Language of document : ECLI:EU:T:2021:537

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção)

8 de setembro de 2021 (*)

«Função pública — Agentes contratuais — Divulgação de dados pessoais — Pedido de assistência — Indeferimento do pedido — Incompetência do autor do ato lesivo — Ato elaborado e assinado por um escritório de advogados externo — Responsabilidade — Danos morais»

No processo T‑52/19,

AH, representado por N. de Montigny, advogada,

recorrente,

contra

Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Vida e de Trabalho (Eurofound), representada por F. van Boven e M. Jepsen, na qualidade de agentes, assistidos por C. Callanan, solicitor,

recorrida,

que tem por objeto um pedido baseado no artigo 270.o TFUE e destinado, por um lado, à anulação da Decisão de 22 de março de 2018, elaborada e assinada por um escritório de advogados externo, relativa a um pedido de assistência do recorrente a respeito da divulgação dos seus dados pessoais e a um pedido de indemnização e, por outro, à reparação dos danos morais que este alegadamente sofreu por causa dessa decisão e da referida divulgação,

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção),

composto por: H. Kanninen, presidente, N. Półtorak e M. Stancu (relatora), juízes,

secretário: L. Ramette, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 8 de dezembro de 2020,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio e factos posteriores à interposição do recurso

1        O recorrente, AH, é agente contratual na Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Vida e de Trabalho (Eurofound).

2        Em 13 de junho de 2017, o recorrente apresentou um pedido nos termos do artigo 90.o, n.o 1, do Estatuto dos Funcionários da União Europeia (a seguir «Estatuto»), a fim de obter uma reclassificação retroativa no seu grupo de funções. Este pedido foi indeferido pela Eurofound por Decisão de 11 de julho de 2017.

3        Em 8 de setembro de 2017, o recorrente apresentou uma reclamação nos termos do artigo 90.o, n.o 2, do Estatuto contra essa decisão (a seguir «reclamação de 8 de setembro de 2017»), que foi indeferida pela autoridade habilitada a celebrar contratos de trabalho (a seguir «AHCC») da Eurofound em 8 de janeiro de 2018. O recorrente não interpôs nenhum recurso desta última decisão.

 Quanto à descoberta do ficheiro «hrlink»

4        Em 12 de janeiro de 2018, o recorrente descobriu um ficheiro intitulado «hrlink» (a seguir «ficheiro “hrlink”»), acessível ao pessoal da Eurofound num dos servidores desta. Este ficheiro continha vários subficheiros confidenciais relativos ao pessoal da Eurofound, entre os quais figurava um processo relativo à reclamação de 8 de setembro de 2017 (a seguir «processo controvertido»). Nesse processo, figuravam documentos relativos ao tratamento dessa reclamação, entre os quais uma mensagem de correio eletrónico de 9 de setembro de 2017, na qual o [confidencial] (1) e o [confidencial] discutiam, nomeadamente, a possibilidade de instaurar um processo disciplinar ao recorrente tendo em conta as falsas alegações feitas por este último na reclamação de 8 de setembro de 2017.

5        Na sequência dessa descoberta, o recorrente enviou, em 15 de janeiro de 2018, a hiperligação do processo controvertido a vários colegas e pediu‑lhes que verificassem se podiam ter acesso a esse processo. Após ter obtido confirmação da parte deles, o recorrente assinalou esse incidente, no mesmo dia, por mensagem de correio eletrónico, à Autoridade Europeia para a Proteção de Dados (AEPD). Esta última abriu um inquérito a este respeito, registado sob o número [confidencial] (a seguir «primeiro inquérito da AEPD»).

6        Por mensagem de correio eletrónico de 30 de janeiro de 2018, o sindicato [confidencial] escreveu ao diretor‑executivo, assinalando que tinha havido uma divulgação dos dados pessoais relativamente a um dos empregados da Eurofound, que era igualmente membro do comité executivo do referido sindicato no âmbito da Eurofound.

 Quanto ao pedido de 2 de fevereiro de 2018 e à decisão impugnada

7        Em 2 de fevereiro de 2018, o recorrente enviou, por meio do seu advogado, uma mensagem de correio eletrónico ao diretor‑executivo e ao chefe dos recursos humanos então em funções (a seguir «pedido de 2 de fevereiro de 2018») que tinha por objeto, por um lado, um pedido de assistência para que a Eurofound investigasse as graves violações da sua hierarquia descobertas pela leitura do processo controvertido, respeitantes, nomeadamente, à divulgação dos seus dados pessoais e às afirmações formuladas pelo [confidencial] na mensagem de correio eletrónico de 9 de setembro de 2017, e, por outro, um pedido de indemnização com fundamento no artigo 90.o, n.o 1, do Estatuto, tendente a obter o pagamento de um montante de 60 000 euros a título provisório para reparação dos danos sofridos em razão dessas violações.

8        Em 14 de fevereiro de 2018, um escritório de advogados irlandês (a seguir «escritório de advogados externo») acusou a receção do pedido de 2 de fevereiro de 2018 em nome da Eurofound.

9        Por Decisão de 22 de março de 2018 (a seguir «decisão impugnada»), o escritório de advogados externo informou o recorrente de que o seu pedido de indemnização constante do pedido de 2 de fevereiro de 2018 fora indeferido com o fundamento de que não houvera divulgação intencional dos seus dados pessoais e de que, por conseguinte, não lhe era devida nenhuma indemnização. Nessa decisão, o referido escritório precisava igualmente que, reconhecendo que o ficheiro «hrlink» não fora protegido, a Eurofound iria abrir um inquérito interno sobre essa falha de segurança. Para o efeito, convidava o recorrente a responder a certas questões sobre a forma como ele próprio tivera acesso a esse ficheiro.

10      Na sequência da adoção da decisão impugnada, o advogado do recorrente enviou ao escritório de advogados externo duas mensagens de correio eletrónico de 5 de abril e de 9 de maio de 2018, às quais este último respondeu por mensagens de correio eletrónico de 26 de abril e de 1 de junho de 2018. Essas mensagens visavam esclarecer o conteúdo e o alcance desta decisão, nomeadamente o alcance do inquérito mencionado no n.o 9, supra.

11      Em 21 de junho de 2018, o recorrente apresentou uma reclamação nos termos do artigo 90.o, n.o 2, do Estatuto contra a decisão impugnada (a seguir «reclamação de 21 de junho de 2018»), pedindo à Eurofound, a título principal, que anulasse essa decisão e procedesse ao inquérito que ele havia solicitado antes de indeferir o pedido de indemnização apresentado em razão da divulgação dos seus dados pessoais e que demandasse judicialmente os responsáveis por essa divulgação, em conformidade com o artigo 49.o do Regulamento (CE) n.o 45/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de dezembro de 2000, relativo à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais pelas instituições e pelos órgãos comunitários e à livre circulação desses dados (JO 2001, L 8, p. 1), e, a título subsidiário, que lhe atribuísse uma indemnização de 30 000 euros para reparação dos seus danos morais.

12      Por Decisão de 18 de outubro de 2018, o escritório de advogados externo informou o recorrente de que a sua reclamação havia sido indeferida. Esta decisão foi assinada por um dos advogados desse escritório na qualidade de «agente legal da Eurofound».

 Quanto às medidas adotadas pela Eurofound na sequência do pedido de assistência do recorrente e da descoberta da falha de segurança do ficheiro «hrlink»

13      Por duas mensagens de correio eletrónico datadas de 2 de fevereiro de 2018, a Eurofound, por um lado, informou o pessoal da existência de um acesso não protegido ao ficheiro «hrlink» e da adoção de medidas corretivas a este respeito e, por outro, assinalou esta falha de segurança à AEPD. Na sequência desta última mensagem de correio eletrónico, a AEPD abriu um inquérito, registado sob o número [confidencial] (a seguir «segundo inquérito da AEPD»).

14      Em 28 de março de 2018, a encarregada da proteção de dados da Eurofound (a seguir «EPD») elaborou um primeiro relatório sobre a falha de segurança do ficheiro «hrlink».

15      Por mensagem de correio eletrónico de 3 de abril de 2018, a AEPD informou a Eurofound de que, apesar da grave divulgação dos dados pessoais devida a uma acessibilidade não protegida desse ficheiro, as medidas corretivas adotadas até então eram satisfatórias e que, por conseguinte, o seu segundo inquérito ia ser encerrado.

16      Por mensagem de correio eletrónico de 13 de abril de 2018, a EPD pediu ao recorrente que preenchesse um questionário no âmbito do inquérito que estava a realizar, a fim de elaborar um relatório destinado à AEPD e ao diretor‑executivo, relativamente ao acesso não autorizado ao ficheiro «hrlink». O recorrente respondeu‑lhe, no mesmo dia, que se deveria dirigir ao seu advogado, que escreveu à EPD em 20 de abril de 2018, precisando a posição deste último sobre esse inquérito.

17      Por mensagem de correio eletrónico de 24 de maio de 2018, a EPD informou a AEPD das evoluções do inquérito interno sobre o acesso não autorizado ao ficheiro «hrlink». Na sequência dessa mensagem de correio eletrónico, em 14 de dezembro de 2018, a AEPD comunicou novamente à Eurofound a sua intenção de encerrar o seu segundo inquérito.

18      Por mensagem de correio eletrónico de 4 de julho de 2018, a AEPD escreveu ao diretor‑executivo, na sua qualidade de responsável pelo tratamento dos dados pessoais da Eurofound, para o informar da queixa dirigida à AEPD pelo recorrente e perguntou‑lhe se tinha comentários a propósito das alegações do recorrente no âmbito do seu primeiro inquérito. O referido diretor respondeu a essa mensagem de correio eletrónico em 1 de agosto de 2018.

19      Por mensagem de correio eletrónico de 18 de outubro de 2018, a EPD informou a AEPD de que a Eurofound pedira uma peritagem informática a uma sociedade externa relativa à falha de segurança do ficheiro «hrlink» cujo relatório final confirmava que esse ficheiro estava acessível desde, pelo menos, 2014 e que não fora introduzida nenhuma alteração intencional nos parâmetros de segurança deste último a fim de divulgar o processo controvertido.

20      Por mensagem de correio eletrónico de 21 de junho de 2019, o diretor‑executivo escreveu à AEPD, informando‑a dos últimos acontecimentos ocorridos relativamente à reclamação do recorrente e ao recurso pendente no Tribunal Geral no presente processo. Em 3 de julho de 2019, a AEPD respondeu à Eurofound que o seu primeiro inquérito seria suspenso até à decisão, pondo termo à presente instância. Uma mensagem de correio eletrónico semelhante foi enviada ao recorrente em 31 de julho de 2019.

 Tramitação processual e pedidos das partes

21      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 28 de janeiro de 2019, o recorrente interpôs o presente recurso. Por requerimento separado do mesmo dia, o recorrente pediu o benefício do anonimato, em conformidade com o artigo 66.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, que lhe foi concedido em 11 de março de 2019.

22      A Eurofound apresentou a sua contestação em 26 de abril de 2019. Por requerimento separado do mesmo dia, a Eurofound apresentou um pedido de omissão perante o público de certos dados que figuravam na petição, em conformidade com o artigo 66.o do Regulamento de Processo.

23      O recorrente apresentou a réplica em 10 de julho de 2019, que continha igualmente um pedido de medidas de organização do processo. Por requerimento separado da mesma data, pediu a omissão perante o público de certos dados que figuravam na réplica.

24      Em 12 de agosto de 2019, o recorrente apresentou na Secretaria do Tribunal Geral um oferecimento de prova. Por carta de 20 de agosto de 2019, o Tribunal Geral convidou a Eurofound a apresentar as suas observações sobre este oferecimento de prova na tréplica.

25      A Eurofound apresentou a tréplica em 18 de setembro de 2019. Por requerimento separado do mesmo dia, reiterou o seu pedido de omissão de certos dados perante o público para todos os documentos relativos ao presente processo, incluindo a réplica e a tréplica.

26      Em 20 de setembro de 2019, o recorrente pediu, a título principal, em aplicação do artigo 68.o do Regulamento de Processo, que o processo T‑630/19, AH/Eurofound fosse apensado ao presente processo e, a título subsidiário e na hipótese de a apensação não ser concedida, a suspensão da tramitação do processo T‑630/19. A Eurofound apresentou as suas observações sobre esses pedidos em 29 de outubro de 2019.

27      Em 17 de outubro de 2019, o presidente do Tribunal Geral, no interesse de uma boa administração da justiça, por decisão fundamentada e após consulta dos juízes em causa, designou, em aplicação do artigo 27.o, n.o 3, do Regulamento de Processo, um novo juiz relator da Primeira Secção do Tribunal Geral.

28      Em 20 de novembro de 2019, a Secretaria do Tribunal Geral informou as partes de que a fase escrita do processo estava encerrada e de que o presidente da Primeira Secção havia decidido não apensar o presente processo ao processo T‑630/19 nesta fase do processo.

29      Em 2 de dezembro de 2019, o recorrente apresentou um pedido fundamentado, ao abrigo do artigo 106.o, n.o 2, do Regulamento de Processo, para ser ouvido no âmbito da fase oral do processo.

30      Em 13 de janeiro de 2020, o recorrente apresentou um novo oferecimento de prova, sobre o qual a Eurofound apresentou as suas observações em 7 de fevereiro de 2020.

31      Por Decisão de 1 de outubro de 2020, o Tribunal Geral apensou o presente processo ao processo T‑630/19, AH/Eurofound, para efeitos da fase oral do processo.

32      No mesmo dia, o Tribunal Geral deu início à fase oral do processo e decidiu submeter às partes questões para resposta escrita, no âmbito das medidas de organização do processo previstas no artigo 89.o do Regulamento de Processo. As partes responderam a essas questões no prazo fixado.

33      Em 13 de novembro de 2020, a Primeira Secção do Tribunal Geral decidiu, nos termos do artigo 89.o do Regulamento de Processo, submeter novas questões à Eurofound para resposta escrita, às quais esta respondeu no prazo fixado.

34      Em 25 de novembro de 2020, a Eurofound apresentou um oferecimento de prova. Em 30 de novembro de 2020, o Tribunal Geral convidou o recorrente a apresentar as suas observações sobre este oferecimento de prova oralmente na audiência.

35      Em 1 de dezembro de 2020, a Eurofound apresentou um pedido de derrogação do regime linguístico para a fase oral, a fim de se poder exprimir em língua inglesa. Em 3 de dezembro de 2020, o presidente da Primeira Secção do Tribunal Geral decidiu não deferir o pedido da Eurofound de apresentar as suas alegações em língua inglesa na audiência de alegações, não podendo esse pedido de derrogação ser apresentado por um dos órgãos ou organismos da União Europeia, por força do artigo 1.o, n.o 2, alínea f), e do artigo 45.o, n.o 1, alínea c), do Regulamento de Processo.

36      Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às questões orais submetidas pelo Tribunal Geral na audiência de 8 de dezembro de 2020.

37      Na petição, o recorrente conclui pedindo, em substância, que o Tribunal Geral se digne:

–        anular a decisão impugnada;

–        condenar a Eurofound a pagar o montante de 30 000 euros a título de reparação dos danos morais sofridos devido à divulgação dos seus dados pessoais e ao indeferimento do pedido de 2 de fevereiro de 2018;

–        condenar a Eurofound nas despesas.

38      Na contestação, a Eurofound conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        negar provimento ao recurso de anulação e ao pedido de indemnização na íntegra por ser inadmissível e improcedente;

–        condenar o recorrente na totalidade das despesas.

39      Na réplica, o recorrente pede, em substância, que o Tribunal Geral se digne:

–        deferir o seu pedido de apresentação de documentos, solicitando à Eurofound que apresente todos os mandatos conferidos aos seus representantes em todas as fases pré‑contenciosa e contenciosa;

–        anular a decisão impugnada;

–        condenar a Eurofound no pagamento de uma indemnização avaliada em 200 000 euros, acrescida de juros de mora a contar da data da prolação do acórdão à taxa fixada pelo Banco Central Europeu (BCE);

–        condenar a Eurofound nas despesas.

40      Na tréplica, a Eurofound conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        julgar inadmissíveis ou, em todo o caso, improcedentes todos os pedidos de apresentação de documentos formulados na réplica relativos ao mandato dos seus representantes;

–        examinar e decidir unicamente sobre os pedidos apresentados na petição, como pedido na contestação, e indeferir os novos pedidos de indemnização, bem como os correspondentes fundamentos e as provas apresentadas em seu apoio, apresentados pela primeira vez na réplica no que respeita tanto à carta de 1 de agosto de 2018 dirigida à AEPD como aos documentos apresentados nos anexos 9, 10 e 13 da réplica;

–        condenar o recorrente nas despesas.

 Questão de direito

 Quanto ao pedido de anulação

41      Em apoio do pedido de anulação, o recorrente invoca sete fundamentos, relativos, o primeiro, à incompetência do autor do ato lesivo; o segundo, à violação do dever de assistência e ao indeferimento prematuro do seu pedido de indemnização; o terceiro, ao caráter contraditório da posição da Administração, bem como à violação do dever de fundamentação e do direito de ser ouvido; o quarto, à violação do artigo 26.o do Estatuto e das disposições aplicáveis em matéria de direito à proteção dos dados pessoais; o quinto, a um conflito de interesses e à violação dos deveres de objetividade, de imparcialidade e de independência da Administração; o sexto, a um desvio de poder; e o sétimo, à violação do artigo 17.o do Estatuto e à confidencialidade das atividades sindicais.

42      No que respeita à decisão impugnada na parte em que indefere o seu pedido de indemnização, com o seu segundo fundamento, o recorrente alega, nomeadamente, que o indeferimento desse pedido foi prematuro. Ora, segundo jurisprudência constante, a decisão de uma instituição que indefere um pedido de indemnização faz parte integrante do procedimento administrativo prévio que antecede uma ação de indemnização intentada no Tribunal Geral e, consequentemente, o pedido de anulação dessa decisão não pode ser apreciado de maneira autónoma em relação ao pedido de indemnização (v., neste sentido, Acórdão de 6 de maio de 2019, Mauritsch/INEA, T‑271/18, não publicado, EU:T:2019:286, n.o 26 e jurisprudência referida). No caso em apreço, tendo o recorrente apresentado o seu pedido indemnizatório com vista, nomeadamente, a ser indemnizado pelos danos morais que alegadamente sofreu em razão da divulgação dos seus dados pessoais (v. n.o 82, infra), não há que decidir de forma autónoma sobre o pedido de anulação formulado contra o indeferimento deste pedido de indemnização.

 Quanto à admissibilidade do pedido de anulação

43      Sem invocar formalmente a inadmissibilidade do pedido de anulação, a Eurofound alega que este é inadmissível devido à inexistência de um interesse em agir certo, real e atual do recorrente, uma vez que ela não se recusou a realizar um inquérito sobre a divulgação dos seus dados pessoais e sempre colaborou com a AEPD a esse respeito. O recorrente contesta estes argumentos e responde, em substância, que o inquérito levado a cabo pela Eurofound nunca teve por objetivo responder aos pedidos formulados em 2 de fevereiro de 2018, a saber, identificar a causa e as pessoas responsáveis pela divulgação dos seus dados pessoais.

44      Segundo jurisprudência constante, um recurso de anulação interposto por uma pessoa singular ou coletiva só é admissível na medida em que o recorrente tenha interesse em que o ato impugnado seja anulado. Esse interesse pressupõe que o recurso possa, pelo seu resultado, conferir um benefício à parte que o interpôs. Esse benefício pode dizer respeito quer aos interesses patrimoniais quer aos interesses não patrimoniais e às perspetivas de futuro do interessado (v. Despacho de 20 de outubro de 2009, Lebard/Comissão, T‑89/06, não publicado, EU:T:2009:408, n.o 35 e jurisprudência referida).

45      No caso em apreço, o recorrente contesta o indeferimento do seu pedido de assistência na parte em que visava a realização, sob supervisão externa, de um inquérito administrativo sobre a divulgação alegadamente ilegal dos seus dados pessoais a terceiros sem o seu consentimento e sobre a identificação das pessoas responsáveis por essa divulgação. Ora, esta constatação é suficiente para concluir que o presente recurso é suscetível de conferir um benefício ao recorrente, uma vez que a anulação da decisão impugnada poderia levar a Eurofound a proceder a tal inquérito.

46      Resulta do que precede que o pedido de anulação do recorrente deve ser considerado admissível.

 Quanto ao mérito do pedido de anulação

–       Quanto ao oitavo fundamento, relativo à incompetência do autor do ato lesivo

47      Com o seu primeiro fundamento, o recorrente alega que a decisão impugnada e a decisão de indeferimento da reclamação padecem de um vício de incompetência, uma vez que foram adotadas pelo escritório de advogados externo que não pode ser considerado uma autoridade na aceção do Estatuto.

48      A Eurofound conclui pedindo que este fundamento seja julgado inadmissível, uma vez que não foi suscitado no âmbito do procedimento pré‑contencioso e, em todo o caso, improcedente. Em primeiro lugar, a decisão impugnada foi redigida e assinada pelo escritório de advogados externo, na sua qualidade de representante da Eurofound, ao abrigo de instruções desta última. A este respeito, a Eurofound precisa que os poderes da AHCC permaneceram da competência exclusiva do diretor‑executivo ao longo da fase pré‑contenciosa e não foram confiados ao escritório de advogados externo. Em segundo lugar, o direito irlandês prevê que um escritório de advogados externo possa assinar uma decisão tomada por uma autoridade administrativa. Em terceiro lugar, a opção de ser assistida por um escritório de advogados externo foi imposta pelo facto de o próprio recorrente ter pedido a assistência de um advogado. Em quarto lugar, as decisões da AHCC não estão sujeitas a nenhum requisito de forma, uma vez que os próprios pedidos dos funcionários ou agentes não têm de respeitar tais requisitos.

49      Sem que seja necessário questionar‑se sobre a presença em substância, na reclamação de 21 de junho de 2018, de um ato lesivo suscetível de ser associado ao presente fundamento, importa recordar que o fundamento relativo à incompetência do autor do ato lesivo é um fundamento de ordem pública que compete, sendo caso disso, ao Tribunal Geral conhecer oficiosamente (v., neste sentido, Acórdão de 17 de novembro de 2017, Teeäär/BCE, T‑555/16, não publicado, EU:T:2017:817, n.o 36 e jurisprudência referida).

50      Por conseguinte, há que examinar o referido fundamento quanto ao mérito.

51      Importa observar, em primeiro lugar, que o escritório de advogados externo estava habilitado a elaborar e a assinar a decisão impugnada. Em contrapartida, não resulta dos autos submetidos ao Tribunal Geral, contrariamente ao que alega o recorrente, que esse escritório não tenha agido sob as instruções da Eurofound. Com efeito, por um lado, é pacífico que o referido escritório sempre indicou ter agido em nome e por conta da Eurofound. Por outro lado, os elementos contextuais, apresentados pela Eurofound no Tribunal Geral e relativos à sua correspondência com o escritório de advogados externo durante a fase pré‑contenciosa, comprovam que os articulados desse escritório foram acordados com a Eurofound.

52      Em segundo lugar, no que respeita à habilitação assim dada pela Eurofound ao escritório de advogados externo para elaborar e assinar a decisão impugnada, esta alega, em substância, que esse escritório beneficiou de uma delegação de assinatura e que essa delegação era lícita.

53      A este respeito, independentemente da natureza da habilitação de que o escritório de advogados externo beneficiou para elaborar e assinar a decisão impugnada, importa salientar, antes de mais, que o Tribunal de Justiça precisou, no que respeita à delegação de poderes, que uma instituição ou um organismo da União está habilitado a prever um conjunto de medidas de organização e de delegação de poderes em instâncias decisórias da sua esfera, nomeadamente em matéria de gestão do seu próprio pessoal (v., neste sentido, Acórdão de 26 de maio de 2005, Tralli/BCE, C‑301/02 P, EU:C:2005:306, n.os 41 a 43).

54      Em seguida, importa recordar que o artigo 2.o do Estatuto dispõe que «[c]ada instituição fixará as entidades que nela exercerão os poderes conferidos pelo […] Estatuto à entidade competente para proceder a nomeações» e que «[u]ma ou mais instituições podem confiar a uma delas ou a um organismo interinstitucional o exercício da totalidade ou de parte dos poderes conferidos à entidade competente para proceder a nomeações, que não sejam decisões relacionadas com a nomeação, a promoção ou a mutação de funcionários». Assim, a autoridade competente deve ser determinada «na [esfera]» da referida instituição, de modo que esses poderes só possam, em princípio, ser atribuídos a uma ou mais pessoas em função desta. A única exceção autorizada pelo Estatuto diz respeito à hipótese de uma ou mais instituições decidirem confiar a uma delas ou a um organismo interinstitucional os referidos poderes, os quais não se podem jamais alargar às decisões relacionadas com a nomeação, a promoção ou a mutação de funcionários.

55      Além disso, a delegação de assinatura constitui uma medida relativa à organização interna dos serviços da Administração da União e é o meio normal pelo qual esta exerce as suas competências. Daqui decorre que, ao abrigo de uma delegação de assinatura, só agentes e funcionários podem, em princípio, estar habilitados a tomar, em nome e sob o controlo da Administração, medidas de gestão ou de administração claramente definidas (v., neste sentido, Acórdão de 6 de dezembro de 1994, Lisrestal e o./Comissão, T‑450/93, EU:T:1994:290, n.o 34 e jurisprudência referida).

56      Por último, a licitude de uma habilitação como a que está em causa no caso em apreço deve ser apreciada à luz do objeto do procedimento pré‑contencioso previsto nos artigos 90.o e 91.o do Estatuto. Ora, este último consiste em instaurar um diálogo entre a instituição e o seu funcionário ou o seu agente sobre os problemas que possam ter surgido na relação de trabalho e em lhes dar assim a possibilidade de encontrar uma solução amigável para o litígio (v. Acórdão de 12 de março de 2019, TK/Parlamento, T‑446/17, não publicado, EU:T:2019:151, n.o 44 e jurisprudência referida). Daqui resulta que, a fim de manter a abertura de espírito e de diálogo que essa fase necessita, a instituição deve continuar a ser a interlocutora privilegiada do funcionário ou do agente durante todo esse processo.

57      No caso vertente, à luz dos princípios acima recordados, há que considerar que embora a Eurofound estivesse em condições de ser aconselhada pelo escritório de advogados externo no âmbito de um procedimento pré‑contencioso abrangido pelo Estatuto, esta faculdade não podia, contudo, ir ao ponto de lhe permitir habilitar uma entidade privada externa, como o referido escritório, a elaborar e a assinar a decisão impugnada.

58      A este respeito, não se pode deixar de observar que o único interlocutor com o qual o recorrente teve contactos durante toda a fase pré‑contenciosa foi o escritório de advogados externo e não a Eurofound. Assim, o papel preponderante que este escritório desempenhou na fase pré‑contenciosa impediu a instauração de um diálogo sereno entre a Eurofound e o recorrente sobre os problemas que surgiram na relação de trabalho que lhes permitisse encontrar uma solução amigável para o litígio. Esta circunstância foi, aliás, confirmada pela Eurofound na audiência, quando afirmou que a opção de se fazer representar por um escritório de advogados externo havia sido igualmente efetuada tendo em conta a natureza «contenciosa» do pedido de indemnização formulado em 2 de fevereiro de 2018.

59      Em terceiro lugar, importa recordar que o procedimento administrativo se rege por regras e princípios inerentes à atuação das autoridades públicas. Assim, nomeadamente, o princípio da boa administração requer que a repartição das competências e dos poderes de assinatura no âmbito das instituições seja claramente definida e publicada (v., neste sentido, Acórdãos de 17 de novembro de 2017, Teeäär/BCE, T‑555/16, não publicado, EU:T:2017:817, n.o 53, e de 19 de dezembro de 2019, XG/Comissão, T‑504/18, EU:T:2019:883, n.o 87). Com efeito, o respeito do princípio da segurança jurídica, que exige que um ato emanado dos poderes públicos não seja oponível aos cidadãos antes de estes terem a possibilidade de dele tomarem conhecimento, impõe, ainda que nenhuma disposição escrita o preveja expressamente, que as decisões relativas ao exercício dos poderes conferidos pelo Estatuto à autoridade habilitada a celebrar contratos e pelo Regime Aplicável aos Outros Agentes da União Europeia à AHCC sejam objeto de uma medida de publicidade adequada de acordo com as modalidades e as formas que cumpre à Administração determinar (v. Acórdão de 30 de novembro de 2009, Wenig/Comissão, F‑80/08, EU:F:2009:160, n.o 90 e jurisprudência referida).

60      Ora, no caso em apreço, não se pode deixar de observar que, mesmo admitindo que a Eurofound tenha podido habilitar o escritório de advogados externo a elaborar e a assinar a decisão impugnada, nenhum elemento dos autos demonstra que essa habilitação tenha sido claramente definida nem a fortiori publicada.

61      Tendo em conta estas considerações, há que salientar que a decisão impugnada é ilegal na medida em que foi elaborada e assinada por um escritório de advogados externo.

62      Esta conclusão não pode ser posta em causa pelos outros argumentos invocados pela Eurofound.

63      Em primeiro lugar, importa recordar que, no que respeita à determinação da autoridade competente para indeferir um pedido de assistência baseado no artigo 24.o do Estatuto e um pedido de indemnização formulado por um funcionário ao abrigo do artigo 90.o, n.o 1, do Estatuto, a Eurofound não está sujeita ao direito irlandês. Com efeito, resulta de uma leitura conjugada do último considerando e do artigo 17.o do Regulamento (CEE) n.o 1365/75 do Conselho, de 26 de maio de 1975, relativo à criação de uma Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Vida e de Trabalho (JO 1975, L 139, p. 1; EE 15 F1 p. 81), conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 1111/2005 do Conselho, de 24 de junho de 2005 (JO 2005, L 184, p. 1), que, por um lado, a Eurofound é criada no âmbito da União e atua no respeito do direito da União e, por outro, o seu pessoal recrutado após 4 de agosto de 2005 está sujeito ao Estatuto. Assim, mesmo admitindo que um escritório de advogados externo possa, segundo o direito nacional a que pertence, redigir e assinar uma decisão tomada por uma Administração pública, tal regra não pode ser aplicada às decisões adotadas com base no Estatuto.

64      Em segundo lugar, a Eurofound não pode validamente afirmar que, uma vez que o recorrente era assistido por um advogado, estava obrigada a recorrer igualmente aos serviços de um escritório de advogados externo.

65      Basta recordar que, a este respeito, segundo jurisprudência assente, não se pode proibir os interessados de recorrerem, durante a fase pré‑contenciosa, aos serviços de um advogado (v., neste sentido, Acórdão de 5 de novembro de 1991, Parlamento/Virgili‑Schettini, C‑348/90 P, EU:C:1991:413, n.o 5 e jurisprudência referida). Este princípio explica‑se pelo facto de que, enquanto uma instituição, que tem recursos mais amplos do que um funcionário ou um agente, pode beneficiar de um serviço jurídico e se fazer assistir ou aconselhar pelos seus agentes, o funcionário ou o agente, que não têm forçosamente conhecimentos jurídicos, têm o direito de recorrer aos serviços de um consultor jurídico externo. Por outro lado, é forçoso constatar que, em todo o caso, como precisou a Eurofound nas suas respostas às medidas de organização do processo, esta não era obrigada a fazer‑se assistir por um escritório de advogados externo, uma vez que beneficiava de um acordo de nível de serviço com a Direção‑Geral dos Recursos Humanos da Comissão Europeia para o tratamento das reclamações administrativas.

66      Em terceiro lugar, é erradamente que a Eurofound afirma, baseando‑se nomeadamente no Acórdão de 5 de novembro de 1991, Parlamento/Virgili‑Schettini (C‑348/90 P, EU:C:1991:413), que as decisões da AHCC não estão sujeitas a nenhum requisito de forma particular e que, por conseguinte, podem ser elaboradas e assinadas por um escritório de advogados externo.

67      Este acórdão retoma, na realidade, um princípio pretoriano, consagrado pelo Acórdão de 9 de março de 1978, Herpels/Comissão (54/77, EU:C:1978:45), segundo o qual um pedido apresentado nos termos do artigo 90.o do Estatuto pelo funcionário não está sujeito a nenhum requisito de forma e o seu conteúdo deve ser interpretado e compreendido pela Administração com toda a diligência que uma grande organização bem equipada deve aos seus administrados, incluindo aos membros do seu pessoal. Ora, contrariamente ao que alega a Eurofound, a flexibilidade relativa aos requisitos de forma aplica‑se exclusivamente aos pedidos dos funcionários ou dos agentes, os quais podem apresentar esse pedido mesmo sem a intervenção de um advogado, e não à decisão formal que a instituição é chamada a tomar com base nesse pedido, cuja redação e assinatura não podem ser delegadas numa entidade privada externa, como resulta do n.o 57, supra.

68      Resulta do que precede que a decisão impugnada está ferida de um vício de incompetência que, atendendo nomeadamente às considerações que figuram nos n.os 58 e 60, supra, violou as regras de uma boa administração em matéria de gestão do pessoal. Deve ser anulada por esse motivo (v., neste sentido, Acórdão de 17 de novembro de 2017, Teeäär/BCE, T‑555/16, não publicado, EU:T:2017:817, n.o 52 e jurisprudência referida).

69      Todavia, a fim de garantir uma boa administração da justiça, há que examinar igualmente o segundo fundamento invocado pelo recorrente.

–       Quanto ao segundo fundamento, relativo, nomeadamente, à violação do dever de assistência

70      O recorrente alega, em substância, que a Eurofound violou o dever de assistência, ao ter rejeitado prematuramente o pedido de indemnização, sem realizar o inquérito que havia pedido em 2 de fevereiro de 2018. Este inquérito deveria ter tido por objetivo, segundo o recorrente, elucidar a falha de segurança, isto é, identificar as pessoas responsáveis por essa falha, as que consultaram o processo controvertido, bem como a razão pela qual o fizeram, e permitir‑lhe justificar assim os danos cuja indemnização solicitava.

71      A Eurofound contesta estes argumentos. Em primeiro lugar, contrapõe que o indeferimento do pedido de indemnização não foi prematuro, uma vez que ela dispunha, no momento da apresentação do mesmo, dos elementos pertinentes para tomar a sua decisão e que o recorrente deveria ter então retirado o seu pedido de indemnização ou aguardado os resultados do inquérito administrativo por assédio e do inquérito da AEPD e, em seguida, apresentar um pedido de indemnização se o resultado de um ou outro desses inquéritos o tivesse justificado. Em segundo lugar, sustenta não ter a obrigação de realizar um inquérito para permitir ao recorrente apreciar a indemnização a que tem direito nem de lhe fornecer as provas necessárias para fundamentar tal pedido.

72      Antes de mais, importa recordar que resulta da lista puramente ilustrativa dos comportamentos enumerados no artigo 24.o do Estatuto, que visa nomeadamente as ameaças, injúrias, difamações ou atentados contra pessoas ou bens do funcionário por causa da sua qualidade ou das suas funções, que o dever de assistência tem unicamente por objetivo proteger os funcionários e agentes da União contra ataques injustificados, incompatíveis com a ordem e a serenidade do serviço, emanados de terceiros ou de funcionários ou agentes da União. A jurisprudência do Tribunal Geral precisa a este respeito que o dever de assistência só é devido em relação a atos que se suspeite estarem feridos de ilegalidade e que possam ser razoavelmente considerados lesivos dos direitos dos funcionários (v. Acórdão de 9 de setembro de 2016, De Esteban Alonso/Comissão, T‑557/15 P, não publicado, EU:T:2016:456, n.o 41 e jurisprudência referida).

73      Por força do dever de assistência, resultante das disposições do artigo 24.o, primeiro parágrafo, do Estatuto, a Administração deve, perante um incidente incompatível com a ordem e a serenidade do serviço, intervir com toda a energia necessária e responder com a rapidez e o zelo exigidos pelas circunstâncias do caso concreto para apurar os factos e deles retirar, com conhecimento de causa, as consequências adequadas. Para este efeito, basta que o funcionário que reclama a proteção da sua instituição faculte um indício da veracidade dos ataques de que alega ser objeto. Perante tais elementos, compete à instituição em causa tomar as medidas adequadas, nomeadamente instaurando um inquérito para apurar os factos na origem da queixa, em colaboração com o seu autor (v. Acórdão de 9 de setembro de 2016, De Esteban Alonso/Comissão, T‑557/15 P, não publicado, EU:T:2016:456, n.o 40 e jurisprudência referida).

74      É à luz desta jurisprudência que há que examinar se a Eurofound cumpriu o seu dever de assistência na sequência do pedido apresentado pelo recorrente destinado a denunciar uma divulgação dos seus dados pessoais que pode ser considerada um ato que lesa os direitos dos funcionários.

75      Importa observar que, a título preliminar, na sequência do pedido de assistência do recorrente, a Eurofound adotou várias medidas relativas à falha de segurança. Em primeiro lugar, corrigiu essa falha e preveniu os membros do seu pessoal desse incidente; em segundo lugar, assinalou imediatamente a referida falha à AEPD com a qual esteve constantemente em contacto no âmbito do segundo inquérito da AEPD; em terceiro lugar, solicitou apoio por parte das outras agências, nomeadamente a Agência Europeia para o Reforço da Cooperação Judiciária Penal (Eurojust) e a Agência da União Europeia para a Cooperação Policial (Europol), para analisar os aspetos técnicos relacionados com a falha de segurança; em quarto lugar, pediu a realização de uma peritagem informática a uma sociedade externa; em quinto lugar, procedeu a uma revisão global das políticas e dos procedimentos em vigor em matéria de tecnologias da informação, incluindo do ponto de vista da proteção dos dados pessoais.

76      No entanto, o Tribunal Geral salienta que, apesar dos esforços desenvolvidos na adoção dessas medidas destinadas a conter os efeitos da falha de segurança do ficheiro «hrlink», não foi realizado nenhum inquérito administrativo propriamente dito para verificar se o próprio recorrente sofrera efetivamente uma divulgação dos seus dados pessoais na sequência dessa falha, nomeadamente à luz das obrigações decorrentes do Regulamento n.o 45/2001 [atual Regulamento (UE) 2018/1725 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2018, relativo à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais pelas instituições e pelos órgãos e organismos da União e à livre circulação desses dados, e que revoga o Regulamento n.o 45/2001 e a Decisão n.o 1247/2002/CE (JO 2018, L 295, p. 39)].

77      A Eurofound sempre defendeu, tanto na fase pré‑contenciosa como no âmbito do processo no Tribunal Geral, que o recorrente nunca fez prova bastante de que a divulgação dos seus dados pessoais tenha sido intencional nem que tenha sofrido danos decorrentes da referida divulgação. Além disso, uma vez que o erro que deu origem à falha de segurança teve natureza técnica e que a AEPD se mostrou satisfeita com as medidas tomadas pela Eurofound, não era exigível nenhuma outra ação da sua parte.

78      Ora, basta salientar, a este respeito, que a Eurofound afirma erradamente que, para justificar os danos sofridos, essa divulgação deve ser intencional. Com efeito, é importante recordar que, segundo a jurisprudência, a divulgação, mesmo não intencional, de informações pessoais em violação das disposições do Regulamento n.o 45/2001 (atual Regulamento n.o 2018/1725) constitui uma falta suscetível de determinar a responsabilidade da instituição em causa (v., neste sentido, Acórdão de 15 de janeiro de 2019, HJ/EMA, T‑881/16, não publicado, EU:T:2019:5, n.os 54 e 57).

79      Por outro lado, a Eurofound não se pode validamente basear na circunstância de a AEPD ter ficado satisfeita com as medidas tomadas, tendo encerrado apenas o seu segundo inquérito, aberto na sequência de denúncia da Eurofound, e não o primeiro, aberto na sequência de queixa do recorrente, que está suspenso enquanto se aguarda a decisão, pondo termo à presente instância.

80      Tendo em conta o que precede, há que declarar que a Eurofound violou igualmente o seu dever de assistência.

81      Nestas condições, há que julgar procedente o segundo fundamento e anular a decisão impugnada, sem que seja necessário examinar os outros fundamentos invocados pelo recorrente, bem como as provas por ele oferecidas e o pedido de medida de organização do processo formulado por este último na réplica, relativo, nomeadamente, à apresentação do mandato ad litem dos representantes da Eurofound. Por outro lado, quanto ao oferecimento de prova apresentado pela Eurofound em 25 de novembro de 2020 relativamente a uma reclamação nos termos do artigo 90.o, n.o 2, do Estatuto, apresentada pelo recorrente em 13 de novembro de 2020 no âmbito do seu relatório de notação, basta observar que este não diz respeito a nenhum dos fundamentos que o Tribunal Geral considerou útil examinar no contexto da anulação da decisão impugnada, pelo que não há que examiná‑lo. O mesmo se diga dos anexos 9, 10 e 13 da réplica cuja inadmissibilidade é invocada pela Eurofound na tréplica.

 Quanto aos pedidos de indemnização

82      O recorrente pede, na petição, a reparação de alegados danos morais decorrentes, por um lado, da divulgação dos seus dados pessoais e, por outro, da decisão impugnada. Na réplica, alega que a descoberta, através da leitura da contestação, da divulgação à AEPD do conteúdo integral do seu pedido de assistência por factos constitutivos de assédio e o tom acusador e depreciativo utilizado pela Eurofound nesse mesmo articulado agravaram os seus danos morais, os quais devem ser elevados a 200 000 euros.

83      A Eurofound contrapõe que os pedidos de indemnização, conforme formulados tanto na petição como na réplica, são inadmissíveis e, em todo o caso, improcedentes.

 Quanto à admissibilidade do pedido de indemnização formulado na petição

84      A Eurofound sustenta, por um lado, que o objeto da petição não corresponde ao da reclamação de 21 de junho de 2018, o que constitui uma violação da regra da concordância, e, por outro, que o recorrente não respeitou a regra do esgotamento das vias de recurso administrativo disponíveis antes do processo contencioso. A Eurofound alega, nomeadamente, em primeiro lugar, que o recorrente não pediu, na reclamação, a anulação da decisão impugnada na parte em que indeferiu o seu pedido de indemnização e, em segundo lugar, que o seu pedido de indemnização não fazia parte do pedido principal dessa reclamação, antes tendo sido formulado de forma vaga e a título subsidiário. Por outro lado, só no momento da petição é que o recorrente precisou, pela primeira vez, que o pedido de indemnização apresentado em 2 de fevereiro de 2018 dizia respeito aos danos morais decorrentes tanto da divulgação dos seus dados pessoais como dos alegados atos de assédio a seu respeito e que o montante de 60 000 euros se repartia assim em 30 000 euros por cada um desses dois tipos de danos. Além disso, uma vez que a ação de indemnização tem um nexo estreito com o recurso de anulação, deve ser julgada inadmissível pelo facto de o recurso de anulação também dever ser considerado inadmissível ou, em todo o caso, improcedente.

85      O recorrente contesta estes argumentos.

86      Em primeiro lugar, importa salientar que o pedido de indemnização de 21 de junho de 2018 foi formulado em modo quase idêntico ao pedido apresentado pelo recorrente na sua petição (v. n.o 11, supra), o que a Eurofound reconhece, aliás, no n.o 1.2 da contestação.

87      Em seguida, ainda que na reclamação de 21 de junho de 2018 o recorrente não explique por que razão alterou o quantum dos danos relativamente ao pedido de 2 de fevereiro de 2018, esta circunstância não pode afetar a admissibilidade do pedido de indemnização. Com efeito, segundo a jurisprudência, a concordância das acusações deve manter‑se apenas entre a reclamação administrativa e a petição, com vista a evitar, nomeadamente, que o funcionário ou o agente invoque determinadas acusações, ou mesmo todas, apenas na fase contenciosa, passando a ser significativamente reduzida qualquer possibilidade de resolução extrajudicial do litígio (v., neste sentido, Acórdão de 19 de dezembro de 2019, Wehrheim/BCE, T‑100/18, não publicado, EU:T:2019:882, n.o 39 e jurisprudência referida).

88      Por último, importa recordar que esta regra da concordância não deve ter por efeito vincular, de forma rigorosa e definitiva, a eventual fase contenciosa, desde que os pedidos apresentados ao juiz da União não alterem nem a causa de pedir nem o objeto da reclamação (v., neste sentido, Acórdão de 19 de dezembro de 2019, Wehrheim/BCE, T‑100/18, não publicado, EU:T:2019:882, n.o 40 e jurisprudência referida). Ora, não se pode deixar de observar, a este último respeito, que o pedido de 2 de fevereiro de 2018, a reclamação de 21 de junho de 2018 e a petição assentam na mesma causa de pedir, a saber, a reparação dos danos morais.

89      Por conseguinte, uma vez que o recorrente apresenta ao Tribunal Geral pedidos que assentam na mesma causa de pedir que a dos fundamentos de impugnação invocados na reclamação, o pedido de indemnização é admissível.

90      Esta conclusão não pode ser posta em causa pelo argumento segundo o qual a ação de indemnização deve ser julgada improcedente, por estar estreitamente ligada ao recurso de anulação, que deve, ele próprio, ser julgado improcedente. Com efeito, importa recordar, a este respeito, que resulta da análise do primeiro e segundo fundamentos que o recurso é procedente.

91      Tendo em conta o que precede, há que julgar improcedente a exceção de inadmissibilidade deduzida pela Eurofound.

 Quanto à admissibilidade do pedido de indemnização formulado na réplica

92      A Eurofound alega que o pedido de indemnização formulado na réplica deve ser declarado inadmissível, uma vez que, por um lado, se baseia em novos tipos de danos apresentados pela primeira vez na fase da réplica e, por outro, o recorrente não esgotou as vias de recurso administrativas antes da instauração de um processo contencioso para estes danos.

93      O recorrente contesta estes argumentos.

94      Em conformidade com o artigo 76.o, alínea e), do Regulamento de Processo, o demandante deve indicar os seus pedidos na petição. Assim, em princípio, só os pedidos expostos na petição podem ser tomados em consideração e a procedência do recurso deve ser examinada unicamente à luz dos pedidos que figuram na petição. O artigo 84.o, n.o 1, do Regulamento de Processo permite a dedução de novos fundamentos no decurso da instância, desde que tenham origem em elementos de direito e de facto que se tenham revelado durante o processo. Resulta da jurisprudência que esta condição se aplica a fortiori a qualquer alteração dos pedidos e que, na falta de elementos de direito ou de facto revelados durante a fase escrita do processo, só podem ser tidos em consideração os pedidos formulados na petição (v. Despacho de 27 de março de 2017, Frank/Comissão, T‑603/15, não publicado, EU:T:2017:228, n.o 41 e jurisprudência referida). Por outro lado, uma argumentação que altera o próprio fundamento da responsabilidade da União deve ser considerada um fundamento novo que não pode ser invocado no decurso da instância (v. Acórdão de 11 de junho de 2019, TO/AEE, T‑462/17, não publicado, EU:T:2019:397, n.o 236 e jurisprudência referida).

95      No caso em apreço, há que constatar que o novo pedido de indemnização que figura na réplica assenta em novos tipos de danos que alteram o próprio fundamento da responsabilidade da União, nomeadamente os factos geradores dos danos morais invocados pelo recorrente na petição. Com efeito, o recorrente alega que são a divulgação do conteúdo integral do seu processo à AEPD através da carta de 1 de agosto de 2018 e o tom acusador e depreciativo utilizado pela Eurofound na contestação que justificam a majoração do montante reclamado a título dos seus alegados danos morais.

96      Por conseguinte, uma vez que estes novos tipos de danos são consequência de faltas alegadamente cometidas pela Administração, os mesmos devem ser objeto de um novo procedimento pré‑contencioso. A este respeito, importa recordar que, nesse caso, este procedimento se deve iniciar imperativamente por um pedido nos termos do artigo 90.o, n.o 1, do Estatuto, convidando a AHCC a reparar os danos alegadamente sofridos e prosseguir, se for caso disso, com uma reclamação contra a decisão de indeferimento do pedido (v., neste sentido, Despacho de 25 de março de 2020, Lucaccioni/Comissão, T‑507/19, não publicado, EU:T:2020:118, n.os 54 e 55).

97      Por conseguinte, não tendo o recorrente seguido, nem sequer instaurado, o procedimento pré‑contencioso adequado para contestar essas faltas, o pedido de indemnização apresentado na réplica é inadmissível, pelo que apenas continua a ser admissível o pedido formulado na petição.

 Quanto ao mérito do pedido de reparação dos alegados danos morais

98      Em primeiro lugar, no que respeita aos danos morais decorrentes da decisão impugnada, importa salientar que, segundo jurisprudência constante, a anulação de um ato ferido de ilegalidade constitui, em si mesma, a reparação adequada e, em princípio, suficiente de qualquer dano moral que esse ato possa ter causado. Esse não será, contudo, o caso quando o recorrente demonstre ter sofrido um dano moral dissociável da ilegalidade em que se baseia a anulação e que não é suscetível de ser integralmente reparado por essa anulação (v. Acórdão de 30 de janeiro de 2020, BZ/Comissão, T‑336/19, não publicado, EU:T:2020:21, n.o 54 e jurisprudência referida).

99      Ora, no caso em apreço, há que constatar que o recorrente não demonstra em que medida esses danos não são suscetíveis de ser integralmente reparados pela anulação da decisão impugnada na qual os referidos danos têm a sua causa.

100    Nestas condições, o Tribunal Geral considera que esses danos são reparados de forma adequada e suficiente pela anulação da decisão impugnada, pelo que há que julgar improcedente o pedido de indemnização destinado à reparação dos referidos danos.

101    Em segundo lugar, no que respeita aos danos morais decorrentes da divulgação dos dados pessoais do recorrente, importa recordar que incumbirá à Eurofound, em conformidade com o artigo 266.o TFUE, tomar as medidas necessárias à execução do acórdão. Além disso, o primeiro inquérito da AEPD iniciado com base numa queixa do recorrente foi suspenso enquanto se aguarda a decisão, pondo termo à presente instância.

102    Assim, uma vez que o Tribunal Geral não pode julgar antecipadamente nem os pedidos desse inquérito nem as medidas tomadas em execução do acórdão, tendo em conta os quais o recorrente poderá decidir apresentar um novo pedido de indemnização, há que julgar improcedente o pedido de indemnização destinado a obter a reparação dos danos morais decorrentes dessa divulgação por serem prematuros.

103    Tendo em conta tudo o que precede, há que anular a decisão impugnada na parte em que indefere o pedido de assistência do recorrente e negar provimento ao recurso quanto ao restante.

 Quanto às despesas

104    Nos termos do artigo 134.o, n.o 3, do Regulamento de Processo, se as partes obtiverem vencimento parcial, cada uma das partes suporta as suas próprias despesas. No entanto, se tal se afigurar justificado tendo em conta as circunstâncias do caso, o Tribunal Geral pode decidir que, além das suas próprias despesas, uma parte suporte uma fração das despesas da outra parte.

105    No caso em apreço, tendo o recurso sido, no essencial, julgado procedente, far‑se‑á uma justa apreciação da causa decidindo que a Eurofound suportará as suas próprias despesas bem como as despesas apresentadas pelo recorrente.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção)

decide:

1)      É anulada a Decisão de 22 de março de 2018, elaborada e assinada por um escritório de advogados externo, relativa a um pedido de assistência de AH a respeito da divulgação dos seus dados pessoais.

2)      É negado provimento ao recurso quanto ao restante.

3)      A Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Vida e de Trabalho (Eurofound) é condenada a suportar, além das suas próprias despesas, as despesas apresentadas por AH.

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 8 de setembro de 2021.

Assinaturas


*      Língua de processo: francês.


1 Dados pessoais ocultados.