Language of document : ECLI:EU:T:2002:94

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Terceira Secção)

10 de Abril de 2002 (1)

«Acção de indemnização - Admissibilidade - Responsabilidade extracontratual - Provedor de Justiça - Apreciação de uma queixa pelo Provedor de Justiça»

No processo T-209/00,

Frank Lamberts, residente em Linkebeek (Bélgica), representado por É. Boigelot, avocat, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

demandante,

contra

Provedor de Justiça Europeu, representado por J. Sant'Anna, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

demandado,

que tem por objecto um pedido de reparação do prejuízo material e moral alegadamente sofrido pelo demandante devido ao tratamento dado à sua queixa pelo Provedor de Justiça Europeu,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Terceira Secção),

composto por: M. Jaeger, presidente, K. Lenaerts e J. Azizi, juízes,

secretário: J. Plingers, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 6 de Dezembro de 2001,

profere o presente

Acórdão

Enquadramento jurídico

1.
    Nos termos do disposto no segundo parágrafo do artigo 21.° CE, qualquer cidadão da União pode dirigir-se ao Provedor de Justiça instituído nos termos do disposto no artigo 195.° CE.

2.
    O artigo 195.°, n.° 1, CE estabelece:

«O Parlamento Europeu nomeará um Provedor de Justiça, com poderes para receber queixas apresentadas por qualquer cidadão da União ou qualquer pessoa singular ou colectiva com residência ou sede estatutária num Estado-Membro e respeitantes a casos de má administração na actuação das Instituições ou organismos comunitários, com excepção do Tribunal de Justiça e do Tribunal de Primeira Instância no exercício das respectivas funções jurisdicionais.

De acordo com a sua missão, o Provedor de Justiça procederá aos inquéritos que considere justificados, quer por sua própria iniciativa quer com base nas queixas que lhe tenham sido apresentadas, directamente ou por intermédio de um membro do Parlamento Europeu, salvo se os factos invocados forem ou tiverem sido objecto de processo jurisdicional. Sempre que o Provedor de Justiça constate uma situação de má administração, apresentará o assunto à Instituição em causa, que dispõe de um prazo de três meses para lhe apresentar a sua posição. O Provedor de Justiça enviará seguidamente um relatório ao Parlamento Europeu e àquela Instituição. A pessoa que apresentou a queixa será informada do resultado dos inquéritos.

O Provedor de Justiça apresentará anualmente ao Parlamento um relatório sobre os resultados dos inquéritos que tenha efectuado.»

3.
    Em 9 de Março de 1994, o Parlamento, em cumprimento do disposto no artigo 195.°, n.° 4, CE, adoptou a Decisão 94/262/CECA, CE, Euratom, relativa ao estatuto e às condições gerais de exercício das funções de Provedor de Justiça Europeu (JO L 113, p. 15).

4.
    Segundo o artigo 14.° da Decisão 94/262, o Provedor tem competência para adoptar as disposições de execução desta decisão.

5.
    Resulta do relatório anual do Provedor de Justiça relativo ao ano de 1997 (JO 1998, C 380, p. 1) que este último adoptou, em 16 de Outubro de 1997 e nos termos do artigo 14.° da Decisão 94/262, disposições de execução que entraram em vigor em 1 de Janeiro de 1998 (a seguir «disposições de execução»). O texto destas disposições foi publicado em todas as línguas oficiais da União no sítio Internet do Provedor de Justiça.

6.
    O procedimento de exame de uma queixa dirigida ao Provedor é, assim, regulado pelo artigo 195.°, n.° 1, CE, pela Decisão 94/262 e pelas disposições de execução.

7.
    Resulta destes textos legais que, quando é submetida ao Provedor uma queixa relativa a um caso de má administração na actuação de uma instituição ou de um organismo comunitário, o Provedor instaura um inquérito, a menos que, por uma das razões referidas nestas disposições, essa queixa deva ser considerada inadmissível, designadamente quando o Provedor não encontra elementos suficientes para justificar a instauração de um inquérito (artigo 2.°, n.os 4, 7 e 8, da Decisão 94/262, artigos 3.° e 4.°, n.os 1 e 2, das disposições de execução).

8.
    Nos termos do disposto no artigo 2.°, n.° 5, da Decisão 94/262, o «Provedor de Justiça pode aconselhar o queixoso a dirigir-se a outra autoridade» (indicação esta retomada no artigo 3.°, n.° 2, das disposições de execução). Além disso, nos termos do artigo 2.°, n.° 6, da Decisão 94/262, as queixas apresentadas ao Provedor não interrompem os prazos de interposição de recursos judiciais ou administrativos.

9.
    O Provedor informa a pessoa de que emanou a queixa do seguimento que à mesma foi dado (artigo 2.°, n.° 9, da Decisão 94/262 e artigos 3.°, n.° 2, e 4.°, n.os 2 e 3, das disposições de execução).

10.
    Para esclarecer qualquer eventual caso de má administração, o Provedor realiza os inquéritos que considera justificados, por iniciativa própria ou na sequência de queixa (artigo 195.°, n.° 1, primeiro parágrafo, CE e artigo 3.°, n.° 1, da Decisão 94/262).

11.
    Segundo dispõe o artigo 3.°, n.° 1, da Decisão 94/262, o Provedor informa a instituição ou o organismo em causa, «que poderá transmitir-lhe qualquer observação útil». Nos termos do n.° 2 deste artigo, as instituições e organismos comunitários deverão fornecer ao Provedor as informações por este solicitadas. Oartigo 4.°, n.os 3 e 4, das disposições de execução prevê, para esta fase do processo, que o Provedor «envi[e] à instituição em causa uma cópia da queixa, convidando-a apresentar um parecer dentro de um prazo determinado, que, normalmente, não poderá exceder três meses. O convite à instituição em causa poderá indicar aspectos específicos da queixa, ou questões precisas, que o parecer deverá focar. Salvo decisão contrária em casos excepcionais, o Provedor de Justiça envia o parecer da instituição em causa ao cidadão. Este tem oportunidade de apresentar as suas observações ao Provedor de Justiça, dentro de um prazo determinado, que, normalmente, não poderá exceder um mês».

12.
    Após ter procedido à apreciação do parecer da instituição ou do organismo em causa e das eventuais observações apresentadas pelo cidadão em questão, o Provedor poderá decidir arquivar o processo, motivando a sua decisão, ou prosseguir os inquéritos. Informa o cidadão em causa sobre a sua decisão (artigo 4.°, n.° 5, das disposições de execução).

13.
    Quando verifica um caso de má administração na acção de uma instituição ou de um organismo comunitário, o Provedor procura encontrar, «[n]a medida do possível, [...] juntamente com a instituição ou organismo em causa, uma solução susceptível de eliminar [esse] caso[...] de má administração e de dar satisfação à queixa apresentada» (artigo 3.°, n.° 5, da Decisão 94/262).

14.
    O artigo 6.°, n.° 1, das disposições de execução estabelece a este propósito, sob a epígrafe «Soluções amigáveis», que o Provedor «cooperará, tanto quanto possível, com a instituição em causa no sentido de alcançar uma solução amigável para eliminar o referido caso e dar satisfação ao cidadão». Se essa cooperação tiver êxito, o Provedor de Justiça dará o caso por encerrado, motivando a sua decisão e informando da mesma o cidadão e a instituição em causa. Em contrapartida, nos termos do n.° 3 desta disposição, «[q]uando o Provedor de Justiça considere não ser possível alcançar uma solução amigável, ou que a procura de uma solução amigável não foi bem sucedida, poderá, ou encerrar o caso, motivando a sua decisão, a qual poderá incluir uma observação crítica, ou elaborar um relatório de que conste um projecto de recomendações».

15.
    No que respeita à possibilidade de formular uma «observação crítica» na acepção desta última disposição, o artigo 7.°, n.° 1, das disposições de execução dispõe que o Provedor faz uma observação crítica, caso considere «que já não é possível à instituição ou ao organismo em causa eliminar o caso de má administração» e «que o caso de má administração não tem implicações gerais».

Matéria de facto subjacente ao litígio

16.
    Tendo trabalhado, desde 1991, na Comissão das Comunidades Europeias, sucessivamente na qualidade de perito nacional destacado, agente temporário e agente auxiliar, o demandante apresentou a sua candidatura num concurso interno de titularização de agentes temporários da categoria A. Por carta de 23 de Marçode 1998, foi informado que tinha obtido aprovação nas provas escritas e foi convidado a apresentar-se à prova oral em 27 de Abril de 1998. Esta carta continha o seguinte aviso:

«A organização das provas não permite alterar o horário que lhe foi indicado».

17.
    Em 2 de Abril de 1998, o demandante teve um acidente que exigiu um tratamento medicamentoso importante. Ficou a seguir em situação de incapacidade para o trabalho até 26 de Abril de 1998 inclusive.

18.
    Na sequência da prova oral de 27 de Abril de 1998, o demandante foi informado, por carta de 15 de Maio de 1998, que não tinha obtido o número de pontos mínimos requeridos nas provas e que não tinha, por este motivo, sido incluído na lista dos aprovados.

19.
    Em 25 de Maio de 1998, o demandante pediu ao presidente do júri de concurso a reapreciação do seu caso, invocando o seu acidente e o facto de ter passado a prova oral sob a influência de medicamentos que podiam causar fadiga e reduzir a sua capacidade de concentração. Sublinhou que não tinha pedido o adiamento da prova oral devido à cláusula, citada supra no n.° 16, constante da convocatória para a prova oral.

20.
    Por carta de 10 de Junho de 1998, a Comissão confirmou o resultado do concurso do demandante. Explicou que este podia ter exposto o problema com que se defrontava, quer contactando o serviço dos concursos «quando recomeçou a trabalhar em 14 de Abril de 1998», quer submetendo o problema aos membros do júri no início da prova oral, o que lhes teria permitido tomar as medidas necessárias, como por exemplo, adiar a prova oral. Afirmava, no entanto, que, como o candidato se tinha apresentado à prova oral e tinha sido reprovado, não podia, de modo nenhum, apresentar-se uma segunda vez.

21.
    Em 23 de Junho de 1998, o demandante escreveu de novo ao presidente do júri. Sublinhou que, ao contrário do que tinha sido indicado por este na carta de 10 de Junho de 1998, não tinha recomeçado a trabalhar em 14 de Abril de 1998 mas só em 27 de Abril de 1998, data da prova oral. Afirmou que foi só no decurso da prova oral que se deu conta dos efeitos dos medicamentos e que não teria podido, portanto, solicitar a atenção do júri para esse facto antes do início da prova oral. Enviou, para o comprovar, um atestado médico, do qual decorre que, devido aos medicamentos receitados durante o período de 8 de Abril a 8 de Maio de 1998, o «paciente pod[ia] sofrer de fadiga anormal inerente ao acidente traumático, bem como ao stress resultante da exigência do tratamento».

22.
    Na mesma data, em 23 de Junho de 1998, o demandante apresentou, em língua inglesa, uma queixa ao Provedor contra a decisão de 10 de Junho de 1998, que confirmara a decisão do júri do concurso de 15 de Maio de 1998.

23.
    Por carta de 22 de Julho de 1998, o Provedor comunicou ao demandante que a sua queixa seria apreciada e que tinha sido solicitado ao presidente da Comissão que apresentasse um parecer sobre a queixa até 31 de Outubro de 1998.

24.
    Por carta dirigida ao demandante em 29 de Julho de 1998, a Comissão confirmou os termos da sua correspondência de 10 de Junho de 1998, já referida. A Comissão indicava designadamente nessa carta que a data em que o demandante tinha recomeçado a trabalhar não alterava a sua posição.

25.
    Por fax de 29 de Outubro de 1998, o Provedor enviou ao demandante um parecer da Comissão, em língua francesa, sem data, sobre a queixa. Neste parecer, a Comissão reiterava, no essencial, as posições já evocadas nas já referidas cartas de 10 de Junho e de 29 de Julho de 1998. A Comissão juntava igualmente, em anexo, uma cópia de um anúncio de concurso interno que não correspondia ao concurso em que o demandante tinha participado.

26.
    Em 17 de Novembro de 1998, o Provedor transmitiu ao demandante a tradução inglesa deste parecer da Comissão, enviada por esta ao Provedor em 9 de Novembro de 1998. Esta versão do parecer tinha, em anexo, o anúncio do concurso em que o demandante tinha participado.

27.
    Em 2 de Dezembro de 1998, o demandante comunicou ao Provedor as suas observações sobre o parecer da Comissão.

28.
    Em 21 de Outubro de 1999, o Provedor comunicou ao demandante a sua decisão sobre a queixa por ele apresentada. Nessa decisão, o Provedor refere que o inquérito efectuado tinha mostrado que, na prática, a Comissão estava disposta a tomar em consideração circunstâncias excepcionais susceptíveis de impedir um candidato de se apresentar na data indicada numa convocatória para provas orais. Acrescentava que, no interesse de uma boa administração, a Comissão devia incluir essa cláusula na convocatória para a prova oral, de modo a informar os candidatos desta possibilidade.

29.
    Porém, a respeito do facto de, no presente caso, a instituição ter recusado que o demandante se apresentasse segunda vez à prova oral, o Provedor afirmava designadamente que um concurso «deve ser organizado no respeito do princípio da igualdade de tratamento dos candidatos. O desrespeito deste princípio pode levar à anulação de um concurso. Isso poderia dar causa a despesas financeiras e administrativas consideráveis para a administração. Resulta do parecer da Comissão que esta considerou que não podia autorizar um candidato a apresentar-se segunda vez à prova oral. O Provedor salienta que nenhum elemento constante do processo permite pensar que a decisão da Comissão de não autorizar o candidato a apresentar-se de novo à prova oral foi tomada em violação de uma qualquer regra ou princípio vinculativo para a Comissão» (pontos 2.2 e 2.3. da decisão do Provedor). Por estes motivos, o Provedor entendeu que, no presente caso, «não tinha havido má administração».

30.
    Em conclusão, o Provedor fez uma «observação crítica» à prática administrativa da Comissão, em geral. Nesta observação crítica, reiterou a sua posição, segundo a qual, no interesse de uma boa administração, a Comissão devia, no futuro, incluir de um modo geral, nas suas convocatórias para a prova oral, uma cláusula específica informando os candidatos que a data indicada podia ser modificada em circunstâncias excepcionais. Quanto à queixa do demandante, concluiu, porém, que como «este aspecto do caso diz respeito a processos respeitantes a factos específicos pertencentes ao passado, não se justifica a procura de uma solução amigável». Por conseguinte, arquivou o processo.

31.
    Por carta de 9 de Novembro de 1999, o demandante dirigiu-se ao membro da Comissão responsável pela Direcção-Geral «Pessoal e administração», solicitando-lhe que reconsiderasse o seu caso. Este membro da Comissão respondeu-lhe, por carta de 15 de Dezembro de 1999, que, a fim de assegurar um tratamento igual dos candidatos às provas, não podia permitir-lhe que se apresentasse de novo à prova oral e que não eram possíveis outras soluções amigáveis.

32.
    Por carta de 17 de Dezembro de 1999, o demandante solicitou ao Provedor explicações a respeito da conclusão deste quanto às consequências da observação crítica para o seu próprio caso. Sugeriu-lhe ainda que procurasse, com a Comissão, uma solução para a sua situação que não teria necessariamente que consistir na autorização para se apresentar segunda vez à prova oral.

33.
    Numa carta de 4 de Fevereiro de 2000, o Provedor explicou ao demandante o objectivo da observação crítica. Recordou, por outro lado, a posição que já tinha expresso na sua decisão de 21 de Outubro de 1999 e informou o demandante de que a Comissão tinha tomado medidas no sentido indicado na sua observação crítica.

34.
    Por carta de 3 de Março de 2000, o mandatário do demandante dirigiu-se ao Provedor, criticando a posição deste, designadamente à luz do princípio da igualdade de tratamento. Reiterou o pedido do demandante de procura de uma solução amigável com a Comissão.

35.
    Em 31 de Março de 2000, o Provedor informou o demandante que tinha transmitido a carta deste de 3 de Março de 2000 ao presidente da Comissão, convidando este a comunicar-lhe as suas observações até 30 de Abril de 2000.

36.
    Em 16 de Junho de 2000, o Provedor transmitiu ao demandante a resposta da Comissão, sem data, à carta deste de 3 de Março de 2000. Nesta carta, a Comissão confirmou a sua posição anterior e sublinhou, mais uma vez, que não podia antever nenhuma solução amigável. Em consequência, o Provedor arquivou o processo.

Tramitação processual e pedidos das partes

37.
    Por petição que deu entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 9 de Agosto de 2000, o demandante intentou a presente acção contra o Provedor e o Parlamento.

38.
    Por requerimentos separados, que deram entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância, respectivamente, em 13 e 16 de Outubro de 2000, o Provedor e o Parlamento suscitaram, cada um deles, uma questão prévia de admissibilidade ao abrigo do artigo 114.° do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância.

39.
    Por despacho de 22 de Fevereiro de 2001, o Tribunal de Primeira Instância (Terceira Secção) julgou inadmissível a acção contra o Parlamento Europeu (Lamberts/Provedor de Justiça e Parlamento, T-209/00, Colect., p. II-765).

40.
    Por despacho da mesma data, o Tribunal (Terceira Secção) relegou para final a decisão sobre a inadmissibilidade invocada pelo Provedor.

41.
    Com base no relatório do juiz-relator, o Tribunal de Primeira Instância (Terceira Secção) decidiu dar início à fase oral do processo.

42.
    Foram ouvidas as alegações das partes e as respostas destas às perguntas do Tribunal na audiência de 6 de Dezembro de 2001.

43.
    O demandante conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    condenar o Provedor de Justiça a pagar-lhe 2 468 787 euros, a título de indemnização por danos materiais, e 124 000 euros, a título de indemnização por danos morais, acrescidos dos juros legais até integral pagamento;

-    a título subsidiário, condenar o Provedor de Justiça a pagar-lhe os montantes de 1 234 394 euros, a título de reparação pelos danos materiais, e de 124 000 euros, a título de reparação pelos danos morais, acrescidos dos juros legais até integral pagamento;

-    condenar o Provedor de Justiça nas despesas.

44.
    O Provedor conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    a título principal, julgar o pedido manifestamente inadmissível;

-    a título subsidiário, julgar o pedido improcedente;

-    decidir sobre as despesas nos termos legais.

Quanto à admissibilidade

Argumentos das partes

45.
    Referindo-se ao despacho do Tribunal de Primeira Instância de 3 de Julho de 1997, Smanor e o./Comissão (T-201/96, Colect., p. II-1081, n.os 29 a 31), o Provedor alega que dispõe de um largo poder de apreciação quanto aos factos e às medidas a tomar na sequência dos seus inquéritos e que não está obrigado a abrir um inquérito, a formular recomendações, a procurar soluções amigáveis ou a enviar relatórios ao Parlamento. De onde deduz que a sua opção por uma medida na sequência de um inquérito não é susceptível de dar origem a responsabilidade extracontratual da Comunidade. O único comportamento que poderia ser contestado como causa de um eventual prejuízo seria o da instituição à qual é atribuído um caso de má administração.

46.
    Invocando os despachos do Tribunal de Justiça de 4 de Outubro de 1991, Bosman/Comissão (C-117/91, Colect., p. I-4837, n.° 20) e do Tribunal de Primeira Instância de 10 de Dezembro de 1996, Söktas/Comissão (T-75/96, Colect., p. II-1689), o Provedor afirma ainda que uma acção de indemnização para ressarcimento de um dano resultante de uma alegada ilegalidade de um acto de uma instituição é inadmissível quando esse acto não produz efeitos jurídicos. Ora, salienta o Provedor, no seu despacho de 22 de Maio de 2000, Associazione delle Cantine Sociali Venete/Provedor de Justiça e Parlamento, T-103/99, Colect., p. II-4165, n.° 50), o Tribunal de Primeira Instância declarou que os diferentes actos que o Provedor pode adoptar em conclusão dos seus inquéritos não produzem quaisquer efeitos jurídicos em relação ao queixoso ou a terceiros, mesmo quando se verifica um caso de má administração na acção de uma instituição.

47.
    O demandante julga esta argumentação infundada.

Apreciação do Tribunal

48.
    Importa observar liminarmente que a presente acção é dirigida contra o Provedor e não contra a Comunidade, única entidade dotada de personalidade jurídica. No entanto, segundo jurisprudência constante, não se pode daí deduzir que o facto de ter intentado uma acção directamente contra um organismo comunitário implica a inadmissibilidade desta. Com efeito, tal acção deve ser considerada intentada contra a Comunidade representada por esse organismo (acórdão do Tribunal de Justiça de 9 de Novembro de 1989, Briantex e Di Domenico/Comissão, 353/88, Colect., p. 3623, n.° 7).

49.
    Convém igualmente ter presente que, nos termos do disposto nos artigos 235.° CE e 288.°, segundo parágrafo, CE, e na Decisão 88/591/CECA, CEE, Euratom, do Conselho, de 24 de Outubro de 1988, que institui um Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias (JO L 319, p. 1), na redacção mais recente que lhe foi dada pela Decisão 1999/291/CE, CECA, Euratom do Conselho, de 26 de Abril de 1999 (JO L 114, p. 52), este Tribunal é competente para conhecer dospedidos de reparação de danos causados por instituições da Comunidade. O Tribunal de Justiça já declarou que o termo «instituição», usado no segundo parágrafo do artigo 288.° CE, não deve ser entendido no sentido de que apenas contempla as instituições da Comunidade enumeradas no artigo 7.° CE. Esta noção abrange igualmente, para efeitos do sistema de responsabilidade extracontratual estabelecido pelo Tratado, todos os outros organismos comunitários instituídos pelo Tratado e destinados a contribuir para a realização dos objectivos da Comunidade. Por conseguinte, os actos praticados por estes organismos no exercício das competências que lhes foram atribuídas pelo direito comunitário são imputáveis à Comunidade, nos termos dos princípios gerais comuns aos Estados-Membros a que se refere o artigo 288.°, segundo parágrafo, CE (v., neste sentido, o acórdão do Tribunal de Justiça de 2 de Dezembro de 1992, SGEEM e Etroy/BEI, C-370/89, Colect., p. I-6211, n.os 12 a 16).

50.
    No que respeita ao Provedor, verifica-se que este organismo foi instituído pelo Tratado que lhe conferiu as competências enumeradas no artigo 195.°, n.° 1, CE. O direito dos cidadãos se dirigirem ao Provedor é um dos elementos constitutivos da cidadania da União, tal como esta se encontra prevista na segunda parte do Tratado CE.

51.
    Acresce que, pela presente acção, o demandante procura obter uma indemnização por danos alegadamente sofridos devido a uma negligência cometida pelo Provedor no exercício das funções que lhe são cometidas pelo Tratado.

52.
    O Tribunal de Primeira Instância tem, portanto, competência para se pronunciar sobre um pedido de indemnização contra o Provedor de Justiça.

53.
    Esta conclusão não é posta em causa pelos argumentos avançados pelo Provedor. Com efeito, o Provedor não tem razão quando procura, no fundo, estabelecer um paralelo com a jurisprudência segundo a qual uma acção de indemnização, fundada na responsabilidade decorrente de uma omissão da Comissão de instaurar um processo por incumprimento nos termos do artigo 226.° CE, é inadmissível, porque esta instituição não está, de qualquer modo, obrigada a instaurar esse processo (despacho do Tribunal de Justiça de 23 de Maio de 1990, Asia Motor France/Comissão, C-72/90, Colect., p. I-2181, n.° 13, e despacho Smanor e o./Comissão, já referido supra, n.° 30).

54.
    Com efeito, importa ter presente que o papel que o Tratado e a Decisão 94/262 atribuíram ao Provedor difere, pelo menos em parte, do papel conferido à Comissão no âmbito da acção por incumprimento ao abrigo do artigo 226.° CE.

55.
    Recorde-se que, no quadro da acção por incumprimento, a Comissão exerce as competências que lhe foram conferidas pelo artigo 211.°, primeiro travessão, CE, em nome do interesse geral comunitário, a fim de zelar pela aplicação do direito comunitário (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de Justiça de 4 de Abril de 1974, Comissão/França, 167/73, Colect., p. 187, n.° 15, e de 29 de Setembro de1998, Comissão/Alemanha, C-191/95, Colect., p. I-5449, n.° 35). Além disso, neste contexto, compete a esta instituição decidir da conveniência de instaurar uma acção por incumprimento (acórdão Comissão/Alemanha, já referido, n.° 37).

56.
    Em contrapartida, no que respeita ao tratamento das queixas pelo Provedor, há que ter presente que o Tratado confere a qualquer cidadão, por um lado, o direito subjectivo de apresentar ao Provedor queixas relativas a casos de má administração das instituições ou dos organismos comunitários, salvo contra o Tribunal de Justiça e o Tribunal de Primeira Instância no exercício das suas funções jurisdicionais, e, por outro, o direito de ser informado do resultado dos inquéritos conduzidos a esse respeito pelo Provedor, nas condições fixadas pela Decisão 94/262 e pelas disposições de execução.

57.
    A Decisão 94/262 confiou ao Provedor a tarefa, não apenas de identificar e procurar eliminar os casos de má administração em nome do interesse geral, mas igualmente a de procurar, na medida do possível, uma solução conforme ao interesse particular do cidadão em causa. É certo que o Provedor dispõe, como ele próprio sublinha, de uma larga margem na apreciação do mérito das queixas e do seguimento a dar-lhes e que não está sujeito a nenhuma obrigação de resultado. Ainda que a fiscalização pelo juiz comunitário tenha, por conseguinte, que ser limitada, nem por isso se pode excluir a hipótese de que, em circunstâncias totalmente excepcionais, um cidadão possa demonstrar que o Provedor cometeu uma falta manifesta no exercício das suas funções, susceptível de causar um prejuízo a esse cidadão.

58.
    Em segundo lugar, a argumentação do Provedor a respeito do carácter não coercitivo dos actos que pode adoptar em conclusão dos seus inquéritos também não pode ser seguida. Com efeito, recorde-se, a acção de indemnização foi instituída pelo Tratado como uma via processual autónoma, com uma função particular no quadro do sistema processual e está subordinada a condições de exercício concebidas em atenção ao seu objecto específico (acórdão do Tribunal de Justiça de 28 de Abril de 1971, Lütticke/Comissão, 4/69, Colect., p. 111, n.° 6, e despacho de 21 de Junho de 1993, Van Parijs e o./Conselho e Comissão, C-257/93, Colect., p. I-3335, n.° 14). Enquanto o recurso de anulação e a acção por omissão se destinam a obter condenação da ilegalidade de um acto juridicamente vinculativo ou da omissão deste, a acção de indemnização tem como objecto a reparação de um prejuízo decorrente de um acto, quer este seja juridicamente vinculativo quer não, ou de um comportamento, imputável a uma instituição ou a um organismo comunitário (v., neste sentido, os acórdãos do Tribunal de Justiça de 10 de Julho de 1985, CMC/Comissão, 118/83, Recueil, p. 2325, n.os 29 a 31, e de 15 de Setembro de 1994, KYDEP/Conselho e Comissão, C-146/91, Colect., p. I-4199, n.° 26; acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 26 de Outubro de 1995, Geotronics/Comissão, T-185/94, Colect., p. II-2795, n.° 39, e de 15 de Junho de 1999, Ismeri Europa/Tribunal de Contas, T-277/97, Colect., p. II-1825, designadamente n.° 61, confirmado por acórdão do Tribunal de Justiça proferidosobre recurso, de 10 de Julho de 2001, Ismeri Europa/Tribunal de Contas, C-315/99 P, Colect., p. I-5281).

59.
    No presente caso, o demandante acusa o Provedor de um comportamento culposo no tratamento da sua queixa. Ora, não se pode excluir a hipótese de esse comportamento ter infringido o direito, conferido pelo Tratado e pela Decisão 94/262 aos cidadãos, a que o Provedor procure uma solução extrajudicial para um caso de má administração que os afecte e lhes possa causar prejuízo.

60.
    Resulta de quanto precede que a presente acção é admissível.

Quanto ao mérito

61.
    O demandante imputa ao Provedor várias faltas de serviço no quadro do tratamento da sua queixa. Por um lado, pede a reparação de um dano material correspondente à remuneração de que teria beneficiado enquanto funcionário do grau A 4, até à idade da reforma, acrescida dos benefícios sociais ligados ao Estatuto dos Funcionários das Comunidades Europeias (a seguir «estatuto»), e tomando em consideração a progressão na carreira e uma promoção de que teria provavelmente beneficiado no quadro de uma carreira normal. A título subsidiário, pede o pagamento de metade desse montante, caso o Tribunal entenda que as suas possibilidades de titularização eram incertas. Por outro lado, o demandante pede reparação dos danos morais alegadamente sofridos. Explica que, desde que foi reprovado no concurso de titularização, se encontra numa situação pessoal e profissional desastrosa. O Provedor teria, devido às faltas cometidas no quadro do tratamento da sua queixa, prolongado a sua situação de incerteza e inquietação quanto à evolução da sua carreira e quanto à possibilidade de ser restituído nos seus direitos. Os efeitos ofensivos e destruidores das faltas de serviço cometidas pelo Provedor justificariam, segundo o demandante, a atribuição de um subsídio de 124 000 euros por danos morais.

62.
    O Tribunal salienta que decorre do artigo 288.° CE que a responsabilidade da Comunidade pressupõe que o demandante prove a ilegalidade do comportamento imputado ao organismo em causa, a realidade do prejuízo e a existência de um nexo de causalidade entre este comportamento e o prejuízo alegado (acórdãos do Tribunal de Justiça de 17 de Dezembro de 1981, Ludwigshafener Walzmühle e o./Conselho e Comissão, 197/80 a 200/80, 243/80, 245/80 e 247/80, Recueil, p. 3211, n.° 5, e do Tribunal de Primeira Instância, de 11 de Julho de 1996, Urretavizcaya/Comissão, T-587/93, ColectFP, p. I-A-349 e II-1027, n.° 77).

63.
    Importa começar por verificar se o Provedor cometeu as faltas de serviço alegadas pelo demandante.

64.
    Em primeiro lugar, o demandante acusa o Provedor de não o ter aconselhado, logo que apresentou a sua queixa e antes da expiração dos prazos processuais pertinentes, a apresentar uma reclamação à administração, e, consecutiva oualternativamente, a interpor recurso no Tribunal pedindo a anulação da decisão do júri. Referindo-se ao artigo 2.°, n.° 5, da Decisão 94/262, o demandante sustenta que o Provedor tem um dever de aconselhamento e de informação aos cidadãos. O Provedor devia ter orientado o demandante a respeito da opção entre, por um lado, a apresentação de uma queixa ao Provedor e, por outro, a interposição de um recurso no Tribunal, o qual, segundo o demandante, teria seguramente obtido provimento.

65.
    O Tribunal observa quanto a este aspecto, em primeiro lugar, que, ao instituir um Provedor de Justiça, o Tratado abriu aos cidadãos da União, e mais precisamente aos funcionários e outros agentes da Comunidade, uma via alternativa ao recurso para o juiz comunitário, tendo em vista a defesa dos seus interesses. Esta via alternativa extrajudicial responde a critérios específicos e não tem necessariamente o mesmo objectivo que uma acção judicial.

66.
    Além disso, como resulta do artigo 195.°, n.° 1, CE e do artigo 2.°, n.os 6 e 7, da Decisão 94/262, estas duas vias de acção não podem ser seguidas em paralelo. Com efeito, embora as queixas apresentadas ao Provedor não interrompam os prazos de interposição de recursos aplicáveis à instauração do processo no tribunal comunitário, o Provedor deve pôr termo à sua apreciação e declarar a queixa inadmissível se o cidadão em causa tiver simultaneamente interposto recurso para o juiz comunitário a respeito dos mesmos factos. Compete, portanto, ao cidadão decidir qual das duas vias ao seu dispor é susceptível de melhor servir os seus interesses.

67.
    No caso ora em apreço, o demandante não contestou a decisão do júri através da apresentação de uma reclamação ao abrigo do artigo 90.°, n.° 2, do estatuto ou instaurando directamente a acção judicial no tribunal comunitário (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 20 de Junho de 1999, Burban/Parlamento, T-133/89, Colect., p. II-245, n.° 17). Ao contrário, escolheu deliberadamente a via extrajudicial para procurar uma solução para o seu diferendo com a Comissão, pensando que esta servia melhor os seus interesses. De qualquer modo, vale a pena recordar que, tratando-se de uma queixa apresentada por um agente das Comunidades, era de presumir que este conhecia as possibilidades de recurso para o Tribunal, dado que estas são expressamente previstas pelo estatuto (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 18 de Dezembro de 1997, Daffix/Comissão, T-12/94, ColectFP, p. I-A-453 e II-1197, n.° 116).

68.
    Isto dito, e como sublinha o demandante, o Provedor «pode», nos termos do artigo 2.°, n.° 5, da Decisão 94/262 e do artigo 3.°, n.° 2, das disposições de execução, aconselhar o cidadão em causa a dirigir-se a uma outra autoridade e, numa situação como a do presente caso, a interpor no Tribunal de Primeira Instância um recurso de anulação. Pode acontecer efectivamente que, no interesse do bom cumprimento da missão que lhe foi confiada pelo Tratado, o Provedor deva informar, de modo sistemático, o cidadão em causa das medidas a tomar a fim demelhor cuidar dos seus interesses, inclusivamente indicando-lhe as vias de acção judicial à sua disposição e o facto de a queixa ao Provedor não ter efeito suspensivo sobre o prazo para agir em juízo nesses casos. Não existe, no entanto, nenhuma disposição expressa impondo ao Provedor que actue desse modo (despacho do Tribunal de Primeira Instância de 30 de Março de 2000, Méndez Pinedo/BCE, T-33/99, ColectFP p. I-A-63 e II-273, n.° 36).

69.
    Não pode, pois, criticar-se o Provedor por se ter abstido de chamar a atenção do demandante para o facto de a sua queixa não ter carácter suspensivo e por não o ter aconselhado a interpor recurso para o tribunal comunitário. Neste aspecto, o Provedor não cometeu, portanto, qualquer falta de serviço susceptível de fazer a Comunidade incorrer em responsabilidade extracontratual.

70.
    Em segundo lugar, o demandante acusa o Provedor de falta de imparcialidade e de objectividade no tratamento da sua queixa, por ter tomado em consideração o parecer da Comissão, quando esse parecer, na versão inglesa, língua na qual tinha apresentado a sua queixa, foi apresentado depois de expirado o prazo fixado pelo Provedor. Salienta ainda que a versão inglesa do parecer não corresponde à versão francesa inicialmente enviada quanto à descrição dos factos subjacentes à decisão do júri, designadamente no que se refere à comparação entre os pontos obtidos pelo demandante e os pontos exigidos pelo anúncio do concurso. Alega, por último, que a versão inglesa do parecer da Comissão tinha um anexo diferente do que fora junto à versão francesa desse parecer.

71.
    O Tribunal faz notar, em primeiro lugar, que o artigo 4.°, n.° 3, das disposições de execução se limita a prever que o Provedor convide a instituição em causa a apresentar um parecer «dentro de um prazo determinado, que, normalmente, não poderá exceder três meses». O prazo fixado pelo Provedor à instituição visada não é, portanto, um prazo de caducidade, de modo que nada impede este de ter em conta um parecer proferido por essa instituição depois do prazo. Além disso, se o demandante refere, com razão, e correctamente as diferenças entre a versão francesa e a versão inglesa do parecer da Comissão e dos seus anexos, nem por isso deixa de ser verdade que, como sublinhou o Provedor, as razões invocadas pela Comissão para recusar que o demandante se apresente segunda vez à prova oral são idênticas nas duas versões linguísticas do parecer. Ora, no âmbito do presente litígio, o resultado do concurso e, em especial os pontos obtidos na prova oral, não foram contestados, sendo estes motivos os únicos elementos pertinentes para a apreciação, pelo Provedor, da queixa apresentada pelo demandante.

72.
    Por conseguinte, ao contrário do que sustenta o demandante, o Provedor não cometeu qualquer falta ao tomar em consideração o parecer da Comissão, em qualquer das suas versões linguísticas.

73.
    Em terceiro lugar, o demandante salienta que entre o momento em que apresentou as suas observações sobre o parecer da Comissão e o momento em que o Provedor decidiu sobre a sua queixa passaram mais de dez meses. O demandantepergunta-se se o Provedor não infringiu o dever, fixado pelo artigo 2.°, n.° 9, da Decisão 94/262, de informar o cidadão autor da queixa do seguimento que à mesma foi dado «no mais curto prazo possível».

74.
    O Tribunal constata, em primeiro lugar, que as disposições aplicáveis não prevêem um prazo preciso para o tratamento das queixas pelo Provedor. Só no seu relatório anual relativo ao ano de 1997, adoptado em 20 de Abril de 1998, veio o Provedor declarar que «[o] objectivo deveria ser o de realizar os inquéritos necessários a uma queixa e comunicar ao cidadão o resultado no prazo de um ano, excepto em circunstâncias especiais que exijam uma investigação mais demorada» (antepenúltimo parágrafo do preâmbulo).

75.
    Não sofre contestação que, através desta declaração, o Provedor se limitou a fixar-se a ele próprio um prazo indicativo e não um prazo peremptório para o tratamento das queixas.

76.
    Importa precisar, porém, que sob pena de infringir, entre outros, o princípio da boa administração, o processo perante o Provedor não pode prolongar-se para além de um prazo razoável, que deve ser apreciado em função das circunstâncias de cada caso.

77.
    No presente caso, decorreram quase dezasseis meses entre a apresentação da queixa pelo demandante e a decisão do Provedor. O demandante sublinha, a este propósito, que o Provedor não avançou qualquer argumento destinado a demonstrar que teriam sido necessárias investigações particularmente demoradas para decidir que, tendo em conta as circunstâncias particulares do caso, uma solução amigável não podia resultar. Porém, ao assim argumentar, o demandante esquece que o Tratado e a Decisão 94/262 conferiram ao Provedor a tarefa não só de procurar, na medida do possível, uma solução conforme ao interesse particular do cidadão em causa, mas igualmente a de identificar e procurar eliminar os casos de má administração em nome do interesse geral (v. n.° 57 supra). Ora, não foi contestado que foi na sequência da intervenção do Provedor motivada pela queixa do demandante que a Comissão alterou, no interesse de uma boa administração, a sua prática administrativa relativa à convocatória dos candidatos às provas orais de um concurso. Nestas circunstâncias e tendo presente a envergadura da tarefa confiada ao Provedor em nome do interesse geral, o facto de o prazo ter sido excedido no presente caso não pode, por si só, constituir incumprimento das suas obrigações pelo Provedor. Esta acusação não merece, pois, acolhimento.

78.
    Em quarto lugar, embora admitindo que o Provedor não está obrigado a encontrar, de cada vez, uma solução amigável, eliminando o caso de má administração e dando satisfação ao cidadão, o demandante sublinha que o Provedor está sujeito a uma obrigação de meios e deve, por isso, tentar encontrar uma solução. Ora, segundo o demandante, no presente caso, em vez de apreciar com celeridade e rigor a queixa e os documentos pertinentes relativos a esta queixa e de se esforçarpor encontrar uma solução amigável que lhe desse satisfação, o Provedor contentou-se em recolher as observações da Comissão e a transmiti-las ao demandante sem as analisar, enganando-se mesmo sobre o seu alcance e tirando conclusões falsas. O demandante faz notar que tinha indicado ao Provedor que uma solução amigável não teria que consistir necessariamente num novo convite para se apresentar à prova oral - o que a Comissão tinha aliás recusado fazer. O demandante sublinha, na petição e na réplica, que era possível considerar outras soluções alternativas, como por exemplo, a reapreciação da prova escrita, a atribuição de um lugar de consultor especial ou a integração do demandante na instituição sem concurso prévio, como já teria acontecido no passado.

79.
    O Tribunal lembra, em primeiro lugar (v. n.° 57 supra), que, se a Decisão 94/262 conferiu ao Provedor a missão de procurar, na medida do possível, uma solução conforme ao interesse particular do cidadão em causa, ele dispõe, no entanto, nesta matéria, de uma larga margem de apreciação. Por conseguinte, só pode incorrer em responsabilidade extracontratual em caso de incumprimento flagrante e manifesto dos deveres que lhe incumbem neste contexto.

80.
    Como o demandante alega, com razão, resulta do artigo 3.°, n.° 5, da Decisão 94/262 e do artigo 6.° das disposições de execução que o Provedor deve, para realizar este objectivo, cooperar com a instituição em questão e não pode, em princípio, limitar-se a transmitir o parecer da instituição ao cidadão em causa. O Provedor deve, designadamente, examinar se a procura de uma solução que dê satisfação ao cidadão é possível e adoptar, no prosseguimento deste objectivo, um papel activo em relação à instituição em causa.

81.
    Porém, como resulta do artigo 6.°, n.° 3, das disposições de execução, há situações em que a procura de uma solução amigável não é possível. Neste caso, o Provedor arquiva o processo, juntando-lhe, eventualmente uma observação crítica ou elaborando um relatório de que conste um projecto de recomendações à instituição ou ao organismo em causa.

82.
    No presente caso, resulta tanto do parecer da Comissão sobre a queixa do demandante como da carta de 15 de Dezembro de 1999 do membro da Comissão responsável pelos serviços de pessoal, que a Comissão recusava autorizar o demandante a apresentar-se segunda vez à prova oral ou a procurar qualquer outra solução alternativa. Esta posição foi posteriormente confirmada pela resposta da Comissão à carta do demandante de 3 de Março de 2000, transmitida a este último em 16 de Junho de 2000.

83.
    Ora, como se pode ver claramente pela decisão do Provedor, tal como foi citada no n.° 29 supra, este teve em conta o facto de essa recusa da Comissão ser motivada pela obrigação que incumbe a esta instituição de respeitar o princípio da não discriminação entre os candidatos de um concurso (v., neste sentido, o acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 9 de Novembro de 1999, Papadeas/Comité das Regiões, T-102/98, ColectFP, p. I-A-211 e II-1091, n.° 55), e o facto de aviolação deste princípio poder implicar a anulação do concurso e poder dar causa a despesas financeiras e administrativas consideráveis para a instituição. Foi, aliás, à luz destas considerações que o Provedor examinou, na sua decisão, a correcção da posição assumida pela Comissão neste caso e considerou que nenhum elemento do processo permitia pensar que a decisão da Comissão de não autorizar o candidato a apresentar-se segunda vez à prova oral tinha sido tomada em violação de uma qualquer regra ou princípio vinculativo para esta instituição.

84.
    Além disso, cabe salientar que foi só no quadro do processo no Tribunal que o demandante indicou, a título de exemplo, diferentes soluções alternativas que, na sua opinião, podiam ter sido consideradas. Nem o Provedor nem a Comissão podiam, portanto, tomar especificamente posição sobre estas propostas no decurso do processo antes da propositura da presente acção.

85.
    O Provedor podia, pois, sem cometer nenhuma falta, concluir, na sua decisão, que a procura de uma solução amigável que desse satisfação ao demandante não podia resultar. O demandante não tem, pois, razão quando acusa o Provedor de ter tratado a sua queixa com negligência, não cumprindo o seu dever de procurar, tanto quanto possível, uma solução amigável com a Comissão, que lhe desse satisfação.

86.
    Em quinto lugar, o demandante sustenta que, ao formular a sua observação crítica, na decisão de 21 de Outubro de 1999, o Provedor violou o artigo 7.° das disposições de execução. Com efeito, segundo esta disposição, o Provedor só poderia fazer uma observação crítica, designadamente quando o caso de má administração não tem implicações gerais. Ora, segundo o demandante, o facto de a Comissão ter alterado a sua convocatória e de o caso do demandante ter sido mencionado no relatório anual do Provedor relativo ao ano de 1999 demonstra que o caso de má administração verificado tinha esse tipo de implicações.

87.
    O Tribunal considera que uma violação desta disposição pelo Provedor, admitindo que estivesse provada, não podia de modo nenhum prejudicar o demandante. Com efeito, nem a formulação de uma observação crítica nem a elaboração de um relatório com uma recomendação dirigida à instituição em causa foram pensados para proteger os interesses individuais do cidadão em causa contra um eventual prejuízo sofrido devido a um caso de má administração de uma instituição ou de um organismo comunitários. Por conseguinte, sem que seja necessário decidir a questão levantada pelo demandante, há igualmente que rejeitar esta acusação.

88.
    Tendo em conta quanto precede, há que concluir que o demandante não demonstrou que o Provedor cometeu faltas de serviço no tratamento da sua queixa.

89.
    Há, assim, que negar provimento ao pedido, sem que seja necessário examinar a realidade dos danos, tanto materiais como morais, invocados e o nexo de causalidade entre estes e o comportamento do Provedor.

Quanto às despesas

90.
    Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, a parte vencida é condenada nas despesas se tal tiver sido pedido.

91.
    Porém, nos termos do artigo 87.°, n.° 3, do mesmo regulamento, o Tribunal pode, por motivos excepcionais, determinar que cada uma das partes suporte as suas próprias despesas.

92.
    Quanto a este aspecto, há que tomar em consideração, primeiro, o facto de que foi por causa da queixa apresentada pelo demandante ao Provedor que a Comissão alterou a sua prática administrativa sem que esta modificação tenha podido aproveitar, eventualmente, ao próprio demandante.

93.
    Em segundo lugar, importa ter presente que as circunstâncias de facto do presente caso são próximas das de um litígio entre as Comunidades e os seus agentes, casos estes em que, segundo o artigo 88.° do Regulamento de Processo, as despesas das instituições e organismos comunitários ficam a cargo destas.

94.
    Atendendo a estas circunstâncias excepcionais, o Tribunal julga adequado decidir que cada uma das partes suportará as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Terceira Secção),

decide:

1)    É negado provimento aos pedidos.

2)    Cada uma das partes suportará as suas próprias despesas.

Jaeger
Lenaerts
Azizi

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 10 de Abril de 2002.

O secretário

O presidente

H. Jung

M. Jaeger


1: Língua do processo: francês.