Language of document : ECLI:EU:C:2003:640

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção)

27 de Novembro de 2003 (1)

«Empresas públicas - Transferência para empresas públicas de uma parte de uma taxa portuária paga ao Estado - Concorrência - Abuso de posição dominante - Auxílio de Estado - Encargo de efeito equivalente - Imposição interna - Livre circulação de mercadorias»

Nos processos apensos C-34/01 a C-38/01,

que têm por objecto pedidos dirigidos ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 234.° CE, pela Corte suprema di cassazione (Itália), destinados a obter, nos litígios pendentes neste órgão jurisdicional entre

Enirisorse SpA

e

Ministero delle Finanze,

uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação dos artigos 12.° do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 25.° CE), 13.° do Tratado CE (revogado pelo Tratado de Amesterdão), 30.° do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 28.° CE), 86.° e 90.° do Tratado CE (actuais artigos 82.° CE e 86.° CE), 92.° do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 87.° CE), 93.° do Tratado CE (actual artigo 88.° CE) e 95.° do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 90.° CE),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),

composto por: P. Jann, exercendo funções de presidente da Quinta Secção, C. W. A. Timmermans, A. Rosas, D. A. O. Edward e S. von Bahr (relator), juízes,

advogada-geral: C. Stix-Hackl,


secretário: H. von Holstein, secretário adjunto,

vistas as observações escritas apresentadas:

-    em representação da Enirisorse SpA, por G. Guarino e A. Guarino, avvocati,

-    em representação do Governo italiano, por I. M. Braguglia, na qualidade de agente, assistido por G. Aiello, avvocato dello Stato,

-    em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por V. Di Bucci e L. Pignataro-Nolin, na qualidade de agentes,

visto o relatório para audiência,

ouvidas as alegações da Enirisorse SpA, representada por L. Malvezzi Campeggi, avvocato, do Governo italiano, representado por G. Aiello, e da Comissão, representada por V. Di Bucci e L. Pignataro-Nolin, na audiência de 5 de Março de 2002,

ouvidas as conclusões da advogada-geral apresentadas na audiência de 7 de Novembro de 2002,

profere o presente

Acórdão

1.
    Por cinco despachos de 12 de Julho de 2000, que deram entrada no Tribunal de Justiça em 25 de Janeiro de 2001, a Corte suprema di cassazione submeteu, nos termos do artigo 234.° CE, cinco questões prejudiciais sobre a interpretação dos artigos 12.° do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 25.° CE), 13.° do Tratado CE (revogado pelo Tratado de Amesterdão), 30.° do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 28.° CE), 86.° e 90.° do Tratado CE (actuais artigos 82.° CE e 86.° CE), 92.° do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 87.° CE), 93.° do Tratado CE (actual artigo 88.° CE) e 95.° do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 90.° CE).

2.
    Estas questões foram suscitadas no âmbito de um litígio que opõe a Enirisorse SpA (a seguir «Enirisorse») ao Ministero delle Finanze (Ministério das Finanças), a propósito do pagamento de uma taxa portuária reclamada por este último por ocasião da carga e da descarga de mercadorias no porto de Cagliari, na Sardenha (Itália).

Legislação nacional

3.
    A Lei n.° 961, de 9 de Outubro de 1967 (GURI n.° 272, de 30 de Outubro de 1967), instituiu, nos portos de Ancona, Cagliari, Livorno, La Spezia, Messina e Savona (Itália), as Aziende dei mezzi meccanici e dei magazzini (empresas dos meios técnicos e dos armazéns, a seguir, em conjunto, «Aziende» ou, individualmente, «Azienda»). Esta lei, na redacção dada pela Lei n.° 494, de 10 de Outubro de 1974 (GURI n.° 274, de 21 de Outubro de 1974, p. 7190), estabelece o estatuto das Aziende, o seu âmbito de aplicação e os meios de que dispõem.

4.
    As Aziende são entidades públicas económicas sujeitas ao controlo do Ministero della marina mercantile (Ministério da Marinha Mercante). Por força da Lei n.° 961, têm por função gerir os meios mecânicos de carga e descarga, as áreas de depósito e todos os outros bens móveis e imóveis detidos pelo Estado e afectos ao tráfego das mercadorias. Têm igualmente por função providenciar pela aquisição, manutenção, transformação e melhoria dos bens por elas geridos, bem como desenvolver quaisquer outras actividades relacionadas com as precedentes.

5.
    As Aziende podem ser autorizadas a fornecer outros serviços comerciais respeitantes aos portos, a assumir a gestão dos meios e instalações que não sejam propriedade do Estado, bem como a desenvolverem todas as missões, de que são incumbidas por lei, noutros portos que façam parte do âmbito territorial do porto no qual têm a sua sede.

6.
    Os meios financeiros de que dispõem as Aziende para desempenhar as suas funções compreendem o produto dos bens por elas geridos, incluindo, segundo as observações do Governo italiano, as remunerações auferidas pelas suas actividades comerciais, como a carga e a descarga de mercadorias, bem como o capital proveniente de empréstimos ou de outras operações financeiras.

7.
    Todas as despesas referentes ao funcionamento dos bens de equipamento são suportadas exclusivamente pelas Aziende. Em contrapartida, as despesas de instalação de novos equipamentos estão normalmente a cargo do Ministério da Marinha Mercante, embora, caso o orçamento o permita, as Aziende podem elas próprias assumir essas despesas.

8.
    Em 1974, foi criada uma taxa sobre a carga e a descarga de mercadorias em todos os portos de Itália, por força do Decreto-Lei n.° 47, de 28 de Fevereiro de 1974 (GURI n.° 68, de 13 de Março de 1974, p. 1749, a seguir «Decreto-Lei n.° 47/74»), convertida em lei, após alteração, pela Lei n.° 117, de 16 de Abril de 1974 (GURI n.° 115, de 4 de Maio de 1974, p. 3123). Esta taxa reverte a favor do Tesouro Público. É aplicável às mercadorias transportadas por via marítima e por via aérea.

9.
    O montante desta taxa, que não pode exceder 90 ITL por tonelada métrica de mercadoria, é determinado e alterado em relação a cada porto por decreto do Presidente da República, tendo em conta a natureza das mercadorias e o custo médio de gestão dos serviços.

10.
    Pelo Decreto-Lei n.° 47/74, que procede à revisão das taxas e dos direitos marítimos, o legislador manteve a disposição instituída pela Lei n.° 82, de 9 de Fevereiro de 1963, relativa à revisão das taxas e dos direitos marítimos (GURI n.° 52, de 23 de Fevereiro de 1963), que já previa a aplicação de uma taxa sobre as mercadorias carregadas, descarregadas ou em trânsito nos portos de Génova, Nápoles, Livorno, Civitavecchia, Trieste, Savona e Brindisi (Itália).

11.
    A Lei n.° 355, de 5 de Maio de 1976, relativa à extensão às Aziende dos portos de Ancona, de Cagliari, de Livorno, de La Spezia e de Messina de determinadas vantagens previstas a favor dos organismos portuários (GURI n.° 147, de 5 de Junho de 1976, p. 4382, a seguir «Lei n.° 355/76»), prevê que as mercadorias carregadas e descarregadas nestes portos estão sujeitas à taxa prevista pela Lei n.° 82, de 9 de Fevereiro de 1963 (a seguir «taxa portuária»). Precisa que dois terços do produto desta taxa revertem a favor das Aziende, para desenvolverem as suas missões, e um terço a favor do Estado.

12.
    O artigo 1.° do Decreto do Presidente da República, de 12 de Maio de 1977, relativo à determinação da taxa estabelecida pela Lei n.° 355, de 5 de Maio de 1976 (GURI n.° 270, de 4 de Outubro de 1977, p. 7175), fixa a tabela aplicável para a determinação do montante da taxa portuária. Este varia entre 15 ITL e 90 ITL por tonelada métrica, consoante as mercadorias em causa.

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

13.
    A Enirisorse efectuou, com meios humanos e logísticos próprios, operações de carga e descarga de mercadorias nacionais e estrangeiras, no porto de Cagliari, sem utilizar os serviços da Azienda que operam nesse porto. Tendo recebido do Ministero delle Finanze várias notificações para pagamento da taxa portuária prevista pela Lei n.° 355/76, a Enirisorse recorreu dessas notificações, alegando nomeadamente a ilegalidade do Decreto do Presidente da República de 12 de Maio de 1977 face ao direito comunitário.

14.
    O Tribunale di Cagliari (Itália) negou provimento a estes recursos, pelo que a Enirisorse interpôs recurso para a Corte d'appello di Cagliari (Itália). Tendo sido negado provimento a este recurso por acórdão deste último de 11 de Março de 1998, a Enirisorse interpôs recurso de cassação.

15.
    Na Corte suprema de cassazione, a Enirisorse alegou que a legislação nacional comporta uma distorção das regras da concorrência, na medida em que a taxa portuária é devida mesmo quando o operador não recorra às prestações da Azienda, no caso em análise, a do porto de Cagliari. A legislação é contrária aos artigos 86.° e 90.° do Tratado. A cobrança, por parte das Aziende, de uma parte importante do produto da taxa portuária constitui, por outro lado, um auxílio de Estado na acepção dos artigos 92.° e 93.° do mesmo Tratado.

16.
    A Corte suprema di cassazione indica, nos despachos de reenvio, que o objectivo da legislação em causa é, segundo o juiz da causa, compensar a Administração pelas despesas e custos referentes às prestações públicas respeitantes ao movimento das mercadorias. Segundo este último, não é necessária a efectiva fruição dos serviços de manutenção prestados pela empresa pública, uma vez que o utente retira vantagens de carácter geral das actividades desta.

17.
    O órgão jurisdicional de reenvio interroga-se sobre a compatibilidade da legislação nacional não apenas com as disposições do direito comunitário mencionadas pela Enirisorse, mas igualmente com os artigos 12.°, 13.°, 30.° e 95.° do Tratado.

18.
    É nestas circunstâncias que a Corte suprema di cassazione decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)    A reserva a uma empresa pública - que opera no mercado das operações portuárias de carga e descarga de mercadorias - de uma parte importante do produto de uma imposição (taxa portuária de carga e descarga de mercadorias), cobrada pelo Estado a operadores que não usufruíram de qualquer serviço ou prestação por parte da referida empresa, constitui um direito especial ou exclusivo ou uma medida contrária às normas do Tratado e, em especial, às regras da concorrência, na acepção do artigo 90.°, n.° 1, do Tratado?

2)    Independentemente da questão anterior, a reserva à referida empresa pública de uma importante parte do produto da imposição constitui um abuso de posição dominante resultante de uma medida legislativa estatal e, portanto, contrária às disposições conjugadas dos artigos 86.° e 90.° do Tratado?

3)    A reserva a tal empresa de uma importante percentagem da referida imposição pode ser definida como auxílio de Estado, na acepção do artigo 92.° do Tratado e, portanto, justifica, em caso da sua não notificação à Comissão ou de uma decisão de incompatibilidade do auxílio com o mercado comum tomada por esta última na acepção do artigo 93.°, o exercício dos poderes atribuídos aos tribunais nacionais - segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça - para garantir a não aplicação do auxílio ilegal e/ou incompatível?

4)    A atribuição à referida empresa pública, por via directa, de uma parte importante do produto de uma imposição estatal cobrada para ou por ocasião da carga ou descarga das mercadorias nos portos, sem que ao pagamento corresponda qualquer prestação ou serviço por parte da própria empresa pública, constitui um encargo de efeito equivalente a um direito aduaneiro de importação (proibido pelos artigos 12.° e 13.° do Tratado) ou uma imposição interna sobre os produtos dos outros Estados-Membros superior à que incide sobre os produtos nacionais similares (artigo 95.°) ou um entrave às importações, proibido pelo artigo 30.°?

5)    Caso a regulamentação nacional não seja conforme ao direito comunitário, os aspectos referidos nas questões anteriores, considerados individualmente, dizem respeito à imposição na sua totalidade ou apenas à parte desta que é atribuída à Azienda Mezzi Meccanici?»

19.
    Por despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 23 de Fevereiro de 2001, foi ordenada a apensação dos processos C-34/01 a C-38/01 para efeitos da fase escrita, da fase oral e do acórdão.

Observações preliminares

20.
    Com a quinta questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se a eventual ilegalidade do mecanismo de imposição, examinado à luz das regras mencionadas em cada uma das questões precedentes, afecta apenas uma parte deste mecanismo, a saber, a atribuição dos dois terços do produto da taxa em causa à Azienda, ou a totalidade do mecanismo de imposição, incluindo a atribuição e a cobrança do montante total dessa taxa. Visto que a quinta questão diz, nestes termos, respeito às quatro questões precedentes, não será respondida separadamente, mas, se necessário, no quadro do exame destas últimas.

21.
    Uma vez que a medida em litígio no processo principal se refere à atribuição, pelo Estado, de uma parte do produto de uma taxa a uma empresa, importa examinar, em primeiro lugar, a compatibilidade dessa medida com as regras do Tratado sobre os auxílios de Estado e, consequentemente, começar por responder à terceira questão.

Quanto à terceira questão

22.
    Através da sua terceira questão, lida à luz da quinta questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, fundamentalmente, se a medida pela qual um Estado-Membro atribui a uma empresa pública uma parte importante de uma taxa, como a taxa portuária em causa no processo principal, constitui um auxílio de Estado, na acepção do artigo 92.° do Tratado, e se, na falta de notificação dessa medida à Comissão ou de decisão desta última sobre a compatibilidade do auxílio com o mercado comum, adoptada em conformidade com o artigo 93.° do referido Tratado, este órgão jurisdicional pode exercer os poderes que lhe são atribuídos para garantir que um auxílio ilegal e/ou incompatível com o mercado comum não é aplicado. Caso a medida em causa constitua um auxílio ilegal ou incompatível com o mercado comum, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se a ilegalidade ou a incompatibilidade está limitada à parte da taxa atribuída à empresa pública em causa ou se abrange a cobrança aos utentes da parte correspondente ao montante deste modo atribuído, ou ainda se afecta a totalidade da taxa.

23.
    A Enirisorse e a Comissão sustentam que a atribuição de uma parte importante da taxa portuária à Azienda de Cagliari constitui um auxílio de Estado. Trata-se de uma medida tomada em benefício de uma empresa que afecta as trocas intracomunitárias; o auxílio é concedido através de recursos do Estado; a medida falseia ou ameaça falsear a concorrência, visto que esta Azienda está em concorrência com empresas de outros Estados-Membros, como as companhias de navegação, que pretendem exercer as suas actividades no âmbito de um regime de «automanutenção». Além disso, os concorrentes incluem igualmente as empresas privadas que operam por conta de terceiros. Não tendo sido notificado à Comissão, o auxílio constitui um auxílio ilegal que não pode, no presente caso, ser justificado pela derrogação prevista no artigo 90.°, n.° 2, do Tratado. O juiz nacional está obrigado, portanto, a eliminar o auxílio ilegal.

24.
    O Governo italiano considera, por seu turno, que a medida em causa não afecta o comércio entre os Estados-Membros, tendo em conta o volume limitado de tráfego nos portos em causa, nomeadamente o de Portovesme, na Sardenha (Itália), e que, portanto, não constitui um auxílio de Estado na acepção do artigo 92.°, n.° 1, do Tratado. Este governo salienta, por outro lado, o objectivo socioeconómico da taxa portuária, que é garantir a sobrevivência e a manutenção em funcionamento dos cinco portos em causa. Defende que, se os custos do serviço de manutenção se repercutissem integralmente nos beneficiários reais dos serviços, o preço que daí resultaria seria, tendo em conta os custos fixos elevados e o tráfego marítimo limitado nesses portos, demasiado elevado para os operadores. Por último, mesmo que a referida taxa fosse considerada um auxílio de Estado, o Governo italiano sustenta que deveria ser julgada compatível com o mercado comum, nos termos do artigo 92.°, n.° 3, alínea c), do Tratado, por se tratar de um auxílio destinado a facilitar o desenvolvimento de certas actividades ou regiões económicas na acepção da referida disposição.

25.
    Para responder à questão colocada importa examinar se estão cumpridas as diversas condições relativas ao conceito de auxílio de Estado enunciadas no artigo 92.°, n.° 1, do Tratado.

26.
    Em primeiro lugar, deve tratar-se de uma intervenção do Estado ou através de recursos estatais. No que diz respeito à taxa portuária, esta condição está cumprida, visto que os montantes pagos às Aziende, que representam uma parte importante desta taxa, provêm do orçamento do Estado, sendo, portanto, recursos estatais.

27.
    Em segundo lugar, a intervenção do Estado deve ser susceptível de afectar o comércio entre os Estados-Membros.

28.
    A este respeito, recorde-se que não existe limiar ou percentagem abaixo dos quais se possa considerar que as trocas comerciais entre os Estados-Membros não são afectadas. Com efeito, a importância relativamente fraca de um auxílio ou a dimensão relativamente modesta da empresa beneficiária não impedem a priori a eventualidade de as trocas entre Estados-Membros serem afectadas (v. acórdão de 24 de Julho de 2003, Altmark Trans e Regierungspräsidium Magdeburg, C-280/00, ainda não publicado na Colectânea, n.° 81). A possibilidade de influenciar as trocas é tanto mais provável, nas causas no processo principal, quanto a taxa portuária é atribuída a uma empresa estabelecida num porto e é paga por companhias de navegação, no âmbito da carga e da descarga de mercadorias, independentemente da sua proveniência.

29.
    Em terceiro lugar, o auxílio deve poder ser considerado uma vantagem concedida à empresa beneficiária e, em quarto lugar, essa vantagem deve falsear ou ameaçar falsear a concorrência.

30.
    A este respeito, há que recordar que são considerados auxílios as intervenções que, independentemente da forma que assumam, sejam susceptíveis de favorecer directa ou indirectamente empresas ou devam ser consideradas uma vantagem económica que a empresa beneficiária não teria obtido em condições normais de mercado (acórdão Altmark Trans e Regierungspräsidium Magdeburg, já referido, n.° 84).

31.
    Pelo contrário, na medida em que uma intervenção estatal deva ser considerada uma compensação que representa a contrapartida das prestações efectuadas pelas empresas beneficiárias para cumprir obrigações de serviço público, de forma que estas empresas não beneficiam, na realidade, de uma vantagem financeira e que, portanto, a referida intervenção não tem por efeito colocar essas empresas numa posição concorrencial mais favorável em relação às empresas que lhes fazem concorrência, essa intervenção não cai sob a alçada do artigo 92.°, n.° 1, do Tratado. Contudo, para que num caso concreto tal compensação possa escapar à qualificação de auxílio estatal, deve estar reunido um determinado número de condições (acórdão Altmark Trans e Regierungspräsidium Magdeburg, já referido, n.os 87 e 88).

32.
    Em primeiro lugar, a empresa beneficiária deve efectivamente ser incumbida da execução de obrigações de serviço público e essas obrigações devem estar claramente definidas (acórdão Altmark Trans e Regierungspräsidium Magdeburg, já referido, n.° 89).

33.
    A este respeito, o Tribunal de Justiça já considerou que não resulta da sua jurisprudência que a exploração de qualquer porto comercial constitua a gestão de um serviço de interesse económico geral (v. acórdão de 17 de Julho de 1997, GT-Link, C-242/95, Colect., p. I-4449, n.° 52). Como tal, esta actividade não implica automaticamente a realização de missões de serviço público.

34.
    Ora, não resulta dos autos transmitidos ao Tribunal de Justiça pelo órgão jurisdicional de reenvio que as Aziende tenham sido encarregadas de uma missão de serviço público nem, por maioria de razão, que esta tenha sido claramente definida.

35.
    Em segundo lugar, os parâmetros com base nos quais é calculada a compensação devem ser previamente estabelecidos de maneira objectiva e transparente, a fim de evitar que aquela implique uma vantagem económica susceptível de favorecer a empresa beneficiária em relação a empresas concorrentes (acórdão Altmark Trans e Regierungspräsidium Magdeburg, já referido, n.° 90).

36.
    A este respeito, o Governo italiano indica que a atribuição de uma parte importante da taxa portuária às Aziende, a qual acresce às tarifas por estas aplicadas, é necessária a fim de manter essas tarifas a um nível suportável pelos operadores. Além disso, tal atribuição permite manter em funcionamento os portos em causa.

37.
    No entanto, essas indicações não bastam para responder à condição acima referida. Em especial, não revelam em que consiste precisamente o alegado serviço público nem se são unicamente visadas as operações de carga e de descarga nos portos em causa ou se são igualmente abrangidas prestações como a segurança da atracagem. Além disso, as observações do Governo italiano também não dão precisões sobre os custos dos serviços nem sobre a avaliação da compensação alegadamente necessária.

38.
    Pelo contrário, resulta do despacho de reenvio no processo C-34/01 e das observações apresentadas ao Tribunal de Justiça pela Enirisorse e pela Comissão que o montante do produto da taxa portuária que reverte a favor das Aziende não reflecte as despesas efectivamente realizadas por estas para prestar os seus serviços de carga e de descarga, uma vez que este montante está relacionado com o volume de mercadorias transportadas pelo conjunto dos utentes e tratadas nos portos em causa. O montante atribuído depende assim do grau de actividade no ou nos portos em causa.

39.
    Ora, tal sistema não responde à exigência segundo a qual a compensação não pode ultrapassar aquilo que é necessário para cobrir total ou parcialmente os custos ocasionados pela execução das obrigações de serviço público, tendo em conta as receitas obtidas, assim como um lucro razoável pela execução destas obrigações (v. acórdão Altmark Trans e Regierungspräsidium Magdeburg, já referido, n.° 92).

40.
    Resulta do que antecede que, se uma medida relativa à atribuição por um Estado-Membro de uma parte importante de uma taxa, como a taxa portuária, a uma empresa pública não estiver relacionada com uma missão de serviço público claramente definida e/ou se as outras condições, como precisadas no acórdão Altmark Trans e Regierungspräsidium Magdeburg, já referido, e recordadas nos n.os 32 a 35 do presente acórdão, relativas à intervenção do Estado, não forem respeitadas, essa medida deve ser qualificada de auxílio de Estado na acepção do artigo 92.°, n.° 1, do Tratado, na medida em que afecte as trocas entre Estados-Membros.

41.
    O órgão jurisdicional de reenvio pergunta ainda se, nesse caso, apenas a atribuição de uma parte da taxa portuária à empresa em causa deve ser afastada ou se todo o mecanismo de imposição, incluindo a cobrança aos utentes da parte correspondente ao montante atribuído nestes termos, deve ser declarado incompatível com as exigências do artigo 92.° do Tratado.

42.
    Em conformidade com a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, decorre do efeito directo reconhecido ao n.° 3, último período, do artigo 93.° do Tratado que a natureza imediatamente aplicável da proibição de execução, contida nesse artigo, abrange qualquer auxílio que tenha sido executado sem ser notificado (v. acórdão de 21 de Novembro de 1991, Fédération nationale du commerce extérieur des produits alimentaires e Syndicat national des négociants et transformateurs de saumon, C-354/90, Colect., p. I-5505, n.° 11). Compete aos órgãos jurisdicionais nacionais proteger os direitos dos particulares face a uma eventual violação, por parte das autoridades nacionais, da proibição de pôr em execução os auxílios, retirando daí todas as consequências, em conformidade com a sua ordem jurídica interna, no que se refere tanto à validade dos actos de execução das medidas de auxílio em causa como à restituição dos apoios financeiros concedidos (v., nomeadamente, acórdão de 16 de Dezembro de 1992, Lornoy e o., C-17/91, Colect., p. I-6523, n.° 30).

43.
    Quanto ao conceito de auxílio de Estado, o Tribunal de Justiça decidiu que este abrange não apenas determinadas imposições parafiscais, em função da afectação do produto dessas imposições (v., nomeadamente, acórdão Lornoy e o., já referido, n.° 28), mas igualmente a cobrança de uma contribuição que constitui uma imposição parafiscal (v. acórdão de 27 de Outubro de 1993, Scharbatke, C-72/92, Colect., p. I-5509, n.° 20).

44.
    Resulta igualmente de jurisprudência recente do Tribunal de Justiça que, quando o modo de financiamento do auxílio, através nomeadamente de cotizações obrigatórias, é parte integrante da medida de auxílio, o exame desta última pela Comissão deve necessariamente tomar em consideração o modo de financiamento do auxílio (v. acórdão de 21 de Outubro de 2003, Van Calster e o., C-261/01 e C-262/01, ainda não publicado na Colectânea, n.° 49).

45.
    Donde resulta que não apenas a atribuição de uma parte da taxa portuária à empresa em causa, mas igualmente a cobrança aos utentes da parte correspondente ao montante deste modo atribuído, podem constituir um auxílio de Estado incompatível com o mercado comum e que, na ausência de notificação deste auxílio, compete ao órgão jurisdicional de reenvio tomar todas as medidas necessárias, em conformidade com o direito nacional, a fim de impedir quer a atribuição de uma parte da taxa às empresas beneficiárias quer a sua cobrança.

46.
    Em contrapartida, o carácter eventualmente ilegal da cobrança e da atribuição de uma parte da taxa, a saber, a parte que reverte a favor da Azienda, não afecta o montante restante da taxa pago ao Tesouro.

47.
    Por conseguinte, deve responder-se à terceira questão, lida em conjugação com a quinta questão, que:

-    uma medida pela qual um Estado-Membro atribui a uma empresa pública uma parte importante de uma taxa, como a taxa portuária em causa no processo principal, deve ser qualificada de auxílio de Estado na acepção do artigo 92.°, n.° 1, do Tratado, na medida em que afecte as trocas entre Estados-Membros, quando:

    -    a atribuição da taxa não estiver relacionada com uma missão de serviço público claramente definida; e/ou

    -    o cálculo da compensação alegadamente necessária para realizar a referida missão não tiver sido efectuado com base em parâmetros previamente definidos de maneira objectiva e transparente, a fim de evitar que aquela compensação implique uma vantagem económica susceptível de favorecer a empresa pública em causa em relação a outras empresas concorrentes;

-    não apenas a atribuição de uma parte da taxa portuária à empresa pública mas igualmente a cobrança aos utentes da parte correspondente ao montante deste modo atribuído podem constituir um auxílio de Estado incompatível com o mercado comum. Na falta de notificação desse auxílio, compete ao órgão jurisdicional de reenvio tomar todas as medidas necessárias, em conformidade com o direito nacional, a fim de impedir quer a atribuição de uma parte da taxa às empresas beneficiárias quer a sua cobrança;

-    o carácter eventualmente ilegal da cobrança e da atribuição da taxa portuária só diz respeito à parte do produto da taxa que reverte a favor da empresa pública em causa e não afecta a integralidade dessa taxa.

Quanto às primeira e segunda questões

48.
    Através das suas primeira e segunda questões, que devem ser tratadas em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, fundamentalmente, se a atribuição pelo Estado a uma empresa pública de uma parte importante de uma taxa, como a taxa portuária em causa no processo principal, constitui uma medida, na acepção do artigo 90.°, n.° 1, do Tratado, susceptível de dar lugar a um abuso de posição dominante contrário ao artigo 86.° deste Tratado e que não pode beneficiar da derrogação prevista no artigo 90.°, n.° 2, do referido Tratado.

49.
    O órgão jurisdicional de reenvio interroga-se assim sobre a compatibilidade de um mecanismo de imposição, como o que está em causa no processo principal, não apenas com as regras da concorrência aplicáveis aos auxílios de Estado, que são objecto da terceira questão atrás examinada, mas também com as aplicáveis às empresas, previstas nos artigos 86.° e 90.° do Tratado.

50.
    Embora seja verdade que a circunstância de a atribuição pelo Estado a uma empresa pública de uma parte importante de uma taxa constituir um auxílio de Estado não exclui que essa atribuição possa igualmente dar lugar a um abuso de posição dominante por parte dessa empresa, contrário aos artigos 86.° e 90.° do Tratado, cumpre reconhecer que as únicas imputações formuladas nos processos principais dizem respeito aos efeitos da concorrência derivados da cobrança e da atribuição pelo Estado da taxa portuária.

51.
    Não foi assinalado nenhum outro efeito sobre a concorrência, em especial, não foi invocada qualquer infracção à concorrência resultante de um comportamento da própria empresa pública.

52.
    Nestas condições, não há que responder às primeira e segunda questões, relativas à aplicação das regras da concorrência dos artigos 86.° e 90.° do Tratado.

Quanto à quarta questão

53.
    Através da sua quarta questão, lida em conjugação com a quinta questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se a medida pela qual um Estado-Membro prevê a cobrança de uma taxa, como a taxa portuária em causa no processo principal, e a atribuição a uma empresa pública de uma parte importante do produto da mesma, sem que o montante deste modo atribuído corresponda a um serviço efectivamente prestado pela referida empresa, constitui um encargo de efeito equivalente a um direito aduaneiro à importação ou à exportação contrário ao artigo 12.° do Tratado ou uma imposição interna discriminatória contrária ao artigo 95.° do mesmo Tratado, ou ainda um obstáculo às importações proibido pelo artigo 30.° do referido Tratado, e se a eventual violação do direito comunitário afecta a integralidade da referida taxa.

54.
    Este órgão jurisdicional considera, com efeito, que a cobrança de uma parte importante da taxa portuária sem que o montante assim cobrado corresponda a um serviço efectivamente prestado pela empresa pública beneficiária desse montante pode constituir um obstáculo às importações contrário ao artigo 30.° do Tratado.

55.
    O órgão jurisdicional de reenvio precisa que não ignora que o artigo 30.° do Tratado não se aplica em matéria de imposições parafiscais na medida em que sejam aplicáveis outras disposições deste, a saber, o artigo 12.°, relativo aos encargos de efeito equivalente a um direito aduaneiro, ou o artigo 95.°, relativo às imposições internas. No entanto, sublinha que os acórdãos do Tribunal de Justiça neste domínio dizem respeito a casos em que as imposições parafiscais em causa implicam, pelo menos na prática, uma discriminação entre produtos nacionais e produtos importados, o que não acontece nos processos principais. Este órgão jurisdicional pergunta se, nestas circunstâncias, o artigo 30.° do Tratado é susceptível de aplicação.

56.
    A este respeito, cumpre recordar que, em conformidade com a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o âmbito de aplicação do artigo 30.° do Tratado não abrange o das disposições do Tratado relativas aos encargos de efeito equivalente a direitos aduaneiros [artigos 12.° do Tratado e 16.° do Tratado CE (revogado pelo Tratado de Amesterdão)] nem o das disposições do Tratado relativas às imposições internas discriminatórias (artigo 95.° do Tratado) (v., neste sentido, nomeadamente, acórdãos de 22 de Março de 1977, Iannelli & Volpi, 74/76, Colect., p. 175, n.° 9; de 11 de Março de 1992, Compagnie commerciale de l'Ouest e o., C-78/90 a C-83/90, Colect., p. I-1847, n.° 20; e Lornoy e o., já referido, n.° 14).

57.
    O Tribunal de Justiça precisou que há que verificar, em primeiro lugar, se uma medida como as descritas nos processos que deram origem aos acórdãos, já referidos, Compagnie commerciale de l'Ouest e o. e Lornoy e o. se enquadra no âmbito de aplicação dos artigos 12.° ou 95.° do Tratado e que, só no caso de a resposta ser negativa, há que examinar, em segundo lugar, se essa medida é abrangida pelo disposto no artigo 30.° do Tratado (v. acórdãos, já referidos, Compagnie commerciale de l'Ouest e o., n.° 21, e Lornoy e o., n.° 15).

58.
    Ora, não se deve efectuar uma distinção entre o presente processo e os que foram anteriormente examinados pelo Tribunal de Justiça. Caso se verifique que a taxa portuária se enquadra no âmbito de aplicação dos artigos 12.° ou 95.° do Tratado, são as disposições de um ou de outro destes artigos que se aplicam e não as do artigo 30.° do mesmo Tratado. A eventual circunstância de esta taxa não constituir um entrave proibido pelos referidos artigos 12.° ou 95.° não tem por consequência, contrariamente à hipótese evocada pelo órgão jurisdicional de reenvio, que o referido artigo 30.° se aplique automaticamente à taxa acima referida.

59.
    Recorde-se ainda que, segundo jurisprudência constante, as disposições relativas aos encargos de efeito equivalente e as relativas às imposições internas discriminatórias não são aplicáveis cumulativamente, pelo que uma mesma imposição não pode, no sistema do Tratado, pertencer simultaneamente a essas duas categorias (v., nomeadamente, acórdãos de 23 de Abril de 2002, Nygård, C-234/99, Colect., p. I-3657, n.° 17, e jurisprudência aí referida, e de 19 de Setembro de 2002, Tulliasiamies e Siilin, C-101/00, Colect., p. I-7487, n.° 115).

60.
    No caso em apreço, uma vez que a taxa portuária não é cobrada por ocasião ou em razão da importação e não se destina exclusivamente a financiar actividades que beneficiam os produtos nacionais, o disposto no artigo 12.° do Tratado não lhe é aplicável (v. acórdão Lornoy e o., já referido, n.os 17 e 18). Em contrapartida, na medida em que se aplica a qualquer mercadoria carregada e descarregada no porto em causa, a taxa portuária é susceptível de constituir uma imposição interna na acepção do artigo 95.° do Tratado. Dado que a referida taxa, como resulta dos despachos de reenvio, não implica uma discriminação em relação aos produtos importados, essa taxa, incluindo a sua cobrança e a sua atribuição, não é contrária às disposições do artigo 95.°

61.
    O acórdão de 15 de Dezembro de 1993, Ligur Carni e o. (C-277/91, C-318/91 e C-319/91, Colect., p. I-6621), referido pelo órgão jurisdicional de reenvio, não contradiz o raciocínio precedente, pois no processo que deu origem a esse acórdão o Tribunal de Justiça não foi interrogado sobre a questão de saber se o eventual entrave se enquadrava no âmbito de aplicação dos artigos 12.° ou 95.° do Tratado ou no do artigo 30.° do mesmo Tratado, e não teve necessidade de examinar essa questão. Com efeito, a questão controvertida desse processo dizia respeito à proibição imposta a um importador de carne fresca de assegurar, pelos seus próprios meios, no território de uma comuna, o transporte e a entrega das suas mercadorias, a menos que pagasse a uma empresa local, detentora de uma concessão exclusiva em matéria de manutenção no matadouro comunal, de transporte e de entrega das mercadorias em questão, o montante correspondente aos serviços prestados (v. acórdão Ligur Carni e o., já referido, n.° 33). Assim, os montantes contestados eram directamente pagos a uma empresa e não constituíam, contrariamente aos valores em causa no processo principal, uma taxa paga ao Estado.

62.
    Tendo em conta as considerações precedentes, deve responder-se à quarta questão que uma taxa, como a taxa portuária em causa no processo principal, constitui uma imposição interna, na acepção do artigo 95.° do Tratado, que não se enquadra no âmbito de aplicação das disposições dos artigos 12.° e 30.° do mesmo Tratado. Não se verificando uma discriminação em relação aos produtos provenientes de outros Estados-Membros, a medida pela qual um Estado-Membro prevê a cobrança de uma taxa e a atribuição de uma parte importante do produto da mesma a uma empresa pública, sem que o montante deste modo atribuído corresponda a um serviço por esta efectivamente prestado, não viola as disposições do referido artigo 95.°

63.
    Por conseguinte, não há que responder à quinta questão no âmbito desta quarta questão.

Quanto às despesas

64.
    As despesas efectuadas pelo Governo italiano e pela Comissão, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),

pronunciando-se sobre as questões submetidas pela Corte suprema di cassazione, por despacho de 12 de Julho de 2000, declara:

1)    Uma medida pela qual um Estado-Membro atribui a uma empresa pública uma parte importante de uma taxa, como a taxa portuária em causa no processo principal, deve ser qualificada de auxílio de Estado na acepção do artigo 92.°, n.° 1, do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 87.°, n.° 1, CE), na medida em que afecte as trocas entre Estados-Membros, quando:

    -    a atribuição da taxa não estiver relacionada com uma missão de serviço público claramente definida; e/ou

    -    o cálculo da compensação alegadamente necessária para realizar a referida missão não tiver sido efectuado com base em parâmetros previamente definidos de maneira objectiva e transparente, a fim de evitar que aquela compensação implique uma vantagem económica susceptível de favorecer a empresa pública em causa em relação a outras empresas concorrentes.

    Não apenas a atribuição de uma parte da taxa portuária à empresa pública mas igualmente a cobrança aos utentes da parte correspondente ao montante deste modo atribuído podem constituir um auxílio de Estado incompatível com o mercado comum. Na falta de notificação desse auxílio, compete ao órgão jurisdicional de reenvio tomar todas as medidas necessárias, em conformidade com o direito nacional, a fim de impedir quer a atribuição de uma parte da taxa às empresas beneficiárias quer a sua cobrança.

    O carácter eventualmente ilegal da cobrança e da atribuição da taxa portuária só diz respeito à parte do produto da taxa que reverte a favor da empresa pública em causa e não afecta a integralidade dessa taxa.

2)    Uma taxa, como a taxa portuária em causa no processo principal, constitui uma imposição interna, na acepção do artigo 95.° do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 90.° CE), que não se enquadra no âmbito de aplicação das disposições dos artigos 12.° e 30.° do Tratado CE (que passaram, após alteração, a artigos 25.° CE e 28.° CE). Não se verificando uma discriminação em relação aos produtos provenientes de outros Estados-Membros, a medida pela qual um Estado-Membro prevê a cobrança de uma taxa e a atribuição de uma parte importante do produto da mesma a uma empresa pública, sem que o montante deste modo atribuído corresponda a um serviço por esta efectivamente prestado, não viola as disposições do referido artigo 95.°

Jann
Timmermans
Rosas

        Edward                        von Bahr

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 27 de Novembro de 2003.

O secretário

O presidente

R. Grass

V. Skouris


1: Língua do processo: italiano.