Language of document : ECLI:EU:T:2008:416

Processo T‑73/04

Le Carbone‑Lorraine

contra

Comissão das Comunidades Europeias

«Concorrência – Acordos, decisões e práticas concertadas – Mercado dos produtos à base de carbono e de grafite para aplicações eléctricas e mecânicas − Orientações para o cálculo do montante das coimas − Gravidade e duração da infracção – Circunstâncias atenuantes – Cooperação durante o procedimento administrativo – Princípio da proporcionalidade − Princípio da igualdade de tratamento»

Sumário do acórdão

1.      Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Critérios – Infracção complexa

(Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 15.°, n.° 2; Comunicação 98/C 9/03 da Comissão, ponto 1 A)

2.      Concorrência – Regras comunitárias – Infracções – Coimas – Unidade de infracções

(Artigo 81.°, n.° 1, CE; Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 15.°, n.° 2)

3.      Concorrência – Regras comunitárias – Aplicação pela Comissão – Autonomia relativamente às apreciações feitas pelas autoridades de Estados terceiros

[Artigos 3.°, n.° 1,alínea g), CE, e 81.° CE]

4.      Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Critérios – Gravidade da infracção – Tomada em consideração dos efeitos da infracção no seu todo

(Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 15.°, n.° 2)

5.      Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Critérios – Gravidade da infracção – Fixação dos preços – Obrigação da Comissão de fazer referência, para apreciar o impacto de uma infracção, ao jogo da concorrência caso a infracção não tivesse existido

(Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 15.°, n.° 2; Comunicação 98/C 9/03 da Comissão, ponto 1 A)

6.      Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Critérios – Gravidade da infracção – Gravidade da participação de cada empresa

(Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 15.°, n.° 2; Comunicação 98/C 9/03 da Comissão)

7.      Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Critérios – Volume de negócios global da empresa em causa – Volume de negócios realizado com as mercadorias que são objecto da infracção

(Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 15.°, n.° 2)

8.      Concorrência – Coimas – Decisão que aplica coimas – Dever de fundamentação

(Artigo 253.° CE; Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 15.°, n.° 2; Comunicação 98/C 9/03 da Comissão)

9.      Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Carácter dissuasivo – Exigência geral que deve guiar a Comissão no cálculo das coimas

(Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 15.°; Comunicação 98/C 9/03 da Comissão, ponto 1 A)

10.    Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Critérios – Gravidade da infracção – Circunstâncias atenuantes – Estabelecimento de um programa de adequação às regras comunitárias de concorrência

(Artigo 81.° CE; Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 15.°; Comunicação 98/C 9/03 da Comissão)

11.    Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Critérios – Gravidade da infracção – Circunstâncias atenuantes – Papel passivo ou seguidista da empresa

(Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 15.°; Comunicação 98/C 9/03 da Comissão, ponto 3, primeiro travessão)

12.    Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Critérios – Gravidade da infracção – Circunstâncias atenuantes

(Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 15.°; Regulamento n.° 2842/98 da Comissão; Comunicação 98/C 9/03 da Comissão, ponto 3)

13.    Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Critérios – Circunstâncias atenuantes – Comportamento que diverge do concertado no âmbito do acordo

(Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 15.°; Comunicação 98/C 9/03 da Comissão, ponto 3, segundo travessão)

14.    Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Critérios – Circunstâncias atenuantes – Cessação da infracção anteriormente à intervenção da Comissão

(Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 15.°; Comunicação 98/C 9/03 da Comissão, ponto 3, terceiro travessão)

15.    Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Critérios – Gravidade da infracção – Circunstâncias atenuantes – Redução do montante da coima em contrapartida de uma colaboração que permite determinar o grau de participação de outra empresa

(Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 15.°; Comunicação 98/C 9/03 da Comissão, ponto 3, sexto travessão)

16.    Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Critérios – Redução do montante da coima em contrapartida da cooperação da empresa incriminada

(Regulamento n.° 17 do Conselho; Comunicação 96/C 207/04 da Comissão, ponto D, n.° 2)

17.    Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Critérios – Situação financeira da empresa em causa

(Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 15.° )

1.      No quadro da aplicação do artigo 81.°, n.° 1, CE, é para determinar se um acordo é susceptível de afectar o comércio entre Estados‑Membros e tem por objectivo ou por efeito impedir, restringir ou falsear o jogo da concorrência no mercado comum que é necessário, se for esse o caso, definir o mercado em causa. Consequentemente, a obrigação de proceder a uma delimitação do mercado numa decisão adoptada em aplicação do artigo 81.°, n.° 1, CE só se impõe à Comissão quando, sem essa delimitação, não seja possível determinar se o acordo, a decisão de associação de empresas ou a prática concertada em causa é susceptível de afectar as trocas comerciais entre Estados Membros e tem por objecto ou por efeito impedir, restringir ou falsear o jogo da concorrência no mercado comum.

A Comissão não é obrigada a delimitar os produtos em causa a fim de apreciar a gravidade da infracção, para cada categoria de produtos objecto do acordo. Com efeito, antes de mais, em conformidade com as Orientações para o cálculo das coimas aplicadas por força do n.° 2 do artigo 15.°, do Regulamento n.° 17 e do n.° 5 do artigo 65.° do Tratado CECA, a avaliação da gravidade de uma infracção deve ter em consideração o carácter da própria infracção, o seu impacto concreto no mercado quando este for quantificável e a dimensão do mercado geográfico de referência. Ora, a Comissão não tem qualquer obrigação de, nos termos das orientações, analisar o impacto de um acordo, de forma específica, para cada categoria de produtos em causa. Além do mais, perante uma infracção complexa única relativa a vários produtos, a Comissão não é obrigada a efectuar uma análise separada de cada elemento da infracção nem a repartir o montante da coima por esses diferentes elementos, assim como também não é obrigada a apreciar a gravidade de cada infracção quando impõe uma coima única a uma empresa que cometeu várias infracções, não podendo esta conclusão, por outro lado, permitir uma punição colectiva arbitrária das empresas implicadas num acordo, decisão ou prática concertada.

Em conformidade com o ponto 1 A, sexto parágrafo, das orientações já referidas, uma presença limitada num mercado pode eventualmente conduzir a um montante de partida menos importante no quadro do «tratamento diferenciado» das empresas implicadas num acordo. Além disso, a gravidade relativa da participação de cada uma das empresas em causa deve ser apreciada pela Comissão a propósito das eventuais circunstâncias atenuantes.

(cf. n.os 36, 45‑46, 48‑52)

2.      No âmbito da aplicação do artigo 81.° CE, a Comissão pode dar início a um processo único tendo por objecto práticas relativas a vários produtos distintos, uma vez que esse processo pode levar à adopção de uma decisão única em que se declara que uma empresa cometeu várias infracções distintas e que aplica outras tantas coimas distintas, respeitando cada uma delas os limites fixados pelo artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17. A Comissão, quando considera que todos os produtos abrangidos pelo processo são objecto de uma infracção complexa única tendo em conta, designadamente, o funcionamento do acordo em causa, pode escolher adoptar uma decisão única que aplica uma coima única a cada empresa em causa, não sendo essa escolha ilógica nem contrária ao princípio da boa administração.

(cf. n.os 56, 63‑66)

3.      A prática seguida pelas autoridades dos Estados terceiros, encarregadas da protecção da livre concorrência, não pode ser imposta à Comissão, que é responsável pela execução e a orientação da política comunitária da concorrência. Com efeito, o exercício dos seus poderes pelas autoridades dos Estados terceiros, no quadro da respectiva competência territorial, obedece a exigências que são próprias dos referidos Estados. Com efeito, os elementos que subjazem aos ordenamentos jurídicos de outros Estados no domínio da concorrência, não apenas comportam finalidades e objectivos específicos, mas conduzem ainda à aprovação de normas materiais específicas e às mais variadas consequências jurídicas no domínio administrativo, penal ou cível, quando as autoridades dos referidos Estados tenham verificado a existência de infracções às regras aplicáveis em matéria de concorrência. Pelo contrário, muito diversa é a situação jurídica em que uma empresa é exclusivamente alvo de aplicação, em matéria de concorrência, do direito comunitário e do direito de um ou de vários Estados‑Membros, isto é, no qual um acordo, decisão ou prática concertada se situa exclusivamente no âmbito de aplicação territorial do ordenamento jurídico da Comunidade Europeia.

Decorre do exposto que, quando a Comissão pune o comportamento ilícito de uma empresa, mesmo tendo este a sua origem num acordo de carácter internacional, visa salvaguardar a livre concorrência no interior do mercado comum, o que constitui, por força do artigo 3.°, n.° 1, alínea g), CE, um objectivo fundamental da Comunidade. Em razão da especificidade do bem jurídico protegido a nível comunitário, as apreciações feitas pela Comissão, ao abrigo das suas competências nesta matéria, podem divergir consideravelmente das efectuadas pelas autoridades de Estados terceiros.

(cf. n.os 57‑60)

4.      A Comissão, quando considera que um conjunto de acordos e ou de práticas concertadas constitui uma infracção complexa única, não é obrigada, para efeitos da apreciação do montante de partida das coimas, a proceder a uma apreciação concreta das práticas ilícitas em cada um dos mercados em causa nem a ter em conta o comportamento efectivo que uma empresa alega ter adoptado, devendo ser tidos em conta unicamente os efeitos resultantes da infracção no seu todo.

(cf. n.os 80, 89‑90, 95, 97, 102)

5.      Para apreciar o impacto concreto de uma infracção no mercado, compete à Comissão referir‑se ao jogo da concorrência que teria normalmente existido se não tivesse existido infracção.

No que respeita a um acordo sobre preços, é legítimo que a Comissão conclua que a infracção produziu efeitos devido ao facto de os membros do cartel terem adoptado medidas para aplicar os preços acordados, por exemplo, anunciando‑os aos clientes, dando instruções aos seus funcionários para os utilizarem como base de negociação e fiscalizando a sua aplicação pelos seus concorrentes e pelos seus próprios serviços de venda. Com efeito, para se verificar a existência de impacto no mercado basta que os preços acordados tenham servido de base para a fixação dos preços de transacção individuais, limitando assim a margem de negociação dos clientes.

Ao invés, não se pode exigir à Comissão, uma vez verificada a execução de um acordo, que demonstre sistematicamente que os acordos permitiram efectivamente às empresas em causa atingir um nível de preços de transacção superior ao que teria prevalecido se não existisse o acordo. A este respeito, não pode ser admitida a tese de que só pode ser tido em consideração, para determinar a gravidade da infracção, o facto de que o nível dos preços de transacção teria sido diferente se não existisse a colusão. Além disso, seria desproporcionado exigir essa demonstração, que envolveria recursos consideráveis, dado que implicaria o recurso a cálculos hipotéticos baseados em modelos económicos cuja exactidão só dificilmente poderia ser verificada pelo juiz e cuja infalibilidade não está de todo provada.

Com efeito, para se apreciar a gravidade da infracção, é determinante saber se os membros do cartel fizeram tudo o que estava ao seu alcance para a concretização das suas intenções. Os membros do cartel não podem, portanto, invocar em seu proveito próprio factores externos que contrariam os seus esforços, convertendo esses factores em elementos de justificação de uma redução da coima.

Assim, a Comissão pode legitimamente basear‑se na execução do acordo para concluir pela existência de um impacto no mercado e isto sem que seja necessário medir com precisão o alcance desse impacto.

Mesmo supondo que o impacto concreto do acordo não tenha sido suficientemente demonstrado pela Comissão, a qualificação da presente infracção como «muito grave» não seria menos adequada. Com efeito, os três aspectos a tomar em consideração na avaliação da gravidade da infracção, nos termos das orientações para o cálculo das coimas aplicadas por força do n.° 2 do artigo 15.° do Regulamento n.° 17 e do n.° 5 do artigo 65.° do Tratado CECA, que são o carácter da própria infracção, o seu impacto concreto no mercado, quando este for quantificável, e a dimensão do mercado geográfico em causa, não têm o mesmo peso no quadro do exame global. A natureza da infracção desempenha um papel primordial, designadamente para caracterizar as infracções «muito graves». A este propósito, resulta da descrição das infracções muito graves nas referidas orientações, que os acordos ou práticas concertadas que visam, designadamente, como no presente caso, a fixação dos preços, podem conduzir, apenas com base na sua própria natureza, à qualificação de «muito grave», sem que seja necessário que esses comportamentos se caracterizem por um impacto ou uma extensão geográfica especiais. Este entendimento é corroborado pelo facto de, embora a descrição das infracções graves refira expressamente o impacto no mercado e os efeitos em amplas zonas do mercado comum, a das infracções muito graves, pelo contrário, não refere qualquer exigência de impacto concreto no mercado nem de produção de efeitos numa zona geográfica especial.

(cf. n.os 83‑87, 91)

6.      No âmbito da determinação do montante de uma coima por violação das regras de concorrência, nos termos das orientações para o cálculo das coimas aplicadas por força do artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17 e do artigo 65.°, n.° 5, do Tratado CECA, há que distinguir a apreciação da gravidade da infracção, que serve para determinar o nível de partida da coima e a da gravidade da participação de cada uma das empresas em causa na infracção, devendo esta última questão ser examinada no âmbito da eventual aplicação de circunstâncias agravantes ou atenuantes.

(cf. n.° 100)

7.      A Comissão não é obrigada, quando determina o montante das coimas em função da gravidade e da duração da infracção em questão, a efectuar o cálculo da coima a partir de montantes baseados no volume de negócios das empresas envolvidas e, em especial, no volume de negócios realizado com os produtos em causa. Daí resulta que, embora não se possa negar, como a recorrente salienta, que o volume de negócios dos produtos em causa pode constituir uma base adequada para avaliar, como a Comissão fez na decisão, os prejuízos causados à concorrência no mercado dos produtos em causa no EEE e a importância relativa dos membros do cartel relativamente aos produtos em causa, o certo é que esse elemento está longe de constituir o único critério segundo o qual a Comissão deve apreciar a gravidade da infracção. Por conseguinte, estar‑se‑ia a atribuir a esse elemento uma importância excessiva se se limitasse a apreciação do carácter proporcionado do montante de partida da coima fixado pela Comissão à comparação do referido montante com o volume de negócios dos produtos em causa. A própria natureza da infracção, o impacto concreto da mesma, a dimensão geográfica do mercado afectado e o necessário alcance dissuasivo da coima são outros tantos elementos tomados em consideração pela Comissão no presente caso, que permitem justificar o montante acima referido.

(cf. n.os 114, 118‑119)

8.      No que diz respeito à fixação de coimas por violações do direito da concorrência, a Comissão cumpre o seu dever de fundamentação quando indica, na sua decisão, os elementos de apreciação que lhe permitiram medir a gravidade e a duração da infracção cometida, sem ter que incluir uma descrição mais detalhada ou elementos quantitativos relativos ao modo de cálculo da coima. A indicação de dados quantitativos relativos ao método de cálculo das coimas, por muito úteis que sejam, não é indispensável para se cumprir o dever de fundamentação.

No que respeita à fundamentação dos montante de partida em termos absolutos, importa recordar que as coimas constituem um instrumento da política de concorrência da Comissão, que deve poder dispor de uma margem de apreciação na fixação do seu montante, a fim de orientar o comportamento das empresas no sentido do cumprimento das regras de concorrência. Além disso, deve evitar‑se que as coimas sejam facilmente previsíveis para os operadores económicos. Por conseguinte, não se pode exigir que a Comissão forneça, quanto a este aspecto, outros elementos de fundamentação, para além dos relativos à gravidade da infracção.

(cf. n.os 129‑130)

9.      Constituindo a dissuasão uma finalidade das coimas por infracção às regras de concorrência, a exigência de a assegurar constitui uma exigência geral que deve nortear a Comissão no cálculo das coimas e não implica necessariamente que esse cálculo seja caracterizado por uma etapa específica destinada à avaliação global de todas as circunstâncias pertinentes para efeitos de realização dessa finalidade.

Para efeito da tomada em consideração do objectivo da dissuasão, a Comissão não definiu, nas Orientações para o cálculo das coimas aplicadas por força do n.° 2 do artigo 15.°, do Regulamento n.° 17 e do n.° 5 do artigo 65.° do Tratado CECA, uma metodologia ou critérios individualizados cuja exposição específica pudesse ter força obrigatória. O ponto 1 A, quarto parágrafo, das orientações, no contexto das indicações relativas à avaliação da gravidade da infracção, menciona unicamente a necessidade de determinar um montante que assegure que a coima é suficientemente dissuasiva.

(cf. n.os 131‑132)

10.    Embora seja importante que uma empresa adopte medidas para impedir que membros do seu pessoal cometam futuramente novas infracções ao direito comunitário da concorrência, por exemplo, criando um programa de conformidade com as regras de concorrência, a adopção dessas medidas em nada altera a realidade da infracção que foi constatada no caso vertente. No âmbito da determinação do montante de uma coima aplicada por infracção às regras de concorrência, a Comissão não é obrigada a considerar esse elemento uma circunstância atenuante, nem no âmbito da tomada em consideração do efeito dissuasivo da coima, nem, por maioria de razão, quando a infracção em causa constitui, como no presente caso, uma violação manifesta do artigo 81.° CE. A este respeito, é desprovida de pertinência a circunstância de essas medidas terem sido postas em prática pela empresa antes da intervenção da Comissão. Além disso, é impossível determinar o grau de eficácia das medidas internas adoptadas por uma empresa para evitar a repetição de infracções ao direito da concorrência.

(cf. n.os 143‑144, 231)

11.    O «papel exclusivamente passivo ou seguidista» de uma empresa na prática de uma infracção, se estiver demonstrado, constitui uma circunstância atenuante, nos termos do ponto 3, primeiro travessão, das Orientações para o cálculo das coimas aplicadas por força do n.° 2 do artigo 15.°, do Regulamento n.° 17 e do n.° 5 do artigo 65.° do Tratado CECA, precisando‑se que este papel passivo implica a adopção pela empresa em causa de uma «atitude discreta», ou seja, não participar activamente na elaboração do ou dos acordos anticoncorrenciais.

De entre os elementos susceptíveis de revelar o papel passivo de uma empresa num acordo podem ser tidos em conta o carácter sensivelmente mais esporádico das suas participações nas reuniões relativamente aos membros normais do acordo assim como a sua entrada tardia no mercado que constitui o objecto da infracção, independentemente da duração da sua participação nesta, ou ainda a existência de declarações expressas neste sentido dos representantes de empresas terceiras que participaram na infracção. Não é suficiente que, durante determinados períodos do acordo, ou relativamente a certos acordos do cartel, a empresa em causa tenha adoptado uma «atitude discreta». Além disso, a abordagem que consiste em distinguir a apreciação da atitude de uma empresa em função do objecto dos acordos ou das práticas concertadas em causa parece, no mínimo, teórica, quando estas se inserem numa estratégia geral, que determina as linhas de acção dos membros do cartel no mercado e limita a sua liberdade comercial com vista a prosseguir um objectivo anticoncorrencial idêntico e um objectivo económico único, a saber, falsear a evolução normal dos preços e limitar a concorrência no mercado em causa.

Por outro lado, o facto de uma empresa ter posto fim à sua participação no acordo apenas alguns meses antes dos outros membros do cartel não justifica uma redução do montante da coima ao abrigo da circunstância atenuante que consiste no «papel exclusivamente passivo ou ‘seguidista’ na infracção cometida».

(cf. n.os 163‑164, 179‑180, 184)

12.    A Comissão, quando aplica, numa decisão, o método exposto nas Orientações para o cálculo das coimas aplicadas por força do n.° 2 do artigo 15.°, do Regulamento n.° 17 e do n.° 5 do artigo 65.° do Tratado CECA, e conclui pela inexistência de circunstâncias atenuantes para a empresa em causa, pode pedir ao juiz comunitário o benefício de uma circunstância atenuante e redução do montante da coima correlativa, mesmo que o não tenha feito na sua resposta à comunicação de acusações.

Com efeito, o artigo 4.° do Regulamento (CE) n.° 2842/98, relativo às audições dos interessados directos em certos processos, nos termos dos artigos [81.° CE] e [82.° CE], que prevê que as partes que pretendam pronunciar‑se sobre as acusações contra eles formuladas devem fazê‑lo por escrito e podem invocar todos os fundamentos e factos úteis para a sua defesa nas suas observações escritas, não se exige às empresas destinatárias de uma comunicação de acusações que formalizem especificamente pedidos de reconhecimento de circunstâncias atenuantes.

Além disso, a comunicação de acusações é um acto preparatório relativamente à decisão, que constitui o último acto do procedimento e na qual a Comissão se pronuncia sobre as responsabilidades das empresas e, eventualmente, sobre as sanções que lhes devem ser aplicadas.

Para determinar o montante da coima, a Comissão deve ter em conta todas as circunstâncias do caso concreto, e, em especial, a gravidade e a duração da infracção, que são os dois critérios expressamente referidos no artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17. Quando uma infracção tenha sido cometida por várias empresas, a Comissão deve apreciar a gravidade relativa da participação de cada uma delas, para determinar se existem, a respeito das mesmas, circunstâncias agravantes ou atenuantes. Os n.os 2 e 3 das orientações já referidas, das quais a Comissão não pode afastar‑se, prevêem uma modulação do montante de base da coima em função de certas circunstâncias agravantes e atenuantes, que são próprias de cada empresa em causa.

(cf. n.os 188‑194)

13.    Para determinar se cada empresa deve beneficiar de uma circunstância atenuante a título da não aplicação efectiva dos acordos infractores, ao abrigo do ponto 3, segundo travessão, das Orientações para o cálculo das coimas aplicadas por força do n.° 2 do artigo 15.°, do Regulamento n.° 17 e do n.° 5 do artigo 65.° do Tratado CECA, importa verificar se, durante o período em que aderiu aos referidos acordos, a recorrente se subtraiu efectivamente à sua aplicação adoptando um comportamento concorrencial no mercado ou, no mínimo, se violou claramente e de modo considerável os compromissos de aplicar esse acordo, a ponto de ter perturbado o próprio funcionamento do mesmo.

(cf. n.° 196)

14.    Uma empresa que participou numa infracção ao direito comunitário da concorrência não pode beneficiar de uma circunstância atenuante ao abrigo do ponto 3, terceiro travessão, das Orientações para o cálculo das coimas aplicadas por força do n.° 2 do artigo 15.°, do Regulamento n.° 17 e do n.° 5 do artigo 65.° do Tratado CECA, quando pôs fim às práticas anticoncorrenciais na sequência da intervenção de autoridades da concorrência de Estados terceiros.

(cf. n.° 230)

15.    Ao determinar o montante da coima por infracção ao direito comunitário da concorrência, uma redução da coima com base na cooperação durante o procedimento administrativo só se justifica se o comportamento da empresa em causa tiver permitido à Comissão apurar a existência de uma infracção com menos dificuldade e, tal sendo caso, pôr‑lhe termo.

O fornecimento de informações que permitiu à Comissão avaliar com mais rigor o grau de cooperação de uma das empresas implicadas num cartel durante o processo para efeitos da determinação do montante da sua coima, facilitando assim a tarefa da Comissão durante a sua investigação, pode ser constitutivo de uma «colaboração efectiva fora do âmbito de aplicação da comunicação sobre a cooperação» na acepção do ponto 3, sexto travessão, das Orientações para o cálculo das coimas aplicadas por força do n.° 2 do artigo 15.°, do Regulamento n.° 17 e do n.° 5 do artigo 65.° do Tratado CECA.

No entanto, dado que as referidas informações devem respeitar às práticas anticoncorrenciais que são objecto da investigação, informações relativas a um território diferente daquele que é objecto da investigação não podem ser tidas em conta.

(cf. n.os 238‑239, 253)

16.    A Comissão beneficia de um amplo poder de apreciação no que diz respeito ao método de cálculo das coimas por infracção ao direito comunitário da concorrência e pode, a esse respeito, ter em conta múltiplos elementos, entre os quais figura a cooperação das empresas em causa durante a investigação conduzida pelos serviços desta instituição. A Comissão goza igualmente de uma vasta margem de apreciação na valoração da qualidade e da utilidade da cooperação prestada por uma empresa, designadamente em comparação com as contribuições de outras empresas. Tendo em conta esse poder de apreciação da Comissão, que se exprime, designadamente, pela indicação, na comunicação relativa à não aplicação de coimas ou à redução do seu montante nos processos relativos a acordos de uma margem de 10 a 50% como montante da redução, a redução máxima de 50% não decorre automaticamente da verificação do preenchimento das condições previstas no ponto D, n.° 2, primeiro e segundo parágrafos, da referida comunicação.

A Comissão pode basear a sua apreciação do montante da redução no facto de, por um lado, as provas fornecidas pela empresa em causa terem apenas um pequeno valor acrescentado tendo em conta os elementos na sua posse e, por outro, de a cooperação da referida empresa só ter começado após a recepção da carta que lhe foi enviada nos termos do artigo 11.° do Regulamento n.° 17.

Com efeito, a redução das coimas em caso de cooperação por parte das empresas que participaram em infracções ao direito comunitário da concorrência tem fundamento na consideração de que essa cooperação facilita a tarefa da Comissão de detectar a existência de uma infracção e, se for esse o caso, de pôr‑lhe termo. Por conseguinte, a Comissão não pode ignorar a utilidade da informação fornecida, que depende necessariamente das provas de que já dispõe. A este respeito, se a diferença fundamental que subjaz aos pontos B, C e D da comunicação sobre a cooperação é a utilidade da informação prestada, a Comissão pode utilizar o critério da utilidade para decidir o montante da redução por cada categoria de redução da coima prevista nos referidos pontos.

Por outro lado, a Comissão pode ter em conta o facto de uma empresa só lhe ter enviado documentos após a recepção de um pedido de informações, sem, contudo, poder considerar este facto determinante para minimizar a cooperação prestada por uma empresa nos termos do ponto D, n.° 2, primeira travessão, da comunicação relativa à não aplicação de coimas ou à redução do seu montante nos processos relativos a acordos, decisões e práticas concertadas

(cf. n.os 271‑274, 276‑277, 279, 283)

17.    Embora não seja obrigada, na determinação do montante das coimas por infracção ao direito comunitário, a tomar em consideração a situação financeira deficitária da empresa em causa, na medida em que o reconhecimento de tal obrigação equivaleria a oferecer uma vantagem concorrencial injustificada às empresas menos adaptadas às condições do mercado, a Comissão pode, no entanto, reduzir o montante da coima devido a graves dificuldades financeiras associadas a várias condenações recentes no pagamento de coimas por infracções ao direito da concorrência, cometidas simultaneamente, considerando deste modo que não é necessário aplicar à referida empresa o montante total da coima para garantir uma dissuasão efectiva.

(cf. n.os 308, 314‑315)