Language of document : ECLI:EU:T:2011:36

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Quarta Secção)

9 de Fevereiro de 2011 (*)

«Marca comunitária – Processo de oposição – Pedido de marca nominativa comunitária ALPHAREN – Marcas nominativas nacionais anteriores ALPHA D3 – Motivo relativo de recusa – Risco de confusão – Artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento (CE) n.° 40/94 [actual artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento (CE) n.° 207/2009] – Exame oficioso dos factos – Artigo 74.° do Regulamento n.° 40/94 (actual artigo 76.° do Regulamento n.° 207/2009)»

No processo T‑222/09,

Ineos Healthcare Ltd, com sede em Warrington, Cheshire (Reino Unido), representada por S. Malynicz, barrister, e A. Smith, solicitor,

recorrente,

contra

Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos)(IHMI), representado por A. Folliard‑Monguiral, na qualidade de agente,

recorrido,

sendo a outra parte no processo na Câmara de Recurso do IHMI:

Teva Pharmaceutical Industries Ltd, com sede em Jerusalém (Israel),

que tem por objecto um recurso da decisão da Segunda Câmara de Recurso do IHMI de 24 de Março de 2009 (processo R 1897/2007‑2), relativa a um processo de oposição entre a Teva Pharmaceutical Industries Ltd e a Ineos Healthcare Ltd,

O TRIBUNAL GERAL (Quarta Secção),

composto, na deliberação, por O. Czúcz, presidente, I. Labucka (relatora) e K. O’Higgins, juízes,

secretário: E. Coulon,

vista a petição entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 1 de Junho de 2009,

vista a contestação apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 2 de Outubro de 2009,

vista a carta da recorrente de 14 de Maio de 2010, indicando que já não pretendia ser ouvida na audiência,

vistas as questões escritas apresentadas às partes pelo Tribunal Geral,

vistas as observações apresentadas pelas partes na Secretaria do Tribunal Geral, em 11 e 14 de Junho de 2010,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1        Em 3 de Março de 2005, a recorrente, Ineos Healthcare Ltd, apresentou um pedido de registo de marca comunitária ao Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), ao abrigo do Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1), conforme alterado [substituído pelo Regulamento (CE) n.° 207/2009 do Conselho, de 26 de Fevereiro de 2009, sobre a marca comunitária (JO L 78, p. 1)].

2        A marca cujo registo foi pedido é o sinal nominativo ALPHAREN.

3        Os produtos para os quais o registo foi pedido integram, após a limitação ocorrida na pendência do processo no IHMI, a classe 5 na acepção do Acordo de Nice relativo à Classificação Internacional dos Produtos e dos Serviços para o registo de marcas, de 15 de Junho de 1957, conforme revisto e alterado, e correspondem à descrição seguinte: «Produtos farmacêuticos e veterinários que contenham hidroxicarbonato de magnésio, ferro ou hidrotalcite ou derivados destes compostos; produtos farmacêuticos e veterinários para diálise renal e tratamento de perturbações e afecções dos rins; agentes fixadores de fosfatos para tratamento da hiperfosfatemia».

4        O pedido de marca comunitária foi publicado no Boletim de Marcas Comunitárias n.° 49/2005, de 5 de Dezembro de 2005.

5        Em 6 de Março de 2006, a Teva Pharmaceutical Industries Ltd (a seguir «oponente») apresentou oposição, nos termos do disposto no artigo 42.° do Regulamento n.° 40/94 (actual artigo 41.° do Regulamento n.° 207/2009), ao registo da marca pedida para os produtos referidos no n.° 3, supra.

6        A oposição tinha por base as seguintes marcas anteriores:

–        marca nominativa húngara ALPHA D3 n.° 134972, para «produtos farmacêuticos que regulam o cálcio», incluídos na classe 5;

–        marca nominativa lituana ALPHA D3 n.° 20613, para «produtos farmacêuticos que regulam o cálcio», incluídos na classe 5;

–        marca nominativa letã ALPHA D3 registada sob a referência M30407, para «produtos farmacêuticos que tenham propriedades de regulação de cálcio», incluídos na classe 5.

7        Os motivos invocados em apoio da oposição são os que constam do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 [actual artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009].

8        Em 9 de Outubro de 2007, a Divisão de Oposição considerou a oposição totalmente procedente, atenta a marca húngara anterior.

9        Em 29 de Novembro de 2007, a recorrente interpôs recurso no IHMI, nos termos dos artigos 57.° a 62.° do Regulamento n.° 40/94 (actuais artigos 58.° a 64.° do Regulamento n.° 207/2009), da decisão da Divisão de Oposição.

10      Por decisão de 24 de Março de 2009 (a seguir «decisão recorrida»), a Segunda Câmara de Recurso do IHMI negou provimento ao recurso. Considerou, em especial, que a marca húngara anterior não podia ser tida em consideração, devido à inexistência de tradução do certificado de registo na língua do processo. O facto de a oposição ter sido julgada procedente apenas com base na marca húngara anterior justifica, por si só, a anulação da decisão da Divisão de Oposição. No entanto, considerando que podia ser adoptada uma decisão com o mesmo dispositivo que o da Divisão de Oposição no momento em que decidiu o recurso, a Câmara de Recurso, no exercício do seu poder de apreciação, analisou as outras marcas nas quais a oposição se baseou. A este respeito, alegou, em especial, que os produtos abrangidos pelos registos letão e lituano eram idênticos aos abrangidos pela marca húngara anterior e que as partes tinham tido oportunidade de apresentar as suas observações sobre todas as circunstâncias do caso concreto. Referiu que os sinais em conflito apresentavam um certo grau de semelhança nos planos visual, fonético e conceptual. De igual modo, concluiu que os produtos eram em parte idênticos e em parte semelhantes. A Câmara de Recurso indicou que este factor se sobrepõe ao grau menor de semelhança entre as marcas. Concluiu, em substância, que existia um risco de confusão no espírito do consumidor médio, que faz parte do público pertinente, que, por não dispor do mesmo nível de conhecimentos e competências em bioquímica e farmacologia que os profissionais destas áreas, está mais exposto a esse risco.

 Tramitação processual e pedidos das partes

11      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–         anular a decisão recorrida;

–         condenar o IHMI nas despesas.

12      O IHMI conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–         negar provimento ao recurso;

–        condenar a recorrente nas despesas.

 Questão de direito

13      Em apoio do seu recurso, a recorrente invoca quatro fundamentos, relativos: o primeiro, à não produção de prova, pela oponente, da semelhança entre os produtos; o segundo, à violação do artigo 73.° do Regulamento n.° 40/94 (actual artigo 75.° do Regulamento n.° 207/2009); o terceiro, à violação do artigo 74.° do Regulamento n.° 40/94 (actual artigo 76.° do Regulamento n.° 207/2009); e o quarto, à violação do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, no que respeita à determinação do público pertinente.

 Quanto ao primeiro fundamento, relativo à não produção de prova, pela oponente, da semelhança entre os produtos

 Argumentos das partes

14      A recorrente alega que, à luz da jurisprudência do Tribunal de Justiça, para apreciar a semelhança dos produtos no âmbito de um processo de oposição, o ónus da prova incumbe à oponente. A demonstração, feita pela oponente, da alegada semelhança dos produtos é insuficiente e limita‑se a duas cartas enviadas à recorrente e a um folheto informativo destinado aos pacientes. Além disso, a recorrente também contesta o carácter probatório do referido folheto informativo. Acrescenta que as provas devem incidir sobre todos os factores que sejam pertinentes para comparar os produtos, que incluem a sua natureza, o seu destino, a sua utilização e o seu carácter concorrente ou complementar.

15      O IHMI contesta os argumentos da recorrente.

 Apreciação do Tribunal Geral

16      Resulta da regra 15, n.° 2, alínea c), do Regulamento (CE) n.° 2868/95 da Comissão, de 13 de Dezembro de 1995, relativo à execução do Regulamento (CE) n.° 40/94 (JO L 303, p. 1), que o acto de oposição deve incluir, designadamente, os fundamentos da oposição. A regra 15, n.° 3, alínea b), do referido regulamento enuncia que o acto de oposição pode incluir uma declaração fundamentada que exponha os principais factos e argumentos da oposição, bem como as correspondentes provas. A regra 19, n.° 1, do referido regulamento precisa que o IHMI dará oportunidade ao oponente para apresentar os factos, comprovativos e argumentos que fundamentem a respectiva oposição, ou para completar quaisquer factos, comprovativos e argumentos que já tenham sido apresentados nos termos do n.° 3 da regra 15, no prazo fixado por si e que deve ser de pelo menos dois meses a contar da data em que se considera que o processo de oposição teve início, nos termos do disposto no n.° 1 da regra 18.

17      Resulta das disposições acima referidas que, no âmbito de um processo de oposição, a parte oponente tem a faculdade, e não a obrigação, de produzir provas em apoio da oposição, nomeadamente no que respeita à semelhança dos produtos e dos serviços em causa.

18      A este respeito, há que concluir que, como resulta do processo no IHMI, este, por carta de 7 de Abril de 2006, nos termos da regra 19, n.° 1, do Regulamento n.° 2868/95, convidou a oponente a apresentar factos, provas e argumentos em apoio da sua oposição, ou a completar os que constam do formulário de oposição, precisando que, caso estes não fossem comunicados, a adopção da decisão relativa à oposição basear‑se‑ia nas provas de que dispunha.

19      Por carta de 18 de Julho de 2006, a oponente apresentou argumentos suplementares. Em seguida, a recorrente submeteu as suas observações por carta de 31 de Outubro de 2006, sobre as quais a oponente tomou posição por carta de 16 de Fevereiro de 2007.

20      Cumpre igualmente precisar que, ao contrário do que, em substância, a recorrente alega, o Tribunal de Justiça, no seu despacho de 9 de Março de 2007, Alecansan/IHMI (C‑196/06 P, não publicado na Colectânea, n.° 24), não se pronunciou de modo nenhum sobre a questão do ónus da prova que incumbe ao oponente no âmbito de um processo de oposição. No n.° 24 desse despacho, o Tribunal de Justiça sublinhou apenas a obrigação de provar, para efeitos da aplicação do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, a semelhança dos produtos, mesmo quando os sinais sejam idênticos.

21      De igual modo, as provas referidas na regra 15, n.° 3, alínea b), do Regulamento n.° 2868/95 não têm necessariamente de abranger todos os aspectos da comparação dos produtos, ao contrário do que a recorrente alega.

22      Face ao exposto, a parte oponente não tem assim a obrigação, no âmbito de um processo de oposição, de produzir provas relativas à semelhança dos produtos em causa. Daqui resulta igualmente que o argumento da recorrente relativo ao carácter probatório de um folheto informativo destinado aos pacientes, que a oponente apresentou ao IHMI, não é pertinente no âmbito deste fundamento. Por conseguinte, o presente fundamento deve ser julgado improcedente.

 Quanto ao segundo e terceiro fundamentos, relativos, respectivamente, à violação do artigo 73.° e do artigo 74.° do Regulamento n.° 40/94

23      Uma vez que o segundo e terceiro fundamentos dizem respeito à utilização, por parte da Câmara de Recurso, de determinadas pesquisas para provar uma semelhança entre os produtos abrangidos pelas marcas letã e lituana anteriores e, em particular, os «produtos farmacêuticos e veterinários que contenham hidroxicarbonato de magnésio, ferro ou hidrotalcite ou derivados destes compostos (a seguir «produtos A») e os «agentes fixadores de fosfatos para tratamento da hiperfosfatemia» (a seguir «produtos C ») abrangidos pela marca pedida, o Tribunal Geral considera oportuno analisar em conjunto o segundo e terceiro fundamentos. Há que começar pela análise do terceiro fundamento.

 Argumentos das partes

24      No âmbito do seu terceiro fundamento, a recorrente sustenta que, ao recorrer, por iniciativa própria, a pesquisas na Internet, para comparar os produtos, como decorre do n.° 40 da decisão recorrida, a Câmara de Recurso violou a obrigação resultante do artigo 74.° do Regulamento n.° 40/94, segundo a qual, num processo respeitante a motivos relativos de recusa de registo, a Câmara de Recurso deve limitar o seu exame às alegações de facto e aos pedidos apresentados pelas partes. Esta disposição refere‑se igualmente à produção de provas pelas partes. Estas pesquisas consistiram na consulta de um dicionário médico em linha, de um sítio Internet do Governo americano, dedicado a ensaios clínicos, e de um sítio Internet de uma sociedade diferente da recorrente, que pertence ao mesmo grupo de sociedades. A recorrente alega igualmente que, no que respeita à semelhança dos produtos abrangidos pelas marcas letã e lituana anteriores com os produtos A e os produtos C abrangidos pela marca pedida, os elementos recolhidos pela Câmara de Recurso na Internet desempenharam um papel determinante.

25      No âmbito do seu segundo fundamento, a recorrente critica, em substância, a Câmara de Recurso por ter baseado a decisão recorrida em motivos em relação aos quais não pôde tomar posição. Com efeito, alega que nunca teve oportunidade de defender a sua posição sobre os elementos de prova que a Câmara de Recurso encontrou na Internet. Acrescenta que, se tivesse tido possibilidade de se pronunciar sobre estas provas, teria podido demonstrar quais os factores que tornavam improvável a conclusão segundo a qual os produtos eram semelhantes.

26      Relativamente ao terceiro fundamento, o IHMI alega que, à luz do acórdão do Tribunal Geral de 24 de Setembro de 2008, Anvil Knitwear/IHMI – Aprile e Aprile (Aprile) (T‑179/07, não publicado na Colectânea, n.os 72 e 75), a Câmara de Recurso não podia dar como provado o argumento da semelhança dos produtos invocado pela oponente pelo facto de a recorrente não ter apresentado objecções. Tinha, por isso, o dever de efectuar a sua própria análise da semelhança dos produtos, com base nas listas de produtos abrangidos pelas marcas em conflito. O IHMI considera que, nestas condições, a Câmara de Recurso podia proceder legalmente a pesquisas, por iniciativa própria, consultando fontes de informação neutras ou fontes de informação conhecidas da recorrente, desde que essas pesquisas se destinassem exclusivamente a verificar a exactidão dos fundamentos e dos argumentos da oponente.

27      Relativamente ao segundo fundamento, o IHMI contesta os argumentos da recorrente, precisando que, à luz da jurisprudência do Tribunal Geral, o direito de ser ouvido, conforme consagrado no artigo 73.°, segundo período, do Regulamento n.° 40/94 (actual artigo 75.°, segundo período, do Regulamento n.° 207/2009), não é aplicável à posição final que a Administração decida adoptar. O mesmo se diga dos documentos que corroboram e concorrem para a decisão final sobre a semelhança dos produtos. Além disso, os documentos recolhidos na Internet só confirmaram a posição inicial da Câmara de Recurso, expressa no n.° 42 da decisão recorrida. O IHMI acrescenta que a recorrente podia apresentar observações sobre as alegações da oponente, antes de a decisão recorrida ser adoptada, o que não fez. Por fim, considera que, mesmo que a Câmara de Recurso tenha cometido um erro ao não submeter às partes os resultados das pesquisas efectuadas na Internet, a conclusão quanto à comparação dos produtos seria a mesma. Tal violação do artigo 73.° do Regulamento n.° 40/94 não justifica a anulação da decisão recorrida.

 Apreciação do Tribunal Geral

28      Nos termos do artigo 74.°, n.° 1, do Regulamento n.° 40/94, «num processo respeitante a motivos relativos de recusa do registo, o exame [do IHMI] limitar‑se‑á às alegações de facto e aos pedidos apresentados pelas partes».

29      Esta disposição visa, designadamente, a base factual das decisões do IHMI, a saber, os factos e as provas em que estas se podem validamente basear. Assim, a Câmara de Recurso, ao se pronunciar sobre um recurso de uma decisão que põe termo a um processo de oposição, só pode fundamentar a sua decisão nos factos e nas provas apresentados pelas partes. Contudo, a limitação da base factual da apreciação feita pela Câmara de Recurso não exclui que esta tenha em consideração, para além dos factos apresentados expressamente pelas partes no processo de oposição, factos notórios, isto é, factos que podem ser conhecidos por qualquer pessoa ou que podem ser conhecidos através de fontes geralmente acessíveis [v. acórdão do Tribunal Geral de 22 de Junho de 2004, Ruiz‑Picasso e o./IHMI – DaimlerChrysler (PICARO), T‑185/02, Colect., p. II‑1739, n.os 28 e 29 e jurisprudência referida, e acórdão Aprile, já referido, n.° 71].

30      No presente caso, a Câmara de Recurso referiu‑se, nos n.os 40 e 41 da decisão recorrida, aos resultados das suas pesquisas na Internet. Mais especificamente, como resulta do n.° 40 da decisão recorrida, utilizou a definição de hiperfosfatemia, incluída na especificação dos produtos C da marca pedida, que encontrou no dicionário de termos médicos em linha. Procurou igualmente, no sítio Internet do Governo americano, dedicado aos ensaios clínicos, as indicações terapêuticas do hidroxicarbonato de magnésio, do ferro ou da hidrotalcite que fazem parte dos produtos A da marca pedida. Por fim, referiu‑se, no n.° 41 da decisão recorrida, às informações relativas à interacção dos produtos em causa, demonstrando que estão estreitamente ligados e que se destinam a pacientes que sofram de afecções renais, encontradas no sítio Internet de uma sociedade diferente da recorrente, que pertence ao mesmo grupo. Há que referir que o IHMI não contestou estes factos.

31      Embora os resultados das pesquisas em questão tenham sido extraídos dos sítios Internet referidos no n.° 30, supra, que são sítios geralmente acessíveis, esta circunstância não pode bastar, no presente caso, para considerar que se trata de factos notórios. Com efeito, trata‑se da descrição de produtos farmacêuticos e das respectivas indicações terapêuticas, que, atendendo ao seu grau de tecnicidade, não podem de modo nenhum ser consideradas informações que constituem factos notórios.

32      Assim, verifica‑se que, ao tomar em consideração os resultados de pesquisas na Internet, referidos no n.° 30, supra, a Câmara de Recurso violou o artigo 74.° do Regulamento n.° 40/94, uma vez que os factos que decorrem das suas pesquisas na Internet, referidos pela Câmara de Recurso, não são factos notórios.

33      Todavia, segundo jurisprudência constante, se, nas circunstâncias particulares do caso concreto, um erro não puder ter tido uma influência determinante quanto ao resultado, a argumentação assente nesse erro não procede e não pode, assim, bastar para justificar a anulação da decisão recorrida [v. acórdão do Tribunal Geral de 12 de Setembro de 2007, Philip Morris Products/IHMI (Forma de um maço de cigarros), T‑140/06, não publicado na Colectânea, n.° 72 e jurisprudência referida].

34      A este respeito, há que referir que o essencial da descrição dos produtos A e C abrangidos pela marca pedida foi exclusivamente extraído dos resultados de pesquisas na Internet, referidos no n.° 30, supra. Por outro lado, há que recordar que a descrição dos produtos em causa constitui o ponto de partida de qualquer comparação de produtos, que é uma etapa indispensável da apreciação do risco de confusão. No presente caso, há que sublinhar que a Câmara de Recurso não podia chegar à conclusão de que existe uma semelhança entre os produtos A e os produtos C, por um lado, e os produtos abrangidos pelas marcas letã e lituana anteriores, por outro, e, por conseguinte, concluir, no n.° 58 da decisão recorrida, pela existência do risco de confusão, sem se referir aos factos extraídos das pesquisas contestadas. Deste modo, se a informação em causa não tivesse sido utilizada, a decisão recorrida teria sido sensivelmente diferente, ao contrário do que o IHMI afirma.

35      Pelo contrário, quanto aos «produtos farmacêuticos e veterinários para diálise renal e tratamento de perturbações e afecções dos rins» (a seguir «produtos B») abrangidos pela marca pedida, as informações extraídas das pesquisas contestadas, referidas no n.° 41 da decisão recorrida, só confirmaram a conclusão da Câmara de Recurso relativa à semelhança dos produtos em causa. Por conseguinte, a violação do artigo 74.° do Regulamento n.° 40/94, declarada no n.° 32, supra, não justifica a anulação da decisão recorrida no que respeita aos produtos B.

36      Por outro lado, há que julgar improcedente o argumento do IHMI relativo às consequências a retirar do acórdão Aprile, já referido (n.os 72 e 75). Embora seja verdade que, nesse acórdão, o Tribunal Geral afirmou que o IHMI não está obrigado a ter por assentes os pontos, invocados por uma parte, que não foram postos em causa pela outra parte no processo, não afirmou de modo nenhum que o IHMI está autorizado a ultrapassar as condições de exame previstas no artigo 74.° do Regulamento n.° 40/94.

37      Resulta do exposto que a utilização, pela Câmara de Recurso, dos resultados das suas pesquisas na Internet referidas no n.° 30, supra, enferma de erro, pelo que há que julgar procedente o terceiro fundamento, na parte em que a Câmara de Recurso confirmou, na decisão recorrida, o indeferimento do pedido de registo do sinal pedido para os produtos A e para os produtos C, e julgá‑lo improcedente no que respeita aos produtos B, sem que seja necessário que o Tribunal Geral se pronuncie sobre o segundo fundamento.

38      Tendo a decisão recorrida sido parcialmente anulada na sequência da análise do terceiro fundamento, há que analisar igualmente o quarto fundamento.

 Quanto ao quarto fundamento, relativo à violação do artigo 8.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, no que respeita à determinação do público pertinente

 Argumentos das partes

39      A recorrente sustenta que a Câmara de Recurso cometeu um erro na identificação do público pertinente, ao considerar, no n.° 36 da decisão recorrida, que os produtos em causa também eram dispensados ao grande público, em regime de venda livre, nas farmácias. A recorrente contesta esta afirmação, por duas razões. Desde logo, no que respeita aos produtos abrangidos pelas marcas letã e lituana anteriores, o único elemento de prova, a saber, o folheto informativo para os consumidores, demonstra que o alfacalcidol, produto farmacêutico pertencente à categoria dos produtos abrangidos pelas marcas anteriores, só é vendido com receita médica. Por si só, esta constatação podia ter permitido concluir pela existência de um público especializado. Do mesmo modo, segundo a recorrente, os produtos abrangidos pela marca pedida só podem ser vendidos com receita médica. Ao considerar, no n.° 58 da decisão recorrida, que os consumidores médios têm uma atenção superior à média, a Câmara de Recurso ignorou que estes dispõem da receita médica ou, pelo menos, de uma assistência especializada de um profissional habilitado do sector médico.

40      O IHMI contesta os argumentos da recorrente.

 Apreciação do Tribunal Geral

41      Segundo a jurisprudência, no âmbito da apreciação global do risco de confusão, deve ter‑se em conta o consumidor médio da categoria de produtos em causa, normalmente informado e razoavelmente atento e avisado. Deve igualmente tomar‑se em consideração o facto de que o nível de atenção do consumidor médio é susceptível de variar em função da categoria de produtos ou serviços em causa (v. acórdão do Tribunal Geral de 13 de Fevereiro de 2007, Mundipharma/IHMI – Altana Pharma (RESPICUR), T‑256/04, Colect., p. II‑449, n.° 42 e jurisprudência referida].

42      No presente caso, a Câmara de Recurso considerou, no n.° 36 da decisão recorrida, que o público pertinente era composto simultaneamente por profissionais do sector médico (médicos, farmacêuticos, enfermeiros) e por consumidores médios, a saber, os pacientes e as pessoas que tomam conta deles. Considerou que não era possível excluir o consumidor médio do público pertinente, uma vez que a especificação dos produtos não estava limitada aos medicamentos vendidos com receita médica e que não se podia assim excluir que os produtos em causa possam ser adquiridos em regime de venda livre. Uma vez que as marcas anteriores estavam registadas na Letónia e na Lituânia, o público pertinente é composto, segundo a Câmara de Recurso, por profissionais do sector médico e por consumidores médios destes dois países.

43      Segundo a jurisprudência, quando os produtos em causa são medicamentos que requerem uma receita médica antes da sua venda aos consumidores nas farmácias, o público pertinente é constituído simultaneamente por consumidores finais e por profissionais da saúde, isto é, por médicos que receitam o medicamento e por farmacêuticos que o vendem. Ainda que a escolha desses produtos possa ser influenciada ou determinada por intermediários, o risco de confusão também pode existir nos consumidores, uma vez que estes podem ser confrontados com esses produtos, quanto mais não seja em operações de compra que ocorreram, para cada um dos referidos produtos considerados individualmente, em momentos diferentes (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 26 de Abril de 2007, Alcon/IHMI, C‑412/05 P, Colect., p. I‑3569, n.os 52 a 63).

44      Como decorre da jurisprudência acima referida, mesmo no caso de medicamentos vendidos exclusivamente com receita médica, não se pode excluir que o consumidor médio faça parte do público pertinente. Assim, a Câmara de Recurso concluiu, com razão, que o público pertinente é composto, simultaneamente, por profissionais de saúde e por consumidores médios.

45      Por conseguinte, a questão de saber se os medicamentos em causa podiam estar acessíveis em regime de venda livre não é pertinente no presente caso, uma vez que, mesmo que a Câmara de Recurso tivesse cometido um erro de apreciação quanto ao modo de venda dos produtos em causa, a conclusão sobre a composição do público pertinente seria a mesma.

46      Daqui resulta que há que julgar improcedente o presente fundamento. Face ao exposto, há que anular a decisão recorrida no que respeita aos produtos A e C.

 Quanto às despesas

47      Nos termos do artigo 87.°, n.° 3, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, se cada parte obtiver vencimento parcial, o Tribunal Geral pode determinar que as despesas sejam repartidas. No presente caso, tendo o pedido da recorrente sido julgado procedente apenas no que respeita a uma parte dos produtos em causa, há que condenar o IHMI a suportar as suas próprias despesas bem como metade das despesas da recorrente.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Quarta Secção)

decide:

1)      A decisão da Segunda Câmara de Recurso do Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), de 24 de Março de 2009 (processo R 1897/2007‑2), é anulada na parte respeitante aos produtos que integram as seguintes categorias: «Produtos farmacêuticos e veterinários que contenham hidroxicarbonato de magnésio, ferro ou hidrotalcite ou derivados destes compostos», «Agentes fixadores de fosfatos para tratamento da hiperfosfatemia».

2)      É negado provimento ao recurso quanto ao restante.

3)      O IHMI é condenado a suportar as suas próprias despesas bem como metade das despesas efectuadas pela Ineos Healthcare Ltd.

4)      A Ineos Healthcare é condenada a suportar metade das suas próprias despesas.

Czúcz

Labucka

O’Higgins

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 9 de Fevereiro de 2011.

Assinaturas


* Língua do processo: inglês.