Language of document : ECLI:EU:T:2011:268

DESPACHO DO PRESIDENTE DO TRIBUNAL GERAL

10 de Junho de 2011 (*)

«Processo de medidas provisórias – Concorrência – Decisão da Comissão que aplica uma coima – Garantia bancária – Pedido de suspensão de execução – Prejuízo financeiro – Inexistência de circunstâncias excepcionais – Falta de urgência»

No processo T‑414/10 R,

Companhia Previdente – Sociedade de Controle de Participações Financeiras, SA, com sede em Lisboa (Portugal), representada por D. Proença de Carvalho e J. Caimoto Duarte, advogados,

requerente,

contra

Comissão Europeia, representada por F. Castillo de la Torre e V. Bottka, e P. Costa de Oliveira, na qualidade de agentes, assistidos por M. Marques Mendes, advogado,

requerida,

que tem por objecto um pedido de suspensão da execução da decisão C (2010) 4387 final da Comissão, de 30 de Junho de 2010, relativa a um processo de aplicação do artigo 101.° TFUE e do artigo 53.° do Acordo EEE (processo COMP/38.344 – Aço para pré‑esforço), bem como um pedido de dispensa da obrigação de constituir uma garantia bancária para evitar a cobrança imediata da coima aplicada por força do artigo 2.° da referida decisão,

O PRESIDENTE DO TRIBUNAL GERAL

profere o presente

Despacho

 Antecedentes do litígio

1        A requerente, a Companhia Previdente – Sociedade de Controle de Participações Financeiras, SA, é uma sociedade comercial com sede em Lisboa (Portugal).

2        Através da decisão C (2010) 4387 final, de 30 de Junho de 2010, relativa a um processo de aplicação do artigo 101.° TFUE e do artigo 53.° do Acordo EEE (processo COMP/38.344 – Aço para pré‑esforço) (a seguir «decisão impugnada»), a Comissão Europeia aplicou à requerente, solidariamente com a sua filial Socitrel – Sociedade Industrial de Trefilaria, SA, uma coima no montante de 12,59 milhões de euros a título de sanção pela participação desta última num acordo no sector do aço para pré‑esforço.

3        O artigo 2.° da decisão impugnada, notificada em 6 de Julho de 2010, impõe o pagamento da coima no prazo de três meses a contar da data de notificação. A carta de notificação precisa no entanto que, em caso de recurso da decisão impugnada interposto no Tribunal, a requerente deve garantir a cobrança da coima quer através da constituição de uma garantia bancária quer através do pagamento provisório da coima.

4        Em 30 de Julho de 2010, a Comissão informou a requerente de que um erro material de cálculo tinha sido identificado na decisão impugnada. Em 30 de Setembro de 2010, a Comissão adoptou a decisão C (2010) 6676 final que altera a decisão impugnada de 30 de Junho de 2010, e que reduz o montante de base aplicável à requerente de 22,5 milhões de euros para 20 milhões de euros sem que essa alteração tivesse, no entanto, efeitos no montante final da coima.

 Tramitação processual e pedidos das partes

5        Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal em 15 de Setembro de 2010, a requerente interpôs um recurso destinado a obter a anulação da decisão impugnada e, a título subsidiário, a redução do montante da coima que a Comissão lhe aplicou.

6        Por requerimento separado apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 16 de Setembro de 2010, a requerente apresentou um pedido de medidas provisórias destinado a obter a suspensão da execução da decisão impugnada. A requerente conclui pedindo que o presidente do Tribunal se digne:

–        suspender, até estar concluído o processo de medidas provisórias, a execução da decisão impugnada;

–        suspender, até estar concluído o processo principal, a execução da decisão impugnada, na parte em que lhe impõe o pagamento de uma coima;

–        dispensá‑la da obrigação de constituir uma garantia bancária ou de proceder ao pagamento provisório da coima como condição para a não cobrança imediata da coima;

–        condenar a Comissão nas despesas.

7        Nas suas observações escritas entradas na Secretaria do Tribunal em 29 de Outubro de 2010, a Comissão conclui pedindo ao presidente do Tribunal Geral que:

–        indefira o pedido de medidas provisórias,

–        condene a requerente nas despesas.

8        Por decisão de 12 de Novembro de 2010, o Tribunal Geral (Primeira Secção) autorizou as partes a adaptar, no processo principal, os seus pedidos e os seus fundamentos a fim de ter em conta as alterações introduzidas pela decisão de 30 de Setembro de 2010. Em consequência, a requerente apresentou, por articulado de 10 de Dezembro de 2010, observações relativas à adaptação do recurso de anulação à referida decisão de 30 de Setembro de 2010. Por último, por carta de 29 de Dezembro de 2010, a requerente informou o secretário do Tribunal de que as alterações introduzidas pela decisão de alteração não afectavam a utilidade do pedido de medidas provisórias.

 Questão de direito

9        Resulta de uma leitura conjugada dos artigos 278.° TFUE e 279.° TFUE, por um lado, e do artigo 256.°, n.° 1, TFUE, por outro, que o juiz das medidas provisórias pode, se considerar que as circunstâncias o exigem, decretar a suspensão da execução de um acto impugnado no Tribunal Geral ou ordenar as medidas provisórias necessárias.

10      O artigo 104.°, n.° 2, do Regulamento de Processo dispõe que os pedidos de medidas provisórias devem especificar o objecto do litígio, as razões da urgência, bem como os fundamentos de facto e de direito que, à primeira vista, justificam a adopção da medida provisória requerida. Assim, a suspensão da execução e as restantes medidas provisórias podem ser concedidas pelo juiz das medidas provisórias se se chegar à conclusão de que, à primeira vista, a sua concessão é justificada de facto e de direito (fumus boni juris) e que são urgentes, no sentido de que é necessário, para evitar um prejuízo grave e irreparável dos interesses da parte que requer as medidas provisórias, que sejam decretadas e produzam os seus efeitos antes da decisão no processo principal. O juiz das medidas provisórias procede igualmente, sendo caso disso, à ponderação dos interesses em presença (despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 23 de Fevereiro de 2001, Áustria/Conselho, C‑445/00 R, Colect., p. I‑1461, n.° 73). Estes requisitos são cumulativos, pelo que um pedido de medidas provisórias deve ser indeferido se um deles não estiver preenchido [despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 14 de Outubro de 1996, SCK e FNK/Comissão, C‑268/96 P(R), Colect., p. I‑4971, n.° 30].

11      Além disso, no âmbito desse exame de conjunto, o juiz das medidas provisórias dispõe de um amplo poder de apreciação e é livre de determinar, tendo presentes as especificidades do caso concreto, o modo como esses diferentes requisitos devem ser verificados, bem como a ordem desse exame, uma vez que nenhuma norma jurídica lhe impõe um esquema de análise preestabelecido para apreciar a necessidade de decidir provisoriamente [despachos do presidente do Tribunal de Justiça de 19 de Julho de 1995, Comissão/Atlantic Container Line e o., C‑149/95 P(R), Colect., p. I‑2165, n.° 23, e de 3 de Abril de 2007, Vischim/Comissão, C‑459/06 P(R), não publicado na Colectânea, n.° 25].

12      Tendo em conta os elementos dos autos, o juiz das medidas provisórias considera que dispõe de todos os elementos necessários para decidir sobre o presente pedido de medidas provisórias, sem que seja necessário pronunciar‑se sobre a sua admissibilidade, nem ouvir previamente as explicações orais das partes.

13      Nas circunstâncias do presente caso, há que começar por analisar se o requisito relativo à urgência está preenchido.

14      Segundo jurisprudência assente, o carácter urgente de um pedido de medidas provisórias deve ser apreciado em função da necessidade de decidir provisoriamente, a fim de evitar que um prejuízo grave e irreparável seja causado à parte que requer as medidas provisórias (despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 18 de Outubro de 1991, Abertal e o./Comissão, C‑213/91 R, Colect., p. I‑5109, n.° 18; despachos do presidente do Tribunal Geral de 19 de Dezembro de 2001, Government of Gibraltar/Comissão, T‑195/01 R e T‑207/01 R, Colect., p. II‑3915, n.° 95, e de 3 de Dezembro de 2002, Neue Erba Lautex/Comissão, T‑181/02 R, Colect., p. II‑5081, n.° 82). No entanto, não basta alegar que a execução do acto cuja suspensão é requerida está iminente, incumbindo à parte produzir a prova séria de que não pode aguardar o desfecho do processo principal sem correr o risco de sofrer um prejuízo dessa natureza (despacho do presidente do Tribunal Geral de 25 de Junho de 2002, B/Comissão, T‑34/02 R, Colect., p. II‑2803, n.° 85). Embora a iminência do prejuízo não tenha de ser estabelecida com uma certeza absoluta, a sua realização deve porém, especialmente quando dependa de vários factores, ser previsível com um grau de probabilidade suficiente. A parte que requer as medidas provisórias continua a ter de provar os factos susceptíveis de comprovar a perspectiva de um prejuízo grave e irreparável [despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 14 de Dezembro de 1999, HFB e o./Comissão, C‑335/99 P(R), Colect., p. I‑8705, n.° 67, e despacho Neue Erba Lautex/Comissão, já referido, n.° 83].

15      Ora, um prejuízo de ordem financeira não pode, salvo circunstâncias excepcionais, ser considerado irreparável ou mesmo dificilmente reparável, já que pode ser objecto de uma compensação financeira posterior [despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 11 de Abril de 2001, Comissão/Cambridge Healthcare Supplies, C‑471/00 P(R), Colect., p. I‑2865, n.° 113; despacho do presidente do Tribunal Geral de 15 de Junho de 2001, Bactria/Comissão, T‑339/00 R, Colect., p. II‑1721, n.° 94]. No entanto, uma medida provisória justifica‑se se se considerar plausível que, na falta de tal medida, a parte que requer as medidas provisórias ficaria numa situação susceptível de pôr em risco a sua existência antes de ser proferida a decisão que põe fim ao processo principal (despacho Neue Erba Lautex/Comissão, já referido, n.° 84).

16      Daqui resulta que, a fim de provar que corre o risco de sofrer um prejuízo grave e irreparável, a requerente deve demonstrar ao juiz das medidas provisórias que não existe nenhuma outra solução além da adopção, a título excepcional, de medidas provisórias (v., neste sentido, despacho do presidente do Tribunal Geral de 12 de Maio de 2010, Reagens/Comissão, T‑30/10 R, ainda não publicado na Colectânea, n.° 33).

17      No caso vertente, é ponto assente que, na sua carta de 6 de Julho de 2010, através da qual notificou a decisão impugnada à requerente, a Comissão informou esta última de que dispunha de três meses, a contar da notificação, para pagar a coima. No entanto, a Comissão indicou que, caso a requerente decidisse interpor no Tribunal Geral um recurso destinado a contestar a legalidade da decisão, cobraria provisoriamente a coima ou exigiria a constituição de uma garantia bancária que cobrisse o montante da dívida principal e os juros eventualmente devidos.

18      Na medida em que incumbe à requerente demonstrar ao juiz das medidas provisórias que explorou infrutiferamente todas as possibilidades que se lhe ofereciam a poderiam permitir‑lhe evitar a ocorrência de um prejuízo grave e irreparável e, consequentemente, que só as medidas provisórias requeridas são susceptíveis de alcançar esse objectivo, decorre da carta de notificação que a requerente tinha pelo menos a obrigação de examinar não apenas a sua capacidade para pagar a referida coima mas igualmente para constituir uma garantia bancária.

19      Dado que a fiscalização da observância do requisito relativo à urgência pelo juiz das medidas provisórias consiste em verificar a prova da inexistência de outra solução que não fosse a adopção de medidas provisórias, importa no presente caso, examinar, em primeiro lugar, se a requerente demonstrou suficientemente que lhe é impossível recorrer a uma garantia bancária e, em segundo lugar, na medida em que essa impossibilidade seja confirmada, que lhe é impossível pagar o montante da coima aplicada pela Comissão na decisão impugnada.

 Quanto à impossibilidade de recorrer a uma garantia bancária

20      Na sua carta de 6 de Julho de 2010, através da qual notificou a decisão impugnada à requerente, a Comissão indicou claramente a esta última a possibilidade de recorrer a um instrumento financeiro – no caso concreto, a uma garantia bancária – que lhe permitisse cumprir provisoriamente a obrigação de pagar a coima aplicada sem ter de desembolsar o montante reclamado na data de exigibilidade.

21      A este respeito, importa recordar, por um lado, que a possibilidade de exigir a constituição de uma garantia bancária corresponde a uma linha de orientação geral e razoável da Comissão (despacho do presidente do Tribunal Geral de 5 de Agosto de 2003, IRO/Comissão, T‑79/03 R, Colect., p. II‑3027, n.° 25) e, por outro, que a parte que requer as medidas provisórias só pode ser dispensada da obrigação de recorrer à constituição de uma garantia bancária como condição da não cobrança imediata de uma coima aplicada pela Comissão perante circunstâncias excepcionais [despachos do presidente do Tribunal de Justiça de 6 de Maio de 1982, AEG‑Telefunken/Comissão, 107/82 R, Recueil, p. 1549, n.° 6; de 15 de Dezembro de 2000, Cho Yang Shipping/Comissão, C‑361/00 P(R), Colect., p. I‑11657, n.° 88, e de 23 de Março de 2001, FEG/Comissão, C‑7/01 P(R), Colect., p. I‑2559, n.° 44; despacho Reagens/Comissão, já referido, n.° 42].

22      A existência de tais circunstâncias excepcionais pode, em princípio, considerar‑se provada quando a parte que pede para ser dispensada da obrigação de constituir uma garantia bancária prova que lhe é objectivamente impossível constituir tal garantia (v. despacho IRO/Comissão, já referido, n.° 26, e jurisprudência referida) ou que a sua constituição poderia pôr em risco a sua existência (v., neste sentido, despachos do presidente do Tribunal Geral de 21 de Dezembro de 1994, Buchmann/Comissão, T‑295/94 R, Colect., p. II‑1265, n.° 24, e de 28 de Junho de 2000, Cho Yang Shipping/Comissão, T‑191/98 R II, Colect., p. II‑2551, n.° 43).

23      Por conseguinte, há que examinar se a requerente fez prova suficiente, em primeiro lugar, de uma impossibilidade objectiva de constituir uma garantia bancária e, em segundo lugar, caso esta impossibilidade não se verificasse, um risco de ameaça à sua existência devido à constituição de tal garantia.

 Quanto à impossibilidade objectiva de constituir uma garantia bancária

24      Em primeiro lugar, a requerente considera ter feito prova da sua impossibilidade objectiva de constituir uma garantia bancária na medida em que conclui da sua alegação segundo a qual demonstrou que as instituições financeiras tinham reduzido drasticamente as suas linhas de crédito para suporte da sua actividade corrente, que essas instituições não estão dispostas a financiar‑lhe ou a garantir‑lhe o pagamento imediato da coima aplicada pela Comissão.

25      Importa assinalar desde já que a requerente não provou ter tentado efectivamente obter uma garantia bancária. Com efeito, cabe salientar que uma garantia bancária é um produto financeiro distinto de um empréstimo. Consequentemente, não pode ser inferido, sem outras provas documentais, da diminuição ou da anulação por uma instituição financeira de linhas de crédito nem da eventual recusa de concessão de um empréstimo, que a constituição de uma garantia bancária não poderia ser obtida (despacho Reagens/Comissão, já referido, n.° 44).

26      Por conseguinte, a conclusão da requerente baseada na diminuição ou na anulação de algumas das suas linhas de crédito deve ser considerada uma simples alegação, não sustentada, que não permite fazer prova suficiente de que lhe era objectivamente impossível constituir essa garantia (v., neste sentido, despacho Reagens/Comissão, já referido, n.os 54 a 56).

27      Assim, na medida em que a requerente não encetou qualquer diligência no que diz respeito à constituição de uma garantia bancária, não se pode considerar que lhe tenha sido objectivamente impossível constituir a garantia bancária exigida (v., neste sentido, despacho do presidente do Tribunal Geral de 21 de Janeiro de 2004, FNICGV/Comissão, T‑252/03 R, Colect., p. II‑315, n.os 32 e 33).

28      Em segundo lugar, a requerente parece considerar que a demonstração segundo a qual a sua situação financeira actual não lhe permitia efectuar o pagamento da coima comprova a sua impossibilidade objectiva de constituir uma garantia bancária.

29      Embora, por um lado, o facto de não poder pagar a coima não seja, em si, a prova da impossibilidade objectiva de obter uma garantia bancária e, por outro, a tomada em consideração unicamente dos recursos financeiros da requerente sem tomar em conta as diligências encetadas por esta última junto de instituições financeiras não permita, em princípio, ao juiz das medidas provisórias concluir pela impossibilidade de obter uma garantia bancária (v., neste sentido, despacho do presidente do Tribunal Geral de 2 de Março de 2011, 1.garantovanà/Comissão, T‑392/09 R, não publicado na Colectânea, n.° 52), não se pode porém excluir que tal impossibilidade possa ser inferida, em certos casos, dos elementos comprovativos da situação financeira da requerente. Importa portanto examinar se os elementos de prova relativos a essa situação são suficientes para concluir que essa impossibilidade existe.

30      A este respeito, cabe recordar que é jurisprudência assente que, no âmbito de um processo de medidas provisórias, incumbe ao requerente fornecer os elementos de prova essenciais que dêem ao juiz uma imagem fiel e global da situação da requerente. Essas indicações devem ser, por um lado, concretas e precisas e, por outro, sustentadas em provas documentais pormenorizadas e autenticadas (v. despachos do presidente do Tribunal Geral de 7 de Maio de 2010, Almamet/Comissão, T‑410/09 R, não publicado na Colectânea, n.° 61, e jurisprudência referida, e Reagens/Comissão, já referido, n.° 46).

31      Numa primeira fase, há que examinar os elementos de prova relativos à situação própria da requerente.

32      A fim de descrever a sua situação financeira, a requerente sublinha, em primeiro lugar, que muitas das linhas de crédito de que beneficiava junto dos bancos foram reduzidas ou canceladas. No entanto, resulta da análise das cartas das instituições de crédito fornecidas pela requerente em anexo ao pedido de medidas provisórias e que comprovam da redução ou da anulação de algumas das suas linhas de crédito que, como salienta acertadamente a Comissão nas suas observações, essas operações financeiras já não encontram justificação em considerações relacionadas com o exame da situação financeira da requerente, mas que se prendem com factores que lhe são alheios, como a reestruturação das próprias instituições bancárias. Consequentemente, estas cartas não contêm elementos suficientemente probatórios quanto à situação financeira da requerente, e mais especialmente sobre a sua capacidade de obter uma garantia bancária.

33      Em seguida, a requerente indica que praticamente já não dispõe de nenhuma linha de crédito, que dispondo apenas de um valor residual de 700 000 euros e que o seu capital circulante existente (fundos de maneio) se eleva a 8 192 euros, capital que é fundamental para a sobrevivência quotidiana da empresa. Conclui que não está minimamente em condições de justificar a mais pequena capacidade para pagar a coima aplicada. Sem necessidade de nos pronunciarmos sobre as dúvidas expressas pela Comissão quanto aos montantes indicados, cabe salientar a falta de pertinência de tais argumentos no quadro da apreciação da impossibilidade objectiva de a requerente constituir uma garantia bancária. Com efeito, a utilidade deste instrumento financeiro é, designadamente, não ser obrigado a dispor de liquidez suficiente para pagar o montante na data de exigibilidade da coima. Além disso, não é feita referência à inexistência de outros activos que seria susceptível de impossibilitar a requerente de oferecer aos estabelecimentos financeiros outras contrapartidas a fim de obter uma garantia bancária.

34      Por outro lado, a requerente sublinha que o montante da coima aplicada ultrapassa significativamente o seu capital social, que se eleva a 953 380 euros, e que o exercício relativo a 2009 apresentou um resultado negativo de 15,5 milhões de euros. No entanto, resulta da análise dos numerosos documentos fornecidos pela Comissão nas suas observações, provenientes das trocas de correspondência com a requerente por ocasião do exame do pedido desta ao abrigo do n.° 35 das Orientações para o cálculo das coimas aplicadas por força do artigo 23.°, n.° 2, alínea a), do Regulamento (CE) n.° 1/2003 (JO 2006, C 210, p. 2) que a descrição dos recursos financeiros da requerente não cumpre as exigências de apresentação de uma imagem fiel e global da sua situação. Com efeito, são, por exemplo, mencionados capitais próprios pertencentes à requerente, cujo montante continuaria a ser importante após a tomada em consideração dos prejuízos desta última, que deveriam ter sido considerados como contrapartida da obtenção de uma garantia bancária, pelo menos para afastar de modo justificado a possibilidade dessa obtenção.

35      Por último, no que respeita às declarações, não sustentadas, da requerente, relativas tanto às suas dificuldades em obter financiamentos junto de instituições bancárias devido ao maior rigor que a crise financeira mundial engendrou, especialmente em Portugal, relativamente à concessão de garantias e de financiamentos como à sua situação de tesouraria «extremamente deficitária» e às suas dificuldades para pagar aos fornecedores, basta recordar que a simples afirmação da requerente quanto às dificuldades financeiras decorrentes da aplicação de uma coima por violação das regras de concorrência não é suficiente para conferir carácter preciso e concreto às indicações, susceptível de permitir ao juiz das medidas provisórias efectuar o seu controlo relativo à impossibilidade objectiva de constituir uma garantia bancária.

36      Numa segunda fase, cabe examinar os elementos de prova relativos à situação do grupo a que pertence a requerente. Com efeito, resulta de jurisprudência constante que, para apreciar se uma sociedade está em condições de constituir uma garantia bancária, há que ter em conta o grupo de sociedades de que mesma faz parte, em especial os recursos de que esse grupo dispõe globalmente [despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 14 de Dezembro de 1999, DSR Senator Lines/Comissão, C‑364/99 P(R), Colect., p. I‑8733, n.° 49].

37      Este entendimento assenta na ideia de que os interesses objectivos da sociedade em causa não têm carácter autónomo relativamente aos das pessoas, singulares ou colectivas, que a controlam e que o carácter grave e irreparável do prejuízo alegado deve, portanto, ser apreciado ao nível do grupo que essas pessoas compõem. Esta confusão de interesses justifica em particular que o interesse da sociedade em causa em sobreviver não seja apreciado independentemente do interesse que aqueles que a controlam têm na sua perenidade (despachos DSR Senator Lines/Comissão, já referido, n.° 50, e HFB e o./Comissão, já referido, n.° 62; despacho do presidente do Tribunal Geral de 15 de Janeiro de 2001, Le Canne/Comissão, T‑241/00 R, Colect., p. II‑37, n.° 40). Esta tomada em consideração da situação do grupo ao qual a sociedade pertence não implica de modo nenhum que a coima ou a responsabilidade pela infracção seja imputada a terceiros (despacho Romana Tabacchi/Comissão, já referido, n.° 111).

38      No caso vertente, a requerente indica que é uma empresa familiar de dimensão modesta e que não pertence a um grande grupo multinacional verticalmente integrado. Exclui a possibilidade de o seu accionista, a Cosico – Sociedade Gestora de Participações Sociais, Lda (a seguir «Cosico»), vir em seu apoio graças aos activos transferidos pela requerente para a Companhia Previdente S.A., sociedade distinta da requerente mas igualmente detida pela Cosico, na medida em que a Companhia Previdente S.A. apresenta um passivo muito superior ao seu activo, o que coloca esta última em situação de insolvência técnica. Finalmente, no que respeita a certas sociedades pertencentes ao mesmo grupo (Emesa – Trefileria, SA, Industrias Galycas, SA e Italcables SpA), a requerente indica que estas últimas estão confrontadas com graves dificuldades económicas, comprovadas por efeitos reais sobre a actividade operacional dessas empresas, que se traduziram nomeadamente no encerramento de fábricas e em despedimentos.

39      Sublinhe‑se a este respeito que, em primeiro lugar, a requerente não forneceu nenhuma informação contabilística relativa ao seu accionista maioritário, a Cosico, ou às outras empresas do grupo de que faz parte que permitisse ao juiz das medidas provisórias, por um lado, tomar conhecimento da estrutura precisa do seu corpo accionista e, por outro, das capacidades financeiras deste grupo. Além disso, esta falta de informações não é minimamente justificada pela requerente, quando a verdade é que fornece alguns elementos de informações de natureza económica e/ou financeira no que a elas respeita.

40      Em seguida, embora não conteste a existência de uma comunidade de interesses económicos existente entre ela e o seu accionista maioritário, a Cosico, a requerente não se baseia, no pedido de medidas provisórias, em nenhum elemento de prova quanto à incapacidade da Cosico em fornecer ou em participar nos esforços de constituição de uma garantia bancária. O mesmo acontece no que respeita a todas as outras sociedades pertencentes ao mesmo grupo. Importa, com efeito, assinalar que as informações fornecidas pela requerente, descritas no n.° 38, supra, são parcelares, insuficientemente baseadas em provas documentais ou mesmo totalmente desprovidas de provas documentais pormenorizadas e autenticadas, além de que não são pertinentes em relação à capacidade de obtenção de uma garantia bancária.

41      Daqui resulta que a requerente forneceu informações incompletas quanto à sua situação financeira que não permitem ao juiz das medidas provisórias dispor de uma imagem fiel e global dessa situação, necessária para o exercício do seu controlo da realidade da impossibilidade objectiva, alegada pela requerente, de constituir uma garantia bancária. Deste modo, tal impossibilidade não pode ser deduzida desses elementos.

42      Consequentemente, a requerente não forneceu a prova de que está objectivamente impossibilitada de obter uma garantia bancária e, portanto, não fez uma demonstração suficiente da existência de circunstâncias excepcionais que consubstanciem tal impossibilidade.

 Quanto ao risco de que a existência da requerente seja posta em causa devido à constituição de uma garantia bancária

43      A existência de circunstâncias excepcionais, que justifiquem uma dispensa da obrigação de recorrer à constituição de uma garantia bancária como condição do não pagamento imediato do montante da coima aplicada pela Comissão na decisão impugnada pode igualmente ser demonstrada através da prova do risco de que a existência da requerente seja posta em causa devido à constituição de tal garantia.

44      No entanto, saliente‑se que o pedido de medidas provisórias contém apenas a declaração, não apoiada em provas documentais pormenorizadas e autenticadas, segundo a qual a requerente, mesmo que lhe fosse possível obter a garantia bancária exigida, teria «enormes dificuldades (pelo menos) de concorrer no mercado» e isso constituiria um «facto altamente prejudicial à estrutura concorrencial dos mercados em que a requerente está activa».

45      Ora, há que reconhecer que esse risco, sem necessidade de analisar a prova relativa à sua ocorrência, deve ser distinguida do risco de que a existência da requerente seja posta em causa devido à constituição de uma garantia bancária. Daqui resulta que o pedido de medidas provisórias não contém qualquer argumento expresso a este respeito e que não é necessário que o juiz das medidas provisórias proceda a uma análise mais exaustiva sobre a existência eventual de circunstâncias excepcionais susceptíveis de justificar uma dispensa da obrigação de recorrer à constituição de uma garantia bancária como condição do não pagamento imediato do montante da coima aplicada pela Comissão na decisão impugnada.

46      Por conseguinte, a requerente não fez prova de que a constituição de uma garantia bancária era passível, em si mesma, de pôr em causa a sua existência e, consequentemente, não demonstrou suficientemente que existissem circunstâncias excepcionais que tal risco consubstancia.

47      Daqui resulta que, dado que a requerente não demonstrou a existência de circunstâncias excepcionais que justifiquem o deferimento do seu pedido de dispensa da obrigação de recorrer à constituição de uma garantia bancária como condição do não pagamento da coima aplicada pela Comissão na decisão impugnada, este pedido deve ser indeferido.

 Quanto à impossibilidade de pagar o montante da coima

48      A título preliminar, recorde‑se que a questão da possibilidade de a requerente constituir ou não uma garantia bancária constitui inegavelmente um elemento essencial que devia resultar do próprio corpo do pedido de medidas provisórias (v., neste sentido, despacho Reagens/Comissão, já referido, n.° 52).

49      Ora, esta possibilidade não foi objecto de um exame sério e completo pela requerente à data da apresentação do pedido de medidas provisórias.

50      Consequentemente, não é necessário examinar o pedido de dispensa de pagamento da coima na medida em que, ao não diligenciar no sentido de saber se podia evitar a ocorrência de um prejuízo grave e irreparável através da constituição de uma garantia bancária, a requerente não demonstrou que só as medidas provisórias requeridas eram susceptíveis de evitar tal prejuízo. Efectivamente, a verificação da impossibilidade de pagamento da coima aplicada pela Comissão na decisão impugnada só se justificaria se o pedido de dispensa da obrigação de constituir uma garantia bancária tivesse sido deferido.

51      De resto, mesmo que a requerente tivesse conseguido demonstrar que lhe era impossível pagar provisoriamente a coima e constituir uma garantia bancária, incumbir‑lhe‑ia além disso demonstrar o carácter grave e irreparável do prejuízo que as medidas provisórias teriam permitido evitar. Ora, basta assinalar, a este respeito, que a requerente se limita a indicar, sem apresentar as correspondentes provas, que, na falta das medidas provisórias requeridas, teria «enormes dificuldades (pelo menos) de concorrer no mercado» e que isso constituiria um «facto altamente prejudicial à estrutura concorrencial dos mercados em que a requerente está activa». Tais alegações, não sustentadas em indícios concretos e precisos, em nada demonstram a realidade do carácter imediato e certo que deve revestir o prejuízo sofrido e que só as medidas provisórias poderiam evitar que ocorresse.

52      Além disso, segundo jurisprudência assente, a urgência em decretar uma medida provisória deve resultar dos efeitos produzidos pelo acto controvertido e não da falta de diligência do requerente da referida medida. Com efeito, incumbe a este último, mesmo correndo o risco de ter de suportar ele próprio o prejuízo, enquanto parte dos «riscos da empresa», dar provas de uma diligência razoável a fim de limitar a dimensão de tal prejuízo (v. despacho do presidente do Tribunal Geral de 15 de Julho de 2008, Antwerpse Bouwwerken/Comissão, T‑195/08 R, não publicado na Colectânea, n.° 48, e jurisprudência referida). Ora, deve salientar‑se que a requerente não menciona minimamente, no seu pedido de medidas provisórias, a existência de uma provisão constituída com vista ao pagamento da coima, cuja eventualidade era conhecida pelo menos desde a notificação da comunicação de acusações de 30 de Setembro de 2008. A falta de constituição de tal provisão deveria assim ser considerada uma prova manifesta da falta de diligência da parte da requerente, que exclui o carácter urgente das medidas provisórias pedidas.

53      Resulta de tudo quanto precede que o pedido de medidas provisórias deve ser indeferido por falta de urgência, sem necessidade de verificar se os outros requisitos de concessão das medidas provisórias requeridas, designadamente o relativo à existência de fumus boni juris, estão preenchidos.

Pelos fundamentos expostos,

O PRESIDENTE DO TRIBUNAL GERAL

decide:

1)      O pedido de medidas provisórias é indeferido.

2)      Reserva‑se para final a decisão quanto às despesas.

Feito no Luxemburgo, em 10 de Junho de 2011.

O secretário

 

      O presidente

E. Coulon

 

      M. Jaeger


* Língua do processo: português.