confiança legítima na sua esfera jurídica (47). Sustenta que resulta nomeadamente do Relatório OLAF que, em momento algum antes do fim da fase operacional da operação Snake em março de 2014 (48), este organismo concluiu que o Reino Unido tinha incumprido as suas obrigações decorrentes do direito da União. Mais especificamente, o Reino Unido refere‑se a três garantias específicas alegadamente dadas pela Comissão e pelo OLAF durante o período de infração, das quais decorre que estes consideravam, por um lado, que esse Estado não violava as obrigações que lhe incumbiam por força do direito da União em matéria de proteção dos interesses financeiros da União e da luta contra a fraude, e, por outro, que o referido Estado não estava sujeito a um processo por incumprimento. Por conseguinte, a Comissão não deve ser autorizada a alterar a sua posição baseada nessas três garantias.

141. Antes de mais, resulta de uma ata dos representantes desse Estado que, numa reunião com o OLAF em 13 de junho de 2014, este último estava «satisfeito com os progressos realizados pelo Reino Unido, bem como com as medidas que já tinham sido adotadas nessa data e com as que estavam previstas». Trata‑se de uma garantia inequívoca de que o OLAF não considerava que o Reino Unido violava as suas obrigações de proteção dos interesses financeiros da União e de luta contra a fraude (49).

142. Posteriormente, uma segunda declaração feita em outubro de 2014 por um agente da Comissão, informando o Reino Unido de que a sua participação no ACP Discount era «satisfatória» e que as ações necessárias para implementar essa operação «[tinham sido] efetuadas em tempo útil e de forma efetiva», constitui uma garantia clara e inequívoca que o Reino Unido não incumpriu as obrigações que lhe incumbiam por força do direito da União no que respeita à sua participação na referida operação (50). Quanto ao contra‑argumento da Comissão segundo o qual essa garantia apenas dizia respeito a um único caso decorrente do ACP Discount, o Reino Unido sustenta que a Comissão não pode pôr em causa a referida garantia com o fundamento de que atualmente considera a apreciação de um único caso insuficiente para a fundamentar, revertendo a sua escolha inicial de se basear num único caso apenas para tranquilizar o Reino Unido.

143. Por último, o Reino Unido refere‑se à primeira reunião bilateral do OLAF com a HMRC, realizada em 19 e 20 de fevereiro de 2015, durante a qual um funcionário do OLAF declarou, segundo a ata dessa reunião redigida pelos funcionários britânicos, que, «até então», esse Estado‑Membro tinha «feito o que havia que fazer». Segundo o Reino Unido, esta última garantia dizia respeito a todas as medidas adotadas até então pelo Reino Unido e não apenas à questão da emissão dos avisos de pagamento C18 Snake.

144. O facto de a Comissão retroceder agora quanto a essas três garantidas é contrário não só ao princípio da confiança legítima mas também ao princípio da segurança jurídica, que pode ser invocado pelos Estados‑Membros (51), ao princípio venire contra factum proprium nemini licet e ao princípio da cooperação leal enunciado no artigo 4.o, n.o 3, TUE (52). Com efeito, as disposições do direito aduaneiro permitem uma certa flexibilidade quanto às medidas que devem ser adotadas para combater uma fraude como a que está em causa e não exigem expressamente um sistema de controlos baseado em filtros de despistagem e controlos prévios, pelo que era possível a Comissão e o OLAF garantirem ao Reino Unido que, até fevereiro de 2015, o seu sistema de controlo aduaneiro era conforme com o direito da União.

145. A este respeito, para examinar os argumentos do Reino Unido há que recordar, desde logo, que o direito de invocar o princípio da proteção da confiança legítima se estende a qualquer particular em cuja esfera jurídica uma instituição da União tenha criado expectativas fundadas ao fornecer‑lhe garantias precisas (53). Embora este direito seja um princípio geral do direito da União que confere direitos aos particulares (54), o Tribunal de Justiça alargou a sua aplicação igualmente às relações entre a Comissão e os Estados‑Membros (55).

146. Todavia, o direito de invocar o princípio da proteção da confiança legítima pressupõe que tenham sido fornecidas ao interessado garantias precisas, incondicionais e concordantes, provenientes de fontes autorizadas e fiáveis, pelas autoridades competentes da União. Com efeito, este direito pertence ao particular em cuja esfera jurídica uma instituição, um órgão ou um organismo da União, ao fornecer‑lhe garantias precisas, criou expectativas fundadas (56), tanto mais que, no âmbito da análise da exceção de inadmissibilidade, relativa a uma violação da sua confiança legítima, suscitada por um Estado‑Membro, por força da máxima reus in exceptione fit ator, este deve fazer prova dessa violação (57).

147. No caso vertente, resulta, em meu entender, dos autos que o Reino Unido não recebeu por parte da Comissão ou do OLAF garantias nas quais pudesse basear uma confiança legítima.

148. Mais especificamente, no que respeita às três afirmações a que se refere o Reino Unido, nenhuma delas constitui, na minha opinião, uma afirmação precisa e incondicional do facto de as ações e a inação do Reino Unido estarem em conformidade com o direito da União ou de este Estado não ter violado o direito da União. Com efeito, por um lado, a alegada declaração do agente do OLAF, numa reunião realizada em 13 de junho de 2014 (58), é demasiado genérica para poder fundar uma confiança legítima quanto à inexistência de uma eventual ação por incumprimento. Além disso, importa analisar esta declaração no seu contexto, do qual resulta que foi feita no âmbito de uma reunião entre o OLAF e o Reino Unido relativa à operação Snake e, nomeadamente, de uma discussão sobre a eventual emissão por este Estado dos avisos de pagamento C18 Snake. Todavia, é pacífico que o Reino Unido os retirou após a reunião, pelo que esta declaração, que regista o progresso que este Estado teria feito, perdeu uma grande parte do seu valor. O mesmo se diga das observações efetuadas pelo OLAF na reunião de 19 e 20 de fevereiro de 2015, que partem da premissa que o Reino Unido emitiu esses avisos de pagamento (59). Por outro lado, quanto à observação, feita em outubro de 2014, segundo a qual o OLAF considerava que a participação do Reino Unido no ACP Discount era satisfatória e que as ações necessárias para a implementação dessa operação «foram implementadas de forma oportuna e eficaz» (60), importa constatar que esta observação não constitui uma apreciação quanto ao respeito do direito da União por esse Estado em matéria de proteção dos interesses financeiros da União, uma vez que apenas dizia respeito a um único caso resultante do ACP Discount e não reflete necessariamente o conteúdo de todas as trocas que o referido Estado teve com a Comissão e com o OLAF nessa altura.

149. Daqui resulta que as três declarações ou afirmações em que o Reino Unido se apoia não podem ser qualificadas de garantias «precisas, incondicionais e concordantes», tanto mais que foram proferidas num contexto caracterizado por um diálogo intenso e contínuo num período relativamente longo entre serviços do OLAF e da Comissão, por um lado, e do Reino Unido, por outro. Assim, como sustenta a Comissão, estas têm lugar no âmbito da ação empreendida pelo OLAF (61) e destinada a convencer os Estados‑Membros a tomar medidas de controlo aduaneiro prévias ao desalfandegamento e baseadas numa análise de risco, como o limiar baseado nos preços mínimos aceitáveis. Resulta claramente deste contexto que essas garantias não foram dadas pelo OLAF nem pela Comissão.

150. Em todo o caso, essas declarações ou afirmações não podem, além disso, obstar à verificação objetiva do desrespeito das obrigações que incumbem aos Estados‑Membros por força da ação prevista no artigo 258.o TFUE. Com efeito, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, este processo assenta na verificação objetiva do incumprimento, por um Estado‑Membro, das obrigações que lhe são impostas pelo direito da União, e os princípios do respeito da confiança legítima e da cooperação leal não podem ser invocados por um Estado‑Membro para obstar a essa verificação objetiva, uma vez que a admissão dessa justificação contrariaria o objetivo prosseguido pelo referido processo (62). No que se refere, mais especificamente, à resposta dos serviços da Comissão e à sua eventual incidência no mérito do incumprimento imputado ao Reino Unido, é jurisprudência constante que a Comissão não está habilitada a dar garantias quanto à compatibilidade com o direito da União de determinado comportamento e que em caso algum tem o poder de autorizar comportamentos contrários a esse direito (63). Daqui decorre, a meu ver, que os Estados‑Membros não podem, num sistema em que são responsáveis pela execução adequada da legislação aduaneira da União no seu território nacional, rejeitar a responsabilidade de uma violação do direito da União que podem ter cometido, alegando que a Comissão não lha censurou num determinado momento.

151. Por último, basta constatar que as alegações baseadas na segurança jurídica, no princípio do estoppel e na falta de cooperação leal da Comissão com o Reino Unido não têm, como resulta da contestação deste Estado, conteúdo autónomo. Com efeito, no seu articulado, o Reino Unido não expõe, em substância, as razões pelas quais esses princípios foram violados (64), pelo que estas alegações dependem dos argumentos relativos à violação da confiança legítima acima analisados e devem ser julgadas improcedentes pelas mesmas razões que as expostas no âmbito dessa análise.

152. Por conseguinte, esta exceção de inadmissibilidade deve, em meu entender, ser julgada improcedente.

4.      Quanto à exceção de inadmissibilidade relativa à impossibilidade de ordenar a disponibilização dos montantes ao abrigo do artigo 258.o TFUE

153. Em primeiro lugar, o Reino Unido invoca a inadmissibilidade da ação na medida em que visa essencialmente conseguir que este Estado pague montantes específicos e excecionalmente elevados ao orçamento da União.

154. Mais especificamente, baseando‑se na jurisprudência do Tribunal de Justiça (65), o Reino Unido suscita a inadmissibilidade da parte dos pedidos da petição relativa à colocação à disposição do orçamento da União de um montante determinado de recursos próprios tradicionais de cerca de 2,7 mil milhões de euros, com o fundamento de que, no âmbito de uma ação por incumprimento ao abrigo do artigo 258.o TFUE, o Tribunal de Justiça não pode ordenar a um Estado‑Membro que inscreva no orçamento da União montantes determinados de recursos próprios não pagos devido a incumprimentos imputados a esse Estado‑Membro. Assim, o terceiro parágrafo do primeiro pedido da petição formulado no n.o 370 da mesma é inadmissível, tanto mais que, segundo jurisprudência constante, no âmbito dessa ação, o Tribunal de Justiça apenas pode declarar o incumprimento, por um Estado‑Membro, das suas obrigações por força do direito da União e não pode ordenar que esse Estado‑Membro adote determinadas medidas.

155. O Reino Unido refuta igualmente o argumento da Comissão segundo o qual esta tinha cuidadosamente «estruturado» os pedidos da sua petição no presente processo de modo a evitar o erro cometido nos dois processos Comissão/Alemanha acima referidos. Trata‑se de um artifício destinado a contornar a incompetência do Tribunal de Justiça, uma vez que a Comissão visa obter o mesmo resultado que o pretendido nesses dois processos utilizando uma formulação diferente.

156. Além disso, a abordagem da Comissão priva o Reino Unido da possibilidade que lhe é conferida pelo artigo 260.o TFUE de sanar qualquer violação verificada nos termos do artigo 258.o TFUE, e não respeita, portanto, as competências respetivas da Comissão, do Tribunal de Justiça e dos Estados‑Membros por força dos Tratados da União.

157. O presente processo distingue‑se do que está em causa no Acórdão de 15 de novembro de 2005, Comissão/Dinamarca (66). É certo que, nesse processo, o Tribunal de Justiça julgou procedente uma ação destinada a obter a declaração de que o Estado‑Membro em causa não tinha cumprido a sua obrigação de colocar à disposição da União recursos próprios de um montante determinado, mas, como resulta do n.o 56 desse acórdão, nem a existência de uma dívida aduaneira nem o montante das perdas de recursos próprios eram contestados nesse processo.

158. Considero que esta argumentação não pode ser acolhida. A este respeito, decorre do terceiro parágrafo do primeiro pedido que, ao enumerar os montantes das perdas de recursos próprios tradicionais para o período de 2011 a 2017, a petição da Comissão visa descrever a extensão do incumprimento, quantificando essas perdas. Embora este terceiro parágrafo contenha a expressão «as perdas de recursos próprios tradicionais a colocar à disposição do orçamento da União» (67) criticada pelo Reino Unido, parece‑me que não se deve entender esta parte da frase como um pedido para ordenar a esse Estado que pague os montantes em causa no âmbito da presente ação, mas no sentido de que o seu objeto é a descrição quantitativa do incumprimento, visando assim demonstrar os montantes específicos que o referido Estado não colocou à disposição do orçamento da União.

159. No que respeita à argumentação relativa aos dois processos que deram origem aos Acórdãos Comissão/Alemanha (68), basta, em meu entender, observar que a redação dos pedidos da Comissão apresentados nesses processos, objeto de uma apreciação crítica pelo Tribunal de Justiça nesses acórdãos, é diferente da redação dos pedidos em causa no presente processo. Com efeito, nesses processos, a Comissão pedia ao Tribunal de Justiça que ordenasse ao Estado‑Membro demandado que procedesse ao pagamento dos montantes se fosse declarado que esse Estado‑Membro não tinha cumprido as obrigações que lhe incumbiam por força do direito da União (69). No âmbito desses dois acórdãos, o Tribunal de Justiça salientou que o que a Comissão pedia não era a declaração de que o Estado‑Membro em causa não tinha cumprido as suas obrigações, mas que fosse ordenado a esse Estado‑Membro que adotasse certas medidas determinadas (70). Daqui decorre, a meu ver, que no âmbito de uma ação de incumprimento ao abrigo do artigo 258.o TFUE, a competência do Tribunal de Justiça se limita à declaração do incumprimento do direito da União imputado a um Estado‑Membro, não podendo ordenar ao Estado‑Membro em causa que entabule diligências para eliminar esse incumprimento. Esta conclusão resulta, além disso, da fórmula segundo a qual a «declaração desse incumprimento obriga […] o Estado‑Membro em causa a tomar todas as medidas necessárias à execução do acórdão do Tribunal de Justiça» (71), que figura atualmente no artigo 260.o TFUE. O processo no Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 258.o TFUE é, portanto, uma ação por incumprimento e não um processo de injunção.

160. Na medida em que a ação prevista no artigo 258.o TFUE assenta na constatação objetiva do incumprimento por um Estado‑Membro das obrigações que o direito da União lhe impõe, os acórdãos proferidos pelo Tribunal de Justiça ao abrigo dessa disposição são, pela sua própria essência, de natureza declarativa (72), pelo que o Tribunal de Justiça pode declarar, nas ações por incumprimento ao abrigo do artigo 258.o TFUE, relativas a montantes de recursos próprios tradicionais, que um Estado‑Membro não colocou esses montantes à disposição do orçamento da União (73). Esta conclusão resulta também, contrariamente às alegações do Reino Unido, do Acórdão Comissão/Dinamarca (74), no qual o Tribunal de Justiça declarou admissível um pedido destinado a que declarasse que, ao não ter colocado à disposição da Comissão um certo montante de recursos próprios e os correspondentes juros de mora, as autoridades dinamarquesas não tinham cumprido as suas obrigações. Além disso, num acórdão recente (75), o Tribunal de Justiça declarou que, «ao recusar disponibilizar recursos próprios tradicionais no montante de 2 120 309,50 euros, […] a República Italiana não [tinha] cumprido as obrigações que lhe incumbem» por força do direito da União. Daqui resulta, em meu entender, que o Tribunal de Justiça pode considerar admissível um pedido que figura na petição da Comissão destinado à apresentação de um montante determinado de perdas dos recursos próprios que esta considera ser devido.

161. Esta conclusão não pode ser posta em causa pelo argumento do Reino Unido segundo o qual a jurisprudência acima referida deve ser lida à luz da questão de saber se o Estado‑Membro demandado na ação por incumprimento ao abrigo do artigo 258.o TFUE contesta ou não a extensão das perdas dos recursos próprios tradicionais ligadas ao incumprimento. Em meu entender, tal contestação é desprovida de pertinência devido à própria natureza da ação por incumprimento, que comporta o direito de este Estado‑Membro pôr em causa no Tribunal de Justiça tanto os elementos factuais apresentados em apoio da ação da Comissão como o seu fundamento jurídico, o que inclui, logicamente, a extensão das perdas dos recursos próprios tradicionais. Tal decorre da faculdade de a Comissão submeter à apreciação do Tribunal de Justiça, no âmbito de uma ação por incumprimento, um diferendo que a opõe a um Estado‑Membro quanto à obrigação de este pôr um determinado montante de recursos próprios da União à disposição da referida instituição, inerente ao sistema destes recursos próprios, conforme atualmente concebido no direito da União (76). Além disso, o Tribunal de Justiça, na sua jurisprudência mais recente na matéria, deu provimento a um pedido da Comissão destinado a que fosse declarada uma violação do direito da União com o fundamento de que um montante determinado de recursos próprios não tinha sido posto à disposição embora o Estado‑Membro em causa contestasse a existência de um direito da União sobre esse montante (77).

162. Por outro lado, há que afastar a objeção formulada pelo Reino Unido segundo a qual a presente ação é inadmissível, por constituir uma forma «disfarçada» de ação de indemnização e por visar a condenação do Estado‑Membro pelo facto de este não ter posto montantes específicos à disposição do orçamento da União. No âmbito de uma ação por incumprimento relativa aos recursos próprios, é evidente que estão em jogo obrigações pecuniárias, e nenhuma regra de direito da União proíbe a Comissão de as invocar no âmbito da violação alegada. Neste domínio específico, é precisamente porque os Estados‑Membros contestam a sua obrigação de colocar os montantes pedidos pela Comissão à disposição do orçamento da União que foi submetida ao Tribunal de Justiça uma ação por incumprimento.

163. Por último, há que salientar que, na sua réplica, a Comissão sublinha que o terceiro parágrafo do primeiro pedido deve ser entendido como um pedido relativo a determinados montantes específicos que o Reino Unido não colocou à disposição do orçamento da União. Assim, há que observar que a própria Comissão admite que «a presente ação não é uma ação de indemnização», mas que visa obter a declaração de que o Reino Unido não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do direito da União, nomeadamente ao não ter colocado certos montantes específicos à disposição do orçamento da União, sendo essa formulação, como exposto anteriormente, conforme com a jurisprudência relativa à ação por incumprimento nos termos do artigo 258.o TFUE.

164. À luz da jurisprudência acima referida e das precisões fornecidas pela Comissão, considero que o terceiro parágrafo do primeiro pedido deve ser entendido no sentido de que visa que o Tribunal de Justiça declare que o Reino Unido não colocou certos montantes específicos à disposição do orçamento da União, em violação do direito da União e, que à luz desta jurisprudência, esse pedido é admissível.

165. A título subsidiário, o Reino Unido sustenta que, se o Tribunal de Justiça decidir fixar um montante que deve ser colocado à disposição da União, deve dar prioridade à estimativa do Reino Unido uma vez que cabe ao Estado‑Membro avaliar o montante devido. Segundo o Reino Unido, a abordagem de princípio correta para determinar o montante das perdas de recursos próprios articula‑se em três etapas que a petição introduzida pela Comissão junta (a saber, o incumprimento das obrigações por esse Estado, o nexo de causalidade e a prova do montante a título desse incumprimento).

166. A este respeito, os argumentos apresentados pelo Reino Unido assentam na premissa de que a Comissão é obrigada a demonstrar que as eventuais medidas tomadas pelo Estado‑Membro eram manifestamente inadequadas. Ora, o exame destes argumentos insere‑se no mérito do primeiro e segundo fundamentos.

167. À luz do que precede, proponho ao Tribunal de Justiça que julgue improcedentes a primeira a quarta exceções de inadmissibilidade suscitadas pelo Reino Unido.

B.      Quanto ao incumprimento das obrigações em matéria de proteção dos interesses financeiros da União e de luta contra a fraude, e das obrigações decorrentes da regulamentação aduaneira da União

168. Com o seu primeiro fundamento a Comissão alega, em substância, que, durante o período da infração, apesar dos avisos e dos repetidos pedidos da Comissão e do OLAF relativos ao risco de fraude, o Reino Unido não tomou medidas destinadas a proteger os interesses financeiros da União. Esta omissão constitui, por um lado, um incumprimento tanto das obrigações gerais em matéria de proteção dos interesses financeiros da União como das obrigações de luta contra a fraude previstas nos artigos 310.o, n.o 6, e 325.o TFUE. Por outro lado, viola a obrigação, das autoridades aduaneiras, desde logo, de tomarem medidas destinadas a proteger os interesses financeiros da União por força do artigo 3.o do Código Aduaneiro da União, conjugado com o artigo 4.o, n.o 3, TUE, em seguida, de efetuarem controlos com base numa análise de risco, em aplicação do artigo 13.o do Código Aduaneiro Comunitário e do artigo 46.o do Código Aduaneiro da União, e, por último, de exigirem o pagamento de garantias ao abrigo do artigo 248.o, n.o 1, do regulamento de aplicação e do artigo 244.o do regulamento de execução.

169. Antes de examinar as acusações específicas apresentadas pela Comissão, debruçar‑me‑ei primeiro sobre as obrigações que incumbem aos Estados‑Membros por força dos artigos 310.o, n.o 6, e 325.o TFUE, invocados pela Comissão em apoio da sua ação e, nomeadamente, dos seus objetivos e da jurisprudência na matéria. Em seguida, há que apreciar a procedência das alegações específicas apresentadas ao abrigo dessas disposições e das disposições do direito derivado referidas no número anterior.

1.      Quanto às obrigações dos EstadosMembros de lutarem contra as atividades ilegais lesivas dos interesses financeiros da União

170. Na medida em que o artigo 310.o, n.o 6, TFUE, que prevê que «[e]m conformidade com o artigo 325.o, a União e os Estados‑Membros combatem as fraudes e quaisquer outras atividades ilegais lesivas dos interesses financeiros da União», constitui apenas uma simples disposição de remissão para o artigo 325.o TFUE, há que considerar que o fundamento invocado pela Comissão, uma vez que é relativo à violação das disposições do direito primário, visa, na realidade, censurar o Reino Unido por não ter cumprido as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 325.o TFUE. Este artigo é uma disposição central em matéria de luta contra a fraude ao nível do direito primário (78), na medida em que define as obrigações da União e dos Estados‑Membros, bem como o seu alcance neste domínio, estas mesmas concretizadas, ao nível do direito derivado, pelo Código Aduaneiro da União, pelo Código Aduaneiro Comunitário, pelo regulamento de aplicação e pelo regulamento de execução.

171. A proteção dos interesses financeiros é uma prioridade que merece a atenção dos Estados‑Membros e da União há vários anos (79) uma vez que os recursos próprios tradicionais (constituídos pelos direitos aduaneiros e pelas cotizações «açúcar») são recebidos pelos Estados‑Membros por conta da União (80). Em 2017, os Estados‑Membros retinham, a título de despesas de cobrança, 20 % dos recursos próprios tradicionais (81). A fraude aduaneira é um fenómeno crescente, que prejudica essa cobrança e, portanto, os interesses financeiros da União. As perdas relacionadas com esta fraude eram estimadas, em 2013, em 185 milhões de euros por ano (82). As consequências nefastas da fraude aduaneira ultrapassam o domínio dos interesses financeiros relativos ao orçamento da União, estendendo‑se aos domínios políticos, económicos e financeiros, e têm repercussões diretas no funcionamento do mercado interno (83).

172. Neste contexto, o artigo 325.o, n.os 1 e 2, TFUE não se limita a enunciar uma obrigação abstrata de os Estados‑Membros combaterem a fraude e quaisquer outras atividades ilegais lesivas dos interesses financeiros da União (84), antes impondo exigências mínimas no que respeita às medidas que esses Estados são obrigados a aplicar a fim de combater a fraude e prevenir essas atividades. Em particular, esta disposição exige que as medidas adotadas pelos Estados‑Membros para combater as atividades ilícitas lesivas dos interesses financeiros da União, por um lado, por força do n.o 1 deste artigo, sejam dissuasoras e efetivas e, por outro, nos termos do n.o 2 do referido artigo, não sejam diferentes das que tomam para combater as fraudes lesivas dos seus próprios interesses financeiros.

173. Estas exigências foram igualmente recordadas na jurisprudência, de onde decorre, nomeadamente, que o artigo 325.o, n.os 1 e 2, TFUE impõe aos Estados‑Membros uma obrigação de resultado precisa, que não está acompanhada de nenhuma condição suplementar (85). Na medida em que o combate às atividades ilícitas lesivas dos interesses financeiros da União através de medidas dissuasoras e efetivas implica a cobrança dos direitos aduaneiros e a disponibilização dos montantes correspondentes no orçamento da União a título dos recursos próprios tradicionais da União, qualquer lacuna na cobrança desses direitos traduz‑se potencialmente numa diminuição desses recursos. Assim, os Estados‑Membros têm de adotar as medidas necessárias para que os direitos aduaneiros possam ser efetiva e integralmente cobrados, o que pressupõe que o controlo aduaneiro seja corretamente exercido (86). Além disso, importa recordar que, em conformidade com o artigo 4.o, n.o 3, segundo parágrafo, TUE, os Estados‑Membros da União têm de tomar todas as medidas gerais ou específicas adequadas para garantir a execução das obrigações decorrentes dos Tratados ou resultantes dos atos das instituições da União (87). A este respeito, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça, em matéria de regulamentações agrícolas, que a exigência imposta aos Estados‑Membros de tomarem todas as medidas necessárias para assegurar uma proteção eficaz dos interesses financeiros da União constitui uma expressão específica do dever geral de cooperação leal que incumbe aos Estados‑Membros nos termos do que é agora o artigo 4.o, n.o 3, TFUE (88). De forma análoga, no domínio do combate à fraude aduaneira, o artigo 325.o TFUE constitui, parece‑me, a expressão específica do princípio da cooperação leal consagrado no artigo 4.o, n.o 3, TUE (89), sendo o próprio artigo 325.o TFUE concretizado no domínio do direito aduaneiro da União pelas disposições do Código Aduaneiro. Daqui resulta que o princípio da cooperação leal consagrado no artigo 4.o, n.o 3, TUE não pode, no domínio do combate à fraude aduaneira, ser invocado a título autónomo (90).

174. Podem‑se retirar duas séries de ensinamentos da jurisprudência acima referida. Por um lado, além da obrigação de os Estados‑Membros preverem, por força do artigo 325.o, n.o 1, TFUE, sanções adequadas para lutar contra a fraude e as outras atividades lesivas dos interesses financeiros da União, as exigências decorrentes da jurisprudência acima referida aplicam‑se igualmente às atividades administrativas dos Estados‑Membros, uma vez que os compromissos que estes assumiram por força dos Tratados são plenamente vinculativos (91).

175. Por outro lado, resulta desta jurisprudência que o artigo 325.o, n.os 1 e 2, TFUE impõe aos Estados‑Membros obrigações vinculativas de resultado no que respeita, nomeadamente, aos objetivos previstos nesta disposição e, mais especificamente, à obrigação que lhes é imposta de combater a fraude e as atividades lesivas dos interesses financeiros da União, de modo a minimizar as eventuais perdas das finanças públicas da União no seu conjunto. Isto implica que, uma vez que esta disposição  visa levar a cabo essa luta através de medidas efetivas, a eficácia de uma medida concreta ou de um conjunto de medidas só pode ser determinada no contexto de uma situação bem delimitada, e não de forma abstrata. Com efeito, a criminalidade, incluindo a sua componente particularmente perigosa, ou seja, a criminalidade organizada no domínio da fraude e de outras atividades lesivas dos interesses financeiros da União, é, por definição, um fenómeno de natureza evolutiva que se adapta progressivamente ao contexto que a rodeia. Como tal, as medidas adotadas pelos Estados‑Membros destinadas a combater este fenómeno devem ser capazes de o contrariar de forma constante. Embora medidas ainda recentemente adotadas pelos Estados‑Membros contra atividades lesivas dos interesses financeiros da União pudessem ser consideradas eficazes, é possível que já não o sejam no contexto atual. Por conseguinte, o artigo 325.o, n.os 1 e 2, TFUE, enquanto disposição que contém uma obrigação de resultado,  impõe aos Estados‑Membros não só a adoção de medidas únicas suscetíveis de prevenir as atividades lesivas dos interesses financeiros da União, mas também uma avaliação e adaptação permanentes no tempo, a fim de assegurar a eficácia dessas medidas.

176. Por estas razões, o argumento de defesa do Reino Unido, segundo o qual os Estados‑Membros dispõem de uma ampla margem de apreciação quanto aos meios utilizados para prevenir atividades ilegais contrárias aos interesses financeiros da União no domínio aduaneiro e dos recursos próprios, não pode, de modo algum, ser acolhido. Com efeito, o Reino Unido parece sugerir que, na medida em que a aplicação dos regimes aduaneiros e a cobrança dos direitos aduaneiros estão a cargo dos Estados‑Membros por intermédio das suas autoridades nacionais, estes últimos dispõem igualmente de uma ampla margem quanto à aplicação das medidas preventivas no âmbito da luta contra a fraude aduaneira.

177. Esta abordagem afigura‑se‑me criticável por duas razões. Em primeiro lugar, existe no direito da União um nexo direto entre, por um lado, a cobrança de direitos aduaneiros diretamente realizada por intermédio dos Estados‑Membros e, por outro, os recursos próprios da União, nexo que o Reino Unido não parece negar (92). Em segundo lugar, embora os Estados‑Membros disponham efetivamente de uma certa margem relativa à escolha das medidas de prevenção da fraude e das lesões aos interesses financeiros da União, não é menos verdade que, por força da jurisprudência do Tribunal de Justiça (93), esta margem de apreciação não é ilimitada e está subordinada ao princípio da efetividade, que impõe que as medidas adotadas sejam eficazes e dissuasoras e, mais especificamente, que assegurem uma cobrança eficaz dos recursos próprios da União que, nomeadamente, os direitos da pauta aduaneira comum constituem, sob reserva, todavia, da necessária observância dos direitos fundamentais garantidos pela Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta») e dos princípios gerais do direito da União (94). Assim, o Tribunal de Justiça já declarou que, quando um Estado‑Membro aceita medidas, renunciando de maneira geral e indiferenciada à cobrança do IVA, embora esteja obrigado a garantir a cobrança da totalidade desse imposto devido no seu território e a cobrança eficaz dos recursos próprios da União, não cumpre as obrigações que lhe incumbem por força do direito da União (95).

178. O Reino Unido sustenta igualmente que a aplicação do direito da União por um Estado‑Membro só infringe o princípio da efetividade se existir um «risco evidente e grave de impunidade» ou se equivaler à ausência de sanção (96). Ora, considero que tal interpretação é infirmada pela jurisprudência de onde decorre que a eficácia da proteção dos interesses financeiros da União prevalece sobre o poder discricionário dos Estados‑Membros (97).

179. Devem igualmente rejeitar‑se os argumentos do Reino Unido relativos ao facto de, por um lado, a obrigação de garantir uma cobrança eficaz dos recursos próprios exigir simplesmente que se envidem esforços razoáveis para fiscalizar e para cobrar os direitos e impostos que se insiram nos recursos, e, por outro, os Estados‑Membros serem obrigados a fazer prova de «diligência» na cobrança dos recursos próprios (98). Com efeito, resulta das presentes conclusões (99) que a efetividade de uma medida adotada para defender os interesses financeiros da União só pode ser apreciada no contexto de circunstâncias específicas, no âmbito das quais importa determinar se os esforços para alcançar esse objetivo foram razoáveis e diligentes. É evidente que uma fraude aduaneira vasta e organizada necessita que o Estado‑Membro invista mais recursos do que em circunstâncias habituais para cumprir as suas obrigações por força dos Tratados fundadores (100).

180. Também não se pode acolher o argumento apresentado pelo Reino Unido segundo o qual a Comissão deve provar, para além da ineficácia das medidas nacionais destinadas a combater a fraude, que o Estado‑Membro é culpado de comportamento negligente ou arbitrário. A este respeito, o Reino Unido faz uma leitura errada da jurisprudência que invoca (101), da qual não resulta de modo algum que a Comissão tivesse de demonstrar uma negligência ou um comportamento arbitrário por parte de um Estado‑Membro para demonstrar a existência de um incumprimento. Pelo contrário, considero que esta jurisprudência deve ser lida no sentido de que um Estado‑Membro não pode, de modo arbitrário, eximir‑se unilateralmente de apurar um direito sobre o montante da dívida aduaneira e de o lançar na conta da Comissão a título de recursos próprios (102).

181. É certo, há que admitir, à semelhança do Reino Unido, que as referidas disposições dos Tratados não impõem expressamente um resultado absoluto, nem exigem que as medidas de controlo aduaneiro eliminem em todos os casos a fraude em relação aos recursos próprios da União. Todavia, decorre do artigo 325.o TFUE, à semelhança da jurisprudência acima referida, que as medidas adotadas com base nas disposições do Código Aduaneiro Comunitário ou do Código Aduaneiro da União devem ser eficazes. O princípio da efetividade previsto no direito primário não pode ser interpretado no contexto do Código Aduaneiro como exigindo a supressão total de qualquer fraude aduaneira, uma vez que tal exigência não é realista, dado que o comportamento faltoso, incluindo em matéria aduaneira, fará sempre parte da vida em sociedade. No entanto, este princípio estabelece a obrigação de fiscalizar as lesões aos interesses financeiros da União e de responder de forma adequada aos riscos de fraude previsíveis e atuais detetados.

182. Uma vez que, como foi salientado anteriormente, decorre das obrigações a que se comprometeram os Estados‑Membros, por força dos Tratados fundadores, que as medidas que adotam devem ser eficazes à luz dos objetivos que visam atingir, e que, embora os Estados‑Membros disponham de uma certa margem de apreciação relativa às medidas que adotam, esta margem é limitada pelo princípio da efetividade já referido, tal implica que a eficácia dessas medidas não pode ser apreciada de forma abstrata, devendo sê‑lo no contexto de uma situação particular. Há que examinar em seguida a procedência das acusações imputadas ao Reino Unido durante o período da infração.

2.      Quanto às medidas a tomar por força da regulamentação aduaneira para proteger os interesses financeiros da União na situação de fraude em causa

183. Com a sua ação, a Comissão acusa, em substância, o Reino Unido de não ter eliminado os riscos de fraude aduaneira e adotado medidas efetivas para lutar contra esses riscos. Para decidir sobre o mérito da presente ação, há que recordar, a título preliminar, que, em conformidade com jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, no âmbito de uma ação por incumprimento, incumbe à Comissão demonstrar a existência do incumprimento alegado e apresentar ao Tribunal de Justiça os elementos necessários para que este possa verificar a existência desse incumprimento, não podendo fundar‑se numa qualquer presunção (103). No caso vertente, coloca‑se a questão de saber se a Comissão demonstrou de forma suficiente que as medidas adotadas pelo Reino Unido para combater a fraude por subavaliação de produto na importação durante o período de infração não eram efetivas para efeitos da cobrança da totalidade dos recursos próprios da União a título de direitos aduaneiros, apesar do facto de as autoridades do Reino Unido terem conhecimento das características constitutivas e da dimensão da fraude cometida nas suas fronteiras (104).

a)      Quanto às características da fraude cometida pelos importadores em causa e ao conhecimento dessa fraude pelas autoridades do Reino Unido

184. A Comissão e o Reino Unido parecem estar de acordo quanto ao facto de este Estado ter sido objeto de uma fraude vasta e organizada antes e durante o período de infração. É igualmente pacífico que a fraude em causa consistia nos valores de importação serem declarados a níveis extremamente baixos pelos importadores, grupos criminosos chineses, que operavam em rede utilizando sociedades «fénix», a saber empresas constituídas com o exclusivo propósito de cometer a fraude, dotadas de recursos extremamente reduzidos, e que eram colocadas em liquidação ou desapareciam no momento em que a exatidão dos valores declarados era posta em causa pelas autoridades aduaneiras, tornando qualquer recuperação a posteriori dos direitos aduaneiros pouco provável, ou mesmo praticamente impossível (105). Tratava‑se de uma fraude simultaneamente móvel e muito reativa, no sentido de que as importações fraudulentas eram rapidamente deslocadas de um Estado‑Membro para outro, e, no interior de um Estado‑Membro, de um porto para outro, ao menor sinal de controlo por parte das autoridades nacionais. Assim, as atividades fraudulentas implicavam volumes muito grandes de produtos que podiam ser deslocados para os Estados‑Membros com um dispositivo de controlo relativamente fraco.

185. A este respeito, é revelador que, embora refute não ter cumprido as suas obrigações por força do direito da União, o Reino Unido reconhece, no relatório anexo à sua resposta de 11 de fevereiro de 2019 ao parecer fundamentado, que «existia sem dúvida alguma [no Reino Unido] uma fraude baseada na subavaliação das importações de produtos têxteis e de calçado provenientes da China durante o período abrangido pela petição da Comissão» (106). Este relatório reconhecia igualmente que «[…] a fraude não suscitava qualquer dúvida e que deviam ser tomadas contramedidas para pôr termo à fraude e favorecer o comércio leal a favor de operadores legítimos […]» (107). Na sua contestação, o Reino Unido considera que é vítima da fraude e que não tem qualquer interesse em permitir que essa atividade criminosa prossiga ou se desenvolva.

186. Como tal, resulta dos autos que, durante os procedimentos pré‑contencioso e contencioso, o Reino Unido admitiu, ainda assim, a existência da fraude, tendo alegado em várias ocasiões na sua contestação apenas progressivamente ter tomado dela conhecimento (108). Assim, segundo o Reino Unido, durante o ACP Discount em novembro e dezembro de 2011, a Comissão e os Estados‑Membros manifestamente não tinham uma ideia clara da prevalência da fraude por subavaliação das importações, visto que o objetivo dessa operação era «verificar o risco de subavaliação» dos produtos em causa. O Reino Unido sustenta que só no final de 2014 e ao longo da operação Snake é que o OLAF e alguns Estados‑Membros em causa começaram a compreender corretamente os comportamentos fraudulentos com os quais estavam confrontados. A este respeito, o Relatório OLAF menciona unicamente que o Reino Unido conhecia suficientemente bem a fraude desde 2014. Após esta operação, o conhecimento da fraude pelos Estados‑Membros, em particular da sua real dimensão e da sua dimensão europeia, ainda se desenvolveu, nomeadamente, no início de 2015 (109) e durante o ano de 2017 (110).

187. A República Portuguesa apoia este argumento do Reino Unido considerando, em substância, que as autoridades do Reino Unido não estavam cientes de uma prática generalizada de falsas declarações perante as alfândegas aquando da receção de uma mensagem formal de assistência mútua do OLAF em 2015 (111). Além disso, o facto de um Estado‑Membro estar ciente, desde março de 2012, da existência de fraudes de subavaliação envolvendo operadores desaparecidos, não lhe dava indicações concretas quanto à existência de declarações aduaneiras inexatas que tinha de conferir de forma sistemática.

188. Ora, no caso vertente, resulta dos autos que o Reino Unido foi informado da totalidade da fraude por subavaliação e das características acima referidas, bem como da necessidade de adotar medidas eficazes para lutar contra essa fraude durante o período de infração. Com efeito, a partir de abril de 2007, numa mensagem de assistência mútua, o OLAF indicava o risco que os produtos têxteis e o calçado provenientes da China apresentavam, e descrevia as suas modalidades (112). Através desta mensagem, o OLAF convidava todos os Estados‑Membros, por um lado, a analisarem as importações de produtos têxteis e de calçado provenientes, nomeadamente, da China para detetar eventuais indícios de importações subavaliadas e, por outro, a procederem a controlos adequados aquando dos desalfandegamentos efetuados para tais importações (113). Atendendo às características acima referidas da fraude na importação, o OLAF até precisava que todos os Estados‑Membros eram suscetíveis de ser afetados, sublinhando que existia o risco de a fraude ser desviada para outros portos da União (114). Daqui decorre que, em 2007, o OLAF já tinha determinado os elementos essenciais do comércio fraudulento, tendo‑os imediatamente levado ao conhecimento dos Estados‑Membros.

189. Além disso, na sua contestação, o Reino Unido sustenta que, em 2009, a Comissão invocou irregularidades verificadas na Bélgica e nos Países Baixos, mas não no Reino Unido. A este respeito, há que observar que a referida mensagem de assistência mútua enviada pela Comissão aos Estados‑Membros indicava expressamente que «[t]odos os Estados‑Membros [estavam] em causa», e convidava‑os a «tomar medidas adequadas para lutar contra o fenómeno endémico da subavaliação» (115). Há que recordar que é certo que tais mensagens de assistência mútua visavam comunicar informações (116) e que não podiam estabelecer a obrigação de efetuar controlos aduaneiros, cabendo estes últimos às autoridades nacionais (117). Todavia, essas mensagens constituem elementos passíveis de instar o Reino Unido a implementar medidas específicas para lutar contra a fraude e para proteger os interesses financeiros da União (118).

190. Por conseguinte, contrariamente ao que sustenta o Reino Unido, não resulta dos autos que foi no momento da conclusão da operação Snake que o OLAF e os Estados‑Membros começaram verdadeiramente a compreender o mecanismo fraudulento em causa. Com efeito, por um lado, uma operação aduaneira conjunta, como a operação Snake, é uma resposta a um problema que foi claramente identificado ao nível da União anteriormente (119). Nos termos do relatório final relativo a esta operação, a sua preparação baseou‑se na «avaliação aprofundada das ameaças constituídas pela fraude aduaneira de subavaliação que afetava a [União] [, que] confirmou que o setor têxtil era consideravelmente afetado pela […] subavaliação [e] que os capítulos mais afetados [eram] os capítulos 61 a 64 da NC», realizada previamente pelo OLAF. Por outro lado, decorre de um relatório do Tribunal de Contas que a Comissão tinha fornecido «orientações claras aos Estados‑Membros sobre a forma de lutar contra a subavaliação aquando da aplicação da [ACP Discount] relativa à subavaliação de produtos têxteis e de calçado importados da China» (120). Daqui resulta que, quando levaram a cabo a ACP Discount, em 2011, os Estados‑Membros já estavam plenamente cientes da fraude e dos meios de lutar contra esta (121).

191. Por último, a República Portuguesa invoca o Relatório Especial do Tribunal de Contas de 2015 (122) para demonstrar que a operação aduaneira conjunta foi a primeira a revelar a existência da fraude. Ora, basta observar que, segundo este relatório, uma operação aduaneira conjunta do OLAF tinha permitido constatar que «40 % dos [têxteis e do calçado originários da China] [introduzidos] em livre prática sob o regime aduaneiro 42 estavam subavaliad[o]s» e tinha tido por objetivo expor o problema preexistente e as medidas a adotar. Tal afirmação não constitui uma constatação de que a luta contra a fraude de subavaliação aduaneira constituía um problema novo, mas uma confirmação de que se tratava de uma causa importante de subavaliação.

192. Resulta do que precede que, durante todo o período da infração e, nomeadamente, desde o início deste período, o Reino Unido tinha pleno conhecimento das características essenciais tanto da fraude como das medidas suscetíveis de serem tomadas para a combater. Este conhecimento podia suscitar dúvidas junto das autoridades aduaneiras nacionais. Tendo em conta estes elementos, coloca‑se a questão de saber quais eram as contramedidas que essas autoridades estavam obrigadas a tomar por força do direito da União.

b)      Quanto à obrigação de instituir uma análise de risco, de efetuar controlos prévios à autorização de saída e quanto à necessidade de constituir garantias

193. A Comissão acusa o Reino Unido de não ter tomado um certo número de medidas de controlo o mais cedo possível, quando o risco de fraude estava identificado e se demonstrara que a fraude estava largamente difundida. A Comissão sustenta ter reiteradamente pedido aos Estados‑Membros que aplicassem limiares de valor como indicadores do risco de subavaliação, controlassem fisicamente as remessas declaradas a valores inferiores aos limiares do preço mínimo aceitável, contestassem o valor aduaneiro declarado, sendo caso disso, e que exigissem garantias para cobrir os direitos adicionais eventualmente exigíveis antes da introdução das mercadorias em livre prática. Mais especificamente, em circunstâncias como as do caso vertente, eram indispensáveis controlos prévios à autorização de saída, uma vez que as empresas implicadas na fraude eram sociedades que desapareciam assim que as declarações eram contestadas, o que impossibilitava a cobrança dos direitos após a introdução em livre prática das mercadorias importadas. Além disso, o controlo físico das mercadorias ainda sob fiscalização aduaneira teria permitido avaliar a qualidade das mercadorias com vista a determinar o seu valor aduaneiro. Ora, salvo no âmbito da operação Snake, o Reino Unido não tomou essas medidas.

194. Ao convidar os Estados‑Membros a aplicarem as ferramentas preventivas para detetar as importações fraudulentas possíveis, a Comissão propôs aos Estados‑Membros, entre os instrumentos potenciais, a metodologia OLAF, que consiste, em substância, em calcular limiares de risco de subavaliação, isto é, o preço mínimo aceitável, para cada código de produto da Nomenclatura Combinada em causa (ao nível de oito algarismos) a partir do preço médio corrigido, ou seja, uma média aritmética (não ponderada) dos valores médios declarados para importação nos 28 Estados‑Membros para cada um dos referidos códigos num período de quatro anos (123). O preço é corrigido no sentido de valores extremamente baixos ou altos que parecem errados serem eliminados. O preço mínimo aceitável é então calculado como sendo igual a 50 % do preço médio corrigido para os diferentes códigos de produtos. A Comissão baseia esta metodologia no Acórdão EURO 2004. Hungary (124), do qual decorre que, quando «o preço declarado era inferior em mais de 50 % ao preço médio estatístico» e, portanto, abaixo dos preços mínimos aceitáveis, podem existir dúvidas sérias quanto à validade das declarações em causa, pelo que essas mercadorias não podem ser colocadas em livre circulação sem controlo prévio. A Comissão invoca igualmente o Acórdão Comissão/Portugal (125), no qual o Tribunal de Justiça declarou que importa proceder à verificação de qualquer declaração aduaneira, nomeadamente, quando as autoridades aduaneiras dispuserem de indicações concretas de que essa declaração é inexata.

195. A Comissão acusa igualmente o Reino Unido de não exigir a constituição de garantias para todas as declarações aduaneiras cujo valor declarado possa ser considerado anormalmente baixo e que, por conseguinte, devem ser verificadas. Por força do artigo 244.o do regulamento de execução e do artigo 248.o do regulamento de aplicação, quando for apresentada uma declaração aduaneira, os direitos aplicáveis devem ser pagos ou cobertos por uma garantia antes da autorização de saída das mercadorias. O Reino Unido não pediu a prestação de garantias baseadas no montante total dos direitos de importação suscetíveis de serem exigíveis em violação dessas disposições.

196. O Reino Unido responde, em substância, que incumbe à Comissão demonstrar que as suas escolhas quanto às medidas antifraude eram manifestamente inadequadas ou destituídas de qualquer razoabilidade. Considera que não estava obrigado a proceder a verificações ou a obter garantias relativamente a todas as declarações que eram inferiores a 50 % do preço médio estabelecido pelo OLAF (126). No Acórdão EURO 2004. Hungary (127), o Tribunal de Justiça explicou que as autoridades aduaneiras nacionais estavam autorizadas, sem a isso serem obrigadas, a basear‑se na diferença de preço para rejeitar o valor declarado. No que se refere ao Acórdão Comissão/Portugal (128), o Reino Unido alega que a Comissão esbate a distinção entre, por um lado, os motivos pelos quais se pode justificar uma verificação em aplicação do regulamento de execução e do regulamento de aplicação e, por outro, o momento em que a verificação se torna necessária na aceção do referido acórdão.

197. O Reino Unido considera que ele próprio era vítima da fraude, pelo que não tinha qualquer interesse em permitir que esta criminalidade prosseguisse. Em seu entender, como esta fraude era muito difícil de controlar, carecia de tempo para a entender plenamente e para definir os melhores meios de a combater. Considera que cumpriu a sua obrigação de combater a fraude em questão ao participar ativamente nas operações de luta antifraude organizadas pelo OLAF, ou seja, a ACP Discount em 2011 e a operação Snake em 2014. Além disso, desde 2015, o Reino Unido empreendeu diligências para atacar a fraude por subavaliação através da operação Breach, no âmbito da qual as suas autoridades emitiram numerosos avisos de pagamento C18, representando um valor de cerca de 35 milhões de GBP em direitos aduaneiros. Além disso, em 2016 foi lançada a operação Samurai, o que implicou sobretudo controlos prévios e atividades de aprendizagem relativas ao regime aduaneiro 42. Baseando‑se nos ensinamentos destas últimas operações, o Reino Unido lançou a operação Swift Arrow a partir de outubro de 2017.

198. No que respeita à constituição das garantias, o Reino Unido considera que, por um lado, o facto de adotar uma conceção tão geral como a que propõe a Comissão quanto às garantias a exigir constitui uma violação inaceitável dos direitos patrimoniais dos importadores, tanto por força dos artigos 16.o e 17.o da Carta como do artigo 1.o do Protocolo Adicional [n.o 1] à Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Paris em 20 de março de 1952 (a seguir «Primeiro Protocolo Adicional»), e que, por outro, para que um pedido de garantias seja válido, deve fundar‑se numa base adequada para determinar o valor real das mercadorias. O recurso ao preço médio por código de produto na metodologia OLAF expõe muito os Estados‑Membros a reclamações dos operadores.

1)      Observações preliminares

199. Resulta da análise dos articulados das partes que a Comissão não nega que o Reino Unido implementou, durante o período da infração, determinadas medidas destinadas a lutar contra a subavaliação fraudulenta, mas sustenta que certas medidas empregues eram ineficazes para proteger os interesses financeiros da União, ao passo que outras não foram de todo aplicadas. Por conseguinte, a fim de examinar os argumentos invocados no âmbito do primeiro fundamento do recurso, importa determinar os objetivos e o alcance das obrigações que incumbem aos Estados‑Membros por força do direito aduaneiro da União, o que permitirá apreciar o caráter eficaz (ou não) das medidas implementadas pelo Reino Unido (129).

200. A este respeito, há que recordar que na medida em que, para proteger eficazmente os interesses financeiros da União, podem ser consideradas medidas muito diversas, a comparação entre elas em termos de eficácia pode não se revelar fácil de fazer num caso como o que está em causa, uma vez que o direito da União confere aos Estados‑Membros uma certa margem quanto à escolha das medidas (130). Todavia, devem considerar‑se ineficazes, em meu entender, as medidas adotadas que, tendo em conta as particularidades de uma dada situação, manifestamente não permitem alcançar os objetivos prosseguidos pelo direito primário e pelo direito derivado da União. Para este efeito, há que admitir um dos argumentos de defesa apresentados pelo Reino Unido no âmbito do presente processo, segundo o qual cabe à Comissão demonstrar, nomeadamente, que as medidas que este Estado alega ter implementado durante o período de infração para prevenir a fraude em causa careciam manifestamente de efetividade com vista à cobrança eficaz da totalidade dos recursos próprios da União a título de direitos aduaneiros (131). Atendendo à duração da infração imputada ao Reino Unido, considero que há que ter em conta o facto de o grau de eficácia de uma medida implementada por um Estado‑Membro só poder ser aferido no âmbito da sua análise detalhada. A fim de evitar desfavorecer retroativamente um Estado‑Membro à luz dos conhecimentos adquiridos posteriormente, a ineficácia das medidas efetivamente aplicadas só pode ser censurada ex ante, ou seja, à luz dos conhecimentos de que dispunham as autoridades nacionais competentes no momento da sua implementação. A situação é, no entanto, diferente nos casos em que o direito da União impõe imperativamente aos Estados‑Membros a obrigação de adotarem certas medidas específicas. Em tal caso, a eficácia da medida em causa já deve ter sido ponderada pelo próprio legislador da União, pelo que a sua mera não execução constitui uma violação do direito da União.

2)      Quanto à obrigação de recorrer à análise de risco

201. O artigo 13.o, n.o 2, do Código Aduaneiro Comunitário e o artigo 46.o, n.os 2 e 4, do Código Aduaneiro da União, aplicáveis, respetivamente, antes e depois de 1 de junho de 2016, obrigam ambos as autoridades nacionais a efetuar controlos aduaneiros com base numa «análise de risco» e a aplicar uma «gestão do risco». O Regulamento (CE) n.o 648/2005 (132) e as suas disposições de aplicação (133) implementaram um sistema de gestão comum do risco na União, segundo o qual os controlos aduaneiros assentam, nomeadamente, numa análise de risco que utiliza técnicas automatizadas de processamento de dados (134). Atualmente, as regras de gestão do risco estão previstas no artigo 46.o do Código Aduaneiro da União, cujo n.o 2 retoma, em substância, o artigo 13.o, n.o 2, do Código Aduaneiro Comunitário. Este último, nomeadamente, aplicável no início do período de infração (ou seja, de novembro de 2011 a junho de 2016), previa que os controlos aduaneiros que não sejam controlos por amostragem «devem basearse na análise de risco utilizando técnicas automatizadas de processamento de dados, com o objetivo de identificar e quantificar os riscos e criar as medidas necessárias para a sua avaliação» (135). Por conseguinte, estas disposições impõem, em substância, aos Estados‑Membros que introduzam um sistema de gestão de risco para efetuar controlos aduaneiros ordinários (136).

202. A gestão do risco tornou‑se um instrumento importante em matéria de controlo aduaneiro a nível mundial (137) e foi objeto de vários estudos (138). Na falta de disposições comunitárias na matéria, a Comissão acrescentou uma definição do conceito de «gestão do risco» na sua proposta de regulamento (CE) n.o 648/2005 (139), que contém a «identificação e a execução sistemáticas de todas as medidas necessárias para limitar a exposição ao risco», incluindo esta expressão «atividades como a recolha de dados e de informações, a análise e avaliação do risco, a recomendação e a realização de ações e o controlo regular e a revisão do processo e dos seus resultados, baseados em fontes e estratégias internacionais, comunitárias e nacionais» (140). O conceito de «análise de risco» foi inserido, no Código Aduaneiro Comunitário, pelo Regulamento n.o 648/2005, que alterou o seu artigo 13.o A Comissão explicou este aditamento com a necessidade de «introduz[ir] uma obrigação para os Estados‑Membros de utilizarem técnicas de análise de risco», precisando que, «[e]nquanto não existirem critérios comunitários ou internacionais, [se aplicam] os critérios nacionais (como [era] o caso [no momento da adoção dessa proposta])» (141). Com esta nova disposição a Comissão pretendia, nomeadamente, estabelecer um «quadro comum de gestão do risco», ainda que permitindo que sistemas nacionais de análise de risco e critérios nacionais possam continuar a ser utilizados (142).

203. Assim, a análise contextual do direito aduaneiro da União corrobora a conclusão que decorre de uma interpretação literal do artigo 13.o, n.o 2, do Código Aduaneiro Comunitário, e do artigo 46.o, n.os 2 e 4, do Código Aduaneiro da União, segundo a qual a aplicação de uma análise e avaliação dos riscos baseados numa análise sistemática de dados pelos Estados‑Membros, em conformidade com os direitos aduaneiros comunitário e da União, é uma obrigação e não uma faculdade. As medidas de controlo aduaneiro implementadas devem, por seu turno, assentar numa análise de risco, o que implica que devem ser selecionadas em função dos riscos identificados aquando da sua avaliação e suscetíveis de os neutralizar. Assim, como já foi explicado (143), o artigo 13.o, n.o 2, do Código Aduaneiro Comunitário e o artigo 46.o, n.o 2, do Código Aduaneiro da União, interpretados à luz do artigo 325.o TFUE, devem ser entendidos no sentido de que implicam, nomeadamente, a obrigação de os Estados‑Membros adaptarem, de forma permanente, os instrumentos da análise de risco, a fim de que estes abranjam em qualquer momento os riscos detetados pelos controlos aduaneiros e tenham em conta, permanentemente, as suas evoluções. Isto significa que a análise de risco efetuada pelos Estados‑Membros deve, entre outras coisas, determinar quais as mercadorias que devem ser objeto de controlos e por que meios.

204. Resulta do exposto que, no contexto do presente processo, a partir do momento em que um risco significativo de fraude aduaneira em todo o território aduaneiro da União relativo a produtos importados da China era conhecido ao nível da União, os Estados‑Membros estavam obrigados, nomeadamente, por força do artigo 13.o, n.o 2, do Código Aduaneiro Comunitário (e posteriormente do artigo 46.o, n.o 2, do Código Aduaneiro da União), a adaptar os seus próprios métodos nacionais de gestão do risco em matéria aduaneira. Com efeito, como foi já salientado (144), as autoridades aduaneiras do Reino Unido estavam plenamente cientes do risco em causa, o que implica que também deviam ter adaptado, num prazo razoável, os seus métodos de análise de risco tendo em conta as informações disponíveis, e realizando os controlos aduaneiros necessários (145). Tendo em conta que resulta dos autos que o Reino Unido estava ciente dos factos relativos ao esquema de fraude aduaneira, em 2007, e que, em seguida, foi regularmente mantido ao corrente da sua evolução, principalmente por intermédio da Comissão, afigura‑se‑me difícil admitir o argumento do demandado segundo o qual a não adoção e implementação de um instrumento de análise de risco no início do período de infração, em novembro de 2011, ou seja, quatro anos após a receção das informações pertinentes pelas autoridades do referido Estado, está em conformidade com o artigo 13.o, n.o 2, do Código Aduaneiro Comunitário.

205. Resulta dos seus articulados que o Reino Unido não contesta, em substância, o facto de não ter recorrido, durante o período da infração, a um método de análise de risco para detetar as fraudes aduaneiras ligadas à subavaliação. Todavia, em resposta às alegações da Comissão, o Reino Unido explica que a elaboração de um método adequado de análise de risco levou algum tempo devido, nomeadamente, ao caráter complexo da fraude em causa (146), sendo a metodologia OLAF inadequada à luz da situação específica do Reino Unido. É certo que, como alega o Estado demandado, os artigos 3.o e 46.o do Código Aduaneiro da União (correspondendo este último ao artigo 13.o do Código Aduaneiro Comunitário) não exigem que os Estados‑Membros implementem um certo tipo de métodos de avaliação dos riscos e não se opõem, portanto, de modo algum, a que um Estado‑Membro, com vista a detetar as fraudes aduaneiras ligadas à subavaliação, não se apoie nos preços médios estatísticos, mas recorra a um método que se foca, de forma dirigida e específica, nos operadores especializados nesse tipo de fraude, como acabaram por fazer as autoridades aduaneiras do Reino Unido no âmbito da operação Swift Arrow. Na realidade, ao fazê‑lo, o Reino Unido reconhece, de forma implícita, que não dispunha, durante o período da infração, de método adequado para efetuar as análises de risco. Ora, parece‑me que tal justificação não é pertinente à luz da obrigação prevista no artigo 13.o, n.o 2, do Código Aduaneiro Comunitário e do artigo 46.o, n.o 2, do Código Aduaneiro da União.

206. Esta conclusão é corroborada pela análise dos elementos de prova que constam dos autos relativa às operações de controlo aduaneiro conduzidas pelo Reino Unido durante o período de infração, das quais resulta, nomeadamente, que as autoridades desse Estado‑Membro tinham recorrido aos instrumentos de análise de risco apenas no quadro da operação Snake, cuja fase operacional tinha decorrido entre 17 de fevereiro e 17 de março de 2014, no âmbito da qual a Comissão recomendou aos Estados‑Membros que aplicassem, entre outras medidas, os limiares de valor enquanto indicadores de risco (147). É pacífico que o Reino Unido participou nessa operação, utilizando os perfis de risco recomendados pelo OLAF, isto é, a metodologia OLAF enquanto limiar de risco, e procedeu a controlos adequados durante essa operação. Todavia, como alegou a Comissão, sem ser contraditada neste ponto pelo Reino Unido, estas medidas só duraram um mês, a saber, durante a fase operacional do referido processo. Dito de outra forma, fora desta fase operacional, as autoridades do Reino Unido não procediam a um controlo baseado na análise de risco, e controlavam, nessa altura, os importadores após o desalfandegamento, para lhes dirigir pedidos posteriormente (148).

207. Por outro lado, no âmbito da sua contestação, em resposta, nomeadamente, às alegações da Comissão relativas à não implementação de uma análise de risco, o Reino Unido alega que a mesma tinha por causa, nomeadamente, o facto de a metodologia OLAF não ter em conta especificidades do mercado britânico e acarretar a deteção de um grande número de importações legítimas como mercadorias subavaliadas (149). A este respeito, há que salientar que esta crítica se baseia na premissa errada de que a violação, por força do direito da União, tem origem no facto de o Reino Unido não ter adotado uma forma particular de controlo aduaneiro recomendado pela Comissão ou pelo OLAF (150). Ora, resulta da descrição da violação que é objeto do primeiro fundamento da petição, bem como de outros articulados da Comissão, que esta acusa o Reino Unido de não ter recorrido a qualquer método de análise de risco. Com efeito, como resulta da análise anterior, os artigos 3.o e 46.o, n.o 2, do Código Aduaneiro da União, assim como o artigo 13.o, n.o 2, do Código Aduaneiro Comunitário, impõem aos Estados‑Membros a adoção, no âmbito dos controlos aduaneiros, de análise de risco, de modo que, mesmo que, por razões apenas por si conhecidas, o Reino Unido não tenha considerado adequado aplicar o método da Comissão, tal não o impediu de, por si, elaborar e implementar controlos aduaneiros (151). Por conseguinte, entendo que as críticas emitidas pelo Reino Unido relativas à metodologia OLAF enquanto instrumento de risco são irrelevantes.

208. Assim sendo, por razões de exaustividade das presentes conclusões, há que recordar que, nos termos do artigo 28.o, n.o 1, TFUE, a União «compreende uma união aduaneira que abrange a totalidade do comércio de mercadorias e implica a proibição, entre os Estados‑Membros, de direitos aduaneiros de importação e de exportação e de quaisquer encargos de efeito equivalente, bem como a adoção de uma pauta aduaneira comum nas suas relações com países terceiros», e que o artigo 3.o, n.o 1, alínea a), TFUE, estabelece uma competência exclusiva no domínio da União Aduaneira (152). A este respeito, em conformidade com o artigo 2.o, n.o 1, TFUE, ao exercer esta competência, as normas aduaneiras da União são codificadas no Código Aduaneiro da União (e no regulamento de aplicação, e no regulamento de execução) e diretamente aplicáveis nos Estados‑Membros (153). Estes últimos são, em aplicação do artigo 291.o TFUE, competentes para a execução desta regulamentação (154). Embora a cobrança dos direitos aduaneiros se mantenha a cargo dos Estados‑Membros (155), o exercício desta tarefa exige uma cooperação estreita entre estes últimos e as instituições da União (156). Assim, por um lado, no domínio do combate à fraude, com base no artigo 325.o TFUE (157), foi conferido à Comissão e, nomeadamente, ao OLAF, um certo número de poderes de controlo e de inquérito (158). Por outro lado, no que se refere, nomeadamente, à gestão do risco, a União adotou uma estratégia para assegurar o respeito das normas mínimas em matéria de gestão do risco e de controlo no domínio aduaneiro (159), prevendo que as administrações aduaneiras nacionais adotem medidas com vista a reformar os procedimentos, as técnicas e os recursos em matéria de controlos efetuados às mercadorias (160). Tendo em conta as disposições referidas, e à luz da missão de interesse geral que é conferida à Comissão ao abrigo do artigo 17.o, n.o 1, TUE (161), considero que a Comissão estava habilitada para elaborar critérios não vinculativos, como a metodologia OLAF, a fim de permitir aos Estados‑Membros efetuarem uma análise de risco no âmbito dos seus controlos aduaneiros, tanto mais que, no caso em apreço, as fraudes aduaneiras em causa respeitavam à União no seu conjunto, e o catálogo de instrumentos de cooperação entre os Estados‑Membros e a Comissão não é limitado (162). Assim sendo, há que salientar que, embora a Comissão tenha precisado, nas suas comunicações, os objetivos da gestão do risco (163), na falta das regras harmonizadas relativas aos métodos de análise de risco (164), os Estados‑Membros eram e são livres de escolher os instrumentos específicos de gestão do risco durante o período de infração (165), como aliás a Comissão admitiu nos seus articulados e na audiência.

209. Quanto aos critérios materiais da metodologia OLAF, enquanto instrumento de análise de risco, no caso em apreço, há que salientar que, como resulta das respostas da Comissão às questões escritas colocadas pelo Tribunal de Justiça, enquanto instrumento de deteção de fraudes aduaneiras, esta metodologia foi objeto de um debate aprofundado entre os Estados‑Membros. Logo, a sua introdução, enquanto instrumento de análise de risco, ocorreu com base numa decisão consensual dos mesmos (166). As explicações avançadas pela Comissão, segundo as quais os limiares de risco de subavaliação (preço mínimo aceitável) para cada código de produto da nomenclatura combinada em causa (ao nível de oito algarismos) eram calculados a partir do preço médio corrigido, ou seja, a média aritmética (não ponderada) dos valores médios declarados para importação nos 28 Estados‑Membros para cada um dos referidos códigos num período de quatro anos, demonstram que esta metodologia não tem um caráter arbitrário. Tanto mais que resulta da jurisprudência que a utilização dos dados estatísticos para contestar a exatidão do valor aduaneiro declarado, ou seja, a existência de um valor aduaneiro inferior a 50 % do preço médio corrigido, atesta a presença de uma fraude por subavaliação que pode suscitar dúvidas (167). Afigura‑se‑me, portanto, que a metodologia OLAF, enquanto instrumento de análise de risco, se baseia em critérios objetivos e neutros.

210. Por último, considero que há que afastar o argumento do Reino Unido segundo o qual a metodologia OLAF implica a deteção de um grande número de importações legítimas, o que poderia constituir, para os operadores em causa, uma violação dos artigos 16.o e 17.o da Carta, relativos, respetivamente, à liberdade de empresa e ao direito de propriedade. A este respeito, uma vez que a análise de risco prevista no artigo 13.o, n.o 2, do Código Aduaneiro Comunitário e no artigo 46.o, n.o 2, do Código Aduaneiro da União constitui uma gestão do risco abstrata, examinando os riscos aduaneiros e planificando as contramedidas necessárias, ou seja, um plano de ação para a implementação das medidas de controlo aduaneiro, não vejo de que forma essa avaliação dos riscos poderia violar os direitos fundamentais referidos nessas disposições da Carta.

3)      Quanto à obrigação de efetuar controlos prévios à autorização de saída

211. O artigo 13.o, n.o 1, do Código Aduaneiro Comunitário, aplicável ao início do período de infração, previa que as «autoridades aduaneiras podem, de acordo com as condições previstas nas disposições em vigor, realizar todos os controlos que considerem necessários» (168). O seu sucessor, o artigo 46.o, n.o 1, do Código Aduaneiro da União, contém, no seu primeiro parágrafo, uma disposição semelhante e o segundo parágrafo vem acrescentar uma lista, não exaustiva, de diferentes controlos aduaneiros aos quais os Estados‑Membros podem recorrer. Resulta, parece‑me, da redação dessas disposições e, mais precisamente, da utilização do verbo «podem», que não se destinam a instituir uma ordem prioritária entre os diferentes tipos de controlo aduaneiro (169). De onde decorre, na minha opinião, que as referidas disposições conferem às autoridades aduaneiras nacionais, quando realizam controlos aduaneiros, uma certa margem de apreciação na escolha e na aplicação das modalidades do controlo aduaneiro (170). Esta leitura é, aliás, corroborada pelas disposições relativas à autorização de saída das mercadorias (171).

212. Todavia, como já foi exposto anteriormente (172), no que respeita à interpretação do alcance das obrigações previstas no artigo 325.o TFUE, a margem de apreciação de que dispõem as autoridades aduaneiras dos Estados‑Membros quanto à escolha das medidas de controlo aduaneiro está limitada pela exigência de assegurar uma proteção eficaz dos interesses financeiros da União. Além disso, como já foi referido, incumbe às autoridades aduaneiras nacionais, em aplicação do artigo 3.o, n.o 1, alínea a), do Código Aduaneiro da União, instituir medidas destinadas a «proteger os interesses financeiros da União e dos seus Estados‑Membros». A importância deste objetivo no Código Aduaneiro da União é salientado pelo lugar que esta disposição ocupa logo no início do mesmo, devendo os Estados‑Membros assegurar o cumprimento desta missão (173). Em suma, embora o artigo 13.o, n.os 1 e 2, do Código Aduaneiro Comunitário e o artigo 46.o, n.os 1 e 2, do Código Aduaneiro da União confiram a implementação e a escolha dos métodos de controlo aduaneiro aos Estados‑Membros que gozam de uma certa margem a este respeito, as medidas escolhidas não devem ser desprovidas de eficácia.

213. Considero, portanto, conformes com o objetivo de proteção dos interesses financeiros da União os métodos de controlo aduaneiro, como os que estão em causa, que, para preservar os interesses financeiros da União, permitem gerir eficazmente os riscos que são graves e identificados num dado momento e num determinado espaço, com base na análise dos riscos descrita nos números anteriores das presentes conclusões. Com efeito, como foi salientado várias vezes durante o período da infração, o risco principal identificado contra os interesses financeiros da União durante o período da infração consistia, nomeadamente, em importações massivas de produtos têxteis e calçado provenientes da China, importações essas que estavam subavaliadas e se caracterizavam, por um lado, por uma declaração sistemática e deliberada das mercadorias abaixo do seu valor real, e, por outro, pela falta de fiabilidade das sociedades operacionais implicadas, que eram, regra geral, constituídas com a única finalidade de perpetuar essa fraude e liquidadas assim que a declaração aduaneira que tinham apresentado era contestada pelas autoridades aduaneiras nacionais. Por conseguinte, este esquema de fraude aduaneira traduz‑se numa redução significativa dos direitos aduaneiros suscetíveis de serem cobrados sobre as mercadorias colocadas em livre circulação. É tendo em conta esta situação de facto que deve ser apreciada a eficácia das medidas de controlo aduaneiro adotadas pelo Reino Unido durante o período da infração, comparando‑as com as que a Comissão acusa este Estado‑Membro de não ter aplicado.

214. A este respeito, parece ser pacífico que, até ao início da operação Swift Arrow em outubro de 2017, o Reino Unido não adotou, regra geral, medidas de controlo aduaneiro prévias à autorização de saída, como verificações prévias ao desalfandegamento ou recolhas de amostras, com exceção das realizadas nas operações Snake, no início de 2014, e Samurai, em setembro de 2016. Sem pôr em causa este facto, ao considerar que o método de avaliação dos riscos proposto pelo OLAF não era adequado para detetar as importações objeto da fraude por subavaliação, o Reino Unido afirma que optou por uma estratégia que consiste na realização de controlos aduaneiros a posteriori, dos quais a operação Breach, que começou em 2015, é o principal exemplo (174). Entre os controlos aduaneiros a posteriori,  o Reino Unido enumera as visitas relacionadas com as expedições suspeitas, análises documentais, auditorias e inspeções, o exame do caráter comercial das vendas em causa e o exame das ligações entre o importador, os transitários e outras empresas, bem como atividades de sensibilização dos importadores, destinadas a identificar as atividades fraudulentas.

215. Quanto ao argumento de defesa que o Reino Unido baseia na impossibilidade de aplicar controlos prévios à autorização de saída devido à inadequação da metodologia OLAF, há que salientar que, como já foi exposto nas presentes conclusões (175), embora os Estados‑Membros não estejam obrigados a seguir o método de análise de riscos proposto pela Comissão, nem por isso deixam de estar sujeitos à obrigação prevista no artigo 13.o, n.o 2, do Código Aduaneiro Comunitário e no artigo 46.o, n.o 2, do Código Aduaneiro da União de adotar controlos que assentam numa análise de risco. Por conseguinte, ao justificar a inexistência dos controlos prévios à autorização de saída pela falta de método adequado de análise de risco, o Reino Unido reconhece, no essencial, a sua inobservância da obrigação de prever esses controlos. Além disso, considero que há que aprovar o argumento da Comissão segundo o qual as medidas a posteriori enumeradas pelo Reino Unido não podem, em todo o caso, ser consideradas eficazes. Considero difícil compreender de que modo a estratégia escolhida a posteriori por esse Estado poderia ser considerada eficaz, tendo em conta o objetivo de proteção dos interesses financeiros da União, numa situação em que a fraude aduaneira consistia na subavaliação de produtos têxteis e de calçado importado, isto é, declarados, de forma consciente, abaixo do seu valor real. Parece inconcebível que as medidas descritas pelo Reino Unido permitam assegurar a cobrança dos direitos aduaneiros efetivamente devidos, se o Reino Unido não efetuou previamente a determinação efetiva das mercadorias importadas, o que implica necessariamente verificações físicas prévias ao desalfandegamento e recolhas de amostras antes da introdução em livre prática das mercadorias em causa (176). A realização dos controlos aduaneiros prévios à autorização de saída afigura‑se indispensável quando as autoridades aduaneiras têm dúvidas quanto à exatidão da declaração aduaneira, mas revela‑se ainda mais necessária nos casos em que os operadores têm por único objetivo cometer uma fraude. A este respeito, como já foi demonstrado, as autoridades aduaneiras do Reino Unido estavam plenamente cientes da fraude relativa à subavaliação aduaneira e, ao participarem na operação Snake, confirmaram, de resto, de forma empírica, a necessidade de adotar medidas eficazes de luta (incluindo medidas prévias) contra esta. Resulta do que precede que as autoridades britânicas tinham, desde o início do período de infração, conhecimento da natureza da fraude aduaneira em causa, face à qual deveriam ter tido sérias dúvidas quanto à eficácia das medidas a posteriori acima referidas.

216. O Reino Unido sustenta igualmente que, segundo o Acórdão Comissão/Portugal (177), o Tribunal de Justiça indicou que as autoridades aduaneiras só são obrigadas a efetuar controlos suplementares se dispuserem «de indicações concretas» quanto à inexatidão de uma declaração aduaneira. Este argumento de defesa assenta, em meu entender, numa leitura errada desse acórdão. Ao salientar que «a fim de [assegurar a] aplicação correta da regulamentação aduaneira, importa proceder à verificação de qualquer declaração aduaneira para além do [limiar em causa] quando as autoridades aduaneiras disp[onham] de indicações concretas de que essa declaração é inexata», o Tribunal de Justiça não estabeleceu, na minha opinião, qualquer limite quanto à fonte da informação de que decorre a inexatidão de uma declaração aduaneira. Tendo em conta, nomeadamente, as missões que incumbem às autoridades aduaneiras nacionais, por força do artigo 3.o, n.o 1, do Código Aduaneiro da União, estas têm a obrigação de reagir à fraude aduaneira, mesmo que a informação relativa à inexatidão respeitante às declarações aduaneiras lhes chegue por intermédio da Comissão ou de outros Estados‑Membros. Esta interpretação é corroborada pelo regime de intercâmbio de informações entre os Estados‑Membros previsto no artigo 46.o, n.o 3, desse código, enquanto expressão da União Aduaneira da União (178). Tendo em conta o conhecimento pelas autoridades aduaneiras do Reino Unido de um risco elevado de fraude aduaneira, exposto nas presentes conclusões, concordo com a Comissão quando diz que o Reino Unido não pode afirmar que, no que respeita aos valores declarados no caso em apreço, as suas autoridades aduaneiras não possuíam indicações concretas quanto à inexatidão de uma declaração como a que está em causa no processo que deu lugar ao Acórdão Comissão/Portugal (179).

4)      Quanto à obrigação de constituir garantias

217. Por força do artigo 248.o, n.o 1, do regulamento de aplicação e do artigo 244.o, n.o 1, do regulamento de execução (180), quando for apresentada uma declaração aduaneira, os direitos aplicáveis devem ser pagos ou cobertos por uma garantia antes da autorização de saída das mercadorias. Assim, se as autoridades aduaneiras considerarem que a conferência da declaração aduaneira pode dar lugar a um montante exigível de direitos de importação (ou eventualmente a outras imposições) mais elevado do que o decorrente dos elementos da declaração aduaneira, a sua autorização de saída será autorizada após a constituição de uma garantia suficiente para cobrir a diferença desses montantes.

218. A este respeito, no que concerne à questão de saber se o artigo 248.o, n.o 1, do regulamento de aplicação (181)exige a constituição de uma garantia, há que salientar que os termos das versões linguísticas que analisei parecem indicar que a autorização de saída está obrigatoriamente sujeita à constituição de uma garantia (182). Ora, as diferentes versões linguísticas do artigo 244.o, n.o 1, do regulamento de execução, disposição que corresponde, em substância, ao artigo 248.o, n.o 1, do regulamento de aplicação, variam. Com efeito, as versões em língua alemã e estónia sugerem que essa constituição é uma faculdade, enquanto as outras versões referidas parecem indicar que se trata de uma obrigação (183). Atendendo às divergências entre as diferentes versões linguísticas do artigo 244.o, n.o 1, do regulamento de execução, a sua redação não permite, na minha opinião, chegar a uma conclusão unívoca quanto ao ponto de saber se essa disposição exige a constituição de uma garantia como condição para a autorização de saída das mercadorias ou se as autoridades aduaneiras dos Estados‑Membros dispõem de uma margem de apreciação em relação às especificidades de cada caso concreto (184). Em caso de disparidade entre as diferentes versões linguísticas de um texto da União, a disposição em causa deve ser interpretada em função da economia geral e da finalidade da regulamentação de que constitui um elemento. A este propósito, quanto ao contexto em que se inscrevem as referidas disposições, considero que há que ter em conta, para efeitos da interpretação do artigo 248.o, n.o 1, do regulamento de aplicação e do artigo 74.o, n.o 1, do Código Aduaneiro Comunitário, que «a autorização de saída das mercadorias objeto [de uma declaração aduaneira] só pode ser concedida se o montante da dívida aduaneira tiver sido pago ou garantido» (185). No que respeita ao artigo 244.o do regulamento de execução, o artigo 89.o e as disposições seguintes desse código especificam as diversas situações nas quais há que recorrer à constituição de garantias, indicando ainda as hipóteses em que tal constituição não deve ter lugar (186). De onde decorre, para efeitos do presente fundamento, que embora as autoridades aduaneiras de um Estado‑Membro disponham de uma certa margem de apreciação quando decidem exigir a constituição de garantias, esta está, em minha opinião, limitada pela exigência de proteção eficaz dos interesses financeiros da União, na aceção do artigo 325.o TFUE, que já foi destacado no âmbito das presentes conclusões (187). A necessidade de salvaguardar os interesses financeiros da União e dos Estados‑Membros decorre, além disso, do considerando 27 do regulamento de execução, que enuncia, nomeadamente, que «[t]endo em conta a necessidade de assegurar uma proteção adequada dos interesses financeiros da União e dos Estados‑Membros, bem como condições de concorrência equitativas entre os operadores económicos, é necessário estabelecer regras processuais relativas à prestação de uma garantia», e dos considerandos 36 e 37 do Código Aduaneiro da União (188). Assim, entendo que há que aprovar a abordagem da Comissão segundo a qual a aplicação das medidas de controlo aduaneiro e a exigência de constituição de garantias devem ser tratadas de forma diferente consoante se trate de empresas reconhecidas que possuem ativos (189) ou se trate, como no caso em apreço, de sociedades ditas «fénix», que têm por único objetivo cometer uma fraude e que são objeto de liquidação no momento da introdução em livre circulação das mercadorias que declararam.

219. No que respeita, no caso em apreço, aos elementos de prova relativos à não aplicação das garantias pelo Reino Unido durante o período da infração, estes já foram examinados nas presentes conclusões, nomeadamente na parte relativa à obrigação de recorrer a uma análise de risco e dos controlos prévios, pelo que não devem ser reiterados na presente parte (190).

220. Além disso, o Reino Unido alega que, por um lado, o facto de adotar uma conceção tão geral como a proposta pela Comissão quanto às garantias a exigir constitui uma violação inaceitável dos direitos patrimoniais dos importadores, por força do artigo 17.o da Carta e do artigo 1.o do Primeiro Protocolo Adicional, e que, por outro, as autoridades do Reino Unido não dispunham de nenhum elemento probatório que permitisse determinar um valor de substituição, pelo que não podiam exigir a constituição de garantias com base nesse valor de substituição.

221. Na minha opinião, estes argumentos devem ser afastados.

222. No que respeita ao argumento do Reino Unido segundo o qual o direito de propriedade, tal como previsto no artigo 17.o da Carta, não permite às autoridades aduaneiras pedir de maneira geral garantias aos importadores, observo que este Estado não explica os motivos exatos pelos quais o pedido de constituição de garantia constitui uma violação deste direito. Ora, por força do adágio ator incumbit probatio, reus in excipiendo fit ator, incumbe ao referido Estado‑Membro provar a sua alegação que visa pôr em causa a obrigação de constituir garantias em que se baseia a Comissão (191).

223. De qualquer modo, parece‑me, à primeira vista, que o Reino Unido não alega que o artigo 248.o do regulamento de aplicação ou o artigo 244.o do regulamento de execução eram, eles próprios, contrários aos direitos fundamentais previstos no artigo 17.o da Carta. Além disso, importa passar brevemente em revista os critérios relativos ao artigo 1.o do Primeiro Protocolo Adicional, tal como caracterizados na jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (a seguir «TEDH»), que deve ser tida em consideração para efeitos da interpretação desse artigo 17.o, em conformidade com a cláusula de homogeneidade prevista no artigo 52.o, n.o 3, da Carta (192). Nos termos dessa jurisprudência, a tributação fiscal constitui, em princípio, uma ingerência no direito de propriedade (193), mas uma ingerência justificada em conformidade com o segundo parágrafo do referido artigo 1.o que prevê expressamente uma exceção no que respeita ao pagamento de impostos ou outras contribuições (194). Neste contexto, há que salientar que, quando os Estados elaboram e põem em prática uma política em matéria fiscal, gozam de uma ampla margem de apreciação (195). Além disso, como alega a Comissão, a constituição de uma garantia aduaneira tem um caráter apenas temporário, sendo liberada assim que os direitos aduaneiros corretos são pagos ou assim que o importador demonstre a inexistência de subavaliação. Parece‑me que, ao sustentar que as autoridades aduaneiras não podem adotar uma conceção tão geral como a que a Comissão pretende quanto às garantias a exigir, o Reino Unido põe em causa a eventual compatibilidade da prática administrativa que esta instituição preconiza com o direito fundamental da propriedade previsto no artigo 17.o da Carta. É verdade que, nos termos da jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, os direitos fundamentais garantidos pela ordem jurídica da União são aplicáveis em todas as situações reguladas pelo direito da União, mas não fora dessas situações, podendo a implementação do direito da União incluir práticas administrativas (196) como as que estão em causa no caso em apreço (197). Todavia, afigura‑se que a objeção referida supra, avançada pelo Reino Unido, pode revestir um caráter hipotético nas condições do presente processo, na medida em que a compatibilidade das decisões e do comportamento das autoridades nacionais com a Carta pode ser apreciada, não de forma abstrata, mas unicamente no contexto de um ato administrativo particular. Uma vez que o Reino Unido não apresentou nenhum caso específico em que uma constituição de garantia, por força das disposições do direito da União, tenha conduzido a uma violação de um direito fundamental consagrado na Carta de um operador em causa, o Tribunal de Justiça não tem, na minha opinião, que examinar este argumento em sua defesa.

224. No que respeita ao argumento do Reino Unido segundo o qual as suas autoridades não estavam em condições de exigir garantias pelo facto de não disporem de nenhum elemento que permitisse determinar um valor de substituição para as mercadorias importadas, parece‑me que o Reino Unido justifica a não implementação de uma medida aduaneira com a não adoção de outra medida, a saber, a falta de controlos prévios à autorização de saída e de colheita de amostras. Mais especificamente, esta omissão teve por efeito que este Estado não pôde determinar, em conformidade com os artigos 70.o e 74.o do Código Aduaneiro da União, o valor dos produtos em causa, o que, no entanto, é necessário para a constituição de garantias. Por último, há que chamar a atenção para uma incoerência nos fundamentos de defesa do Reino Unido que alega, em substância, que, numa situação em que as suas autoridades aduaneiras não aplicaram corretamente as disposições do Código Aduaneiro da União relativas à determinação do valor aduaneiro das mercadorias em causa, não deixa de ser possível, como o Reino Unido demonstra com a operação Breach (198), determinar a diferença entre o valor das mercadorias com base no qual os direitos aduaneiros foram cobrados e o seu valor real.

3.      Resumo dos elementos considerados contra o Reino Unido

225. A título de resumo, há que considerar que as medidas que o Reino Unido adotou para o período de infração não podem ser consideradas eficazes na aceção do artigo 325.o TFUE e das disposições do direito derivado no domínio aduaneiro. Com efeito, considero que, no que respeita aos produtos em causa, este Estado não realizou, durante o período da infração, controlos aduaneiros baseados na análise de risco e controlos prévios à autorização de saída das mercadorias, nem exigiu garantias antes da introdução em livre prática das mesmas. As medidas de controlo posteriores ao desalfandegamento das mercadorias não foram suficientes nem efetivas nos termos das referidas disposições. Assim, as medidas adotadas pelo Reino Unido eram manifestamente desprovidas de eficácia, tendo em conta as características da fraude em causa e o conhecimento que as autoridades do Reino Unido dela podiam ter durante o período da infração.

226. Tal conclusão resulta também dos dados estatísticos fornecidos pela Comissão, dos quais resulta que, com base na metodologia OLAF, enquanto 32,44 % das importações foram declaradas a um nível inferior ao preço médio aceitável em 2013, esta proporção passou para 50,50 % em 2016 (199). O Reino Unido reconhece que, com base na abordagem elaborada pela HMRC, 35,2 % de todas as importações abrangidas pelos capítulos 61 a 64 provenientes da China foram, durante o período de infração, subavaliadas, ao passo que, em aplicação da metodologia OLAF, esse número ascende a 44,8 % (200). Ora, há que constatar que as duas partes estão de acordo quanto ao facto de a operação Swift Arrow ter tido por efeito a redução do volume de produtos subavaliados, demonstrando os números do primeiro trimestre dos anos 2017 e 2018 volumes de importação inferiores ao preço mínimo aceitável muito reduzidos (201). Ambas as partes reconhecem igualmente que os controlos aduaneiros desta operação consistiam em controlos anteriores à autorização de saída das mercadorias com base numa análise de risco, controlos que eram acompanhados de recolhas de amostras. Estes dados permitem, em minha opinião, concluir pela existência de um nexo direto entre a presença da fraude por subavaliação e os métodos de controlo aduaneiro aplicados pelo Estado‑Membro, o que implica que a fraude massiva por subavaliação em causa cometida durante o período de infração não tinha caráter inevitável. Por conseguinte, considero que o argumento, que ocupa um lugar central na defesa do Reino Unido, segundo o qual não se pode deduzir do sucesso da operação Swift Arrow que as medidas tomadas anteriormente eram manifestamente inadequadas, deve ser rejeitado, uma vez que os dados empíricos anteriormente examinados confirmam precisamente o contrário.

227. A conclusão anterior no que respeita ao caráter insuficiente das medidas adotadas, durante o período de infração, pelo Reino Unido para combater a fraude por subavaliação não é contrariada pelo argumento que retira do facto de ter participado em todas as operações conduzidas pela Comissão e a que ele próprio deu início, tendo esta instituição aliás confirmado que ele tinha encetado todas as diligências exigidas a este respeito (202). Com efeito, como afirmou o próprio Reino Unido, incumbe aos Estados‑Membros zelar pela aplicação do direito aduaneiro da União, o que implica que têm o ónus de realizar controlos aduaneiros adequados e de proteger, de modo eficaz, os interesses financeiros da União. O cumprimento desta missão necessita, por parte dessas autoridades, de um trabalho contínuo, coerente e sistémico para a proteção da fronteira aduaneira da União, que não se pode limitar à participação pontual em operações aduaneiras, cujos efeitos só podem ser temporários.

4.      Quanto à obrigação de os EstadosMembros determinarem os montantes dos direitos aduaneiros e procederem ao registo de liquidação dos montantes correspondentes

228. A Comissão alega que, durante o período da infração, o Reino Unido cometeu uma violação contínua do artigo 105.o, n.o 3, do Código Aduaneiro da União e da disposição correspondente do artigo 220.o, n.o 1, do Código Aduaneiro Comunitário, por não ter tido em conta as dívidas aduaneiras que continuavam por cobrar quanto às importações fraudulentamente subavaliadas em causa, a partir do momento em que as autoridades aduaneiras se aperceberam da situação que levou à verificação dessas dívidas.

229. Em contrapartida, o Reino Unido sustenta, em substância, que, uma vez que não é obrigado a verificar as declarações aduaneiras em causa nem a calcular os direitos suplementares, não tem qualquer obrigação de registar na contabilidade as dívidas aduaneiras em causa.

230. Antes de mais, nos termos do artigo 104.o, n.o 1, do Código Aduaneiro da União e da disposição correspondente do artigo 218.o, n.o 1, do Código Aduaneiro Comunitário, as autoridades aduaneiras devem proceder, nos termos da legislação nacional, ao registo de liquidação do montante dos direitos de importação ou de exportação devidos. Por um lado, embora o registo de liquidação previsto nessas disposições seja o corolário das obrigações de constatar e pôr à disposição da União recursos próprios tradicionais, que decorrem, nomeadamente, das disposições dos Regulamentos n.os 1150/2000 e 609/2014 analisados no âmbito do segundo fundamento das presentes conclusões (203), verifica‑se independentemente dessas obrigações (204), e deve, portanto, delas ser distinguido (205). Por outro lado, a obrigação de proceder ao registo de liquidação dos montantes dos direitos por força das referidas disposições é, no âmbito deste processo, uma consequência direta e inevitável da adoção das medidas aduaneiras, como o recurso à análise de risco e os controlos aduaneiros prévios à autorização de saída já analisados, de modo que a sua inexistência implica necessariamente o não registo de liquidação dos referidos montantes. Por conseguinte, considero que a alegação relativa à violação da obrigação de registo de liquidação dos montantes em causa deve ser analisada conjuntamente com as acusações relativas à obrigação de adotar medidas aduaneiras necessárias, que já foram discutidas no âmbito do presente fundamento.

231. Quanto ao mérito, nos termos da jurisprudência, o registo de liquidação dos montantes de direitos aduaneiros consiste, nomeadamente, no lançamento, pelas autoridades aduaneiras, nos registos contabilísticos ou em qualquer outro suporte equivalente, quando essas autoridades possam calcular o montante legalmente devido e determinar o devedor (206), do montante a cobrar. Isto implica que, quando uma autoridade aduaneira constata que houve total ou parcialmente falta de pagamento das dívidas aduaneiras e que está em condições de calcular o montante dos direitos originados por essa dívida e determinar o devedor, é obrigada a proceder ao registo de liquidação desse montante em conformidade com as disposições acima referidas. No caso em apreço, como foi já salientado, o Reino Unido estava ciente da fraude por subavaliação das mercadorias, o que implica que as suas autoridades tinham, não só obrigação de determinar os valores aduaneiros corretos e de realizar os controlos das declarações aduaneiras, como também de determinar os montantes relativos às importações em causa e proceder ao registo de liquidação, nos termos do artigo 105.o, n.o 3, do Código Aduaneiro da União e da disposição correspondente do artigo 220.o, n.o 1, do Código Aduaneiro Comunitário (207).  Na medida em que o Reino Unido não procedeu a essas determinações e a esses registos, a acusação relativa a essas disposições que não tem, na realidade, conteúdo autónomo, deve ser considerada também infundada enquanto consequência direta das violações analisadas nos números anteriores das presentes conclusões. Com efeito, não tendo adotado as medidas necessárias acima referidas por força das disposições pertinentes do Código Aduaneiro Comunitário e do Código Aduaneiro da União, lidos à luz do princípio da efetividade consagrado no artigo 325.o TFUE, o Reino Unido não determinou, forçosamente, os montantes relativos às importações em causa e não procedeu ao seu registo de liquidação, nos termos do artigo 105.o, n.o 3, do Código Aduaneiro da União e da disposição correspondente do artigo 220.o, n.o 1, do Código Aduaneiro Comunitário.

232. Nestas condições, há que considerar procedente o primeiro fundamento na parte em que diz respeito às obrigações decorrentes do artigo 325.o TFUE, dos artigos 13.o e 220.o, n.o 1, do Código Aduaneiro Comunitário, dos artigos 3.o, 46.o e 105.o, n.o 3, do Código Aduaneiro da União, do artigo 248.o, n.o 1, do regulamento de aplicação, e do artigo 244.o do regulamento de execução.

C.      Quanto ao incumprimento da legislação da União relativa aos recursos próprios e à estimativa de perdas de recursos próprios tradicionais constituídos pelos direitos aduaneiros

233. A Comissão considera que o Reino Unido não cumpriu a legislação relativa aos recursos próprios tradicionais e, nomeadamente aos artigos 2.o e 8.o das Decisões 2007/436 e 2014/335, bem como aos artigos 2.o, 6.o, 9.o, 10.o, 11.o e 17.o do Regulamento n.o 1150/2000, aos quais correspondem, respetivamente, os artigos 2.o, 6.o, 9.o, 10.o, 12.o e 13.o do Regulamento n.o 609/2014. Segundo a Comissão, este Estado não efetuou, durante o período da infração, os controlos aduaneiros adequados, de modo que as mercadorias fraudulentamente subavaliadas não foram declaradas corretamente na alfândega. Tendo em conta esta avaliação incorreta, os direitos aduaneiros devidos por essas mercadorias não foram calculados corretamente e os montantes dos recursos próprios correspondentes aos direitos que deveriam ter sido apurados não o foram e, portanto, não foram colocados à disposição do orçamento da União no momento em que o deviam ter sido. A Comissão censura igualmente ao Reino Unido o facto de as suas autoridades terem constatado, e depois anulado, dívidas aduaneiras relativas a certas importações de mercadorias subavaliadas, cometendo assim um erro administrativo. Em resumo, a Comissão considera que o Reino Unido é responsável pelas perdas de recursos próprios tradicionais daí resultantes.

234. Antes de analisar a procedência do presente fundamento, é necessário fornecer esclarecimentos quanto ao regime jurídico relativo à disponibilização dos recursos próprios tradicionais a fim de determinar as obrigações dos Estados‑Membros na matéria (secção 1). Quanto ao mérito deste fundamento, antes de mais, há que examinar o argumento da Comissão segundo o qual, ao não ter tomado as medidas adequadas após ter apurado uma dívida aduaneira suplementar em relação a certas mercadorias subavaliadas no período compreendido entre novembro de 2011 e novembro de 2014, e ao anular essas dívidas suplementares verificadas, as autoridades do Reino Unido cometeram um erro administrativo pelo qual aquele é financeiramente responsável (secção 2). Em seguida, há que analisar a problemática espinhosa quanto à determinação das perdas de recursos próprios tradicionais resultantes do incumprimento imputado (secção 3) e, por último, a título subsidiário, os argumentos de defesa do Reino Unido relativos aos juros de mora (secção 4).

1.      Quanto ao regime jurídico do registo de liquidação dos montantes devidos e da disponibilização dos recursos próprios tradicionais

235. As receitas provenientes dos direitos da pauta aduaneira comum constituem, em conformidade com o artigo 2.o, n.o 1, alíneas a) e b), da Decisão 2007/436 e com o artigo 2.o, n.o 1, alínea a), da Decisão 2014/335, recursos próprios tradicionais da União (208). Estes últimos são definidos «como receitas […] afetadas à [União], de uma vez por todas, para financiar o seu orçamento, e que lhe pertencem por direito, sem que haja lugar a qualquer ulterior decisão das autoridades nacionais» (209). Embora os Estados‑Membros estejam encarregados de cobrar, em conformidade com o artigo 8.o, n.o 1, das referidas decisões, os recursos próprios da União, têm, no entanto, a obrigação de os colocar à disposição da União, sem a tal se poderem opor (210).

236. O caráter imperativo da colocação à disposição da União dos recursos próprios tradicionais decorre das disposições do Regulamento n.o 609/2014 (211), relativo aos métodos e ao procedimento para a colocação à disposição, nomeadamente, dos recursos próprios tradicionais (212). A este respeito, nos termos do artigo 2.o, n.o 1, do Regulamento n.o 609/2014 (213), um direito da União sobre os recursos próprios tradicionais considera‑se apurado assim que se encontrem preenchidas as condições previstas na regulamentação aduaneira no que se refere ao registo de liquidação do montante do direito e à sua comunicação ao devedor (214), e, nos termos do artigo 13.o, n.o 1, desse regulamento (215), os Estados‑Membros têm de tomar todas as medidas necessárias para que os montantes correspondentes aos direitos apurados sejam colocados à disposição da Comissão. Por outro lado, o Tribunal de Justiça já precisou que esta disposição constitui uma expressão específica das exigências de cooperação leal que resultam do artigo 4.o, n.o 3, TUE, segundo as quais os Estados‑Membros devem, nomeadamente, submeter à Comissão os problemas encontrados na aplicação do direito da União (216).

237. Uma vez que as receitas deficitárias de um recurso próprio deverão ser compensadas quer por outro recurso próprio, quer por uma adaptação das despesas, os Estados‑Membros têm a obrigação de apurar os direitos da União sobre os recursos próprios tradicionais, sob pena de se aceitar que o equilíbrio financeiro da União seja perturbado pelo comportamento de um Estado‑Membro(217). Para efeitos de disponibilização dos recursos próprios, o artigo 9.o, n.o 1, do Regulamento n.o 609/2014 impõe que cada Estado‑Membro inscreva os recursos próprios a crédito da conta aberta para o efeito em nome da Comissão, segundo as regras definidas no artigo 10.o desse regulamento (218). A este respeito, o artigo 6.o, n.o 1, do Regulamento n.o 609/2014 prevê que os Estados‑Membros devem manter uma contabilidade dos recursos próprios junto do Tesouro ou do organismo que designarem. Quando as condições exigidas para o apuramento da dívida aduaneira estiverem preenchidas, os Estados‑Membros são obrigados a lançá‑la na contabilidade em conformidade com as disposições do artigo 6.o, n.o 3, primeiro parágrafo, desse regulamento (a contabilidade A) ou, se estiverem reunidas as condições ad hoc, a lançá‑la devidamente na contabilidade prevista no artigo 6.o, n.o 3, segundo parágrafo, do referido regulamento (a contabilidade B) (219).

238. A este respeito, há que precisar que a proteção geral dos interesses financeiros da União constitui um objetivo autónomo que está inscrito na parte VI, título II (Disposições financeiras), do Tratado FUE, distinto da União Aduaneira prevista na parte III, título II, capítulo 1, TFUE, relativa às políticas da União (220). Todavia, como salientou a advogada‑geral V. Trstenjak (221), existe uma ligação entre as normas aduaneiras e as normas sobre os recursos próprios da União, no sentido de que os direitos aduaneiros apurados enquanto recursos próprios serão determinados, impostos e cobrados pelas competentes autoridades aduaneiras nacionais, de acordo com as normas aduaneiras aplicáveis(222). Neste contexto, o Tribunal de Justiça declarou que existe um nexo indissociável entre a obrigação de apurar os recursos próprios da União, a de os lançar na conta da Comissão nos prazos fixados e a de pagar juros de mora (223). Estes últimos são, aliás, exigíveis seja qual for a razão do atraso desses lançamentos na conta da Comissão (224).

239. O Tribunal de Justiça mostra‑se particularmente atento na interpretação das disposições referidas supra, recordando, nomeadamente, que as disposições financeiras do direito da União estão entre as normas fundamentais do sistema jurídico da União, cujo estrito respeito é indispensável para assegurar o efetivo funcionamento desta (225). Uma vez que a União deve dispor dos recursos próprios «nas melhores condições possíveis» (226), o Tribunal de Justiça lembrou que diversas regras relativas à cobrança dos direitos aduaneiros têm por objetivo assegurar uma aplicação uniforme e diligente das disposições em matéria aduaneira, no interesse de uma colocação à disposição rápida e eficaz dos recursos próprios da União (227). Assim, resulta de jurisprudência constante que, embora um erro cometido pelas autoridades aduaneiras de um Estado‑Membro tenha por efeito que os recursos próprios da União não tenham sido cobrados, tal erro não pode pôr em causa a obrigação do Estado‑Membro em causa de pagar os direitos que foram apurados e os juros de mora (228). A título de exemplo, foram rejeitadas as justificações avançadas pelos Estados‑Membros, relativas a um erro de contabilização pelas autoridades nacionais (229), da distinção entre um erro material e um erro jurídico avançada pelo Estado‑Membro em causa ou ainda do caráter não intencional do atraso no lançamento dos montantes na conta da Comissão (230). De onde decorre que um Estado‑Membro que não proceda ao apuramento do direito da União sobre os recursos próprios e que não ponha o montante correspondente à disposição da Comissão, não estando preenchida uma das condições previstas no artigo 13.o, n.o 2, do Regulamento n.o 609/2014, não cumpre as suas obrigações decorrentes do direito da União (231).

240. Tendo em conta estas observações, não posso deixar de partilhar da posição da Comissão segundo a qual a violação da obrigação que incumbe ao Estado‑Membro, por força do direito da União, de proteger os interesses financeiros da União e de combater a fraude, bem como de proceder a controlos aduaneiros com base numa análise de risco e de exigir a constituição de garantias, constatada nas presentes conclusões, é necessariamente acompanhada do cálculo incorreto dos montantes dos recursos próprios tradicionais a pôr à disposição do orçamento da União e do não apuramento e disponibilização desses recursos no momento em que o deviam ter sido.

2.      Quanto à violação da obrigação do Reino Unido de colocar à disposição da Comissão os montantes correspondentes aos direitos aduaneiros apurados no âmbito da operação Snake

241. Decorre das considerações precedentes que o Reino Unido estava obrigado, em conformidade com o artigo 2.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1150/2000, ao qual corresponde o artigo 2.o, n.o 1, do Regulamento n.o 609/2014, a apurar a existência de recursos próprios da União e a colocá‑los, em aplicação dos artigos 6.o, 9.o e 10.o destes dois regulamentos, à disposição desta. Na sua petição, com a sua primeira acusação, a Comissão censura, em substância, as autoridades do Reino Unido de terem anulado na contabilidade B montantes importantes de dívidas aduaneiras. Esses montantes correspondem às dívidas suplementares apuradas na sequência da operação Snake, levada a cabo em 2014, e notificadas pelas autoridades do Reino Unido através da emissão dos avisos de pagamento C18 Snake, mas que foram retirados pelas autoridades do Reino Unido entre junho e novembro de 2015 (232). Segundo a Comissão, ao não terem adotado as medidas aduaneiras adequadas após terem constatado dívidas aduaneiras suplementares, e ao procederem à sua anulação, estas autoridades cometeram um erro administrativo pelo qual o Reino Unido deve ser considerado financeiramente responsável.

242. Este Estado critica a presente acusação, em substância, por duas razões. Por um lado, alega que não existia, no momento da emissão dos avisos de pagamento C18 Snake, nenhuma metodologia para proceder a uma determinação do valor aduaneiro a posteriori, após a autorização de saída das mercadorias subavaliadas. Por outro lado, o Reino Unido sustenta que os montantes em causa se revelaram «incobráveis», na aceção destas disposições, por razões que não são imputáveis às autoridades do Reino Unido, na medida em que os importadores visados pelos 23 avisos de pagamento C18 Snake eram sociedades «fénix», ou seja, sociedades que desaparecem a partir da introdução em livre prática das mercadorias. Assim, teria sido definitivamente impossível proceder à cobrança dos direitos em causa, por razões que não lhe podem ser imputadas, em conformidade com o artigo 17.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1150/2000 e com o artigo 13.o, n.o 2, alínea b), do Regulamento n.o 609/2014. Daqui decorre que o Reino Unido estava dispensado de colocar à disposição do orçamento da União os montantes correspondentes aos direitos apurados.

243. Logo, no âmbito da presente acusação, a questão é saber se, ao não proceder à cobrança dos direitos aduaneiros apurados pelos avisos de pagamento C18 Snake, o Reino Unido agiu de forma incompatível com as disposições supramencionadas dos Regulamentos n.os 1150/2000 e 609/2014.

244. A este respeito, em conformidade com o artigo 13.o, n.o 1, do Regulamento n.o 609/2014 e com a disposição correspondente do artigo 17.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1150/2000, os Estados‑Membros tomam todas as medidas necessárias para que os montantes correspondentes aos direitos apurados sejam colocados à disposição do orçamento da União. No caso em apreço, importa recordar que as autoridades britânicas consideraram que certas importações controladas no âmbito da operação Snake estavam subavaliadas, que procederam ao registo de liquidação dos montantes em causa, notificaram aos operadores os 23 avisos de pagamento C18 Snake e verificaram as dívidas aduaneiras correspondentes a estes. Os montantes correspondentes a essas dívidas foram inicialmente inscritos na contabilidade B, em conformidade com o artigo 6.o, n.o 3, dos Regulamentos n.os 1150/2000 e 609/2014, como direitos apurados, não cobrados e relativamente aos quais não tinha sido prestada qualquer caução. Em seguida, o Reino Unido procedeu à sua anulação.

245. Neste contexto, importa recordar que, por força do artigo 13.o, n.o 2, do Regulamento n.o 609/2014 e do artigo 17.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1150/2000, os Estados‑Membros só são dispensados de pôr à disposição da Comissão os montantes correspondentes aos direitos apurados se não tiver sido possível efetuar a cobrança por razões de força maior ou quando se verificar que é definitivamente impossível proceder a essa cobrança por razões que lhes não possam ser imputadas. Há igualmente que recordar que o Tribunal de Justiça interpretou os conceitos de «razões de força maior» e «outras razões que não […] sejam imputáveis [aos Estados‑Membros]» de forma estrita. A título de exemplo, recusou considerar que uma greve previsível possa constituir um facto justificativo de atraso no lançamento dos recursos (233) ou que um Estado‑Membro possa apreciar a oportunidade de executar um pedido de lançamento antecipado de recursos (234). O Tribunal de Justiça rejeitou, aliás, uma justificação de um Estado‑Membro relativa aos comportamentos fraudulentos de funcionários aduaneiros (235).

246. À luz da jurisprudência acima referida, parece‑me que, no caso em apreço, os argumentos de defesa do Reino Unido não podem ser acolhidos. Em primeiro lugar, é pacífico que este Estado não invoca a força maior para justificar a anulação dos avisos de pagamento C18 Snake, limitando‑se antes a alegar que não pode ser considerado responsável pela perda dos direitos aduaneiros suplementares reclamados nesses avisos de pagamento. Embora a insolvência do devedor da dívida aduaneira constitua, prima facie, um fator que não depende da vontade de um Estado‑Membro, há que ter em mente que, no caso em apreço, a Comissão acusa o Reino Unido de não ter tomado todas as medidas necessárias para que os montantes correspondentes aos direitos da União sobre os recursos próprios tradicionais sejam postos à disposição do orçamento da União. Resulta dos articulados das partes que estas não contestam que os direitos aduaneiros suplementares tinham sido apurados, uma vez que as autoridades britânicas identificaram as mercadorias cuja autorização de saída tinha sido concedida, nem que as garantias para assegurar a cobrança integral dos montantes exigidos não tinham sido pedidas aos importadores em causa (236). É importante salientar que, durante este período, estas autoridades britânicas estavam plenamente cientes do esquema fraudulento em questão, que consistia, nomeadamente, na cessação de toda a atividade das sociedades em causa, a partir da primeira impugnação da declaração aduaneira apresentada para efeitos da importação das mercadorias. Considero, portanto, desprovido de fundamento o argumento do Reino Unido segundo o qual a cobrança das dívidas aduaneiras suplementares visadas pelos avisos de pagamento C18 Snake foi impossível pelo facto de esses créditos não poderem ser executados. Com efeito, após o apuramento dos direitos aduaneiros suplementares, este Estado devia ter pedido, de acordo com as disposições do Código Aduaneiro Comunitário e do Código Aduaneiro da União em vigor, conforme interpretadas à luz do princípio da proteção efetiva dos interesses financeiros da União previsto no artigo 325.o TFUE, a constituição de garantias suficientes para cobrir o montante exigível (237). Assim, parece‑me que a justificação relativa à insolvência dos devedores de dívidas aduaneiras, como invocada pelo Reino Unido, não constitui, enquanto tal, uma razão que possa dispensar o Estado‑Membro de cobrar essa dívida aduaneira em aplicação das disposições em causa.

247. Por outro lado, há que rejeitar o argumento do Reino Unido segundo o qual a anulação dos avisos de pagamento C18 Snake era inevitável, uma vez que não existia qualquer metodologia para determinar o valor aduaneiro das mercadorias de forma correta. Mais especificamente, este Estado sustenta que as suas autoridades retiraram os avisos de pagamento C18 Snake após a sua contestação por certos operadores, com o fundamento de que a metodologia OLAF que tinham utilizado para determinar o valor aduaneiro correto das importações subavaliadas e que tinha sido objeto de contestações quando da operação Snake não era adequada para proceder à «reavaliação» dessas importações. Segundo o Reino Unido, as suas autoridades tiveram de retirar os avisos de pagamento C18 Snake, uma vez que se baseavam unicamente na metodologia OLAF.

248. A este respeito, há que observar que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, a regulamentação da União relativa à determinação do valor aduaneiro tem por objetivo o estabelecimento de um sistema equitativo, uniforme e neutro que exclui a utilização de valores aduaneiros arbitrários ou fictícios (238). O Tribunal salientou também que resulta dos artigos 29.o a 31.o do Código Aduaneiro Comunitário (atuais artigos 70.o a 74.o do Código Aduaneiro da União) que os métodos de determinação do valor aduaneiro previstos por essas disposições são estabelecidos numa ordem hierárquica e apresentam entre si um nexo de subsidiariedade, pelo que quando tal valor aduaneiro não puder ser determinado por aplicação de uma determinada disposição, há que aplicar a disposição que vem imediatamente a seguir, na ordem estabelecida (239). No caso em apreço deve recordar‑se que, segundo os autos, como resulta da análise do primeiro fundamento (240), era suposto utilizar a metodologia OLAF, inicialmente, apenas como um instrumento de análise de risco nas atividades aduaneiras habituais. Além disso, contrariamente ao que alega o Reino Unido, não foi na reunião de 20 de fevereiro de 2015 que o OLAF indicou, pela primeira vez, que o preço médio corrigido não devia ser utilizado para efeitos de «reavaliação», mas os Estados‑Membros foram informados desde o início da ACP Discount de que o objetivo desta metodologia era a deteção das fraudes. Por conseguinte, quando as autoridades britânicas recorreram aos preços médios corrigidos baseados na metodologia OLAF para calcular os direitos aduaneiros suplementares exigidos nos avisos de pagamento C18 Snake (241), não utilizaram esta metodologia segundo os objetivos para os quais foi concebida. Partilho, portanto, da posição da Comissão (242) segundo a qual as autoridades britânicas, após terem identificado as mercadorias fraudulentamente subavaliadas, deviam ter determinado o seu valor aduaneiro correto, em conformidade com os métodos sequenciais precisados no Código Aduaneiro Comunitário e no Código Aduaneiro da União, com base nos métodos de determinação acima referidos, tendo em conta o facto de que se tratava das mercadorias importadas visadas pelos controlos aduaneiros (243). Por conseguinte, parece que, ao não ter seguido as etapas relativas à determinação do valor aduaneiro, nos termos das disposições aduaneiras aplicáveis e referidas no número anterior, no atinente às mercadorias identificadas como subavaliadas no âmbito da operação Snake, e ao aplicar a metodologia OLAF em vez dessas disposições, o Reino Unido não respeitou a legislação aduaneira da União, pelo que os montantes determinados nos avisos de pagamento C18 Snake não refletem os montantes efetivamente devidos pelos operadores.

249. Resulta efetivamente dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça que as próprias autoridades britânicas se aperceberam dos erros que tinham cometido na determinação dos montantes suplementares (244), mas, em vez de os corrigir e de reemitir ordens de pagamento, optaram por anular definitivamente os avisos de pagamento C18 Snake. O Reino Unido defende que, na falta de uma metodologia aceitável, era preferível anular as dívidas (245). Como afirma a Comissão, o Reino Unido podia emitir novamente avisos de pagamento, o que escolheu não fazer.

250. Tendo em conta o que precede, considero que o Reino Unido, após ter constatado, registado e notificado aos devedores os direitos aduaneiros exigidos pelos 23 avisos de pagamento C18 Snake, não cumpriu as obrigações por força do artigo 13.o, n.o 1, do Regulamento n.o 609/2014 e da disposição correspondente do artigo 17.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1150/2000, segundo as quais incumbe aos Estados‑Membros tomar todas as medidas necessárias para que os montantes correspondentes aos direitos apurados sejam colocados à disposição do orçamento da União. A anulação desses avisos de cobrança, bem como as decisões anteriores relativas aos mesmos, devem ser consideradas erros administrativos das autoridades britânicas, cuja consequência é a não cobrança dos recursos próprios tradicionais da União. Além disso, partilho da posição da Comissão segundo a qual o Reino Unido preferiu anular os montantes reclamados pelos avisos de pagamento C18 Snake e inscritos na contabilidade B do que observar o procedimento previsto no artigo 13.o do Regulamento n.o 609/2014 e na disposição correspondente do artigo 17.o do Regulamento n.o 1150/2000, permitindo aos Estados‑Membros ficarem isentos da obrigação de colocar à disposição do orçamento da União os montantes correspondentes aos direitos que se revelem incobráveis. Daqui resulta que o Reino Unido não podia, nestas condições, invocar a isenção prevista no artigo 13.o, n.o 2, do Regulamento n.o 609/2014 e na disposição correspondente do artigo 17.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1150/2000, na medida em que os erros administrativos descritos são imputáveis a este Estado. De onde decorre que, por força da jurisprudência assente (246), um Estado‑Membro que, após ter apurado um direito da União sobre os recursos próprios, não põe o montante correspondente à disposição da Comissão, sem que esteja preenchida uma das condições previstas nas disposições acima mencionadas, não cumpre as suas obrigações decorrentes do direito da União. Por conseguinte, há que considerar que, devido à anulação dos 23 avisos de pagamento C18 Snake e à não colocação à disposição dos respetivos montantes, são devidos recursos próprios tradicionais ao orçamento da União relativos ao período compreendido entre novembro de 2011 e novembro de 2014.

3.      Quanto à avaliação das perdas dos recursos próprios tradicionais

251. A fim de apreciar a dimensão das perdas dos recursos próprios tradicionais para o orçamento da União resultantes do incumprimento do direito da União imputado ao Reino Unido no âmbito da presente ação, a Comissão baseou‑se, no caso em apreço, na metodologia OLAF e nos dados que tinha disponíveis. Nesta base, considera, no que respeita ao período compreendido entre novembro de 2011 e 11 de outubro de 2017, que o montante de 2 679 637 088,86 euros (montante bruto, deduzidas as despesas de cobrança) devia ter sido posto à disposição da Comissão a título de recursos próprios tradicionais.

252. O Reino Unido, em contrapartida, impugna na sua contestação tanto a metodologia utilizada como o montante calculado pela Comissão. Com base na sua própria avaliação, fixou o montante dos recursos próprios suplementares ligados às importações subavaliadas da China para o período de infração no montante de 217 646 623 GBP (247), número que reviu em baixa na tréplica e fixou em 123 819 268 GBP. Ao fazê‑lo, embora este Estado persista em contestar o incumprimento que lhe é imputado, parece‑me que, na realidade, reconhece implicitamente, em certa medida, que a sua não aplicação das medidas eficazes para combater a fraude aduaneira por subavaliação acarretou uma perda de recursos próprios tradicionais para o orçamento da União (248). Assim, a questão central do presente fundamento é saber como determinar a dimensão das perdas em causa.

253. Antes de examinar esta questão quanto ao mérito, considero que há que formular observações relativas às objeções preliminares apresentadas pelo Reino Unido no atinente, por um lado, à falta de competência da Comissão e do Tribunal de Justiça para proceder à avaliação e ao apuramento dos recursos próprios tradicionais, sendo esta competência dos Estados‑Membros (secção 1), e, por outro, ao caráter da presente ação, que constitui, na realidade, uma ação de indemnização, pelo que incumbe à Comissão provar o nexo de causalidade direto entre o incumprimento específico do Estado e o prejuízo que este lhe causou (secção 2).

a)      Observações preliminares

1)      Quanto à competência da Comissão para proceder à avaliação das perdas de recursos próprios tradicionais e à competência do Tribunal de Justiça para decidir esta questão

254. O Reino Unido sustenta que, quando os outros métodos utilizados numa fase anterior na sequência dos procedimentos previstos pelos artigos 70.o a 74.o do Código Aduaneiro da União (249) para determinar o valor aduaneiro não podem ser aplicados (250), é da competência exclusiva do Estado‑Membro aplicar, em vez do método ordinário que se baseia no valor transacional de uma mercadoria, um método subsidiário (251), previsto no artigo 74.o, n.o 3, do Código Aduaneiro da União e no artigo 31.o do Código Aduaneiro Comunitário, e, assim, determinar o valor aduaneiro das mercadorias em causa com base em dados disponíveis e através de «meios razoáveis» (252). Esta determinação implica um certo número de decisões complexas e escolhas metodológicas difíceis por parte das autoridades nacionais, que dispõem a este respeito de um amplo poder de apreciação.

255. Não partilho deste argumento de defesa baseado na aplicação das disposições aduaneiras, uma vez que, à semelhança da Comissão, considero que a utilização da metodologia OLAF, enquanto fundamento para estimar as perdas dos recursos próprios tradicionais, não visa determinar o valor aduaneiro das mercadorias importadas na aceção dessas disposições, o que é da competência exclusiva dos Estados‑Membros (253). Com efeito, por força dos artigos 69.o a 74.o do Código Aduaneiro da União, o Estado‑Membro deve determinar o valor aduaneiro das mercadorias e recorrer, se necessário, aos métodos secundários para o fazer (254). No caso em apreço, incumbia ao Reino Unido determinar o valor aduaneiro dos produtos têxteis e de calçado proveniente da China, tendo em conta os indicadores concretos que apontavam para a sua subavaliação. Ora, no caso em apreço, tais determinações não ocorreram, como resulta do exame do primeiro fundamento do presente recurso. Daqui resulta que a Comissão não pode substituir‑se aos Estados‑Membros para proceder a essa avaliação quando o Estado‑Membro em causa não o fez segundo os métodos acima referidos. Tal determinação já não é, de qualquer forma, possível. Esta circunstância é inerente à natureza estatística da metodologia OLAF enquanto instrumento de cálculo das perdas de recursos próprios tradicionais, que tem por objetivo determinar, com base nos dados estatísticos, a dimensão das perdas verificadas devido à violação pelo Reino Unido das disposições da legislação da União em matéria de recursos próprios tradicionais, na medida em que as suas autoridades não efetuaram os controlos aduaneiros adequados relativos às mercadorias em causa (255), pelo que os direitos aduaneiros devidos por estas últimas não foram corretamente calculados.

256. Decorre de jurisprudência constante já referida (256) que, regra geral, existe um nexo direto entre a violação do direito aduaneiro da União imputada ao Estado‑Membro e a perda de recursos próprios tradicionais daí resultante para o orçamento da União. Neste contexto, o Tribunal de Justiça já declarou, no processo que deu origem ao Acórdão de 9 de julho de 2020, República Checa/Comissão (257), que é inerente ao sistema dos recursos próprios da União, conforme atualmente concebido no direito da União, que a Comissão tem a faculdade de submeter à apreciação do Tribunal de Justiça, no âmbito de uma ação por incumprimento, um diferendo que a opõe a um Estado‑Membro quanto à obrigação de este pôr um determinado montante de recursos próprios da União à disposição desta instituição (258).

257. No caso em apreço, na medida em que o Reino Unido decidiu não pôr à disposição da Comissão, no prazo fixado no parecer fundamentado, o montante dos recursos próprios tradicionais em causa, tendo‑se limitado a contestar a posição da Comissão quanto à sua obrigação de aplicar esse montante, entendo que foi com razão que esta instituição considerou que esse Estado não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força da regulamentação em matéria de recursos próprios tradicionais e decidiu intentar uma ação por incumprimento para esse efeito. Neste contexto, cabe à Comissão provar a existência do alegado incumprimento e compete‑lhe trazer ao Tribunal de Justiça os elementos necessários à verificação por este da existência desse incumprimento, sem que se possa basear em presunções (259). Assim, incumbe ao Tribunal de Justiça verificar se a Comissão demonstrou de forma juridicamente bastante o montante das perdas de recursos próprios que exige relativamente ao período de infração. Daqui resulta que deve ser afastado o argumento do Reino Unido relativo à ordem de análise das metodologias e segundo o qual o Tribunal de Justiça deve, antes de mais, examinar a estimativa proposta deste Estado.

258. O Reino Unido sustenta, além disso, que, se o Tribunal de Justiça vier a declarar, num primeiro momento, que a Comissão provou de forma juridicamente bastante um incumprimento da sua obrigação de combater a fraude (260), incumbe à Comissão, num segundo momento, provar que a metodologia proposta pelo Reino Unido para determinar os recursos próprios suplementares que seriam devidos assenta em opções e numa apreciação das provas manifestamente desrazoáveis. Mais especificamente, segundo o Reino Unido, decorre da articulação dos artigos 258.o e 260.o TFUE que, ao incluir no objeto da sua ação a questão relativa às estimativas das perdas de recursos próprios tradicionais, a Comissão ultrapassa o âmbito de uma ação por incumprimento nos termos do artigo 258.o TFUE, que está limitada à questão de saber se o Estado‑Membro não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do direito da União. Nessa hipótese, a Comissão é obrigada a fazer prova de outro tipo de ilegalidade, a saber, o caráter manifestamente desrazoável da avaliação dos direitos não pagos efetuada pelo Reino Unido.

259. A este respeito, observo que este argumento não tem em conta o facto de a presente ação se destinar a que o Tribunal de Justiça declare, nomeadamente, que o Reino Unido não cumpriu as obrigações que lhe incumbem em matéria de recursos próprios por força do direito da União, o que implica necessariamente que a Comissão forneça prova relativa à dimensão das perdas desses recursos e do incumprimento. Tal estimativa não colide com um eventual recurso ao procedimento nos termos do artigo 260.o TFUE, no caso de o Estado‑Membro não ter pago o montante principal ou os juros na sequência de um eventual acórdão que o tenha condenado por violação das obrigações resultantes do regime dos recursos próprios. Em todo o caso, a questão de saber se o Estado‑Membro agiu de forma razoável, ao «reavaliar» as importações subavaliadas, não se coloca no caso em apreço. Com efeito, a jurisprudência invocada pelo Reino Unido para fundar a sua tese relativa à «reavaliação» das mercadorias respeita às obrigações do Estado‑Membro, quando este procede, em caso de dúvida surgida no âmbito de controlos aduaneiros, a uma determinação do valor aduaneiro das mercadorias importadas (261). Ora, como foi já salientado, a Comissão visa, no âmbito deste segundo fundamento, não determinar o valor aduaneiro das mercadorias específicas, mas estimar as perdas de recursos próprios tradicionais com base em dados estatísticos.

260. Por outro lado, nos seus pedidos de informação de 22 de junho de 2018 e 22 de março de 2019, o Reino Unido pediu à Comissão que lhe fornecesse informações sobre o cálculo das perdas de recursos próprios reclamadas no montante de 2 679 637 088,86 EUR, a fim de poder recalcular esse montante. A este respeito, constato que, na réplica, a Comissão explicou que a metodologia seguida e os dados utilizados para calcular esse montante tinham sido sempre do conhecimento do Reino Unido, uma vez que, nomeadamente, se tratava de informações provenientes deste próprio Estado através da base de dados Surveillance 2.

2)      Quanto à alegada obrigação de demonstrar o dano e o nexo de causalidade, bem como o cenário contrafactual

261. O Reino Unido sustenta que incumbe à Comissão basear o seu pedido nos padrões aplicáveis a um processo relativo a responsabilidade, uma vez que pede que o Tribunal de Justiça condene esse Estado no pagamento de uma indemnização. Ora, no caso em apreço, a Comissão não consegue provar, por um lado, a existência de um prejuízo concreto e quantificável, e, por outro, a presença de um nexo de causalidade direto entre o incumprimento cometido pelo Reino Unido e esse dano.

262. A este respeito, antes de mais, importa recordar que o processo no Tribunal de Justiça, em conformidade com o artigo 258.o TFUE, é uma ação por incumprimento e não uma ação de indemnização. Logo, no âmbito da ação por incumprimento, incumbe à Comissão demonstrar que o Reino Unido não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do direito da União (262). Uma vez que a presente ação não se destina a obter do Tribunal de Justiça a condenação do Estado demandado no pagamento de uma indemnização, o mesmo Tribunal não deve analisar os elementos avançados pelo Reino Unido no que respeita à existência do dano e do nexo de causalidade entre o incumprimento em matéria aduaneira e o alegado dano. De qualquer modo, este argumento do Reino Unido deve ser rejeitado tendo em conta a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça de onde resulta que a ação por incumprimento reveste caráter objetivo (263). Com efeito, o desrespeito de uma obrigação imposta por uma regra de direito comunitário é, em si mesmo, constitutivo de incumprimento, pelo que é irrelevante a consideração de que esse desrespeito não produziu consequências negativas (264). Assim, considero que a presente ação não se destina, devido às características da ação por incumprimento, a obter do Tribunal de Justiça a condenação do Estado‑Membro demandado no pagamento de uma indemnização.

263. Todavia, há que salientar que, na sua petição, a Comissão não pediu, em todo o caso, a indemnização de um dano. Com efeito, a posição do Reino Unido segundo a qual incumbe à Comissão demonstrar a existência de um «dano», cuja quantificação só é possível depois de ter previamente estabelecido a existência de um nexo de causalidade resultante do comportamento faltoso do Estado‑Membro, baseia‑se, em meu entender, numa leitura errada da petição e de outros articulados do processo em causa. Mais especificamente, resulta do terceiro parágrafo do primeiro pedido que a Comissão acusa o Reino Unido de não ter colocado à disposição do orçamento da União os montantes corretos de recursos próprios tradicionais, o que conduziu à violação das disposições relativas a esses recursos. Como foi já exposto, incumbe aos Estados‑Membros, por força dos artigos 9.o e 10.o do Regulamento n.o 1150/2000, aos quais correspondem, respetivamente, os artigos 9.o e 10.o do Regulamento n.o 609/2014, conjugados com os artigos 2.o e 8.o das Decisões 2007/436 e 2014/335, apurar o direito da União sobre os recursos próprios tradicionais desde que estejam preenchidas as condições previstas pela regulamentação aduaneira no que respeita ao registo de liquidação do montante do direito e à sua notificação ao devedor.

264. Por conseguinte, resulta inequivocamente da petição e, nomeadamente, das disposições da União aí referidas, que a Comissão acusa o Reino Unido de não ter colocado à disposição da União os montantes corretamente calculados dos recursos próprios tradicionais e não o prejuízo causado a esta última. O incumprimento descrito no petitum da petição (e, nomeadamente, a passagem «ao não ter em conta os montantes corretos dos direitos aduaneiros e ao não colocar à disposição o montante correto dos recursos próprios tradicionais») constitui, portanto, por natureza, um pedido destinado a obter a declaração de um incumprimento da obrigação de agir que incumbe ao Estado, ou seja, a sua omissão de cumprir as suas obrigações decorrentes do direito da União, e não um dano causado por esse Estado.

265. No que respeita, em seguida, ao argumento do Reino Unido relativo à necessidade de demonstrar um nexo de causalidade entre o incumprimento específico do Estado‑Membro e as perdas dos recursos próprios, o Tribunal de Justiça já sublinhou que existe um «nexo direto» entre a cobrança das receitas provenientes dos direitos aduaneiros e a colocação à disposição do orçamento da União dos recursos correspondentes (265). Ora, considero que resulta desta jurisprudência que se, devido a um erro cometido pelas autoridades aduaneiras de um Estado‑Membro, os direitos aduaneiros não são cobrados, isso não põe em causa a obrigação de o Estado‑Membro disponibilizar os montantes que deveriam ter sido apurados e pagar juros de mora. Embora exista uma correlação sine qua non entre, por um lado, o incumprimento de um Estado‑Membro no domínio da regulamentação aduaneira e, por outro, o montante dos recursos próprios que não foi colocado à disposição do orçamento da União, tendo o primeiro inevitavelmente um efeito sobre o segundo, isso não significa que esses dois elementos devam ser analisados em termos de dano causado pelo comportamento ilícito do Estado‑Membro. Um Estado‑Membro que não proceda ao apuramento do direito da União relativamente aos recursos próprios e que não coloque o montante correspondente à disposição da Comissão, sem que se verifique uma das condições previstas no artigo 17.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1150/2000 ou no artigo 13.o, n.o 2, do Regulamento n.o 609/2014 não cumpre as suas obrigações decorrentes do direito da União, designadamente as decorrentes dos artigos 2.o e 8.o das Decisões 2000/597 e 2007/436 (266). Esta conclusão é corroborada pela jurisprudência invocada pelo Reino Unido na sua contestação, de onde decorre que o comportamento errado das autoridades aduaneiras relativamente ao cálculo dos direitos aduaneiros devidos acarreta inevitavelmente perdas de recursos próprios tradicionais da responsabilidade dos Estados‑Membros (267). Neste contexto, o artigo 340.o TFUE e a jurisprudência a ele relativa invocados pelo Reino Unido são irrelevantes.

266. Além disso, parece‑me que não se pode retirar uma conclusão diferente do processo que deu origem ao Acórdão Comissão/Reino Unido (268), invocado pelo Reino Unido e pelos intervenientes, uma vez que este processo dizia respeito a uma situação diferente da que está na origem do presente processo. Nesse processo estava efetivamente em causa demonstrar a responsabilidade do Reino Unido em razão de uma eventual emissão de certificados EXP pelas autoridades de Anguila, um país e território ultramarino (PTU), em violação da decisão dita «PTU». A Comissão alegava, nomeadamente, que o Reino Unido devia, enquanto Estado‑Membro, assumir a responsabilidade pelos atos adotados e pela negligência em que incorreram as autoridades de Anguila, contrárias a esta decisão, tendo em conta as relações especiais que mantém com o seu PTU, o qual não é um Estado independente. O Reino Unido considerava que nenhum ato de direito da União permitia considerar Anguila responsável, perante a União, pelos erros cometidos pelas suas próprias autoridades na aplicação da referida decisão, e da perda de recursos próprios daí resultante, de modo que o Reino Unido também não podia ser considerado responsável por tais erros, pelo simples facto de ser o Estado‑Membro ao qual Anguila se encontra ligada (269). Assim, o problema central no referido processo respeitava à responsabilidade de um Estado‑Membro da União face ao comportamento das autoridades de um PTU com o qual mantinha relações especiais, comportamento que violava o direito da União, o que acarretou a perda dos recursos próprios. Consequentemente, na medida em que o presente processo diz respeito à responsabilidade própria do Reino Unido e não à de outra entidade, as conclusões do referido acórdão não podem ser transpostas para o presente processo, contrariamente ao que sustenta este Estado.

267. Por último, o Reino Unido invoca, sob a forma de uma exceção de inadmissibilidade, o argumento segundo o qual a Comissão não tinha demonstrado que as medidas que esse Estado tinha escolhido para lutar contra a fraude por subavaliação tinham efetivamente acarretado perdas de recursos próprios tradicionais para o orçamento da União (270). Em sua opinião, a tese da Comissão segundo a qual a fraude por subavaliação continuou devido à falta de análises de risco e de controlos eficazes prévios ao desalfandegamento implica, necessariamente, perante tais medidas, o desaparecimento das trocas comerciais e das perdas de recursos próprios tradicionais que lhe estão associados. Por outras palavras, se tivesse implementado as medidas de combate à fraude que a Comissão considera adequadas, a importação de mercadorias subdeclaradas teria sido eliminada, donde deduz que não teria sido devido ao orçamento da União nenhum direito aduaneiro suplementar significativo. O Reino Unido afirma que só deve ser responsabilizado pelas perdas para o orçamento da União correspondentes à diferença entre os recursos próprios tradicionais que teriam sido exigíveis no seu cenário contrafactual e os recursos próprios tradicionais que efetivamente disponibilizou.

268. A este propósito, resulta de jurisprudência constante que é irrelevante o facto de saber se, numa situação em que os recursos próprios tradicionais foram objeto de perdas por acontecimentos anteriores devidos a um erro administrativo das autoridades do Estado‑Membro, teria sido possível que esses acontecimentos se produzissem sem erro e, portanto, sem perdas de recursos próprios (271). Por uma questão de exaustividade, importa observar que, além dos controlos pontuais (272), o Reino Unido não realizou praticamente nenhum controlo durante o período de infração. Ao fazê‑lo, criou uma situação irreversível que teve por efeito uma perda considerável de recursos próprios tradicionais que, na minha opinião, deve ser constatada. Considero que, nesse contexto, não compete ao Tribunal de Justiça especular sobre o que teria ocorrido se o Reino Unido tivesse cumprido as suas obrigações nos termos do direito da União. Com efeito, uma análise contrafactual, como a preconizada pelo Reino Unido, não pode pôr em causa a realidade dessa perda nem o facto de esta poder ter sido evitada se tivessem sido efetuados controlos adequados pelas autoridades aduaneiras britânicas antes da introdução em livre prática das mercadorias em causa. Com efeito, tal argumento é desprovido de fundamento, uma vez que há que ter em conta a situação factual, tal como se apresentava devido às violações dos direitos da União, e não o volume de mercadorias subavaliadas que poderiam ter sido importadas se o Estado‑Membro tivesse, hipoteticamente, cumprido as obrigações que lhe incumbem por força do direito da União. Por conseguinte, considero que esse cenário contrafactual não pode ser acolhido em matéria de perda de recursos próprios.

b)      Quanto ao mérito

1)      Quanto à síntese da metodologia OLAF e à sua aplicação enquanto instrumento de cálculo das perdas de recursos próprios tradicionais

269. A Comissão considera que é necessário recorrer a uma avaliação baseada em todas as informações disponíveis, para determinar as perdas de recursos próprios tradicionais, dado que já não é possível determinar o valor correto das mercadorias subavaliadas aplicando um ou outro dos métodos previstos no Código Aduaneiro Comunitário e no Código Aduaneiro da União. Tendo em conta a falta de cooperação do Reino Unido, nenhum elemento de prova direta permite comprovar o valor aduaneiro das mercadorias em causa. A Comissão chegou, portanto, a uma estimativa das perdas de recursos próprios tradicionais com base na metodologia OLAF, fundada em dados estatísticos e na média corrigida dos preços das mercadorias em causa importadas para a União.

270. Mais especificamente, a utilização da metodologia OLAF, enquanto metodologia para determinar a dimensão das perdas de recursos próprios tradicionais, segue o esquema seguinte. Num primeiro momento, consideram‑se subavaliadas as importações que se situam abaixo do limiar do preço mínimo aceitável (lowest acceptable price), que, recorde‑se, é calculado como sendo igual a 50 % do preço médio corrigido à escala da União (cleaned average price). São incluídas como importações subavaliadas as importações de uma categoria de produtos dos capítulos 61 a 64 da Nomenclatura Combinada (para cada código de produtos da Nomenclatura Combinada com oito algarismos) (273) cujo valor agregado diário (média ponderada diária) é inferior ao preço mínimo aceitável do código de produtos em causa, com base em dados retirados da base de dados Surveillance 2 e utilizados na base de dados Comext (274). Numa segunda etapa, o alcance das perdas de recursos próprios para as quantidades consideradas subavaliadas é calculado em termos de direitos aduaneiros suplementares devidos com base na diferença entre o valor declarado e o preço médio corrigido.

271. Por conseguinte, na falta de qualquer informação direta sobre o volume e a natureza das importações subavaliadas no Reino Unido durante o período pertinente, a estimativa do volume das mercadorias subavaliadas na qual se baseia o recurso funda‑se, em princípio, no preço mínimo aceitável para os diferentes códigos produzidos (50 % do preço médio corrigido) (275), ao passo que a estimativa do valor das quantidades subavaliadas é calculada em função do preço médio corrigido. Embora a metodologia assim descrita se baseie nos dados pertinentes fornecidos à Comissão pelos Estados‑Membros, através das bases de dados acima referidas, os montantes calculados com base na metodologia OLAF constituem, por conseguinte, uma estimativa orçamental retrospetiva das perdas para a União e não a prova direta dos montantes correspondentes aos direitos apurados que este Estado estava obrigado a pôr à disposição do orçamento da União durante o período de infração (276), se os controlos adequados no momento dos desalfandegamentos tivessem sido corretamente realizados.

272. O Reino Unido, apoiado neste ponto pelos intervenientes, alega que a Comissão não pode utilizar a metodologia OLAF para calcular as perdas de recursos próprios tradicionais, sublinhando que esta é apenas um instrumento de análise de risco. Nesse contexto, o Reino Unido e os intervenientes afirmam que a Comissão utilizou a metodologia OLAF na sua petição para determinar o valor aduaneiro correto das mercadorias importadas subavaliadas.

273. Na minha opinião, esta argumentação não pode ser acolhida.

274. Antes de mais, por um lado, tendo em conta a natureza das importações e a omissão das autoridades aduaneiras britânicas de efetuarem os controlos aduaneiros em causa, é indubitável que, uma vez autorizada a introdução em livre prática no território aduaneiro da União pelas autoridades aduaneiras nacionais, deixa de ser objetivamente possível fazer reverter essas mercadorias para efeitos de controlos aduaneiros, mesmo que se verifique posteriormente que os controlos aduaneiros não foram efetuados ou o foram incorretamente. Esta conclusão também não parece ser contestada pelo Reino Unido (277). Por conseguinte, só posso partilhar da posição da Comissão segundo a qual nenhum elemento de prova direta permite atestar o volume ou o valor aduaneiro das mercadorias em causa. Por outro lado, embora seja verdade que a metodologia OLAF foi inicialmente concebida e aprovada pelos Estados‑Membros de forma consensual como instrumento de análise de risco para ajudar as autoridades aduaneiras nacionais a identificar as mercadorias potencialmente subdeclaradas, é igualmente verdade que permite, por um lado, determinar, com base nos dados estatísticos aduaneiros fornecidos pelos Estados‑Membros à Comissão, os volumes de importações declaradas num valor inferior ao limiar de risco e, por outro, ao utilizar o critério do preço médio corrigido para as mercadorias em causa à escala da União, elaborada mediante a aplicação da mesma metodologia, calcular o montante dos recursos próprios que o Estado‑Membro teria recebido e posto à disposição do orçamento da União se tivesse cumprido as suas obrigações nos termos da regulamentação relativa aos recursos próprios tradicionais. Assim, considero que não existe nenhuma contradição no facto de a metodologia OLAF, apesar de inicialmente concebida como instrumento de análise dos riscos aduaneiros, poder igualmente servir de base para calcular o alcance das perdas dos recursos tradicionais quando as importações foram introduzidas em livre prática no território aduaneiro da União sem que tenham sido efetuados controlos adequados à autorização de saída, o que reflete uma perda para o orçamento da União.

2)      Quanto à aplicação do Acórdão Comissão/Portugal

275. Segundo a Comissão, uma abordagem baseada em dados estatísticos e elaborada no âmbito do método para efeitos do cálculo das perdas de recursos próprios tradicionais é confirmada pelo Acórdão Comissão/Portugal (278).

276. Partilho da opinião da Comissão segundo a qual a estimativa das perdas de recursos próprios com base nos dados estatísticos não representa, em princípio, uma terra incognita para o Tribunal de Justiça. O processo que deu origem ao Acórdão Comissão/Portugal (279), invocado pela Comissão, era relativo ao tratamento da introdução em livre prática de bananas por algumas estâncias aduaneiras portuguesas. Na sua petição, a Comissão Europeia pedia ao Tribunal de Justiça que declarasse que, devido à aceitação sistemática, no decurso dos anos de 1998 a 2002, de declarações aduaneiras de introdução em livre prática de bananas frescas, pelas suas autoridades aduaneiras, sabendo ou devendo aquelas razoavelmente saber que o peso declarado das bananas não correspondia ao seu peso real, e devido à recusa das autoridades portuguesas de colocarem à disposição os recursos próprios correspondentes à perda de receitas e aos juros de mora devidos, a República Portuguesa não tinha cumprido as obrigações que lhe incumbiam por força do direito da União. O Tribunal de Justiça decidiu que, dado que os montantes efetivamente devidos a título dos direitos sobre os recursos próprios das Comunidades poderiam ter sido apurados corretamente logo na realização das operações de importação e subsequente desalfandegamento se as autoridades nacionais tivessem procedido às verificações necessárias, a República Portuguesa devia ser colocada, relativamente ao período controvertido, numa situação equivalente àquela em que se encontraria se tivesse apurado corretamente os direitos e os tivesse inscrito na contabilidade (280).

277. Há que sublinhar que o Tribunal de Justiça rejeitou inequivocamente o argumento de defesa da República Portuguesa segundo o qual estava excluído quantificar o montante dos recursos próprios que não tinham sido devidamente apurados durante os anos em causa, salientando que a impossibilidade de proceder a verificações na ausência das mercadorias em causa era a consequência inelutável da omissão das autoridades portuguesas. O Tribunal de Justiça decidiu que, devido a essa impossibilidade, não era inadequado, nesse processo, quantificar o montante dos recursos próprios que não tinham sido devidamente apurados durante os anos em causa, ou seja, 1998 a 2002, com base nos resultados dos controlos posteriores efetuados entre 1 de agosto e 31 de outubro de 2003 (281). Todavia, há que salientar que o Tribunal de Justiça não acolheu o pedido da Comissão destinado a determinar o montante dos recursos próprios resultante da prática do controlo aduaneiro ilegal, na medida em que o método estatístico proposto continha um quadro de referência incorreto para efetuar essa determinação (282).

278. Assim, a solução adotada pelo Tribunal de Justiça, no Acórdão Comissão/Portugal (283), confirma, por um lado, que não está excluído que a Comissão se possa basear, no que respeita aos incumprimentos do direito aduaneiro da União pelo Estado‑Membro onde as mercadorias importadas já foram introduzidas em livre prática no território aduaneiro da União, em determinados dados estatísticos que caracterizam o incumprimento imputado para, nomeadamente, determinar a posteriori a dimensão da perda dos recursos próprios para o orçamento da União que daí resulta. Por outro lado, não se pode deixar de observar que o processo que deu origem a esse acórdão dizia respeito a uma violação aduaneira bem definida, a saber, a aceitação da diferença entre o peso declarado das bananas e o peso real de uma caixa, em relação à qual, com base nos dados exatos recolhidos nos controlos posteriores relativos ao mesmo incumprimento, era relativamente fácil tirar conclusões estatísticas sobre a diferença de peso eventualmente declarada e real entre as mercadorias importadas durante o período da infração. Em contrapartida, a metodologia adotada, no caso em apreço, para calcular a dimensão dos recursos próprios tradicionais caracteriza‑se pela multiplicidade dos indicadores pertinentes, como o volume das importações subavaliadas fraudulentamente em relação a todas as importações realizadas durante o período da infração e o «justo valor» aduaneiro a atribuir a essas importações. Estes indicadores caracterizam, assim, o impacto da fraude por subavaliação das mercadorias no orçamento da União e, mais genericamente, a dimensão do incumprimento imputado ao Reino Unido, fornecendo ao mesmo tempo elementos relativos às perdas de recursos próprios tradicionais de forma mais indireta do que os dados estatísticos em causa no processo que deu origem ao Acórdão Comissão/Portugal (284).

3)      Quanto à admissão de princípio da abordagem proposta pela Comissão para avaliar as perdas de recursos próprios tradicionais

279. A metodologia OLAF proposta pela Comissão para determinar a extensão das perdas dos recursos próprios tradicionais para o orçamento da União parece, como resulta da análise precedente, ir além dos problemas jurídicos relativos à quantificação dos recursos próprios resolvidos até agora pelo Tribunal de Justiça. Assim, para determinar se e em que medida a abordagem metodológica proposta pela Comissão é conforme com os critérios relativos à ação por incumprimento nos termos do artigo 258.o TFUE, considero que há que ter em conta, por um lado, critérios relativos ao ónus da prova estabelecido pela jurisprudência do Tribunal de Justiça e, por outro, características essenciais desta abordagem metodológica.

280. O objetivo da ação por incumprimento prevista no artigo 258.o TFUE é, segundo a jurisprudência clássica, alcançar a eliminação efetiva dos incumprimentos dos Estados‑Membros e das suas consequências (285). Como foi já recordado no âmbito das presentes conclusões (286), segundo jurisprudência constante, o processo nos termos desta disposição assenta na constatação objetiva do incumprimento, por um Estado‑Membro, das obrigações que lhe são impostas pelo Tratado FUE ou por qualquer ato de direito derivado (287). A este propósito, importa lembrar que a não adoção de medidas em matéria de recursos próprios constitui também um incumprimento na aceção da referida disposição (288). Além disso, como já se recordou, incumbe à Comissão, que tem o ónus de demonstrar a existência do incumprimento alegado, fornecer ao Tribunal de Justiça, no âmbito de um processo por incumprimento nos termos do artigo 258.o TFUE, os elementos necessários à verificação por este da existência do referido incumprimento, sem poder basear‑se numa qualquer presunção (289). Só quando a Comissão tenha fornecido «elementos suficientes que revelem determinados factos» relativos ao incumprimento pelo Estado‑Membro demandado é que «incumbe a este último contestar de modo substancial e detalhado os dados assim apresentados e as consequências que daí decorrem» (290).

281. Resulta, em minha opinião, do exposto que, no âmbito de um processo por incumprimento em que a Comissão acusa um Estado‑Membro, nomeadamente, de uma violação das regras do direito da União relativas à cobrança dos recursos próprios tradicionais e da sua obrigação de colocar à disposição do orçamento da União certos montantes, a Comissão deve apresentar ao Tribunal de Justiça os elementos que são necessários a este último para verificar a existência da acusação que é feita ao Reino Unido de não ter cumprido a sua obrigação de colocar à disposição da União um determinado montante de recursos próprios desta, sem que possa basear‑se em hipóteses especulativas. Isto significa igualmente que, para determinar o alcance das perdas desses recursos, o Tribunal de Justiça não é obrigado a fazer uma escolha entre as diferentes abordagens metodológicas propostas pelas partes, como o Reino Unido parece sugerir na sua contestação, mas apenas a apreciar a metodologia OLAF proposta pela Comissão em apoio da sua ação.

282. Assim sendo, tendo em conta a natureza da violação do direito aduaneiro da União imputada ao Reino Unido, que é objeto do primeiro fundamento do presente processo por incumprimento, o Tribunal de Justiça não pode ignorar o quadro factual do processo, conforme exposto no âmbito do exame deste fundamento (291), do qual resulta que, apesar de estar plenamente ciente da existência e da natureza da fraude à subavaliação massiva de produtos têxteis e de calçado proveniente da China nas fronteiras aduaneiras da União, o Reino Unido não tomou medidas eficazes para combater essa fraude durante o período de infração, nomeadamente ao não proceder a análises de risco, ao não realizar controlos aduaneiros físicos e ao não constituir garantias junto dos importadores. Ao fazê‑lo, o Reino Unido não recolheu amostras para determinar o valor aduaneiro correto das importações suspeitas de serem subavaliadas em conformidade com o Código Aduaneiro Comunitário e com o Código Aduaneiro da União. Assim, a determinação da proporção das mercadorias afetadas pela fraude por subavaliação durante o período de infração, bem como a determinação do seu valor aduaneiro «correto», fica, em substância, comprometida pelo incumprimento acima descrito.

283. É, portanto, com razão que a Comissão, nos seus articulados, sublinha que a não aplicação da sequência dos procedimentos aduaneiros, como a prevista pelo Código Aduaneiro Comunitário e pelo Código Aduaneiro da União, constitui o fator determinante, que dita a dimensão das perdas dos recursos próprios tradicionais para o orçamento da União, com base numa análise estatística ex post dos dados que a caracterizam indiretamente. Por isso, é, portanto, impossível restabelecer uma situação compatível com o direito aduaneiro da União no que respeita às importações fraudulentas específicas, de modo que nem as autoridades competentes do Reino Unido nem as da Comissão dispõem, nomeadamente, da possibilidade de determinar o valor aduaneiro correto em aplicação das regras em matéria de avaliação previstas pela legislação aduaneira da União. Na medida em que esta situação resulta, de forma objetiva, do incumprimento pelo próprio Estado‑Membro das disposições aduaneiras, incumbe‑lhe, em caso de declaração desse incumprimento, assumir as perdas para o orçamento da União, conforme determinadas unicamente com base numa análise «indireta» dos dados e recorrendo à maior probabilidade que é necessariamente associada a essa determinação. Consequentemente, considero que não está excluído, em princípio, que a Comissão demonstre, no âmbito de um processo por incumprimento nos termos do artigo 258.o TFUE, a extensão de um incumprimento do direito da União relativo aos recursos próprios através de uma metodologia baseada em dados estatísticos, quando a impossibilidade de proceder a verificações é a consequência inevitável da omissão das autoridades aduaneiras do Estado‑Membro. Esta interpretação é também corroborada pela obrigação de os Estados‑Membros protegerem os interesses financeiros da União, que decorre, nomeadamente, do artigo 325.o TFUE.

284. Todavia, devido à natureza da metodologia OLAF baseada nos dados estatísticos, os problemas relativos ao valor da prova que lhe estão associados não podem ser subestimados (292). Com efeito, não se pode negligenciar o facto de, a fim de medir a dimensão das eventuais perdas orçamentais, diferentes soluções metodológicas poderem ser utilizadas, e produzirem resultados diferentes em termos de montantes. O presente processo ilustra particularmente bem esse problema, uma vez que a demandante e o demandado apresentaram, cada um, uma abordagem radicalmente diferente para quantificar as perdas dos recursos próprios tradicionais. A própria Comissão não nega a multiplicidade dos métodos possíveis para avaliar essas perdas, indicando, nas suas respostas às perguntas escritas colocadas pelo Tribunal de Justiça, que, em princípio, o resultado do incumprimento em causa pode igualmente basear‑se noutros métodos de avaliação das referidas perdas. Embora tenha sérias dúvidas quanto às alegadas vantagens da metodologia OLAF, a saber, a «robustez» que a Comissão destacou várias vezes nos seus articulados (293), ela constitui o critério pertinente para apreciar o valor probatório dos métodos estatísticos e há que reconhecer que a dimensão da perda do orçamento assim avaliada está largamente dependente do método específico escolhido.

285. Além disso, há que ter presente que, na medida em que a estimativa das perdas de recursos próprios tradicionais é calculada com base em informações que figuram nas bases de dados Surveillance 2 (dados relativos às importações de produtos abrangidos pelos capítulos 61 a 64 da Nomenclatura Combinada provenientes da China) e Comext (cálculo dos preços médios corrigidos), que são por natureza elementos factuais, o montante definitivo é igualmente tributário das escolhas metodológicas, como os critérios relativos à determinação do volume das mercadorias subavaliadas e à definição do valor de referência para «reavaliar» essas mercadorias. Estas escolhas metodológicas são, por natureza, critérios bastante normativos, na medida em que dependem das escolhas efetuadas pela instituição que desenvolveu o método em questão. Por isso, não posso deixar de partilhar do argumento do Reino Unido segundo o qual o relatório técnico no qual assenta o cálculo OLAF só se justifica no contexto de um «preço equitativo» (fair price) predeterminado ao nível da União‑28 (294). O problema relativo à variação dos critérios de avaliação e ao seu impacto no resultado do montante das perdas é destacado, nomeadamente, pela resposta escrita da Comissão às perguntas do Tribunal de Justiça, da qual decorre que o resultado do cálculo definitivo varia, nomeadamente, em função do preço mínimo aceitável (entre 10 % e 50 % do nível dos preços médios) (295) e que a Comissão «considerou esta abordagem». Embora a Comissão entenda que, devido ao incumprimento imputado às autoridades britânicas, as perdas de recursos próprios tradicionais para o orçamento da União ascenderiam, no total, a 2 092 703 277,93 euros, na hipótese de o preço mínimo aceitável ser fixado ao nível de 10 % do preço médio corrigido, não é menos verdade que esse montante corresponde a 78,1 % do pedido pela Comissão no âmbito do presente processo, com base no preço mínimo aceitável fixado ao nível de 50 % do preço médio corrigido, o que, na minha opinião, não é negligenciável. Há, portanto, que reconhecer que a utilização de uma metodologia baseada em dados estatísticos é acompanhada da possibilidade de estabelecer pontos de referência diferentes, mas igualmente válidos, que fazem depender o resultado obtido dessa metodologia.

286. Tendo em conta o que precede, considero, no âmbito de um processo por incumprimento nos termos do artigo 258.o TFUE, que não se pode excluir que, para efeitos da estimativa das perdas de recursos próprios tradicionais para o orçamento da União devidas ao incumprimento das obrigações aduaneiras pelo Estado‑Membro em causa, na falta de provas diretas causadas pela omissão desse Estado‑Membro, a ação da Comissão se baseie numa metodologia baseada em dados estatísticos. Todavia, para não se afastar dos objetivos e da finalidade do processo por incumprimento, a aplicação dessa metodologia, para estimar as perdas de recursos próprios tradicionais, só pode ser aceite na medida em que a escolha de um método específico se justifique à luz das particularidades do caso em apreço, não sendo as referências de base arbitrárias nem distorcidas, e o recurso a esta metodologia constitua uma análise quantitativa coerente baseada em todos os dados pertinentes disponíveis. Além disso, quanto mais limitados forem os elementos de prova diretos que corroboram os dados de base relativos à metodologia em causa, mais prudente deve ser a seleção de critérios normativos utilizados por essa metodologia. Este aspeto é tanto mais importante quanto a estimativa das perdas de recursos próprios tradicionais no âmbito de um processo por incumprimento, nos termos do artigo 258.o TFUE, se destina a colocar o Estado‑Membro, relativamente ao período controvertido, numa situação equivalente àquela em que se encontraria se tivesse apurado corretamente os direitos e os tivesse inscrito na contabilidade (296). Por fim, a fiabilidade da metodologia escolhida para determinar as perdas de recursos próprios tradicionais devido ao incumprimento imputado é reforçada se a escolha metodológica adotada for acompanhada por precisões relativas aos eventuais métodos alternativos, aos resultados obtidos devido à sua utilização e aos motivos pelos quais a Comissão optou pela metodologia em causa.

4)      Quanto à utilização da metodologia baseada em dados estatísticos no caso em apreço

287. Antes de mais, há que salientar que resulta dos articulados das partes e dos autos no seu conjunto que, devido à natureza da violação das disposições do direito aduaneiro, foram reunidas poucas provas diretas para apreciar a dimensão das perdas de recursos próprios tradicionais no que respeita às importações realizadas no Reino Unido durante o período da infração. Mais especificamente, estas limitam‑se, no essencial, a doze artigos analisados em laboratório pelas autoridades aduaneiras britânicas em 2017 (297) e a resultados de controlo provenientes das alfândegas chinesas (298). Ora, tais provas não são representativas para se apreciar o valor aduaneiro correto das importações em causa e a dimensão das perdas dos recursos próprios tradicionais sofridos pelo orçamento da União devido à subavaliação fraudulenta das mesmas importações (299). Como foi já exposto por várias vezes no âmbito das presentes conclusões, a impossibilidade de quantificar as perdas resulta, no caso em apreço, de elementos objetivos, ou seja, a inação do Reino Unido face ao risco conhecido de declarações subavaliadas. Por conseguinte, partilho da tese da Comissão segundo a qual, na medida em que as mercadorias subavaliadas já foram colocadas em livre prática no território aduaneiro da União, o seu valor real já não pode ser determinado, pelo que o montante das perdas dos recursos próprios tradicionais para o orçamento da União só pode ser calculado através de uma estimativa retrospetiva stricto sensu. Parece‑me que este ponto de partida não é, na realidade, contestado pelo Reino Unido, uma vez que apresenta, para o caso de o incumprimento que lhe é imputado no âmbito do primeiro fundamento ser acolhido, o seu próprio método estatístico para determinar as eventuais perdas de recursos próprios tradicionais.

288. Neste contexto, há que observar que, com base nos dados à sua disposição, as partes concordam quanto ao facto de que existia uma fraude aduaneira no território do Reino Unido durante o período da infração, devido a uma subavaliação de mercadorias importadas provenientes da China, e quanto ao facto de o aumento do volume das importações subavaliadas ter aumentado consideravelmente entre 2012 e 2016 (300). Do mesmo modo, é pacífico, entre as partes, que a operação Swift  Arrow (301) teve por efeito, se se compararem os dados do primeiro semestre de 2017 e do primeiro semestre de 2018, uma diminuição considerável do volume de produtos em causa importados para o Reino Unido cujo valor aduaneiro estava fraudulentamente subavaliado, enquanto o volume das importações legítimas se manteve num nível comparável. Ainda que as partes discordem quanto à interpretação que há que dar a esses factos, aceitam‑no enquanto tal. As partes também não se opõem no que respeita à relevância da utilização, em princípio, de uma metodologia baseada em dados estatísticos a fim de apreciar as perdas de recursos próprios tradicionais devido a uma fraude aduaneira, que implica, num primeiro momento, a determinação do volume das importações fraudulentamente subavaliadas durante o período de infração, e depois a determinação do valor aduaneiro «correto» dessas mercadorias. Numa segunda fase, o montante dos direitos aduaneiros suplementar é calculado com base na diferença entre o valor declarado e esse valor «correto».

289. Em contrapartida, as partes estão em profundo desacordo quanto aos elementos de base das metodologias utilizadas para calcular as perdas de recursos próprios tradicionais. Em primeiro lugar, no que respeita à determinação do volume de mercadorias subavaliadas, segundo a Comissão, há que ter em conta o volume das importações situadas abaixo do preço mínimo aceitável, estabelecido com base num valor médio ao nível da União‑28 e nos dados agregados diários que constam da base Surveillance 2, enquanto, segundo o Reino Unido, para determinar esse volume, há que recorrer a um «limiar de conformidade», estabelecido em função dos valores de importação declarados apenas no Reino Unido, abaixo do qual as importações dos produtos em causa podem estar subavaliadas (302). Em segundo lugar, quanto ao valor de referência para «reavaliar» as mercadorias subavaliadas, a Comissão considera que há que recorrer à diferença entre o valor declarado e o preço médio corrigido para a União‑28, enquanto o Reino Unido entende que os artigos que se situam abaixo do «limiar de conformidade» podem ser «reavaliados» calculando‑se a diferença entre o valor declarado (por artigo) e o valor desse mesmo limiar. A diferença nas abordagens metodológicas tem por efeito uma enorme disparidade quanto ao resultado da estimativa das perdas de recursos próprios tradicionais. Com base na metodologia OLAF, a Comissão considera que o montante de 2 679 637 088,86 euros (montante bruto, menos as despesas de cobrança) devia ter sido colocado à disposição da Comissão como recursos próprios tradicionais. Ora, o Reino Unido entende que esse montante, num primeiro momento, era de 217 646 623 GBP (303), antes da dedução a título dos avisos de pagamento C18 Breach (304). Num segundo momento, revê esse número em baixa, para 143 115 553 GBP, das quais devem ser deduzidas 44 296 285 GBP a título dos avisos de pagamento C18 Breach. Em resumo, uma das diferenças mais importantes entre os métodos avançados pelas partes reside no facto de que, enquanto a abordagem da Comissão assenta em preços médios ao nível da União no seu conjunto, o método britânico assenta apenas na utilização dos dados do Reino Unido.

290. Dito isto, há que examinar sucessivamente as duas etapas da metodologia em que a Comissão se baseou para avaliar a perda dos recursos tradicionais, a saber, a da determinação do volume das importações subavaliadas e a do valor de referência para «reavaliar» essas importações.

i)      Quanto à determinação do volume das importações subavaliadas

291. O Reino Unido alega, por um lado, que não existe qualquer justificação convincente para utilizar o preço mínimo aceitável deduzido dos preços médios da União‑28 para determinar o volume de mercadorias subavaliadas durante o período da infração. Por outro lado, este Estado sustenta que resulta da petição e dos articulados da Comissão emitidos na fase pré‑contenciosa que as perdas dos recursos próprios tradicionais verificadas no período compreendido entre novembro de 2011 e novembro de 2014 se limitam aos direitos aduaneiros suplementares que eram reclamados pelas autoridades britânicas nos avisos de pagamento C18 Snake, e que foram anulados.

292. Tendo em conta os argumentos de defesa acima referidos apresentados pelo Reino Unido, é necessário, para estudar a problemática da determinação do volume das importações subavaliadas durante o período de infração, examiná‑la em duas fases, tomando posição, primeiro, sobre o período compreendido entre novembro de 2011 e novembro de 2014, e depois sobre as estimativas efetuadas pela Comissão para o período compreendido entre 1 de janeiro de 2015 e 11 de outubro de 2017.

–       Quanto ao período compreendido entre novembro de 2011 e novembro de 2014

293. No que respeita ao objeto do pedido para o período compreendido entre novembro de 2011 e novembro de 2014, a Comissão precisou, em especial, em resposta às perguntas colocadas pelo Tribunal de Justiça, que acusa o Reino Unido de não ter cumprido as suas obrigações relativas ao regime de recursos próprios tradicionais e que reclama a esse título montantes relativos às importações subavaliadas calculadas com base na metodologia OLAF.

294. A este propósito, resulta do artigo 120.o do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, e da jurisprudência a ele relativa, que a petição inicial deve indicar o objeto do litígio e conter a exposição sumária dos fundamentos em que se baseia, e que essa indicação deve ser suficientemente clara e precisa para permitir ao demandado preparar a sua defesa e ao Tribunal de Justiça exercer a sua fiscalização. Daqui resulta que os elementos essenciais de facto e de direito em que se funda uma ação devem decorrer, de forma coerente e compreensível, do texto da própria petição, e que os pedidos desta última devem ser formulados de forma inequívoca, a fim de evitar que o Tribunal de Justiça decida ultra petita ou não conheça de uma acusação (305). Em particular, a ação da Comissão deve conter uma exposição coerente e pormenorizada das razões que a conduziram à convicção de que o Estado‑Membro em causa não cumpriu uma das obrigações que lhe incumbem por força dos Tratados. Por conseguinte, uma contradição na exposição do fundamento invocado pela Comissão em apoio da sua ação por incumprimento não preenche os requisitos estabelecidos (306).

295. No caso em apreço, observo que, no que respeita à avaliação das perdas de recursos próprios tradicionais apresentadas na petição, a Comissão indicou expressamente que o período compreendido entre novembro de 2011 e novembro de 2014 estava «coberto devido às dívidas que o próprio Reino Unido declarou e posteriormente anulou». Além disso, na parte da petição relativa à descrição do incumprimento, a Comissão dedicou‑se longamente à sua caracterização com base no erro administrativo cometido aquando da anulação dos avisos de pagamento C18 Snake (307). Em sua opinião, com este erro administrativo, pelo qual são financeiramente responsáveis as autoridades britânicas, o Reino Unido causou perdas dos recursos próprios tradicionais ao orçamento da União. Parece‑me que, ao fazê‑lo, a petição consegue demonstrar um nexo entre o erro administrativo imputável ao Reino Unido, por um lado, e as perdas de recursos próprios tradicionais que este Estado está obrigado a pôr à disposição da Comissão, por outro. Na réplica, a Comissão acrescentou que a «presente ação por incumprimento diz respeito às dívidas aduaneiras constatadas pelo Reino Unido no âmbito da [operação] Snake».

296. Parece‑me, portanto, que, com estas indicações, no que respeita a este período, a própria Comissão limitou o objeto do segundo fundamento às perdas de recursos próprios tradicionais de que o Reino Unido seria responsável em razão das dívidas que este próprio Estado apurou no âmbito da operação Snake, o que inclui, nomeadamente, os 23 avisos de pagamento C18 Snake, que foram enviados aos operadores e posteriormente anulados. Tal leitura é, na minha opinião, corroborada pelas acusações formuladas pela Comissão na notificação para cumprir e no parecer fundamentado. Assim, resulta da notificação para cumprir que, «com base nas 24 dívidas apuradas e posteriormente anuladas, são devidos os montantes a título dos recursos próprios para o período em causa (novembro de 2011‑2014)» (308). Importa também salientar que o parecer fundamentado contém, num primeiro momento, a mesma formulação que consta da petição, e precisa, num segundo momento, de modo inequívoco, que «na medida em que este argumento do Reino Unido visa limitar o alcance temporal da infração, há que observar que a reclamação da Comissão relativa ao período entre 2011 e o fim da [operação] Snake em 2014 incide sobre os montantes em causa nas ordens de cobrança a posteriori que as alfândegas britânicas emitiram após essa operação, antes de as anular» (309).

297. Resulta das considerações precedentes que, no que respeita ao período compreendido entre novembro de 2011 e novembro de 2014, o objeto do segundo fundamento limita‑se à verificação das perdas de recursos próprios tradicionais pelas quais o Reino Unido é responsável em razão das dívidas aduaneiras suplementares verificadas no âmbito da operação Snake e, nomeadamente, dos 23 avisos de pagamento C18 Snake anulados na sequência de erros administrativos imputáveis a este Estado‑Membro (310).

–       Quanto ao período entre 1 de janeiro de 2015 e 11 de outubro de 2017

298. No que respeita ao período compreendido entre 1 de janeiro de 2015 e 11 de outubro de 2017, para determinar os montantes das perdas de recursos próprios tradicionais e, nomeadamente, os volumes das importações subavaliadas, a Comissão utiliza, na sua petição, a metodologia OLAF. A abordagem da Comissão é que o volume das importações declaradas a um valor inferior a um limiar de risco de 50 % do preço médio corrigido serve de base à determinação do montante dessas perdas, que corresponde, assim, ao montante dos recursos próprios tradicionais que o Reino Unido teria recebido e colocado à disposição da União se tivesse cumprido as suas obrigações. Segundo o Reino Unido, esta escolha feita pela Comissão é arbitrária. Contesta, assim, a abordagem segundo a qual qualquer declaração de mercadorias abaixo desse limiar constitui, de forma automática, uma declaração subavaliada, e considera que tal circunstância é simplesmente suscetível de justificar a existência de dúvidas que podem conduzir a controlos suplementares.

299. A este respeito, há que observar que a Comissão partilha, em princípio, da abordagem segundo a qual qualquer mercadoria importada cujo valor declarado seja inferior ao preço médio dos produtos da mesma categoria não pode, em princípio, ser considerada por definição subavaliada, alegando que a metodologia OLAF não foi aplicada a todas as mercadorias importadas no Reino Unido e declaradas num valor inferior ao limiar de 50 % do preço corrigido médio, mas que utiliza agregados quotidianos. Este recurso aos agregados quotidianos tem como efeito que se determinados lotes de mercadorias têm um valor inferior ao limiar de 50 % do preço corrigido médio, e outros lotes permitem ter uma média acima do preço mínimo aceitável diário à escala da União‑28, a média do agregado diário será superior ao preço mínimo aceitável, de modo que o agregado diário que contém estes lotes subavaliados não será incluído nas perdas de recursos calculadas (311). Esta instituição afirma que, embora a utilização de dados diários agregados possa conduzir à inclusão de certas importações legítimas no volume de importações declaradas abaixo do preço mínimo aceitável, a metodologia OLAF exclui, nomeadamente, uma certa proporção de mercadorias subavaliadas. Parece‑me que, nas suas respostas escritas às questões do Tribunal de Justiça, o Reino Unido renuncia à sua posição anterior e está, na realidade, de acordo com este argumento da Comissão, uma vez que indica que a única razão pela qual a soma calculada pela Comissão a título dos recursos próprios tradicionais é muito superior à calculada segundo o método do Reino Unido é que a metodologia OLAF utiliza preços de «reavaliação» muito mais elevados (312).

300. Em conclusão, no que respeita à diferença de abordagem das partes no atinente ao volume das mercadorias subavaliadas importadas durante o período da infração, tomadas em consideração para o cálculo das perdas dos recursos próprios tradicionais, pode explicar‑se, claramente, pelos diferentes limiares escolhidos por essas partes. Com efeito, enquanto a metodologia OLAF se baseia no preço mínimo aceitável que constitui 50 % do preço médio corrigido para a União‑28, o Reino Unido preconiza um cálculo baseado em declarações de importação individuais recolhidas pelas autoridades aduaneiras britânicas para definir o limiar de subavaliação (313). Tendo em conta as diferenças entre estes critérios e o facto de que quer a metodologia OLAF quer a proposta pelo Reino Unido visam ambas avaliar as mesmas perdas, mas a um nível diferente, ou seja, respetivamente, do ponto de vista da União no seu todo, e do ponto de vista do Estado em causa, sou de opinião que a metodologia apresentada por este último poderia constituir uma referência de comparação pertinente para apreciar de modo crítico os volumes de importações subavaliados durante o período de infração calculados com base na metodologia OLAF. Ao responder às perguntas do Tribunal de Justiça sobre a questão de saber qual seria o eventual impacto, sobre o montante da perda dos recursos próprios, se o limiar de subavaliação britânico fosse utilizado, em vez do preço mínimo aceitável como valor de referência das importações subavaliadas pela Comissão, o Reino Unido observou que, embora não pudesse reproduzir exatamente os cálculos desta instituição, a percentagem de redução das perdas dos recursos próprios tradicionais estimada seria de 4,4 ou de 4,7 %. Por conseguinte, como o Reino Unido indicou com razão, considero que a enorme diferença entre a estimativa das perdas dos recursos próprios tradicionais avançada pela Comissão e a preconizada pelo Reino Unido no âmbito do presente processo se explica principalmente pelo valor de referência para a «reavaliação» das mercadorias subdeclaradas, mais do que pelo volume (314).

301. Resulta do exposto que o método da Comissão não sobrestima de forma manifesta o volume das mercadorias subavaliadas durante o período da infração. Tendo em conta a duração do referido período, bem como a natureza da fraude em questão, parece‑me que as posições das partes relativas a este elemento não divergem significativamente na medida em que a diferença de menos de 5 % entre as estimativas feitas, respetivamente pela Comissão e pelo Reino Unido, permanece dentro de limites razoáveis. Por conseguinte, há que acolher as estimativas dos volumes das importações subavaliadas, enquanto base para determinar os montantes de perdas dos recursos próprios tradicionais, como apresentados pela Comissão na sua petição.

ii)    Quanto ao valor de referência para determinar os montantes das perdas dos recursos próprios

302. Como já foi salientado no âmbito das presentes conclusões, as posições das partes divergem principalmente quanto à questão de saber a que nível de preços deve ser efetuada a «reavaliação» das mercadorias consideradas subavaliadas para calcular os direitos aduaneiros suplementares e para determinar a dimensão das perdas dos recursos próprios tradicionais para o orçamento da União. Segundo a Comissão, tal correção deve efetuar‑se ao nível dos preços médios corrigidos, na medida em que, por um lado, o preço dos têxteis e do calçado não varia de forma significativa ao longo do tempo e, por outro, na falta de controlos físicos e de amostras recolhidas pelas autoridades aduaneiras britânicas a um nível estatisticamente representativo, há que admitir que os preços e a qualidade das mercadorias subavaliadas correspondem à repartição dos preços não abrangidos pela subavaliação. O Reino Unido considera, em contrapartida, que esta escolha metodológica não é justificada, uma vez que nenhuma prova permite sustentar a hipótese de as mercadorias subdeclaradas terem as mesmas características de preço e de qualidade que as outras mercadorias importadas da China. Pelo contrário, os elementos recolhidos parecem indicar que as importações subavaliadas visavam o segmento de gama baixa do mercado britânico.

303. A este respeito, como já salientei, o valor de referência, enquanto critério normativo, não pode ser arbitrário, e destina‑se a colocar o Estado‑Membro, para o período controvertido, numa situação equivalente àquela em que se encontraria se tivesse apurado corretamente os direitos e os tivesse lançado na sua contabilidade. Com efeito, considero que o valor de referência deve estar em conformidade com todas as circunstâncias factuais e jurídicas do incumprimento em causa, uma vez que se trata de um dos critérios de base na determinação da dimensão das perdas de recursos próprios tradicionais (315).

304. Antes de mais, resulta da análise da Comissão, que não é, aliás, contestada, em substância, pelo Reino Unido, que as importações subavaliadas de têxteis e de calçado proveniente da China foram, na sua maioria, em termos de volume, efetuadas sob o regime aduaneiro 42, isto é, destinavam‑se a outros Estados‑Membros do território aduaneiro da União. A título de exemplo, resulta do Relatório OLAF que, em 2016, 87 % das importações de produtos têxteis e de calçado de valor reduzido entradas pelo Reino Unido foram efetuadas sob o regime aduaneiro 42, ao passo que, durante o mesmo período, o regime aduaneiro 40 só foi utilizado para 13 % das importações de produtos têxteis e de calçado provenientes da China. Esta disparidade confirma, parece‑me, a deslocação para o Reino Unido de operações fraudulentas levadas a cabo com destino a outros Estados‑Membros (316). Na minha opinião, é também com razão que a Comissão sustenta que, no que respeita à cobrança dos direitos aduaneiros, não há que fazer a distinção entre as mercadorias abrangidas por estes dois regimes aduaneiros, na medida em que os restantes 13 % de importações declaradas sob o regime aduaneiro 40 poderiam ter sido encaminhados para outros Estados‑Membros uma vez efetuado o desalfandegamento no Reino Unido. Daqui resulta que a grande maioria das importações subavaliadas era direta ou indiretamente dirigida para o mercado dos produtos têxteis e do calçado da União no seu conjunto e não especificamente para o mercado britânico, pelo que não existe nenhuma razão razoável para os «reavaliar» com base num valor de referência diferente do que caracteriza o nível dos preços dos produtos em causa da União no seu conjunto.

305. Em seguida, resulta dos articulados que o Reino Unido critica a utilização do valor de referência baseado nos preços médios corrigidos, eles próprios baseados nos preços médios à escala da União, pelo facto de não ter em conta a qualidade das mercadorias em causa e o seu Estado‑Membro de entrada, tanto mais que a Comissão não fez prova do valor das mercadorias em causa. Por conseguinte, os dados específicos do Reino Unido devem ser preferidos ao referido preço médio corrigido da União. A este respeito, como já foi exposto no âmbito das presentes conclusões (317), é difícil criticar a Comissão por não ter produzido as provas diretas relativas ao valor das importações subavaliadas, na medida em que esta omissão é consequência da inação das autoridades aduaneiras britânicas. Considero que, na falta de provas diretas relativas ao valor das mercadorias em causa, pode ser admitida uma prova baseada em dados estatísticos, como os que estão em causa, no âmbito de uma ação por incumprimento, nos termos do artigo 258.o TFUE, para determinar as perdas de recursos próprios para o orçamento da União.

306. Além disso, quanto a estas críticas, importa recordar que a determinação da dimensão das perdas de recursos próprios no caso em apreço deve visar determinar qual deveria ter sido a contribuição do Estado‑Membro em causa para o orçamento da União na sequência da cobrança de direitos aduaneiros durante o período da infração, na falta das irregularidades descritas no âmbito do primeiro fundamento do presente recurso. As receitas provenientes dos direitos aduaneiros constituem, como foi já salientado (318), recursos próprios tradicionais da União, que devem ser postos à disposição da União pelos Estados‑Membros, por força das disposições conjugadas dos Regulamento n.os 1150/2000 e 609/2014 (319). A cobrança dos direitos aduaneiros de importação é precedida pela determinação do valor aduaneiro das mercadorias e pelo cálculo dos direitos aduaneiros correspondentes, constituindo estes dois elementos etapas prévias à introdução em livre prática das mercadorias importadas para o território aduaneiro da União e à sua introdução no consumo definitiva. Por conseguinte, no que respeita, nomeadamente, aos direitos aduaneiros, a estimativa das perdas para o orçamento da União resultante da inexistência de controlos aduaneiros não pode basear‑se no destino eventual das mercadorias em causa no mercado individual de um Estado‑Membro e, nomeadamente, nos segmentos inferiores ou superiores desse mercado em termos de qualidade de produtos, o que reveste, na falta de prova direta, um caráter especulativo, dado que o valor aduaneiro das mercadorias importadas na União é determinado pelas autoridades aduaneiras competentes. Logo, só posso partilhar do argumento do Reino Unido segundo o qual o valor aduaneiro das mercadorias corresponde ao seu custo de compra ao exportador, sendo esse valor determinado pela natureza e qualidade das mercadorias, e não pelo seu destino (320). De onde decorre que, para determinar o valor aduaneiro das mercadorias à entrada do território da União, a identificação do Estado‑Membro de destino é irrelevante, pelo que a Comissão, para determinar a dimensão das perdas de recursos próprios tradicionais devido a uma fraude aduaneira causada pela subavaliação das mercadorias, agiu corretamente ao não operar qualquer distinção em função do destino dos produtos em causa na União (321).

307. A título exaustivo, no que respeita à escolha do preço médio corrigido pela União‑28, enquanto valor de referência para avaliar a dimensão das perdas dos recursos próprios tradicionais para o orçamento da União, como já foi salientado nas presentes conclusões (322), por um lado, a União forma uma União Aduaneira única, pelo que a adoção da regulamentação em matéria aduaneira é da competência exclusiva da União. Por outro lado, a cobrança dos direitos aduaneiros, calculados sobre as importações provenientes de países terceiros, determina a dimensão do orçamento da União. Daqui deduzo que, num caso como o que está em causa, em que é devido à inação das autoridades nacionais que não existe prova direta que permita determinar a dimensão das perdas dos recursos próprios, há que confirmar a abordagem metodológica da Comissão baseada numa referência comum, sem ter em conta as especificidades de cada Estado‑Membro, como o nível de vida e o poder de compra da sua população, que são suscetíveis de ditar os preços de venda dos produtos em causa em cada um dos Estados‑Membros, considerados individualmente. Por estas razões, considero que há que apoiar a abordagem da Comissão que consiste em adotar, como valor de referência, os preços médios corrigidos à escala da União, eles próprios apoiados nos valores declarados pelos Estados‑Membros na base de dados comum Surveillance 2 (323). Este valor de referência constitui, portanto, o que devia ter sido aplicado para calcular os recursos próprios tradicionais postos à disposição do orçamento da União se se tivesse aplicado corretamente o direito aduaneiro da União. Na medida em que esta metodologia se baseia na média dos preços declarados, este valor reflete a natureza e a qualidade de todos os produtos importados durante o período da infração, sem atribuir qualquer preferência aos segmentos de mercado a que pertencem as mercadorias em causa. Uma vez que as partes não contestam a premissa de que os produtos têxteis e de calçado provenientes da China em causa são produtos cujos preços são bastante estáveis (324), há que considerar, na minha opinião, que os preços médios corrigidos na escala da União constituem um valor de referência adequado e não arbitrário para avaliar as perdas com recursos próprios para o orçamento da União (325).

5)      Resumo relativo à avaliação dos recursos próprios tradicionais

308. Tendo em conta as considerações expostas, entendo que os argumentos apresentados pela Comissão, na sua petição, não permitem ao Tribunal de Justiça pronunciar‑se com certeza sobre a extensão das perdas dos recursos próprios tradicionais objeto da presente ação.

309. Em primeiro lugar, no que respeita ao período compreendido entre novembro de 2011 e novembro de 2014, o objeto da petição está limitado, como exposto anteriormente nas presentes conclusões (326), às dívidas correspondentes aos avisos de pagamento C18 Snake. Assim, as perdas de recursos próprios tradicionais cujo apuramento pode ser pedido pela Comissão devem ser logicamente as que resultam da anulação desses avisos de pagamento, e não podem ser superior a estas. Todavia, na sua petição, a Comissão formulou um pedido correspondente às perdas de recursos próprios da União, para o período referido supra, na ordem dos 1 001 511 991,60 euros (327). A este propósito, como observa, em meu entender corretamente, o Reino Unido, este montante não reflete a argumentação da Comissão de onde decorre que, para o período referido, o seu pedido incide sobre os montantes visados pelos avisos de pagamento C18 Snake emitidos pelas alfândegas britânicas, que foram posteriormente anuladas. Importa salientar que, embora essas autoridades tenham fixado o valor aduaneiro das mercadorias identificadas como estando subavaliadas no âmbito da operação Snake ao aplicarem os preços médios corrigidos à escala da União, o que era um erro administrativo imputável ao Reino Unido (328), a estimativa das perdas de recursos próprios ligados aos avisos de pagamento C18 Snake não pode, em caso algum, ultrapassar 357 milhões de GBP (329). Além disso, segundo o Reino Unido, o montante que resulta dos avisos de pagamento C18 Snake notificados aos operadores ascende a 192 568 694,30 GBP (330). Esta contradição entre, por um lado, os montantes reclamados na petição e, por outro, os fundamentos da mesma, enquanto base do pedido de apuramento das perdas de recursos próprios no período de infração, só se explica, na minha opinião, pela seleção incorreta da base de referência efetuada pela Comissão, que consiste em incluir no seu cálculo, além dos montantes ligados à cobrança dos avisos de pagamento C18 Snake, todas as importações subavaliadas do referido período com base em dados estatísticos. No caso em apreço, uma vez que subsistem incertezas importantes quanto à exatidão do montante pedido pela Comissão para o período compreendido entre novembro de 2011 e novembro de 2014 a título das perdas de recursos próprios para o orçamento da União, considero que não demonstrou de forma juridicamente bastante a totalidade desse montante.

310. Em segundo lugar, resulta do exposto que a metodologia OLAF que a Comissão aplicou para estimar as perdas de recursos próprios tradicionais para o período compreendido entre 1 de janeiro de 2015 e 11 de outubro de 2017 reveste um caráter adequando e não arbitrário, pelo que pode ser utilizada para determinar o volume das mercadorias subavaliadas durante o período de infração e para determinar o valor de referência para efeitos da sua «reavaliação».

311. Embora o Tribunal de Justiça possa, em princípio, acolher o pedido da Comissão no sentido de quantificar o montante dos recursos próprios tradicionais no que respeita ao período compreendido entre 1 de janeiro de 2015 e 11 de outubro de 2017, coloca‑se, no entanto, a questão de saber se, no que respeita ao período compreendido entre 1 de maio de 2015 e 11 de outubro de 2017, correspondente aos direitos aduaneiros suplementares visados pelos avisos de pagamento C18 Breach emitidos, a partir de maio de 2018, no âmbito da operação Breach, os montantes visados por esses avisos de pagamento devem ser «contabilizados» na estimativa do montante cujo apuramento é pedido pela Comissão. A este respeito, o Reino Unido afirma que reclamou um total de 25 milhões de GBP de direitos aduaneiros junto de 27 operadores e lançou os montantes correspondentes (331) na contabilidade B (332). Mais especificamente, o Reino Unido sustenta que a Comissão, apesar de ter conhecimento de oito desses avisos de pagamento desde maio de 2018 (333), não deduziu os montantes correspondentes a esses avisos de pagamento da sua estimativa dos montantes das perdas de recursos próprios tradicionais. A decisão de proceder a esse lançamento não foi contestada no parecer fundamentado nem na petição, sendo que, para oito desses avisos de pagamento C18 Breach, os lançamentos na contabilidade B datam de maio de 2018, pelo que a Comissão deles tinha conhecimento durante o período pré‑contencioso. A Comissão, por seu turno, replica que o Reino Unido recusou, durante todo o período pré‑contencioso e contencioso, comunicar o detalhe dos seus cálculos (e, nomeadamente, indicar as declarações, os volumes e os valores de «reavaliação» utilizados), de modo que não estava em condições de separar essas importações do volume total de importações abrangidas pela abordagem baseada nos dados agregados diários da Surveillance 2.

312. A este propósito, nos termos da jurisprudência constante, só se pode intentar uma ação por incumprimento com base no artigo 258.o TFUE quando o Estado‑Membro em causa não procedeu em conformidade com o parecer fundamentado no prazo fixado neste último (334). A existência de um incumprimento deve, por conseguinte, ser apreciada em função da situação do Estado‑Membro tal como se apresentava no termo desse prazo (335). No caso em apreço resulta da contestação, sem que este elemento de facto seja contestado pela Comissão, que o Reino Unido emitiu, em maio de 2018, e, portanto, antes da data de termo do prazo fixado no parecer fundamentado de 24 de setembro de 2018, oito avisos de pagamento C18 Breach, relativos ao período que tinha início em 1 de maio de 2015. Assim, dado que a Comissão deles tinha conhecimento antes da comunicação do parecer fundamentado, deveria ter incluído os montantes a esse título no parecer emitido em 24 de setembro de 2018. Por conseguinte, com vista ao cálculo do montante definitivo devido relativamente ao período de 1 de maio a 11 de outubro de 2017, o Reino Unido só pode reclamar a dedução desses oito avisos de pagamento C 18 Breach. Para determinar se os montantes correspondentes aos referidos oito avisos de pagamento devem ser tidos em consideração, para efeitos do presente processo, como foi repetidamente salientado no âmbito das presentes conclusões, há que ter em conta o artigo 13.o, n.o 1, do Regulamento n.o 609/2014 e o artigo 17.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1150/2000, que impõem aos Estados‑Membros a disponibilização à Comissão de todos os montantes correspondentes aos direitos apurados (336). Ora, não resulta dos autos, e não é, aliás, defendido pelas partes, que os oito avisos de pagamento C18 Breach em causa se tenham tornado incobráveis, nos termos do artigo 13.o, n.o 2, segundo e terceiro parágrafos, do Regulamento n.o 609/2014, nem que se trata dos créditos prescritos na aceção do artigo 103.o do Código Aduaneiro da União (337). De onde decorre que, neste momento, os montantes correspondentes a estes oito avisos de pagamento deveriam, em princípio, ser deduzidos do montante da estimativa dos recursos próprios tradicionais relativos ao período de 2015 a 2017, tanto mais que, na sua resposta escrita às perguntas do Tribunal de Justiça, o Reino Unido apresentou elementos para se proceder a essa dedução (338). Todavia, entendo que, no âmbito de uma ação por incumprimento nos termos do artigo 258.o TFUE, não incumbe ao Tribunal de Justiça substituir‑se à Comissão, calculando ele próprio o montante preciso correspondente aos oito avisos de pagamento C18 Breach, nem «deduzindo‑os» do montante pedido pela Comissão a título das perdas de recursos próprios para o orçamento da União.

313. Com base nas considerações precedentes, concluo que o segundo fundamento deve ser julgado procedente na medida em que visa obter a declaração de incumprimento pelo Reino Unido das disposições relativas aos recursos próprios acima referidos, mas que o pedido da Comissão que consiste em quantificar o montante dos recursos próprios tradicionais deve ser julgado improcedente.

314. Proponho, portanto, que o Tribunal de Justiça declare que, quanto ao período compreendido entre novembro de 2011 e novembro de 2014, o Reino Unido não disponibilizou o montante correto dos recursos próprios tradicionais relativos às importações fraudulentas que apurou no âmbito da operação Snake e aos avisos de pagamento C18 Snake anulados posteriormente, e que, ao fazê‑lo, violou os artigos 2.o e 8.o das Decisões 2007/436 e 2014/335, e os artigos 2.o, 6.o, 9.o, 10.o, 11.o e 17.o do Regulamento n.o 1150/2000, aos quais correspondem, respetivamente, os artigos 2.o, 6.o, 9.o, 10.o, 12.o e 13.o do Regulamento n.o 609/2014. No entanto, proponho ao Tribunal de Justiça que rejeite integralmente o que se pede no terceiro parágrafo do primeiro pedido formulado na petição, na parte em que se refere a este período, na medida em que a Comissão não demonstrou a exatidão dos montantes que nele figuram.

315. No que respeita ao período compreendido entre 1 de janeiro de 2015 e 11 de outubro de 2017, concluo que o Reino Unido não cumpriu as disposições acima referidas ao não disponibilizar os montantes devidos. Todavia, uma vez que o montante correspondente a oito avisos de pagamento C18 Breach deveria ser subtraído ao montante dos recursos próprios tradicionais e que não compete ao Tribunal de Justiça substituir‑se à Comissão para essa determinação, o montante dos recursos próprios tradicionais para o período de 1 de janeiro de 2015 a 11 de outubro de 2017 não pode ser determinado no âmbito da presente ação.

316. Se o Tribunal de Justiça seguir a minha proposta de conclusão relativa ao segundo fundamento, a questão relativa à taxa de câmbio que deve ser utilizada para calcular o montante das perdas de recursos próprios fica sem objeto. É, portanto, a título subsidiário, e apenas na hipótese de o Tribunal de Justiça decidir quantificar o montante reclamado pela Comissão a título de perdas de recursos próprios tradicionais, que passo a analisar brevemente o mérito deste argumento.

4.      Quanto aos juros de mora

317. Quanto à exceção de inadmissibilidade suscitada pelo Reino Unido segundo a qual o pedido da Comissão a título de juros de mora, nos termos do artigo 12.o do Regulamento n.o 609/2014, é inadmissível, uma vez que, no seu parecer fundamentado, a Comissão não mencionou nenhum incumprimento no que respeita ao pagamento de juros de mora, observo que este parecer menciona expressamente, nomeadamente, o artigo 12.o deste regulamento (339), que corresponde ao artigo 11.o do Regulamento n.o 1150/2000. A petição não estende, portanto, o alcance do litígio estabelecido no parecer fundamentado, contrariamente ao que alega este Estado, pelo que esta exceção de inadmissibilidade deve ser julgada improcedente.

318. A Comissão considera que, tendo em conta a existência de um nexo indissociável entre, por um lado, as obrigações de apurar os recursos próprios da União e de os lançar na conta da Comissão nos prazos fixados e, por outro, a obrigação de pagar juros de mora (340), o Reino Unido estava obrigado a pagar esses juros nos termos do artigo 12.o do Regulamento n.o 609/2014. Referindo‑se à redação desta disposição, considera que o montante dos juros só será calculado depois de o Reino Unido ter colocado o montante principal à disposição, pondo assim termo ao seu atraso no lançamento dos montantes dos recursos próprios tradicionais em questão nessa conta. Em resposta, o Reino Unido sustenta que o pedido relativo aos juros de mora é inadmissível, na medida em que é prematuro formulá‑lo, dado que esta obrigação de pagar os juros de mora só nasce num momento posterior. A este respeito, como explicado já anteriormente (341), a jurisprudência do Tribunal de Justiça estabelece um nexo indissociável entre, por um lado, a obrigação de apurar os recursos próprios da União, e de os lançar na conta da Comissão nos prazos fixados e, por outro, a de pagar juros de mora. A obrigação de lançamento em conta dos recursos próprios e a obrigação de pagamento de juros de mora por atraso nesse lançamento são, entre si, uma obrigação principal e uma obrigação acessória (342). De onde resulta que se o Tribunal de Justiça acolher o segundo fundamento e considerar que o Reino Unido não cumpriu as suas obrigações a título do apuramento do lançamento dos recursos próprios, então esse Estado tem de pagar juros de mora. Por uma questão de exaustividade, observo que as partes parecem estar de acordo quanto ao facto de que, quando o Reino Unido pagar os montantes em causa, haverá que aplicar o limite de 16 % previsto no artigo 1.o, n.o 6, do Regulamento 2016/804 (343).

D.      Quanto à violação do princípio da cooperação leal previsto no artigo 4.o, n.o 3, TUE

319. A acusação relativa a uma violação da obrigação de cooperação leal como a consagrada no artigo 4.o, n.o 3, TUE parece‑me dever ser examinada de modo autónomo na medida em que diga respeito às alegações da Comissão relativas à não comunicação de informações (344). Com efeito, com esta acusação a Comissão censura este Estado por ter recusado fornecer‑lhe, por um lado, uma cópia da avaliação jurídica ou de qualquer outra indicação relativa ao conteúdo dessa avaliação que conduziu à anulação dos avisos de pagamento C18 Snake e, por outro, todos os elementos necessários à determinação das perdas de recursos próprios tradicionais que daí resultavam. Ora, estas alegações são independentes do argumento avançado pela Comissão, no âmbito do seu primeiro fundamento, segundo o qual o facto de não tomar medidas de controlo aduaneiro constitui um incumprimento à obrigação das autoridades aduaneiras de tomar medidas destinadas a proteger os interesses financeiros da União.

320. Importa, desde logo, recordar que resulta do princípio da cooperação leal, consagrado no artigo 4.o, n.o 3, TUE, que os Estados‑Membros são obrigados a adotar todas as medidas adequadas para garantir o alcance e a eficácia do direito da União (345). Deve sublinhar‑se que incumbe aos Estados‑Membros, por força do artigo 4.o, n.o 3, TUE, facilitar à Comissão o cumprimento da sua missão, que consiste, designadamente, segundo o artigo 17.o, n.o 1, TUE, em velar pela aplicação das disposições dos Tratados, bem como das medidas adotadas pelas instituições por força destes (346).

321. No caso em apreço, antes de mais, no que respeita à primeira crítica da Comissão (347), resulta dos autos que esta instituição tinha pedido ao Reino Unido que fornecesse a cópia da avaliação jurídica em causa, que justificava a anulação dos avisos de pagamento C18 Snake (348). Na sua resposta de 22 de junho de 2018 à notificação para cumprir, o Reino Unido referiu que a anulação dessas dívidas tinha sido decidida de forma totalmente independente pelo agente revisor (349) e sem que se baseie em qualquer avaliação jurídica, contestando este Estado, aliás, a existência desta última. Em vez disso, as autoridades nacionais limitaram‑se a fornecer cópias de várias cartas de anulação emitidas. O Reino Unido sublinha que a avaliação jurídica em causa dizia respeito aos processos de liquidação instaurados contra determinados operadores, mas que não conduziu à anulação dos avisos de pagamento C18 Snake.

322. A este propósito, há que salientar que, no contexto particular da divulgação de documentos aduaneiros, a fim de auxiliar a Comissão na sua missão de velar pelo cumprimento dos Tratados, os Estados‑Membros devem nomeadamente facilitar‑lhe os instrumentos para comprovar a regularidade dos pagamentos dos recursos próprios (350). De onde decorre, em minha opinião, que ainda que a avaliação jurídica em causa não fosse pertinente para a análise do fundamento jurídico da decisão de anulação adotada pelo agente revisor, a Comissão podia exigir que o Estado‑Membro lhe fornecesse esse documento, uma vez que resulta dos autos que esse Estado tinha reconhecido por diversas vezes a sua existência (351). Deve igualmente sublinhar‑se que, embora tenha sido devido às explicações avançadas pelo Reino Unido que a Comissão forjou a sua convicção de que a avaliação jurídica era o fundamento da anulação dos avisos de pagamento C18 Snake, foi devido à falta de cobrança dos montantes devidos nos termos desses avisos que formulou o seu pedido destinado a obter a apresentação do documento em causa, na medida em que diziam respeito aos recursos próprios tradicionais da União e, portanto, ao orçamento desta última. A circunstância de se ter verificado posteriormente que a anulação dos avisos de pagamento C18 Snake era causada por outros motivos em nada altera, na minha opinião, a procedência deste pedido da Comissão, que faz parte da sua missão acima referida.

323. Observo que as partes não contendem, em princípio, quanto à não apresentação da avaliação jurídica em causa pelo Reino Unido. Este último, sem negar a inexistência desta apresentação, sustenta, no entanto, que, mesmo que os avisos de pagamento C18 Snake tenham sido anulados com base na avaliação jurídica em causa, em vez de numa decisão independente do agente revisor, essa avaliação é, de qualquer forma, protegida pelo segredo profissional e não é possível derrogar a proteção fundamental do seu caráter confidencial. Em seu entender, a obrigação de pôr os documentos úteis à disposição da Comissão está sujeita a «condições razoáveis» (352), pelo que não lhe incumbia comunicar esse documento à Comissão.

324. Na minha opinião, esta argumentação não pode ser acolhida. A este respeito, considero, como a Comissão sublinhou, com razão, que esta obrigação decorre de uma interpretação errada do Acórdão Comissão/Itália (353) invocado pelo Reino Unido. Com efeito, afigura‑se que, nesse processo, a Comissão tinha pedido à República italiana um extrato que justificasse todos os montantes em causa, incluindo as referências a todos os documentos aduaneiros subjacentes. Foi ao responder a este argumento avançado por esse Estado‑Membro, segundo o qual o pedido apresentado pela Comissão carecia de um «trabalho de preparação considerável necessário», em razão do qual não podia dar‑lhe sequência «no prazo imposto» (354), que o Tribunal de Justiça observou que, quando a Comissão pede estes documentos, deve fazê‑lo em condições razoáveis. Por conseguinte, este acórdão não me parece relevante para o presente processo, e noto que não é relativo à problemática atinente à divulgação de documentos cobertos pelo sigilo profissional.

325. No que respeita, nomeadamente, ao argumento de defesa apresentado pelo Reino Unido segundo o qual a avaliação jurídica em causa estava protegida pelo «sigilo profissional», conferindo‑lhe caráter confidencial, considero que este não demonstrou, no caso em apreço, por que motivo um documento redigido pelos serviços da HMRC, através de um agente revisor, que parece também fazer parte dessa autoridade (355), mesmo que coberto pelo sigilo profissional, não podia ser divulgado à Comissão. Com efeito, uma vez que a avaliação jurídica em causa era dirigida a um serviço pertencente à mesma autoridade, parece abrangida pela jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa aos pareceres inhouse (356). Importa recordar, por outro lado, que, segundo jurisprudência assente, um Estado‑Membro não pode invocar disposições, práticas ou situações da sua ordem jurídica interna para justificar a inobservância das obrigações resultantes do direito da União (357). De onde resulta que o Reino Unido não pode, para justificar o incumprimento da sua obrigação de cooperação acima referida, invocar este tipo de dificuldades para fundamentar a sua decisão de não divulgar à Comissão documentos relativos aos avisos de pagamento C18 Snake.

326. No que respeita à segunda crítica, relativa à violação do princípio da cooperação leal formulado pela Comissão (358), segundo a qual o Reino Unido não forneceu todas as informações necessárias para determinar os montantes das perdas de recursos próprios que resultam dos avisos de pagamento C18 Snake, apesar dos repetidos pedidos da Comissão, parece‑me que este Estado não põe em causa, na realidade, estas alegações. Além disso, resulta dos autos que só no âmbito do processo contencioso é que o Reino Unido respondeu a essas alegações. Tendo em conta estes elementos, importa, por conseguinte, constatar que o Reino Unido não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do princípio da cooperação leal.

327. Atendendo às considerações precedentes, entendo que, ao não ter comunicado à Comissão a avaliação jurídica em causa e todos os elementos necessários à determinação dos montantes das perdas de recursos próprios resultantes dos avisos de pagamento C18 Snake, o Reino Unido não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 4.o, n.o 3, TUE.

E.      Quanto ao incumprimento das obrigações decorrentes da regulamentação relativa ao IVA e aos recursos próprios provenientes do IVA

328. Com o seu terceiro fundamento, a Comissão considera que o Reino Unido não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 4.o, n.o 3, TUE, dos artigos 310.o, n.o 6, e 325.o TFUE, e dos artigos 2.o, n.o 1, alíneas b) e d), 83.o, 85.o a 87.o e 143.o, n.o 1, alínea d), da Diretiva 2006/112. Em apoio deste fundamento, a Comissão alega, em substância, que a determinação incorreta do valor aduaneiro das mercadorias importadas abrangidas tanto pelo regime aduaneiro 40 como pelo regime aduaneiro 42 teve como consequência diminuir o valor tributável do IVA, pelo que a União Europeia foi privada de uma parte dos seus recursos próprios.

329. Quanto ao regime aduaneiro 40, a Comissão sublinha que, em aplicação dos artigos 2.o, n.o 1, alínea d), 85.o a 87.o da Diretiva 2006/112, o IVA deve ser cobrado pelo Estado‑Membro de importação e que o valor tributável deste imposto inclui o valor aduaneiro, bem como os direitos aduaneiros e as despesas acessórias. Considera que, uma vez que o IVA não foi cobrado tendo em conta o valor aduaneiro correto das mercadorias importadas, os montantes correspondentes não foram tomados em consideração na determinação da base dos recursos próprios provenientes do IVA.

330. Ao abrigo do regime aduaneiro 42, a Comissão salienta, antes de mais, que, segundo o Relatório OLAF, em 2016, 87 % das mercadorias foram importadas por intermédio do Reino Unido para outros Estados‑Membros. Em seguida, expõe que, para as mercadorias abrangidas pelo regime aduaneiro 42, o valor tributável do IVA é constituído, em conformidade com o artigo 83.o da Diretiva 2006/112, pelo preço de compra dos bens ou de bens similares ou, na falta de preço de compra, pelo preço de custo, determinados no momento da entrega. Por último, sustenta que se o valor aduaneiro das mercadorias importadas for incorreto, o cálculo do IVA a cobrar sobre estas pelo Estado‑Membro destinatário ou do transporte consequentemente também o será.

331. A Comissão deduz de todos estes elementos que, ao não adotar medidas suscetíveis de remediar a subavaliação do valor aduaneiro das mercadorias importadas, o Reino Unido não cumpriu as obrigações decorrentes do artigo 4.o, n.o 3, TUE e dos artigos 310.o, n.o 6, e 325.o TFUE, e, por não ter garantido a cobrança integral das receitas do IVA, privou a União de uma parte dos recursos próprios provenientes desse imposto. Mais especificamente, a Comissão acrescenta que o artigo 143.o, n.o 2, da Diretiva 2006/112, que fixa as condições aplicáveis às importações abrangidas pelo regime aduaneiro 42, impõe aos Estados‑Membros que tomem todas as medidas adequadas para assegurar a cobrança do IVA. Por conseguinte, ao não adotar tais medidas, o Reino Unido comprometeu a capacidade de os outros Estados‑Membros cobrarem o IVA, e deve ser responsabilizado por essa situação.

332. O Reino Unido sustenta, em contrapartida, que a reclamação da Comissão não assenta em nenhuma base jurídica. A este respeito, refere que nem as disposições da Diretiva 2006/112 nem as do artigo 4.o, n.o 3, TUE implicam a responsabilidade de um Estado‑Membro pelas perdas de recursos próprios tradicionais ou de recursos próprios provenientes do IVA suportado noutros Estados‑Membros. Acrescenta que a Comissão, que se limita a invocar as obrigações gerais de cooperação leal e de luta contra a fraude, não está em condições de precisar o fundamento jurídico com base no qual um Estado‑Membro seria obrigado, para além das suas fronteiras, a responder pela cobrança do IVA noutro Estado da União. Observa igualmente que, se a tese da Comissão fosse acolhida, seria impossível medir o grau de responsabilidade de um Estado‑Membro na perda de recursos próprios sofridos noutro Estado‑Membro em razão do incumprimento pelo primeiro das suas obrigações.

333. O Reino Unido sublinha, além disso, que, nos termos do artigo 83.o da Diretiva 2006/112, o valor tributável do IVA fixado para as mercadorias importadas abrangidas pelo regime aduaneiro 42 assenta no preço de compra faturado ao adquirente final situado no Estado‑Membro de destino. Salienta que cabe a este segundo Estado verificar e garantir que o IVA sobre essas aquisições é efetivamente declarado. Daí deduz que o alegado nexo de causalidade invocado pela Comissão não está demonstrado. Por último, o Reino Unido afirma que não resulta de nenhum dos elementos de facto apresentados pela Comissão que, pelo seu comportamento, tenha impedido os outros Estados‑Membros de cobrar o IVA.

334. À luz destes argumentos, importa, num primeiro momento, fornecer alguns esclarecimentos sobre o regime jurídico dos recursos próprios provenientes do IVA (secção 1), e depois, num segundo momento, analisar sucessivamente as acusações próprias dos regimes aduaneiros 40 (secção 2) e 42 (secção 3).

1.      Quanto ao regime jurídico da colocação à disposição do orçamento da União dos recursos provenientes do IVA

335. A fim de assegurar a criação de um mercado interno no seio do qual a concorrência não é falseada e a livre circulação das mercadorias e serviços é garantida, o legislador da União esforçou‑se por harmonizar as regras relativas aos impostos sobre o volume de negócios através de um sistema de IVA, o qual constitui um imposto sobre o consumo que engloba a maior parte dos aspetos da economia. Nesta ótica, a Diretiva 2006/112 prevê uma regra comum de valor tributável. Mais precisamente, nos termos do artigo 73.o dessa diretiva, o valor tributável ao qual se aplica a taxa de IVA compreende «tudo o que constitui a contraprestação que o fornecedor ou o prestador tenha recebido ou deva receber em relação a essas operações, do adquirente, do destinatário ou de um terceiro, incluindo as subvenções diretamente relacionadas com o preço de tais operações» (359). Para além deste princípio, o valor tributável é regido por regras específicas, nomeadamente no caso das aquisições intracomunitárias (360) de bens ou no caso das importações de bens (361).

336. Por outro lado, em conformidade com o artigo 2.o, n.o 1, alínea b), da Decisão 2007/436 e com o artigo 2.o, n.o 1, alínea b), da Decisão 2014/335, os recursos próprios da União incluem, além dos recursos próprios tradicionais, as receitas provenientes da aplicação de uma taxa uniforme (362) à base do IVA, determinada de maneira harmonizada segundo regras da União. Esta taxa uniforme constitui uma «taxa de mobilização» desse recurso e não uma taxa de tributação, uma vez que não cria obrigações fiscais para os contribuintes, mas impõe apenas aos Estados a cobrança do montante pelo qual são responsáveis perante a União sobre qualquer fonte orçamental (363).

337. Quanto à matéria coletável deste recurso próprio, que é distinta da base tributável prevista na Diretiva 2006/112, o artigo 3.o do Regulamento n.o 1553/89 enuncia, em substância, que a base dos recursos provenientes do IVA é obtida dividindo o total das receitas líquidas de IVA cobradas pelo Estado‑Membro durante o ano, quer pela taxa a que esse imposto é cobrado durante esse mesmo ano, quer pela taxa média ponderada do IVA, quando são aplicadas várias taxas num Estado‑Membro (364).

338. Este sistema de recursos próprios destina‑se, portanto, no que diz respeito aos recursos IVA, a criar, a cargo dos Estados‑Membros, uma obrigação de pôr à disposição da União, enquanto recursos próprios, uma parte dos montantes que cobram a título do IVA (365).

339. Existe, assim, uma relação direta entre a cobrança das receitas do IVA no respeito do direito da União aplicável e a colocação à disposição do orçamento da União dos recursos IVA correspondentes, uma vez que qualquer falha na cobrança das receitas está potencialmente na origem de uma redução dos recursos próprios (366). A este título, os Estados‑Membros devem garantir uma cobrança eficaz dos recursos próprios da União, procedendo à cobrança das quantias correspondentes aos recursos que, devido a fraudes, foram subtraídas ao orçamento da União (367).

340. A este respeito, há que recordar que, em matéria de IVA, decorre, nomeadamente, dos artigos 2.o e 273.o da Diretiva 2006/112, lida em conjugação com o artigo 4.o, n.o 3, TUE, que os Estados‑Membros não só têm a obrigação geral de tomar todas as medidas legislativas e administrativas adequadas para garantir a cobrança da totalidade do IVA devido nos seus respetivos territórios, como também devem combater a fraude (368). Além disso, como foi já sublinhado (369), o artigo 325.o TFUE obriga os Estados‑Membros a combaterem as atividades ilícitas lesivas dos interesses financeiros da União, por meio de medidas dissuasoras e efetivas e, em particular, obriga‑os, para combater as fraudes (370) lesivas dos interesses financeiros da União, a tomar as mesmas medidas que tomam para combater a fraude lesivas dos seus próprios interesses financeiros (371).

341. À luz das considerações precedentes, tenho poucas dúvidas que, no presente caso, a inexistência de medidas adequadas suscetíveis de combater o risco de fraude e de assegurar uma avaliação correta das mercadorias importadas (372) seja suscetível de constituir, do ponto de vista dos recursos próprios provenientes do IVA, um incumprimento do artigo 325.o TFUE, que concretiza o artigo 4.o, n.o 3, TUE (373), suscetível de lesar os interesses financeiros da União. Assim sendo, resulta da jurisprudência anteriormente referida que o nexo entre a cobrança das receitas provenientes do IVA por um Estado‑Membro e a colocação à disposição do orçamento da União dos recursos provenientes do IVA é apenas potencial. Consequentemente, considero que cabe verificar, à luz das regras próprias de cada um dos regimes aduaneiros aplicáveis no caso em apreço, se a omissão pelas autoridades do Reino Unido de efetuar controlos aduaneiros, conforme apresentada no âmbito do primeiro fundamento, privou concretamente o orçamento da União de uma parte dos recursos próprios provenientes do IVA.

2.      Quanto à acusação relativa à perda de recursos próprios provenientes do IVA a título do regime aduaneiro 40

342. O regime aduaneiro 40 corresponde ao caso em que as mercadorias importadas a partir de um país terceiro são diretamente introduzidas em livre prática (374). Em conformidade com o artigo 2.o, n.o 1, alínea d), da Diretiva 2006/112, as importações de bens estão incluídas nas operações sujeitas ao IVA. Nos termos do artigo 85.o desta diretiva, «[n]as importações de bens, o valor tributável é constituído pelo valor definido para efeitos aduaneiros pelas disposições comunitárias em vigor». Este valor tributário é ajustado segundo as regras previstas nos artigos 86.o e 87.o da Diretiva 2006/112 (375). Além disso, o artigo 70.o, n.o 1, do Código Aduaneiro da União (376), precisa a definição do valor aduaneiro das mercadorias importadas, que é «o valor transacional, ou seja, o preço efetivamente pago ou a pagar pelas mercadorias quando são vendidas para exportação com destino ao território aduaneiro da União». Daqui decorre que o objetivo prosseguido pelo artigo 85.o da Diretiva 2006/112, lido em conjugação com o artigo 70.o, n.o 1, do Código Aduaneiro da União, consiste em incluir no valor tributável tudo o que constitui o valor do bem para o seu adquirente final (377).

343. À luz destes elementos, é evidente que a não implementação de medidas adequadas destinadas a combater a fraude aduaneira não permitiu ao Reino Unido aplicar as regras de determinação do valor tributável do IVA nas importações de mercadorias abrangidas pelo regime aduaneiro 40. No entanto, resta determinar se os recursos próprios provenientes deste imposto foram concretamente afetados por essa circunstância. Quanto a este ponto, a Comissão, à qual incumbe provar a existência dos incumprimentos que alega (378), afirma, de um modo geral, que a diminuição dos recursos próprios provenientes do IVA decorre ipso facto da subavaliação do valor aduaneiro das mercadorias importadas.

344. Contudo, não penso que este argumento permita demonstrar de forma suficiente a existência de uma relação direta entre a omissão do Reino Unido e uma eventual diminuição dos recursos próprios provenientes do IVA. Com efeito, como já referi (379), resulta do artigo 3.o do Regulamento n.o 1553/89 que a base de recursos IVA é calculada a partir do total das receitas líquidas de IVA cobradas pelo Estado‑Membro dividido pela taxa do IVA. Ora, no que respeita às mercadorias importadas, o total das receitas líquidas cobradas não depende unicamente do valor aduaneiro dos bens mas também do preço de venda faturado ao adquirente final. Assim, o montante das receitas provenientes do IVA continua a ser idêntico quando o adquirente final pagou um preço de compra equivalente ao valor aduaneiro real do bem. Daqui resulta que a mera constatação da subavaliação do valor aduaneiro das mercadorias importadas não implica automaticamente uma redução da matéria coletável sobre a qual são calculados os recursos próprios provenientes do IVA.

345. Nestas condições, considero que o raciocínio de ordem geral em que a Comissão se baseia para sustentar que, no que respeita às importações de bens abrangidos pelo regime aduaneiro 40, a União foi privada de uma parte dos recursos próprios provenientes do IVA não pode constituir, por si só, prova suficiente da realidade desta acusação. Por conseguinte, proponho ao Tribunal de Justiça que julgue improcedente o pedido formulado quanto a este ponto pela Comissão.

3.      Quanto à acusação relativa à perda dos recursos próprios provenientes do IVA a título do regime aduaneiro 42

346. Antes de mais, é oportuno recordar que, segundo o Relatório OLAF, 87 % do volume total das mercadorias importadas em 2016 estava abrangido pelo regime aduaneiro 42 (380).

347. Como já expliquei no âmbito das presentes conclusões, o regime aduaneiro 42 corresponde ao caso em que, no momento da importação, é certo que as mercadorias importadas se destinam a outro Estado‑Membro (381). Em tal hipótese, o IVA é devido no Estado‑Membro de destino final das mercadorias e não no Estado do importador. Mais precisamente, esta isenção decorre do artigo 143.o, n.o 1, alínea d), da Diretiva 2006/112, segundo o qual os Estados‑Membros isentam as importações de bens expedidos ou transportados a partir de um território terceiro ou de um país terceiro para um Estado‑Membro que não seja o de chegada da expedição ou do transporte, no caso de a entrega desses bens, efetuada pelo importador designado ou reconhecido como devedor do imposto por força do disposto no artigo 201.o da referida diretiva, estar isenta em conformidade com o artigo 138.o da mesma. Por outras palavras, a isenção de IVA prevista no artigo 143.o da Diretiva 2006/112 baseia‑se na circunstância de a importação ser seguida de uma entrega intracomunitária, ela própria isenta nos termos do artigo 138.o da referida diretiva.

348. Por outro lado, resulta do artigo 68.o da Diretiva 2006/112 que o facto gerador do IVA ocorre no momento em que é efetuada a aquisição intracomunitária, ou seja, de acordo com o segundo parágrafo deste artigo, «no momento em que se considera efetuada a entrega de bens similares [dentro] do país». A este título, o Tribunal de Justiça declara que o conceito de «entrega de bens» não diz respeito à transferência de propriedade nas formas previstas pelo direito nacional aplicável, mas inclui qualquer operação de transferência de um bem corpóreo por uma parte que confere à outra parte o poder de dispor dele, de facto, como se fosse o proprietário desse bem (382).

349. Por último, para as aquisições intracomunitárias de bens, resulta dos artigos 76.o e 83.o da Diretiva 2006/112 que o valor tributável do IVA é constituído pelo preço de compra dos bens ou de bens similares ou, na falta de preço de compra, pelo preço de custo, determinados no momento em que se efetua a entrega.

350. No presente caso, afigura‑se‑me difícil subscrever o postulado da Comissão segundo o qual a determinação incorreta pelo Reino Unido do valor aduaneiro das mercadorias importadas teve incidência no montante dos recursos próprios provenientes do IVA postos à disposição da União. Tendo em conta as regras já referidas aplicáveis às operações abrangidas pelo regime aduaneiro 42, este nexo direto, que, de resto, a Comissão não fundamenta nos seus articulados, não me parece demonstrado por duas razões. Por um lado, o valor tributável do IVA aplicável às mercadorias abrangidas pelo referido regime não está correlacionado com o valor aduaneiro dos bens importados, mas com o preço de compra desses bens no Estado‑Membro de destino final. Por outro lado, no âmbito do regime aduaneiro 42, a totalidade do IVA deve ser cobrado e pago no Estado‑Membro onde as mercadorias são finalmente entregues.

351. Acrescento que a fragilidade sistémica do regime aduaneiro 42 impede que um único Estado‑Membro seja considerado responsável pela perda de recursos próprios provenientes do IVA. A este título, observa que, no seu Relatório Especial n.o 13/2011 sobre o controlo da aplicação do procedimento aduaneiro 42, o Tribunal de Contas constatou que o Tribunal concluiu que a aplicação do procedimento aduaneiro conduziu a perdas significativas que avaliou em cerca de 2 200 milhões de euros (383) e lamentou a insuficiência dos controlos operados pelos sete Estados‑Membros selecionados no seu estudo (384). O Tribunal de Contas recomendou nomeadamente que se melhorasse a comunicação dos dados chave nos Estados‑Membros e entre eles, que se encorajasse a verificação automática dos números de identificação de IVA e que se criasse um perfil de risco comum à escala da União para as importações efetuadas sob o regime aduaneiro 42 (385). No seu Relatório Especial n.o 24/2015 relativo à luta contra a fraude ao IVA intracomunitário, o Tribunal de Constas sublinhou a persistência dessas dificuldades ao observar que «[a]s melhorias legislativas efetuadas pela Comissão relativamente ao procedimento aduaneiro 42 e o seguimento dado às recomendações do Tribunal formuladas no Relatório Especial n.o 13/2011 são positivos, mas [que] a luta contra a fraude é prejudicada por uma execução fraca e pelos casos de incumprimento detetados nos Estados‑Membros durante a […] auditoria» (386). A este título, o Tribunal de Contas sublinhou também, por um lado, que não há controlos cruzados eficazes entre os dados aduaneiros e os dados fiscais na maior parte dos Estados‑Membros visitados e, por outro, que existem problemas com a precisão, a exaustividade e a atualidade dos dados (387). Tais constatações conduzem‑me também a afastar a tese da Comissão segundo a qual o Reino Unido, com as suas omissões, impediu os outros Estados‑Membros de cobrar a integralidade do IVA.

352. Nestas condições e apesar das omissões do Reino Unido na determinação do valor aduaneiro das mercadorias em causa, não é possível, na falta de um nexo direto, imputar a este Estado uma diminuição dos recursos próprios provenientes do IVA a título das operações abrangidas pelo regime aduaneiro 42. Por conseguinte, sugiro que o Tribunal de Justiça rejeite quanto a este ponto o pedido apresentado pela Comissão.

353. Tendo em conta todas estas considerações, proponho ao Tribunal de Justiça que julgue improcedente o terceiro fundamento, tanto sobre a acusação relativa à perda de recursos próprios provenientes do IVA a título do regime aduaneiro 40 como sobre o relativo à perda de recursos próprios provenientes do IVA a título do regime aduaneiro 42.

VII. Quanto às despesas

354. Nos termos do artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Em conformidade com o artigo 138.o, n.o 3, deste regulamento, se as partes obtiverem vencimento parcial, cada uma das partes suportará as suas próprias despesas. No entanto, se tal se afigurar justificado tendo em conta as circunstâncias do caso, o Tribunal pode decidir que, além das suas próprias despesas, uma parte suporte uma fração das despesas da outra parte. Tendo a Comissão pedido a condenação do Reino Unido nas despesas e tendo este sido vencido no essencial dos seus fundamentos, tendo em conta as circunstâncias do caso vertente, há que condená‑lo a suportar, para além das suas próprias despesas, quatro quintos das despesas da Comissão. Esta última suportará um quinto das suas despesas.

355. Em conformidade com o artigo 140.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, segundo o qual os Estados‑Membros que intervenham no litígio devem suportar as suas próprias despesas, o Reino da Bélgica, a República da Estónia, a República Helénica, a República da Letónia, a República Portuguesa e a República Eslovaca suportarão as suas próprias despesas.

VIII. Conclusão

356. Pelos fundamentos expostos nas presentes conclusões, proponho que o Tribunal de Justiça decida da seguinte forma:

1)      O Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte, ao não adotar, durante o período de infração, medidas destinadas a proteger os interesses financeiros da União e ao não ter em conta os montantes corretos dos direitos aduaneiros relativos a certas importações de produtos têxteis e de calçado provenientes da China, não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 325.o TFUE, dos artigos 13.o e 220.o, n.o 1, do Regulamento (CEE) n.o 2913/92 do Conselho, de 12 de outubro de 1992, que estabelece o Código Aduaneiro Comunitário, conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 648/2005 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 1 de abril de 2005, dos artigos 3.o, 46.o e 105.o, n.o 3, do Regulamento (UE) n.o 952/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de outubro de 2013, que estabelece o Código Aduaneiro da União, do artigo 248.o, n.o 1, do Regulamento (CEE) n.o 2454/93 da Comissão, de 2 de julho de 1993, que fixa determinadas disposições de aplicação do Regulamento n.o 2913/92, conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 1335/2003 da Comissão, de 25 de julho de 2003, e do artigo 244.o do Regulamento de Execução (UE) 2015/2447 da Comissão, de 24 de novembro de 2015, que estabelece as regras de execução de determinadas disposições do Regulamento (UE) n.o 952/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece o Código Aduaneiro da União.

2)      O Reino Unido, ao não pôr à disposição da União o montante correto dos recursos próprios tradicionais relativos a essas importações, não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força dos artigos 2.o e 8.o da Decisão 2014/335/UE, Euratom do Conselho, de 26 de maio de 2014, relativa ao sistema de recursos próprios da União Europeia e da Decisão 2007/436/CE, Euratom do Conselho, de 7 de junho de 2007, relativa ao sistema de recursos próprios das Comunidades Europeias, dos artigos 2.o, 6.o, 9.o, 10.o, 12.o e 13.o do Regulamento (UE, Euratom) n.o 609/2014 do Conselho, de 26 de maio de 2014, relativo aos métodos e ao procedimento para a colocação à disposição dos recursos próprios tradicionais e dos recursos próprios baseados no IVA e no RNB e às medidas destinadas a satisfazer as necessidades da tesouraria, e dos artigos 2.o, 6.o, 9.o, 10.o, 11.o e 17.o do Regulamento (CE, Euratom) n.o 1150/2000 do Conselho, de 22 de maio de 2000, relativo à aplicação da Decisão 94/728.

3)      O Reino Unido, ao não ter comunicado à Comissão Europeia a avaliação jurídica do serviço jurídico da Her Majesty’s Revenue and Customs (Administração Fiscal e Aduaneira do Reino Unido) e todos os elementos necessários à determinação dos montantes das perdas de recursos próprios resultantes dos avisos de pagamento a posteriori emitidos no âmbito da operação Snake, não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do princípio da cooperação leal, conforme previsto no artigo 4.o, n.o 3, TUE.

4)      A ação é julgada improcedente quanto ao restante.

5)      O Reino Unido suporta, além das suas próprias despesas, quatro quintos das despesas da Comissão Europeia.

6)      A Comissão Europeia suporta um quinto das suas despesas.

7)      O Reino da Bélgica, a República da Estónia, a República Helénica, a República da Letónia, a República Portuguesa e a República Eslovaca suportam as suas próprias despesas.


1      Língua original: francês.


2      Devo sublinhar que o Tribunal de Justiça é competente por força do artigo 86.o do Acordo sobre a saída do Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte da União Europeia e da Comunidade Europeia da Energia Atómica (JO 2020, L 29, p. 7), aprovado pela Decisão (UE) 2020/135 do Conselho, de 30 de janeiro de 2020, relativa à celebração do Acordo sobre a Saída do Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte da União Europeia e da Comunidade Europeia da Energia Atómica (JO 2020, L 29, p. 1), para conhecer das ações interpostas por ou contra este Estado antes do termo do período de transição, em 1 de janeiro de 2021.


3      Decisão do Conselho, de 26 de maio de 2014, relativa ao sistema de recursos próprios da União Europeia (JO 2014, L 168, p. 105).


4      JO 2007, L 163, p. 17.


5      JO 2000, L 130, p. 1.


6      Rendimento Nacional Bruto.


7      JO 2014, L 168, p. 39.


8      Regulamento de 17 de maio de 2016 que altera o Regulamento n.o 609/2014 (JO 2016, L 132, p. 85).


9      JO 2014, L 168, p. 29.


10      Regulamento (CEE, Euratom) do Conselho, de 29 de maio de 1989, relativo ao regime uniforme e definitivo de cobrança dos recursos próprios provenientes do Imposto sobre o Valor Acrescentado  (JO 1989, L 155, p. 9).


11      JO 1992, L 302, p. 1.


12      JO 2005, L 117, p. 13.


13      JO 2013, L 269, p. 1.


14      JO 1993, L 253, p. 1.


15      JO 2003, L 187, p. 16.


16      JO 2015, L 343, p. 558.


17      JO 2006, L 347, p. 1, e retificação no JO 2007, L 335, p. 60.


18      JO 2009, L 175, p. 12.


19      A seguir «produtos em causa» ou «produtos têxteis e de calçado provenientes da China».


20      Importa precisar que o período de infração é anterior à entrada em vigor do acordo de saída (v. nota 2 das presentes conclusões), pelo que a União era composta por 28 Estados‑Membros. Assim, para efeitos das presentes conclusões, faz‑se referência à «União‑28».


21      Decorre do anexo B do regulamento de execução, título II, intitulado «Códigos relativos aos requisitos comuns em matéria de dados para pedidos e decisões», no ponto 1/10, intitulado «Regime», que, no momento da apresentação da declaração aduaneira, o importador é obrigado a indicar um código de quatro algarismos, cujos dois primeiros representam o regime solicitado. O «código 40» corresponde à introdução no consumo com introdução em livre prática simultânea de mercadorias (a seguir «regime aduaneiro 40»), ao passo que o código 42 faz parte da introdução no consumo com introdução em livre prática simultânea de mercadorias com isenção de IVA para entrega noutro Estado‑Membro.


22      Trata‑se de uma «perda potencial» para o período de maio de 2013 a março de 2015 de 589 676 121 euros sobre uma quantidade de quase mil milhões e meio de quilogramas de produtos em causa.


23      Resulta deste relatório que, em 2016, 87 % das importações de produtos têxteis e de calçado de baixo valor para o Reino Unido foram efetuadas no âmbito do regime aduaneiro 42, ao passo que, durante o mesmo período, esse regime só foi utilizado para 15 % das importações de produtos têxteis e de calçado provenientes da China registados no conjunto da União‑28. Segundo o OLAF, esta disparidade confirma a deslocação para o Reino Unido de operações fraudulentas levadas a cabo a partir de outros Estados‑Membros.


24      V. n.o 58 das presentes conclusões.


25       O OLAF fixou em 1 987 429 507,96 de euros o montante total dessas perdas e dividiu esse montante da seguinte forma: 325 230 822,55 de euros em 2013; 480 098 912,45 de euros em 2014; 535 290 329,16 de euros em 2015 e 646 809 443,80 de euros em 2016.


26      Observo que o Tribunal de Justiça ainda não respondeu a esse pedido.


27      No que se refere à formulação dos pedidos apresentados em apoio da presente ação, há que observar que foram reproduzidos duas vezes na petição inicial, no início e no fim da mesma. Ora, os pedidos não estão formulados de forma idêntica. Assim, a parte entre parênteses (a seguir «terceiro parágrafo do primeiro pedido»), embora não figure no petitum apresentado no início da petição, está inserida nos pedidos que figuram no fim da petição (n.o 370) e é reiterada na réplica da Comissão (n.o 285).


28      No âmbito do regime aduaneiro 42, o importador das mercadorias deve indicar, no documento administrativo único, um código que começa pelos algarismos 42 para obter uma isenção do IVA. Aplica‑se quando as mercadorias importadas do exterior da União para um Estado‑Membro se destinam a ser transportadas para outro Estado‑Membro. Por força do artigo 143.o da Diretiva 2006/112, quando este regime aduaneiro é utilizado, as importações estão isentas de IVA no Estado‑Membro de chegada, mas devem ser tributadas no Estado‑Membro de destino dos bens.


29      V., nomeadamente, Acórdãos de 8 de dezembro de 2005, Comissão/Luxemburgo (C‑33/04, EU:C:2005:750, n.o 70); de 31 de maio de 2018, Comissão/Polónia (C‑526/16, não publicado, EU:C:2018:356, n.o 49), e de 18 de outubro de 2018, Comissão/Roménia (C‑301/17, não publicado, EU:C:2018:846, n.o 32).


30      V. Acórdão de 19 de setembro de 2017, Comissão/Irlanda (Imposto de matrícula) (C‑552/15, EU:C:2017:698, n.os 28 e 29, e jurisprudência referida).


31      V., neste sentido, Acórdãos de 8 de abril de 2008, Comissão/Itália (C‑337/05, não publicado, EU:C:2008:203, n.o 23), e de 13 de fevereiro de 2014, Comissão/Reino Unido (C‑530/11, não publicado, EU:C:2014:67, n.o 40).


32      V. Acórdão de 11 de julho de 2018, Comissão/Bélgica (C‑356/15, EU:C:2018:555, n.o 33 e jurisprudência referida).


33      V. Acórdão de 11 de julho de 2018, Comissão/Bélgica (C‑356/15, EU:C:2018:555, n.o 34 e jurisprudência referida).


34      Pedido anexo à sua resposta à notificação para cumprir de 22 de junho de 2018.


35      V. n.os 301 a 326 do parecer fundamentado.


36      Trata‑se, nomeadamente, por um lado, do relatório técnico do JRC, intitulado «The estimation of fair prices of traded goods from outlier‑free trade data» (A estimativa do preço justo das mercadorias comercializadas a partir dos dados comerciais fora dos valores extremos), e, por outro, do documento do OLAF, intitulado «A subavaliação das importações de produtos têxteis e de calçado: método de cálculo das perdas estimadas em matéria de direitos aduaneiros».


37      No que respeita a estas perdas estimadas de recursos próprios tradicionais para o orçamento da União, o telecarregamento (chamado «DL 53») utilizado pelo OLAF para calcular essas perdas já estava disponível no sítio internet Theseus no momento em que o OLAF publicou o seu relatório final, em 1 de março de 2017, bem como posteriormente. Estava igualmente incluído no anexo 7 do Relatório OLAF. Em resposta às questões do Reino Unido, a Comissão fez‑lhes referência nos n.os 307 e 308 do parecer fundamentado.


38      V. anexo A.32 da petição, que reproduz os quadros que figuram no anexo D do relatório junto à resposta de 11 de fevereiro de 2019.


39      Relatórios intitulados «A subavaliação de importações de produtos têxteis e de calçado: método de cálculo das perdas estimadas em matéria de direitos aduaneiros» e «A estimativa do preço justo das mercadorias comercializadas a partir dos dados comerciais fora de valores extremos» (anexo A.35).


40      Resulta deste anexo que os preços médios corrigidos são calculados com base nos dados relativos às importações extraídas da base de dados estatísticos Comext para um período de 48 meses. É uma base de dados de referência para o comércio internacional de bens gerida pelo Eurostat. O parecer fundamentado faz‑lhe referência expressa no n.o 309.


41      Segundo a Comissão, o Reino Unido pode aceder aos dados não agregados através da aplicação SurvRecapp. Pode, portanto, consultar, inserir, atualizar ou suprimir os diferentes dados que possui.


42      V. anexo D.5, pp. 149 a 1332.


43      V. Acórdão de 18 de novembro de 2010, Comissão/Espanha (C‑48/10, EU:C:2010:704, n.o 33 e jurisprudência referida).


44      V. n.o 126 das presentes conclusões.


45      V., neste sentido, Acórdão de 15 de dezembro de 2009, Comissão/Alemanha, C‑372/05, EU:C:2009:780, n.o 33.


46      V. n.o 77 das presentes conclusões.


47      V. n.os 116 e segs. da contestação.


48      V. n.o 28 desse relatório.


49      Esta primeira garantia aprovava efetivamente os esforços e as medidas adotadas pelo Reino Unido para realizar esses progressos até junho de 2014 e não apenas, como alega erradamente a Comissão, os projetos futuros previstos por este Estado.


50      Ora, segundo o Reino Unido, a Comissão estava bem informada à época do facto de, no âmbito do APC Discount, as autoridades britânicas terem efetuado controlos documentais com visitas de seguimento após a saída das mercadorias, mas não terem efetuado controlos prévios, nem controlo de amostras, ou pedido garantias.


51      V. Acórdão de 26 de maio de 1982, Alemanha e Bundesanstalt für Arbeit/Comissão (44/81, EU:C:1982:197, n.os 16 a 18).


52      Esta afirmação não pode ser posta em causa pelo princípio, consagrado pela jurisprudência, segundo o qual a confiança legítima não pode assentar numa prática ilegal (Acórdão de 11 de abril de 2018, SEB bankas, C‑532/16, EU:C:2018:228, n.o 50) e segundo o qual não se pode invocar uma confiança legítima contra uma disposição inequívoca de um diploma de direito da União [Acórdão de 7 de abril de 2011, Sony Supply Chain Solutions (Europe), C‑153/10, EU:C:2011:224, n.o 47].


53      V., neste sentido, Acórdãos de 11 de março de 1987, Van den Bergh en Jurgens e Van Dijk Food Products (Lopik)/CEE (265/85, EU:C:1987:121, n.o 44 e jurisprudência referida), e de 7 de abril de 2011, Grécia/Comissão (C‑321/09 P, EU:C:2011:218, n.o 45 e jurisprudência referida).


54      V., neste sentido, Acórdão de 19 de maio de 1992, Mülder e o./Conselho e Comissão (C‑104/89 e C‑37/90, EU:C:1992:217, n.o 15).


55      V., neste sentido, Acórdãos de 6 de dezembro de 2001, Grécia/Comissão (C‑373/99, ECLI:EU:C:2001:662, n.o 56); de 24 de abril de 2007, Comissão/Países Baixos (C‑523/04, EU:C:2007:244, n.o 28); e de 1 de junho de 2016, Hungria/Comissão (T‑662/14, EU:T:2016:328, n.o 57); e Despacho de 23 de março de 2011, Estónia/Comissão (C‑535/09 P, não publicado, EU:C:2011:171, n.os 72 e 73).


56      V., nomeadamente, Acórdãos de 7 de abril de 2011, Grécia/Comissão (C‑321/09 P, EU:C:2011:218, n.o 25), e de 19 de julho de 2016, Kotnik e o. (C‑526/14, EU:C:2016:570, n.o 62).


57      V., por analogia, no que respeita à cessação dentro dos prazos de incumprimento, Conclusões da advogada‑geral V. Trstenjak no processo Comissão/Alemanha (C‑536/07, ECLI:EU:C:2009:340, n.o 39).


58      V. primeira garantia invocada pelo Reino Unido, exposta no n.o 141 das presentes conclusões.


59      V. primeira garantia invocada pelo Reino Unido, exposta no n.o 140 das presentes conclusões.


60      V. segunda garantia invocada pelo Reino Unido, exposta no n.o 142 das presentes conclusões.


61      V., nomeadamente, mensagem de assistência mútua AM 2007/015, de 20 de abril de 2007, e orientações do ACP Discount de 2011.


62      V., neste sentido e por analogia, Acórdão de 24 de abril de 2007, Comissão/Países Baixos (C‑523/04, EU:C:2007:244, n.o 28 e jurisprudência referida), e de 6 de outubro de 2009, Comissão/Espanha (C‑562/07, EU:C:2009:614, n.o 18).


63      V., neste sentido, Acórdão de 15 de junho de 2000, Comissão/Alemanha (C‑348/97, EU:C:2000:317, n.o 45 e jurisprudência referida).


64      V., nomeadamente, n.os 114, 115 e 131 da contestação.


65      V. Acórdãos de 14 de abril de 2005, Comissão/Alemanha (C‑104/02, EU:C:2005:219, n.os 48 a 51), e de 5 de outubro de 2006, Comissão/Alemanha (C‑105/02, EU:C:2006:637, n.os 43 a 45).


66      C‑392/02, EU:C:2005:683.


67      Utilização do futuro na versão em língua inglesa.


68      N.o 237 da contestação, que cita o Acórdão de 14 de abril de 2005, Comissão/Alemanha (C‑104/02, EU:C:2005:219, n.os 48 a 51), e Acórdão de 5 de outubro de 2006, Comissão/Alemanha (C‑105/02, EU:C:2006:637, n.os 43 a 45).


69      Mais especificamente, nesses processos a Comissão pedia ao Tribunal de Justiça que declarasse, respetivamente, que a República Federal da Alemanha era «obrigada a pagar ao orçamento comunitário os juros devidos em caso de inscrição tardia na contabilidade» (Acórdão de 14 de abril de 2005, Comissão/Alemanha, C‑104/02, EU:C:2005:219, n.o 1) e a «creditar imediatamente na conta da Comissão os recursos próprios não pagos devido aos incumprimentos» (Acórdão de 5 de outubro de 2006, Comissão/Alemanha, C‑105/02, EU:C:2006:637, n.o 1).


70      Acórdãos de 14 de abril de 2005, Comissão/Alemanha (C‑104/02, EU:C:2005:219, n.os 49 e 50), e de 5 de outubro de 2006, Comissão/Alemanha (C‑105/02, EU:C:2006:637, n.os 44 e 45).


71      Acórdãos de 14 de abril de 2005, Comissão/Alemanha (C‑104/02, EU:C:2005:219, n.o 49), e de 5 de outubro de 2006, Comissão/Alemanha (C‑105/02, EU:C:2006:637, n.o 44).


72      V. von Bardeleben, E., Donnat, F., e Siritzky, D., La Cour de justice de l’Union européenne et le droit du contentieux européen, La Documentation française, Paris, 2012, p. 196, e Conclusões da advogada‑geral E. Sharpston no processo Comissão/República Checa (Mecanismo temporário de recolocação de requerentes de proteção internacional) (C‑719/17, EU:C:2019:917, n.o 100).


73      V., por exemplo, Acórdãos de 21 de setembro de 1989, Comissão/Grécia (68/88, EU:C:1989:339); de 15 de novembro de 2005, Comissão/Dinamarca (C‑392/02, EU:C:2005:683; de 3 de abril de 2014, Comissão/Reino Unido (C‑60/13, não publicado, EU:C:2014:219); e, mais recentemente, de 11 de julho de 2019, Comissão/Itália (Recursos próprios — Cobrança de uma dívida aduaneira) (C‑304/18, não publicado, EU:C:2019:601).


74      Acórdão de 15 de novembro de 2005 (C‑392/02, EU:C:2005:683, n.os 31 a 34).


75      Acórdão de 11 de julho de 2019 Comissão/Itália (Recursos próprios — Cobrança de uma dívida aduaneira) (C‑304/18, não publicado, EU:C:2019:601, n.o 76 e dispositivo).


76      V. Acórdão de 9 de julho de 2020, República Checa/Comissão (C‑575/18 P, EU:C:2020:530, n.o 68).


77      V. Acórdão de 11 de julho de 2019 Comissão/Itália (Recursos próprios — Cobrança de uma dívida aduaneira) (C‑304/18, não publicado, EU:C:2019:601).


78      É útil recordar que este artigo 325.o TFUE é o sucessor do artigo 280.o CE, que entrou em vigor com o Tratado de Amesterdão em 1999, que constituía, ele próprio, uma evolução do anterior artigo 209.o‑A do Tratado de Maastricht de 1992.


79      Os Estados‑Membros verificam os recursos próprios tradicionais e comunicam os montantes dos direitos apurados à Comissão. Assim, a Convenção relativa à proteção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias foi introduzida pelo Ato do Conselho de 26 de julho de 1995 (Ato do Conselho, de 26 de julho de 1995, que estabelece a Convenção relativa à proteção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias, JO 1995, C 316, p. 48).


80      Esses montantes são comunicados à Comissão através dos extratos mensais da contabilidade A. Os direitos apurados que não tenham sido inscritos na contabilidade A por não terem sido cobrados pelos Estados‑Membros e por não ter sido prestada qualquer garantia (ou mesmo que tenha sido prestada uma garantia, quando os direitos são, ainda assim, objeto de contestação) figuram numa contabilidade separada. Estes direitos são objeto de uma depreciação em função das informações transmitidas anualmente pelos Estados‑Membros.


81      Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho e ao Tribunal de Contas — Contas anuais consolidadas da União Europeia de 2017 (JO 2018, C 348, p. 1).


82      SWD (2013) 483 final.


83      V. Djurdjevic, Z., «Fraud adversely affecting the budget of the European Union: the forms, methods and causes», Financial Theory and Practice, 2006, vol. 30, pp. 254 e 255.


84      Quanto à definição dos conceitos de «fraude» e de «quaisquer outras atividades ilegais», na aceção do artigo 325.o TFUE, e à sua distinção, v. Conclusões do advogado‑geral M. Bobek no processo Scialdone (C‑574/15, EU:C:2017:553, n.os 65 e segs.). Sobre a evolução histórica desta disposição, antes do Tratado de Lisboa (artigo 209.o‑A do Tratado CE), v. Conclusões do advogado‑geral F. G. Jacobs no processo Comissão/BCE (C‑11/00, EU:C:2002:556).


85      V., nomeadamente, Acórdãos de 8 de setembro de 2015, Taricco e o. (C‑105/14, EU:C:2015:555, n.os 50 e 51), e de 5 de dezembro de 2017, M.A.S. e M.B. (C‑42/17, EU:C:2017:936, n.o 38). Por outro lado, o Tribunal de Justiça recordou que, embora os Estados‑Membros estejam obrigados a tomar medidas efetivas que permitam recuperar os montantes indevidamente pagos ao beneficiário de uma subvenção parcialmente financiada pelo orçamento da União, o artigo 325.o TFUE não lhes impõe todavia nenhuma obrigação além da relativa ao caráter efetivo das medidas, quanto ao processo que deve permitir chegar a esse resultado [Acórdão de 1 de outubro de 2020, Úrad špeciálnej prokuratúry (C‑603/19, EU:C:2020:774, n.o 55)].


86      V., neste sentido, Acórdãos de 8 de setembro de 2015, Taricco e o. (C‑105/14, EU:C:2015:555, n.o 51); de 5 de dezembro de 2017, M.A.S. e M.B. (C‑42/17, EU:C:2017:936, n.o 38), e de 5 de junho de 2018, Kolev e o. (C‑612/15, EU:C:2018:392, n.os 51 a 53).


87      V., nomeadamente, Acórdão de 31 de outubro de 2019, Comissão/Reino Unido (C‑391/17, EU:C:2019:919, n.o 70).


88      V. Acórdãos de 11 de outubro de 1990, Itália/Comissão (C‑34/89, EU:C:1990:353, n.o 12); de 21 de fevereiro de 1991, Alemanha/Comissão (C‑28/89, EU:C:1991:67, n.o 31), e de 21 de janeiro de 1999, Alemanha/Comissão (C‑54/95, EU:C:1999:11, n.o 66).


89      V., nomeadamente, Conclusões do advogado‑geral M. Bobek no processo Scialdone (C‑574/15, EU:C:2017:553, n.o 75 e segs.). A sobreposição substantiva das obrigações impostas pelo artigo 325.o, n.o 2, TFUE e do princípio da cooperação leal estabelecido no artigo 4.o, n.o 3, TUE tem a sua origem na génese da primeira dessas disposições. De certa forma, o artigo 325.o, n.o 2, TFUE representa uma codificação da jurisprudência do Tribunal de Justiça sobre o princípio da cooperação leal num domínio específico. Além disso, é jurisprudência constante que, se uma regulamentação do direito da União não previr sanções para os casos de violação da mesma, ou remeter para as disposições jurídicas e administrativas nacionais, os Estados‑Membros são obrigados, por força do artigo 4.o, n.o 3, TUE, a adotar todas as medidas adequadas para garantir a aplicação e a eficácia do direito da União [(v., por exemplo, Acórdãos de 21 de setembro de 1989, Comissão/Grécia (68/88, EU:C:1989:339, n.o 23), e de 15 de janeiro de 2004, Penycoed (C‑230/01, EU:C:2004:20, n.o 36)].


90      O mesmo não acontece no que respeita à aplicação deste princípio no contexto das críticas da Comissão relativas à comunicação dos documentos e dos elementos para que esta possa determinar os montantes em causa. Estas críticas serão examinadas na secção D das presentes conclusões.


91      V., neste sentido, Acórdão de 8 de julho de 2010, Comissão/Itália (C‑344/08, EU:C:2010:414, n.o 39).


92      V., por analogia, Acórdão de 26 de fevereiro de 2013, Åkerberg Fransson (C‑617/10, EU:C:2013:105, n.o 26), no qual o Tribunal de Justiça estabeleceu a «relação direta» entre as receitas provenientes da aplicação de uma taxa uniforme à matéria coletável harmonizada do IVA e os recursos próprios, que tem por consequência que qualquer falha na cobrança das primeiras está potencialmente na origem de uma redução dos segundos.


93      Segundo a jurisprudência, embora os Estados‑Membros estejam obrigados a garantir o respeito das obrigações a que estão submetidos os sujeitos passivos do IVA e beneficiem, a este respeito, de uma certa margem no que respeita, nomeadamente, à maneira de utilizar os meios de que dispõem, esta margem é, todavia, limitada, nomeadamente, pela obrigação de garantir uma cobrança eficaz dos recursos próprios da Comunidade (Acórdão de 17 de julho de 2008, Comissão/Itália, C‑132/06, EU:C:2008:412, n.os 21 e 37 a 39). V., por outro lado, artigo 3.o, alíneas a) a d), do Código Aduaneiro da União.


94      V., nomeadamente, Acórdãos de 7 de abril de 2016, Degano Trasporti (C‑546/14, EU:C:2016:206, n.os 20 e 21); de 5 de dezembro de 2017, M.A.S. e M.B. (C‑42/17, EU:C:2017:936, n.os 33 a 36); e de 17 de janeiro de 2019, Dzivev e o. (C‑310/16, EU:C:2019:30, n.os 27, 30, 34 e jurisprudência referida).


95      V. Acórdãos de 17 de julho de 2008, Comissão/Itália (C‑132/06, EU:C:2008:412) e de 11 de dezembro de 2008, Comissão/Itália (C‑174/07, não publicado, EU:C:2008:704), nos quais o Tribunal de Justiça considerou que a República Italiana não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força dos artigos 2.o e 22.o da Sexta Diretiva 77/388/CEE, e do artigo 10.o CE (atual artigo 4.o, n.o 3, TUE). Embora, com efeito, uma regulamentação da União não preveja sanções para os casos de violação da mesma, ou remeta para as disposições legais e administrativas nacionais, os Estados‑Membros são obrigados, por força do artigo 4.o, n.o 3, TUE, a adotar todas as medidas adequadas para garantir a aplicação e a eficácia do direito da União [jurisprudência constante desde o Acórdão de 21 de setembro de 1989, Comissão/Grécia (68/88, EU:C:1989:339, n.o 23)].


96      Conclusões do advogado‑geral Y. Bot no processo M.A.S. e M.B. (C‑42/17, EU:C:2017:564, n.o 83).


97      Com efeito, nos termos dos n.os 34 e 35 do Acórdão de 5 de dezembro de 2017, M.A.S. e M.B. (C‑42/17, EU:C:2017:936), independentemente da margem de apreciação de que os Estados‑Membros dispõem para escolher os mecanismos repressivos, devem tipificar como infrações penais os casos de fraude grave, para assegurar uma proteção eficaz dos interesses financeiros da União. Assim, nas conclusões citadas pelo Reino Unido, o advogado‑geral Y. Bot considerou que um direito só é efetivo se a sua violação for punida, devendo o quadro jurídico nacional para punir as fraudes ao IVA ser adequado para evitar o risco de impunidade [Conclusões do advogado‑geral Y. Bot no processo M.A.S. e M.B. (C‑42/17, EU:C:2017:564, n.os 82 a 87)]. Quanto à exigência de efetividade, v., igualmente, Conclusões do advogado‑geral M. Bobek no processo Scialdone (C‑574/15, EU:C:2017:553, n.o 77).


98      V. Acórdão de 8 de julho de 2010, Comissão/Itália (C‑334/08, EU:C:2010:414, n.o 49).


99      V. n.o 175 das presentes conclusões.


100      Por esta razão, por força do artigo 2.o, n.o 3, da Decisão 2014/335, os Estados‑Membros retêm 20 % dos direitos aduaneiros a título de despesas de cobrança. Esta percentagem era de 25 %, em conformidade com o artigo 2.o, n.o 3, da Decisão 2007/436.


101      V. Acórdãos de 16 de maio de 1991, Comissão/Países Baixos (C‑96/89, EU:C:1991:213, n.o 37); de 15 de junho de 2000, Comissão/Alemanha (C‑348/97, EU:C:2000:317, n.o 64); e de 18 de outubro de 2007, Comissão/Dinamarca (C‑19/05, EU:C:2007:606, n.o 18).


102      Resulta da jurisprudência que existe um nexo indissociável entre a obrigação de verificar a existência da dívida aduaneira e a de a lançar na conta da Comissão nos prazos fixados, eventualmente acrescida de juros de mora, dependendo esse nexo indissociável do apuramento dos recursos próprios e não podendo estar dependente do comportamento arbitrário ou negligente de um Estado‑Membro, como sublinhou o advogado‑geral L. A. Geelhoed nas suas Conclusões no processo Comissão/Dinamarca (C‑392/02, EU:C:2005:142, n.o 57). Por outro lado, os Estados‑Membros devem apurar os créditos, mesmo que os contestem. Não havendo esse apuramento, o Estado‑Membro em causa corre o risco de perturbar o equilíbrio financeiro da União, ainda que apenas temporariamente [v., neste sentido, Acórdãos de 18 de outubro de 2007 (Comissão/Dinamarca, C‑19/05, EU:C:2007:606); de 16 de maio de 1991 (Comissão/Países Baixos, C‑96/89, EU:C:1991:213, n.o 38); e de 15 de junho de 2000 (Comissão/Alemanha, C‑348/97, EU:C:2000:317, n.o 11)]. Daqui decorre, em meu entender, que um Estado‑Membro não pode, unilateralmente, eximir‑se a apurar os créditos.


103      V. Acórdãos de 12 de maio de 2005, Comissão/Bélgica (C‑287/03, EU:C:2005:282, n.o 27 e jurisprudência referida), e de 19 de maio de 2011, Comissão/Malta (C‑376/09, EU:C:2011:320, n.o 32 e jurisprudência referida).


104      V., neste sentido, Acórdão de 17 de março de 2011, Comissão/Portugal (C‑23/10, não publicado, EU:C:2011:160, n.o 54) do qual resulta, mutatis mutandis, que o facto de não eliminar os riscos da fraude aduaneira e de não adotar medidas relativas a esses riscos só pode ser imputado aos Estados‑Membros se as suas autoridades tinham conhecimento desses riscos durante o período de infração.


105      Relatório OLAF, resumo e ponto 6.


106      V. n.o 2.6 do relatório de uma empresa de consultadoria anexo à resposta do Reino Unido de 11 de fevereiro de 2019.


107      N.o 2.4 do relatório de uma empresa de consultadoria anexo à resposta do Reino Unido de 11 de fevereiro de 2019.


108      O Reino Unido sustenta igualmente que o Tribunal de Justiça deve rejeitar qualquer alegação de incumprimento relativa ao período anterior a junho de 2015, dado que só nesse momento, quando o OLAF enviou uma mensagem de assistência mútua formal aos Estados‑Membros (AM/2015/013, de 16 de junho de 2015), recomendando que fossem tomadas certas medidas de controlo para combater essa fraude, é que o Reino Unido teve conhecimento suficiente da referida fraude.


109      Nomeadamente na reunião ad hoc de 25 e 26 de fevereiro de 2015 organizada pela Comissão. Nessa reunião, o OLAF «recomendou fortemente», nomeadamente, que os Estados‑Membros utilizassem filtros de risco adequados para identificar envios potencialmente subavaliados, que exigissem garantias para os envios identificados como suspeitos e que conduzissem inquéritos a fim de determinar o valor aduaneiro.


110      Ou seja, durante a operação Octopus.


111      Segundo este Estado‑Membro, resulta da mensagem de assistência mútua AM/2015/013 de 16 de junho de 2015, que é uma mensagem formal de assistência mútua enviada pelo OLAF aos Estados‑Membros e do n.o 83 do Relatório Especial n.o 24/2015 do Tribunal de Contas Europeu, com o título «Luta contra a fraude ao IVA intracomunitário: são necessárias mais medidas»,  que as autoridades britânicas não estavam cientes da existência de uma prática generalizada de falsas declarações perante as alfândegas.


112      V. mensagem de assistência mútua AM 2007/015, de 20 de abril de 2007. Por outro lado, esta mensagem de assistência mútua já indicava, após um inquérito inicial, a existência deste problema detetado na Alemanha em 2005.


113      Esta mensagem de assistência mútua já instava «todos os Estados‑Membros» a procurar «eventuais indícios de manutenção das faturas [para produtos têxteis e calçado provenientes da China] em níveis artificialmente baixos»; a «determinar o valor real […] das mercadorias [perante esses indícios de subavaliação]»; a «proceder a controlos adequados aquando dos desalfandegamentos efetuados no futuro sobre [tais importações]», e a «tomar medidas de proteção adequadas».


114      V. mensagem de assistência mútua AM 2007/015, de 20 de abril de 2007, nomeadamente, n.o 12.


115      V. mensagem de assistência mútua AM 2009/001, de 23 de janeiro de 2009, nomeadamente, n.os 10 a 12. Chamava igualmente a atenção dos Estados‑Membros, a este respeito, para os conselhos que o OLAF já tinha dado na mensagem de assistência mútua AM 2007/015, de 20 de abril de 2007. Mais especificamente, pedia a todos os Estados‑Membros que «identificassem os envios de alto risco» e «verificassem a existência dos importadores». Por outro lado, importa sublinhar que a mensagem de assistência mútua AM 2015/013, invocada nomeadamente pela República Portuguesa no seu articulado de intervenção, recorda as advertências enviadas pelo OLAF aos Estados‑Membros nas mensagens AM 2007/015 e AM 2009/001.


116      Trata‑se dos instrumentos previstos nos artigos 17.o, n.o 2, e 18.o, n.o 1, do Regulamento (CE) n.o 515/97 do Conselho, de 13 de março de 1997, relativo à assistência mútua entre as autoridades administrativas dos Estados‑Membros e à colaboração entre estas e a Comissão, tendo em vista assegurar a correta aplicação das regulamentações aduaneira e agrícola (JO 1997, L 82, p. 1). Nos termos deste artigo 17.o, n.o 2, «[a] Comissão comunicará às autoridades competentes de cada Estado‑Membro, logo que delas disponha, todas as informações que lhes permitam assegurar o cumprimento das regulamentações aduaneira ou agrícola». O artigo 18.o, n.o 1, dispõe que «[a] Comissão comunicará essas informações [transmitidas pelas autoridades competentes de um Estado‑Membro, que tomaram conhecimento de operações que sejam ou pareçam ser contrárias às regulamentações aduaneira e agrícola e se revestem de interesse especial no plano comunitário] às autoridades competentes dos outros Estados‑Membros».


117      Quanto à competência da União no domínio da União Aduaneira e ao exercício das funções de controlo pelas autoridades nacionais, v. Albert, J.‑L., «Section 1 — Un pluralisme national préservé», Le droit douanier de l’Union européenne, Bruxelas, Bruylant, 2019, p. 466 a 473, e Natarel, V. E., «Le phénomène douanier dans le marché intérieur: à propos de l’exemple français», Revue des affaires européennes, 2005, n.o 4, p. 637.


118      O Reino Unido invoca igualmente o resumo das conclusões da reunião do Comité do Código Aduaneiro, de 9 de março de 2012, para alegar que nem o OLAF nem os Estados‑Membros conheciam plenamente o alcance da fraude em março de 2012. Resulta desse documento que as informações aí contidas apenas foram reiteradas. V. resumo das conclusões da reunião do Comité do Código Aduaneiro de 9 de março de 2012, n.o 5, alínea b).


119      As operações aduaneiras conjuntas, como a operação Snake, constituem uma «vigilância especial» na aceção do artigo 7.o do Regulamento n.o 515/97, mais especificamente, em conformidade com o ponto c) deste artigo, uma vigilância especial da circulação de mercadorias identificadas como objeto de potenciais violações da legislação aduaneira. O objetivo da operação é, nomeadamente, coordenar a ação dos Estados‑Membros a nível da União a fim de melhor combater uma fraude específica.


120      V. Relatório Especial n.o 19/2017 do Tribunal de Contas, com o título «Procedimentos de importação: as insuficiências do quadro jurídico e uma aplicação ineficaz têm impacto sobre os interesses financeiros da UE», n.o 94.


121      Assim, deve ser afastado o argumento avançado pelo Reino Unido segundo o qual foi em 16 de junho de 2015 que o OLAF, quando enviou aos Estados‑Membros a mensagem de assistência mútua AM 2015/013, pediu, pela primeira vez, que estes adotassem medidas específicas para lutar contra a fraude de subavaliação.


122      Relatório Especial n.o 24/2015, já referido na nota 111 das presentes conclusões. A este respeito, este Estado‑Membro cita o ponto 83 desse relatório, no qual o Tribunal de Contas indicou que uma operação aduaneira conjunta com o OLAF tinha permitido constatar que «40 % [dos têxteis e calçado originário da China] [introduzidos] em livre prática ao abrigo do procedimento aduaneiro 42 foram subavaliad[o]s».


123      A metodologia OLAF utiliza uma média dos preços dos Estados‑Membros calculada num período de 48 meses.


124      Acórdão de 16 de junho de 2016, C‑291/15, EU:C:2016:455, n.os 38 e 39.


125      Acórdão de 17 de março de 2011, C‑23/10, não publicado, EU:C:2011:160, n.os 50 e 54.


126      V. n.o 55 das presentes conclusões.


127      Acórdão de 16 de junho de 2016, C‑291/15, EU:C:2016:455.


128      Acórdão de 17 de março de 2011, C‑23/10, não publicado, EU:C:2011:160, n.os 50 e 54.


129      Observo que, na sua petição inicial, a Comissão se refere, é certo, à violação do princípio geral da cooperação leal previsto no artigo 4.o, n.o 3, TUE como base jurídica do primeiro fundamento. Todavia, como foi já exposto no n.o 174 das presentes conclusões, o artigo 325.o TFUE e as disposições aduaneiras em causa devem ser consideradas expressão específica desse princípio geral, de modo que não há que analisar a violação da obrigação geral da cooperação leal no âmbito do presente fundamento.


130      V. n.os 175 a 177 das presentes conclusões.


131      Parece‑me que, por um lado, a Comissão, ao admitir que deve demonstrar, na sua petição, que as medidas adotadas pelo Reino Unido não eram efetivas, aceita este argumento de defesa deste Estado. Por outro lado, a Comissão contesta o argumento do Reino Unido segundo o qual não está obrigada a demonstrar que as eventuais medidas adotadas por este Estado eram manifestamente inadequadas. Ora, tendo em conta o objetivo de luta contra a fraude previsto no artigo 325.o TFUE, estes argumentos equivalem, na realidade, a dizer a mesma coisa por outras palavras.


132      Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de abril de 2005, que altera o Regulamento n.o 2913/92 (JO 2005, L 117, p. 13).


133      Regulamento (CE) n.o 1875/2006 da Comissão, de 18 de dezembro de 2006, que altera o Regulamento n.o 2454/93 (JO 2006, L 360, p. 64).


134      Trata‑se do sistema de controlo das importações denominado «Import Control System» (ICS) que entrou em vigor em 1 de janeiro de 2011. Esta regulamentação concretizava o programa internacional lançado originariamente pelos Estados Unidos («Customs Trade Partnership Against Terrorism») e, posteriormente, em 2005, pela Organização Mundial das Alfândegas (OMA), que estabelece, nomeadamente, o quadro das normas ditas «SAFE» destinadas a garantir a segurança das trocas de mercadorias sem prejudicar a sua fluidez, antecipando a remessa dos dados às autoridades competentes.


135      O sublinhado é meu. Além disso, o artigo 46.o, n.o 2, do Código Aduaneiro da União prevê que «os controlos aduaneiros que não sejam aleatórios devem basearse essencialmente na análise de risco utilizando técnicas de processamento eletrónico de dados, com o objetivo de identificar e avaliar os riscos e elaborar as contramedidas necessárias» (o sublinhado é meu).


136      Quanto à distinção entre o conceito de «gestão de risco» e de «análise de risco», v. Drobot, E., e Klevleeva, A., «Risk management in customs control», Munich Personal RePEc Archive, 2016. Todavia, à luz das disposições do artigo 46.o do Código Aduaneiro da União e dos trabalhos preparatórios do artigo 13.o, n.o 2, do Código Aduaneiro Comunitário, a expressão «gestão do risco» parece visar a gestão nacional ou comum (a nível da União) do risco. Parece‑me que o conceito de «análise de risco» se refere especificamente à análise efetuada pelos Estados, no âmbito do controlo aduaneiro, com o objetivo de «identificar e avaliar os riscos e elaborar as contramedidas necessárias».


137      V. Widdowson, D., «Managing risk in the customs context», in De Wolf, L., e Sokol, J. B. (eds), Customs Modernization Handbook, Word Bank, Washington D.C., pp. 91 a 99.


138      V. Widdowson, D., op.cit. V., também, Dunne, M., «À propos de la gestion des risques», OMD Actualité, junho 2010, e Jacob, C., e Zaharia, S., «Risk management — a new priority system customs and its consequences», Munich Personal RePEc Archive Paper 39352, disponibilizado em 17 de junho de 2012.


139      Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que altera o Regulamento (CEE) n.o 2913/92 (COM/2003/0452 final), v. alteração do artigo 4.o


140      No entanto, tanto quanto é do meu conhecimento, não existe no direito da União uma definição do conceito de «análise de risco». A OMA qualifica‑a de «utilização sistemática da informação para determinar em que frequência se verificam os riscos determinados e a magnitude das suas consequências prováveis». V. Berr, C., Répertoire de droit commercial, Douanes, Dalloz, janeiro 2013 (atualização: março de 2019), n.o 68. V., também, o Recueil de l’OMD sur la gestion des risques en matière douanière, disponível in https://ec.europa.eu/taxation_customs/general‑information‑customs/customs‑risk‑management/international‑cooperation_fr#heading_2.


141      V. proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que altera o Regulamento n.o 2913/92 (COM/2003/0452 final), exposição dos motivos, ponto 3. V., também, comunicado IP/03/1100. Estas propostas foram aprovadas pelo Parlamento Europeu, pelo que o Regulamento n.o 648/2005 foi publicado no Jornal Oficial da União Europeia em 4 de maio de 2005 (JO 2005, L 117, p. 13) e entrou em vigor em 11 de maio de 2005.


142      V. proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que altera o Regulamento n.o 2913/92.


143      V. n.o 175 das presentes conclusões.


144      V. n.os 188 a 190 das presentes conclusões.


145      A Comissão invoca, aliás, a violação pelo Reino Unido da sua obrigação de adotar instrumentos de análise de risco num prazo razoável, sublinhando que este Estado deveria ter implementado esses instrumentos mais cedo.


146      O Reino Unido insiste no facto de que devia «dotar‑se de instalações adequadas para desenvolver e realizar controlos prévios fora do porto», «dedicar tempo e recursos consideráveis aos trabalhos preparatórios, à elaboração e à experimentação dos procedimentos aplicáveis aos controlos prévios tendo em conta a amplitude da fraude, mas também à implementação das correspondentes diretrizes operacionais, à elaboração a nível nacional das políticas e dos procedimentos em matéria de garantias relativas aos envios particulares suspeitos de fraude de subavaliação, à elaboração de um programa de vigilância dos operadores suspeitos e das suas cadeias de abastecimento, e à implementação de um programa de formação dos operadores».


147      É pacífico que, no âmbito da ACP Discount, que decorreu em novembro e dezembro de 2011, o Reino Unido não recorreu à análise de risco, quando as orientações desta operação previam, entre outras, a determinação de um limiar de risco a aplicar aos preços das mercadorias. Além disso, a operação Samurai, que teve lugar em setembro de 2016 e no âmbito da qual o Reino Unido teria levado a cabo ações de controlo e de aprendizagem antes do desalfandegamento, teve um alcance limitado, estendendo‑se unicamente a dois importadores em particular. A operação Breach, conduzida a partir de maio de 2015 e que ainda está em curso, segundo as afirmações do Reino Unido na audiência, apenas continha medidas destinadas a contestar a posteriori unicamente os valores considerados demasiado baixos para serem credíveis (v. Relatório OLAF, n.o 2, nomeadamente 2.1.6 e 2.3 e, também, «Guidlines for preventing and detecting irregularities (under‑invoicing) in imports of têxteis and footwear», n.os 5 a 9).


148      Assim, resulta da ata da reunião entre a HMRC e o OLAF de 13 de junho de 2014 que o Reino Unido ia conduzir inquéritos relativos aos importadores que eram suscetíveis de subavaliar as mercadorias. Foi salientado que, uma vez que as autoridades britânicas tinham tomado medidas posteriores à autorização de saída, era «pouco provável […] que qualquer dívida fosse cobrada».


149      No âmbito do presente fundamento importa examinar as críticas da metodologia OLAF enquanto instrumento de deteção dos riscos, fazendo parte da análise do segundo fundamento da presente ação a análise dessa metodologia enquanto base para calcular as perdas de recursos próprios tradicionais.


150      As críticas do Reino Unido relativas à utilização do mesmo método para calcular o défice de recursos próprios tradicionais serão examinadas no âmbito da análise do segundo fundamento da ação.


151      Após terem examinado os resultados da operação Snake, um certo número de Estados‑Membros, a saber, a República Checa, a Hungria, a República da Polónia, a República da Eslovénia e a República da Eslováquia, decidiram desenvolver o seu próprio sistema de limiar de preços aceitáveis, nomeadamente, devido à objeção formulada pela República Checa segundo a qual este Estado‑Membro dispunha de um nível de preço médio de mercadorias consideravelmente inferior. A Comissão acrescenta que a República da Polónia suscitou questões sobre a metodologia OLAF, pedindo ao JRC documentos suplementares para o efeito. Esta circunstância confirma, na minha opinião, que esta metodologia nunca foi considerada pela Comissão um método de avaliação obrigatório para os Estados‑Membros.


152      A vertente externa desta competência é a política comercial comum para a qual a União tem igualmente competência exclusiva por força do artigo 3.o, n.o 1, alínea e), TFUE, tendo as disposições do direito derivado como base jurídica, entre outros, o artigo 207.o TFUE que consagra essa política. No que respeita, nomeadamente, à determinação do valor aduaneiro, que está na origem da fraude aduaneira em causa, as disposições do Código Aduaneiro Comunitário e do Código Aduaneiro da União pretendem implementar o acordo relativo à aplicação do artigo VII do Acordo Geral sobre Pautas Aduaneiras e Comércio de 1994, que consta do anexo 1A do Acordo que institui a Organização Mundial do Comércio, sendo estas regras também um domínio de competência exclusiva da União [v., nomeadamente, Parecer 1/94 (Acordos anexos ao Acordo OMC), de 15 de novembro de 1994 (EU:C:1994:384, n.o 34), e Fabio, M., Customs Law of the European Union, 4.a ed., Wolters Kluwer, 2012, n.o 4.01].


153      A base jurídica do Código Aduaneiro da União é constituída pelos artigos 33.o, 114.o e 207.o TFUE.


154      Quanto à repartição das competências desde o Tratado de Lisboa, v. Grave J.‑M., «The Impact of the Lisbon Treaty on Customs Matters: A Legal Assessment», Global Trade and Customs Journal, vol. 5, n.o 3, 2010, p. 110. Quanto ao «federalismo executivo», v. Limbach, K., «Uniformity of Customs Administration in the European Union», Bloomsbury Publishing, Londres, novembro de 2015, p. 132.


155      Em matéria de controlo aduaneiro foram conferidos certos poderes aos Estados‑Membros, embora a doutrina evoque a «competência residual» dos Estados‑Membros no domínio aduaneiro (v., nomeadamente, Albert, J.‑L, «L’Union douanière, les apparences d’une solidarité européenne historique», Gestion & finances publiques, vol. 4, n.o 4, 2017, pp. 59 a 69, e Natarel, E., «Le phénomène douanier dans le marché intérieur: à propos de l’exemple français», Revue des affaires européennes, n.o 4, 2005, p. 637). Quanto ao «abandono» das competências tradicionais em matéria aduaneira dos Estados em benefício das autoridades da União, v., nomeadamente, Soulard, C., «Union douanière — Taxation des marchandises», JurisClasseur Europe, fasc. 500, 2016, n.os 35 e 58.


156      Por esta razão, o artigo 33.o TFUE prevê uma base jurídica relativa à cooperação aduaneira entre os Estados‑Membros e a Comissão. No que respeita, nomeadamente, à coordenação em matéria de fraude, importa acrescentar que o artigo 325.o, n.o 3, TFUE enuncia que os Estados‑Membros coordenarão as respetivas ações no sentido de defender os interesses financeiros da União contra a fraude, organizando, com a ajuda da Comissão, uma colaboração estreita e regular entre as autoridades competentes.


157      Anteriormente artigo 280.o CE.


158      V., por exemplo, Regulamento (CE, Euratom) n.o 2988/95 do Conselho, de 18 de dezembro de 1995, relativo à proteção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias (JO 1995, L 312, p. 1), Regulamento (Euratom, CE) n.o 2185/96 do Conselho, de 11 de novembro de 1996, relativo às inspeções e verificações no local efetuadas pela Comissão para proteger os interesses financeiros das Comunidades Europeias contra a fraude e outras irregularidades (JO 1996, L 292, p. 2), e Regulamento (CE) n.o 1073/1999 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de maio de 1999, relativo aos inquéritos efetuados pelo Organismo Europeu de Luta Antifraude (OLAF) (JO 1999, L 136, p. 1).


159      V., nomeadamente, Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho e ao Comité Económico e Social Europeu sobre Gestão dos Riscos Aduaneiros e Segurança do Circuito de Abastecimento, COM/2012/0793 final.


160      No que respeita, mais especificamente, à regulamentação aduaneira, o legislador da União previu uma obrigação de recorrer a uma análise de risco baseada nos «critérios definidos a nível nacional, comunitário e, sempre que possível, internacional». V. redações do artigo 13.o, n.o 2, do Código Aduaneiro Comunitário e do artigo 46.o, n.o 2, do Código Aduaneiro da União.


161      Resulta do artigo 17.o, n.o 1, TUE que a Comissão, nomeadamente, «promove o interesse geral da União», «[c]ontrola a aplicação do direito da União» e «[e]xerce funções de coordenação, de execução e de gestão em conformidade com as condições estabelecidas nos Tratados». Quanto à aplicação desta disposição em matéria aduaneira, v. Lyons, T., EC Customs Law, Oxford University Press, Oxford, 2018, p. 138.


162      V. Lyons, T., op. cit., p. 147.


163      Na «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho e ao Comité Económico e Social Europeu relativa à estratégia e ao plano de ação da UE sobre gestão dos riscos aduaneiros: enfrentar os riscos, reforçar a segurança da cadeia de abastecimento e facilitar o comércio» (COM/2014/527), a Comissão sublinhou que a «gestão dos riscos em matéria de circulação de mercadorias […] requer[ia] a capacidade para identificar, avaliar e analisar o vasto leque de ameaças e riscos associados às mercadorias e à sua circulação», devendo essa gestão «ter em conta a diversidade de riscos, […] bem como o seu impacto e consequências, caso esses riscos venham a materializar‑se, a fim de por em prática medidas de minimização e de controlo de riscos no momento e no local mais oportunos na cadeia de abastecimento» (v. anexo da comunicação, ponto 1).


164      V. Charroux, G. e Woerth, E., «Rapport sur l’évaluation de l’action de la douane dans la lutte contre les fraudes et trafics», de 3 de junho de 2015, para a Assembleia Nacional, Comité de Avaliação e Controlo das Políticas Públicas.


165      Embora a análise de risco tenha sido introduzida no Código Aduaneiro Comunitário em 2005, foram precisos nove anos para que a Comissão adotasse a comunicação citada na nota 163, que previa uma análise da implementação da política de gestão do risco em matéria aduaneira e propunha uma estratégia na matéria. V., nomeadamente, a «Estratégia da UE sobre gestão dos riscos aduaneiros», anexa a este documento e disponível em https://eur‑lex.europa.eu/legal‑content/EN/TXT/?uri=COM %3A2014 %3A0527 %3AFIN.


166      A Comissão acrescentou que, quando da reapreciação da ACP Discount (novembro e dezembro de 2011), efetuada pelos serviços da Comissão uma vez terminada a ação, verificou‑se um amplo consenso entre todos os Estados‑Membros sobre o facto de os limiares de preços justos deverem ser mantidos. Por esta razão, a operação Snake de 2014 aplicou novamente o preço mínimo aceitável fixado em 50 % do preço médio corrigido. Os Estados‑Membros não suscitaram a questão de uma alteração desse limiar aquando da análise dos resultados da operação Snake. Todavia, a Comissão confirma que nenhum Estado‑Membro pediu uma redução do preço mínimo aceitável.


167      V. Acórdão de 16 de junho de 2016, EURO 2004. Hungary (C‑291/15, EU:C:2016:455). No n.o 38 desse acórdão, o Tribunal de Justiça teve o cuidado de sublinhar que «a autoridade aduaneira em causa [tinha considerado] que o valor transacional declarado das mercadorias importadas era excecionalmente baixo em relação ao valor estatístico médio para a importação de mercadorias similares», confirmando assim que o «valor estatístico médio» das mercadorias pode ser utilizado para contestar a exatidão do valor aduaneiro declarado.


168      Este número foi formulado nestes termos desde a sua adoção [v. proposta de regulamento (CEE) do Conselho que estabelece o Código Aduaneiro Comunitário (COM/90/71 final, JO 1990, C 128, p. 1)] e é atualmente retomado de forma idêntica no artigo 46.o, n.o 1, do Código Aduaneiro da União. Quanto à evolução desta disposição, v. n.o 202 das presentes conclusões.


169      Além disso, observo que o artigo 5.o, n.o 3, do Código Aduaneiro da União, que define o conceito de «[c]ontrolos aduaneiros», inclui «os atos específicos executados pelas autoridades aduaneiras a fim de garantirem o cumprimento da legislação aduaneira e de outra legislação que regule a entrada, a saída, o trânsito, a circulação, o armazenamento e a utilização para fins especiais de mercadorias que circulem entre o território aduaneiro da União e países ou territórios que não façam parte desse território, bem como a presença e a circulação no território aduaneiro da União de mercadorias não‑UE e de mercadorias sujeitas ao regime de destino especial».


170      V., nomeadamente, Albert, J.‑L., Le droit douanière de l’Union européenne, Bruxelas», Bruylant, 2019, p. 525.


171      V., nomeadamente, artigo 73.o do Código Aduaneiro da União e Conclusões do advogado‑geral N. Jääskinen no processo Codirex Expeditie (C‑542/11, EU:C:2013:123, n.os 51 e segs.).


172      V. n.os 175 a 177 das presentes conclusões.


173      Quanto à missão das autoridades aduaneiras nos termos desta disposição, v. Lyons, T., op. cit., p. 72 e segs.


174      O Reino Unido afirma que a operação Breach implicava também controlos prévios. Todavia, há que observar, por um lado, que o Reino Unido não precisou em que é que esses controlos consistiam, e, por outro, que a fase de intervenção dessa operação durou unicamente dois dias. V. ata da reunião de 3 de fevereiro de 2016.


175      V. n.os 175 a 177 das presentes conclusões.


176      A ineficácia das medidas adotadas e a sua ausência são corroboradas por relatórios de missões de inspeção conduzidas durante esse período. A Comissão salienta ter identificado várias remessas específicas que apresentavam valores declarados muito baixos durante o período em causa. A título de exemplo, resulta do Relatório de Inspeção 17‑11‑1 que as autoridades britânicas confirmaram que não tinham posto em prática as medidas solicitadas pelo OLAF na sequência da operação Snake em 2014 e que este tinha novamente reclamado no Relatório de Inspeção 16‑11‑1. Além disso, resulta do Relatório de Inspeção 17‑11‑2 que cinco lotes importados em 29 de setembro de 2017 e selecionados pelos agentes da Comissão apresentavam, em média, um valor declarado que se situava a apenas 3,3 % do preço médio corrigido. A HMRC confirmou que os envios posteriores declarados por esses operadores tinham sido intercetados e que tinham sido emitidas ordens de cobrança de direitos adicionais no âmbito da operação Swift Arrow.


177      Acórdão de 17 de março de 2011, C‑23/10, não publicado, EU:C:2011:160, n.o 50.


178      Como resulta do Código Aduaneiro da União, o direito aduaneiro da União encoraja esse intercâmbio de tais informações. Mais particularmente, resulta do artigo 46.o, n.o 3, desse código que os controlos aduaneiros devem ser realizados dentro de um quadro comum de gestão do risco, baseado no intercâmbio de informações sobre riscos e resultados de análises de risco entre administrações aduaneiras e que defina […] critérios e normas comuns de riscos, medidas de controlo e áreas de controlo prioritárias.


179      Acórdão de 17 de março de 2011, C‑23/10, não publicado, EU:C:2011:160.


180      O artigo 248.o do regulamento de aplicação reproduz, em muito larga medida, os termos do artigo 20.o da Diretiva 82/57/CEE da Comissão, de 17 de dezembro de 1981, que fixa determinadas disposições de aplicação da Diretiva 79/695/CEE do Conselho relativa à harmonização dos procedimentos de introdução em livre prática de mercadorias (JO 1982, L 28, p. 38), ao passo que o artigo 244.o do regulamento de execução visa implementar as disposições do título V, capitulo 3, secção 1, intitulada «Conferência», do Código Aduaneiro da União.


181      Disposição que esteve em vigor desde o início do período de infração até 1 de maio de 2016.


182      Com efeito, as versões em língua espanhola, alemã, estónia, inglesa, francesa e italiana do artigo 248.o do regulamento de aplicação parecem indicar que a autorização de saída está obrigatoriamente sujeita à constituição de uma garantia.


183      Versão em língua alemã: «Sind die Zollbehörden der Auffassung, dass aufgrund einer Überprüfung der Zollanmeldung höhere Einfuhr‑ oder Ausfuhrabgaben oder andere Abgaben zu entrichten sein könnten als aufgrund der Angaben in der Zollanmeldung, so kann die Überlassung der Waren von einer Sicherheitsleistung abhängig gemacht werden, die die Differenz zwischen dem aufgrund der Angaben in der Zollanmeldung ermittelten Betrag und dem Betrag abdeckt, der letztlich zu entrichten sein könnte.» Versão em língua estónia: «Kui toll leiab, et tollideklaratsiooni õigsuse kontrollimisest tulenev impordi‑ või eksporditollimaksu või muude tasutavate maksude summa võib olla suurem kui tollideklaratsiooni andmetest tulenev summa, võib kauba vabastamine sõltuda tagatise esitamisest, mis on piisav deklaratsiooni andmete põhjal kindlaksmääratud summa ja hiljem tasumisele kuuluda võiva lõppsumma vahe tasumiseks.» (Sublinhado meu).


184      V., nomeadamente, Acórdão Profisa (C‑63/06, EU:C:2007:233, n.o 13 e jurisprudência aí referida).


185      V. Acórdão de 1 de fevereiro de 2001, D. Wandel (C‑66/99, EU:C:2001:69, n.o 36), e Despacho de 16 de setembro de 2014, Kyocera Mita Europe/Comissão (T‑35/11, não publicado, EU:T:2014:795, n.os 41 e 42). Observo que o artigo 194.o do Código Aduaneiro da União prevê obrigações semelhantes.


186      V. Lyons, T., op. cit., pp. 462 e 463.


187      V. n.o 177 das presentes conclusões.


188      Estes considerandos 36 e 37, relativos à constituição de garantias, evidenciam, nomeadamente, o objetivo de «salvaguardar os interesses financeiros da União e dos Estados‑Membros e prevenir as operações fraudulentas» e precisam que há que ter em conta o grau de risco e a situação particular dos operadores económicos em causa.


189      Esta tese relativa a um tratamento diferente dos operadores em função da sua «legitimidade» é corroborada, na minha opinião, pela existência de um estatuto especial, a saber, o estatuto de operador económico autorizado pelo Código Aduaneiro da União (artigo 38.o e segs.).


190      V. n.os 201 a 216 das presentes conclusões.


191      V., por analogia, Acórdão de 15 de dezembro de 2009, Comissão/Alemanha (C‑372/05, EU:C:2009:780, n.os 72 a 77).


192      Segundo as Anotações relativas à Carta, este artigo 17.o corresponde ao artigo 1.o do Primeiro Protocolo Adicional (JO 2007, C 303, p. 17).


193      O TEDH recordou, repetidamente, que o artigo 1.o do Primeiro Protocolo Adicional, que garante em substância o direito de propriedade, contém três normas distintas: a primeira, expressa na primeira frase do primeiro parágrafo e que reveste um caráter geral, enuncia o princípio do respeito pela propriedade; a segunda, que consta da segunda frase do mesmo parágrafo, visa a privação da propriedade e sujeita‑a a certas condições; quanto à terceira, consignada no segundo parágrafo, reconhece aos Estados contratantes o poder, entre outros, de regulamentar a utilização dos bens em conformidade com o interesse geral, pondo em vigor as leis que considera necessárias para esse fim. Não se trata, portanto, de regras desprovidas de relação entre elas. A segunda e terceira são relativas a exemplos particulares de violações do direito de propriedade; assim, devem ser interpretadas à luz do princípio previsto na primeira [v., nomeadamente, TEDH, 21 de fevereiro de 1986, James e o. c. Reino Unido (CE:ECHR:1986:0221JUD000879379, § 37), e TEDH, 16 de junho de 2015, Sargsyan c. Azerbaijão (CE:ECHR:2015:0616JUD004016706, § 217)].


194      V., nomeadamente, TEDH, 29 de abril de 2008, Burden c. Reino Unido (CE:ECHR:2008:0429JUD001337805, § 59).


195      V. TEDH, 23 de outubro de 1997, National & Provincial building society, Leeds permanent building society e Yorkshire building society c. Reino Unido (CE:ECHR:1997:1023JUD002131993, § 80).


196      V., a título de exemplo, Acórdão de 14 de janeiro de 2021, Okrazhna prokuratura — Haskovo e Apelativna prokuratura — Plovdiv (C‑393/19, EU:C:2021:8, n.o 31 e jurisprudência referida).


197      Quanto ao exemplo abstrato em que a obrigação financeira nascida da cobrança do imposto ou de uma contribuição pode lesar o direito de propriedade, v. TEDH, 3 de julho de 2003, Buffalo s.r.l. em liquidação c. Itália (CE:ECHR:2003:0703JUD003874697, em particular §§ 36 e 37).


198      O Reino Unido salienta que, no âmbito dessa operação, foram identificados 239 operadores de alto risco, e que foram notificadas ordens de cobrança a posteriori (aviso C18) a vários desses operadores. Este Estado afirma que, na referida operação «foram também realizadas cerca de trinta inspeções prévias e recolhidas amostras», sem precisar, todavia, quando e em que medida as amostras foram recolhidas e por que razão preferiu renunciar a exigir garantias antes de conceder a autorização de saída das mercadorias, quando a sua cobrança a posteriori é, por razões práticas, uma medida menos eficaz.


199      Relatório OLAF, ponto 2.1.4.


200      Segundo os seus articulados, a Comissão não pode confirmar o número acima referido apresentado pelo Reino Unido.


201      Segundo a Comissão, estes dados demonstram não só que o Reino Unido era responsável por 74,60 % das perdas de recursos próprios tradicionais devidas à subavaliação dos produtos têxteis e do calçado proveniente da China em 2015, de 79,15 % dessas perdas em 2016 e de 66,90 % dessas mesmas perdas em 2017, mas igualmente que, desde o lançamento da operação Swift Arrow e da sua ampliação progressiva, este número baixou consideravelmente, uma vez que, por exemplo, era de 33,86 % em novembro de 2017 e de 4,73 % em junho de 2018 (base de dados de Surveillance 2 para as importações de produtos têxteis e de calçado provenientes da China). A Comissão explica igualmente que, embora o Reino Unido tenha tomado medidas relativamente limitadas (verificando apenas alguns operadores, com base em limiares de baixo valor, apenas em alguns portos), as importações subavaliadas diminuíram de forma espetacular e quase imediata (menos 90 % em três meses e menos 96 % num ano).


202      O Reino Unido refere‑se, nomeadamente, às operações ACP Discount, Snake, Breach e Samurai.


203      V. n.os 235 a 240 das presentes conclusões.


204      Com efeito, embora resulte da jurisprudência do Tribunal de Justiça que os Estados‑Membros são obrigados a apurar um direito da União sobre os recursos próprios a partir do momento em que as autoridades aduaneiras estejam em condições de calcular o montante dos direitos resultante de uma dívida aduaneira e de determinar o devedor (Acórdãos de 23 de fevereiro de 2006, Comissão/Espanha, C‑546/03, não publicado, EU:C:2006:132, n.o 29; de 15 de novembro de 2005, Comissão/Dinamarca, C‑392/02, EU:C:2005:683, n.os 59 e 61; de 17 de junho de 2010, Comissão/Itália, C‑423/08, EU:C:2010:347, n.o 40, e de 17 de março de 2011, Comissão/Portugal, C‑23/10, não publicado, EU:C:2011:160, n.o 59), não é necessário que o registo de liquidação tenha efetivamente ocorrido (v., neste sentido, Acórdão de 15 de novembro de 2005, Comissão/Dinamarca, C‑392/02, EU:C:2005:683, n.o 58), o que implica que se trata de dois regimes jurídicos distintos.


205      Despacho de 9 de julho de 2008, Gerlach & Co. (C‑477/07, não publicado, EU:C:2008:390, n.o 22).


206      V., nomeadamente, Acórdãos de 16 de julho de 2009, Distillerie Smeets Hasselt e o. (C‑126/08, EU:C:2009:470, n.o 22), de 8 de novembro de 2012, KGH Belgium (C‑351/11, EU:C:2012:699, n.o 21), e Despacho de 9 de julho de 2008, Gerlach & Co. (C‑477/07, não publicado, EU:C:2008:390, n.o 17) relativos ao artigo 217.o, n.o 1, e ao artigo 220.o, n.o 1, do Código Aduaneiro Comunitário.


207      V. Acórdão de 17 de junho de 2010, Comissão/Itália (C‑423/08, EU:C:2010:347, n.os 37 e segs.).


208      V. Acórdão de 3 de abril de 2014, Comissão/Reino Unido (C‑60/13, não publicado, EU:C:2014:219, n.o 40). Para uma visão geral do regime dos recursos próprios, v. Albert, J.‑L., Le droit douanier de l’Union européenne, Bruylant, Bruxelas, 2019, pp. 132 a 144; Berlin, D., Politiques de l’Union européenne, Bruylant, Bruxelas, 2016, pp. 53 a 64, e Aubert, M.‑H., «Rapport: Système des ressources propres des Communautés européennes», Assembleia Nacional (documentos de informação da Assembleia Nacional. Décima primeira legislatura, n.o 3436), Paris, 2001.


209      Comissão Europeia, As finanças públicas da União Europeia, Serviço das Publicações Oficiais das Comunidades Europeias, Luxemburgo, 2007, p. 143.


210      Potteau, A., «Budget de l’Union européenne — Contenu du budget», JurisClasseur Europe Traité, fasc. 198, 4 de novembro de 2016, n.o 33.


211      Esta disposição corresponde ao artigo 2.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1150/2000.


212      V. Berlin, D., op. cit., n.o 34.


213      Esta disposição substituiu o artigo 2.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1150/2000.


214      O Tribunal de Justiça já declarou que «um direito considera‑se apurado desde que o crédito correspondente tenha sido devidamente estabelecido» (Acórdão de 22 de fevereiro de 1989, Comissão/Itália, 54/87, EU:C:1989:76). Para um exemplo mais recente, v. Acórdão de 3 de abril de 2014, Comissão/Reino Unido (C‑60/13, não publicado, EU:C:2014:219, n.o 43 e jurisprudência referida). A advogada‑geral E. Sharpston sustentou, aliás, que os Estados‑Membros não gozavam de qualquer margem a este respeito (Conclusões no processo República Checa/Comissão, C‑575/18 P, EU:C:2020:205, n.o 43).


215      Esta disposição substituiu o artigo 17.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1150/2000.


216      V., neste sentido, Acórdão de 5 de outubro de 2006, Comissão/Alemanha, C‑105/02, EU:C:2006:637, n.o 87.


217      O Tribunal de Justiça já decidiu que a disposição anterior, o artigo 2.o, n.o 1, dos Regulamentos n.o 1150/2000, deve ser interpretado no sentido de que os Estados‑Membros não podem deixar de apurar os créditos, mesmo que os contestem, sob pena de se aceitar que o equilíbrio financeiro da União seja perturbado, mesmo que temporariamente, pelo comportamento de um Estado‑Membro (Acórdão de 17 de março de 2011, Comissão/Portugal, C‑23/10, não publicado, EU:C:2011:160, n.o 58). V., também, Acórdãos de 15 de novembro de 2005, Comissão/Dinamarca (C‑392/02, EU:C:2005:683, n.os 54 e 60), e de 7 de abril de 2011, Comissão/Finlândia (C‑405/09, EU:C:2011:220, n.o 37 e jurisprudência referida).


218      V. Acórdão de 8 de julho de 2010, Comissão/Itália (C‑334/08, EU:C:2010:414, n.o 67).


219      O Tribunal de Justiça salienta que, em aplicação do artigo 6.o, n.o 3, alíneas a) e b), do Regulamento n.o 1150/2000, os Estados‑Membros são obrigados a lançar na contabilidade A os direitos apurados nos termos do artigo 2.o do mesmo regulamento, o mais tardar, no primeiro dia útil depois do dia 19 do segundo mês a seguir àquele em que o direito foi apurado, sem prejuízo da faculdade de lançar na contabilidade B, no mesmo prazo, os direitos apurados «ainda não cobrados» e para os quais não tenha «sido fornecida qualquer caução», bem como os direitos apurados e «cobertos por garantias, que sejam objeto de contestação e possam vir a sofrer variações na sequência de eventuais diferendos»» (Acórdão de 8 de julho de 2010, Comissão/Itália, C‑334/08, EU:C:2010:414, n.o 66 e jurisprudência referida).


220      V., a este respeito, Lyons, T., op. cit., pp. 52 e 53.


221      V. conclusões da advogada‑geral V. Trstenjak no processo Comissão/Itália (C‑275/07, EU:C:2008:334, n.o 82 e nota de rodapé 39).


222      V., nomeadamente, Acórdãos de 21 de setembro de 1989, Comissão/Grécia (C‑68/88, EU:C:1989:339, n.o 17); de 16 de maio de 1991, Comissão/Países Baixos (C‑96/89, EU:C:1991:213, n.o 38); e de 12 de junho de 2003, Comissão/Itália (C‑363/00, EU:C:2003:335, n.o 43).


223      V., nomeadamente, Acórdão de 11 de julho de 2019, Comissão/Itália (Recursos próprios — Cobrança de uma dívida aduaneira) (C‑304/18, não publicado, EU:C:2019:601, n.o 70 e jurisprudência referida).


224      V. jurisprudência referida na nota 222 das presentes conclusões.


225      V., neste sentido, conclusões do advogado‑geral C. O. Lenz no processo Comissão/Grécia (70/86, EU:C:1987:250).


226      Considerando 3 do Regulamento n.o 609/2014 e Acórdão de 22 de fevereiro de 1989, Comissão/Itália (54/87, EU:C:1989:76).


227      V., neste sentido, Acórdãos de 5 de outubro de 2006, Comissão/Bélgica (C‑275/04, EU:C:2006:641, n.o 68); de 5 de outubro de 2006, Comissão/Países Baixos (C‑312/04, EU:C:2006:643, n.o 54); de 5 de outubro de 2006, Comissão/Bélgica (C‑377/03, EU:C:2006:638, n.o 69); e de 19 de março de 2009, Comissão/Itália (C‑275/07, EU:C:2009:169, n.o 84).


228      V. Acórdãos de 8 de julho de 2010, Comissão/Itália (C‑334/08, EU:C:2010:414, n.o 50 e jurisprudência referida), e de 11 de julho de 2019, Comissão/Itália (Recursos próprios — Cobrança de uma dívida aduaneira) (C‑304/18, não publicado, EU:C:2019:601, n.o 61).


229      V., nomeadamente, Acórdão de 22 de fevereiro de 1989, Comissão/Itália (54/87, EU:C:1989:76).


230      V., neste sentido, Acórdão de 12 de junho de 2003, Comissão/Itália (C‑363/00, EU:C:2003:335, n.o 45 e jurisprudência referida).


231      V., neste sentido, Acórdãos de 3 de abril de 2014, Comissão/Reino Unido (C‑60/13, não publicado, EU:C:2014:219, n.o 50); de 17 de março de 2011, Comissão/Portugal (C‑23/10, não publicado, EU:C:2011:160, n.o 61 e jurisprudência referida); e de 11 de julho de 2019, Comissão/Itália (Recursos próprios — Cobrança de uma dívida aduaneira) (C‑304/18, não publicado, EU:C:2019:601, n.o 61).


232      Quanto ao número de avisos de pagamento C18 emitidos no âmbito da operação Snake, resulta das explicações do Reino Unido relativas ao anexo D.5 da tréplica, e das respostas do Reino Unido às questões colocadas pelo Tribunal de Justiça, que as suas autoridades emitiram 23 avisos de pagamento C18 de cerca de 201 828 809,62 GBP, sendo este valor revisto, na tréplica, em baixa no montante de 192 568 694,30 GBP, uma vez que nem todas as mercadorias em causa estão abrangidas pelo incumprimento em causa.


233      V. Acórdão de 17 de setembro de 1987, Comissão/Grécia (70/86, EU:C:1987:374).


234      V., neste sentido, Acórdão de 18 de dezembro de 1986, Comissão/Reino Unido (93/85, EU:C:1986:499).


235      V., neste sentido, Acórdão de 8 de julho de 2010, Comissão/Itália (C‑334/08, EU:C:2010:414). Para um comentário, v. Potteau, A., «Les finances publiques de l’Union européenne en 2008‑2009», Revue trimestrielle de droit européen, n.o 2, 2010, p. 380.


236      V. n.os 201 a 216 e 219 das presentes conclusões.


237      V. n.os 217 a 224 das presentes conclusões.


238      V. Acórdão de 15 de julho de 2010, Gaston Schul (C‑354/09, EU:C:2010:439, n.o 27 e jurisprudência referida).


239      V., neste sentido, Acórdão de 16 de junho de 2016, EURO 2004. Hungary (C‑291/15, EU:C:2016:455, n.o 29 e jurisprudência referida).


240      V. n.os 193 a 210 das presentes conclusões.


241      Anexo D.5 da tréplica.


242      Esta posição foi expressa pela Comissão logo a seguir à operação Snake (v. Relatório de Inspeção 16‑11‑1 que consta do anexo A.16 da petição inicial, ponto 3.1.1).


243      No que respeita aos avisos de pagamento C18 Snake, havia que determinar o valor aduaneiro das importações específicas e não a estimativa das perdas para os recursos próprios tradicionais. V., também, n.o 206 das presentes conclusões.


244      V. ata da reunião de 20 de fevereiro de 2015, anexo B.2 da contestação.


245      Resposta do Reino Unido de 22 de junho de 2018, n.o 147.


246      V., nomeadamente, Acórdão de 11 de julho de 2019, Comissão/Itália (Recursos próprios — Cobrança de uma dívida aduaneira) (C‑304/18, não publicado, EU:C:2019:601).


247      Este montante pode ter de ser reduzido em cerca de 25 milhões de GBP, ou seja, o montante inscrito na contabilidade B que corresponde às somas exigidas no aviso C18 resultantes da operação Breach, e relativas ao período de maio de 2015 a outubro de 2017.


248      O Reino Unido só o admite a título supletivo, na medida em que a sua defesa assenta na rejeição da existência das violações descritas no âmbito do primeiro fundamento, ao mesmo tempo que propõe, no âmbito do segundo fundamento, a sua própria metodologia para medir a perda dos recursos próprios tradicionais.


249      Anteriormente os artigos 29.o a 31.o do Código Aduaneiro Comunitário.


250      A expressão «meios razoáveis» implica, segundo o Reino Unido, que se trata de decisões que cabe ao Estado‑Membro tomar no âmbito da sua competência exclusiva, e que lhe deve ser concedida uma margem muito grande de apreciação nas suas escolhas de métodos e de avaliações. O Reino Unido tem de provar, não o caráter justo ou injusto da sua estimativa, mas apenas o seu caráter razoável. O ónus de provar que não é razoável incumbe totalmente à Comissão.


251      Observo que o artigo 74.o do Código Aduaneiro da União (antigo artigo 31.o do Código Aduaneiro Comunitário) prevê que, caso o valor aduaneiro não possa ser determinado nos termos do artigo 70.o do Código Aduaneiro da União, deve ser determinado pela aplicação sucessiva dos métodos previstos a seguir, só podendo cada um deles ser utilizado se o anterior, na ordem em que são apresentados, se revelar inutilizável, criando assim uma hierarquia metodológica. O método previsto no n.o 3 desse artigo 74.o, dito o método de «último recurso», que se apoia em «meios razoáveis», aplica‑se quando os métodos previstos nos números anteriores não se podem aplicar. V., nomeadamente, Albert, J.‑L., «Section 3 — La valeur en douane», Le droit douanier de l’Union européenne, Bruxelas, Bruylant, 2019, p. 255 a 280.


252      O Reino Unido observa que já aconteceu o Tribunal de Justiça apurar perdas de recursos próprios tradicionais num montante preciso em certos processos, mas que parece que os pedidos da ação não tinham então suscitado qualquer objeção e/ou as somas em questão não eram contestadas: v., por exemplo, Acórdão de 21 de setembro de 1989, Comissão/Grécia (C‑68/88, EU:C:1989:339). A situação é muito diferente no caso em apreço.


253      V., neste sentido, Acórdão de 16 de junho de 2016, EURO 2004. Hungary (C‑291/15, EU:C:2016:455).


254      É também por esta razão que devem ser rejeitados, em meu entender, os argumentos relativos ao método subsidiário previsto no artigo 74.o, n.o 3, do Código Aduaneiro da União.


255      V. n.os 193 a 216 e 225 a 227 das presentes conclusões.


256      V. n.o 177 e notas 92 e 265 das presentes conclusões.


257      C‑575/18 P, EU:C:2020:530.


258      V. n.o 68 desse acórdão.


259      V., nomeadamente, Acórdãos de 27 de abril de 2006, Comissão/Alemanha (C‑441/02, EU:C:2006:253, n.o 48), e de 2 de maio de 2019, Comissão/Croácia (Aterro de Biljane Donje) (C‑250/18, não publicado, EU:C:2019:343, n.o 33).


260      O Reino Unido é também de opinião que, além da fraude, incumbe à Comissão, numa primeira fase, provar ainda um nexo de causalidade entre esse incumprimento e um prejuízo, assim como a admissibilidade do seu pedido de pagamento de um determinado montante à União.


261      V. Acórdão de 16 de junho de 2016, EURO 2004. Hungary (C‑291/15, EU:C:2016:455, n.os 23 e 36).


262      V. n.os 159 a 162 das presentes conclusões e jurisprudência aí referida.


263      V., nomeadamente, Acórdão de 17 de novembro de 1993, Comissão/Espanha (C‑73/92, EU:C:1993:891, n.o 19).


264      V., nomeadamente, Acórdãos de 21 de setembro de 1999, Comissão/Irlanda (C‑392/96, EU:C:1999:431, n.os 60 e 61); de 26 de junho de 2003, Comissão/França (C‑233/00, EU:C:2003:371, n.o 62); e de 26 de outubro de 2006, Comissão/Espanha (C‑36/05, EU:C:2006:672, n.o 38).


265      V., neste sentido, Acórdão de 5 de junho de 2018, Kolev e o. (C‑612/15, EU:C:2018:392, n.os 51 e 52).


266      V., neste sentido, Acórdãos de 15 de novembro de 2005, Comissão/Dinamarca (C‑392/02, EU:C:2005:683, n.o 68); de 18 de outubro de 2007, Comissão/Dinamarca (C‑19/05, EU:C:2007:606, n.o 32); e de 3 de abril de 2014, Comissão/Reino Unido (C‑60/13, não publicado, EU:C:2014:219, n.o 50). V., no que respeita à doutrina, Meisse, E., «Application du système des ressources propres des Communautés», Europe, n.o 346/2006, p. 9.


267      Antes de mais, no que respeita ao Acórdão de 17 de março de 2011, Comissão/Portugal (C‑23/10, não publicado, EU:C:2011:160), o Reino Unido alega que o Tribunal de Justiça indicou que o Estado demandado era responsável pela «perda de receitas consecutiva» e que a sua responsabilidade se verificava «[s]e um erro cometido pelas autoridades aduaneiras […] tiver como consequência a não cobrança de direitos aduaneiros» (n.os 57 e 6[0]). Em seguida, quanto ao Acórdão de 8 de julho de 2010, Comissão/Itália (C‑334/08, EU:C:2010:414), segundo o Reino Unido, o Estado demandado era considerado responsável pela perda de recursos próprios tradicionais devido ao comportamento incorreto das suas autoridades, que emitiram a uma sociedade autorizações ilegais para colocar certos produtos num regime de isenção de direitos aduaneiros, quando estes estavam normalmente sujeitos a tais direitos (n.o 40). Por último, no que respeita ao Acórdão de 18 de outubro de 2007, Comissão/Dinamarca (C‑19/05, EU:C:2007:606), o Reino Unido alega que nada indicava que, se as autoridades dinamarquesas não tivessem cometido o erro que consistia em isentar de direitos aduaneiros as mercadorias em causa, isto é, se tivessem interpretado corretamente o alcance do regime de destino especial, o montante dos direitos aduaneiros cobrado e tido em conta teria sido o mesmo.


268      Acórdão de 31 de outubro de 2019, Comissão/Reino Unido (C‑391/17, EU:C:2019:919), processo julgado ao mesmo tempo que o processo que deu origem ao Acórdão de 31 de outubro de 2019, Comissão/Países Baixos (C‑395/17, EU:C:2019:918).


269      V., nomeadamente, Acórdão de 31 de outubro de 2019, Comissão/Reino Unido (C‑391/17, EU:C:2019:919, n.os 92 a 102). Foi, portanto, para demonstrar a existência da responsabilidade de um Estado‑Membro pelas ações de um PTU que dão lugar a uma perda de recursos próprios para o orçamento da União que o Tribunal de Justiça considerou que havia que examinar a questão de saber se esse Estado‑Membro era responsável perante a União, por força das obrigações que lhe incumbem enquanto Estado‑Membro nos termos do artigo 4.o, n.o 3, TUE, e se era obrigado, por força desta disposição, a compensar o montante em causa.


270      Trata‑se da exceção de inadmissibilidade suscitada, a título subsidiário, no âmbito do quarto fundamento.


271      V., neste sentido, Acórdão de 18 de outubro de 2007, Comissão/Dinamarca (C‑19/05, EU:C:2007:606, n.o 34).


272      Referidos, nomeadamente, no n.o 197 das presentes conclusões.


273      V., nomeadamente, dados da Surveillance 2 que mostram as quantidades superiores e inferiores ao preço mínimo aceitável das importações dos capítulos 61 a 64 da Nomenclatura Combinada provenientes da China de janeiro de 2015 a agosto de 2018, que figuram no quadro intitulado «UK [Lowest Acceptable Price] Quantities of imports» no anexo A.34 da petição.


274      V. nota 40 das presentes conclusões.


275      Relatório OLAF, pp. 8 e 9.


276      Esta conclusão decorre diretamente das observações da própria Comissão, como formuladas na sua petição e na sua tréplica, e das respostas às perguntas colocadas pelo Tribunal de Justiça.


277      O Reino Unido apresenta, no âmbito do presente recurso, uma metodologia igualmente baseada em dados estatísticos.


278      Acórdão de 17 de março de 2011, Comissão/Portugal (C‑23/10, não publicado, EU:C:2011:160).


279      Acórdão de 17 de março de 2011, Comissão/Portugal (C‑23/10, não publicado, EU:C:2011:160).


280      Acórdão de 17 de março de 2011, Comissão/Portugal (C‑23/10, não publicado, EU:C:2011:160, n.o 63).


281      Mais especificamente, o Tribunal de Justiça salientou, no n.o 66 desse acórdão, que, para quantificar o montante dos recursos próprios que não foram devidamente apurados durante os anos em causa com base em resultados dos controlos realizados posteriormente ao período de infração entre 1 de agosto e 31 de outubro de 2003, a Comissão devia comparar o peso médio apurado por caixa de bananas nos referidos controlos com o peso médio declarado durante esse mesmo período.


282      O método de cálculo do montante a colocar à disposição do orçamento comunitário consistia em controlar todas as importações de bananas frescas entre 1 de agosto e 31 de outubro de 2003, e depois calcular, em função dos resultados desse controlo, o peso médio das bananas importadas no decurso dos anos de 1998 a 2002 (n.o 30 desse acórdão). Segundo a Comissão, o montante a colocar à disposição do orçamento comunitário, relativamente aos anos de 1998 a 2002, ascendia a 16 087 604,41 euros (n.o 29 do referido acórdão).


283      Acórdão de 17 de março de 2011, Comissão/Portugal (C‑23/10, não publicado, EU:C:2011:160).


284      Acórdão de 17 de março de 2011, Comissão/Portugal (C‑23/10, não publicado, EU:C:2011:160).


285      V., nomeadamente, Acórdãos de 12 de julho de 1973, Comissão/Alemanha (70/72, EU:C:1973:87, n.o 13), e de 16 de outubro de 2012, Hungria/Eslováquia (C‑364/10, EU:C:2012:630, n.o 68).


286      V. n.o 160 das presentes conclusões.


287      V., nomeadamente, Acórdão de 10 de novembro de 2020, Comissão/Itália (Valores limite — PM10) (C‑644/18, EU:C:2020:895, n.o 70 e jurisprudência referida).


288      A este respeito, o Tribunal de Justiça declarou, nomeadamente, que, quando um Estado‑Membro se absteve de submeter ao IVA um tipo de operação, em desrespeito das exigências decorrentes da Sexta Diretiva 77/388, essa violação é também suscetível de provocar um incumprimento, pelo referido Estado‑Membro, da sua obrigação de pôr à disposição da Comissão, a título dos recursos IVA, os montantes correspondentes à taxa que devia ter sido cobrada sobre as referidas operações [v., nomeadamente, Acórdãos de 12 de setembro de 2000, Comissão/França (C‑276/97, EU:C:2000:424, n.os 49, 56, 61 e 70); Comissão/Irlanda (C‑358/97, EU:C:2000:425, n.os 58, 65, 69 e 78); e Comissão/Reino Unido (C‑359/97, EU:C:2000:426, n.os 70, 77 e 87)].


289      V. n.os 183 e 257 das presentes conclusões.


290      V., nomeadamente, Acórdãos de 26 de abril de 2005, Comissão/Irlanda (C‑494/01, EU:C:2005:250, n.o 44), e de 28 de março de 2019, Comissão/Irlanda (Sistema coletor e de tratamento de águas residuais) (C‑427/17, não publicado, EU:C:2019:269, n.o 39).


291      V. n.os 184 a 227 das presentes conclusões.


292      A questão relativa ao valor probatório dos dados estatísticos não é alheia aos debates jurídicos. Assim, em matéria antidumping, a fim de estabelecer o país análogo para determinar o valor normal dos produtos, o Tribunal de Justiça já declarou, no Acórdão GLS (C‑338/10, EU:C:2012:158, n.o 30), que incumbe às instituições da União examinar com toda a diligência necessária as informações de que dispõem, entre as quais figuram, designadamente, as estatísticas do Eurostat, para determinar se existe um país análogo. No processo que deu lugar ao Acórdão Bricmate (C‑569/13, EU:C:2015:572, n.os 65 e 68), o Tribunal de Justiça declarou que «as instituições da União não examinaram com a diligência devida os dados contidos nas estatísticas do Eurostat». Esta questão põe‑se também no domínio da discriminação indireta em que o Tribunal de Justiça, remetendo para as orientações fundadoras na matéria, recorda que «a discriminação indireta pode ser demonstrada por quaisquer meios, incluindo através de dados estatísticos» [v., nomeadamente, Acórdãos de 24 de setembro de 2020, YS (Pensões de empresa de pessoal dirigente) (C‑223/19, EU:C:2020:753, n.o 50), e de 3 de outubro de 2019, Schuch‑Ghannadan (C‑274/18, EU:C:2019:828, n.o 46 e jurisprudência referida)].


293      A Comissão salienta também o caráter científico da metodologia escolhida, sem, todavia, precisar do que se trata.


294      Relatório de uma empresa de consultadoria no anexo A.32 da petição e anexo B.5 da contestação, ponto 2.12).


295      V. anexo E.4 das respostas da Comissão.


296      V. Acórdão de 17 de março de 2011, Comissão/Portugal (C‑23/10, não publicado, EU:C:2011:160, n.o 63 e jurisprudência referida).


297      V. anexo B.32 da contestação.


298      O anexo 6 do Relatório OLAF consta do anexo A.36 da petição.


299      A este respeito, há que aprovar a posição da Comissão segundo a qual as amostras de mercadorias recolhidas pelas autoridades aduaneiras do Reino Unido, para o período posterior a 2017, são irrelevantes para efeitos do presente processo, uma vez que se situam fora do período de infração objeto da ação.


300      V., nomeadamente, respostas escritas do Reino Unido às perguntas colocadas pelo Tribunal de Justiça.


301      V. n.o 226 das presentes conclusões.


302      Este método consiste em estudar a «distribuição» de diferentes «populações», ao nível do valor da «extremidade da ponta» do grupo principal (em termos de volume) constituído por preços baixos.


303      Para uma explicação mais detalhada deste número, v. n.o 252 das presentes conclusões.


304      V. nota 247 das presentes conclusões.


305      V., neste sentido, Acórdãos de 14 de janeiro de 2010, Comissão/República Checa (C‑343/08, EU:C:2010:14, n.o 26); de 15 de junho de 2010, Comissão/Espanha (C‑211/08, EU:C:2010:340, n.o 32); e de 15 de novembro de 2012, Comissão/Portugal (C‑34/11, EU:C:2012:712, n.o 44).


306      V. Acórdãos de 2 de junho de 2016, Comissão/Países Baixos (C‑233/14, EU:C:2016:396, n.o 35), e de 2 de abril de 2020, Comissão/Polónia, Hungria e República Checa (Mecanismo temporário de recolocação de requerentes de proteção internacional) (C‑715/17, C‑718/17 e C‑719/17, EU:C:2020:257, n.o 116).


307      A Comissão sublinha, nomeadamente, que, se as autoridades do Reino Unido entendessem que os montantes correspondentes às dívidas declaradas não eram adequados, deveriam ter introduzido as correções ad hoc e reemitir os avisos de pagamento.


308      V. n.o 178 da notificação para cumprir.


309      V., nomeadamente, n.os 243 e 338 do parecer fundamentado que figura no anexo A.31.


310      V. n.os 241 a 243 das presentes conclusões.


311      Como explica a Comissão, admitindo, para um determinado código de Nomenclatura Combinada com oito algarismos, que o preço médio corrigido para a União‑28 seja de 15 GBP/kg, o valor do preço mínimo aceitável é então de 7,50 GBP/kg. Admitindo ainda, continua, que, durante um determinado dia tenham sido efetuadas nove importações regulares com um valor reduzido de 10 GBP/kg e uma importação subavaliada com um valor de 1 GBP/kg, a agregação dos dados quotidianos dá um preço médio de 9,1 GBP/kg. Uma vez que este preço é superior ao preço mínimo aceitável de 7,50 GBP/kg, o agregado diário que contém o envio subavaliado não seria, então, incluído nas perdas de recursos próprios tradicionais calculadas.


312      Na audiência, a Comissão defendeu que resultava do ponto 1.12 do relatório de uma empresa de consultadoria (anexo A.32 da petição e anexo B.5 da contestação) que o Reino Unido admite que as importações subavaliadas representam pelo menos 35 % de todas as importações do Reino Unido durante o período de infração.


313      V., nomeadamente, relatório de uma empresa de consultadoria no anexo A.32 da petição e no anexo B.5 da contestação, ponto 3.5.


314      Na sua resposta às perguntas do Tribunal de Justiça, o Reino Unido evocou também o «volume comum», ou seja, o volume das importações considerado subavaliado com base nos dois métodos. A sua estimativa do «volume comum» para os anos 2015 a 2017 é de 992 326 582 kg.


315      Como resulta do relatório de uma empresa de consultadoria, 80 % da diferença das perdas de recursos próprios tradicionais é atribuível ao valor de referência (segundo a metodologia OLAF, seria de 2,26 a 141,95 GBP, enquanto, ao aplicar‑se o «limiar de conformidade» elaborado pelo Reino Unido, seria de 0,10 a 8,90 GBP; anexo B.5 da contestação, ponto 3.3).


316      Relatório OLAF, ponto 2.1.5.


317      V. n.o 274 das presentes conclusões.


318      V. n.o 235 das presentes conclusões, que se refere, nomeadamente, ao artigo 2.o, n.o 1, alíneas a) e b), da Decisão 2007/436 e ao artigo 2.o, n.o 1, alínea a), da Decisão 2014/335.


319      V., nomeadamente, artigos 2.o, 9.o e 10.o desses regulamentos, e n.os 236 a 240 das presentes conclusões.


320      V. relatório complementar de uma empresa de consultadoria no anexo B.6 da contestação, pontos 2.25 a 2.26.


321      É igualmente pertinente a afirmação da Comissão segundo a qual, em 2016, 87 % das importações de produtos têxteis e de calçado do Reino Unido foram efetuadas no âmbito do regime aduaneiro 42, o que implica que essas mercadorias se destinavam a outros Estados‑Membros, quando, durante o mesmo período, o regime aduaneiro 40 só foi utilizado para 13 % das importações desses produtos, que podiam permanecer no mercado britânico ou ser dirigidos para outros Estados‑Membros.


322      V. n.o 208 das presentes conclusões.


323      V. n.o 126 das presentes conclusões.


324      Relatório OLAF, ponto 2.1.2.


325      V., mutatis mutandis, nomeadamente, Acórdão de 16 de junho de 2016, EURO 2004. Hungary (C‑291/15, EU:C:2016:455, n.o 23). Além disso, importa refutar o argumento avançado pela Comissão segundo o qual este acórdão autoriza o recurso aos preços médios de produtos em causa à escala da União para servir de base à «reavaliação» das importações subavaliadas e para subsequentemente calcular as perdas dos recursos próprios tradicionais. Com efeito, nesse processo, o Tribunal de Justiça declarou simplesmente que, se se considerar que o valor transacional indicado é anormalmente baixo em relação aos preços médios de compra baseados nas médias estatísticas e praticados na importação de mercadorias semelhantes, há que considerar que tal diferença de preço se afigura suficiente para justificar as dúvidas da autoridade aduaneira e a rejeição, por parte desta, do valor aduaneiro declarado das mercadorias em causa. Por conseguinte, o Tribunal de Justiça não tomou posição sobre a questão de saber qual o nível de preço dos produtos em causa que deve constituir o valor de referência para determinar o valor aduaneiro adequado.


326      V. n.os 295 a 297 das presentes conclusões.


327      Este montante é constituído do seguinte modo: 480 098 912,45 euros em 2014, 325 230 822,55 euros em 2013, 173 404 943,81 euros em 2012 e 22 777 312,79 euros em 2011.


328      V. n.os 241 a 250 das presentes conclusões no que respeita à anulação dos avisos de pagamento C18 Snake.


329      Há também que ter presente que este montante é calculado pelas autoridades do Reino Unido numa base incorreta e que isso já foi sublinhado (v. n.os 247 a 249 das presentes conclusões).


330      Na sua resposta às perguntas do Tribunal de Justiça, o Reino Unido explica que a razão pela qual os avisos de pagamento C18 Snake reclamam um montante de 201 828 809,62 GBP, ao passo que o Reino Unido faz referência, na tréplica, a um número de pouco mais de 192 568 694,30 GBP, se deve ao facto de este último número excluir as importações provenientes dos outros países que não a China e as importações de códigos de produto diferentes dos têxteis e do calçado, que não são objeto do presente recurso. Por outro lado, o Reino Unido sustenta que este montante de 192 568 694,30 GBP deveria seguidamente ser reduzido para um montante de cerca de 25 milhões de GBP. Com efeito, há que aplicar os valores‑limite da metodologia britânica em vez dos preços médios corrigidos ao nível da União e proceder a um ajustamento, com base nesses mesmos limiares, do volume das mercadorias subestimadas e que devem ser «reavaliadas», uma vez que esse volume é inferior ao volume calculado aplicando a metodologia OLAF (v. anexos D.5 e D.10 da tréplica).


331      Na sua contestação, o Reino Unido defende que emitiu 27 avisos de pagamento C18 Breach na data de apresentação do referido articulado, e que os montantes correspondentes foram lançados na contabilidade B, tendo, em relação a oito desses avisos, a inscrição ocorrido em maio de 2018. Na sua tréplica, o Reino Unido refere que o montante total dos direitos reclamados através dos referidos avisos de cobrança aumentou entretanto e que esse número era então de 45 882 997,46 GBP (número revisto, após uma análise complementar, para 44 296 285,04 GBP).


332      Isso significa que foram apurados direitos aduaneiros, mas não lançados na contabilidade A, por ainda não terem sido cobrados, nem ter sido fornecida qualquer caução (v. artigo 6.o, n.os 1 e 3, alíneas a) e b) do Regulamento n.o 1150/2000).


333      Data que se situa na fase pré‑contenciosa, após a notificação para cumprir de 9 de março de 2018 e antes da data correspondente ao prazo de dois meses indicado no parecer fundamentado de 24 de setembro de 2018.


334      O parecer fundamentado foi emitido em 24 de setembro de 2018, terminando este prazo dois meses após essa data.


335      V., nomeadamente, Acórdãos de 4 de maio de 2017, Comissão/Luxemburgo (C‑274/15, EU:C:2017:333, n.o 47); de 27 de março de 2019, Comissão/Alemanha (C‑620/16, EU:C:2019:256, n.o 39 e jurisprudência referida); e de 2 de abril de 2020, Comissão/Polónia, Hungria e República Checa (Mecanismo temporário de recolocação de requerentes de proteção internacional) (C‑715/17, C‑718/17 e C‑719/17, EU:C:2020:257, n.o 54).


336      V. n.o 236 das presentes conclusões.


337      V. argumentos apresentados no âmbito da análise do aviso de pagamento C18 Snake.


338      No entanto, saliento que, contrariamente ao que sustenta o Reino Unido, esta tomada em consideração não implica a inadmissibilidade da ação relativamente ao período compreendido entre 1 de maio de 2015 e 11 de outubro de 2017, uma vez que diz apenas respeito à determinação da extensão das perdas de recursos próprios tradicionais.


339      V. parecer fundamentado, quadro jurídico, n.o 272 e dispositivo.


340      V. n.o 338 da petição.


341      V. n.o 238 das presentes conclusões.


342      V. Conclusões da advogada‑geral V. Trstenjak no processo Comissão/Itália (C‑275/07, EU:C:2008:334, n.o 89)


343      Nos termos do artigo 2.o, terceiro parágrafo, do Regulamento 2016/804: «[o] artigo 1.o, n.o 6, é aplicável ao cálculo dos juros de mora dos recursos próprios devidos após a data de entrada em vigor do presente regulamento. Todavia, a limitação da majoração total da taxa de juro a 16 pontos percentuais […] [é] também aplicáve[l] ao cálculo dos juros de mora dos recursos próprios que eram devidos antes da data de entrada em vigor do presente regulamento, caso a Comissão ou o EstadoMembro em causa só tenham tomado conhecimento desses recursos próprios após a data de entrada em vigor do presente regulamento.» (sublinhado meu).


344      Observo que o segundo parágrafo do primeiro pedido relativo às disposições aduaneiras inclui uma menção ao princípio da cooperação leal consagrado no artigo 4.o, n.o 3, TUE e que o primeiro fundamento contém uma parte relativa à violação deste princípio (v. n.o 173 das presentes conclusões). Noto igualmente que o segundo pedido remete para o artigo 2.o, n.os 2 e 3, alínea d), do Regulamento n.o 608/2014, sem que a Comissão exponha na fundamentação da sua petição em que é que este Estado não cumpriu esta disposição, pelo que há que julgar improcedente o incumprimento das obrigações por força da referida disposição.


345      V., neste sentido, Acórdãos de 21 de setembro de 1989, Comissão/Grécia (68/88, EU:C:1989:339, n.o 23), e de 31 de outubro de 2019, Comissão/Reino Unido (C‑391/17, EU:C:2019:919, n.o 93).


346      V., nomeadamente, Acórdãos de 25 de maio de 1982, Comissão/Países Baixos (96/81, EU:C:1982:192, n.o 7), e de 12 de setembro de 2000, Comissão/Países Baixos (C‑408/97, EU:C:2000:427, n.o 16). Nesta perspetiva, importa ter em conta o facto de, em certos domínios, como o processo fiscal em causa, a Comissão estar largamente dependente dos elementos fornecidos pelo Estado‑Membro em causa (v., neste sentido, Acórdão de 12 de setembro de 2000, Comissão/Países Baixos, C‑408/97, EU:C:2000:427, n.o 17).


347      V. n.o 319 das presentes conclusões.


348      A avaliação jurídica em causa tinha sido pedida aquando das inspeções 16‑11‑1, 17‑11‑1 e 17‑11‑2 efetuadas pela Comissão. Além disso, resulta do Relatório de Inspeção 17‑11‑2 que, no momento desta, não era possível encontrar as dívidas correspondentes às diferentes declarações de importação, o que teria justificado a anulação desses avisos de pagamento. Segundo esse relatório, a Comissão pediu uma cópia da avaliação jurídica da HMRC que deu lugar à anulação dos avisos de pagamento C18 Snake, e as autoridades britânicas recusaram fornecer esse documento, afirmando que era confidencial e estava sujeito à proteção das comunicações entre um advogado e o seu cliente.


349      Agindo ao abrigo do artigo 33E(5) do Finance Act 2003 (Lei das Finanças de 2003).


350      V., nomeadamente, Acórdão de 7 de março de 2002, Comissão/Itália (C‑10/00, EU:C:2002:146), e Conclusões do advogado‑geral D. Ruiz‑Jarabo Colomer nos processos Comissão/Finlândia (C‑284/05, C‑294/05, C‑372/05, C‑387/05, C‑409/05, C‑461/05 e C‑239/06, EU:C:2009:67, n.o 168).


351      V. Relatório de Inspeção 16‑11‑1, n.o 3.1.2., e Relatório de Inspeção 17‑11‑1, n.o 3.1.2., que figura respetivamente nos anexos A.16 e A.15 da petição.


352      V. Acórdão de 7 de março de 2002, Comissão/Itália (C‑10/00, EU:C:2002:146, n.o 91).


353      Acórdão de 7 de março de 2002 (C‑10/00, EU:C:2002:146, n.o 91)


354      V., neste sentido, Acórdão Comissão/Itália (C‑10/00, EU:C:2002:146, n.o 44).


355      V. n.o 144 da contestação.


356      Resulta de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que a confidencialidade das comunicações escritas entre advogados e clientes está protegida com base no direito da União, desde que se trate de correspondência trocada no quadro e para os fins do direito de defesa do cliente, e emane de advogados independentes [v., neste sentido, Acórdãos de 18 de maio de 1982, AM & S Europe/Comissão (155/79, EU:C:1982:157, n.os 21 e 27), e de 14 de setembro de 2010, Akzo Nobel Chemicals e Akcros Chemicals/Comissão e o. (C‑550/07 P, EU:C:2010:512, n.o 70)].


357      V., nomeadamente, Acórdão de 12 de novembro de 2019, Comissão/Irlanda (Parque eólico de Derrybrien) (C‑261/18, EU:C:2019:955, n.o 89 e jurisprudência referida).


358      V. n.o 319 das presentes conclusões.


359      Para elementos mais detalhados sobre o valor tributável, v. Berlin, D., «Taxe sur le chiffre d’affaires — Fonctionnement de la taxe — Régimes spéciaux», JurisClasseur Europe Traité, fasc. 1640, fevereiro 2021, n.os 16 e segs.


360      Artigos 83.o e 84.o da Diretiva 2006/112.


361      Artigos 85.o a 87.o da Diretiva 2006/112.


362      Esta taxa uniforme é fixada em 0,30 % pelas Decisões 2007/436 e 2014/335.


363      V. Potteau, A., «Budget de l’Union européenne — Contenu du budget», JurisClasseur Europe Traité, fasc. 198, 4 de novembro de 2016, n.o 21.


364      Segundo Potteau, A., o Regulamento n.o 1553/89 afastou qualquer nexo direto entre o recurso proveniente do IVA e os contribuintes, ao impor como método único o método das receitas, que consiste num simples cálculo estatístico (v. nota 210 das presentes conclusões).


365      V. Acórdão de 15 de novembro de 2011, Comissão/Alemanha (C‑539/09, EU:C:2011:733, n.o 71 e jurisprudência referida).


366      V., neste sentido, Acórdãos de 5 de dezembro de 2017, M.A.S. e M.B. (C‑42/17, EU:C:2017:936, n.o 31); de 7 de abril de 2016, Degano Trasporti (C‑546/14, EU:C:2016:206, n.o 22 e jurisprudência referida); e de 26 de fevereiro de 2013, Åkerberg Fransson (C‑617/10, EU:C:2013:105, n.o 26 e jurisprudência referida).


367      V. Acórdão de 5 de dezembro de 2017, M.A.S. e M.B. (C‑42/17, EU:C:2017:936, n.o 32).


368      V. jurisprudência referida nos n.os 172 a 175 das presentes conclusões.


369      V. n.os 172 e 173 das presentes conclusões.


370      Quanto ao impacto da fraude, v. Boerselli, F., «Pragmatic Policies to tackle VAT fraud in the European Union», International VAT monitor, vol. 19, n.o 5, 2008, p. 333.


371      V., neste sentido, Acórdãos de 5 de dezembro de 2017, M.A.S. e M.B. (C‑42/17, EU:C:2017:936, n.o 30); de 20 de março de 2018, Menci (C‑524/15, EU:C:2018:197, n.o 19 e jurisprudência referida); e de 2 de maio de 2018, Scialdone (C‑574/15, EU:C:2018:295, n.o 27).


372      V. n.o 225 das presentes conclusões.


373      V. n.o 173 das presentes conclusões.


374      V. nota 21 das presentes conclusões.


375      Segundo o artigo 86.o, n.o 1, da Diretiva 2006/112, o valor tributável inclui os impostos, direitos e taxas devidos fora do Estado‑Membro de importação e os devidos pela importação. Inclui também as despesas acessórias, tais como as de embalagem, de transporte e de seguro, até ao primeiro lugar de destino dos bens no território do Estado‑Membro de importação, bem como as decorrentes do transporte para outro lugar de destino no território da Comunidade, se este último lugar for conhecido no momento em que ocorre o facto gerador do imposto.


376      Disposição que corresponde ao artigo 29.o, n.o 1, do Código Aduaneiro Comunitário.


377      Para uma apresentação pormenorizada da avaliação dos bens ou serviços importados, v. Bieber, T., «Customs Valuation and Import VAT», Global Trade and Customs Journal, vol. 14, n.o 2, p. 73.


378      V., neste sentido, Acórdão de 18 de junho de 2020, Comissão/Hungria (Transparência associativa) (C‑78/18, EU:C:2020:476, n.o 36 e jurisprudência referida).


379      V. n.o 337 das presentes conclusões.


380      V. nota 23 das presentes conclusões.


381      V. nota 21 das presentes conclusões.


382      V. Acórdãos de 18 de julho de 2013, Evita‑K (C‑78/12, EU:C:2013:486, n.o 33), e de 21 de novembro de 2013, Dixons Retail (C‑494/12, EU:C:2013:758, n.o 20).


383      V. ponto VI da síntese do Relatório 13/2011.


384      V. n.os 26 e segs. do Relatório 13/2011.


385      V. Relatório 13/2011, ponto 55.


386      V. Relatório Especial n.o 24/2015, ponto 85, p. 34, já referido na nota 111 das presentes conclusões.


387      V. síntese deste relatório, ponto IV, p. 9.