Language of document : ECLI:EU:C:2024:66

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

ANTHONY MICHAEL COLLINS

apresentadas em 18 de janeiro de 2024 (1)

Processo C104/23

A GmbH & Co. KG

contra

Hauptzollamt B

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Bundesfinanzhof (Supremo Tribunal Tributário Federal, Alemanha)]

«Reenvio prejudicial — União aduaneira — Pauta Aduaneira Comum — Nomenclatura Combinada — Classificação das mercadorias — Posição pautal 9406 — Conceito de construções prefabricadas — Abrigos para vitelos — Classificação na subposição 9406 00 80»






I.      Introdução

1.        Com o presente reenvio prejudicial, o Bundesfinanzhof (Supremo Tribunal Tributário Federal, Alemanha) coloca ao Tribunal de Justiça a questão de saber se, na aceção da Nomenclatura Combinada, os abrigos para vitelos feitos de plástico são «construções prefabricadas» previstas no capítulo 94 ou «plásticos e suas obras» previstos no capítulo 39.

II.    Quadro jurídico

2.        A Nomenclatura Combinada constante do anexo I do Regulamento (CEE) n.o 2658/87 do Conselho, de 23 de julho de 1987, relativo à nomenclatura pautal e estatística e à pauta aduaneira comum (2), regula a classificação dos artigos importados para a União Europeia para fins aduaneiros. Em conformidade com a Convenção Internacional sobre o Sistema Harmonizado de Designação e Codificação de Mercadorias (3), celebrada em Bruxelas em 14 de junho de 1983, a Nomenclatura Combinada baseia‑se no Sistema Harmonizado de Designação e Codificação de Mercadorias (a seguir «sistema harmonizado»). É composta por capítulos, secções, posições e subposições, tendo cada uma das posições e subposições o seu próprio número de código. Os seis primeiros algarismos referem‑se às posições e subposições da nomenclatura do sistema harmonizado, enquanto o sétimo e o oitavo algarismos identificam subposições específicas.

3.        A Nomenclatura Combinada, com a redação que lhe foi dada pelo Regulamento de Execução (UE) n.o 1101/2014 da Comissão, de 16 de outubro de 2014, que altera o anexo I do Regulamento (CEE) n.o 2658/87 do Conselho relativo à nomenclatura pautal e estatística e à pauta aduaneira comum (4), entrou em vigor em 1 de janeiro de 2015 (5). Foi sempre pertinente para o litígio no processo principal (6).

4.        No título I da primeira parte da Nomenclatura Combinada, o subtítulo A intitula-se «Regras Gerais para interpretação da Nomenclatura Combinada». Uma vez que pode ser pertinente para o caso em apreço, prevê que:

«1.      Os títulos das Secções, Capítulos e Subcapítulos têm apenas valor indicativo. Para os efeitos legais, a classificação é determinada pelos textos das posições e das Notas de Secção e de Capítulo e, desde que não sejam contrárias aos textos das referidas posições e notas, pelas Regras seguintes:

2.      a) Qualquer referência a um artigo em determinada posição abrange esse artigo mesmo incompleto ou inacabado, desde que apresente, no estado em que se encontra, as características essenciais do artigo completo ou acabado. Abrange igualmente o artigo completo ou acabado, ou como tal considerado nos termos das disposições precedentes, mesmo que se apresente desmontado ou por montar.

[…]

3.      Quando pareça que a mercadoria pode classificar‑se em duas ou mais posições por aplicação da Regra 2 b) ou por qualquer outra razão, a classificação deve efetuar‑se da forma seguinte:

a)      A posição mais específica prevalece sobre as mais genéricas.

b)      Os produtos misturados, as obras compostas de matérias diferentes ou constituídas pela reunião de artigos diferentes e as mercadorias apresentadas em sortidos acondicionados para venda a retalho, cuja classificação não se possa efetuar pela aplicação da Regra 3 a), classificam‑se pela matéria ou artigo que lhes confira a característica essencial, quando for possível realizar esta determinação;

[…]

4.      As mercadorias que não possam ser classificadas por aplicação das Regras acima enunciadas classificam‑se na posição correspondente aos artigos mais semelhantes.

[…]

6.      A classificação de mercadorias nas subposições de uma mesma posição é determinada, para efeitos legais, pelos textos dessas subposições e das notas de subposição respetivas, assim como, mutatis mutandis, pelas Regras precedentes, entendendo‑se que apenas são comparáveis subposições do mesmo nível. Para os fins da presente Regra, as Notas de Secção e de Capítulo são também aplicáveis, salvo disposições em contrário.»

5.        O capítulo 39 e o capítulo 94 são as disposições da Nomenclatura Combinada pertinentes para as questões prejudiciais submetidas ao Tribunal de Justiça. A posição 3926 da Nomenclatura Combinada intitula‑se «Outras obras de plásticos e obras de outras matérias das posições 3901 a 3914». A subposição 3926 9097 tem por título «Outras». A nota 1 do capítulo 39 da Nomenclatura Combinada afirma:

«Na Nomenclatura, consideram‑se “plástico” as matérias das posições 3901 a 3914 que, submetidas a uma influência exterior (em geral o calor e a pressão com, eventualmente, a intervenção de um solvente ou de um plastificante), são suscetíveis ou foram suscetíveis, no momento da polimerização ou numa fase posterior, de adquirir por moldagem, vazamento, perfilagem, laminagem ou por qualquer outro processo, uma forma que conservam quando essa influência deixa de se exercer.»

6.        A Nota 2, alínea x), do Capítulo 39 da Nomenclatura Combinada afirma que este capítulo não compreende os artigos abrangidos pelo Capítulo 94, incluindo as «construções pré‑fabricadas». A posição 9406 da Nomenclatura Combinada intitula‑se «construções prefabricadas». A Nota 4 do capítulo 94 da Nomenclatura Combinada afirma:

«Consideram‑se “construções prefabricadas”, na aceção da posição 9406, as construções acabadas e montadas na fábrica, bem como as apresentadas em conjuntos de elementos para montagem no local, tais como habitações, instalações de trabalho, escritórios, escolas, lojas, hangares, garagens ou construções semelhantes.»

III. Factos do litígio no processo principal, questões prejudiciais e tramitação processual no Tribunal de Justiça

7.        Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, a recorrente, A Gmbh, fornece o que descreve como abrigos para vitelos ou iglus para vitelos, com diferentes dimensões e design, como soluções zootécnicas para a criação de vitelos. Os abrigos para vitelos apresentam‑se sob a forma de uma caixa de plástico, composta por paredes e telhado, e, consoante o modelo, um elemento de piso. Dispõem de aberturas para o material de cama e aberturas de ventilação. A parte frontal consiste numa abertura de entrada sem porta, embora, para alguns modelos, as portas possam estar disponíveis como acessório opcional. O abrigo maior («abrigo coletivo») é importado sem elemento de piso, tendo em vista a posterior adição de um piso em madeira maciça. As dimensões do modelo mais pequeno de abrigo para vitelos são de 147 cm de comprimento, 109 cm de largura e 117 cm de altura. O abrigo coletivo tem dimensões de 220 cm de comprimento, 273 cm de largura e 183 cm de altura. Os abrigos para vitelos são geralmente colocados ao ar livre, a fim de proteger os vitelos das intempéries. São feitos em polietileno, contendo 8 % de dióxido de titânio. Cada um destes artigos é constituído entre 12 % e 21 % por uma base e aros da porta metálicos.

8.        Em 5 de agosto de 2015, a recorrente solicitou ao recorrido, o Hauptzollamt B (Serviço Aduaneiro Central B), a emissão de uma informação pautal vinculativa com vista a obter a classificação dos abrigos para vitelos na subposição 9406 0080 da Nomenclatura Combinada como «construção prefabricada» de «outras matérias». Em 29 de setembro de 2015, o recorrido emitiu uma informação pautal vinculativa que classificou os artigos como outras obras de plásticos, diferentes das subposições da Nomenclatura Combinada 3926 1000 a 3926 9092, na subposição 3926 9097. Consequentemente, os abrigos para vitelos foram objeto de uma taxa de direitos de 6,5 %, em vez da taxa de 2,7 % que teria sido aplicada se tivessem sido classificados como construções prefabricadas.

9.        A recorrente interpôs recurso para o Finanzgericht (Tribunal Tributário, Alemanha) para impugnar a classificação do recorrido e obter a classificação dos abrigos para vitelos como «construções prefabricadas». O Finanzgericht (Tribunal Tributário, Alemanha) negou provimento ao recurso com o fundamento de que, sendo constituídos por polietileno, que lhes conferia a sua característica essencial, os abrigos para vitelos tinham sido corretamente classificados na subposição 3926 9097. O Finanzgericht (Tribunal Tributário, Alemanha) declarou que, uma vez que praticamente toda a parte frontal dos abrigos para vitelos era constituída por uma abertura de entrada, os abrigos não eram fechados e, por conseguinte, não podiam ser classificados como construções prefabricadas.

10.      A recorrente interpôs recurso de «Revision» desta decisão para o órgão jurisdicional de reenvio.

11.      Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, a recorrente alega que a classificação dos abrigos para vitelos na posição 9406 da Nomenclatura Combinada não exige a existência de um espaço fechado por todos os lados. Nem o texto do regulamento nem as suas notas contêm essa exigência e os exemplos de construções que figuram na Nota 4 do Capítulo 94 da Nomenclatura Combinada incluem os «hangares», que podem ter aberturas de entrada e de saída sem fecho ou um lado completamente aberto. Estes exemplos reproduzem as notas explicativas do sistema harmonizado relativas à posição 9406 e a Nota 4 do Capítulo 94 da Harmonised Tariff Schedule [Nomenclatura Tarifária Harmonizada] dos Estados Unidos da América. A recorrente observa que, devido às condições climáticas em muitos Estados‑Membros, não é absolutamente necessário que a construção consista num espaço totalmente fechado para ser utilizada como tal. Também não é evidente que uma «construção prefabricada» deva permitir a entrada de pessoas ou que todas essas pessoas, incluindo pessoas altas, devam poder entrar de pé.

12.      O órgão jurisdicional de reenvio assinala igualmente que, dado que a expressão «construção prefabricada» não é definida nas posições, nas notas e nas notas explicativas, há que recorrer, em primeiro lugar, à linguagem comum para determinar em que consiste para efeitos da classificação na posição 9406. O recorrido observa que nem todos os artigos abrangidos pelo conceito de «construção» na linguagem comum são «construções prefabricadas» na aceção da Nota 4 do Capítulo 94 e da posição pautal 9406 da Nomenclatura Combinada. O recorrido alega que as construções a que se refere a Nota 4 do Capítulo 94 se caracterizam, entre outras coisas, por serem fechadas por todos os lados, serem concebidas para utilização (estática) a longo prazo, de construção estável e terem dimensões de molde a permitir a entrada de pé de uma pessoa de estatura média.

13.      O órgão jurisdicional de reenvio observa que, em conformidade com as regras gerais para a interpretação da Nomenclatura Combinada, os abrigos para vitelos seriam classificados na posição 3926, a menos que dela sejam excluídas, em conformidade com a Nota 2, alínea x), do Capítulo 39, com base no facto de serem construções prefabricadas abrangidas pelo Capítulo 94. Contrariamente à posição defendida pelo Finanzgericht (Tribunal Tributário, Alemanha) e pelo recorrido, o órgão jurisdicional de reenvio tende a considerar que a posição 9406 não exige que uma construção prefabricada forme um espaço fechado por todos os lados. O órgão jurisdicional de reenvio entende igualmente que, para serem abrangidas pela posição 9406, as construções prefabricadas devem permitir a entrada de pessoas de estatura média e ter, pelo menos, um espaço que permita a essas pessoas permanecer de pé. Tendo em conta as suas dúvidas quanto à classificação dos artigos, o Bundesfinanzhof (Supremo Tribunal Tributário Federal) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      A posição 9406 da [Nomenclatura Combinada] pressupõe obrigatoriamente que uma construção prefabricada forme um espaço totalmente fechado por todos os lados?

2)      Em caso de resposta negativa à primeira questão: a posição 9406 da [Nomenclatura Combinada] pressupõe que as dimensões de uma construção prefabricada sejam de molde a permitir a entrada de pessoas de estatura média, e, para este efeito, é necessário pelo menos uma área acessível que permita a essas pessoas manter‑se de pé, ou é suficiente que se possa aceder em posição curvada?»

14.      A Comissão apresentou observações escritas.

IV.    Apreciação

 Observações da Comissão Europeia

15.      Abordando conjuntamente as questões colocadas, a Comissão, em conformidade com o enfoque do órgão jurisdicional de reenvio, observa que, para classificar os abrigos para vitelos em causa, é necessário determinar se consistem em «construções prefabricadas» que, por força da Nota 2, alínea x), do Capítulo 39 da Nomenclatura Combinada, são excluídas da classificação ao abrigo do Capítulo 39. Resulta da Nota 4 do Capítulo 94 que uma «construção prefabricada» deve ser uma «construção» que corresponda aos exemplos incluídos na nota, que se referem a habitações, instalações de trabalho, escritórios, escolas, lojas, hangares, garagens ou construções semelhantes. As notas explicativas do sistema harmonizado de 2022 (7)      classificam também certos tipos de estufas e quiosques de rua na posição «construções prefabricadas».

16.      A Comissão observa que nem a Nomenclatura Combinada nem o sistema harmonizado definem o conceito de «construção». A determinação do significado e do alcance dos termos que o direito da União não define deve fazer‑se de acordo com o seu sentido habitual na linguagem comum, tendo em conta o contexto em que figuram e o objetivo prosseguido pela regulamentação de que fazem parte (8). Referindo‑se à definição de «building» na língua inglesa e de «Gebäude» na língua alemã, a Comissão considera que, para que uma construção possa ser classificada como «construção prefabricada», deve ter um telhado e paredes, destinar‑se a ser utilizada por pessoas que se possam movimentar dentro da mesma para exercer as suas atividades, ser colocada ao ar livre e ter uma certa estabilidade e durabilidade.

17.      Quanto ao número de paredes que uma construção deve ter e/ou se deve conter um espaço fechado, a Comissão e o órgão jurisdicional de reenvio referem‑se à ata da 227.a reunião do Comité do Código Aduaneiro. Apesar de estas conclusões não serem vinculativas, declaram que, embora uma construção não tenha necessariamente de ter quatro paredes, deve ter um telhado e algumas paredes (9). Este entendimento é confirmado pelo facto de os hangares, referidos a título de exemplo na Nota 4 do Capítulo 94, nem sempre terem quatro paredes. A exigência de que uma construção tenha quatro paredes ou seja de outra forma fechada pode conduzir à classificação de artigos em subposições diferentes consoante tenham ou não portas, o que seria contrário ao objetivo de uma classificação uniforme.

18.      A exigência segundo a qual uma construção deve ser utilizada por pessoas que se possam movimentar dentro da mesma para exercer as suas atividades é corroborada pelo facto de todos os artigos enumerados no Capítulo 94 se destinarem a uso humano e de a Nomenclatura Combinada classificar os artigos para uso animal noutros pontos. A Comissão conclui assim que as «construções prefabricadas», na aceção da posição 9406, devem destinar‑se a uso humano, que deve ser possível às pessoas movimentarem‑se dentro das mesmas e que a sua dimensão deve ser de molde a permitir que as pessoas possam ter acesso e exercer atividades dentro das mesmas sem dificuldade. É neste contexto que a Comissão se refere ao tratamento dado às estufas e às estufas de túnel pela Nomenclatura Combinada. Para classificar uma estufa como «construção prefabricada», as suas dimensões devem ser de molde a permitir a entrada de uma pessoa de estatura média. Refere‑se ao Regulamento (CE) n.o 1655/2005(10) da Comissão, que prevê que uma «miniestufa» com 50 cm de comprimento, 24 cm de largura e 25 cm de altura não é considerada uma «construção prefabricada» compreendida na posição 9406. Do mesmo modo, de acordo com as notas explicativas da Nomenclatura Combinada de 2019 (11), para que seja uma «construção prefabricada», as dimensões de uma estufa de túnel devem ser de molde a permitir a entrada de pessoas. Seria igualmente incompatível com os exemplos dados na Nota 4 se bastasse que uma pessoa de estatura média pudesse movimentar‑se no interior de tais construções sem que essa pessoa pudesse permanecer de pé. A Comissão conclui que os abrigos para vitelos não são «construções prefabricadas» previstas na posição 9406, a menos que as suas dimensões sejam de molde a que as pessoas se possam movimentar no seu interior permanecendo de pé.

19.      É indubitável para a Comissão que os abrigos para vitelos em causa no processo principal se destinam a ser utilizados ao ar livre.

20.      Remetendo para os exemplos que figuram na Nota 4, a Comissão tem dúvidas quanto ao facto de os artigos em causa no processo principal cumprirem a exigência de durabilidade e de estabilidade. Cita o exemplo das estufas de túnel que, em conformidade com as notas explicativas da Nomenclatura Combinada de 2019, não são abrangidas pela posição 9406 se puderem ser facilmente desmontadas e deslocadas de um local para outro. Tendo em conta a sua dimensão e o seu peso aparentes, a Comissão considera que pode ser possível deslocar facilmente os abrigos para vitelos em causa de um local para outro, caso em que a exigência de durabilidade e estabilidade não seria cumprida.

 Análise

21.      Como observa acertadamente a Comissão, quando é submetido ao Tribunal de Justiça um reenvio prejudicial em matéria de classificação pautal, a função deste consiste mais em esclarecer os critérios cuja aplicação permitirá ao órgão jurisdicional de reenvio classificar corretamente os produtos em causa segundo a Nomenclatura Combinada do que em proceder ele próprio a essa classificação (12). Embora a classificação consista, em última análise, numa constatação puramente factual que não cabe ao Tribunal de Justiça efetuar no quadro de um reenvio prejudicial (13), este pode fornecer, de acordo com as circunstâncias do caso, indicações e orientações (14).

22.      Em conformidade com jurisprudência constante do Tribunal de Justiça e para garantir a segurança jurídica e a facilidade dos controlos, o critério decisivo para a classificação pautal das mercadorias é o da apreciação das suas características e propriedades objetivas, como definidas na posição relevante da Nomenclatura Combinada e nas suas notas de secção ou de capítulo (15). Apesar de as notas explicativas do sistema harmonizado e da Nomenclatura Combinada não terem força vinculativa, constituem instrumentos importantes para assegurar a aplicação uniforme da pauta aduaneira comum e, fornecem enquanto tais, elementos válidos para a sua interpretação (16).

23.      O órgão jurisdicional de reenvio declara que, em conformidade com a regra 3, b), das regras gerais para a interpretação da Nomenclatura Combinada e tendo em conta o facto de serem principalmente constituídos por polietileno, em princípio, os abrigos para vitelos são abrangidas pela posição 3926. A Nota 2, alínea x), exclui do Capítulo 39 as «construções prefabricadas» do Capítulo 94. O problema submetido ao órgão jurisdicional de reenvio pode, portanto, ser resolvido determinando se os artigos em causa são «construções prefabricadas» na aceção da posição 9406, uma vez que, em caso afirmativo, não podem ser abrangidos pelo capítulo 39. Daqui resulta que a classificação dos artigos em causa pode ser efetuada por referência a um processo de eliminação. Se uma «construção prefabricada» tiver de formar um espaço totalmente fechado por todos os lados ou ter dimensões de molde a permitir a entrada de pessoas de estatura média ou que estas se mantenham de pé, os abrigos para vitelos em causa não são abrangidos pela posição 9406 e devem, por conseguinte, ser classificados na posição 3926.

24.      O órgão jurisdicional de reenvio observa que, de acordo com a linguagem comum, as construções exigem efetivamente uma cobertura, mas não obrigatoriamente paredes por todos os lados, para que exista um espaço totalmente fechado. Embora a maior parte dos exemplos de construções que figuram na Nota 4 do Capítulo 94 constituam espaços fechados por todos os lados, como assinala acertadamente a recorrente, os hangares podem ser construídos com um ou mais lados abertos. Uma vez que é possível instalar portas como acessórios opcionais em certos modelos, os abrigos para vitelos podem criar um espaço fechado.

25.      Em virtude das regras gerais para a interpretação da Nomenclatura Combinada, a classificação deve ser determinada, em primeiro lugar, pelos textos das posições e das Notas de Secção e de Capítulo. A posição 9406 da Nomenclatura Combinada utiliza os termos «vorgefertigte Gebäude» na língua alemã, «prefabricated buildings» na língua inglesa e «constructions préfabriqueés» na língua francesa, devendo este termo ser interpretado à luz dos exemplos que figuram na Nota 4 do Capítulo 94.

26.      A ata da 227.a reunião do Comité do Código Aduaneiro atesta bem as dificuldades associadas à classificação dos casos‑limites. Nessa reunião, os representantes de dezasseis Estados‑Membros foram favoráveis à classificação de uma pérgula composta por um telhado e três paredes, construída com uma caixilharia de alumínio e vidro, como «construção prefabricada» na posição 9406, ao passo que os representantes de nove Estados‑Membros propenderam para a sua classificação como construções de alumínio na posição 7610. As conclusões do Comité do Código Aduaneiro estão em conformidade com as observações da recorrente apresentadas ao órgão jurisdicional de reenvio, segundo as quais os hangares podem ter um ou mais lados abertos. A Comissão e o órgão jurisdicional de reenvio concordam com esta apreciação.

27.      Tendo em conta estes argumentos, sou de opinião que não é necessário que uma «construção prefabricada» prevista na posição 9406 forme um espaço fechado por todos os lados. Daqui resulta que concordo com a conclusão da maioria dos membros do Comité do Código Aduaneiro, segundo a qual uma construção não tem de ter quatro paredes. Embora seja verdade que as construções enumeradas na Nota 4 do Capítulo 94 formam habitualmente espaços fechados por todos os lados, tal não impede que uma «construção prefabricada» que não contenha esse espaço fechado seja abrangida pelo âmbito deste conceito. Na linguagem comum, pode existir uma construção apesar de a mesma não conter um espaço fechado. No âmbito do presente reenvio prejudicial, os hangares para feno e os hangares concebidos para secar madeira ao ar constituem exemplos que vêm imediatamente à mente.

28.      Debruçando‑me agora sobre a questão de saber se uma «construção prefabricada» prevista na posição 9406 deve ter uma altura mínima, este critério deve ser considerado à luz dos exemplos referidos na Nota 4 do Capítulo 94. Considerando o termo «hangares» por si só, pode defender‑se que certos hangares podem não ter dimensões de molde a permitir a entrada de pé de uma pessoa de estatura média, mas que ainda assim constituem uma construção. Os exemplos que figuram na Nota 4 do Capítulo 94 relativos a habitações, instalações de trabalho, escritórios, escolas, lojas, hangares, garagens ou construções semelhantes denotam que as «construções prefabricadas» têm a natureza de construções nas quais uma pessoa de estatura média pode entrar e circular. Daqui parece deduzir‑se que, para que os «hangares» constituam «construções prefabricadas» na aceção da Nota 4 do Capítulo 94, as suas dimensões devem ser de molde a permitir a entrada e a movimentação de pé de uma pessoa de estatura média.

29.      Cheguei a esta conclusão sem invocar os três argumentos apresentados pela Comissão. Em primeiro lugar, não me convence o argumento segundo o qual a exclusão, pelo Regulamento (CE) n.o 1655/2005 da Comissão, de uma miniestufa da posição 9406 é indicativa de uma abordagem geral relativa aos requisitos de altura de uma «construção prefabricada» que, de outro modo, seria abrangida por essa posição. As dimensões do artigo aí referido eram de cerca de 50 cm de comprimento, 24 cm de largura e 25 cm de altura. Como se depreende da fotografia que figura no anexo do referido regulamento, fornecida a título meramente informativo, este artigo assemelha‑se a uma caixa de vidro ou a um contentor e não pode ser confundido com uma construção.

30.      Por outro lado, a sugestão de que as dimensões de uma «construção prefabricada» prevista na posição 9406 devem ser de molde a permitir a entrada de pessoas de estatura média porque as notas explicativas da Nomenclatura Combinada o estabelecem parece incorreta em circunstâncias em que esta afirmação surge no contexto de uma referência a estufas de túnel e, portanto, não foi concebida para ser de aplicação geral.

31.      Em terceiro lugar, também não me convence o argumento da Comissão segundo o qual, em consequência da indicação de que todos os artigos do Capítulo 94 se destinam a uso humano, os hangares para animais e os outros artigos destinados a uso animal devem ser classificados noutra posição da Nomenclatura Combinada. Embora os títulos das secções e dos capítulos tenham apenas valor indicativo, em conformidade com a regra 1 das regras gerais para a interpretação da Nomenclatura Combinada, o capítulo 94, que diz respeito, nomeadamente, a móveis, mobiliário médico‑cirúrgico, almofadas, anúncios, cartazes ou tabuletas e placas indicadoras, luminosos, está incluído na Secção XX da Nomenclatura Combinada, sob a epígrafe «Mercadorias e produtos diversos». Pela sua própria natureza, uma secção composta por artigos diversos contém todo o tipo de artigos. Parece‑me difícil, se não mesmo impossível, deduzir o que quer que seja de uma miscelânea. Para chegar a esta conclusão, observo que, em 1977, a Organização Mundial das Alfândegas classificou na posição 9406 10, como construções prefabricadas feitas de madeira, silos de cereais, de tipo agrícola, compostos por várias partes circulares, de diâmetro decrescente, feitos de painéis de fibras de madeira, concebidos para serem montados através da sua colocação uns em cima dos outros e sendo unidos por tubos de ferro, os quais não incluíam equipamentos mecânicos ou térmicos (17).

32.      Sob reserva de verificação pelo órgão jurisdicional de reenvio, a descrição dos abrigos para vitelos que consta da decisão de reenvio suscita a questão da sua durabilidade e da sua estabilidade que, como assinala a Comissão, constituem características que devem ser tidas em conta para determinar se as construções devem ser classificadas como «construções prefabricadas».

33.      A recorrente refere‑se igualmente à Harmonized Tariff Schedule [Nomenclatura Tarifária Harmonizada] dos Estados Unidos da América. A posição 9406, relativa às construções prefabricadas, contém uma subposição específica para os «Hangares de plástico para animais». Uma vez que a sua nota 4 é quase idêntica (18)      à do sistema harmonizado e da Nomenclatura Combinada, estou convencido de que corrobora a tese segundo a qual os hangares para animais feitos de plástico não são classificados na posição 9406, em conformidade com esta nota, e que é necessária uma inserção específica para se sejam abrangidos pelo Capítulo 94. A inclusão expressa na nomenclatura norte‑americana dos hangares de plástico para animais como subposição da posição 9406 limita‑se a demonstrar a existência de uma divergência nas abordagens da União e dos Estados Unidos da América relativamente a esta questão (19).

V.      Conclusão

34.      Tendo em conta o acima exposto, proponho que o Tribunal de Justiça responda às questões prejudiciais submetidas pelo Bundesfinanzhof (Supremo Tribunal Tributário Federal, Alemanha) do seguinte modo:

A Nomenclatura Combinada constante do anexo I do Regulamento (CEE) n.o 2658/87 do Conselho, de 23 de julho de 1987, relativo à nomenclatura pautal e estatística e à pauta aduaneira comum, na sua versão resultante do Regulamento de Execução (UE) n.o 1101/2014 da Comissão, de 16 de outubro de 2014,

deve ser interpretada no sentido de que uma construção prefabricada prevista na posição 9406 da mesma:

–        não tem de formar um espaço totalmente fechado por todos os lados;

–        deve ter dimensões de molde a permitir a entrada de pessoas de estatura média e ter, pelo menos, uma área acessível que permita a essas pessoas manter‑se de pé; e

–        deve ser duradoura e estável.


1      Língua original: inglês.


2      JO 1987, L 256, p. 1.


3      Coletânea de Tratados das Nações Unidas, vol. 1503, p. 4, n.o 25910 (1988), JO 1987, L 198, p.3.


4      JO 2014, L 312, p. 1


5      Em conformidade com o artigo 12.o do Regulamento n.o 2658/87, a Comissão adota anualmente, através de regulamento, uma versão atualizada completa da Nomenclatura Combinada e das correspondentes taxas dos direitos autónomos e convencionais da pauta aduaneira comum, conforme resulta das medidas adotadas pelo Conselho ou pela Comissão.


6      Em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça: v., por exemplo, Acórdão de 2 de maio de 2019, Onlineshop (C‑268/18, EU:C:2019:353, n.o 22).


7      A Comissão refere‑se às notas explicativas de 2022 devido ao facto de os códigos do sistema harmonizado não terem sofrido nenhuma alteração substancial desde a data dos factos no litígio no processo principal.


8      V., por exemplo, Acórdão de 6 de setembro de 2018, Kreyenhop & Kluge (C‑471/17, EU:C:2018:681, n.o 39).


9      Ata da 227.a reunião do Comité do Código Aduaneiro, p. 10.


10      Regulamento (CE) n.o 1655/2005 da Comissão, de 10 de outubro de 2005, relativo à classificação de certas mercadorias na Nomenclatura Combinada (JO 2005, L 266, p. 50).


11      JO 2019, C 119, p. 1.


12      V., por exemplo, Acórdão de 20 de outubro de 2022, Mikrotīkls (C‑542/21, EU:C:2022:814, n.o 21 e jurisprudência aí referida).


13      Ibidem.


14      V., por exemplo, Conclusões da advogada‑geral J. Kokott no processo Uroplasty (C‑514/04, EU:C:2006:56, n.o 45).


15      V., por exemplo, Acórdão de 28 de abril de 2022, PRODEX (C‑72/21, EU:C:2022:312, n.o 28).


16      Ibidem, n.o 29.


17      Estas informações sobre um parecer de classificação estão disponíveis na base de dados sobre mercadorias do Sistema Harmonizado da Organização Mundial das Alfândegas. V. https://www.wcotradetools.org/en/harmonized‑system. Os pareceres de classificação gozam do mesmo estatuto que as notas explicativas, distinguindo‑se pelo facto de que os primeiros se referem a produtos específicos. No seu Acórdão de 19 de novembro de 1975, Douaneagent der Nederlandse Spoorwegen (38/75, EU:C:1975:154, n.o 24), o Tribunal de Justiça observou o seguinte: «Evidentemente que [os] pareceres de classificação [da Organização Mundial das Alfândegas] não vinculam as partes contratantes, mas constituem elementos de interpretação, tanto mais determinantes porquanto emanados de uma autoridade, incumbida pelas partes contratantes de assegurar a uniformidade na interpretação e aplicação da nomenclatura.»


18      As versões dos Estados Unidos da América de 2015 e de 2023 preveem que: «Consideram‑se “construções prefabricadas”, na aceção da posição 9406, as construções acabadas e montadas na fábrica, bem como as inseridas em conjuntos de elementos para montagem no local, tais como habitações, instalações de trabalho, escritórios, escolas, lojas, hangares, garagens ou construções semelhantes.» No texto norte‑americano, as palavras «entered together» («inseridas em conjuntos») substituem as palavras «presented together» («apresentadas em conjuntos») no sistema harmonizado e na Nomenclatura Combinada.


19      Neste contexto, recordo as palavras do advogado‑geral F. G. Jacobs nas suas Conclusões de 28 de outubro de 1999 no processo Peacock (C‑339/98, EU:C:1999:540, n.o 37): «[O] Tribunal é uma jurisdição encarregada de aplicar especificamente o direito comunitário. No âmbito das suas competências inclui‑se claramente, como questão de direito, a de interpretar os termos da [Nomenclatura Combinada]. O Tribunal não é um corpo técnico dotado de qualificação que lhe permita dirimir conflitos em questões puramente técnicas e, de modo algum, deve intervir em qualquer processo de negociações técnicas relativas ao conteúdo das várias posições [do sistema harmonizado], ou seja, negociações em cujo âmbito peritos, com os conhecimentos adequados, irão diligenciar a obtenção de acordo internacional sobre o que, sem sombra de dúvida, constitua questão controversa e essencialmente técnica. Esse processo pode implicar alterações que clarifiquem o texto do [sistema harmonizado], sendo o meio mais adequado para, a longo prazo, alcançar um consenso entre as diferentes opiniões envolvidas. Mas o Tribunal pode dar o seu contributo, ao declarar como é que devem ser interpretados os termos relevantes da [Nomenclatura Combinada], em dado momento, como matéria de direito comunitário.»