Language of document : ECLI:EU:T:2001:250

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Primeira Secção)

10 de Outubro de 2001 (1)

«Decisão 94/90/CECA, CE, Euratom - Acesso do público aos documentos da Comissão - Actas do comité dos impostos especiais de consumo - Acesso parcial - Excepção - Identidade das delegações nacionais - Protecção do interesse da instituição relativo ao sigilo das suas deliberações»

No processo T-111/00,

British American Tobacco International (Investments) Ltd, com sede em Londres (Reino Unido), representada por S. Crosby, solicitor,

recorrente,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada por U. Wölker e X. Lewis, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrida,

que tem por objecto um pedido de anulação da decisão da Comissão que indefere parcialmente um pedido de acesso a certas actas do comité dos impostos especiais de consumo,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Primeira Secção),

composto por: B. Vesterdorf, presidente, M. Vilaras e N. J. Forwood, juízes,

secretário: H. Jung,

vistos os autos e após a audiência de 7 de Março de 2001,

profere o presente

Acórdão

Enquadramento jurídico

1.
    Em 6 de Dezembro de 1993, a Comissão e o Conselho aprovaram um código de conduta em matéria de acesso do público aos documentos da Comissão e do Conselho (JO L 340, p. 41, a seguir «código de conduta»).

2.
    Para garantir a sua aplicação, a Comissão adoptou, em 8 de Fevereiro de 1994, a Decisão 94/90/CECA, CE, Euratom relativa ao acesso do público aos documentos da Comissão (JO L 46, p. 58). No artigo 1.° dessa decisão, a Comissão adopta formalmente o código de conduta cujo texto é a esta anexado.

3.
    O código de conduta enuncia o seguinte princípio geral:

«O público terá o acesso mais amplo possível aos documentos da Comissão e do Conselho.»

4.
    As circunstâncias que podem ser invocadas por uma instituição para justificar o indeferimento de um pedido de acesso a documentos são enumeradas, na rubrica do código de conduta intitulada «Regime de excepções», nos seguintes termos:

«As instituições recusam o acesso a qualquer documento cuja divulgação possa prejudicar:

-    a protecção do interesse público (segurança pública, relações internacionais, estabilidade monetária, processos judiciais, inspecções e inquéritos),

-    a protecção do indivíduo e da vida privada,

-    a protecção do sigilo comercial e industrial,

-    a protecção dos interesses financeiros da Comunidade,

-    a protecção da confidencialidade solicitada pela pessoa singular ou colectiva que forneceu a informação ou exigida pela legislação do Estado-Membro que forneceu a informação.

As instituições podem igualmente recusar o acesso a um documento para salvaguardar o interesse da instituição no que respeita ao sigilo das suas deliberações.»

5.
    O artigo 24.° da Directiva 92/12/CEE do Conselho, de 25 de Fevereiro de 1992, relativa ao regime geral, à detenção, à circulação e aos controlos dos produtos sujeitos a impostos especiais de consumo (JO L 76, p. 1), tal como foi alterado pelo artigo 1.°, n.° 11, da Directiva 94/74/CE do Conselho, de 22 de Dezembro de 1994 (JO L 365, p. 46), prevê:

«1. A Comissão será assistida por um 'comité dos impostos especiais de consumo', a seguir designado 'comité', composto por representantes dos Estados-Membros e presidido por um representante da Comissão. O comité estabelecerá o seu próprio regulamento interno.

2. As medidas necessárias à aplicação dos artigos 5.°, 7.°, 15.°-B, 18.°, 19.° e 23.° serão adoptadas de acordo com o processo previsto nos n.os 3 e 4.

3. O representante da Comissão submeterá à apreciação do comité um projecto das medidas a tomar. O comité emitirá o seu parecer sobre esse projecto num prazo que o presidente pode fixar em função da urgência da questão em causa. Ocomité pronunciar-se-á por maioria, nos termos previstos no n.° 2 do artigo 148.° do Tratado. O presidente não participa na votação.

4.    a)    A Comissão adoptará as medidas projectadas desde que sejam conformes com o parecer do comité;

    b)    Se as medidas projectadas não forem conformes com o parecer do comité ou na ausência de parecer, a Comissão submeterá sem demora ao Conselho uma proposta relativa às medidas a tomar. O Conselho deliberará por maioria qualificada.

        Se, no termo de um prazo de três meses a contar da data em que a proposta foi submetida à sua apreciação, o Conselho não tiver adoptado medidas, a Comissão adoptará as medidas propostas, excepto no caso de o Conselho se ter pronunciado por maioria simples contra as referidas medidas.

5. Além das medidas referidas no n.° 2, o comité analisará as questões evocadas pelo seu presidente, quer por iniciativa deste quer a pedido do representante de um Estado-Membro, que incidam sobre a aplicação das disposições comunitárias em matéria de impostos especiais de consumo.»

Factos

6.
    A recorrente, a British American Tobacco International (Investments) Ltd, é uma sociedade estabelecida no Reino Unido que faz parte do grupo British American Tobacco, que, na altura dos factos, exportava tabaco expandido, a partir do Reino Unido, para diversos Estados-Membros da Comunidade.

7.
    No decurso do ano de 1998, a recorrente tomou conhecimento, por intermédio das autoridades do Reino Unido, dos extractos de uma acta de uma reunião do comité dos impostos especiais de consumo, de 7 e 8 de Outubro de 1997, de que resultava que, por iniciativa de um Estado-Membro, uma maioria de delegações tinha dado a conhecer a sua vontade de considerar que o tabaco expandido devia ser equiparado ao «tabaco de fumar», na acepção do artigo 5.°, n.° 1, da Directiva 95/59/CE do Conselho, de 27 de Novembro de 1995, relativa aos impostos que incidem sobre o consumo de tabacos manufacturados, com excepção dos impostos sobre o volume de negócios (JO L 291, p. 40), e, portanto, como um produto sujeito a imposto especial de consumo, na acepção da Directiva 92/12. A seguir, a recorrente foi igualmente informada, pelas mesmas autoridades, da adopção de conclusões nesse sentido pelo comité dos impostos especiais de consumo, bem como das reservas manifestadas pela delegação da República Italiana e das dificuldades de aplicação com que se confrontava a Administração Fiscal desse Estado. A recorrente pediu, por isso, à Comissão que a questão do regime fiscaldo tabaco expandido fosse, de novo, examinada pelo comité e decidida em sentido contrário.

8.
    Por carta de 16 de Novembro de 1999, a Comissão confirmou que se chegou a um acordo numa reunião do comité de 29 e 30 de Abril de 1998, nos termos do qual o tabaco expandido devia ser tratado como tabaco de fumar e, portanto, como um produto sujeito a imposto especial de consumo, cuja circulação entre os diferentes Estados-Membros estava subordinada ao cumprimento das formalidades previstas pelo artigo 18.°, n.° 1, da Directiva 92/12. A Comissão indicava, por outro lado, que, em conformidade com o pedido da recorrente, tinha de novo levantado a questão do regime fiscal do tabaco expandido numa reunião do comité de 28 e 29 de Outubro de 1999, mas que os membros do comité tinham recusado reabrir a discussão e confirmado a sua posição.

9.
    Por carta de 6 de Janeiro de 2000, a recorrente, com base na Decisão 94/90, pediu à Comissão para ter acesso às actas do comité dos impostos especiais de consumo relativas às reuniões de 29 e 30 de Abril de 1998 e de 28 e 29 de Outubro de 1999, na medida em que elas tinham incidido sobre o regime fiscal do tabaco expandido.

10.
    Por carta de 17 de Janeiro de 2000, a Direcção-Geral «Fiscalidade e União Aduaneira» da Comissão informou a recorrente do indeferimento do seu pedido, pela razão de que a divulgação dos documentos em causa poderia prejudicar a protecção da confidencialidade pedida pelas pessoas colectivas que forneceram a informação.

11.
    Por carta de 4 de Fevereiro de 2000, a recorrente introduziu um pedido confirmativo junto do secretário-geral da Comissão, em conformidade com o disposto no artigo 2.°, n.° 2, da Decisão 94/90.

12.
    Por carta de 8 de Março de 2000, o secretário-geral da Comissão informou a recorrente da sua decisão de lhe recusar acesso às actas em causa pelas razões de que a sua divulgação poderia prejudicar, por um lado, a protecção da confidencialidade pedida pela pessoa colectiva que forneceu a informação e, por outro, a protecção do interesse da instituição relativo ao sigilo das suas deliberações.

Tramitação do processo e pedidos das partes

13.
    Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 2 de Maio de 2000, a recorrente interpôs o presente recurso.

14.
    Com base no relatório do juiz-relator, o Tribunal (Primeira Secção) decidiu dar início à fase oral do processo.

15.
    Por despacho de 19 de Fevereiro de 2001, o Tribunal, ao abrigo do artigo 66.°, n.° 1, do seu Regulamento de Processo, ordenou à Comissão, a título de medida de instrução, que lhe transmitisse as actas do comité dos impostos especiais de consumo, a que o acesso tinha sido recusado, a fim de lhe permitir examinar o seu conteúdo.

16.
    Em 1 de Março de 2001, a Comissão apresentou na Secretaria do Tribunal as duas actas do comité dos impostos especiais de consumo relativas às reuniões tidas por esse comité, por um lado, em 29 e 30 de Abril de 1998 e, por outro, em 28 e 29 de Outubro de 1999. Em conformidade com o disposto no artigo 67.°, n.° 3, terceiro parágrafo, do Regulamento de Processo, esses documentos não foram comunicados à recorrente.

17.
    As partes foram ouvidas em alegações e nas suas respostas às questões formuladas pelo Tribunal, na audiência de 7 de Março de 2001.

18.
    A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

- anular a decisão que recusa o acesso aos documentos;

- condenar a Comissão nas despesas.

19.
    A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:

- negar provimento ao recurso;

- condenar a recorrente nas despesas.

Quanto ao objecto do litígio

20.
    Na audiência, a Comissão informou o Tribunal e a recorrente da sua decisão de conceder a esta o acesso a uma versão não confidencial das actas em causa, em que a identidade das delegações que exprimiram as posições reproduzidas nesses documentos seria ocultada, o que o Tribunal registou.

21.
    Convidada a pronunciar-se sobre a substituição da decisão de recusa inicial por esta nova decisão, a recorrente adaptou os seus pedidos e fundamentos em consequência.

22.
    A esse propósito, há que recordar que, segundo jurisprudência constante, os pedidos inicialmente dirigidos contra um acto substituído no decurso da instância podem considerar-se dirigidos contra o acto de substituição, constituindo este um elemento novo que permite à recorrente adaptar os seus pedidos e fundamentos (acórdãos do Tribunal de Justiça de 3 de Março de 1982, Alpha Steel/Comissão, 14/81, Recueil, p. 749, n.° 8, e de 14 de Julho de 1988, StahlwerkePeine-Salzgitter/Comissão, 103/85, Colect., p. 4131, n.° 11; acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 15 de Setembro de 1998, De Persio/Comissão, T-23/96, ColectFP, p. I-A-483 e II-1413, n.° 32). Em tal hipótese, seria, com efeito, contrário a uma boa administração da justiça e a uma exigência de economia de processo obrigar a recorrente a interpor novo recurso para o Tribunal de Primeira Instância (acórdão Alpha Steel/Comissão, já referido, n.° 8).

23.
    No caso em apreço, a recorrente pediu a anulação da decisão da Comissão, na medida em que comporta uma recusa de divulgar o nome dos Estados-Membros mencionados nas actas em causa.

24.
    Por conseguinte, de acordo com as partes, foi registado que a única questão que continuava por resolver era a de saber se a Comissão estava no direito de conceder apenas um acesso parcial aos documentos em causa, consistente em ocultar a identidade das delegações que exprimiram a sua posição durante as reuniões que foram objecto das actas em litígio. Foi igualmente registada a renúncia da recorrente em alegar qualquer outro fundamento ou argumento exposto na sua petição contra a decisão inicial de recusa.

25.
    Tendo a Comissão, por outro lado, precisado, na audiência, que a recusa de revelar os nomes dos Estados-Membros mencionados nas actas em causa era exclusivamente motivada pela excepção facultativa, tirada da protecção do interesse da instituição relativo ao sigilo das suas deliberações, incumbe, portanto, ao Tribunal pronunciar-se unicamente sobre o pedido de anulação dessa decisão de recusa e sobre o fundamento apresentado em apoio desse pedido, tirado da violação da Decisão 94/90.

Quanto ao mérito

Argumentos das partes

26.
    A recorrente sustenta que a decisão da Comissão de não divulgar o nome dos Estados-Membros mencionados nas actas, a que ela tinha pedido acesso integral, é contrária à Decisão 94/90 porquanto é baseada numa aplicação errónea da excepção facultativa tirada da protecção do interesse da instituição relativo ao sigilo das deliberações. A ponderação dos interesses em causa, a que a aplicação dessa excepção está subordinada, devia, em sua opinião, conduzir a fazer prevalecer os seus interesses sobre os da instituição.

27.
    Por um lado, com efeito, a recorrente teria um interesse manifesto em conhecer a identidade das diferentes delegações citadas nas actas em causa. A este propósito, alega que, apesar da harmonização do regime dos impostos especiais de consumo na Comunidade, o tabaco expandido está sempre sujeito, no plano dos factos, a diferenças de tratamento significativas por parte das autoridadesaduaneiras dos Estados-Membros, cujas consequências são onerosas para ela. Sendo responsável pela gestão dos aspectos fiscais das operações comerciais do grupo British American Tobacco, seria, pois, importante para a recorrente conhecer a posição precisa dos Estados-Membros em causa, a fim de poder negociar eficazmente com eles numa base bilateral.

28.
    Por outro lado, quanto ao pretenso interesse da Comissão, seria baseado na premissa errónea de que a não divulgação da identidade das delegações nacionais constituiria uma condição necessária ao desenrolar de discussões francas e abertas entre os Estados-Membros. Segundo a recorrente, é, pelo contrário, o conhecimento das posições tomadas pelos membros do comité que permite garantir a lealdade dos debates, como confirma o carácter transparente das discussões que tiveram lugar noutros círculos institucionais, nomeadamente, parlamentares. Resultaria, aliás, da jurisprudência (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 19 de Outubro de 1995, Carvel e Guardian Newspapers/Conselho, T-194/94, Colect., p. II-2765) que seria legítimo pedir a uma instituição que revele a posição tomada pelas delegações nacionais no decurso das deliberações.

29.
    Quanto ao argumento segundo o qual ela nunca manifestara o seu interesse em relação à identidade das delegações mencionadas nas actas, a recorrente objecta que pretendia conhecer a posição dos Estados-Membros, isto é, não somente o conteúdo das suas discussões mas também a identidade das delegações que exprimiram uma posição. Fazendo essa informação parte integrante dos documentos a que era pedido acesso, não lhe incumbia, portanto, em sua opinião, expor razões adicionais para fundamentar o seu pedido quanto a esse ponto. De qualquer forma, a menos que se proceda a uma inversão do ónus da prova, seria à Comissão que caberia justificar a sua posição, quando recusa conceder acesso a um documento, e não ao requerente fundamentar o seu pedido.

30.
    A Comissão considera que a decisão de conceder acesso parcial às actas em causa, sem divulgar a identidade das diferentes delegações mencionadas nesses documentos, corresponde a uma justa ponderação dos interesses em presença.

31.
    Sustenta que os interesses da recorrente, no caso em apreço, foram suficientemente tomados em conta, uma vez que, tal como resulta da petição, o objectivo que esta prosseguia na altura da apresentação do seu pedido de acesso aos documentos em causa era somente conhecer o conteúdo das discussões do comité a propósito do regime aplicável ao tabaco expandido. A Comissão sublinha, a esse propósito, que deve ser informada dos interesses do requerente quando procede à ponderação dos interesses. Ora, em nenhum momento, a recorrente indicara pretender também conhecer a identidade das delegações que estão na origem das diversas posições expressas. Além disso, segundo a Comissão, a própria recorrente sublinhou, durante a fase escrita do processo, que o acesso parcial aos documentos em causa podia constituir uma solução satisfatória.

32.
    A Comissão alega, por outro lado, que a recorrente, devido às suas actividades, sabe, de qualquer forma, quais são os Estados-Membros em que depara com exigências particulares por parte das autoridades aduaneiras. Por conseguinte, a recorrente teria já conhecimento da informação que solicita.

33.
    Quanto ao seu próprio interesse, a Comissão sustenta que o mesmo exige que a identidade das diferentes delegações que intervieram no decurso das reuniões do comité seja mantida em sigilo. Na medida em que preside ao comité dos impostos especiais de consumo, seria, com efeito, no seu interesse que as discussões levadas a cabo entre os Estados-Membros continuem francas, leais e exaustivas. A este propósito, sublinha que, no quadro das reuniões como as que deram lugar às actas em causa, o comité não exerce o papel de um comité de comitologia, mas o de um simples fórum de discussão entre Estados-Membros, em conformidade com o disposto no artigo 24.°, n.° 5, da Directiva 92/12. Por conseguinte, a divulgação da identidade das delegações comprometeria tanto mais a boa ordem dessas deliberações.

34.
    Em resposta às questões do Tribunal, a Comissão expôs, na audiência, que, de uma maneira mais geral, parte do princípio de que a identidade das delegações nacionais mencionadas nas actas de reuniões de comités não é divulgada, sublinhando, embora, que uma ponderação dos interesses em causa deve ser efectuada, caso a caso, tendo em conta o conteúdo do documento em causa.

Apreciação do Tribunal

35.
    Há que recordar, a título preliminar, que o código de conduta adoptado pela Comissão na Decisão 94/90 prevê duas categorias de excepções ao direito de acesso do público aos documentos dessa instituição. A primeira categoria, redigida em termos imperativos, reúne as «excepções obrigatórias» cujo objectivo é proteger quer os interesses de terceiros quer o interesse do público em geral. A segunda, redigida em termos facultativos, incide sobre as deliberações internas da instituição que põem unicamente em causa os interesses desta (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 5 de Março de 1997, WWF UK/Comissão, T-105/95, Colect., p. II-313, n.° 60).

36.
    No caso em apreço, tal como precisou a Comissão na audiência, a decisão impugnada, que indefere parcialmente o pedido de acesso da recorrente às actas do comité dos impostos especiais de consumo, é baseada exclusivamente na excepção facultativa. Ao abrigo desta, a Comissão pode também recusar o acesso aos seus documentos «para salvaguardar a protecção do interesse da instituição no que respeita ao sigilo das suas deliberações».

37.
    A este propósito, importa sublinhar que as deliberações do comité dos impostos especiais de consumo, à semelhança dos seus documentos, entendem-se como sendo da Comissão. Com efeito, esse comité, constituído em execução de um actocomunitário, tem por missão principal assistir a Comissão, que assegura a respectiva presidência bem como o seu Secretariado, o que implica que ela lavre as actas por ele adoptadas. Além disso, afigura-se que o comité não dispõe de administração, de orçamento, de arquivos e de instalações, e ainda menos de domicílio, que lhe sejam próprios. Por conseguinte, o comité, que nem é uma pessoa singular ou colectiva, nem um Estado-Membro, nem outro órgão nacional ou internacional, também não pode ser considerado «uma outra instituição ou órgão comunitário» na acepção do código de conduta (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 19 de Julho de 1999, Rothmans/Comissão, T-188/97, Colect., p. II-2463, n.os 58 e 59).

38.
    Na medida em que o comité dos impostos especiais de consumo se deve, por conseguinte, considerar sujeito à Comissão, esta tem, assim, o direito de se prevalecer da excepção relativa ao sigilo das suas deliberações na hipótese em que os documentos aos quais se pede acesso digam respeito a deliberações do comité dos impostos especiais de consumo.

39.
    Todavia, a simples circunstância de os documentos em causa dizerem respeito a deliberações desse comité não poderá, só por si, bastar para justificar a aplicação da excepção invocada.

40.
    Com efeito, segundo a jurisprudência, qualquer excepção ao direito de acesso aos documentos da Comissão abrangidos pela Decisão 94/90 deve ser interpretada e aplicada em termos estritos (acórdão do Tribunal de Justiça de 11 de Janeiro de 2000, Países Baixos e van der Wal/Comissão, C-174/98 P e C-189/98 P, Colect., p. I-1, n.° 27, e acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 13 de Setembro de 2000, Denkavit Nederland/Comissão, T-20/99, Colect., p. II-3011, n.° 45). Por outro lado, para efeitos da aplicação dessa excepção facultativa, a Comissão goza de um poder de apreciação, que deve, todavia, exercer ponderando realmente, por um lado, o interesse do cidadão em obter acesso a esses documentos e, por outro, o seu eventual interesse em preservar o sigilo das suas deliberações (acórdão WWF UK/Comissão, já referido, n.° 59; v. também, a propósito do Conselho, acórdãos do Tribunal de Primeira Instância Carvel e Guardian Newspapers/Conselho, já referido, n.° 65, e de 17 de Junho de 1998, Svenska Journalistförbundet/Conselho, T-174/95, Colect., p. II-2289, n.° 113).

41.
    Por isso, no quadro do controlo de legalidade, incumbe ao Tribunal verificar, sem sobrepor a sua apreciação à da Comissão, se esta ponderou efectivamente os interesses em causa sem exceder os limites inerentes ao seu poder de apreciação. Foi com esta finalidade que o Tribunal ordenou a apresentação dos documentos em litígio.

42.
    No que respeita, em primeiro lugar, à apreciação do interesse da recorrente, deve recordar-se que, no quadro da aplicação da Decisão 94/90, qualquer pessoa pode pedir o acesso a qualquer documento da Comissão não publicado, sem que seja necessário fundamentar o pedido (acórdão Svenska Journalistförbundet/Conselho,já referido, n.° 65). Resulta daí nomeadamente que, na ausência de informações sobre os motivos pessoais de apresentação de um pedido, não poderá criticar-se a instituição em causa, quando proceda à ponderação dos interesses em presença com vista a aplicar a excepção facultativa, por apreciar o interesse do autor do pedido à luz do interesse que poderia ter qualquer cidadão em obter o acesso aos documentos das instituições, sem ter em conta interesses particulares de que, por hipótese, ela não tem conhecimento.

43.
    Todavia, nas circunstâncias do caso em apreço, a Comissão não poderá prevalecer-se de um desconhecimento dos objectivos prosseguidos pela recorrente aquando da apresentação do seu pedido de acesso às actas em causa. Tal como resulta dos autos (v., supra, n.os 7 e 8), esse pedido dava seguimento às diligências feitas por essa empresa para fazer valer o seu ponto de vista contra a decisão de certos Estados-Membros de tratar o tabaco expandido como «tabaco de fumar» na acepção do artigo 5.°, n.° 1, da Directiva 95/59 e de o submeter, em consequência, ao regime previsto pela Directiva 92/12 relativa aos produtos sujeitos a impostos especiais de consumo. O pedido da recorrente visava, assim, conhecer as posições expressas sobre essa questão no seio do comité, tendo em conta as implicações que tal qualificação acarretava para ela tanto no plano fiscal como administrativo.

44.
    Nesse contexto, o interesse que representava para a recorrente a possibilidade de tomar conhecimento não somente do conteúdo das discussões mas também da identidade das delegações que estão na origem das posições expressas não podia manifestamente ser desconhecido.

45.
    Há, em seguida, que salientar que esse interesse não poderá ser considerado como desprovido de qualquer importância para efeitos de uma ponderação dos interesses em presença.

46.
    A esse propósito, importa reconhecer que os documentos aos quais era pedido o acesso diziam respeito à aplicação, pelos Estados-Membros, de disposições que foram objecto de uma harmonização a nível comunitário. A Directiva 92/12 visa, com efeito, estabelecer um certo número de regras no que respeita à detenção, à circulação e aos controlos dos produtos sujeitos a impostos especiais de consumo, e isto, nomeadamente, a fim de que a exigibilidade dos impostos especiais de consumo seja idêntica em todos os Estados-Membros (acórdão do Tribunal de Justiça de 2 de Abril de 1998, EMU Tabac e o., C-296/95, Colect., p. I-1605, n.° 22). Em particular, quanto aos produtos do tabaco, a exigibilidade e a estrutura dos impostos especiais de consumo sobre um produto particular dependem, nomeadamente, da sua classificação numa das categorias referidas pela Directiva 95/59 (v. acórdão do Tribunal de Justiça de 24 de Setembro de 1998, Brinkmann, C-319/96, Colect., p. I-5255).

47.
    Ora, no que respeita ao tabaco expandido, está assente que foram reconhecidas diferenças de tratamento nos Estados-Membros, dado que alguns deles o classificaram como tabaco de fumar na acepção do artigo 5.°, n.° 1, da Directiva 95/59, com a finalidade de sujeitar esse produto a impostos especiais de consumo e de exigir o documento previsto pelo artigo 18.°, n.° 1, da Directiva 92/12, para efeitos de exportação desse produto para o seu território. Tal como resulta, aliás, dos extractos da acta das reuniões de 7 e 8 de Outubro de 1997 do comité dos impostos especiais de consumo (v., supra, n.° 7), já comunicados à recorrente, tratava-se, segundo a Comissão, de um «exemplo típico de pontos de vista divergentes no seio da Comunidade que afectam o comércio efectuado pelas empresas multinacionais». Apesar das posições expressas, em seguida, pelas diferentes delegações nacionais no seio do comité, aquando das reuniões que são objecto das actas em litígio, não é contestado pela Comissão que o tratamento pelos Estados-Membros da exportação de tabaco expandido para os seus territórios apresenta ainda diferenças significativas.

48.
    Por isso, a possibilidade de a recorrente tomar conhecimento da identidade das delegações que exprimiram uma posição formal a esse respeito deve ser considerada como apresentando para ela e para as suas actividades um interesse manifesto, nomeadamente com vista a fazer valer o seu ponto de vista junto das autoridades fiscais e aduaneiras dos Estados em causa.

49.
    Essa conclusão não poderá ser infirmada pelo argumento de que a recorrente identificara, de qualquer maneira, os Estados em que depara com exigências particulares por parte das autoridades aduaneiras. A supor que tal seja o caso, o conhecimento, por esse operador, das práticas próprias das autoridades de alguns Estados não poderá limitar o seu interesse em tomar conhecimento das posições formais expressas por estes últimos nas reuniões do comité dos impostos especiais de consumo. Além disso, esse argumento, porquanto implica que a posição expressa por um Estado-Membro no seio do comité corresponde a uma prática conhecida das suas autoridades aduaneiras, não faz senão pôr em causa o carácter confidencial dessa posição e não o interesse da recorrente em tomar conhecimento dela.

50.
    Quanto ao argumento de que a recorrente admitira, durante a fase escrita do processo, que um acesso parcial às actas constituiria para ela uma solução satisfatória, deve igualmente ser rejeitado. Basta, a esse propósito, verificar que, na sua petição, a recorrente criticava somente a Comissão por não ter examinado a possibilidade de um acesso parcial às actas em causa, concluindo, no entanto, pela anulação total da decisão que indefere o seu pedido.

51.
    Em segundo lugar, deve verificar-se se a Comissão podia, todavia, sem ultrapassar os limites inerentes ao seu poder de apreciação, fazer prevalecer o seu interesse no sigilo das deliberações sobre o da recorrente, a fim de se opor à divulgação da identidade das delegações mencionadas nas actas. A esse propósito, a Comissão alega que essa divulgação comprometeria o carácter efectivo, isto é, franco, leal eexaustivo, das discussões entre os Estados-Membros e, portanto, a boa ordem das deliberações do comité.

52.
    Todavia, como resulta da jurisprudência, o código de conduta, tal como adoptado pela Comissão na Decisão 94/90, não poderá justificar que uma instituição recuse, por princípio, o acesso a documentos que digam respeito às suas deliberações, em virtude de eles conterem informações relativas à posição tomada pelos representantes dos Estados-Membros, a não ser desconhecendo a obrigação de ponderar os interesses em presença (v., a propósito do Conselho, acórdão Carvel e Guardian Newspapers/Conselho, já referido, n.os 72 e 73) Por isso, o argumento da Comissão segundo o qual a divulgação da identidade das delegações poria necessariamente em causa a boa ordem das deliberações do comité não constitui motivo suficiente para, por si só, fazer claudicar o direito de acesso de que dispõe, em princípio, a recorrente ao abrigo da Decisão 94/90.

53.
    Além disso, tal como a Comissão admitiu na audiência (v., supra, n.° 34), deve, em cada caso, proceder-se a uma ponderação dos interesses em questão, tendo presente o conteúdo do documento em causa.

54.
    No caso em apreço, em primeiro lugar, quanto à acta da reunião do comité com data de 29 e 30 de Abril de 1998, resulta do seu conteúdo que a delegação de um Estado-Membro aderiu ao ponto de vista da maioria das delegações, a despeito do facto de ela considerar o tabaco expandido como não podendo ser fumado. Em seguida, deduz-se daí que as quinze delegações são, portanto, favoráveis à exigência do documento de acompanhamento, referido no artigo 18.°, n.° 1, da Directiva 92/12, em caso de circulação desse produto na Comunidade.

55.
    No que respeita, por outro lado, à acta da reunião do comité de 28 e 29 de Outubro de 1999, faz-se nela referência, por um lado, ao pedido da recorrente que tem em vista que o comité reconsidere a sua posição e, por outro, à recusa de três delegações de abrir uma nova discussão a esse respeito, bem como à ausência de opinião expressa pelas outras delegações.

56.
    Força é, por isso, reconhecer que essas actas dizem respeito a deliberações que estavam consumadas na data da apresentação do seu pedido pela recorrente (v., a contrario, a propósito de documentos relativos a actividades de inspecção em curso, acórdão Denkavit Nederland/Comissão, já referido, n.° 48), de forma que a divulgação da identidade das delegações mencionadas nesses documentos já não era susceptível de prejudicar a expressão efectiva, pelos Estados-Membros, das suas posições respeitantes ao regime fiscal do tabaco expandido.

57.
    Segue-se que, no quadro de uma ponderação real dos interesses em jogo, tal motivo não poderá justificar, no caso em apreço, a existência de um interesse em preservar o sigilo das deliberações em detrimento do interesse da recorrente.

58.
    Resulta do conjunto destes elementos que, nas circunstâncias específicas do caso em apreço, a decisão impugnada está viciada por um erro manifesto de apreciação e deve, portanto, ser anulada.

Quanto às despesas

59.
    Nos termos do n.° 2 do artigo 87.° do Regulamento de Processo, a parte vencida deve ser condenada nas despesas, se tal tiver sido requerido. Tendo a Comissão sido vencida, há que, tendo em conta os pedidos da recorrente, condená-la nas despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Primeira Secção)

decide:

1)    A decisão da Comissão que indefere parcialmente um pedido de acesso a certas actas do comité dos impostos especiais de consumo é anulada.

2)    A Comissão é condenada nas despesas.

Vesterdorf
Vilaras
Forwood

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 10 de Outubro de 2001.

O secretário

O presidente

H. Jung

B. Vesterdorf


1: Língua do processo: inglês.