Language of document : ECLI:EU:C:2024:251

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)

21 de março de 2024 (*)

«Reenvio prejudicial — Regulamento (UE) 2019/1157 — Reforço da segurança dos bilhetes de identidade dos cidadãos da União Europeia — Validade — Base jurídica — Artigo 21.o, n.o 2, TFUE — Artigo 77.o, n.o 3, TFUE — Regulamento (UE) 2019/1157 — Artigo 3.o, n.o 5 — Obrigação de os Estados‑Membros incluírem no suporte de armazenamento dos bilhetes de identidade duas impressões digitais em formatos digitais interoperáveis — Artigo 7.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia — Respeito pela vida privada e familiar — Artigo 8.o da Carta dos Direitos Fundamentais — Proteção de dados pessoais — Regulamento (UE) 2016/679 — Artigo 35.o — Obrigação de proceder a uma avaliação de impacto sobre a proteção de dados — Manutenção dos efeitos de um regulamento declarado inválido no tempo»

No processo C‑61/22,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Verwaltungsgericht Wiesbaden (Tribunal Administrativo de Wiesbaden, Alemanha), por Decisão de 13 de janeiro de 2022, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 1 de fevereiro de 2022, no processo

RL

contra

Landeshauptstadt Wiesbaden,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção),

composto por: K. Lenaerts, presidente, L. Bay Larsen, vice‑presidente, A. Arabadjiev, A. Prechal, E. Regan (relator), T. von Danwitz, F. Biltgen e Z. Csehi, presidentes de secção, J.‑C. Bonichot, S. Rodin, D. Gratsias, M. L. Arastey Sahún e M. Gavalec, juízes,

advogado‑geral: L. Medina,

secretário: D. Dittert, chefe de unidade,

vistos os autos e após a audiência de 14 de março de 2023,

vistas as observações apresentadas:

–        em representação de RL, por W. Achelpöhler, Rechtsanwalt,

–        em representação do Governo Alemão, por J. Möller e P.‑L. Krüger, na qualidade de agentes,

–        em representação do Governo Belga, por P. Cottin e A. Van Baelen, na qualidade de agentes, assistidos por P. Wytinck, advocaat,

–        em representação do Governo Espanhol, por L. Aguilera Ruiz, na qualidade de agente,

–        em representação do Governo Polaco, por B. Majczyna, na qualidade de agente,

–        em representação do Parlamento Europeu, por G. C. Bartram, P. López‑Carceller e J. Rodrigues, na qualidade de agentes,

–        em representação do Conselho da União Europeia, por M. França e Z. Šustr, na qualidade de agentes,

–        em representação da Comissão Europeia, por H. Kranenborg, E. Montaguti e I. Zaloguin, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões da advogada‑geral na audiência de 29 de junho de 2023,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a validade do Regulamento (UE) 2019/1157 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de junho de 2019, que visa reforçar a segurança dos bilhetes de identidade dos cidadãos da União e dos títulos de residência emitidos aos cidadãos da União e seus familiares que exercem o direito à livre circulação (JO 2019, L 188, p. 67), e, em especial, do seu artigo 3.o, n.o 5.

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe RL à Landeshauptstadt Wiesbaden (Capital do Land de Wiesbaden, Alemanha) (a seguir «Cidade de Wiesbaden») a respeito do indeferimento por esta última do seu pedido de emissão de um bilhete de identidade que não inclua as suas impressões digitais.

I.      Quadro jurídico

A.      Direito da União

1.      Regulamento 2019/1157

3        Os considerandos 1, 2, 4, 5, 17 a 23, 26 a 29, 32, 33, 36, 40 a 42 e 46 do Regulamento 2019/1157 têm a seguinte redação:

«(1)      O Tratado da União Europeia (TUE) visa facilitar a livre circulação de pessoas, sem deixar de garantir a segurança dos seus povos, através da criação de um espaço de liberdade, segurança e justiça, nos termos das disposições do TUE e do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE).

(2)      A cidadania da União [Europeia] confere a cada cidadão da União o direito à livre circulação, sob reserva de determinadas restrições e condições. A Diretiva 2004/38/CE do Parlamento Europeu e do Conselho[, de 29 de abril de 2004, relativa ao direito de livre circulação e residência dos cidadãos da União e dos membros das suas famílias no território dos Estados‑Membros, que altera o Regulamento (CEE) n.o 1612/68 e que revoga as Diretivas 64/221/CEE, 68/360/CEE, 72/194/CEE, 73/148/CEE, 75/34/CEE, 75/35/CEE, 90/364/CEE, 90/365/CEE e 93/96/CEE (JO 2004, L 158, p. 77),] consubstancia esse direito. O artigo 45.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (“Carta”) estabelece igualmente a liberdade de circulação e residência. A liberdade de circulação comporta o direito de entrar e sair dos Estados‑Membros mediante a apresentação de bilhete de identidade ou passaporte válido.

[…]

(4)      A Diretiva [2004/38] estabelece que os Estados‑Membros podem adotar as medidas necessárias para recusar, fazer cessar ou retirar os direitos conferidos pela presente diretiva, em caso de abuso ou fraude. A falsificação de documentos ou a apresentação de factos materiais falsos relativos às condições associadas ao direito de residência foram consideradas casos típicos de fraude para efeitos da referida diretiva.

(5)      Existem consideráveis diferenças entre os níveis de segurança dos bilhetes de identidade nacionais emitidos pelos Estados‑Membros e os títulos de residência para os cidadãos da União que residem noutro Estado‑Membro e seus familiares. Essas diferenças aumentam o risco de falsificação e fraude documental e colocam dificuldades de ordem prática aos cidadãos que exercem o seu direito à livre circulação. As estatísticas da Rede Europeia de Análise de Riscos de Fraude de Documentos mostram que o número de bilhetes de identidade fraudulentos tem crescido ao longo do tempo.

[…]

(17)      Os dispositivos de segurança são necessários para verificar se o documento é autêntico e confirmar a identidade dos titulares. A aplicação de normas mínimas de segurança e a inclusão de dados biométricos nos bilhetes de identidade e cartões de residência dos familiares que não sejam nacionais de um Estado‑Membro constituem passos importantes para reforçar a segurança da sua utilização na União. A inclusão dos referidos identificadores biométricos deverá permitir aos cidadãos da União exercer plenamente o seu direito de livre circulação.

(18)      O armazenamento de uma imagem facial e de duas impressões digitais (“dados biométricos”) nos documentos de identidade e de residência, tal como já previsto para os passaportes e os títulos de residência biométricos para os nacionais de países terceiros, é o método mais adequado para combinar uma identificação e uma autenticação fiáveis com um risco de fraude reduzido, de modo a reforçar a segurança dos documentos de identidade e de residência.

(19)      Como prática geral, para efeitos de verificação da autenticidade do documento e da identidade do titular, os Estados‑Membros deverão, em primeiro lugar, verificar a imagem facial e, caso seja necessário para confirmar sem dúvidas a autenticidade do documento e a identidade do titular, verificar igualmente as impressões digitais.

(20)      Os Estados‑Membros deverão assegurar que, nos casos em que a verificação dos dados biométricos não confirme a autenticidade do documento ou a identidade do seu titular, seja efetuado um controlo manual obrigatório por pessoal qualificado.

(21)      O presente regulamento não prevê uma base jurídica para a criação ou manutenção de bases de dados a nível nacional para o armazenamento de dados biométricos nos Estados‑Membros, tendo em conta que esta questão é abrangida pelo direito nacional e deve ser conforme com o direito da União em matéria de proteção de dados. O presente regulamento também não prevê uma base jurídica para a criação ou manutenção de uma base de dados centralizada a nível da União.

[…]

(23)      Para efeitos do presente regulamento, deverão ser tidas em conta as especificações estabelecidas no documento 9303 da [Organização da Aviação Civil Internacional (OACI)], que asseguram a interoperabilidade global, incluindo no caso de leitura ótica e recurso a inspeção visual.

[…]

(26)      Os Estados‑Membros deverão certificar‑se da existência de procedimentos adequados e eficazes de recolha de identificadores biométricos que sejam conformes com os direitos e princípios definidos na Carta, na Convenção para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais do Conselho da Europa[, assinada em Roma em 4 de novembro de 1950] e na Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança[, adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em 20 de novembro de 1989 (Recueil des traités des Nations unies, vol. 1577, p. 3), e que entrou em vigor em 2 de setembro de 1990]. Os Estados‑Membros deverão assegurar que o superior interesse da criança seja a principal consideração ao longo de todo o processo de recolha. Para o efeito, o pessoal qualificado deverá receber a devida formação sobre práticas respeitadoras das crianças na recolha de identificadores biométricos.

(27)      Se forem encontradas dificuldades na recolha de identificadores biométricos, os Estados‑Membros deverão assegurar a aplicação de procedimentos adequados para respeitar a dignidade das pessoas em causa. Por conseguinte, deverão ser tidas em conta considerações específicas relacionadas com o género e as necessidades específicas das crianças e das pessoas vulneráveis.

(28)      A adoção de normas mínimas de segurança e de modelos de bilhetes de identidade deverá constituir garantia de fiabilidade desses documentos para os outros Estados‑Membros, sempre que os cidadãos da União exercerem o direito de livre circulação. A introdução de normas de segurança reforçadas deverá proporcionar garantias suficientes às autoridades públicas e às entidades privadas para lhes permitir confiar na autenticidade dos bilhetes de identidade utilizados pelos cidadãos da União para efeitos de identificação.

(29)      Um símbolo distintivo, sob a forma do código de país, composto por duas letras, do Estado‑Membro que emite o documento, rodeado de 12 estrelas amarelas e impresso em negativo num retângulo azul, facilita a inspeção visual do documento, em particular quando o titular exercer o direito de livre circulação.

[…]

(32)      Os Estados‑Membros deverão tomar todas as medidas necessárias para assegurar que os dados biométricos identificam corretamente a pessoa a quem é emitido um bilhete de identidade. Para o efeito, os Estados‑Membros podem considerar a recolha de identificadores biométricos, em especial a imagem facial, através do registo presencial pelas autoridades nacionais que emitem bilhetes de identidade.

(33)      Os Estados‑Membros deverão trocar estas informações, uma vez que são necessárias para consultar, autenticar e verificar as informações contidas no suporte de armazenamento seguro. Os formatos utilizados para o suporte de armazenamento seguro deverão ser interoperáveis, incluindo no que respeita aos pontos de passagem de fronteira automatizados.

[…]

(36)      Os títulos de residência emitidos aos cidadãos da União deverão incluir informações específicas que garantam a sua identificação nessa qualidade em todos os Estados‑Membros. Será assim facilitado o reconhecimento do exercício do direito de livre circulação e dos direitos inerentes a esse exercício pelos cidadãos da UE em mobilidade, embora a harmonização não deva exceder o necessário para suprir as insuficiências dos documentos atuais. Os Estados‑Membros podem escolher o formato em que estes documentos são emitidos e podem emiti‑los num formato conforme com as especificações do documento 9303 da OACI.

[…]

(40)      Relativamente aos dados pessoais a tratar para efeitos da aplicação do presente regulamento, é aplicável o Regulamento (UE) 2016/679 do Parlamento Europeu e do Conselho[, de 27 de abril de 2016, relativo à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados e que revoga a Diretiva 95/46/CE (Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados) (JO 2016, L 119, p. 1; a seguir “RGPD”)]. É necessário prever salvaguardas adicionais aplicáveis aos dados pessoais tratados e, sobretudo, a dados sensíveis como os identificadores biométricos. Deverá ser dada a conhecer aos titulares dos dados a existência, nos documentos, de um suporte de armazenamento que contém dados biométricos, incluindo o respetivo acesso sem contacto, assim como todos os casos em que os dados inseridos nos bilhetes de identidade e títulos de residência são utilizados. De qualquer forma, os titulares dos dados deverão ter acesso aos dados pessoais inseridos nos respetivos bilhetes de identidade e títulos de residência, e deverão poder solicitar a sua retificação mediante a emissão de um novo documento nos casos em que esses dados estejam incorretos ou incompletos. O suporte de armazenamento deverá garantir um elevado nível de segurança e proteger de forma eficaz os dados pessoais nele contidos contra o acesso não autorizado.

(41)      Os Estados‑Membros deverão ser responsáveis pelo tratamento adequado dos dados biométricos, desde a recolha até à integração dos dados no suporte de armazenamento de elevado nível de segurança, nos termos do [RGPD].

(42)      Os Estados‑Membros deverão ser especialmente prudentes quando cooperarem com um prestador de serviços externo. Essa cooperação não deverá excluir qualquer responsabilidade decorrente do direito da União ou do direito nacional em caso de incumprimento das obrigações em matéria de dados pessoais.

[…]

(46)      Atendendo a que os objetivos do presente regulamento, a saber reforçar a segurança e facilitar o direito à livre circulação dos cidadãos da União e das suas famílias, não podem ser suficientemente alcançados pelos Estados‑Membros, mas podem, devido à dimensão e aos efeitos da ação, ser mais bem alcançados a nível da União, a União pode tomar medidas, em conformidade com o princípio da subsidiariedade consagrado no artigo 5.o [TUE]. Em conformidade com o princípio da proporcionalidade consagrado no mesmo artigo, o presente regulamento não excede o necessário para alcançar esses objetivos.»

4        O artigo 1.o do Regulamento 2019/1157, sob a epígrafe «Objeto», dispõe:

«O presente regulamento reforça as normas de segurança aplicáveis aos bilhetes de identidade de cidadão nacional emitidos pelos Estados‑Membros e aos títulos de residência emitidos pelos Estados‑Membros aos cidadãos da União e seus familiares que exercem o direito à livre circulação na União.»

5        O artigo 2.o deste regulamento, sob a epígrafe «Âmbito de aplicação», enuncia:

«O presente regulamento é aplicável:

a)      Aos bilhetes de identidade de cidadão nacional emitidos pelos Estados‑Membros, a que se refere o artigo 4.o, n.o 3, da Diretiva [2004/38];

O presente regulamento não se aplica aos documentos de identificação emitidos a título provisório com um prazo de validade inferior a seis meses.

b)      Aos certificados de registo emitidos nos termos do artigo 8.o da Diretiva [2004/38] aos cidadãos da União residentes há mais de três meses num Estado‑Membro de acolhimento, e aos documentos que certifiquem a residência permanente emitidos nos termos do artigo 19.o da Diretiva [2004/38] a cidadãos da União, mediante pedido;

c)      Aos cartões de residência emitidos nos termos do artigo 10.o da Diretiva [2004/38] aos familiares de cidadãos da União, que não sejam nacionais de um Estado‑Membro, e aos cartões de residência permanente emitidos nos termos do artigo 20.o da Diretiva [2004/38] aos familiares de cidadãos da União, que não sejam nacionais de um Estado‑Membro.»

6        O artigo 3.o do referido regulamento, sob a epígrafe «Normas de segurança/modelo/especificações», prevê, nos seus n.os 5 a 7 e 10:

«5.      Os bilhetes de identidade devem incluir um suporte de armazenamento com elevado nível de segurança, que deverá conter dados biométricos com a imagem facial do titular e duas impressões digitais em formatos digitais interoperáveis. Para a recolha dos identificadores biométricos, os Estados‑Membros devem aplicar as especificações técnicas estabelecidas pela Decisão de Execução C(2018) 7767 da Comissão[, de 30 de novembro de 2018, que estabelece um modelo uniforme de título de residência para os nacionais de países terceiros e que revoga a Decisão C(2002) 3069].

6.      O suporte de armazenamento deve dispor de capacidade suficiente e das características necessárias para garantir a integridade, autenticidade e confidencialidade dos dados. Os dados armazenados devem ser acessíveis sem contacto e securizados, tal como previsto na Decisão de Execução C(2018) 7767. Os Estados‑Membros devem proceder ao intercâmbio das informações necessárias para autenticar o suporte de armazenamento e para consultar e verificar os dados biométricos referidos no n.o 5.

7.      As crianças com menos de 12 anos podem ser dispensadas do requisito de fornecer impressões digitais.

As crianças com menos de 6 anos são dispensadas do requisito de fornecer impressões digitais.

As pessoas cujas impressões digitais sejam fisicamente impossíveis de recolher são dispensadas desse requisito.

[…]

10.      Se os Estados‑Membros armazenarem, nos bilhetes de identidade, dados para utilização em serviços eletrónicos, como a administração pública e o comércio eletrónicos, esses dados nacionais devem ser física ou logicamente separados dos dados biométricos a que se refere o n.o 5.»

7        Nos termos do artigo 5.o deste mesmo regulamento, sob a epígrafe «Supressão gradual»:

«1.      A validade dos bilhetes de identidade que não cumpram os requisitos do artigo 3.o cessa na respetiva data de caducidade ou até 3 de agosto de 2031, consoante a que ocorrer primeiro.

2.      Em derrogação do n.o 1:

a)      A validade dos bilhetes de identidade que […] que não incluam uma zona de leitura ótica funcional, tal como definida no n.o 3, cessa na respetiva data de caducidade ou até 3 de agosto de 2026, consoante a que ocorrer primeiro;

[…]

3.      Para efeitos do n.o 2, entende‑se por uma zona de leitura ótica funcional:

a)      Uma zona de leitura ótica conforme com a parte 3 do documento 9303 da OACI; ou

b)      Qualquer outra zona de leitura ótica para a qual o Estado‑Membro emissor notifique as normas necessárias à leitura e visualização das informações nela contidas, salvo se um Estado‑Membro notificar a Comissão [Europeia], até 2 de agosto de 2021, da sua falta de capacidade para ler e visualizar estas informações.

[…]»

8        O artigo 6.o do Regulamento 2019/1157, sob a epígrafe «Informações mínimas a fornecer», dispõe, no seu primeiro parágrafo:

«Os títulos de residência, quando emitidos pelos Estados‑Membros aos cidadãos da União, devem indicar, pelo menos, o seguinte:

[…]

f)      As informações a incluir nos certificados de registo e nos documentos que certifiquem a residência permanente, emitidos nos termos do artigo 8.o e do artigo 19.o, respetivamente, da Diretiva [2004/38];

[…]»

9        O artigo 10.o deste regulamento, sob a epígrafe «Recolha de identificadores biométricos», prevê:

«1.      Os identificadores biométricos são recolhidos exclusivamente por pessoal qualificado e devidamente habilitado, designado pelas autoridades responsáveis pela emissão dos bilhetes de identidade ou dos cartões de residência, com o objetivo de serem integrados no suporte de armazenamento de elevada segurança previsto no artigo 3.o, n.o 5, para os bilhetes de identidade e no artigo 7.o, n.o 1, para os cartões de residência. A título de derrogação ao disposto na primeira frase, as impressões digitais são recolhidas exclusivamente por pessoal qualificado e devidamente autorizado dessas autoridades, exceto no caso de pedidos apresentados às autoridades diplomáticas e consulares do Estado‑Membro.

A fim de assegurar a coerência dos identificadores biométricos com a identidade do requerente, este deve comparecer pessoalmente pelo menos uma vez durante o processo de emissão de cada pedido.

2.      Os Estados‑Membros certificam‑se da aplicação de procedimentos adequados e eficazes de recolha de identificadores biométricos que cumpram os direitos e princípios estabelecidos na Carta, na Convenção para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais e na Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança.

Se forem encontradas dificuldades na recolha de identificadores biométricos, os Estados‑Membros devem assegurar a aplicação de procedimentos adequados para garantir a dignidade das pessoas em causa.

3.      A não ser que seja necessário para efeitos de tratamento de dados de acordo com o direito da União e com o direito nacional, os identificadores biométricos armazenados para efeitos de personalização dos bilhetes de identidade ou títulos de residência devem ser conservados de forma bastante segura e apenas até à data de recolha do documento e, em qualquer caso, o mais tardar 90 dias a contar da data de emissão desse documento. Após este período, os identificadores biométricos serão imediatamente apagados ou destruídos.»

10      O artigo 11.o do referido regulamento, sob a epígrafe «Proteção de dados pessoais e responsabilidade», enuncia, nos seus n.os 4 e 6:

«4.      A cooperação com prestadores de serviços externos não exclui qualquer responsabilidade de um Estado‑Membro decorrente do direito da União ou nacional em caso de incumprimento das obrigações em matéria de dados pessoais.

[…]

6.      Os dados biométricos armazenados no suporte de armazenamento dos bilhetes de identidade e títulos de residência só podem ser utilizados, de acordo com o direito da União e do direito nacional, pelo pessoal devidamente autorizado das autoridades nacionais competentes e das agências da União, para fins de verificação da:

a)      Autenticidade do bilhete de identidade ou título de residência;

b)      Identidade do titular, através de dispositivos comparáveis e diretamente disponíveis, nos casos em que a apresentação do bilhete de identidade ou título de residência for exigida por lei.»

11      O artigo 14.o do mesmo regulamento, sob a epígrafe «Especificações técnicas adicionais», dispõe, nos seus n.os 1 e 2:

«1.      Para assegurar, se for caso disso, que os bilhetes de identidade e títulos de residência referidos no artigo 2.o, alíneas a) e c), cumprem as futuras normas mínimas de segurança, a Comissão estabelece, por meio de atos de execução, especificações técnicas adicionais relativamente a:

a)      Dispositivos e requisitos de segurança complementares, incluindo normas de prevenção reforçadas contra o risco de reprodução fraudulenta, contrafação e falsificação;

b)      Especificações técnicas relativas ao suporte de armazenamento dos dados biométricos a que se refere o artigo 3.o, n.o 5, e à sua proteção, incluindo a prevenção do acesso não autorizado e uma validação facilitada;

c)      Requisitos em matéria de qualidade e normas técnicas comuns no que diz respeito à imagem facial e às impressões digitais.

Os referidos atos de execução são adotados pelo procedimento de exame a que se refere o artigo 15.o, n.o 2.

2.      Pode decidir‑se, nos termos do artigo 15.o, n.o 2, que as especificações referidas no presente artigo são mantidas secretas e não são publicadas. […]»

2.      RGPD

12      O considerando 51 do RGPD enuncia:

«Merecem proteção específica os dados pessoais que sejam, pela sua natureza, especialmente sensíveis do ponto de vista dos direitos e liberdades fundamentais, dado que o contexto do tratamento desses dados poderá implicar riscos significativos para os direitos e liberdades fundamentais. […] O tratamento de fotografias não deverá ser considerado sistematicamente um tratamento de categorias especiais de dados pessoais, uma vez que são apenas abrangidas pela definição de dados biométricos quando forem processadas por meios técnicos específicos que permitam a identificação inequívoca ou a autenticação de uma pessoa singular. Tais dados pessoais não deverão ser objeto de tratamento, salvo se essa operação for autorizada em casos específicos definidos no presente regulamento, tendo em conta que o direito dos Estados‑Membros pode estabelecer disposições de proteção de dados específicas, a fim de adaptar a aplicação das regras do presente regulamento para dar cumprimento a uma obrigação legal, para o exercício de funções de interesse público ou para o exercício da autoridade pública de que está investido o responsável pelo tratamento. Para além dos requisitos específicos para este tipo de tratamento, os princípios gerais e outras disposições do presente regulamento deverão ser aplicáveis, em especial no que se refere às condições para o tratamento lícito. Deverão ser previstas de forma explícita derrogações à proibição geral de tratamento de categorias especiais de dados pessoais, por exemplo, se o titular dos dados der o seu consentimento expresso ou para ter em conta necessidades específicas […]»

13      O artigo 4.o deste regulamento, sob a epígrafe «Definições», tem a seguinte redação:

«Para efeitos do presente regulamento, entende‑se por:

[…]

2)      “Tratamento”, uma operação ou um conjunto de operações efetuadas sobre dados pessoais ou sobre conjuntos de dados pessoais, por meios automatizados ou não automatizados, tais como a recolha, o registo, a organização, a estruturação, a conservação, a adaptação ou alteração, a recuperação, a consulta, a utilização, a divulgação por transmissão, difusão ou qualquer outra forma de disponibilização, a comparação ou interconexão, a limitação, o apagamento ou a destruição;

[…]

7)      “Responsável pelo tratamento”, a pessoa singular ou coletiva, a autoridade pública, a agência ou outro organismo que, individualmente ou em conjunto com outras, determina as finalidades e os meios de tratamento de dados pessoais; sempre que as finalidades e os meios desse tratamento sejam determinados pelo direito da União ou de um Estado‑Membro, o responsável pelo tratamento ou os critérios específicos aplicáveis à sua nomeação podem ser previstos pelo direito da União ou de um Estado‑Membro;

[…]»

14      O artigo 9.o do referido regulamento, sob a epígrafe «Tratamento de categorias especiais de dados pessoais», prevê, no seu n.o 1:

«É proibido o tratamento de dados pessoais que revelem a origem racial ou étnica, as opiniões políticas, as convicções religiosas ou filosóficas, ou a filiação sindical, bem como o tratamento de dados genéticos, dados biométricos para identificar uma pessoa de forma inequívoca, dados relativos à saúde ou dados relativos à vida sexual ou orientação sexual de uma pessoa.»

15      O artigo 35.o do mesmo regulamento, sob a epígrafe «Avaliação de impacto sobre a proteção de dados e consulta prévia», dispõe, nos seus n.os 1, 3 e 10:

«1.      Quando um certo tipo de tratamento, em particular que utilize novas tecnologias e tendo em conta a sua natureza, âmbito, contexto e finalidades, for suscetível de implicar um elevado risco para os direitos e liberdades das pessoas singulares, o responsável pelo tratamento procede, antes de iniciar o tratamento, a uma avaliação de impacto das operações de tratamento previstas sobre a proteção de dados pessoais. Se um conjunto de operações de tratamento que apresentar riscos elevados semelhantes, pode ser analisado numa única avaliação.

[…]

3.      A realização de uma avaliação de impacto sobre a proteção de dados a que se refere o n.o 1 é obrigatória nomeadamente em caso de:

a)      Avaliação sistemática e completa dos aspetos pessoais relacionados com pessoas singulares, baseada no tratamento automatizado, incluindo a definição de perfis, sendo com base nela adotadas decisões que produzem efeitos jurídicos relativamente à pessoa singular ou que a afetem significativamente de forma similar;

b)      Operações de tratamento em grande escala de categorias especiais de dados a que se refere o artigo 9.o, n.o 1, ou de dados pessoais relacionados com condenações penais e infrações a que se refere o artigo 10.o; ou

c)      Controlo sistemático de zonas acessíveis ao público em grande escala.

[…]

10.      Se o tratamento efetuado por força do artigo 6.o, n.o 1, alínea c) ou e), tiver por fundamento jurídico o direito da União ou do Estado‑Membro a que o responsável pelo tratamento está sujeito, e esse direito regular a operação ou as operações de tratamento específicas em questão, e se já tiver sido realizada uma avaliação de impacto sobre a proteção de dados no âmbito de uma avaliação de impacto geral no contexto da adoção desse fundamento jurídico, não são aplicáveis os n.os 1 a 7, salvo se os Estados‑Membros considerarem necessário proceder a essa avaliação antes das atividades de tratamento.»

3.      Regulamento (UE) 2016/399

16      O artigo 8.o do Regulamento (UE) 2016/399 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de março de 2016, que estabelece o código da União relativo ao regime de passagem de pessoas nas fronteiras (Código das Fronteiras Schengen) (JO 2016, L 77, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento (UE) 2017/458 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de março de 2017 (JO 2017, L 74, p. 1), prevê, nos seus n.os 1 e 2:

«1.      A passagem das fronteiras externas é submetida a controlos por guardas de fronteira. Os controlos são efetuados em conformidade com o presente capítulo.

[…]

2.      À entrada e à saída, as pessoas que beneficiam do direito de livre circulação ao abrigo do direito da União são sujeitas aos seguintes controlos:

a)      Verificação da identidade e nacionalidade da pessoa e da autenticidade e validade do documento de viagem para a passagem da fronteira, designadamente através da consulta das bases de dados pertinentes […]

b)      verificação de que uma pessoa que beneficia do direito de livre circulação ao abrigo do direito da União não é considerada uma ameaça para a ordem pública, a segurança interna, a saúde pública ou as relações internacionais de qualquer dos Estados‑Membros; […]

Em caso de dúvida sobre a autenticidade do documento de viagem ou sobre a identidade do seu titular, deve ser verificado pelo menos um dos identificadores biométricos integrados nos passaportes e documentos de viagem emitidos nos termos do Regulamento (CE) n.o 2252/2004 [do Conselho, de 13 de dezembro de 2004, que estabelece normas para os dispositivos de segurança e dados biométricos dos passaportes e documentos de viagem emitidos pelos Estados‑Membros (JO 2004, L 385, p. 1)]. Sempre que possível, essa verificação também deve ser efetuada relativamente a documentos de viagem não abrangidos pelo referido regulamento.

[…]»

4.      Diretiva 2004/38

17      O artigo 4.o da Diretiva 2004/38, sob a epígrafe «Direito de saída», dispõe, nos seus n.os 1 e 3:

«1.      Sem prejuízo das disposições em matéria de documentos de viagem aplicáveis aos controlos nas fronteiras nacionais, têm direito a sair do território de um Estado‑Membro a fim de se deslocar a outro Estado‑Membro todos os cidadãos da União, munidos de um bilhete de identidade ou passaporte válido, e os membros das suas famílias que, não tendo a nacionalidade de um Estado‑Membro, estejam munidos de um passaporte válido.

[…]

3.      Os Estados‑Membros, agindo nos termos do respetivo direito, devem emitir ou renovar aos seus nacionais um bilhete de identidade ou passaporte que indique a nacionalidade do seu titular.»

18      O artigo 5.o desta diretiva, com a epígrafe «Direito de entrada», refere, no seu n.o 1:

«Sem prejuízo das disposições em matéria de documentos de viagem aplicáveis aos controlos nas fronteiras nacionais, os Estados‑Membros devem admitir no seu território os cidadãos da União, munidos de um bilhete de identidade ou passaporte válido, e os membros das suas famílias que, não tendo a nacionalidade de um Estado‑Membro, estejam munidos de um passaporte válido.

Não pode ser exigido ao cidadão da União um visto de entrada ou formalidade equivalente.»

19      O artigo 6.o da referida diretiva, sob a epígrafe «Direito de residência até três meses», enuncia:

«1.      Os cidadãos da União têm o direito de residir no território de outro Estado‑Membro por período até três meses sem outras condições e formalidades além de ser titular de um bilhete de identidade ou passaporte válido.

2.      O disposto no n.o 1 é igualmente aplicável aos membros da família que não tenham a nacionalidade de um Estado‑Membro e que, munidos de um passaporte válido, acompanhem ou se reúnam ao cidadão da União.»

20      O artigo 8.o da Diretiva 2004/38, sob a epígrafe «Formalidades administrativas para os cidadãos da União», prevê, nos seus n.os 1 e 3:

«1.      Sem prejuízo do n.o 5 do artigo 5.o, para períodos de residência superiores a três meses, o Estado‑Membro de acolhimento pode exigir que os cidadãos da União se registem junto das autoridades competentes.

[…]

3.      Para a emissão do certificado de registo, os Estados‑Membros só podem exigir que:

–        o cidadão da União a quem se aplica a alínea a) do n.o 1 do artigo 7.o apresente um bilhete de identidade ou passaporte válido, uma confirmação de emprego pela entidade patronal ou uma certidão de emprego, ou a prova de que exerce uma atividade não assalariada,

–        o cidadão da União a quem se aplica a alínea b) do n.o 1 do artigo 7.o apresente um bilhete de identidade ou passaporte válido e comprove que preenche as condições nela previstas,

–        o cidadão da União a quem se aplica a alínea c) do n.o 1 do artigo 7.o apresente um bilhete de identidade ou passaporte válido, comprove a sua inscrição num estabelecimento de ensino reconhecido e a sua cobertura extensa por um seguro de doença e a declaração ou meios equivalentes referidos na alínea c) do n.o 1 do artigo 7.o Os Estados‑Membros não podem exigir que esta declaração mencione um montante específico de recursos.»

5.      Acordo Interinstitucional

21      Os pontos 12 a 14 do Acordo Interinstitucional entre o Parlamento Europeu, o Conselho da União Europeia e a Comissão Europeia sobre legislar melhor, de 13 de abril de 2016 (JO 2016, L 123, p. 1; a seguir «Acordo Interinstitucional»), enunciam:

«12.      […]

As avaliações de impacto auxiliam as três instituições a tomarem decisões com pleno conhecimento de causa, e não são um substituto de decisões políticas tomadas no âmbito do processo decisório democrático. […]

As avaliações de impacto deverão abranger a existência, a amplitude e as consequências de um problema e a questão de saber se é necessária uma ação da União. As avaliações de impacto deverão definir soluções alternativas e, se possível, os potenciais custos e benefícios a curto e longo prazo, determinando o seu impacto económico, ambiental e social de forma integrada e equilibrada graças a análises qualitativas e quantitativas. Os princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade deverão ser plenamente respeitados, bem como os direitos humanos. […] As avaliações de impacto deverão basear‑se em informações exatas, objetivas e completas, e ser proporcionadas no que diz respeito ao âmbito de aplicação e incidência.

13.      A Comissão efetuará avaliações de impacto das suas iniciativas legislativas […] que são suscetíveis de ter repercussões importantes a nível económico, ambiental ou social. Regra geral, as iniciativas constantes do programa de trabalho da Comissão e da declaração conjunta deverão ser acompanhadas de uma avaliação de impacto.

[…] Os resultados finais das avaliações de impacto serão colocados à disposição do Parlamento Europeu, do Conselho [da União Europeia] e dos parlamentos nacionais e serão tornados públicos juntamente com o(s) parecer(es) do Comité de Controlo da Regulamentação da Comissão aquando da adoção da iniciativa da Comissão.

14.      Ao ponderarem as propostas legislativas da Comissão, o Parlamento […] e o Conselho tomarão plenamente em conta as avaliações de impacto da Comissão. Para esse efeito, as avaliações de impacto são apresentadas de modo a facilitar a análise, pelo Parlamento […] e pelo Conselho, das escolhas feitas pela Comissão.»

B.      Direito alemão

22      O § 5 da Gesetz über Personalausweise und den elektronischen Identitätsnachweis (Lei relativa aos Bilhetes de Identidade e à Identificação Eletrónica), de 18 de junho de 2009 (BGBl. I, p. 1346), na sua versão aplicável aos factos no processo principal (a seguir «PAuswG»), intitulado «Modelo de bilhete de identidade; dados armazenados», dispõe, no seu n.o 9:

«As duas impressões digitais do requerente [do bilhete de identidade] que devem ser conservadas no suporte de armazenamento eletrónico em aplicação do Regulamento [2019/1157] são gravadas no suporte de armazenamento e de processamento eletrónico do bilhete de identidade sob a forma das impressões planas dos indicadores esquerdo e direito. Nos casos de falta de indicador, de qualidade insuficiente da impressão digital ou de ferimentos da polpa digital, utilizar‑se‑á a impressão plana do polegar, do médio, ou do anelar. As impressões digitais não devem ser registadas nos casos em que não seja possível recolher impressões digitais por motivos médicos que não sejam apenas de natureza temporária.»

23      Nos termos do § 6, n.os 1 e 2, da PauswG:

«(1)      Os bilhetes de identidade são emitidos com um prazo de validade de dez anos.

(2)      Antes do termo do prazo de validade do bilhete de identidade, pode ser requerido um novo bilhete de identidade se se demonstrar um interesse legítimo na emissão de um novo bilhete.»

24      O § 9 da PAuswG, sob a epígrafe «Emissão do bilhete», enuncia, no seu n.o 1, primeiro período:

«Os bilhetes de identidade e os bilhetes de identidade provisórios são emitidos, a requerimento, aos alemães na aceção do artigo 116.o, n.o 1, da Lei Fundamental.»

25      O artigo 28.o da PauswG, sob a epígrafe «Invalidade», prevê, no seu n.o 3:

«As anomalias do suporte eletrónico de armazenamento e de processamento não afetam a validade do bilhete de identidade.»

II.    Litígio no processo principal e questão prejudicial

26      Em 30 de novembro de 2021, o demandante no processo principal solicitou à Cidade de Wiesbaden a emissão de um novo bilhete de identidade, com o fundamento de que o chip eletrónico do seu antigo bilhete estava deteriorado. No entanto, solicitou que o novo bilhete não contivesse as suas impressões digitais.

27      A Cidade de Wiesbaden indeferiu este pedido com base num duplo fundamento. Por um lado, o demandante no processo principal não tinha direito à emissão de um novo bilhete de identidade, uma vez que já possuía um documento de identidade válido. Com efeito, em conformidade com o § 28, n.o 3, da PAuswG, um bilhete de identidade conserva a sua validade apesar de o seu chip eletrónico estar deteriorado. Por outro lado, e em todo o caso, desde 2 de agosto de 2021, a inclusão de duas impressões digitais no suporte de armazenamento dos bilhetes de identidade é obrigatória por força do § 5, n.o 9, da PAuswG, que transpõe o artigo 3.o, n.o 5, do Regulamento 2019/1157.

28      Em 21 de dezembro de 2021, o demandante no processo principal intentou uma ação no Verwaltungsgericht Wiesbaden (Tribunal Administrativo de Wiesbaden, Alemanha), que é o órgão jurisdicional de reenvio, pedindo que a Cidade de Wiesbaden fosse condenada a emitir‑lhe um bilhete de identidade sem que as suas impressões digitais fossem recolhidas.

29      O órgão jurisdicional de reenvio manifesta dúvidas quanto à legalidade dos fundamentos invocados na decisão em causa no processo principal. No que respeita, em particular, ao segundo fundamento, tende a pensar que a validade do Regulamento 2019/1157 ou, pelo menos, a validade do artigo 3.o, n.o 5, deste é contestável.

30      Em primeiro lugar, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se sobre se este regulamento não deveria ter sido adotado ao abrigo do artigo 77.o, n.o 3, TFUE e, por conseguinte, no termo do processo legislativo especial previsto nesta disposição, e não ao abrigo do artigo 21.o, n.o 2, TFUE e por aplicação do processo legislativo ordinário. Com efeito, por um lado, o artigo 77.o, n.o 3, TFUE refere‑se especificamente à competência da União para adotar, entre outras, disposições relativas aos bilhetes de identidade e é, assim, uma disposição mais específica do que o artigo 21.o, n.o 2, TFUE. Por outro lado, no Acórdão de 17 de outubro de 2013, Schwarz (C‑291/12, EU:C:2013:670), o Tribunal de Justiça declarou que o Regulamento n.o 2252/2004, ao estabelecer normas para os dados biométricos dos passaportes, se baseava validamente no artigo 62.o, ponto 2, alínea a), CE, que corresponde agora ao artigo 77.o, n.o 3, TFUE.

31      Em segundo lugar, o órgão jurisdicional de reenvio invoca a possível existência de um vício processual que afetou a adoção do Regulamento 2019/1157. Com efeito, como sublinhou a Autoridade Europeia para a Proteção de Dados (a seguir «AEPD») no seu Parecer 7/2018, de 10 de agosto de 2018, sobre a proposta de regulamento que visa reforçar a segurança dos bilhetes de identidade dos cidadãos da União e de outros títulos (a seguir «Parecer 7/2018»), a recolha e o armazenamento de impressões digitais constituem tratamentos de dados pessoais que devem ser objeto de uma avaliação de impacto nos termos do artigo 35.o, n.o 10, do RGPD. Ora, no caso em apreço, essa avaliação não foi realizada. Em especial, o documento que acompanha a referida proposta de regulamento, intitulado «Impact assessment», não pode ser considerado uma avaliação de impacto na aceção desta disposição.

32      Em terceiro lugar, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se mais especificamente sobre a compatibilidade do artigo 3.o, n.o 5, do Regulamento 2019/1157 com os artigos 7.o e 8.o da Carta relativos, respetivamente, ao respeito pela vida privada e familiar e à proteção de dados pessoais. Com efeito, a obrigação imposta aos Estados‑Membros de emitirem bilhetes de identidade cujo suporte de armazenamento contenha duas impressões digitais constitui uma restrição ao exercício dos direitos reconhecidos por estas duas disposições da Carta, restrição que só pode ser justificada se preencher os requisitos estabelecidos no artigo 52.o, n.o 1, da Carta.

33      Ora, por um lado, a referida restrição pode não corresponder a um objetivo de interesse geral. É certo que o Tribunal de Justiça admitiu, no Acórdão de 17 de outubro de 2013, Schwarz (C‑291/12, EU:C:2013:670), que a luta contra as entradas ilegais de nacionais de países terceiros no território da União é um objetivo reconhecido pelo direito da União. Todavia, o bilhete de identidade não é, em primeira linha, um documento de viagem, como o passaporte, e o seu objetivo consiste apenas em permitir a verificação da identidade de um cidadão da União nas suas interações tanto com autoridades administrativas como com os terceiros privados.

34      Por outro lado, admitindo que o referido regulamento prossegue um objetivo de interesse geral reconhecido pelo direito da União, existem dúvidas quanto à proporcionalidade desta mesma restrição. Com efeito, a solução adotada pelo Tribunal de Justiça no Acórdão de 17 de outubro de 2013, Schwarz (C‑291/12, EU:C:2013:670), não é transponível para o Regulamento 2019/1157, por ser relativa aos passaportes cuja posse, contrariamente aos bilhetes de identidade, é facultativa na Alemanha e cuja utilização prossegue um objetivo diferente.

35      Em contrapartida, resulta do Parecer 7/2018 que o facto de incluir e armazenar impressões digitais tem uma incidência considerável, suscetível de afetar até 370 milhões de cidadãos da União e de submeter potencialmente 85 % da população da União à recolha obrigatória de impressões digitais. Ora, esta incidência considerável, conjugada com o caráter muito sensível dos dados tratados (uma imagem facial combinada com duas impressões digitais), implica que a restrição introduzida ao exercício dos direitos garantidos nos artigos 7.o e 8.o da Carta, resultante da recolha obrigatória das impressões digitais para efeitos da emissão dos bilhetes de identidade, seja muito maior do que para os passaportes, o que exige, em contrapartida, maiores exigências a nível da justificação e um exame minucioso da medida em causa segundo um critério de estrita necessidade.

36      Em todo o caso, a necessidade de proceder a um controlo estrito da proporcionalidade decorre igualmente do artigo 9.o, n.o 1, do RGPD, nos termos do qual o tratamento desses dados biométricos é, em princípio, proibido e só pode ser autorizado em casos excecionais e estritamente limitados.

37      Neste contexto, embora o órgão jurisdicional de reenvio considere que a utilização de dados biométricos reduz o risco de um documento poder ser falsificado, tem dúvidas quanto à questão de saber se essa circunstância pode, por si só, justificar a amplitude da restrição ao direito à proteção dos dados pessoais à luz, em especial, das seguintes razões.

38      Antes de mais, no seu Parecer 7/2018, a AEPD sublinhou que outras técnicas de impressão segura dos documentos de identificação, tais como os hologramas ou as marcas de água, eram claramente menos intrusivos, permitindo igualmente impedir a falsificação desses documentos de identidade e verificar a sua autenticidade. Aliás, o facto de o direito alemão admitir que um bilhete de identidade cujo chip eletrónico está deteriorado continua a ser válido demonstra que os elementos físicos, nomeadamente as microimpressões ou as impressões UV, são suficientes para garantir a segurança dos referidos bilhetes.

39      Em seguida, o artigo 3.o, n.o 7, do Regulamento 2019/1157 autoriza os Estados‑Membros a dispensar as crianças com menos de 12 anos do requisito de fornecer impressões digitais e, em todo o caso, impõe‑lhes que dispensem as crianças com menos de 6 anos desse requisito, o que demonstra que a recolha de duas impressões digitais não é estritamente necessária.

40      Por outro lado, o artigo 3.o, n.o 5, do Regulamento 2019/1157 não respeita o princípio da minimização dos dados, enunciado no artigo 5.o do RGPD, do qual resulta que a recolha e a utilização de dados pessoais devem ser adequadas, pertinentes e limitadas ao que é necessário relativamente às finalidades para as quais são tratados. Com efeito, embora favoreça a interoperabilidade dos diferentes tipos de sistemas, a recolha de duas impressões digitais completas, e não apenas dos pontos característicos dessas impressões (as «minúcias»), aumenta igualmente a quantidade de dados pessoais armazenados e, portanto, o risco de usurpação de identidade em caso de fuga de dados. Este risco não é, aliás, negligenciável, uma vez que os chips eletrónicos utilizados nos bilhetes de identidade podem ser lidos por scanners não autorizados.

41      Por último e em substância, a restrição introduzida ao exercício dos direitos garantidos nos artigos 7.o e 8.o da Carta pode não ser legítima, uma vez que, no seu Parecer 7/2018, a AEPD salientou que, quando o Regulamento 2019/1157 foi adotado, o número de bilhetes de identidade falsificados era relativamente reduzido tendo em conta o número de bilhetes emitidos (38 870 bilhetes falsificados detetados entre 2013 e 2017) e que esse número vinha diminuindo há vários anos.

42      Foi nestas circunstâncias que o Verwaltungsgericht Wiesbaden (Tribunal Administrativo de Wiesbaden) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«A obrigação de recolher e de conservar impressões digitais nos bilhetes de identidade, em conformidade com o artigo 3.o, n.o 5, do Regulamento [2019/1157], viola normas hierarquicamente superiores do direito da União, em especial:

a)      o artigo 77.o, n.o 3, TFUE

b)      os artigos 7.o e 8.o da Carta

c)      o artigo 35, n.o 10, do RGPD

sendo, por conseguinte, inválida por um destes motivos?»

III. Quanto à questão prejudicial

43      Com a sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende, em substância, saber se este Regulamento 2019/1157 é inválido, no todo ou em parte, pelo facto de, primeiro, ter sido adotado com uma base jurídica errada, segundo, violar o artigo 35.o, n.o 10, do RGPD e, terceiro, violar os artigos 7.o e 8.o da Carta.

A.      Quanto ao primeiro fundamento de invalidade, relativo ao recurso a uma base jurídica errada

44      O primeiro fundamento de invalidade evocado pelo órgão jurisdicional de reenvio é relativo à questão de saber se, atendendo nomeadamente à referência expressa aos bilhetes de identidade que figura no artigo 77.o, n.o 3, TFUE, e à solução adotada no Acórdão de 17 de outubro de 2013, Schwarz (C‑291/12, EU:C:2013:670), o Regulamento 2019/1157 deveria ter sido adotado com fundamento nesse artigo 77.o, n.o 3, e em aplicação do processo legislativo especial ali previsto, e não, como foi o caso, ao abrigo do artigo 21.o, n.o 2, TFUE.

1.      Observações preliminares

45      Segundo jurisprudência constante, a escolha da base jurídica de um ato da União deve assentar em elementos objetivos suscetíveis de ser objeto de fiscalização jurisdicional, entre os quais figuram a finalidade e o conteúdo desse ato (Acórdãos de 16 de fevereiro de 2022, Hungria/Parlamento e Conselho, C‑156/21, EU:C:2022:97, n.o 107, e de 16 de fevereiro de 2022, Polónia/Parlamento e Conselho, C‑157/21, EU:C:2022:98, n.o 121).

46      Além disso, importa salientar que, quando exista, nos Tratados, uma disposição mais específica que possa constituir a base jurídica do ato em causa, este deve ter por base essa disposição (Acórdãos de 6 de setembro de 2012, Parlamento/Conselho, C‑490/10, EU:C:2012:525, n.o 44, e de 8 de dezembro de 2020, Polónia/Parlamento e Conselho, C‑626/18, EU:C:2020:1000, n.o 48 e jurisprudência referida).

47      Por último, se o exame de um ato da União demonstrar que este prossegue várias finalidades ou que tem várias componentes e se uma dessas finalidades ou dessas componentes for identificável como sendo principal ou preponderante, enquanto as outras são apenas acessórias ou têm apenas um alcance extremamente limitado, a base jurídica para a adoção desse ato deve ser determinada em conformidade com essa finalidade ou componente principal [v., neste sentido, Acórdão de 20 de novembro de 2018, Comissão/Conselho (AMP Antártida), C‑626/15 e C‑659/16, EU:C:2018:925, n.o 77, e Parecer 1/19 (Convenção de Istambul), de 6 de outubro de 2021, EU:C:2021:832, n.o 286].

2.      Quanto aos âmbitos de aplicação respetivos do artigo 21.o, n.o 2, TFUE e do artigo 77.o, n.o 3, TFUE

48      O artigo 21.o, n.o 2, TFUE enuncia que se, para atingir esse objetivo, se revelar necessária uma ação da União sem que os Tratados tenham previsto poderes de ação para o efeito, o Parlamento e o Conselho, deliberando de acordo com o processo legislativo ordinário, podem adotar disposições destinadas a facilitar o exercício desses direitos.

49      Daqui resulta que esta disposição confere à União uma competência geral para adotar as disposições necessárias para facilitar o exercício do direito dos cidadãos da União de circular e permanecer livremente no território dos Estados‑Membros, referido no artigo 20.o, n.o 2, alínea a), TFUE, sem prejuízo dos poderes de ação previstos para esse efeito pelos Tratados.

50      Ora, ao contrário do artigo 21.o, n.o 2, TFUE, o artigo 77.o, n.o 3, TFUE prevê expressamente esses poderes de ação no que respeita à adoção de medidas relativas aos passaportes, bilhetes de identidade, títulos de residência ou qualquer outro documento equiparado emitidos aos cidadãos da União a fim de facilitar o exercício do direito, previsto no artigo 20.o, n.o 2, alínea a), TFUE, de circular e permanecer livremente no território dos Estados‑Membros.

51      É certo que o artigo 77.o, n.o 3, TFUE figura no título V deste Tratado, consagrado ao espaço de liberdade, segurança e justiça e, mais precisamente, no capítulo 2 deste título, intitulado «Políticas relativas aos controlos nas fronteiras, ao asilo e à imigração». Todavia, segundo o artigo 77.o, n.o 1, TFUE, a União desenvolve uma política que visa assegurar tanto a ausência de quaisquer controlos de pessoas, independentemente da sua nacionalidade, na passagem das fronteiras internas, como o controlo de pessoas e a vigilância eficaz da passagem das fronteiras externas, bem como introduzir gradualmente um sistema integrado de gestão dessas fronteiras. Ora, as disposições relativas aos passaportes, bilhetes de identidade, títulos de residência ou qualquer outro documento equiparado referidas no título de competência previsto neste artigo 77.o, n.o 3, fazem parte integrante dessa política da União. Com efeito, no que se refere aos cidadãos da União, esses documentos permitem‑lhes, nomeadamente, atestar a sua qualidade de beneficiários do direito de circular e permanecer livremente no território dos Estados‑Membros e, portanto, de exercer esse direito. Por conseguinte, o referido artigo 77.o, n.o 3, pode servir de base à adoção de medidas relativas aos referidos documentos se essa ação se revelar necessária para facilitar o exercício do referido direito, previsto no artigo 20.o, n.o 2, alínea a), TFUE.

52      Esta interpretação do alcance material do artigo 77.o, n.o 3, TFUE não pode ser infirmada pela evolução histórica que os Tratados conheceram em matéria de competência da União para adotar medidas relativas aos passaportes, bilhetes de identidade, títulos de residência e qualquer outro documento equiparado, a que se referem o Parlamento, o Conselho e a Comissão, nem pela circunstância, evocada pelo Governo Alemão, de que esta disposição prevê que a mesma se aplica «sem que para tal os Tratados tenham previsto poderes de ação».

53      É certo que o Tratado de Lisboa suprimiu a disposição anteriormente enunciada no artigo 18.o, n.o 3, CE, que excluía expressamente a possibilidade de o legislador da União recorrer ao artigo 18.o, n.o 2, CE (atual artigo 21.o, n.o 2, TFUE) como base jurídica para a adoção tanto de «disposições relativas aos passaportes, bilhetes de identidade, títulos de residência ou qualquer outro documento equiparado», como de «disposições respeitantes à segurança social ou à proteção social». Todavia, ao mesmo tempo, este Tratado conferiu expressamente à União um poder de ação nestes dois domínios, a saber, por um lado, no artigo 21.o, n.o 3, TFUE no que respeita à segurança social e à proteção social e, por outro, no artigo 77.o, n.o 3, TFUE no que respeita às disposições relativas aos passaportes, bilhetes de identidade, títulos de residência ou qualquer outro documento equiparado, e submeteu a adoção das medidas nos referidos domínios a um processo legislativo especial, e nomeadamente à unanimidade no Conselho.

54      Nestas condições, não se pode deduzir da supressão da disposição anteriormente enunciada no artigo 18.o, n.o 3, CE que tenha passado a ser possível adotar «disposições relativas aos passaportes, bilhetes de identidade, títulos de residência ou qualquer outro documento equiparado» com fundamento no artigo 21.o, n.o 2, TFUE. Pelo contrário, resulta da evolução histórica que os autores dos Tratados pretenderam, com o artigo 77.o, n.o 3, TFUE, conferir à União uma competência mais específica para a adoção dessas disposições destinadas a facilitar o exercício do direito de circular e permanecer livremente no território dos Estados‑Membros, garantido no artigo 20.o, n.o 2, alínea a), TFUE, do que a competência mais geral prevista nesse artigo 21.o, n.o 2.

55      Além disso, a indicação que figura no artigo 77.o, n.o 3, TFUE, segundo a qual esta disposição é aplicável «sem que para tal os Tratados tenham previsto poderes de ação», deve ser entendida, tendo em conta a sistemática geral do Tratado FUE, no sentido de que os poderes de ação assim visados são os conferidos não por uma disposição que tem um alcance mais geral, como o artigo 21.o, n.o 2, TFUE, mas por uma disposição ainda mais específica.

56      Por conseguinte, a adoção do Regulamento 2019/1157 só se podia basear no artigo 21.o, n.o 2, TFUE, na condição de a finalidade ou a componente principal ou preponderante deste regulamento se situar fora do âmbito de aplicação específico do artigo 77.o, n.o 3, TFUE, a saber, a emissão de passaportes, bilhetes de identidade, títulos de residência ou qualquer outro documento equiparado, a fim de facilitar o exercício do direito previsto no artigo 20.o, n.o 2, alínea a), TFUE.

3.      Quanto à finalidade ou à componente principal ou preponderante do Regulamento 2019/1157

57      Em primeiro lugar, no que respeita à finalidade do Regulamento 2019/1157, o seu artigo 1.o enuncia que este tem por objeto reforçar as normas de segurança aplicáveis aos bilhetes de identidade de cidadão nacional emitidos pelos Estados‑Membros e aos títulos de residência emitidos pelos Estados‑Membros aos cidadãos da União e seus familiares que exercem o direito à livre circulação na União.

58      No mesmo sentido, o considerando 46 deste regulamento enuncia que os objetivos deste último consistem em «reforçar a segurança» desses documentos de viagem e de identidade «e facilitar o direito à livre circulação dos cidadãos da União e das suas famílias», o que é igualmente confirmado pelos considerandos 1, 2, 5, 17, 28, 29 e 36 do referido regulamento.

59      Em segundo lugar, no que respeita ao conteúdo do Regulamento 2019/1157, importa salientar que este último comporta dezasseis artigos. Os artigos 1.o e 2.o deste regulamento definem, respetivamente, o seu objeto e âmbito de aplicação. Os artigos 3.o e 4.o, bem como 6.o e 7.o do referido regulamento, que constituem as suas componentes principais, enunciam, designadamente, os requisitos em termos de segurança, de conteúdo, de formato ou de especificações que os bilhetes de identidade e os documentos de residência emitidos pelos Estados‑Membros devem respeitar, ao passo que os artigos 5.o e 8.o do mesmo regulamento preveem a supressão gradual dos bilhetes de identidade e dos bilhetes de residência que não cumpram os requisitos nele fixados. Por último, os artigos 9.o a 16.o do Regulamento 2019/1157 especificam a forma como devem ser cumpridas as obrigações nele previstas, em especial no que respeita à recolha dos identificadores biométricos e à proteção de dados pessoais.

60      É certo que o artigo 2.o do Regulamento 2019/1157 refere que este se aplica não só aos bilhetes de identidade de cidadão nacional emitidos pelos Estados‑Membros mas também aos certificados de registo emitidos nos termos do artigo 8.o da Diretiva 2004/38 aos cidadãos da União residentes há mais de três meses num Estado‑Membro de acolhimento, e aos documentos que certifiquem a residência permanente emitidos nos termos do artigo 19.o desta diretiva, certificados e documentos estes que não podem ser equiparados aos bilhetes de identidade, aos passaportes ou aos títulos de residência. No entanto, o Regulamento 2019/1157 não contém nenhuma disposição que regule estes certificados e limita‑se a indicar, no seu artigo 6.o, primeiro parágrafo, alínea f), que os títulos de residência emitidos pelos Estados‑Membros aos cidadãos da União devem conter as informações a incluir nos certificados de registo e nos documentos que certifiquem a residência permanente, emitidos nos termos do artigo 8.o e do artigo 19.o, respetivamente, da Diretiva 2004/38. Logo, deve considerar‑se que a finalidade e a componente deste regulamento associadas a estes certificados têm um alcance extremamente limitado, de modo que a base jurídica do referido regulamento não pode ser determinada à luz desta finalidade ou desta componente.

61      Nestas condições, decorre da finalidade e das componentes principais do Regulamento 2019/1157 que este figura entre os atos abrangidos pelo âmbito de aplicação específico do artigo 77.o, n.o 3, TFUE, conforme identificado nos n.os 48 a 51 do presente acórdão.

62      Consequentemente, ao adotar o Regulamento 2019/1157 com fundamento no artigo 21.o, n.o 2, TFUE, o legislador da União violou o artigo 77.o, n.o 3, TFUE e recorreu a um processo legislativo inadequado.

63      Daqui resulta que o primeiro fundamento de invalidade evocado pelo órgão jurisdicional de reenvio, relativo ao facto de o Regulamento 2019/1157 ter sido adotado erradamente ao abrigo do artigo 21.o, n.o 2, TFUE e em aplicação do processo legislativo ordinário, é suscetível de conduzir à invalidade deste regulamento.

B.      Quanto ao segundo fundamento de invalidade, relativo ao incumprimento do artigo 35.o, n.o 10, do RGPD

64      O segundo fundamento de invalidade evocado pelo órgão jurisdicional de reenvio é apresentado como sendo relativo ao facto de o Regulamento 2019/1157 ter sido adotado sem ter sido realizada uma avaliação de impacto sobre a proteção de dados, em violação do artigo 35.o, n.o 10, do RGPD.

65      A este respeito, importa salientar que o artigo 35.o, n.o1, do RGPD dispõe que, quando um certo tipo de tratamento, em particular que utilize novas tecnologias e tendo em conta a sua natureza, âmbito, contexto e finalidades, for suscetível de implicar um elevado risco para os direitos e liberdades das pessoas singulares, o responsável pelo tratamento procede, antes de iniciar o tratamento, a uma avaliação de impacto das operações de tratamento previstas sobre a proteção de dados pessoais. O artigo 35.o, n.o 3, deste regulamento precisa que essa avaliação é obrigatória no caso de operações de tratamento em grande escala de categorias especiais de dados referidas no artigo 9.o, n.o 1, do referido regulamento, como os dados biométricos para identificar uma pessoa de forma inequívoca.

66      Uma vez que, no caso em apreço, o Regulamento 2019/1157 não procede, ele próprio, a nenhuma operação aplicada a dados ou a conjuntos de dados pessoais, limitando‑se a prever a realização pelos Estados‑Membros de certos tratamentos em caso de pedido de bilhete de identidade, é forçoso constatar que a adoção deste regulamento não estava subordinada à realização prévia de uma avaliação do impacto das operações de tratamento previstas, na aceção do artigo 35.o, n.o 1, do RGPD. Ora, o artigo 35.o, n.o 10, deste regulamento institui uma derrogação ao artigo 35.o, n.o 1, do referido regulamento.

67      Por conseguinte, uma vez que, como resulta do que precede, o artigo 35.o, n.o 1, do RGPD não era aplicável quando da adoção do Regulamento 2019/1157, esta adoção não pôde violar o artigo 35.o, n.o 10, do Regulamento 2016/679.

68      Tendo em conta o que precede, o segundo fundamento, relativo à violação do artigo 35.o, n.o 10, do RGPD, não é suscetível de conduzir à invalidade do Regulamento 2019/1157.

C.      Quanto ao terceiro fundamento de invalidade, relativo à incompatibilidade do artigo 3.o, n.o 5, do Regulamento 2019/1157 com os artigos 7.o e 8.o da Carta

69      O terceiro fundamento de invalidade do Regulamento 2019/1157 evocado pelo órgão jurisdicional de reenvio diz respeito à questão de saber se a obrigação de incluir duas impressões digitais completas no suporte de armazenamento dos bilhetes de identidade emitidos pelos Estados‑Membros, prevista no artigo 3.o, n.o 5, deste regulamento, implica uma restrição injustificada aos direitos garantidos nos artigos 7.o e 8.o da Carta.

1.      Quanto à existência de uma restrição

70      O artigo 7.o da Carta prevê, nomeadamente, que todas as pessoas têm direito ao respeito pela sua vida privada. Quanto ao artigo 8.o, n.o 1, da mesma, este enuncia que todas as pessoas têm direito à proteção dos dados de caráter pessoal que lhes digam respeito. Decorre da leitura conjugada destas disposições que, em princípio, qualquer tratamento de dados pessoais por um terceiro é suscetível de constituir um ato lesivo dos referidos direitos (Acórdão de 17 de outubro de 2013, Schwarz, C‑291/12, EU:C:2013:670, n.o 25).

71      No caso em apreço, o artigo 3.o, n.o 5, do Regulamento 2019/1157 dispõe que o suporte de armazenamento com elevado nível de segurança que os bilhetes de identidade emitidos pelos Estados‑Membros aos seus nacionais devem incluir deverá conter dados biométricos, a saber, uma imagem facial e duas impressões digitais em formatos digitais interoperáveis.

72      Ora, esses dados pessoais permitem a identificação precisa das pessoas singulares em causa e revestem especial sensibilidade devido aos riscos significativos para os direitos e liberdades fundamentais que a sua utilização é suscetível de representar, como resulta, em especial, do considerando 51 do RGPD, regulamento que se aplica aos dados em causa, como recorda o considerando 40 do Regulamento 2019/1157.

73      Por conseguinte, a obrigação de incluir duas impressões digitais no suporte de armazenamento dos bilhetes de identidade, prevista no artigo 3.o, n.o 5, do Regulamento 2019/1157, constitui uma restrição tanto ao direito ao respeito pela vida privada como ao direito à proteção de dados pessoais, consagrados, respetivamente, nos artigos 7.o e 8.o da Carta.

74      Além disso, esta obrigação implica a realização prévia de duas sucessivas operações de tratamento de dados pessoais, a saber, a recolha das referidas impressões junto da pessoa em causa e o seu armazenamento provisório para efeitos de personalização dos bilhetes de identidade, operações essas que estão reguladas no artigo 10.o do referido regulamento. As referidas operações constituem igualmente restrições aos direitos consagrados nos artigos 7.o e 8.o da Carta.

2.      Quanto à justificação da restrição

75      Como resulta de jurisprudência constante, o direito ao respeito pela vida privada e o direito à proteção de dados pessoais, garantidos, respetivamente, nos artigos 7.o e 8.o da Carta, não são prerrogativas absolutas, mas devem ser tomados em consideração relativamente à sua função na sociedade (v., neste sentido, Acórdão de 20 de setembro de 2022, SpaceNet e Telekom Deutschland, C‑793/19 e C‑794/19, EU:C:2022:702, n.o 63).

76      Por conseguinte, podem ser introduzidas restrições a esses direitos, desde que, em conformidade com o artigo 52.o, n.o 1, primeiro período, da Carta, estejam previstas por lei e respeitem o conteúdo essencial desses direitos. Além disso, em conformidade com o segundo período desse número, na observância do princípio da proporcionalidade, essas restrições só podem ser introduzidas se forem necessárias e corresponderem efetivamente a objetivos de interesse geral reconhecidos pela União, ou à necessidade de proteção dos direitos e liberdades de terceiros. A este respeito, o artigo 8.o, n.o 2, da Carta especifica que os dados pessoais devem, nomeadamente, ser objeto de um tratamento «para fins específicos e com o consentimento da pessoa interessada ou com outro fundamento legítimo previsto por lei».

a)      Quanto à observância do princípio da legalidade

77      No que respeita ao requisito, estabelecido no artigo 52.o, n.o 1, primeiro período, da Carta, segundo o qual qualquer restrição ao exercício dos direitos fundamentais deve ser prevista por lei, importa recordar que este requisito implica que o ato que permite a ingerência nesses direitos deve definir, ele próprio, o alcance da restrição ao exercício do direito em causa, precisando‑se, por um lado, que este requisito não impede que a restrição em causa seja formulada em termos suficientemente abertos para se poder adaptar a situações diferentes, bem como à evolução das circunstâncias e, por outro, que o Tribunal de Justiça pode, se for caso disso, concretizar, por via de interpretação, o alcance concreto da restrição à luz tanto dos próprios termos da regulamentação da União em causa como da sua sistemática geral e dos objetivos que prossegue, conforme interpretados à luz dos direitos fundamentais garantidos pela Carta (Acórdão de 21 de junho de 2022, Ligue des droits humains, C‑817/19, EU:C:2022:491, n.o 114).

78      No caso em apreço, as restrições ao exercício dos direitos fundamentais garantidos nos artigos 7.o e 8.o da Carta que decorrem da obrigação de incluir duas impressões digitais completas no suporte de armazenamento dos bilhetes de identidade emitidos pelos Estados‑Membros, bem como as condições de aplicação e o alcance dessas limitações, estão definidas de forma clara e precisa no artigo 3.o, n.o 5, e no artigo 10.o, n.os 1 e 3, do Regulamento 2019/1157, adotados pelo legislador da União de acordo com o processo legislativo ordinário e cujos efeitos serão mantidos pelo presente acórdão.

79      Por conseguinte, as referidas restrições ao exercício dos direitos fundamentais garantidos nos artigos 7.o e 8.o da Carta respeitam o princípio da legalidade previsto no artigo 52.o, n.o 1, primeiro período, da Carta.

b)      Quanto à observância do conteúdo essencial dos direitos fundamentais consagrados nos artigos 7.o e 8.o da Carta

80      Importa constatar que as informações fornecidas pelas impressões digitais não permitem, por si só, ter uma visão geral da vida privada e familiar das pessoas em causa.

81      Nestas condições, a limitação que implica a obrigação de incluir duas impressões digitais no suporte de armazenamento dos bilhetes de identidade emitidos pelos Estados‑Membros, prevista no artigo 3.o, n.o 5, do Regulamento 2019/1157, não viola o conteúdo essencial dos direitos fundamentais consagrados nos artigos 7.o e 8.o da Carta (v., por analogia, Acórdão de 21 de junho de 2022, Ligue des droits humains, C‑817/19, EU:C:2022:491, n.o 120).

c)      Quanto à observância do princípio da proporcionalidade

82      Como resulta do artigo 52.o, n.o 1, segundo período, da Carta, para que possam ser introduzidas restrições ao exercício dos direitos fundamentais garantidos por esta na observância do princípio da proporcionalidade, essas restrições devem ser necessárias e corresponder efetivamente a objetivos de interesse geral reconhecidos pela União ou à necessidade de proteção dos direitos e liberdades de terceiros.

83      Mais especificamente, as derrogações à proteção dos dados pessoais e as respetivas restrições devem ocorrer na estrita medida do necessário, entendendo‑se que, quando exista uma escolha entre várias medidas adequadas à satisfação dos objetivos legítimos prosseguidos, se deve recorrer à menos restritiva delas. Além disso, um objetivo de interesse geral não pode ser legitimamente prosseguido sem ter em conta o facto de que deve ser conciliado com os direitos fundamentais afetados pela medida em causa, através de uma ponderação equilibrada entre, por um lado, o objetivo de interesse geral e, por outro, os direitos em causa, a fim de assegurar que os inconvenientes causados por esta medida não sejam desproporcionados relativamente aos objetivos prosseguidos. Assim, a possibilidade de justificar uma restrição aos direitos garantidos nos artigos 7.o e 8.o da Carta deve ser apreciada medindo a gravidade da ingerência que tal restrição implica e verificando se a importância do objetivo de interesse geral prosseguido por essa restrição está relacionada com essa gravidade (Acórdão de 22 de novembro de 2022, Luxembourg Business Registers, C‑37/20 e C‑601/20, EU:C:2022:912, n.o 64 e jurisprudência referida).

84      Consequentemente, para verificar se, no caso em apreço, as ingerências nos direitos garantidos nos artigos 7.o e 8.o da Carta resultantes da obrigação de incluir duas impressões digitais no suporte de armazenamento dos bilhetes de identidade, prevista no artigo 3.o, n.o 5, do Regulamento 2019/1157, respeitam o princípio da proporcionalidade, importa examinar, primeiro, se esta medida prossegue um ou vários objetivos de interesse geral reconhecidos pela União e é efetivamente adequada para realizar esses objetivos, segundo, se as ingerências daí resultantes se limitam ao estritamente necessário, no sentido de que os referidos objetivos não poderiam razoavelmente ser alcançados de maneira tão eficaz por outros meios menos atentatórios desses direitos fundamentais das pessoas em causa, e, terceiro, se as referidas ingerências não são desproporcionadas em relação aos objetivos, o que implica, nomeadamente, uma ponderação desses objetivos e da gravidade das referidas ingerências (v., neste sentido, Acórdãos de 22 de novembro de 2022, Luxembourg Business Registers, C‑37/20 e C‑601/20, EU:C:2022:912, n.o 66, e de 8 de dezembro de 2022, Orde van Vlaamse Balies e o., C‑694/20, EU:C:2022:963, n.o 42).

1)      Quanto à prossecução de um ou mais objetivos de interesse geral reconhecidos pela União e à adequação da medida para alcançar esses objetivos

i)      Quanto ao caráter de interesse geral dos objetivos prosseguidos pela medida em causa

85      Em conformidade com o seu artigo 1.o, o Regulamento 2019/1157 tem por objeto reforçar as normas de segurança aplicáveis, nomeadamente, aos bilhetes de identidade de cidadão nacional emitidos pelos Estados‑Membros que exercem o seu direito à livre circulação.

86      Mais especificamente e como resulta dos considerandos 4, 5, 17 a 20 e 32 do Regulamento 2019/1157, a inclusão dos dados biométricos, entre os quais figuram duas impressões digitais completas, no suporte de armazenamento dos bilhetes de identidade destina‑se a garantir a autenticidade dos referidos bilhetes e a permitir a identificação fiável do seu titular, contribuindo simultaneamente, em conformidade com os considerandos 23 e 33 e com o artigo 3.o, n.o 5, deste regulamento, para a interoperabilidade dos sistemas de verificação dos documentos de identidade, a fim de reduzir o risco de falsificação e de fraude documental.

87      Ora, o Tribunal de Justiça já teve oportunidade de decidir, a propósito da emissão dos passaportes (v., neste sentido, Acórdão de 17 de outubro de 2013, Schwarz, C‑291/12, EU:C:2013:670, n.os 36 a 38) e da criação de um ficheiro de identificação dos nacionais de países terceiros (v., neste sentido, Acórdão de 3 de outubro de 2019, A e o., C‑70/18, EU:C:2019:823, n.o 46 e jurisprudência referida), que a luta contra a fraude documental, que inclui, nomeadamente, a luta contra o fabrico de bilhetes de identidade falsos e contra a usurpação de identidade, constitui um objetivo de interesse geral reconhecido pela União.

88      Quanto ao objetivo de interoperabilidade dos sistemas de verificação dos documentos de identificação, este tem igualmente esse caráter, uma vez que, como resulta do considerando 17 do Regulamento 2019/1157, contribui para facilitar o exercício, pelos cidadãos da União, do direito que lhes reconhece o artigo 20.o TFUE de circular e permanecer livremente no território dos Estados‑Membros.

ii)    Quanto à adequação da medida em causa para responder efetivamente aos objetivos de interesse geral prosseguidos

89      No caso em apreço, a inclusão de duas impressões digitais completas no suporte de armazenamento dos bilhetes de identidade é adequada para realizar os objetivos de interesse geral de luta contra o fabrico de bilhetes de identidade falsos e a usurpação de identidade, bem como de interoperabilidade dos sistemas de verificação, invocados pelo legislador da União para justificar esta medida.

90      Com efeito, antes de mais, a inclusão de dados biométricos, como impressões digitais, nos bilhetes de identidade é suscetível de dificultar o fabrico de bilhetes de identidade falsos, na medida em que, nomeadamente, em conformidade com o artigo 3.o, n.o 5, do Regulamento 2019/1157, lido em conjugação com o artigo 14.o, n.os 1 e 2, deste regulamento, esses dados devem ser armazenados segundo especificações técnicas precisas e que podem ser mantidas secretas.

91      Em seguida, a inclusão desses dados biométricos constitui um meio que permite, em conformidade com o artigo 11.o, n.o 6, e os considerandos 18 e 19 do Regulamento 2019/1157, verificar, de maneira fiável, a autenticidade do bilhete de identidade e a identidade do titular do bilhete e reduzir assim o risco de fraude.

92      Por último, a opção de o legislador da União prever a inclusão das impressões digitais completas afigura‑se igualmente adequada para realizar o objetivo de interoperabilidade dos sistemas de verificação dos bilhetes de identidade, uma vez que o recurso às impressões digitais completas permite assegurar uma compatibilidade com todos os sistemas automatizados de identificação das impressões digitais utilizados pelos Estados‑Membros, ainda que esses sistemas não recorram necessariamente ao mesmo mecanismo de identificação.

93      O órgão jurisdicional de reenvio observa ainda que o artigo 3.o, n.o 7, do Regulamento 2019/1157 autoriza, no seu primeiro parágrafo, os Estados‑Membros a dispensar da recolha das suas impressões digitais, nomeadamente, as crianças com menos de 12 anos e impõe‑lhes mesmo, no seu segundo parágrafo, que dispensem desta recolha as crianças com menos de 6 anos.

94      É certo que uma legislação só é adequada a garantir a realização do objetivo invocado se as medidas nela previstas responderem verdadeiramente à intenção de o alcançar e se forem aplicadas de maneira coerente e sistemática (v., por analogia, Acórdão de 5 de dezembro de 2023, Nordic Info, C‑128/22, EU:C:2023:951, n.o 84 e jurisprudência referida).

95      No entanto, o Regulamento 2019/1157 cumpre este requisito embora preveja dispensas à obrigação de proceder à recolha das impressões digitais das crianças, uma vez que, como resulta do seu considerando 26, essas dispensas visam ter em conta o superior interesse da criança.

96      O mesmo se diga da regra enunciada no artigo 5.o do Regulamento 2019/1157, segundo a qual os bilhetes de identidade que não cumpram os requisitos do artigo 3.o deste regulamento só perdem a sua validade na respetiva data de caducidade ou em 3 de agosto de 2031. Com efeito, o legislador da União podia considerar que esse período transitório era adequado para evitar onerar os Estados‑Membros com a emissão de novos bilhetes de identidade para todas as pessoas em causa num período muito curto, sem, no entanto, pôr em causa a eficácia a longo prazo das medidas previstas por este regulamento.

97      Quanto à circunstância de certos Estados‑Membros preverem na sua legislação que os bilhetes de identidade que emitem permanecem válidos apesar da deterioração do suporte eletrónico de armazenamento, basta salientar que essas legislações só são compatíveis com o Regulamento 2019/1157 se o período transitório referido no número anterior não tiver decorrido.

2)      Quanto ao caráter necessário do recurso à medida em causa para realizar os objetivos de interesse geral prosseguidos

98      No que respeita, em primeiro lugar, ao próprio princípio de incluir impressões digitais no suporte de armazenamento dos bilhetes de identidade, há que salientar que as impressões digitais constituem meios fiáveis e eficazes para estabelecer com certeza a identidade de uma pessoa e que o procedimento utilizado para a recolha dessas impressões é simples de aplicar.

99      Em especial, como salientou a advogada‑geral no n.o 90 das suas conclusões, a simples inclusão de uma imagem facial constitui um meio de identificação menos eficaz do que a inclusão, além dessa imagem, de duas impressões digitais, uma vez que o envelhecimento, o modo de vida, as doenças ou uma intervenção cirúrgica estética ou reconstrutiva podem alterar as características anatómicas do rosto.

100    É verdade que a avaliação de impacto realizada pela Comissão que acompanha a proposta de regulamento que esteve na origem do Regulamento 2019/1157 indicou que deveria ser privilegiada a opção de não tornar obrigatória a inclusão de duas impressões digitais no suporte de armazenamento dos bilhetes de identidade.

101    Todavia, além do facto de a própria Comissão ter optado por não acolher esta opção na sua proposta legislativa, importa salientar que — embora o Acordo Interinstitucional preveja, no seu ponto 14, que ao ponderarem as propostas legislativas da Comissão, o Parlamento e o Conselho tomarão plenamente em conta as avaliações de impacto da Comissão — este mesmo acordo indica, no seu ponto 12, que essas avaliações «auxiliam as três instituições a tomarem decisões com pleno conhecimento de causa, e não são um substituto de decisões políticas tomadas no âmbito do processo decisório democrático». Por conseguinte, embora sejam obrigados a ter em consideração as avaliações de impacto da Comissão, o Parlamento e o Conselho não estão, no entanto, vinculados pelo seu conteúdo, em especial, no que respeita às apreciações que delas constam (v., neste sentido, Acórdão de 21 de junho de 2018, Polónia/Parlamento e Conselho, C‑5/16, EU:C:2018:483, n.o 159 jurisprudência referida).

102    Consequentemente, o simples facto de o legislador da União ter adotado uma medida diferente e, sendo caso disso, mais restritiva do que a recomendada no termo da avaliação de impacto não é suscetível de demonstrar que excedeu os limites do que era necessário para atingir o objetivo pretendido (v., neste sentido, Acórdão de 4 de maio de 2016, Pillbox 38, C‑477/14, EU:C:2016:324, n.o 65).

103    No caso em apreço, a avaliação de impacto realizada pela Comissão constatou que a opção de tornar obrigatória a inclusão de impressões digitais no suporte de armazenamento dos bilhetes de identidade era a mais eficaz para efeitos da realização do objetivo específico de luta contra o fabrico de bilhetes de identidade falsos e de melhoria da autenticação documental. Nestas condições, a opção que consiste em não tornar obrigatória tal inclusão não pode, em todo o caso, pôr em causa a necessidade, na aceção da jurisprudência recordada no n.o 84 do presente acórdão, da medida adotada pelo legislador da União.

104    Em segundo lugar, no que respeita à inclusão das duas impressões digitais completas em vez de alguns dos pontos característicos dessas impressões (as «minúcias»), por um lado, como salientou a advogada‑geral no n.o 93 das suas conclusões, as minúcias não apresentam as mesmas garantias que uma impressão completa. Por outro lado, a inclusão de uma impressão completa é necessária para a interoperabilidade dos sistemas de verificação dos documentos de identificação, o que constitui um dos objetivos essenciais prosseguidos. Com efeito, como resulta do n.o 47 do Parecer 7/2018 e como sublinha igualmente o órgão jurisdicional de reenvio, os Estados‑Membros utilizam diferentes tecnologias de identificação das impressões digitais, pelo que o facto de só incluir no suporte de armazenamento do bilhete de identidade certas características de uma impressão digital teria por efeito comprometer a realização do objetivo de interoperabilidade dos sistemas de verificação dos documentos de identificação prosseguido pelo Regulamento 2019/1157.

105    Resulta das considerações precedentes que as restrições introduzidas aos direitos fundamentais garantidos nos artigos 7.o e 8.o da Carta que decorrem da obrigação de incluir duas impressões digitais completas no suporte de armazenamento parecem respeitar os limites do estritamente necessário.

3)      Quanto à existência de uma ponderação entre, por um lado, a gravidade da ingerência aos direitos fundamentais em presença e, por outro, os objetivos prosseguidos por esta medida

i)      Quanto à gravidade da ingerência provocada pela restrição ao exercício dos direitos garantidos nos artigos 7.o e 8.o da Carta

106    A apreciação da gravidade da ingerência que opera uma restrição aos direitos garantidos nos artigos 7.o e 8.o da Carta implica que se tenha em conta a natureza dos dados pessoais em causa, em particular o caráter eventualmente sensível desses dados, bem como a natureza e as modalidades concretas do tratamento dos dados, em especial o número de pessoas que têm acesso a esses dados e as modalidades de acesso a estes últimos. Se for caso disso, deve igualmente ser tida em consideração a existência de medidas destinadas a prevenir o risco de esses dados serem objeto de tratamentos abusivos.

107    No caso em apreço, a restrição ao exercício dos direitos garantidos nos artigos 7.o e 8.o da Carta resultante do Regulamento 2019/1157 é certamente suscetível de dizer respeito a um grande número de pessoas, tendo este número sido avaliado pela Comissão na sua avaliação de impacto em 370 milhões de habitantes dos 440 milhões que contava então com a União. As impressões digitais, enquanto dados biométricos, revestem, por natureza, uma sensibilidade especial, gozando, como resulta nomeadamente do considerando 51 do RGPD, de uma proteção específica no direito da União.

108    Todavia, importa sublinhar que a recolha e o armazenamento de duas impressões digitais completas só são autorizados pelo Regulamento 2019/1157 com vista à inclusão destas impressões digitais no suporte de armazenamento dos bilhetes de identidade.

109    Além disso, decorre do artigo 3.o, n.o 5, deste regulamento, lido em conjugação com o seu artigo 10.o, n.o 3, que, uma vez realizada essa integração e o bilhete de identidade entregue à pessoa em causa, as impressões digitais recolhidas só são conservadas no suporte de armazenamento do referido bilhete, o qual é, em princípio, fisicamente detido por essa pessoa.

110    Por último, o Regulamento 2019/1157 prevê um conjunto de garantias destinadas a limitar os riscos de, no momento da sua execução, serem recolhidos ou utilizados dados pessoais para outros fins que a realização dos objetivos que prossegue, e isto não só no que respeita às operações de tratamento de dados pessoais que este regulamento torna obrigatórias mas também no que respeita aos principais tratamentos de que podem ser objeto as impressões digitais incluídas no suporte de armazenamento dos bilhetes de identidade.

111    Assim, no que respeita, primeiro, à recolha dos dados, o artigo 10.o, n.os 1 e 2, do Regulamento 2019/1157 enuncia que os elementos de identificação biométrica devem ser recolhidos «exclusivamente por pessoal qualificado e devidamente autorizado» e que esse pessoal deve respeitar «procedimentos adequados e eficazes de recolha de identificadores biométricos», devendo estes procedimentos cumprir os direitos e princípios estabelecidos na Carta, na Convenção para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais e na Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança. Além disso, como salientado no n.o 96 do presente acórdão, o artigo 3.o, n.o 7, deste regulamento contém regras especiais para as crianças com menos de 12 anos (primeiro e segundo parágrafos) e para as pessoas cujas impressões digitais sejam fisicamente impossíveis de recolher (terceiro parágrafo), estando estas últimas pessoas «dispensadas desse requisito».

112    No que respeita, segundo, ao armazenamento de dados, por um lado, o Regulamento 2019/1157 obriga os Estados‑Membros a procederem ao armazenamento, como dados biométricos, de uma imagem facial e de duas impressões digitais. A este respeito, o considerando 21 deste regulamento precisa expressamente que este não prevê «uma base jurídica para a criação ou manutenção de bases de dados a nível nacional para o armazenamento de dados biométricos nos Estados‑Membros, tendo em conta que esta questão é abrangida pelo direito nacional e deve ser conforme com o direito da União em matéria de proteção de dados», nem prevê «uma base jurídica para a criação ou manutenção de uma base de dados centralizada a nível da União». Por outro lado, o artigo 10.o, n.o 3, do referido regulamento prevê que esses «identificadores biométricos […] devem ser conservados […] apenas até à data de recolha do documento e até à data de receção do documento e, em qualquer caso, até à data de receção do documento e, em qualquer caso, o mais tardar 90 dias a contar da data de emissão desse documento» e precisa que, «[a]pós esse período, os identificadores biométricos serão imediatamente apagados ou destruídos».

113    Daqui resulta, nomeadamente, que o artigo 10.o, n.o 3, do Regulamento 2019/1157 não permite aos Estados‑Membros tratar os dados biométricos para fins diferentes daqueles previstos neste regulamento. Além disso, esta mesma disposição opõe‑se a uma conservação centralizada de impressões digitais que vá além do armazenamento provisório dessas impressões para efeitos de personalização dos bilhetes de identidade.

114    Por último, o artigo 11.o, n.o 6, deste Regulamento 2019/1157 evoca a possibilidade de os dados biométricos contidos no suporte de armazenamento seguro poderem ser utilizados, em conformidade com o direito da União e o direito nacional, pelo pessoal devidamente autorizado das autoridades nacionais competentes e das agências da União.

115    Quanto à alínea a) desta disposição, esta só autoriza a utilização dos dados biométricos armazenados no suporte de armazenamento para fins de verificação da autenticidade do bilhete de identidade ou título de residência.

116    Quanto à alínea b) da referida disposição, a mesma prevê que os dados biométricos armazenados no suporte de armazenamento dos bilhetes de identidade e títulos de residência podem ser utilizados para fins de verificação da identidade do titular, «através de dispositivos comparáveis e diretamente disponíveis, nos casos em que a apresentação do bilhete de identidade ou título de residência for exigida por lei». Ora, sendo tal tratamento suscetível de fornecer informações adicionais sobre a vida privada das pessoas em causa, só pode ter lugar para fins estritamente limitados à identificação da pessoa em causa e em condições precisamente delimitadas pela lei que exigem a apresentação do bilhete de identidade ou do título de residência.

117    Terceiro, no que respeita à consulta dos dados biométricos registados no suporte de armazenamento dos bilhetes de identidade, importa sublinhar que o considerando 19 do Regulamento 2019/1157 estabelece uma ordem de prioridade na utilização dos meios de verificação da autenticidade do documento e da identidade do titular, ao prever que os Estados‑Membros deverão, «em primeiro lugar, verificar a imagem facial» e, caso seja necessário para confirmar sem dúvidas a autenticidade do documento e a identidade do titular, «verificar igualmente as impressões digitais».

118    Quarto, no que toca ao risco de acesso não autorizado aos dados armazenados, o artigo 3.o, n.os 5 e 6, do Regulamento 2019/1157 prevê, para minimizar esse risco, que as impressões digitais sejam armazenadas num «suporte de armazenamento com elevado nível de segurança», que disponha de «capacidade suficiente e das características necessárias para garantir a integridade, autenticidade e confidencialidade dos dados». Além disso, resulta do artigo 3.o, n.o 10, deste regulamento que «se os Estados‑Membros armazenarem, nos bilhetes de identidade, dados para utilização em serviços eletrónicos, como a administração pública e o comércio eletrónicos, esses dados nacionais devem ser física ou logicamente separados», nomeadamente, das impressões digitais recolhidas e armazenadas com fundamento no referido regulamento. Por último, resulta dos considerandos 41 e 42, bem como do artigo 11.o, n.o 4, deste regulamento que os Estados‑Membros continuam a ser responsáveis pelo tratamento adequado dos dados biométricos, incluindo quando cooperam com prestadores de serviços externos.

ii)    Quanto à importância dos objetivos prosseguidos

119    Como foi recordado no n.o 89 do presente acórdão, a inclusão de duas impressões digitais no suporte de armazenamento dos bilhetes de identidade visa lutar contra o fabrico de bilhetes de identidade falsos e a usurpação de identidade, bem como assegurar a interoperabilidade dos sistemas de verificação dos documentos de identificação. Ora, a este título, é suscetível de contribuir para a proteção da vida privada das pessoas em causa e, mais amplamente, para a luta contra a criminalidade e o terrorismo.

120    Além disso, tal medida permite responder à necessidade de qualquer cidadão da União dispor de meios para se identificar de forma fiável e, para os Estados‑Membros, de assegurar que as pessoas que invocam direitos reconhecidos pelo direito da União sejam efetivamente titulares desses direitos. Contribui assim, em particular, para facilitar o exercício pelos cidadãos da União do seu direito à liberdade de circulação e de permanência, que constitui igualmente um direito fundamental garantido no artigo 45.o da Carta. Assim, os objetivos prosseguidos pelo Regulamento 2019/1157, nomeadamente, por meio da inclusão de duas impressões digitais no suporte de armazenamento dos bilhetes de identidade, têm uma importância particular não só para a União e os Estados‑Membros mas também para os cidadãos da União.

121    Por outro lado, a legitimidade e a importância destes objetivos não são de modo nenhum postas em causa pela circunstância, evocada pelo órgão jurisdicional de reenvio, de o Parecer 7/2018 referir, nos seus n.os 24 a 26, que apenas foram detetados 38 870 casos de bilhetes de identidade fraudulentos entre 2013 e 2017 e que este número vinha baixando havia vários anos.

122    Com efeito, mesmo considerando que o número de bilhetes de identidade fraudulentos seja reduzido, o legislador da União não estava obrigado a esperar que esse número começasse a aumentar para adotar medidas destinadas a prevenir o risco de utilização desses bilhetes, mas podia, nomeadamente numa preocupação de controlo dos riscos, antecipar essa evolução, desde que fossem respeitados os outros requisitos relativos à observância do princípio da proporcionalidade.

iii) Ponderação

123    Tendo em conta o que precede, há que constatar que a restrição ao exercício dos direitos garantidos nos artigos 7.o e 8.o da Carta resultante da inclusão de duas impressões digitais no suporte de armazenamento dos bilhetes de identidade não parece ser, tendo em conta a natureza dos dados em causa, a natureza e as modalidades das operações de tratamento, bem como dos mecanismos de salvaguarda previstos, de uma gravidade desproporcionada em relação à importância dos diferentes objetivos que esta medida prossegue. Assim, deve considerar‑se que tal medida se baseia numa ponderação equilibrada entre, por um lado, esses objetivos e, por outro, os direitos fundamentais em presença.

124    Por conseguinte, a restrição ao exercício dos direitos garantidos nos artigos 7.o e 8.o da Carta não viola o princípio da proporcionalidade, pelo que o terceiro fundamento não é suscetível de implicar a invalidade do Regulamento 2019/1157.

125    Decorre de todas as considerações precedentes que o Regulamento 2019/1157 é inválido unicamente na parte em que foi adotado ao abrigo do artigo 21.o, n.o 2, TFUE.

IV.    Quanto à manutenção no tempo dos efeitos do Regulamento 2019/1157

126    Os efeitos de um ato declarado inválido podem ser mantidos por motivos de segurança jurídica, nomeadamente quando os efeitos imediatos do acórdão que declara essa invalidade originarem consequências negativas graves para as pessoas em causa (v., neste sentido, Acórdão de 17 de março de 2016, Parlamento/Comissão, C‑286/14, EU:C:2016:183, n.o 67).

127    No caso em apreço, a invalidação do Regulamento 2019/1157 com efeito imediato seria suscetível de produzir consequências negativas graves para um número significativo de cidadãos da União Europeia, em particular para a sua segurança no espaço de liberdade, segurança e justiça.

128    Nestas condições, o Tribunal de Justiça decide que há que manter os efeitos deste regulamento até à entrada em vigor, num prazo razoável que não pode exceder dois anos a contar de 1 de janeiro do ano que se segue à data da prolação do presente acórdão, de um novo regulamento, baseado no artigo 77.o, n.o 3, TFUE, chamado a substituí‑lo.

V.      Quanto às despesas

129    Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) declara:

1)      O Regulamento (UE) 2019/1157 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de junho de 2019, que visa reforçar a segurança dos bilhetes de identidade dos cidadãos da União e dos títulos de residência emitidos aos cidadãos da União e seus familiares que exercem o direito à livre circulação, é inválido.

2)      Os efeitos do Regulamento 2019/1157 são mantidos até à entrada em vigor, num prazo razoável que não pode exceder dois anos a contar de 1 de janeiro do ano que se segue à data da prolação do presente acórdão, de um novo regulamento, baseado no artigo 77.o, n.o 3, TFUE, chamado a substituílo.

Assinaturas


*      Língua do processo: alemão.